Você está na página 1de 13

A IMPORTÂNCIA DA INTELIGÊNCIA COMO OBJETO DE ESTUDO

PARA O CAMPO DA DEFESA NO BRASIL


Arthur Macdowell Cardoso*

Resumo
Essencial para que todas as ações no campo da defesa sejam desenvolvidas com base em
conhecimentos precisos e oportunos, a Inteligência desempenha um papel crucial na Defesa
Nacional. Como elemento intrínseco à defesa, a Atividade de Inteligência proporciona a ca-
pacidade de produzir conhecimentos estratégicos por meio de uma metodologia que busca
ser isenta de viés e imparcial. Apesar de sua importância para a defesa, a Inteligência é pouco
contemplada como objeto de estudo no campo acadêmico dos estudos estratégicos no Bra-
sil. Este trabalho aborda o papel da Inteligência nesse campo de estudos, sua importância
como ferramenta para o assessoramento estratégico aos processos decisórios do Estado no
âmbito da defesa e o atual cenário dos estudos voltados à Inteligência no campo dos estudos
estratégicos no Brasil.

Palavras-chave: Atividade de Inteligência; Defesa nacional; Estudos estratégicos; Inteligência


de defesa.

Introdução

A partir da redemocratização do
Brasil, concretizada com a Consti-
tuição Federal de 1988, iniciou-se um
Outra reformulação conduzida no mes-
mo período e que merece destaque foi a
alteração na estrutura da Atividade de In-
prolongado processo de transformação teligência do país. O Serviço Nacional de
da estrutura da Defesa Nacional. Este Informações (SNI), criado em 1964 para
processo foi responsável pela extinção desenvolver a atividade de Inteligência,
do Estado-Maior das Forças Armadas foi extinto em 1990. De 1990 a 1999,
(EMFA), do Conselho de Segurança Na- a unidade responsável pela atividade de
cional e pela criação do Ministério da Inteligência do país sofreu muitas altera-
Defesa (MD), em 1999. Tal reforma teve ções de nome e de subordinação. A Lei
como objetivo modernizar a estrutura da nº 9.883, de 7 de dezembro de 1999,
Defesa, buscando aproximá-la dos pa- reestruturou a atividade de Inteligência:
drões vigentes em outras repúblicas de- criou o Sistema Brasileiro de Inteligência
mocráticas (OLIVEIRA, 2005). (Sisbin) e a Agência Brasileira de Inte-

 *UDGXDQGRGREDFKDUHODGRGH'HIHVDH*HVWmR(VWUDWpJLFD '*(,8)5- HSHVTXLVDGRUYR-


OXQWiULRGR/DERUDWyULRGH6HJXUDQoD,QWHUQDFLRQDOH'HIHVD1DFLRQDO /$%6'(1&(((6* 

Revista Brasileira de Inteligência. Brasília: Abin, n. 12, dezembro 2017 51


Arthur Macdowell Cardoso

ligência (Abin), órgão central do novo Com o auxílio de iniciativas federais, a


sistema, subordinada ao Gabinete de exemplo do Programa de Apoio ao Ensi-
Segurança Institucional da Presidência no e à Pesquisa Científica e Tecnológica
da República (GSIPR). Como atribuições em Defesa Nacional (Pró-Defesa), criado
legais da Abin, podemos destacar o pla- pelo MD em 2005, buscou-se incentivar
nejamento, a execução, a coordenação, projetos capazes de criar redes de co-
a supervisão e o controle das Atividades operação acadêmica na área de Defesa
de Inteligência no país e a implementa- Nacional no país.
ção de medidas para a proteção de infor-
As mudanças impostas às estruturas da
mações de interesse estratégico relativas
Defesa nacional, bem como a criação de
à segurança do Estado e da sociedade.
cursos de graduação e pós-graduação
Como órgão central, também é sua res-
no campo da Defesa, são marcos no de-
ponsabilidade coordenar e integrar as
senvolvimento de uma nova mentalidade
atividades do Sisbin.
de Defesa Nacional no Brasil e desem-
Em 2002, o MD, membro integrante do penham um papel importante na formu-
Sisbin e responsável pelo fornecimento lação do arcabouço teórico de futuros
de dados e conhecimentos específicos profissionais da Defesa.
relacionados à defesa, criou o Sistema de
Tendo como objetivo a produção e a di-
Inteligência de Defesa (Sinde) por meio fusão de conhecimentos estratégicos ca-
da Portaria Normativa n° 295, de 3 de pazes de auxiliar os processos decisórios
junho. Com isso, procurava otimizar a do Estado, a Atividade de Inteligência
estrutura de Inteligência voltada para o desempenha papel essencial na Defesa
desempenho e a coordenação da Ativi- Nacional. Embora valiosa como ferra-
dade de Inteligência de Defesa. menta para a elaboração e a condução
de políticas públicas voltadas à defesa, a
As reformas implantadas na defesa oca-
Inteligência está pouco presente no cam-
sionaram uma considerável desmilitari-
po dos estudos estratégicos no Brasil.
zação da sua estrutura nos níveis polí-
tico e estratégico, tornando crescente a O objetivo deste trabalho é abordar a im-
necessidade da formação de profissionais portância da Inteligência como objeto de
civis para atuarem no campo da Defesa. estudo para o aprimoramento das capa-
A Estratégia Nacional de Defesa (END), cidades analíticas inerentes à formulação
documento responsável pelo estabeleci- e à coordenação das políticas e estraté-
mento das diretrizes estratégicas no âm- gias da Defesa Nacional. Serão primeiro
bito da Defesa Nacional, define capaci- apresentados os principais documentos
tação de especialistas civis no campo da que norteiam as ações do Estado volta-
defesa como de interesse estratégico do das à defesa, sendo destacado o papel da
Estado, sendo responsabilidade do Go- Inteligência e da capacitação dos recur-
verno Federal o apoio às universidades sos humanos, em especial os civis, para
no desenvolvimento de estudos relativos o campo. Em seguida, será abordada
à defesa (END, 2012). a Atividade de Inteligência e seu papel

