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Capa e diagramação
Kamila M. P. e Carol M. C.
Revisão
Kamila M. P.
1ª Edição - 2022
______________________
Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e
acontecimentos descritos são produtos da
Para todas as mulheres, que mesmo em momentos difíceis,
conseguem achar forças para enfrentar qualquer desafio… com a
ajuda de muita música, claro.
Nessa noite, não dormi quase nada por conta dos meus
pensamentos naquela garota do outro lado da minha parede. Além
de gotosa, fofa e linda, ela me parece inteligente, divertida,
esforçada, independente e, claro, sem esquecer, uma destruidora de
corações, como eu. Será que, por ela ser assim, teria a
possibilidade de transarmos só por transar? Já que o foco para nós
seria esse mesmo, certo? Ainda não posso arriscar, terei que
conhecê-la melhor e, por isso, usei o banco de dados
de investigações da agência. Eu sei que isso não é certo, mas não
deixa de ser uma investigação, não é? Cheguei na agência naquela
manhã de sexta-feira e fui logo abrindo o nosso sistema, digitando o
nome “Sofya Viatcheslav”, e os resultados foram bastante
interessantes.
Nome: Sofya Viatcheslav Antonov.
Antonov. Esse sobrenome não me é estranho.
Nascimento: 22 de janeiro de 1991, vinte e cinco anos.
Natural de: Nova York, EUA.
Nome do Pai: Vladmir Kritsk Antonov (Fugitivo da antiga União
Soviética; natural de Kiev, Ucrânia; chegou aos EUA em 1988).
Nome da Mãe: Ivanka Prutsk Viatcheslav Antonov (Fugitiva da
antiga União Soviética; natural de Kiev, Ucrânia; chegou aos EUA
em 1988).
Eu sabia que o nome e sobrenome dela não são comuns aqui
nos EUA, também que, provavelmente, seriam do Leste Europeu.
Bingo! Ela é americana, mas seus pais são ucranianos e viveram no
bairro de Little Ukraine, em Nova York, até que... ah, mas que droga.
Agora eu entendi o porquê dela ter fechado a cara para mim ontem,
quando eu perguntei sobre seus pais. Estou me sentindo um
completo idiota neste momento. O pai abandonou ela e sua mãe
quando ela tinha apenas cinco anos. Não bastasse isso, ainda
criança, com apenas oito anos, ela perdeu sua mãe devido a um
coma alcoólico seguido de overdose e, sem parentes próximos nos
EUA — e com o maldito pai desaparecido por aí —, ela acabou em
um orfanato no Brooklyn, permanecendo no mesmo até seus
dezoito anos. Passei a mão em meus cabelos e depois em minha
barba, a alisando, tentando absorver essas informações. Ela é
praticamente órfã. Senti uma vontade imensa de chegar hoje, bater
em sua porta e abraçá-la. Com certeza, ela não deve ter tido uma
infância fácil, pelo contrário, é provável que tenha tido uma infância
muito dura e sofrida.
Continuei lendo o arquivo, achando outras coisas muito
interessantes. Ela estudou em um colégio público e, mais tarde,
ganhou uma bolsa de estudos para cursar jornalismo na Columbia
University, uma das melhores universidades do país. Além do inglês,
ela fala russo e espanhol, apenas confirmando para mim que ela é
realmente inteligente. Fui passando o arquivo quando algo me
chamou a atenção. Cliquei em “histórico policial arquivado” e lá
estava! Quando ela tinha apenas dez anos, furtou uma boneca de
uma loja de brinquedos, o dono da loja chamou a polícia, mas
desistiu de fazer a queixa. E mais um: quando ela tinha
quatorze anos, foi pega em uma loja de moda íntima, furtando um
sutiã, mas a dona da loja também desistiu da queixa. Ora, ora, ora,
temos uma mão leve aqui então. Isso não aparece no histórico
pessoal dela por não serem “crimes” graves. Somente quem tem
acesso ao histórico policial dela é o departamento de polícia e o FBI,
por isso, esses pequenos delitos nunca irão causar problemas a ela.
Fechei meu Mac e encostei minhas costas na cadeira, jogando
o peso para trás, mexendo sem parar na minha barba. Então, essa
é uma parte de Sofya Viatcheslav. Bem, ela é uma guerreira, não
teve uma vida fácil e, hoje, pelo pouco que percebi de sua atual
circunstância, ela deu a volta por cima, conseguindo ter uma boa
vida para se ir levando. Mesmo com esse pequeno histórico
criminal, isso fez com que eu a admirasse ainda mais. Ela é bem
mais do que apenas uma vizinha gostosa e eu quero conhecê-la
muito mais que isso.
