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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

CENTRO DE TECNOLOGIA
DEPARTAMENTO DE ARQUITETURA E URBANISMO
HISTÓRIA DA ARQUITETURA E URBANISMO II

Lívia Bernardino Sencades


Maria Clara Mariz Maia De Freitas
Maria Luísa Peres Martorelli

ARTS & CRAFTS


O MOVIMENTO PARA REFORMA DAS ARTES APLICADAS

João Pessoa - PB
Agosto de 2023
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO……………………………………………………………………….2
2. OBJETO……………………………………………………………………………….2
3. OBJETIVOS…………………………………………………………………………...2
4. JUSTIFICATIVA………………………………………………………………………3
5. METODOLOGIA……………………………………………………………………..3
6. A ORIGEM DO MOVIMENTO DAS ARTES
APLICADAS………………………………………………………………………….3
7. CARACTERÍSTICAS E PRINCÍPIOS……………………………………………….6
8. PRODUÇÕES ……………...………………………………………………………....8
9. PRECURSORES E SUAS RESPECTIVAS OBRAS ……………………………….16
10. ARQUITETURA…………………………………………………………………….30
11. ARTS E CRAFTS NA INGLATERRA……………………………………………...34
12. ARTS E CRAFTS NOS ESTADOS UNIDOS…………………………………….....44
13. OBRA DESTAQUE……………………………………………………………….…49
14. CONSIDERAÇÕES FINAIS………………………………………………………...53
15. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ………………………………………………55

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INTRODUÇÃO

O movimento de reforma das artes aplicadas, o Arts and Crafts, é um movimento que
retoma o artesanato, e é contrário à produção em massa. Surgiu a partir da primeira exposição
universal ,em 1851, no Palácio de Cristal, por Joseph Paxton, no Hyde Park, em Londres, na
Inglaterra. Foi durante a exposição que se percebeu a má qualidade dos produtos. Sendo
assim, as pessoas começaram a questionar se valia a pena a produção ser em massa, por
possuir uma qualidade inferior. Logo eles buscavam trazer uma produção mais artesanal, com
um padrão de qualidade, e priorizando a função, não a decoração. O movimento incorporou
diversos artistas, artesãos, escritores, arquitetos, ceramistas, joalheiros, escultores e
marceneiros. Além disso, alguns de seus precursores eram conservadores ardentes, já outros
eram reformistas, como veremos adiante.

OBJETO
O presente trabalho dedica-se a aquisição do conhecimento acerca do Arts e Crafts,
movimento para reforma das artes aplicadas, como forma de atender e contemplar de maneira
mais abrangente e satisfatória o que foi abordado pelo professor em sala de aula. O estudo
focalizou em trazer aspectos do seu contexto histórico, características e princípios, os
precursores desse movimento e suas devidas produções artísticas, além de sua arquitetura em
geral - a exemplo da Standen House- que foi a obra emblemática escolhida para exemplificar
a arquitetura do Arts & Crafts. Além, do paisagismo e da sua decoração no interior, composta
por tapetes, tecidos, papel de parede e móveis próprios do movimento.

OBJETIVOS
Objetivo geral
Produzir um estudo acerca do Arts & Crafts e seu impacto nas produções artísticas e
na arquitetura, analisando desde da sua origem até expressões mais tardias na arquitetura.
Objetivos específicos
● Apresentar as consequências do seu surgimento
● Contextualizar o que foi o movimento para reforma das artes aplicadas
● Analisar as obras que marcaram esse período
● Estudo sobre as técnicas e materiais utilizados
● Obra emblemática

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JUSTIFICATIVA
Este trabalho propõe explorar e analisar o impacto do movimento Arts and Crafts na
arquitetura e compreender como seus princípios estéticos e filosóficos influenciaram o
desenvolvimento da arquitetura no final do século XIX e início do século XX, além de seu
legado duradouro até os dias atuais sob uma perspectiva abrangente e exemplificada, de
forma a possibilitar um aprofundamento pertinente do eixo temático proposto.

METODOLOGIA
Nesse ínterim, a pesquisa reuniu uma ampla revisão bibliográfica, a partir de artigos,
teses, dissertações, livros e sites. Além, da análise das produções da época, desde tapetes e
cortinas florais até móveis com marchetarias na madeira, e dos ensinamentos ministrados na
aula de História da Arquitetura e Urbanismo II. Isso ocorre com intuito de unir a teoria e
gerar um conhecimento amplo desse movimento.

CONTEXTO HISTÓRICO

O movimento surgiu durante a era Vitoriana, na Inglaterra, (1837-1901). Durante esse


período, ocorreu também a PAX Britannica (1815-1914), tal qual a Europa estava em relativa
paz, e o Império Britânico era a potência mundial, uma vez que a marinha britânica
controlava a maioria das rotas marítimas de comércio, além de exercer o controle sob as suas
colônias.Além disso, ocorreu durante o final da Primeira Revolução Industrial que teve início
em 1760 até meados de 1850, e durante a Segunda Revolução Industrial, que ocorreu entre
meados de 1850 até meados de 1945. Nesse ínterim, o Liberalismo econômico era a base da
economia industrial, e devido aos avanços tecnológicos e industriais, havia uma grande
reserva de carvão, assim como muita mão de obra para contratar, uma vez que os burgueses
possuiam muito capital acumulado. Também foi um processo que marcou o início da
urbanização, visto que a Revolução Industrial incentivava o capitalismo, a indústria, e a
produção em massa, tornando-se necessário pessoas para controlar as máquinas, gerando
empregos e a relocação das pessoas para os centros urbanos, caracterizando também o êxodo
rural.

Com isso, houve a desumanização das condições de trabalho, conflitos entre


empresários e empregados reivindicando seus direitos, banalização dos produtos artísticos,
imitações baratas e aplicações indiscriminadas de ornamentos, falta de qualidade dos

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produtos, inquietação dos críticos de arte e arquitetos e artistas. Ademais, havia uma tentativa
de imitar o material utilizado nas obras, como o bronze, ouro e prata, e eles apenas pintavam
para simular o metal precioso, quando na verdade era falso, esse tipo de falsificação foi muito
apontado durante a grande exposição em 1851, levando a criação do Arts and Crafts.
Portanto, os intelectuais eram contra o exagero decorativo, que além de ser mal executado era
desnecessário. Visto que, a função apresentava-se em segundo plano, e a decoração se
sobressaia sem necessidade. Ademais, o conhecimento do uso dos materiais, suas
propriedades e as técnicas aplicadas na construção, passaram a ser valorizados, garantindo a
qualidade do produto.

O movimento surgiu a partir da primeira exposição universal ,em 1851, em Londres,


no Palácio de Cristal, no Hyde Park, Joseph Paxton, a figura 1 retrata o local da exposição. A
exposição foi organizada por Henry Cole, com apoio do Príncipe Albert, que era o marido da
rainha Vitória, em parceria com a ROYAL SOCIETY OF ARTS. Foi durante a exposição que
se percebeu a má qualidade dos produtos, alguns exemplos deles estão apresentados nas
figuras 2-6. Sendo assim, o Arts and Crafts, buscava retomar a produção artesanal,
apresentando maior qualidade e originalidade aos produtos. Esse movimento possui uma
natureza social, estética e revolucionária. Foi a reação às consequências da revolução
industrial e da produção em massa. A partir disso, é perceptível que as artes aplicadas são
artes que tem uma função, como por exemplo cadeiras, luminárias, entre outras, e não apenas
a decoração, e sim a junção da funcionalidade e com o belo.

Figura 1: Imagem do Palácio de Cristal, por Joseph Paxton, Londres, 1851.

Fonte: https://www.e-cultura.pt/efemeride/875

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Figura 2:Estante exposta na exposição universal de 1851. Figura 3:Candelabro em bronze, exposição de 1851.

Fonte: KOSMINSKY, D. “Bom gosto”, contradição e a comunicação do simbólico na construção visual do


Palácio de Cristal. In: Cultura Visual, n. 15, maio/2011, Salvador: EDUFBA, p 71-82.

Figura 4: Espelho em prata exposto na exposição universal de 1851.

Fonte: KOSMINSKY, D. “Bom gosto”, contradição e a comunicação do simbólico na construção visual do


Palácio de Cristal. In: Cultura Visual, n. 15, maio/2011, Salvador: EDUFBA, p 71-82.

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Figura 5 e 6 : móveis expostos na exposição universal de 1851.

Fonte: BENÉVOLO, Leonardo. História da Arquitetura Moderna, página 185.