52 Revista Brasileira de Inteligência. Brasília: Abin, n. 12, dezembro 2017


A importância da Inteligência como objeto de estudo para o campo da Defesa no Brasil

como ferramenta de assessoramento à definida como: “conjunto de medidas e


defesa. O tópico seguinte será dedicado ações do Estado, com ênfase na expres-
ao estudo da defesa em instituições civis são militar, para a Defesa do território,
no Brasil, sendo, em seguida, abordado da soberania e dos interesses nacionais
o estudo da Inteligência nestes espaços. contra ameaças preponderantemen-
Por fim, serão expostas algumas breves te externas, potenciais ou manifestas”
considerações finais. (PND, 2012, pp.1-2).

A Política e a Estratégia Nacionais Além da definição dos conceitos funda-


de Defesa mentais relacionados à Defesa Nacional,
a PND contextualiza o cenário interna-
A partir da Lei Complementar n° 97, cional contemporâneo, enfatizando a
de 1999, instrumento normativo que delicada posição ocupada pelo Brasil e
dispõe sobre as normas gerais para a sua postura perante aquele. Explicitadas
organização, o preparo e o emprego as questões relativas ao Brasil, seu en-
das Forças Armadas (FAs), fica esta- torno estratégico e o contexto interna-
belecida a responsabilidade do poder cional, a PND estabelece oito Objetivos
Executivo em enviar, para apreciação Nacionais de Defesa a serem alcança-
do Legislativo, três documentos funda- dos para a preservação da soberania e
mentais da Defesa Nacional, a Políti- dos interesses nacionais, sendo também
ca Nacional de Defesa (PND), a END determinadas orientações para guiar o
e o Livro Branco de Defesa Nacional, comprimento destes (PND, 2012).
todos obrigatoriamente renováveis em
um período de quatro anos. A partir das premissas e dos Objetivos
Nacionais de Defesa estabelecidos pela
A PND é o documento condicionante de PND, foi elaborada a END, documen-
mais alto nível do planejamento de ações to que busca propiciar a execução da
destinadas à Defesa nacional. Voltada PND. Configurada para a construção
essencialmente para ameaças externas, de uma estratégia de caráter dissuasó-
estabelece objetivos e orientações para o rio, a END busca o aperfeiçoamento
preparo e o emprego dos setores militar das capacidades de preparo e emprego
e civil em todas as esferas do Estado, em das FAs e da sociedade civil em prol da
prol da Defesa Nacional (PND, 2012). Defesa Nacional.

A PND explicita os conceitos de Segu- A Inteligência é descrita pela END


rança e Defesa Nacional, em que a Se- (2012) como uma atividade voltada
gurança é definida como: “a condição para o acompanhamento de situações
que permite ao País preservar sua sobe- e atores que possam vir a representar
rania e integridade territorial, promover potenciais ameaças ao Estado e para
seus interesses nacionais, livre de pres- proporcionar o alerta antecipado ante a
sões e ameaças, e garantir aos cidadãos possibilidade de concretização de tais
o exercício de seus direitos e deveres ameaças. Por meio dela, busca-se que
constitucionais”. Já a Defesa Nacional é todos os planejamentos – políticos, es-

Revista Brasileira de Inteligência. Brasília: Abin, n. 12, dezembro 2017 53


Arthur Macdowell Cardoso

tratégicos, operacionais e táticos – e sua ensino militar, em particular no nível de


execução sejam desenvolvidos com base Altos Estudos, e capacitar civis e milita-
em conhecimentos confiáveis e oportu- res para a própria Administração Central
nos (PND, 2012, p.33). do ministério e para outros setores do
governo, de interesse da Defesa (END,
A END (2012) também aborda direta- 2012). A PEnsD reconhece como obje-
mente o ensino e a capacitação de pro- tivo a capacitação de recursos humanos
fissionais civis para o campo da Defesa, da área de Inteligência, com ênfase na
definindo como objetivo: elaboração de documentos prospectivos
e na análise nos campos científico, nucle-
“Promover maior integração e participa-
ção dos setores civis governamentais na ar, cibernético e espacial.
discussão dos temas ligados à Defesa,
através, entre outros, de convênios com No intuito de promover essa capacita-
Instituições de Ensino Superior e do fo- ção, o Governo Federal deve apoiar, nas
mento à pesquisa nos assuntos de Defe-
universidades, um amplo espectro de
sa, assim como a participação efetiva da
sociedade brasileira, por intermédio do programas e cursos que versem sobre
meio acadêmico e de institutos e entida- a Defesa (END, 2012). Buscando aten-
des ligados aos assuntos estratégicos de der a esta demanda estratégica por es-
Defesa” (END, 2012, p. 41).
pecialistas civis em assuntos de defesa,
Uma vez que o papel das Instituições de crescente desde a criação do MD em
Ensino Superior (IES) tido como funda- 1999, foram idealizados os primeiros
mental para a participação da sociedade cursos dedicados ao campo da defesa
brasileira nos assuntos da defesa, o do- em IES do Brasil.
cumento busca se aprofundar no dire-
cionamento ideal das questões relativas A Atividade de Inteligência
ao ensino. Dessa forma, a END atribui Conforme definido na Lei nº 9.883/1999,
ao MD a responsabilidade de promover a Abin é responsável por planejar e exe-
estímulos a encontros, simpósios e se- cutar ações, inclusive sigilosas, referentes
minários destinados à discussão de as- à obtenção e à análise de dados destina-
suntos de relevância estratégica à Defesa dos à produção de conhecimento para o
Nacional. Determina, também, que o assessoramento à Presidência da Repú-
ministério deverá implementar ações e blica. Também é sua responsabilidade a
programas voltados à promoção e à dis- execução de medidas de proteção de co-
seminação de pesquisas essenciais à for- nhecimentos sensíveis, relativos aos inte-
mação de recursos humanos para a área resses nacionais e à segurança do Estado
da Defesa. Para o cumprimento dessas e da sociedade. A mesma lei determina,
atribuições, a END determina que o MD ainda, que compete à Abin promover o
deverá manter uma Política de Ensino desenvolvimento de recursos humanos e
de Defesa (PEnsD)1, tendo como obje- da doutrina de Inteligência, assim como
tivo acelerar o processo de interação do a realização de estudos e pesquisas para
1
 &I'HFUHWRQƒGHDJRVWRGH3XEOLFDGRQR'28GHS