Quase tudo pronto! Hoje o jantar será macarrão à carbonara,
além de ser meu jantar de open house para alguns poucos amigos,
sendo eles Shantell, Nigel, Lea e Kate. Meu apartamento finalmente
está 100% pronto e organizado. Está lindo! Nigel deixou meu closet
impecável, separando tudo por cor ou marca, e aproveitamos para
fazer a limpa do desapego, na qual doei centenas de roupas e
sapatos. Isso faz bem de vez em quando. Estava colocando as
flores no centro da mesa de jantar quando escutei o barulho de
passos na escada, será que era ele? Bem, provavelmente, pois eu,
ele e a senhora Johnson somos os únicos moradores do prédio que
tem apenas quatro apartamentos, sendo um deles inutilizado por
razões que desconheço. Vi uma sombra por debaixo da minha
porta, oscilando por alguns longos segundos, seguindo para a porta
ao lado depois. Ele havia parado na minha porta? Mas para que?
Seria muito cedo para chamá-lo para um jantar? Quer dizer, não
para um jantar de encontro, claro, mas para o jantar desta noite?
Por via das dúvidas, eu acho melhor não. O que eu iria falar para o
pessoal? “Hey, gente! Meu vizinho gostosão veio jantar com a
gente!”. Melhor mesmo é esquecer isso e evitar perguntas.
Mas, percebi que ele não era apenas “meu vizinho gostosão”,
além de ser isso, claro, ele é engraçado e carismático, pelo menos
para um Agente do FBI, parece ser extrovertido até demais, mas
ainda não o conheço o suficiente para dizer isso. Sem falar no fato
de ele ser filho de uma das maiores milionárias de Nova York e de
um Senador Federal. Eu irei descobrir mais sobre ele em outra
oportunidade. Fiquei muito curiosa para saber mais sobre sua vida.
A nossa conversa de ontem foi tão agradável! John é um cara
legal e, assim como eu, curte bem a vida, se entende o que eu
quero dizer. A situação com Chris foi tão constrangedora. Porém,
John soube levar na esportiva, então eu o acompanhei na
brincadeira. E por mais que eu queira, involuntariamente e
voluntariamente, eu acho que não deve — e nem deverá — rolar
nada entre nós. Nós somos vizinhos de porta e, mesmo os dois não
prestando no sentido “amoroso”, estamos muito perto um do outro e
isso seria um desastre. No entanto, isso não significa que não
podemos ser amigos, pois suponho que ele seria um ótimo amigo.
Coloquei as taças na mesa e fui ao banheiro retocar a
maquiagem. O look está ótimo para um jantar de open house! Estou
com uma camisa branca larga, que mais parece uma bata,
chegando até meu umbigo, com os botões fechados até meu
pescoço, uma calça jeans skinny de cintura alta azul escura e flats
da mesma cor. Meus cabelos estão soltos, formando ondas bem
abertas e minha maquiagem está leve e linda. Tudo ok, só
estão faltando os convi... não mais, o interfone tocou. Atendi e os
mandei subir. Fui em direção a sala de jantar para ver se estava
tudo pronto e a campainha tocou. Abri a porta com um sorriso para
recebê-los.
— Hello! — disseram juntos.
— Bem-vindos ao meu Open House!
— Cadê seu vizinho gostosão?! — perguntou Nigel, antes
mesmo de me cumprimentar, indo para dentro direto.
— Oi para você também!
— Ah sim, precisamos conversar sobre isso! — indagou
Shantell, apontando o dedo em minha direção, enquanto passava
por mim na porta.
— Você mal se mudou e já está pegando seu vizinho? Mas,
espera aí! Por que eu estou surpresa? Isso é tão típico de você! —
Kate passou por mim, dando-me um tapinha no ombro.
— Agora eu fiquei curiosa — disse Lea, entrando logo depois.
— Eu estou bem, por sinal — fechei a porta e revirei os olhos.
— Uau, seu apartamento ficou lindo, Sofy! — falou Shantell.
— Sim, amei! Muito moderno — Kate complementou. — Ele
até pode sair na matéria que vamos fazer para edição de julho, o
que acha?
— Ótima ideia! — respondi.
— Vocês duas parem, não estamos na redação, por favor.
Sem trabalho aqui! — disse Nigel em voz alta.
— Chefe, estou com fome e o cheiro está maravilhoso. O que
é? — perguntou Lea, minha assistente, e que por sinal, também é a
assistente da Kate.
— Macarrão à carbonara. De entrada teremos uma salada
primavera fresca com um vinho do porto, ou um Chandon Rose se
preferirem, para acompanhar.
— Uau, nem parece aquela garota catarrenta que eu conheci
no orfanato — brincou Shantell e nós rimos.
— Vai se ferrar! Vamos comer logo.
Enquanto comíamos, e recebia vários elogios por meus dotes
culinários, bem merecidos por sinal — modéstia à parte —,
conversamos sobre diversos assuntos, até que, claro, chegou a
pauta da vez: John.