CARACTERÍSTICAS E PRINCÍPIOS

Nesse contexto, após a Revolução Industrial houve uma grande desvalorização do


trabalho artesão, visto que o uso do maquinário e a produção em massa era bastante
recorrente nessa época. Dessa forma, o objetivo do movimento Arts e Crafts era de
restabelecer esse valor, a harmonia do trabalho do artesão, arquiteto e designer, e de realizar
objetos de artes de uso cotidiano para todos. Sendo assim, havia alguns princípios que
norteavam o Arts e Crafts como:
- Valorização do trabalho artesanal
- Originalidade dos produtos
- Utilização adequada dos ornamentos
- Conhecimento e técnica dos materiais
- Design de interiores
- Arquitetura na sua simplicidade, originalidade e natureza

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Em primeiro plano, o pensamento da época buscava restaurar justamente o valor do
trabalho manual, uma vez que a crescente industrialização estava levando a perda da
individualidade das peças produzidas e de certa forma interferiam na qualidade dos
resultados, assim o artesanato era visto como uma forma de expressão e
autodesenvolvimento, e que a conexão direta com o processo de criação conferia significado
e valor tanto para o criador quanto para o consumidor da peça. Em seguida, a originalidade
dos produtos era fundamental, visto que os praticantes acreditavam que cada peça deveria
refletir a individualidade e a criatividade do artista envolvido e exprimiam que a produção em
massa levava a padronização e a perda da personalidade dos produtos. Desse modo, a busca
pela originalidade ia além da simples estética, cada item era visto como obra de arte, criada
com atenção aos detalhes, nesse viés, a originalidade estava ligado também com a ideia que o
artesão deveria ser reconhecido pelo seu trabalho e talentos distintos.

Em seguida, a utilização adequada dos ornamentos foi um aspecto importante do


movimento, visto que eles não valorizavam apenas como elementos decorativos, mas como
parte integrante do design geral das peças -se integrando de forma harmoniosa- eram
pensados em realçar a forma e função dos objetos, em vez de distrair visualmente. Além
disso, muitos ornamentos estavam ligados a elementos da natureza, a exemplo de plantas,
flores, animais e padrões orgânicos, o que reforçava a conexão com a natureza e a
autenticidade. Outro ponto importante, é que os ornamentos não eram apenas decorativos,
mas havia a funcionalidade por trás, eles podiam ser incorporados a peças funcionais como
móveis, luminárias e utensílios domésticos, agregando a beleza e a funcionalidade. Assim, os
ornamentos eram aplicados de maneira simples, elegante e equilibrada, além dos materiais
aplicados serem frequentemente naturais como pedra, vidro e cerâmica, o qual contribui para
a sensação artesanal. Ademais, o foco estava na qualidade de execução e atenção aos
detalhes, fatores esses que foram perdidos durante a Revolução Industrial, o que contribuiu
para a valorização manual e a oposição da produção em massa.

Outrossim, o conhecimento das técnicas e materiais utilizados era visto como um


resgate da tradição do artesanato e elevar a qualidade das criações, dessa maneira os
praticantes acreditavam que os artesãos deveriam ser mestres de atuação na sua devida área,
ou seja, não apenas possuir habilidades técnicas, mas ter o conhecimento e a propriedade dos
materiais que estavam utilizando, além de dominar as técnicas tradicionais, refinando as
técnicas antigas a fim de criar peças contemporâneas com um toque de autenticidade

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histórica. Assim, eles eram encorajados a inovar e experimentar, combinando técnicas e
materiais de forma única e original, as quais capturavam sua visão artística. Nesse âmbito, a
funcionalidade era um aspecto essencial dentro design, as peças deveriam ser bonitas, mas
acima de tudo funcionais e atender as necessidades das pessoas de forma prática, esse
princípio contribuiu para a criação de móveis, objetos de decoração e utensílios que eram
tanto belos como úteis. Tal característica também impactou na maneira de como os espaços
eram concebidos e decorados, as ideias do movimento foram aplicadas com a finalidade de
criar ambientes que refletissem esses valores de artesanato, autenticidade e natureza. Logo, os
materiais naturais refletiam em alta qualidade e eram utilizados em pisos, revestimento de
paredes e mobiliários, os espaços eram concebidos para maximizar a funcionalidade e o fluxo
natural, procurando também trazer a natureza para dentro dos ambientes e favorecer a
iluminação solar.

Ademais, a concepção arquitetônica também fez parte do movimento com as


habilidades dos artesãos na arquitetura, o qual resultou em detalhes esculpidos a mão,
entalhes e outros elementos ornamentais incorporados nas edificações. Além, de buscar se
integrar com a natureza, alcançado através do uso de materiais naturais, incorporação de
elementos naturais nas fachadas e nas concepções dos espaços. A valorização da escala
humana também esteve presente dentro do movimento, assim os projetos arquitetônicos,
muitas vezes se adequavam aos tamanhos e proporções humanas, em contraste com os
edifícios massivos e impessoais da arquitetura industrial. Em resumo, o movimento Arts and
Crafts teve um impacto significativo na arquitetura, promovendo uma abordagem mais
artesanal, funcional, esteticamente agradável e integrada com a natureza. Esses princípios
influenciaram o desenvolvimento da arquitetura moderna e ainda podem ser vistos em muitos
projetos arquitetônicos contemporâneos.

PRODUÇÕES
O movimento Arts & Crafts representou uma resposta criativa e filosófica às
transformações industriais da época. Emergindo como uma reação contra a produção em
grande escala e a perda da qualidade artesanal, valorizando assim a conexão entre artistas e
artesãos, e a criação de objetos que unissem a funcionalidade e estética. Nesse contexto, o
movimento abrange uma ampla gama de disciplinas, desde arquitetura e mobiliários até
cerâmicas e tecidos, gerando uma série de produções diversas, refletindo os princípios de
artesanato e design intrínsecos da época. A figura 7 retrata um exemplo de arquitetura,

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conhecida como Red House, projetada por Philip Webb, o projeto arquitetônico foca na
integração harmoniosa entre o design, artesanato e natureza.
Figura 7- Red House, Londres, Inglaterra, por Philip Webb

Fonte-https://www.archdaily.com/873077/ad-classics-red-house-arts-crafts-william-morris-philip-webb

Figura 8- Planta Baixa Red House Figura 9- Interior da Red House

Fonte: http://groupblue3.blogspot.com/2012/12/plans-and-elevations-analysis.html

Assim, o projeto arquitetônico da figura 7 e 9 retrata a beleza e simplicidade até no


uso dos materiais naturais, com a coberta em pedra e a fachada em tijolos vermelhos, além
das estruturas de madeiras visíveis como mostra figura 9, sendo muito comum no âmbito da
arquitetura encontrar casas de campo e bangalôs. Enquanto, a figura 8 retrata a planta baixa
apresentada de uma forma mais livre, com disposição em “L” e não sendo simétrica.

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A busca por móveis artesanais e bem trabalhados, eram típicos do movimento - a
figura 10 - mostra uma cadeira idealizada por Gustav Stickley, designer americano influente
nesse aspecto, o qual projetou móveis de linha reta, madeira maciça e funcionalidade.
Figura 10- Cadeira Morris, por Gustav Stickley

Fonte- https://eseck1.blogspot.com/2021/01/pww-gustav-stickley-morris-chair.html

No livro Craftsman Homes, de Gustav Stickley ,em 1909, ele fala “Uma cadeira
grande e funda que significa conforto para um homem cansado quando ele chega em casa
após o dia de trabalho”. Desse modo, a cadeira nos convida a sentar e relaxar com seus
braços inclinados e o seu assento e encosto com estufados.
Outro exemplar, de mobiliário, pode ser visto na figura 11, a qual representa uma
mesa sólida e funcional, que valoriza os materiais naturais, tendo em vista que foi feita de
madeira maciça -como o carvalho- gerando durabilidade e beleza natural.
Figura 11- Mobiliário produzido por Morris e Webb, 1861-1862

Fonte:https://www.meisterdrucke.pt/impressoes-artisticas-sofisticadas/Philip-Webb/362102/Arm%C3%A1rio-St
.-George,-1861-(carvalho-com-pain%C3%A9is-pintados).html

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Assim, a mesa se apresenta de forma simples e elegante, com uma rica atenção aos
detalhes, porém sem excessos de ornamentos, tornando-se prática para o uso cotidiano,
havendo portanto um equilíbrio entre estética e funcionalidade, característica típica do
movimento. Além disso, foi utilizada uma técnica artesanal conhecida como marchetaria,
envolvendo a criação de padrões decorativos, combinando diferentes pedaços de madeira, a
fim de formar um desenho completo, sendo uma forma de arte que requer habilidade de corte,
montagem e acabamento, além de atenção aos detalhes.