54 Revista Brasileira de Inteligência. Brasília: Abin, n. 12, dezembro 2017


A importância da Inteligência como objeto de estudo para o campo da Defesa no Brasil

o exercício e o aprimoramento da ativida- A Política Nacional de Inteligência (PNI)


de de Inteligência (BRASIL, 1999, Art.
A Política Nacional de Inteligência (PNI)
4°, V). A Escola de Inteligência2 (Esint/
é o documento de mais alto nível para
Abin) é responsável pela formação, pela
a orientação da atividade de Inteligên-
capacitação e pelo aperfeiçoamento dos
cia no país e já estava previsto na Lei
profissionais de Inteligência da Abin e,
n° 9.883/1999. Foi aprovado em 2016
também, pela qualificação e pelo apri- pelo presidente interino Michel Temer
moramento em Inteligência de servido- e publicado no Diário Oficial da União,
res de órgãos integrantes do Sisbin. em 29 de junho, por meio do Decreto
n° 8.793/2016.
Servindo como instrumento legislativo
complementar, o Decreto n° 4.376, Responsável pela definição dos parâ-
de 13 de setembro de 2002, dispõe metros e limites da Atividade de Inteli-
sobre a organização e o funcionamen- gência e seus executores, a PNI (2016)
to do Sisbin, composto por represen- estabelece seus pressupostos, instru-
tantes de diversos ministérios, sem mentos, diretrizes e objetivos no âmbito
vínculo de subordinação. Cabem aos do Sisbin. Como instrumento de gestão
integrantes do Sisbin, a produção de pública, a PNI (2016) busca estar em
conhecimentos, o planejamento e a perfeita sintonia com os preceitos da Polí-
execução de ações relativas à obtenção tica Externa Brasileira e com os interesses
e à integração de dados e informações, estratégicos definidos pelo Estado, como
o intercâmbio destas informações, bem aqueles consignados na PND e na END.
como o fornecimento de conhecimen-
tos de Inteligência à Abin, seu órgão Os recursos humanos são definidos
central. Uma das mais desafiadoras como um fator estratégico, sendo enfa-
atribuições do Sisbin é a identificação tizadas as ações de capacitação, forma-
ção e desenvolvimento de pessoal para
e a prevenção de ameaças internas e
a Atividade de Inteligência (PNI, 2016).
externas à ordem constitucional (BRA-
Portanto, há uma sintonia entre a PNI
SIL, 1999), função que demanda um
(2016) e a PEnsD no que tange à ca-
acompanhamento permanente de inú-
pacitação de recursos humanos para a
meras ameaças concretas e potenciais.
Atividade de Inteligência e aos benefícios
Para a execução desta tarefa, é essen-
que essa proporciona às capacidades de
cial que o Sistema disponha de profis- produção de conhecimentos estratégicos
sionais com altas capacidades analíti- úteis ao Estado e à Defesa Nacional.
cas, aptos a considerarem uma ampla
variedade de fatores multidisciplinares As capacidades analíticas proporciona-
para a produção de conhecimentos das pela capacitação no campo da Inte-
úteis ao assessoramento, nas suas es- ligência, voltadas ao assessoramento de
feras de atribuições. processos decisórios desenvolvidos pelo

