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DITADURA MILITAR
1 INTRODUÇÃO
[...] que uma das formas mais antigas de dominação é pela via cultural, uma vez que,
através das representações culturais, os membros de uma sociedade engendram e
perpetuam os valores e normas de conduta, de comportamento. Dentre as formas
culturais de maior impacto, porque consegue atingir um público considerável, está o
teatro, como hoje, é também a televisão, por seus filmes, séries e novelas.
Portanto, nesse contexto, o teatro se instala como uma das manifestações artísticas
mais visadas pela censura. A ação dos órgãos de censura se materializava de diversas formas,
através dos cortes morais e políticos, da faixa etária indicada para cada peça, e também das
suspensões de espetáculos. Esse trabalho de censura era realizado pelo setor da Divisão de
Censura de Diversões Públicas (DCDP) do Departamento da Polícia Federal (DPF) que
expedia o Certificado de Censura da obra teatral, o qual tinha validade de cinco anos sob a
condição de ser acompanhado do enredo devidamente carimbado pela DCDP.
O texto teatral “Dona Clara Clareou ou Simplesmente Destroços” foi submetido à
censura no ano de 1982, não possui cortes em nenhum dos seus dois testemunhos datados de
1981, entretanto, um deles possui o carimbo da Superintendência Regional da Bahia – DPF,
em todas as suas folhas, assim como também o carimbo da Sociedade Brasileira de Autores
Teatrais na primeira e última folha, marcando a ação da censura (figuras 1 e 2).
A peça em exame é uma exposição do drama de um rapaz que para sobreviver rompe
com seus valores e é estimulado a aceitar a sua condição amoral por Clara. [...] Clara
passa a ser um misto de mãe e amante de Lucas que vive num conflito provocado por
sua bissexualidade que Clara estimula-o a aceitar sem medo. (Arquivo Nacional de
Brasília, DPF, parecer 03/82, 1982)
Portanto, é evidente que uma produção teatral que estimule ações feministas, que
despertam nas mulheres um forte anseio de mudar suas condições de vida, conquistando sua
independência, lutando por seus direitos e afrontando o poder masculino, é algo que preocupa
uma sociedade machista, principalmente, num momento em que esta ainda estava dominada
por militares, mesmo sendo uma peça datada de 1982, período final da ditadura militar.
Sobre os movimentos feministas durante a ditadura militar, Soares (1998) aponta a sua
importância, principalmente, como motivador das mulheres para subverter-se contra a ordem
social, política e econômica vigente, afirmando que
Todos esses intensos movimentos feministas da década de 70, podem ser vistos como
uma motivação para que Jurema Penna tenha encenado Dona Clara Clareou ou Simplesmente
Destroços em 1982, dado que um texto teatral que aborda temas definidos como polêmicos,
como bissexualidade e poligamia, provavelmente, seria vetado na década de 60, anos iniciais
da Ditadura Militar, em que a censura era mais intensa comparada com a realizada na década
de 80.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
AUERBACH, Erich. Introdução aos estudos literários. Tradução José Paulo Paes. São Paulo:
Cultrix, 1972.
BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo: Fatos e Mitos. Tradução Sérgio Milliet. Ed:
Difusão Europeia do Livro, São Paulo, 1970.
BORGES, Rosa; SOUZA, Arivaldo Sacramento de. Filologia e Filologia como Crítica
Textual. In: BORGES, Rosa et al. Edição de Texto e Crítica Filológica. Salvador: Quarteto,
2012.
EM "DONA Clara Clareou" o fim fica por conta do tempo. In: Correio da Bahia. 25 de
março, 1982.
SANTOS, Rosa Borges dos. Edição e estudo de textos teatrais censurados na Bahia: A
Filologia em diálogo com a Literatura, a História e o Teatro. Ed: EDUFBA, Salvador, 2012.
SCOTT, JOAN. Gender: a useful category of historical analyses. Gender and the politics of
history. Tradução: DABAT, Christine Rufino; Ávila, Maria Bethânia. New York, Columbia
University Press. 1989.
SOARES, Vera. Muitas faces do feminismo no Brasil. In: Mulher e Política – Gênero e
feminismo no Partido dos Trabalhadores. São Paulo, Editora Fundação Perseu Abramo, 1998.
TELES, Maria Amélia de Almeida. Breve histórico do feminismo no Brasil. Ed: Brasiliense,
São Paulo, 1993.