Outras produções tipicamente conhecidas eram as cerâmicas, sobretudo, do artista


William De Morgan, com suas cerâmicas ricamente decoradas, muitas vezes possuíam
motivos de animais e figuras mitológicas. Logo, a figura 12 representa um prato de cerâmica
com foco no desenho de um pavão, o qual é representado de forma majestosa e detalhada.

Figura 12- Prato de Pavão, 1888-98, por William De Morgan

Fonte- https://aegis-education.com/william-de-morgan/

Dessa forma, suas peças decorativas e utilitárias refletiam a ênfase do trabalho manual
e a criatividade individual, sendo considerado um anti-industrial, que defendia o artesanato
fino. A técnica utilizada por Morgan resulta em uma superfície brilhante e suave, que
adiciona uma sensação de profundidade e luminosidade à peça. A atenção aos detalhes é vista
como o artista evidenciou as penas do pavão, os padrões intrincados nas plumagens,
demonstrando o nível de habilidades e dedicação na peça.
Nessa perspectiva, os azulejos eram peças comuns entre as produções, desempenhando
um papel fundamental na decoração interior, eram muitas vezes feitos a mão, o que permitia a

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criação de painéis ornamentais nas paredes, lareiras ou até mesmo pisos. Logo, a figura 13
apresenta uma série de azulejos de William Morgan.
Figura 13- Azulejos de William Morgan

Fonte: ADAMS, 1987, pág.59

Nesse sentido, percebe-se os desenhos inspirados na natureza, como folhas, flores,


pássaros e padrões geométricos, todos trabalhados com detalhes meticulosos e cores ricas.
Assim, eles eram produzidos com cuidado e dedicação, dando um caráter único e distintivo
para as peças, além de contarem histórias e expressar a filosofia do movimento.
Além disso, a produção de tecidos e papéis de paredes eram bastantes recorrentes no
período, representados com motivos naturais, repetidos de maneira harmoniosa. A figura 14
retrata um papel de parede com padrões de pássaros vermelhos e azuis, que parecem estar
roubando morangos das videiras, apresentando uma abordagem orgânica e com atenção aos
detalhes. A palete de cores é rica em tons azuis, vermelhos e verdes, refletindo a preferência
de Morris em cores naturais e suaves.
Figura 14- Strawberry Thief, William Morris

Fonte- https://www.artsy.net/artwork/william-morris-1834-1896-the-strawberry-thief-flower-and-bird-pattern

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Logo, percebe-se que a maneira como os elementos se entrelaçam e a complexidade
das formas, demonstram a habilidade artesanal e a atenção aos detalhes de produção. Além da
estética, o "Strawberry Thief" representa a filosofia de Morris em relação ao papel de parede.
Ele acreditava que os espaços internos deveriam ser preenchidos com designs que evocassem
a beleza da natureza e proporcionassem uma sensação de conexão com o ambiente exterior.
Nessa perspectiva, os vitrais também eram uma forma de expressão artística muito
valorizada, buscando combinar elementos da natureza, padrões geométricos e uma paleta de
cores ricas para expressar harmonia e espiritualidade. A figura 15 representa um vitral que
retrata a cena de um casamento religioso, no qual observa-se a presença de dois personagens
principais com trajes cerimoniais, cercado por outros membros da corte. Logo, a obra
apresenta uma estética pré-rafaelita, conhecida com sua atenção aos detalhes e a utilização de
cores vibrantes.
Figura 15- E. Burne-Jones, O Casamento de Sir Tristram, 1862

Fonte- https://www.meisterdrucke.pt/

Além disso, a obra retrata uma cena da lenda arturiana de Sir Tristram e Isolda, uma
história de amor e tragédia que faz parte do ciclo arturiano. Sir Tristram, também conhecido
como Tristão, é um cavaleiro lendário e Isolda (ou Iseult) é uma princesa da Irlanda. Eles se
apaixonam, mas o destino trágico os impede de ficarem juntos devido a circunstâncias
complexas. Assim, os vitrais não possuiam apenas a função de decorar os ambientes, mas de
transmitir um significado, espiritualidade e conexão com a natureza, eles refletiam a filosofia
do movimento de celebrar a estética e a artesania manual.

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Além do mais, as tipografias e as produções de livros também eram uma área de
importância, visto que o movimento abraçava a ideia de que o design e a estética deveriam
estar presentes no cotidiano, incluindo a impressão de textos. Dessa maneira, os artistas
valorizavam a criação de fontes tipográficas únicas e expressivas, eles se inspiraram na
caligrafia medieval e elementos naturais. Assim, essas fontes eram utilizadas em livros,
folhetos e outras impressões da época. A figura 16 mostra a fonte tipográfica Kelmscott
Chaucer, criada por William Morris para a sua editora Kelmscott Press.

Figura 16- Kelmscott Chaucer, criada por William Morris

Fonte- https://exhibitions.lib.umd.edu/williammorris/kelmscott-press/the-kelmscott-chaucer

Nesse âmbito, a fonte tipográfica foi criada para uma edição especial de "The Works
of Geoffrey Chaucer", um livro magnificamente decorado que incorporava ilustrações
intrincadas e design tipográfico cuidadoso.
Dando continuidade, as lareiras eram elementos chaves na arquitetura de interiores,
sendo esteticamente agradáveis e aconchegantes. Logo, elas eram projetadas integradas com
o design geral dos ambientes, refletindo os princípios do movimento, com o uso de materiais
naturais e a ênfase na estética funcional. A figura 17 exemplifica uma lareira construída com
ênfase na qualidade artesanal .

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Figura 17- Lareira da Red House, 1860

Fonte- https://smarthistory.org/william-morris-and-philip-webb-red-house/

Dessa forma, o arquiteto projetou a lareira sem excessos ornamentais, com um jogo de
composição dos tijolos, além disso, o mobiliário do ambiente também é essencial para tornar
o lugar aconchegante e agradável para apreciar o calor.

Por fim, os tapetes e as cortinas eram elementos essenciais para a criação de espaços
confortáveis e acolhedores. Assim, os tapetes eram criados dentro do movimento Arts &
Crafts com padrões elaborados, geométricos ou florais, muitos designers eram influenciados
pela natureza, com elementos orgânicos, figuras que remetesse folhas e flores, e evocavam a
harmonia da natureza, com cores mais terrosas. Em seguida, as cortinas também auxiliavam
na integração dos ambientes, elas eram frequentemente feitas de tecido naturais como o
algodão, o linho e a seda. E os padrões das cortinas escoavam os temas de movimento como
elementos naturais, padrões geométricos e influência medievais. Desse modo, a figura 18
retrata um exemplo dessas produções.

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Figura 18-A tapeçaria do pica-pau “Woodpecker”, William Morris

Fonte:https://www.meisterdrucke.pt/impressoes-artisticas-sofisticadas/

Assim, a simplicidade elegante é uma característica em comum, juntamente com os


elementos naturais no tapete com árvores, pássaros e folha. Os elementos trabalham juntos
para evocar uma sensação de beleza natural e artesanal. Em síntese, as produções do
movimento Arts & Crafts valorizavam as ideias do trabalho manual, a natureza, a
individualidade, a beleza estética e a funcionalidade. O movimento deixou um legado
duradouro que influencia o design e o artesanato até os dias de hoje.

PRECURSORES

Nesse âmbito, o movimento Arts & Crafts ganhou força no final do século XIX e
representou uma resposta à crescente industrialização e à despersonalização das produções.
No cerne desta abordagem, estava a crença na importância das habilidades artesanais, design
bem elaborado e a conexão profunda com a natureza. No entanto, antes mesmo do
movimento ganhar sua forma característica houve um grupo de indivíduos visionários e
pioneiros cujas ideias e contribuições semearam as bases para a revolução criativa que viria a
definir o Arts and Crafts. Esses precursores, dotados de uma visão destemida e resistente,
desafiaram as normas predominantes da época, que favoreciam a produção em massa e a
uniformidade. Eles reconheceram que a riqueza do design e a singularidade do trabalho

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manual estavam sendo gradualmente diluídas pela maquinaria industrial. Suas ideias
inovadoras e paixão pela criação artística autêntica e significativa forneceram as bases para
uma revolução estética que continua a ressoar até os dias de hoje, lembrando-nos da
importância do artesanato, da conexão com a natureza e da busca incansável pela beleza em
nossa vida cotidiana. Dessa forma, foram de extrema importância para o percorrer do
movimento nomes como:
● William Morris
● Augustus Pugin
● Henry Cole
● Owen Jones
● John Ruskin
● William de Morgan
● Philip Webb
● Irmandade Pré-Rafaelita
● Edward Burne-Jones

● William Morris (1834 -1896)

Nesse viés, William Morris foi considerado o maior expoente do movimento Arts &
Crafts, ele foi artista, escritor, poeta, artesão, topógrafo e desenhista. William Morris estudou
na Faculdade de Exeter, em Oxford, onde interessou-se pela arquitetura, belas artes e pela
arte industrial. E foi em Oxford que conheceu as obras de John Ruskin, um crítico de arte que
foi conselheiro e defensor da Irmandade dos Pré-Rafaelitas. Ele recriou as indústrias manuais,
caracterizada pela participação do homem na produção, com o monitoramento da qualidade e,
por consequência, em menor escala. Além disso, o escritor era extremamente preocupado
com os problemas da industrialização e do sistema fabril, acreditava que a insipidez da
produção de massa e a falta de trabalho digno poderiam ser sanadas pela junção da arte com o
ofício, e que poderiam combinar-se para criar objetos belos do dia a dia, e assim o ambiente
feito pelo homem poderia ser revitalizado.