 6REUH D (6,17 YHU ZZZDELQJRYEUDWLYLGDGHLQWHOLJHQFLDHVFRODGHLQWHOLJHQFLD
$FHVVRHP

Revista Brasileira de Inteligência. Brasília: Abin, n. 12, dezembro 2017 55


Arthur Macdowell Cardoso

Estado e ao acompanhamento perma- O Sinde foi idealizado para aperfeiçoar e


nente de circunstâncias de interesse es- integrar as Atividades de Inteligência já
tratégico, permitem o emprego de técni- conduzidas pelos Órgãos de Inteligência
cas capazes de produzir conhecimentos do MD e das FAs. Através dele, é rea-
estratégicos objetivos. lizado o assessoramento ao Ministro da
Defesa e ao Chefe do Estado-Maior Con-
A Inteligência de Defesa junto das Forças Armadas (CEMCFA),
respectivamente, os decisores estratégi-
Conduzida em caráter permanente mes-
co e operacional de mais alto nível no
mo em situação de paz, a Atividade de
âmbito da defesa.
Inteligência de Defesa (AID) é definida
como o conjunto de ações de Inteligência Na defesa, a Inteligência está presente
desenvolvidas “no interesse da Defesa, em todos os níveis de seus processos
englobando os ramos Inteligência e Con- decisórios. Seu emprego é essencial
tra-inteligência” (MD, 2002). Sua finali- para que todas as ações desenvolvidas
dade é o acompanhamento de situações no campo da defesa sejam conduzidas
e atores que possam vir a representar po- com base em conhecimentos confiáveis
tenciais ameaças ao Estado, permitindo o e oportunos (END, 2012).
alerta antecipado ante a possibilidade de
concretização de tais ameaças. O estudo da Defesa em instituições civis
no Brasil
Conduzida pelo MD através do Sinde,
a AID é responsável pela coleta e pela Desenvolvidos quase que exclusivamente
análise de informações de interesse es- em instituições de caráter militar até o
tratégico para a defesa, utilizados para final do século XX, os estudos de Defe-
o assessoramento a decisores políticos e sa só foram introduzidos em instituições
estratégicos. Instituído por meio da Por- civis do Brasil após a reformulação da es-
taria Normativa n° 295/2002 do MD, trutura da Defesa Nacional, no início da
o Sinde é a plataforma responsável pela década de 1990.
integração das ações de planejamento e
execução da AID, tendo como integran- A formulação da PND e da END foi
tes todos os órgãos de Inteligência do conduzida especialmente com a ideia
MD e das FAs, sistemicamente conecta- de que “a Defesa do país é inseparável
dos sem vínculos de subordinação. do seu desenvolvimento” e que “preser-
var a segurança requer medidas de lar-
A produção de conhecimento, principal go espectro”, envolvendo várias áreas e
objetivo da AID, é regulada por meio instituições nacionais, muitas das quais
da Doutrina de Inteligência de Defesa não implicam qualquer envolvimento
(DID), definida como: “o conjunto de das FAs (PND, 2012). Essa nova men-
conceitos, princípios, normas, métodos talidade criou uma demanda por pro-
e processos que orienta e disciplina a fissionais capacitados para atuação com
Atividade de Inteligência no âmbito do diferentes especialidades e perspectivas.
SINDE” (MD, 2002). Tal demanda impulsionou a criação dos

56 Revista Brasileira de Inteligência. Brasília: Abin, n. 12, dezembro 2017


A importância da Inteligência como objeto de estudo para o campo da Defesa no Brasil

cursos de graduação e pós-graduação maiores integração e participação dos


dedicados ao campo da defesa. Em abril setores civis e governamentais na discus-
de 2017, foi assinado e homologado o são de temas ligados à defesa. Embora
parecer do Conselho Nacional de Edu- idealizada inicialmente para a capacita-
cação/Câmara de Educação Superior nº ção de oficiais dos estamentos superio-
147/2017, que autoriza a inserção da res das três forças, a busca pelo estímu-
Defesa no rol das Ciências estudadas no lo intelectual multidisciplinar fez que, a
país (MEC, 2017). partir de 1951, a ESG recebesse tam-
bém a contribuição de civis de diversos
Neste tópico, serão apresentados os atu- segmentos profissionais.
ais cursos de graduação, pós-graduação
e Altos Estudos destinados à formação A criação do MD e o desejo pela cons-
de profissionais para o campo da defesa, trução de uma nova mentalidade de de-
com ênfase nos conduzidos por meio de fesa no Brasil levaram também à criação
IES de caráter civil. das primeiras graduações e pós-gradua-
ções dedicadas aos estudos estratégicos
Criada pela Lei n° 785/1949, publicada e de defesa no país.
em 20 de agosto de 1949, a Escola Su-
perior de Guerra (ESG)3 é um Instituto Conduzido por meio do Instituto de Estu-
de Altos Estudos de Política, Estratégia dos Estratégicos (INEST) da Universidade
e Defesa e tem como objetivo desen- Federal Fluminense (UFF), o Programa de
volver e consolidar os conhecimentos Pós-Graduação em Estudos Estratégicos
necessários ao exercício de funções de da Defesa e da Segurança (PPGEST) é o
direção e assessoramento superior para primeiro curso de uma IES de caráter civil
o planejamento da Defesa Nacional, nela a contemplar os estudos da defesa. Tendo
inclusos os aspectos desenvolvimentistas início a partir do Programa Pró-Defesa,
introduzidos pela PND (2012). Como foi autorizado em dezembro de 2007
principal centro de estudos dedicado aos pela Coordenação de Aperfeiçoamento
Altos Estudos da Defesa no país, a esco- de Pessoal de Nível Superior (Capes) do
la é responsável pela realização de cur- Ministério da Educação (MEC) e iniciou
sos, pesquisas, palestras, seminários e suas atividades em 2008.
outras atividades acadêmicas dedicadas
ao tema. É através da ESG que o MD A única outra IES no Brasil a se dedi-
realiza a maioria de suas ações e progra- car aos estudos estratégicos no nível de
mas para a promoção e a disseminação pós-graduação é a Universidade Federal
de pesquisas essenciais à formação de do Rio Grande do Sul (UFRGS), respon-
recursos humanos para a área da De- sável pelo Programa de Pós-Graduação
fesa. Hoje subordinada diretamente ao em Estudos Estratégicos Internacionais
gabinete do Ministro da Defesa, a ESG (PPGEEI), criado em 2010. No PPGEEI,
também atua como uma das principais são conduzidos os cursos de Mestrado e
plataformas para o ministério promover Doutorado em Estudos Estratégicos.