— Você está pegando o John? — perguntou Shantell.
— Então o nome dele é John?! Uh, que másculo — falou Kate.
— Quem é John? — perguntou Lea.
— Não, não estou pegando ele. Seria arriscado demais, ele é
meu vizinho de porta.
— Sofy, coisas como essa nunca te impediram de pegar
alguém, ou usar seus famosos joguinhos de sedução,
principalmente com um cara como ele — Shantell disse e todos
riram, concordando.
Eu não estou valendo nada mesmo. Mesmo que isso seja um
pouco verdade.
— Eu sei. Mas e se ele for como alguns dos caras com quem
eu já saí? Tipo o Chris, que não para de me encher o saco.
— Garota, acredite em mim, ele está longe de ser assim —
falou Shantell, me apontando seu garfo.
— Jura? E como você sabe? — perguntei, curiosa. Hm.
— Porque ele é um dos melhores amigos de Preston. E, pelo
pouco que conheço dele, ele é você, só que com um pinto no meio
das pernas.
— Uau, essa eu queria ver! — Nigel falou rindo, assim como
todos na mesa.
— Sério. Eu tenho até medo de deixar Preston sozinho do lado
dele, o cara é o maior mulherengo.
— Gente, eu estou curiosa para ver esse tal vizinho gostosão
— Kate falou.
— Ele é tudo isso mesmo?! — Lea ainda não acreditava.
Minha cara deixou bem claro um grande SIM, me jogando para
trás na cadeira, Shatell estralou os dedos e assentiu com a cabeça
e Nigel, óbvio, foi o mais escandaloso.
— Ele não é TUDO isso, garota, ele É TUDO. Ponto. Se eu
tivesse a oportunidade o levaria para meus pais conhecê-lo.
Rimos daquilo. Então ele era mesmo um mulherengo. Hm, só
de lembrar dele na academia, todo suado, com aquelas roupas, eu
já estou molhada. E agora, sabendo o que Shantell havia dito, todo
o meu controle para não pensar nele daquela maneira foi por água
abaixo, junto com a minha vontade de não provocá-lo com os “meus
joguinhos”, segundo as palavras de Shantell. Senhor, me
ajuda! Terminamos o jantar e ficamos conversando um pouco na
sala ao som de boas músicas. Kate, educada e a louca com TOC
que é, lavou a louça, enquanto Lea a ajudava no restante da
limpeza.
Passa um pouco da meia noite e todos já foram embora.
Combinamos de ir amanhã em um Pub Irlandês o qual eu ainda não
conheço, e Shantell vai direto com seu namorado e os amigos dele.
Também será amanhã que Shantell irá me apresentar, finalmente,
Preston, que chegará de viagem no mesmo dia. Não vou mentir,
estou com esperanças de ver John por lá também. Deus, por quê
mandaste um vizinho gostoso e não um vizinho velho, gordo e
barbudo? Seria tão mais fácil! Eu já estou a semanas sem transar, o
que vem justificando meu mau humor diário ultimamente, e ter John
do outro lado da parede não está ajudando minha calcinha a se
manter seca.
Estou no banho, e ter esses pensamentos não me ajudam em
nada, por isso, fui mais além, pensando no que ele estaria fazendo
agora... será que estava no banho também? Hm, imaginar ele no
banho, com aquele corpo maravilhoso, seus músculos gigantes,
aquele mastro, que, pelo volume que eu vi em sua calça naquele
dia, me parece ser bem grande... ah! Desci minhas mãos para o
meio de minhas pernas, imaginando como seria bom um banho com
ele. Se ele faz sucesso com as mulheres é porque, pelo
menos, bom de cama ele é. Comecei a massagear meus peitos
enquanto uma de minhas mãos continuava no meio de minhas
pernas, brincando com meu clítoris inchado. Eu preciso tanto de um
bom sexo! Estava começando a sentir meu orgasmo vindo — que
há tempos não aparece —, quando escutei um grito, que não era o
meu e, muito menos, de prazer. Desliguei o chuveiro para ouvir
melhor e ver se era aquilo mesmo que tinha escutado.
— Socorro! Ah!
Oh Meu Deus, é a senhora Johnson, com certeza! Peguei a
minha toalha e a enrolei no corpo, não me importando em sair
molhando tudo pelo caminho, com meu corpo e meus cabelos ainda
ensopados. Abri a porta e voei para a grade do corredor para ver o
que estava acontecendo lá embaixo. Parece que James não está lá.
Droga. Foi quando eu escutei a porta dele, se escancarando, o
revelando de cueca boxer preta e uma regata branca, além de estar
armado e, Senhor, armado duas vezes com aquele belo pacote no
meio das pernas... foco Sofya! Tentei segurar um suspiro.
— Você está bem? — Perguntou ele, olhando para mim com
cara de preocupado.