Nessa perspectiva, derivando de Ruskin a ideia de que a qualidade do objeto fabricado


deveria refletir tanto a unidade de projeto e execução quanto o bem-estar do trabalhador.
Assim, o designer e escritor dá início a uma série de empreendimentos comerciais que iriam

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divulgar a importância do design de forma inédita. A partir da abertura da sua primeira firma
Morris, Faulkner, Marshall & Company, em 1861, Morris e seus sócios começaram a
produzir objetos decorativos e utilitários, móveis, tecidos, tapetes, azulejos, e logo, a empresa
conseguiu se destacar no âmbito com sua alta qualidade e bom gosto dos produtos. Além de
contar com vários artistas renomados da época, os quais contribuíram para a elaboração dos
projetos. Dessa forma, a figura 19 retrata a sala de William Morris, projetada com a
colaboração de vários artistas.

Figura 19- Sala de William Morris, Museu Victoria e Albert, Londres, Inglaterra

Fonte: STEVEN, Adams, 1987

Assim, o espaço foi realizado com a ajuda de Burne-Jones nas janelas, a tela de Jane e
William Morris, as paredes por Philip Webb e o trabalho do gesso do piano por Kate
Faulkner.

Em 1875, Morris dissolveu a parceria com seus antigos sócios e montou uma nova
firma, Morris & Co, o qual passou a dedicar a atenção aos aspectos de qualidade dos
materiais e fabricação de produtos. A Morris & Co mantinha uma relação flexível entre
design e produção: alguns tipos de objetos eram fabricados artesanalmente com a supervisão
direta de Morris, outros fabricados com limitada mecanização das oficinas. Com o tempo a
empresa foi ficando conhecida pelo público, projetando o design para uma posição de
destaque no mercado. Assim, a firma trabalhava em uma escala relativamente modesta,
concentrando-se na qualidade e não na quantidade de produtos, apesar do auge da empresa ter

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sido no Arts & Crafts, a firma durou até meados de 1940. A figura 20 e 21, retratam
respectivamente, uma importante área do comércio onde estava localizada a loja Morris &
Co, na rua Oxford Street em Londres. E em seguida, as cadeiras sussex que foram um
sucesso de vendas da empresa Morris & Co.

Figura 20- Loja Morris & Co, Londres Figura 21- Cadeira sussex, William Morris

Fonte: http://hteoriadesign.blogspot.com/2017/04/cadeiras-sussex-consumo.html

Em 1891, Morris resolve aplicar sua filosofia em uma nova área -a impressão de livros-
com resultados fundamentais no campo do designer gráfico. Nesse contexto, foi lançado o
primeiro livro projetado e composto pela Kelmscott Press, fundada por Morris, por um
desejo pessoal, produzia livros de maneira renascentista como nas guildas medievais, com
fontes e prensas próprias. Os livros eram feitos artesanalmente e utilizava os melhores
materiais, além das inovações nas diagramações das páginas e no design das fontes, e suas
experiências inspiraram em uma renovação nos padrões dos design de livros. Logo, os
trabalhos de Morris acabaram por atingir uma enorme repercussão mundial e surgiram
diversas organizações e oficinas dedicadas a projetar e produzir artefatos de vários tipos e em
escalas artesanais ou semi-industriais, a exemplo - Arts & Crafts Exhibition Society- fundada
em 1888, com Walter Crane e William Morris como seus primeiros presidentes. A figura 22 e
23 retratam conteúdos da Kelmscott.

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Figura 22- Logotipo Kelmscott Figura 23- Primeiro livro da Kelmscott, 1894

Fonte: https://pt.slideshare.net/HelyCostaJr/histria-do-design-grfico-111813413

Assim, percebe-se o caráter medieval das fontes da firma Kelmscott na figura 22, com
desenhos orgânicos de flores e folhas, os quais remetem à natureza. Enquanto, a figura 23
retrata o primeiro livro publicado pela Kelmscott, The story of the Glittering Plain, por
William Morris e Walter Crane.
Por fim, as firmas de Morris são o plano de ação de suas teorias, para ele as questões da
arte de sua época deveriam ser colocadas sobre questões políticas, as quais deveriam
compreender uma ação. Assim, ele nega a produção mecânica e afirma que o operário deveria
se tornar artista.

“ Quero falar daquele lado da arte que deveria ser sentido e executado
pelo simples operário em seu trabalho cotidiano, e que com razão se
chama arte popular. Esta arte não existe mais, destruída pelo
comercialismo. Mas ela viveu e floreceu desde o início da luta entre o
homem e a natureza até o surgimento do sistema capitalista. Enquanto
durou, tudo que o homem fazia era ornamentado pelo homem, assim
como tudo o que o faz a natureza é ornamentada pela natureza.”
( A arte das máquinas, William Morris, 1891)

Nesse ínterim, o autor expressa o seu desejo da arte que deveria ser sentido e realizado
pelo trabalhador comum em suas atividades diárias, expressando como “arte popular”. Essa
arte estava intimamente ligada à vida e à natureza, e cada coisa feita pelo homem era
"ornamentada" por sua própria mão, assim como a natureza ornamenta o mundo natural. O

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autor lamenta que essa forma de arte popular tenha sido destruída pelo comercialismo. Ele
sugere que a influência do sistema capitalista levou ao declínio dessa arte, onde o valor
comercial passou a ser mais importante do que o valor intrínseco da expressão artística. Para
Morris a arte deveria ser “do povo, pelo povo e para o povo”. Contudo, ele não conseguiu
alcançar esse viés, por seus produtos serem feitos manualmente, o que os tornava mais caros
e inacessíveis para o povo, apenas aos ricos.

● Augustus Pugin (1812-1852)

Augustus Pugin foi um arquiteto, escritor, crítico, designer e artista, conhecido por seu
papel fundamental no neogótico e na revitalização da arquitetura neogótica. Além disso, ele
desempenhou uma função essencial na criação de móveis, objetos decorativos e decoração de
interiores. Suas ideias nostálgicas as glórias do passado medieval diante da mediocridade das
criações modernas, tiveram impacto sobre Ruskin, que como ele realizava um elogio aos
padrões artesanais e a organização dos trabalhos das guildas medievais e, sobretudo, no
trabalho de William Morris. Pugin defendia a verdade nas construções, pela interação
harmoniosa dos elementos arquitetônicos com a estrutura, assim ele rejeitava o uso
superficial dos ornamentos e enfatizava a importância dos elementos reais e práticos.

Assim como no movimento Arts & Crafts, ele ressaltava a essência do trabalho artesanal
e a habilidade manual na produção de utensílios, desse modo os artesãos deveriam estar
envolvido em todo o processo de produção, desde do projeto até a execução, sendo
considerado totalmente contra a industrialização, assim ele criticava o desenfreado avanço
industrial e o crescimento urbano sem planejamento. Ele acreditava que a sociedade deveria
retornar a valores tradicionais e espirituais para encontrar equilíbrio e significado. Por fim,
ele via a arquitetura como uma forma de comunicação visual que transmitia significados e
valores, acreditando que cada detalhe arquitetônico deveria ter um significado simbólico e
espiritual, contribuindo para a compreensão e experiência religiosa dos ocupantes. Um ponto
importante é o fato que Augustus Pugin não viveu o movimento, porém suas ideias
comungavam com os princípios do Arts & Crafts. A figura 24 retrata alguns ornamentos de
inspiração gótica feitos por Pugin.

21
Figura 24- Ornamentos de Pugin

Fonte: https://pt.slideshare.net/HelyCostaJr/histria-do-design-grfico-111813413

Em suma, Augustus Pugin não foi um membro direto do movimento Arts and Crafts,
mas suas ideias e princípios tiveram uma influência notável nas ideias e abordagens dos
designers e artesãos associados a esse movimento. Sua ênfase no artesanato, autenticidade e
integração do design o conecta às aspirações do movimento Arts and Crafts.