 ,QIRUPDo}HVGHWDOKDGDVVREUHD(6*SRGHPVHUREWLGDVQDSiJLQDGDLQVWLWXLomRQDLQWHUQHW
KWWSZZZHVJEU$FHVVR

Revista Brasileira de Inteligência. Brasília: Abin, n. 12, dezembro 2017 57


Arthur Macdowell Cardoso

Instituído a partir do Programa de Apoio variedade de campos de conhecimento,


a Planos de Reestruturação e Expansão ajustando-se ao contexto essencialmente
de Universidades Federais (REUNI) em multidisciplinar introduzido pela PND,
2009, o Bacharelado em Defesa e Ges- e não são, portanto, percebidos como
tão Estratégica Internacional (DGEI) da área de interesse exclusivamente militar.
Universidade Federal do Rio de Janeiro Norteado por essa mentalidade, o Ba-
(UFRJ) foi o primeiro curso de graduação charelado em DGEI foi idealizado com
criado para a formação de profissionais o objetivo de:
civis para a área da defesa e ainda é o
“[…] preparar gestores e operadores
único. Idealizado como essencialmente com sólida formação em estudos estra-
multidisciplinar, o curso é atualmente mi- tégicos e defesa capazes de formular,
nistrado em diversos institutos do cam- coordenar e aplicar políticas e recursos,
pus da Cidade Universitária, tais como prospectar cenários, lidar com situações
de risco e de incerteza e executar ope-
o Centro de Letras e Artes, o Centro de rações diversas nos planos doméstico e
Ciências Matemáticas e da Natureza e o internacional.” (UFRJ, 2009).
Instituto de Pós-Graduação e Pesquisa
em Administração (COPPEAD)4. A cooperação entre os acadêmicos da
defesa e as FAs na produção de conhe-
A graduação promove anualmente a Se- cimento se dá, especialmente, por meio
mana de Defesa e Gestão Estratégica de atividades promovidas por institui-
Internacional (SDGEI). O evento propor- ções de ensino e pesquisa do MD. Em
ciona uma plataforma para o aperfeiçoa- busca de conhecimentos mais específi-
mento das capacidades acadêmicas dos cos ao campo da defesa, muitos acadê-
alunos de DGEI, em que os graduandos micos frequentemente recorrem a essas
desfrutam de uma rara oportunidade de instituições. Esse relacionamento é ex-
apresentar estudos especificamente de- cepcionalmente produtivo por meio das
dicados à temática de defesa. Não limita- atividades conduzidas pelos centros de
da à participação de graduandos do cur- pesquisa de duas destas instituições: o
so, a SDGEI é também uma importante Centro de Estudos Estratégicos (CEE) da
plataforma para a maior integração do ESG e o Centro de Estudos Políticos e
DGEI com outras instituições, cursos e a Estratégicos da Escola de Guerra Naval
sociedade em geral, importante também (EGN). Há ainda o Instituto Brasileiro
para a consolidação dos estudos estraté- de Estudos de Defesa Pandiá Calógeras
gicos como uma área de conhecimento (Ibed), centro de pesquisas que, como
essencialmente multidisciplinar. a ESG, é responsável por assessorar di-
retamente o MD, tendo como objetivos
A criação do DGEI foi um importante produzir análises, promover o diálogo e
marco para o aprimoramento das capaci- estimular a produção de conhecimentos
dades de defesa do país. Os estudos da acadêmicos sobre temas de interesse es-
defesa foram ampliados em direção a uma tratégico à Defesa Nacional.

 2EDFKDUHODGRGH'*(,pD~QLFDJUDGXDomRDGHVIUXWDURSULYLOpJLRGHWHUGLVFLSOLQDVPLQLV-
WUDGDVSHOR&233($'LQVWLWXWRGHH[FHOrQFLDQRFDPSRGDDGPLQLVWUDomRDQWHVGHGLFDGR
H[FOXVLYDPHQWHjSyVJUDGXDomR

58 Revista Brasileira de Inteligência. Brasília: Abin, n. 12, dezembro 2017


A importância da Inteligência como objeto de estudo para o campo da Defesa no Brasil

O estudo da Atividade de Inteligência da esfera acadêmica e colaborando para


no campo dos estudos no Brasil a valorização da Inteligência como ativi-
dade essencial do Estado.
Como ferramenta voltada ao acompa-
nhamento de circunstâncias e atores Como argumenta Martins (2015), o
estratégicos aos interesses nacionais, a avanço de estudos e pesquisas dedica-
Inteligência desempenha um papel im- dos à Inteligência contribui não apenas
portante no assessoramento dos proces- para o aprendizado dos que a estu-
sos decisórios desenvolvidos pelo Esta- dam, mas também para o aperfeiçoa-
do, sobretudo no âmbito da defesa. mento das noções metodológicas da
própria Inteligência:
Embora definida pela END (2012) como
ferramenta pela qual os conhecimentos “As pesquisas, estudos e reflexões teó-
essenciais aos processos decisórios da rico-doutrinárias em Inteligência e te-
defesa são elaborados, a Inteligência é mas afins retroalimentam as atividades
de ensino, levando à incorporação de
pouco contemplada como um objeto de novas práticas, tecnologias, abordagens
estudo formal no campo dos estudos es- metodológicas e alterações doutrinárias”
tratégicos no Brasil. (MARTINS, 2015, p. 17).