● Henry Cole (1808-1882)

Henry Cole foi uma figura importante no movimento artístico e cultural durante o
século XIX, conhecido pelo seu papel fundamental na promoção da arte e do design, bem
como sua contribuição para o desenvolvimento dos princípios da Reforma das Artes e
Ofícios. Henry foi um funcionário público, empresário, organizador de exposições e defensor
das artes. As ideias e princípios desenvolvidos por ele influenciaram a geração posterior de
artistas e artesãos que estavam envolvidos no movimento. Além disso, diferente dos demais
precursores, Cole era apenas parcialmente contra a industrialização, pois acreditava em um
método de controle da qualidade do produto. Assim, ele estava totalmente convicto que o
baixo nível de produção corrente devia-se à separação entre arte e indústria e, portanto,
poderia ser melhorado agindo-se no plano de organização e canalizando a obra dos artistas
para o industrial design. Em 1845, ele foi ganhador do concurso organizado pela Society of
Arts. Logo, a figura 25 retrata os objetos ganhadores do concurso, com formas austeras e
funcionais .

22
Figura 25- Jogo de chá branco

Fonte:https://es.slideshare.net/wewe/arts-crafts-254383347?from_search=7

Entre 1849 e 1852, Cole editou o Journal of Design, onde reproduz e critica modelos
dos mais variados ramos da indústria, sobretudo, ao uso excessivo e inapropriado dos
ornamentos, propondo uma estética útil e funcional dos objetos. Em 1850, consegue
permissão para organizar a primeira Exposição Universal, e para isso, foi projetado o Crystal
Palace, por Joseph Paxton. Com a Exposição de 1851, Cole pode fazer um balanço da
produção industrial nos países europeus, chegando à conclusão de que a arte decorativa da
Europa encontrava-se em completa decadência quando comparada à produção oriental ou
americana de arte e objetos de uso.

“É evidente, na Exposição, a ausência de qualquer princípio


comum do desenho ornamental; parece que as artes aplicadas
de toda a Europa estão profundamente desmoralizadas”.
Henry Cole, 1851

Dessa forma, a Grande Exposição de 1851, em Londres, foi um evento que apresentou
uma ampla gama de produtos industriais e artesanais de diferentes países. Entretanto, para
Cole essas diferentes abordagens de estilo e design criava a sensação de um caos estético,
sem coesão e harmonia, levando a confusão visual. Assim, esse impasse refletia diretamente
na perda do valor artístico e estético nas artes aplicadas. Logo, ele acreditava que a falta de
direção e/ou orientação em termos de estilo e princípios estava causando a desmoralização da
qualidade e integridade do design, portanto, a indústria monitorada e o desenho industrial
seriam uma solução para tal problema.

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● Owen Jones (1809-1874)

Owen Jones foi arquiteto, designer e teórico britânico que desempenhou um papel
fundamental dentro do movimento do Arts & Crafts com suas ideias e contribuições, as quais
influenciaram o desenvolvimento e os princípios estéticos desse movimento. Jones foi
considerado um intelectual operativo, treinado como arquiteto, suas variadas experiências
incluíam não só projetos arquitetônicos, mas também design gráfico, editora, litografia,
decoração de interiores e organização museográfica. Entre 1842 e 1845, publica os desenhos
geométricos e os detalhes de Alhambra de Granada, copiados do local por ele mesmo e por
outros estudiosos, depois de um volume sobre mosaicos de pavimentação, um sobre os livros
miniaturas da Idade Média e um sobre ornamentos policrômicos italianos.

Em 1851, participa da Exposição Universal, pintando em cores as estruturas metálicas


do Palácio de Cristal e, no ano seguinte, publica um ensaio teórico sobre o emprego das cores
na arte decorativa. Em 1856, surge sua principal obra, The Grammar of Ornament, o qual
reúne exemplos de decoração de todos os tempos e países. Além disso, ele participou de
outros eventos culturais da época, a reconstrução do Crystal Palace em Sydenham a partir de
1852, a Manchester Art Treasures Exhibition de 1857 e a criação do Museum of Ornamental
Art. Nesse contexto, durante toda sua vida tentou aliar tradição e progresso, defendendo o uso
de materiais modernos na arquitetura -a exemplo do ferro e vidro. Desse modo, as figuras 26,
27, 28 e 29 retratam alguns ornamentos de diferentes localidades contidas no livro de Owen
Jones, The Grammar of Ornament.

Figura 26- Friso grego do Partenon

Fonte: Owen The Grammar of Ornament, Londres 1856

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Figura 27-Ornamento egipcio Figura 28- Ornamento da Alhambra Figura 29- Ornamento do Renascimento

Fonte: Owen The Grammar of Ornament, Londres 1856

Logo, Jones afirmava que os ornamentos deveriam ser baseados em princípios


matemáticos e geométricos, e que os designers deveriam buscar inspiração na natureza e em
padrões culturais autênticos, em vez de simplesmente imitar estilos passados.

● John Ruskin (1819-1900)


John Ruskin era um desenhista, aquarelista, filantropo e sociólogo inglês, além de ser
um defensor da arquitetura neogótica. Suas críticas, teorias e ideias foram essenciais para o
movimento das artes aplicadas, influenciando Morris.

Figura 30: Livro escrito por Ruskin, “ Seven Lamps of Architecture”

Fonte:https://www.archdaily.com/774517/the-long-ish-read-john-ruskin-considers-the-seven-lamps-of-architectu
re

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Ruskin escreveu o livro, representado na figura 30, “Seven Lamps of Architecture”,
(1849), que representa os sete pontos que uma boa arquitetura deve seguir, como uma crítica
aos produtos que estavam sendo produzidos na época. Além disso, defendia que o ferro não
deveria ser utilizado como elemento estrutural, e sim como um elemento de ligação, também
considerava o ferro como material de segunda ordem, quando comparado com a argila e a
pedra, que deram a vida à arquitetura.

● William de Morgan (1839-1917)

Morgan foi um dos designers mais criativos do Arts and Crafts, e é reconhecido pelos
seus milhares trabalhos em cerâmica, azulejos, pratos e vasos. Porém, seus primeiros
trabalhos reconhecidos, foram vitrais, e eles que desencadearam a mudança para sua
fabricação de azulejos. A figura 31, representa vários desenhos feitos por William de Morgan,
que seriam base para produção de seus azulejos decorativos.

Figura 31: desenhos de Morgan para sua produção de azulejo, 1872-1882.

Fonte: https://www.vam.ac.uk/articles/william-de-morgan-an-introduction

26
Sendo assim, podemos observar por meio da figura 31, que os desenhos de Morgan
transmitiam a originalidade, o naturalismo e a produção artesanal, princípios do movimento
da reforma das artes aplicadas.

● Philip Webb (1821-1893)

Arquiteto e designer britânico, que ficou conhecido por suas casas de campo. Logo,
virou grande amigo de Morris, juntando-se a ele na Morris&Co. Sua primeira encomenda foi
a Red House, projetada para William Morris. Philip Webb era defensor do uso de materiais
contrastantes e, também utilizava materiais locais, respeitando as necessidades do cliente,
criando projetos originais e funcionais. Webb também projetou móveis domésticos e
acessórios decorativos. Um de seus projetos é a Clouds House, apresentada na figura 32, em
Wiltshire, que foi finalizada em 1886, mas danificada pelo incêndio em 1889. Atualmente, a
casa é um centro de tratamento de dependência química da Inglaterra.

Figura 32: Cloud House, por Philip Webb

Fonte: Google Imagens


https://www.google.com/search?sca_esv=560335776&sxsrf=AB5stBhELPSyak1v6AwwJdB-VpgwiXGmhA:16
93059523244&q=clouds+wiltshire+por+philip+webb&tbm

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● Irmandade Pré-Rafaelita

A irmandade Pré-Rafaelita, era um grupo de pintores e artistas ingleses, constituído


em 1848, que visava recuperar a pureza e claridade das pinturas medievais, anteriores ao
pintor renascentista Rafael. Ademais, em suas obras, geralmente são representados temas
bíblicos e também personagens da literatura, poesia e mitologia, além do uso de cores fortes.
Os principais artistas desse movimento foram: Dante Gabriel Rossetti (1828-1882), John
Everett Millais (1829-1896), William Holman Hunt (1827-1910). Outrossim , rejeitavam a
sofisticação acadêmica e opiniões artísticas convencionais, e eram a favor do naturalismo e
simplicidade. O trabalho dos pré-rafaelitas receberam críticas devido a suas representações
arcaicas e planas, com ausência do sombreamento, além do uso de cores fortes.

Uma das inúmeras obras desse movimento, é a Ophelia, produzida por John Everett
Millais em 1851, que é um personagem da literatura, faz parte da famosa obra “Hamlet” de
William Shakespeare, a obra apresentada na figura 33 predomina-se o uso de cores fortes,
assim como o naturalismo, características do movimento, atualmente ela está localizada na
Galeria Tate, na Inglaterra. Outra obra do movimento, produzida por Dante Gabriel Rossetti,
Lady Lilith, 1867, a pintura faz referência a um mito, representada na figura 34, pode-se
perceber o uso de cores quentes e vibrantes, áreas iluminadas, e também escuras, atualmente
faz parte do acervo do Museu Metropolitano de NY. A partir disso, à medida em que as obras
seguiam um viés decorativo, os pré-rafaelitas se uniram ao movimento da reforma das artes
aplicadas, em meados do de 1880.

Figura 33: Ophelia, por John Everett Millais, 1851.

Fonte: https://amodistadodesterro.com/irmandade-pre-rafaelita/

28
Figura 34: Lady Lilith, por Dante Gabriel Rossetti, 1867.

Fonte: https://amodistadodesterro.com/irmandade-pre-rafaelita/

● Edward Burne-Jones (1833-1898)

Edward Burne-Jones foi um artista britânico, e trabalhou em colaboração com William


Morris, uma vez que era um dos sócios da Morris, Marshall, Faulkner & Co. Burne-Jones é
considerado por muitos, como o último da irmandade pré-rafaelita, e possui obras impecáveis
como a representada na figura 35, “Escadas douradas”, 1880, que aborda a simplicidade,
pureza e clareza, princípios das pinturas medievais, atualmente faz parte do acervo da
Galeria Tate. Além disso, Edward Burne- Jones, atuava na produção dos tradicionais vitrais
na Inglaterra, que abordavam um viés religioso, como o “O bom Pastor”,produzido em 1861,
que está representado na figura 36.

29
Figura 35:Escadas douradas, 1880, por E.Burne-Jones. Figura 36: O bom Pastor, 1861, por E. Burne-Jones.

Fonte: https://www.tate.org.uk/art/artists/sir-edward-coley-burne-jones-bt-68/seven-sides-edward-burne-jones

ARQUITETURA

No âmbito arquitetônico, o movimento arts and crafts buscará traduzir suas


características em traços marcantes dentro da construção, dando ênfase sempre a busca por
uma relação com a natureza, uma ornamentação limpa de adereços excessivos, bem como
uma evolução e inovação na forma de construir
Analisando estes conceitos, nota-se, inicialmente, nas casas construídas uma fusão
com os jardins e áreas externas, de forma a unir-se cada vez mais com a natureza - exaltada
pelo movimento (figura 37). A proposta arquitetônica seria, portanto, utilizar o jardim não
somente como um integrante secundário adjacente à construção principal, mas com o
protagonista nos grandes terrenos, sendo o entorno parte fundamental na arquitetura como um
todo. (figura 38)

30
Figura 37 - Shaw´s Corner, na Inglaterra

Fonte: (nationaltrust.org.uk)

Figura 38: foto ampla do jardim da Shaw´s Corner

:
Fonte: Shaw’s Corner Garden 2-for-1 entry - BBC Gardeners World Magazine

É importante destacar, ainda no âmbito de uma relação com o natural, a notória


preocupação com os materiais utilizados para construir. Dessa forma, nota-se a utilização de
materiais na sua forma orgânica e aparente possível, priorizando a busca por materiais
naturais que se comunicassem com seu entorno. (Figura 39)

31
Figura 39 - Stoneywell House, Ernest Gimson

Fonte: Stoneywell - OLIVER ARCHITECTURE (oliver-architecture.co.uk)

Ademais a este conceito natural, desenvolve-se na arquitetura um elemento


construtivo que propõe essa comunhão casa-jardim: a Bay Window (figura 40). Este
elemento busca, assim, estender os limites da casa de forma a ser envolvida pela paisagem, a
trazendo ao máximo para o ambiente interior com uma janela em projeção - seja em quartos,
salas ou ambientes diversos da casa. Em outro âmbito de janelas, havia também a proposta de
janelas sempre maiores para gerar uma integração mais plena com a natureza.

Figura 40 - Blackwell House, Inglaterra, por Mackay Hugh Baillie Scott

Fonte: Blackwell - The Arts & Crafts House | Bowness-on-Windermere (visitcumbria.com)

32
Na análise de planta, remetendo ao seu conceito da busca por evolução e inovação, as
plantas possuem uma configuração mais livre, não havendo uma preocupação em gerar
plantas axiais e padronizadas (Figura 41 e 42)

Figura 41 - plantas baixas da Spade House, Inglaterra, por Charles Francis Annesley Voysey

Fonte: IrfanView HTML-Thumbnails (gotik-romanik.de)

Figura 42 - White House, Inglaterra, por Ernest Gimson

Fonte: File:Ernest Gimson White House 2.jpg - Wikimedia Commons

33
O movimento Arts and Crafts buscou traduzir de tal forma uma harmonia que se
estendia para o seu interior, inserindo nos seus móveis, vidraçarias e decorações as
características próprias do movimento, e voltando sua preocupação a um design de interiores
até então não elaborado nos projetos. (Figura 43 e 44)
Figura 43 - interior da Blackwell House , por Baillie Scott

Fonte: https://lakelandarts.org.uk/blackwell/the-experience/

Figura 44 - interior da Shaw´s Corner , por G. Shaw

Fonte: (nationaltrust.org.uk)

ARTS E CRAFTS NA INGLATERRA


Sendo o grande berço do movimento arts and crafts, a Inglaterra protagonizou
importantes obras e produções da época, os quais expressará de forma muito nítida e pura
todas as características do movimento - emergido no contexto de crescente industrialização

34
britânica e buscando reviver a beleza da artesania, da simplicidade e singularidade estética e a
integração com a natureza. Esta expressão, que se desenvolve também nas artes e utensílios,
encontra forte representação na arquitetura, em que todas as suas minuciosas características
podem encontrar uma totalidade harmoniosa, unificando todas as produções, desde os objetos
que compõem a casa até a construção em si.

● Broadleys House, por Charles Voysey


A Broad Leys foi construída em 1899, idealizada pelo industrial Arthur Currer
e sua esposa. Localizada em Windermere - Cumbria, esta é considerada uma produção
emblemática de Voysey, com extensos jardins frontais em terraços e três grandes
janelas curvas distintas, que se estendem do chão até o primeiro andar,
proporcionando vistas magníficas sobre o lago.
Charles Voysey caracteriza-se por uma arquitetura em linhas retas, curvas
suaves e espaços abertos, adotando uma abordagem minimalista e se afastando do
visual ornamentado e intrincado tão fortemente utilizado nos tempos vitorianos.

Figura 45 - Fachada voltada para o lago da Broad Leys

Fonte: ART and ARCHITECTURE, mainly: Charles Voysey's showpiece - Broad Leys
country house-hotel Cumbria (melbourneblogger.blogspot.com)

35
Figura 46 - detalhes das aberturas

Fonte: Broad Leys. 1898-1900 by C. F. A. Voysey | Heinz Theuerkauf | Flickr

Figura 47 - Fachada lateral da Broadleys

Fonte: Broad Leys. 1898-1900 by C. F. A. Voysey | Heinz Theuerkauf | Flickr

Sua marcante fachada expressa - nas suas grandes abertas e a presença de


notórias bay windows - um desejo de criar uma ligação direta com seu exterior,
conectando toda a casa com o deslumbrante lago à sua frente, bem como com todo
seu entorno verde.
Figura 48 - Vista panorâmica e ampla da construção com o jardim

Fonte: Casa & História : Broad Leys : CFA Voysey Country House (wmbrc.co.uk)

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Ainda em completa imersão da proposta arts and crafts, a Broadleys unifica-se
com seu entorno verde e extensos jardins que fazem parte - sendo estes também
protagonistas - do projeto.
Figura 49 - imagem de ambiente interno da casa

Fonte: Casa & História : Broad Leys : CFA Voysey Country House (wmbrc.co.uk)
A utilização de materiais expostos, a abertura proposta com a expansão da bay
window, as linhas sóbrias e uma ornamentação harmonicamente minimalista
expressão os traços de Voysey com a influência do movimento arts and crafts

Figura 50 - planta baixa da Broadleys

Fonte: Casa & História : Broad Leys : CFA Voysey Country House (wmbrc.co.uk

37
Não seguindo uma simetria prescrita, a construção apresenta uma planta com
L, com uma fachada curvilínea - marcada por grandes salões e uma fachada reta,
localizando os cômodos privados.