A Atividade de Inteligência, como con- No campo da defesa, a capacitação de


junto de ações voltadas à produção de recursos humanos para a Inteligência
conhecimentos estratégicos capazes de permite o aperfeiçoamento de técnicas
assessorar na elaboração e na implemen- voltadas à produção de conhecimentos
tação de políticas públicas, bem como ao imparciais úteis ao assessoramento dos
acompanhamento de ameaças concretas processos decisórios em todos os níveis
ou potenciais ao Estado e à sociedade, da defesa. Ela é também uma ferramenta
possui um potencial considerável no essencial para o processo de avaliação de
aperfeiçoamento das capacidades analíti- riscos impostos por ameaças à defesa e
cas de acadêmicos da defesa. A chegada de possíveis vulnerabilidades nacionais.
desta nova geração de estudantes e fu-
turos profissionais do campo da defesa, A ESG foi a primeira instituição nacional
indivíduos com capacidades desenvolvi- a se dedicar ao estudo da Atividade de
das em ambientes com metodologias dis- Inteligência, buscando institucionalizar a
tintas de seus antecessores, está sendo formação de recursos humanos na área.
responsável por uma transformação nas Em 1996, foi instituído o Curso Superior
relações entre civis e militares. A inser- de Inteligência Estratégica (CSIE), refor-
ção da Inteligência como objeto de estu- mulado em 1999, com a criação do MD.
do nestes espaços, além de aperfeiçoar Conduzido ao longo de vinte semanas, o
as capacidades analíticas dos alunos e fa- CSIE permanece como um dos principais
miliarizá-los com as estruturas nacionais mecanismos para a capacitação de recur-
operantes no âmbito do Sisbin, poderia sos humanos para a Atividade de Inteli-
contribuir também com a disseminação gência, tendo formado 468 profissionais
da cultura de Inteligência, aproximando-a desde sua restauração (CSIE, 2016).

Revista Brasileira de Inteligência. Brasília: Abin, n. 12, dezembro 2017 59


Arthur Macdowell Cardoso

Além do CSIE, a ESG também promove tratégicos no Brasil, a Inteligência nunca


outras atividades acadêmicas dedicadas foi contemplada como objeto de estudo
à Inteligência. Em 2014 e 2015, foi rea- por nenhuma de suas publicações7.
lizado o Seminário de Inteligência Estra-
tégica, evento que possibilitou uma ino- O Programa de Pós-Graduação em
vadora aproximação dos Altos Estudos Estudos Estratégicos Internacionais
de Inteligência Estratégica promovidos (PPGEEI/UFRGS) se destaca por ser o
pela ESG com acadêmicos. O seminá- único programa de pós-graduação de es-
rio abordou questões contemporâneas tudos estratégicos a possuir uma discipli-
relativas ao papel da Inteligência e seu na dedicada especificamente ao estudo
uso como ferramenta pelo Estado, pos- da Inteligência. Intitulada: “Inteligência
sibilitando aos acadêmicos presentes a governamental na guerra e na paz”, a
oportunidade de se familiarizarem com disciplina tem como objetivo:
o tema e as estruturas nacionais dedi- “discutir criticamente a literatura de inte-
cadas a estas atividades. Em 2016, o ligência governamental, introduzindo os
Laboratório de Segurança Internacional alunos aos fundamentos conceituais do
objeto, à história da atividade de inteli-
e Defesa Nacional (LABSDEN) do CEE gência desde o início do século XX, às
da ESG contemplou a Inteligência como relações entre a inteligência e a guerra
uma de suas linhas de pesquisa, propor- e, por fim, as relações entre a inteligên-
cionando uma rara oportunidade de ini- cia e a política internacional.” (UFRGS,
2017).
ciação científica no tema.
Sendo a Atividade de Inteligência essen-
Nos poucos cursos dedicados ao estu- cial para que o planejamento e a execu-
do da defesa nas IESs de caráter civil no ção de todas as ações conduzidas no
Brasil, a Inteligência permanece como âmbito da defesa desenvolvam-se com
uma temática pouco explorada. No ba- base em conhecimentos confiáveis e
charelado de Defesa e Gestão Estraté- oportunos (END, 2012, p.33), os aca-
gica Internacional (DGEI/UFRJ)5 e no dêmicos do campo da defesa precisam
Programa de Pós-Graduação em Estu- estar devidamente familiarizados com
dos Estratégicos da Defesa e da Segu- essa importante ferramenta do processo
rança (PPGEST/UFF)6, a Inteligência não decisório para o qual estão sendo inten-
é contemplada com uma disciplina pró- cionalmente preparados para participar.
pria. Na principal publicação acadêmica
do Inest a Revista Brasileira de Estudos Tanto o bacharelado de DGEI (UFRJ)
Estratégicos, um dos poucos periódicos quanto o PPGEST (UFF) têm como ob-
acadêmicos dedicados aos estudos es- jetivo a capacitação de profissionais para

 $HVWUXWXUDFXUULFXODUGH'*(,HVWiGLVSRQtYHOHPZZZVLJDXIUMEUVLUDUHSRVLWRULRFXUULFXOR
GLVWULEXLFRHV($$)&%%)'KWPO$FHVVRHP

 $  HVWUXWXUD FXUULFXODU GR 33*(67 SRGH VHU HQFRQWUDGD HP ZZZSSJHVWXIIEULQGH[SKS
HVWUXWXUDFXUULFXODU$FHVVRHP

 7RGDVDVHGLo}HVGD5HYLVWD%UDVLOHLUDGH(VWXGRV(VWUDWpJLFRVSRGHPVHUHQFRQWUDGDVHP
ZZZLQHVWXIIEULQGH[SKSUHVWLQLFLR$FHVVRHP

60 Revista Brasileira de Inteligência. Brasília: Abin, n. 12, dezembro 2017


A importância da Inteligência como objeto de estudo para o campo da Defesa no Brasil