Figura 51 - detalhes da Broadleys House

Fonte:Broad Leys, Lake Windermere. 1898-1900 by C. F. A. Voysey | Flickr

● The Pastures, por Charles Voysey


A The Pastures, ou Casa das Pastagens, foi construída em 1901, por
um projeto de Charles F. A. Voysey, em North Luffenham, Leicestershire,
Inglaterra. Sua construção relativamente simples, mas com detalhes
remetentes ao arts and crafts, foi projetada para senhorita G. Conant., com a
prevalência da pedra, integrando-se ao seu entorno

Figura 52 - Visão ampla das fachadas da The Pastures

Fonte: IrfanView HTML-Miniaturas (gotik-romanik.de)

38
Figura 52 - Visão ampla das fachadas da The Pastures

Fonte: IrfanView HTML-Miniaturas (gotik-romanik.de)

Figura 53 - Visão ampla da fachada principal

Fonte: IrfanView HTML-Miniaturas (gotik-romanik.de)

Na análise de sua fachada, nota-se que as paredes são ásperas, as janelas têm curativos
de pedra - como a prevalência em toda construção - e os telhados são de ardósia,
configurando assim uma busca pela utilização de materiais naturais e integrantes ao seu
jardim extenso (figuras 51,52 e 53)

Figura 54 - Visão ampla das fachadas da The Pastures

Fonte: IrfanView HTML-Miniaturas (gotik-romanik.de)

39
Em referência ao movimento arts and crafts, utilizando o conceito de expansão do
interior para o exterior, a casa apresenta diversas bay windows em todas as suas fachadas
(figura 54)

Figura 55 - imagem de plantas baixas da The Pastures

Fonte: IrfanView HTML-Miniaturas (gotik-romanik.de)


Sua configuração em U propõe um layout particular e assimétrico para a construção
(fig. 55)

Figura 56 - imagens do seu interior

Fonte: IrfanView HTML-Miniaturas (gotik-romanik.de)


Como notório em outras construções, seu design de interior apresenta uma
simplicidade na ornamentação, a prevalência por aberturas e por materiais comuns. (fig. 56)

40
● Inglewood House, por Ernest Gimson
A Inglewood House, situada em Leicester, na Inglaterra, foi construída no ano de
1892 pelo percussor Ernest Gimson. A artista e escritora, Freda Derrick, descreve sua
percepção acerca da casa:
"Em 1892, quando a aglomeração e a agitação do período vitoriano
ainda permaneciam em muitas casas, poderia ter parecido quase
austera. Primeiro notei as proporções da sala, que media dez por sete
dos meus passos sem a baía, e era elevada, o topo da porta só vinha
cerca de dois terços do caminho até o teto. Então percebeu-se que a
sala estava bem iluminada por suas duas janelas ao norte e a baía ao
sul, mas não iluminada demais, de modo a dar e desabrigar a sensação;
Deve-se certamente sentir um interior como tal, a menos que seja uma
espécie de jardim-sala ou um anexo de banho de sol da casa. A lareira,
que ficava no centro da longa parede interna, tinha uma lareira de
pedra (…). As paredes foram revestidas de madeira e pintadas em dois
tons de creme. As vigas e o friso eram enriquecidos por ornamentos
simples e gratuitos, cuja qualidade de vida parecia ligar o interior ao
mundo do jardim ao redor da casa.”

Figura 57 - Fachadas da Inglewood House

Fonte: Casas em Leicester – Ernest Gimson e o Movimento de Artes e Ofícios em Leicester

41
A marcante característica do movimento presente nesta construção encontra-se no
material utilizado na sua produção - seu exterior é composta por tijolos de estoque de areia
vermelha quente de Leicester aparentes e coberto com ardósias locais de Swithland (figura
57)
Figura 58 - Fachadas da Inglewood House

Fonte: Casas em Leicester – Ernest Gimson e o Movimento de Artes e Ofícios em Leicester


Pode-se citar também a expressão das bay window como parte componente do projeto
arquitetônico e a presença das várias janelas, para garanti, como como citado por em sua
descrição (olhar página 42): “parecer ligar o interior ao mundo do jardim ao redor da casa”.
(figura 58)
Figura 59 - Fachadas da Inglewood House

Fonte: Casas em Leicester – Ernest Gimson e o Movimento de Artes e Ofícios em Leicester

● Rodmarton Manor, por Ernest Barnsley


Ernest Barnsley, que construiu a Mansão Rodmarton para a família Biddulph, era um
seguidor de William Morris. Os Cotswolds se tornaram uma fortaleza para artesãos e artistas

42
no início do século 20. A mansão tomava forma de um grupo germinado de edificações com
uma área de jardim exuberante e extensa que a complementa

Figura 67 - Fachada da edificação da Rodmarton

Fonte:Rodmarton Manor - Casas Históricas | Casas Históricas (historichouses.org)

Sua edificação apresenta uma forte rusticidade pelo material natural aparente, que
parece fazer parte do local, “nascendo” da própria natureza ao seu entorno

Figura 68 - Parte do jardim da Rodmarton

Fonte:Rodmarton Manor & Jardim - Cotswolds

Esta arquitetura exemplifica de forma categórica dois grandes pilares das produções
construtivas do movimento arts and crafts na arquitetura: o jardim não somente como parte
secundária de um projeto, mas como o grande protagonista de um local que se desenvolve a

43
partir do seu entorno, buscando integrar-se a natureza e gerar a partir dela uma singularidade;
bem como o aspecto de uma implementação em grandes terrenos, para que esses limites entre
construído e natural possa ser mais ampliado.

ARTS & CRAFTS NOS ESTADOS UNIDOS

Nessa conjuntura, o movimento Arts & Crafts floresceu nos Estados Unidos como
resposta à industrialização, assim como na Inglaterra, onde buscava resgatar os valores
artesanais em meio à crescente mecanização. Dessa forma, o movimento encontrou solo fértil
nos Estados Unidos, onde a perda da autenticidade e a produção em massa eram questões
preocupantes na época. Logo, os precursores do movimento nessa região afirmavam que a
busca pelo lucro não deveria sufocar a criatividade e a maestria artesanal. Assim, em todo o
país os ideais de Morris ganharam força e repercussão através do movimento para reforma
das artes aplicadas. Em um contexto da história em que a tecnologia industrial e a inovação
estavam remodelando a relação dos americanos com a natureza e o ambiente urbano, a
mensagem de Morris harmonizou com a nostalgia de um passado pré-industrial. E portanto, o
movimento encontrou audiência por um estilo que oferecesse simplicidade e beleza no
funcionalismo.
Nesse viés, dois grandes líderes emergiram dessa revolução estética, Gustav Stickley,
um dos nomes mais proeminentes, o qual publicou a revista The Craftsmen, em 1901, que
contribui para o desenvolvimento do Arts & Crafts, promovendo o trabalho manual e
exaltando a beleza na simplicidade, afirmando que cada objeto deveria refletir na dedicação e
habilidade do artesão, além de expor o bangalô como uma edificação de público amplo.
Elbert Hubbard também contribuiu para a disseminação do Arts & Crafts nos Estados
Unidos, ele foi fundador da comunidade dos Arts & Crafts chamada Roycrofters, criada em
1893, a qual publicou o livro Roycroft Books, sobre móveis, luminárias e metais produzidos
pela comunidade. Além disso, ele foi um instrutor de trabalho manual que se tornou
arquiteto, o qual projetou diversos projetos com os princípios com influência do período das
Artes e Ofícios. Nesse sentido, a filosofia do Arts & Crafts nos Estados Unidos também
carrega uma dimensão social, a crença que o artesanato poderia elevar a qualidade de vida
dos artesãos e, por extensão, contribuir para uma sociedade mais justa, visto que proporciona
um escape às atividades repetidas das fábricas e, também fomentava uma comunidade de
artesãos cujo trabalho era uma extensão da sua própria identidade.

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Outrossim, a ênfase na natureza e na autenticidade estão intrínsecas dentro do
movimento e, também, nos projetos arquitetônicos com o uso de materiais naturais -a
exemplo das pedras e madeiras- abraçando linhas simples e formas e estratégias que
harmonizem com o ambiente natural. Logo, as figuras 69, 70 e 71 apresentam um projeto que
integra com essas ideias do período.

Figura 69- Gamble House, Califórnia, EUA, por Henry e Chales Greene

Fonte:https://www.visitpasadena.com/directory/gamble-house/

Figura 70- Interior da Gamble House

Fonte:https://www.visitpasadena.com/directory/gamble-house/

45
Figura 71- Mobiliário da Gamble House

Fonte:https://www.visitpasadena.com/directory/gamble-house/

Logo, observa-se como a casa se integra com a natureza, com a presença de varandas,
grandes janelas, proporcionando vistas para o jardim e a passagem de luz natural. Além disso,
o uso de materiais naturais, como a madeira no telhado e no seu interior, e as pedras nas
fachadas. Desse modo, o projeto apresenta-se em equilíbrio com a natureza e a vida
cotidiana.