o assessoramento de alto nível no campo de estudo. Tampouco foi a Inteligência


dos estudos estratégicos (UFRJ, 2009; contemplada como tema por sequer uma
INEST, 2017). Assim, é possível obser- das sessenta e nove dissertação de mes-
var uma sintonia entre a proposta peda- trado do PPGEST(UFF)8. No PPGEEI
gógica desses cursos e os objetivos da (UFRGS, 2017), único espaço a ofere-
Atividade de Inteligência, uma vez que cer uma disciplina estritamente dedicada
ambos compartilham o compromisso à Inteligência, também não há teses ou
com a produção de conhecimentos ne- dissertações que tenham contemplado a
cessários ao aprimoramento das capaci- Inteligência como tema9.
dades do Estado Brasileiro e à salvaguar-
Salvo as periódicas atividades desen-
da de sua sociedade. volvidas no âmbito da ESG, das quais
os acadêmicos eventualmente podem
Entretanto, o estudo da Atividade de
participar voluntariamente, são poucas
Inteligência vem sendo negligenciado
as oportunidades disponíveis aos alunos
nestes raros espaços dedicados ao es-
para se familiarizarem com a Atividade
tudo da defesa no Brasil, espaços cuja
de Inteligência. Uma das raras exce-
proposta é, justamente, a capacitação de
ções se deu durante a terceira edição da
civis para o assessoramento estratégico a SDGEI, em 2013, quando foi promovi-
questões de defesa. A ausência da Inte- do o painel: “A comunidade de Inteligên-
ligência como disciplina e a falta de um cia brasileira: Espionagem para quem?”,
docente especialista no tema dificulta o evento que contou com a presença de
desenvolvimento de artigos acadêmicos um Oficial de Inteligência da Abin como
que contemplem a Inteligência como palestrante convidado10.
tema e distancia os alunos de uma área
essencial para os processos decisórios da Para o aprimoramento das capacidades
Defesa Nacional. analíticas destes acadêmicos, seria ideal
que estes fossem preparados para o uso
Até o momento (2017), nenhuma mo- da Inteligência como ferramenta para o
nografia defendida para a obtenção do assessoramento de processos decisórios
diploma do bacharelado de DGEI (UFRJ) no campo da defesa. Por meio do estudo
contemplou a Inteligência como objeto da Inteligência, os graduandos poderiam
8
 $VGLVVHUWDo}HVGHIHQGLGDVSDUDDREWHQomRGRWtWXORGHPHVWUHQR33*(67 8)) SRGHPVHU
HQFRQWUDGDVHPSSJHVWXIIEULQGH[SKSGLVVHUWDFRHVGHIHQGLGDVSSJHVW$FHVVR

 $VWHVHVHGLVVHUWDo}HVGHIHQGLGDVQR33*((, 8)5*6 HVWmRGLVSRQtYHLVHPKWWSVZZZ
XIUJVEUSSJHHL"SDJHBLG DFHVVR

 $,,,6'*(,RFRUUHXGHDGHGH]HPEURGHQRDXGLWyULRGR&HQWUR&XOWXUDO3UR-
IHVVRU +RUiFLR GH 0DFHGR ORFDOL]DGR QR &HQWUR GH &LrQFLDV 0DWHPiWLFDV H GD 1DWXUH]D
&LGDGH8QLYHUVLWiULD5LRGH-DQHLURFRQWDQGRFRPDSUHVHQoDGHHVWXGDQWHVGRFXUVRGH
'*(, JUDGXDQGRV H SyVJUDGXDGRV GRV FXUVRV GH 'LUHLWR *HVWmR 3~EOLFD SDUD R 'HVHQ-
YROYLPHQWR(FRQ{PLFRH6RFLDO+LVWyULD&LrQFLDV(FRQ{PLFDV*HRJUD¿D/HWUDV&LrQFLDV
6RFLDLV&LrQFLDVGD&RPSXWDomR$GPLQLVWUDomR5HODo}HV,QWHUQDFLRQDLVDVVLPFRPRGH
RXYLQWHVGH8)5-8))8)55-38&5LR8Q%8)35,%0(&,6(/D6DOOH8(5-8QL5LR
863&ROpJLR3HGUR,,HPSUHVDVJUXSRVHSUR¿VVLRQDLVRULXQGRVGDV)RUoDV$UPDGDVHGDV
)RUoDV$X[LOLDUHV 6'*(, 

Revista Brasileira de Inteligência. Brasília: Abin, n. 12, dezembro 2017 61


Arthur Macdowell Cardoso

aprender não apenas sobre a estrutura decisórios desenvolvidos pelo Estado


do Sisbin e suas atribuições, mas tam- para a elaboração e a implementação
bém técnicas para a produção de conhe- de políticas públicas, bem como para a
cimento em uma metodologia específica condução de todas as ações desenvolvi-
que busca a verdade, sem influências das no âmbito da defesa (END, 2012,
ideológicas ou outro viés. p. 33), a Atividade de Inteligência é
negligenciada como objeto de estudo
Porém, não sendo a Atividade de Inteli- nos poucos espaços dedicados à defesa
gência contemplada como um objeto de na esfera acadêmica civil. Salvo o pro-
estudo específico nesse campo acadêmi- grama de pós-graduação e o doutora-
co, os estudantes que não buscam tais do da UFRGS, nenhum outro curso de
conhecimentos individualmente desco- graduação ou pós-graduação dedicado
nhecem, como boa parte da sociedade à defesa possui disciplinas voltadas es-
brasileira, a natureza da Atividade de In- pecificamente à Inteligência. A produ-
teligência, sua estrutura institucional no ção acadêmica dedicada ao tema nestes
Brasil e seu papel no processo decisório espaços também é modesta.
de políticas e estratégias nacionais. Pri-
vados de estudos idealizados para aper- A inserção da Inteligência como objeto
feiçoar a produção de conhecimentos de estudo no campo da defesa permiti-
dedicados ao assessoramento em situa- ria aos discentes o aperfeiçoamento de
ções de tomada de decisão e gerencia- técnicas voltadas para a produção de co-
mento de crises, os graduandos acabam nhecimento em uma metodologia espe-
por permanecer leigos quanto à impor- cífica que busca ser isenta de viés e útil
tância da Inteligência para o Estado e a ao assessoramento estratégico. Também
sociedade brasileiros. proporcionaria a familiarização com as
estruturas nacionais dedicadas à Ativida-
Considerações finais de de Inteligência e o papel do Sisbin na
defesa dos interesses nacionais. Sobretu-
Apesar do considerável avanço da defesa do, sua inserção na academia colaboraria
em se fazer presente na esfera acadêmica para o aprimoramento da cultura nacio-
e incluir a sociedade civil e sua capacita- nal de Inteligência, proporcionando um
ção para o campo da defesa como ele- espaço onde o tema poderia ser debati-
mento fundamental das capacidades na- do e aprimorado, possibilitando também
cionais, objetivo estratégico reconhecido a aproximação da sociedade acadêmica
pela END (2012), à luz do paradigma de defesa com o tema e a valorização da
essencialmente multidisciplinar introdu- Inteligência como uma atividade essen-
zido pela PND (2012), a Inteligência cial para o Estado e à Defesa Nacional.
permanece pouco presente no campo
dos estudos da defesa no Brasil. A consolidação dos estudos da defesa
no contexto acadêmico foi um balizador
Embora seja uma atividade essencial para o avanço da produção de conhe-
para o assessoramento dos processos cimento neste campo. Orientados por

62 Revista Brasileira de Inteligência. Brasília: Abin, n. 12, dezembro 2017


A importância da Inteligência como objeto de estudo para o campo da Defesa no Brasil

doutrinas de perspectivas abrangentes existente entre a Inteligência e a comu-


quanto à natureza da defesa e à sua nidade acadêmica no Brasil.
multidisciplinaridade, as graduações e
Conclui-se pela necessidade e pela im-
pós-graduações de estudos estratégi-
portância de atividades de estudo e pes-
cos se tornarão os principais núcleos
quisa voltadas ao tema da Inteligência no
para a capacitação de profissionais civis campo dos estudos estratégicos no Bra-
para o campo da defesa. Porém, a au- sil, reconhecido como objetivo específi-
sência da Inteligência como objeto de co pela PEnsD e como um instrumento
estudo nestes espaços poderá ter como essencial da Inteligência Nacional pela
consequência a preservação da distância PNI (2016).

Bibliografia
BRASIL. Lei nº 9.883, de 7 de dezembro de 1999. Brasília, DF, 1999.

CSIE. Curso Superior de Inteligência Estratégica (CSIE) – Resumo Histórico, Escola Superior de Guer-
ra, Ministério da Defesa, Brasília-DF, 2016. Disponível em: <esg.br/images/resumo_historico_cursos/
historico_csie.pdf>. Acesso em: 23/9/16.

END. Estratégia Nacional de Defesa. Ministério da Defesa, Brasília-DF, 2012.

INEST. Perfil do profissional. Instituto Nacional de Estudos Estratégicos, Universidade Federal Flumi-
nense, Niterói-RJ, 2017. Disponível em:<ppgest.uff.br/index.php/perfil-do-profissional-do-ppgest>.
Acesso em: 99/2017.

MARTINS, Erika F.S. O papel da Escola de Inteligência para o avanço dos estudos em Inteligência no
Brasil. Revista Brasileira de Inteligência, 10ª Edição, Brasília, 2015. Disponível em:<abin.gov.br/con-
teudo/uploads/2016/02/RBI-10.pdf>. Acesso em: 9/9/2017.

MEC. Parecer nº 147/2017. Conselho Nacional de Educação da Câmara de Educação Superior, Minis-
tério da Educação, 2017.

MD. Portaria Normativa nº 295/2002. Ministério da Defesa, Brasília-DF, 2002.

OLIVEIRA, Eliézer Rizzo. “Democracia e Defesa Nacional – A criação do Ministério da Defesa na Pre-
sidência de FHC”. Editora Manole Ltda., São Paulo– SP, 2005.
PND. Política Nacional de Defesa (PND). Ministério da Defesa, Brasília-DF, 2012.

PNI. Política Nacional de Inteligência (PNI). Decreto n° 8.793/2016, Brasília-DF, 2016.

SDGEI. III Semana de Defesa e Gestão Estratégica Internacional. Universidade Federal do Rio de Janeiro,
2013. Disponível em: <semanadefesa.com.br/iiisdgei>. Acesso em: 9/9/2017.

UFRGS. EEI 18 (M/D) – Inteligência Governamental na Guerra e na Paz. Programa de Pós-Graduação


em Estudos Estratégicos Internacionais, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2017. Disponível
em: <ufrgs.br/ppgeei/wp-content/uploads/2017/05/eei18.pdf>. Acesso em: 9/9/2017.

UFRJ. “Projeto Pedagógico do Curso de DGEI”. Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas /Centro de
Ciências Jurídicas e Econômicas, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), RJ, 2009.

Revista Brasileira de Inteligência. Brasília: Abin, n. 12, dezembro 2017 63

Você também pode gostar