Em seguida, a figura 72, 73 e 74 ilustram a Thorsen House, localizada em Berkeley, na


Califórnia, projetada por Greene e Greene, com a presença de caudas de vigas de madeira
com longas saliências e varandas fortemente em balanço são características distintivas.

Figura 72- Fachada principal da Thorsen House

Fonte: https://www.thisiscarpentry.com/2011/05/13/thorsen-house/

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Figura 73- Varanda da Thorsen House

Fonte: https://www.thisiscarpentry.com/2011/05/13/thorsen-house/

Figura 74- Sala de jantar da Thorsen House

Fonte: https://www.thisiscarpentry.com/2011/05/13/thorsen-house/

Nessa perspectiva, a Thorsen House incorpora os princípios fundamentais do Arts &


Crafts, equilibrando arquitetura, design, natureza e materiais de alta qualidade - a exemplo do
carvalho. Além, da casa possuir uma comunhão com a natureza, garantida pelo seu entorno e
pelas jardineiras presentes na casa. Assim, essas características demonstram a dedicação dos

47
irmãos Greene aos princípios do movimento Arts and Crafts e como eles conseguiram criar
espaços que encarnam a filosofia e a estética desse movimento revolucionário.
Além desses dois exemplares arquitetônicos, a Craftsman Farm, em Nova Jersey, nos
Estados Unidos, por Gustav Stickley, construída em 1908- 1917, representa outro projeto
arquitetônico do movimento Arts & Crafts, demonstrado na figura 75 e 76.

Figura 75- Fachada da Craftsman Farm, Parsippany, Nova Jersey, Gustav Stickley

Fonte: https://njskylands.com/hscrfarm

Figura 76 - Interior da Craftsman Farm

Fonte: https://njskylands.com/hscrfarm

Assim, a Craftsman Farm é um marco histórico nacional e uma casa museu histórica,
construída por Gustav Stickley, como expressão mais completa do seu estilo “artesão”. Seus
edifícios originais englobam a “Log House”, que era a casa da família Stickley e três chalés,

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além de incluir o celeiro, a leiteira e a garagem. Além de ser residência, a casa servia como
um lugar onde Stickley realizou oficinas, palestras e eventos, os quais promoviam suas ideias
sobre arte, design e artesanato, onde ele produzia suas próprias peças e móveis no local. É
notável na casa sua integração com a natureza, desde do paisagismo até a utilização de
materiais naturais como pedras e madeira, trazendo um aspecto de rústico e orgânico. Logo, a
residência exemplifica os princípios do movimento com móveis projetados à mão e uma
estética que valoriza a simplicidade e utilidade. Por fim, embora o Arts & Crafts tenha
diminuído sua popularidade ao longo do tempo, o legado da Craftsman Farm continua
presente, hoje a casa é um museu e local histórico que preserva a história do arquiteto e sua
contribuição para o design e arquitetura dos Estados Unidos.

OBRA DESTAQUE

Figura 77: Standen House, por Philip Webb, West Sussex, Inglaterra, 1894.

Fonte: https://victorianweb.org/art/architecture/webb/17.html

A Standen House, apontada na figura 77, foi projetada pelo arquiteto Philip Webb, para
o advogado James Beale, sua esposa Margaret Beale, e seus sete filhos. Sua construção foi
finalizada em 1894, em West Sussex, na Inglaterra. A casa possui uma grande fusão com a
natureza, por meio de diversos elementos, como as plantas existentes no jardim que
envolvem a casa, como está apontado na figura 85, em seu interior há madeira aparente, que
geralmente era pintada de verde com intuito de remeter-se à natureza, além de possuir
desenhos entalhados na madeira, e não pintados, a assim como está representado na figura

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80, uma imagem da sala de jantar da casa, e também a existência de Bay Windows, que
fazem parte da construção como maneira de abraçar o entorno.

O jardim da casa foi pensado pelo arquiteto, Philip Webb, e plantado pela Margaret
Beale, a proprietária da casa, e nele é perceptível os caminhos sinuosos e as cores vibrantes
das flores, como está retratado nas figuras 84 e 86 . A Standen House foi construída com
materiais locais, que estão aparentes na construção, como o tijolo, e a pedra, tal qual estão
expostos na figura 79. A propriedade em geral possui limites internos e externos imponentes.
Além disso, seu interior possui muitas obras do famoso William Morris, que é um dos
precursores mais importantes do movimento da reforma das artes aplicadas, o Arts and
Crafts, e coincidentemente amigo da família Beale. Sendo assim, tem diversos móveis e
papéis de parede, feitos por Morris, caracterizando o estilo da casa, do mesmo modo que está
apresentado na figura 78. Outros cômodos da casa estão representados nas figuras 81, 82 e
83, eles são a estufa, o quarto e a cozinha, respectivamente.

Por fim, a família morou na Standen House até a morte do casal, e depois a casa foi
passada para um dos sete filhos dos Beale, a Helen Beale, que morou na casa por um tempo,
mas vendeu. Já em 1972, ela foi adquirida pelo National Trust, que é uma organização
responsável pela preservação histórica e natural da Grã-Bretanha, hoje ela está aberta para
visitação.

Figura 78: Imagem da sala de estar, com diversas estampas e tecidos de Morris.

Fonte: https://britain-and-beyond.com/national-trust-standen-house-and-garden/

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Figura 79: Imagem da fachada da Standen House, detalhe para o tijolo e a pedra aparentes.

Fonte: https://britain-and-beyond.com/national-trust-standen-house-and-garden/

Figura 80: Sala de jantar da Standen House, com detalhe para madeira pintada em verde.

Fonte: https://britain-and-beyond.com/national-trust-standen-house-and-garden/

Figura 81: Estufa da Standen House, no térreo da edificação.

Fonte: https://mariaevisitajardines.wordpress.com/2010/08/31/standen/

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Figura 82: A imagem mostra um dos quartos da casa.

Fonte: https://mariaevisitajardines.wordpress.com/2010/08/31/standen/

Figura 83: A imagem mostra a cozinha da Standen House.

Fonte: https://mariaevisitajardines.wordpress.com/2010/08/31/standen/

Figura 84: Imagem do jardim e horta, e os espantalhos.

Fonte: https://mariaevisitajardines.wordpress.com/2010/08/31/standen/

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Figura 85: Imagem do detalhe das janelas, e o tijolo e pedra, materiais locais utilizados na construção.

Fonte: https://mariaevisitajardines.wordpress.com/2010/08/31/standen/

Figura 86: A imagem aponta o jardim e a fachada da casa.

Fonte: https://mariaevisitajardines.wordpress.com/2010/08/31/standen/

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Mediante aprofundamento dissertado ao longo deste trabalho, pode-se afirmar, por
fim, que o movimento Arts and Crafts desempenhou um papel de extrema importância na
evolução da arte e da arquitetura, deixando traços que continuam a influenciar esses campos
na atualidade. Nota-se que, como exposto, a ênfase na habilidade artesanal, a conexão com a
natureza, valorização da estética funcional e racionalizada, a utilização dos materiais puros e

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a preocupação por uma produção detalhista, transformou a maneira como artistas, artesãos e
arquitetos abordam suas criações.
No contexto da arte, o Arts and Crafts rejeitou os princípios da produção em massa e
da uniformidade, abraçando em vez disso a singularidade e a personalidade que a habilidade
manual poderia conferir a cada peça. Esse movimento revigorou a apreciação pelo artesanato,
pela atenção aos detalhes e pela autenticidade, fundamentos que se entrelaçam com as
produções em outros campos artísticos.

Já na arquitetura, o Arts and Crafts desempenhou um papel crucial na transição do


ecletismo do século XIX para o modernismo do século XX. Ao promover a integração
harmoniosa entre o ambiente construído e a natureza circundante, redefiniu a relação entre
edifícios e paisagens. A ênfase na utilização de materiais locais, técnicas artesanais e
elementos decorativos inspirados na natureza deu origem a uma estética arquitetônica que
buscava a funcionalidade sem sacrificar a beleza. Além disso, é a partir deste movimento que
começou-se a privilegiar o design de interiores - importante contribuição para a arquitetura na
atualidade - de forma a se pensar na construção como um todo harmonioso e racional, desde
o seu interior aos limites do terreno, revolucionando a forma de idealizar a arquitetura.
Por fim, este movimento reverberou de maneira significativa o movimento Art
Nouveau francês, diluindo as barreiras tradicionais entre as belas-artes e o artesanato, e
valorizando os ofícios e a maestria manual.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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