— Sim, mas parece que a...
— Socorro! Por favor!
É mesmo a senhora Johnson. Olhamos juntos para baixo e
depois um para a cara do outro, indo em disparada para a escada,
descendo por ela, até que ele segurou meu braço, com aquela mão
gigante. Não sei se estou molhada pela água do banho que estava
tomando ou se ele me fez ficar molhada novamente.
— Não, você espera aqui. Não sei se pode ser algo perigoso
— John falou num sussurro.
— Você está louco? Não pode ir sozi… — ele não me deixou
terminar, me calando com seu dedo em minha boca.
— Você fica AQUI — rosnou, ainda sussurrando e fechando a
cara.
Eu assenti, porque depois disso, as minhas pernas ficaram
bambas. Ele me olhou e desviou o olhar para baixo, enquanto
posicionava sua arma, não a de baixo, mas a de fogo. A
senhora Johnson ainda continuava gritando, e eu fui descendo na
ponta dos pés para chegar até ela.
— O que está acontecendo, senhora Johnson, a senhora está
bem? — ouvi John a perguntando em voz baixa.
— Oh querido, me ajude! Ele é enorme!
— Shh. Tem mais alguém aí dentro? — escutei ele, rosnando
baixo e engatilhando sua arma, devagar.
— Tem! Ele está no meu quarto, por favor, não o deixe fugir! —
ela pediu, ainda alarmada, mas baixando a voz.
— Tudo bem, vá para um lugar seguro — logo corri em direção
a ela, a abraçando.
Ele me fuzilou com os olhos, fechando sua cara totalmente.
— Vocês duas, subam, agora! — ele sussurrou, ainda bravo,
entrando no apartamento em seguida.
Mas não tínhamos forças para subir, e aquela pobre
senhora, que conseguia ser um pouco mais baixa que eu, grudou no
meu corpo, e eu coloquei meus braços em volta dela, para lhe
passar segurança, ou pelo menos tentar. Foram alguns minutos de
tensão quando ouvimos um barulho oco forte, mas não eram tiros, e
ela gritou novamente, quase me matando de susto. Eu já estava
quase entrando e indo atrás de John quando ele apareceu, ainda
de cara fechada, com sua arma em uma mão e na outra um... aquilo
é um...
— Um rato?! É sério, senhora Johnson?! — perguntou John,
em um tom inquisidor.
Soltei o ar de meus pulmões, aliviada, e a soltei... pelo menos
tentei. Ela olhou para o bicho já desfalecido que ele segurava pelo
rabo e me apertou ainda mais, gritando, fazendo o ar sumiu de
meus pulmões novamente.
— Senhora Johnson, calma, já está tudo bem! Já pode me
soltar agora — falei com dificuldade, pois ela, mesmo sendo
daquele tamanho, tem um aperto forte.
John continuou parado ali, enquanto eu tentava me soltar
dela sem sucesso, e quando o olhei novamente ele estava com
aquela cara debochada, de riso.
— Não! Tire isso da minha frente, o jogue longe de mim!
Ao invés de John ir em direção a porta de entrada do prédio,
ele deu um passo à frente, o que a fez se agarrar mais em mim,
me jogando para a parede e me prensando a ela. Levantei a minha
cabeça em busca de ar, e encarei furiosamente John, que não tirava
seus olhos do meu decote, que ficava cada vez mais visível
conforme ela me apertava e a toalha ia se soltando.
— Senhora Johnson está tudo bem, ele já está morto! Por
favor! — exclamei.
— Não, TIRE ELE DAQUI! — gritou, me apertando cada vez
mais.
— JOHN! — gritei para que ele tirasse o pobre rato morto de
lá.
Ele me olhou novamente, rindo discretamente, e foi em direção
a porta do edifício, saindo e voltando um minuto depois, mas aquela
velha não desgrudava de mim!
— Senhora Johnson, pronto. Ele não está mais aqui, pode me
soltar por favor?
Ela foi afrouxando seu aperto e eu fui a colocando o mais
longe possível de mim, me desvencilhando dela, que encostou na
parede, fechando seus olhos e colocando as mãos em seu peito.
Quase fiquei sem a minha toalha e, quando a ajeitava em meu
corpo, percebi que John ainda me olhava, só que com um olhar de
predador... olhando sua caça. Um olhar de desejo, que quase me
fez cair para trás.
— Ah, muito obrigada, querido, eu tenho pavor desses bichos!
— falou a pobre senhora, que foi na direção dele e o abraçou.
— Não precisava de tudo isso, senhora Johnson, mas quando
for assim, é só me chamar — John falou.
— Tudo bem, me desculpe incomodar voc... oh minha querida,
você deve estar morrendo de frio só com essa toalha. Está muito
molhada! — disse ela, virando-se para mim e pegando minhas
bochechas.
— Sim. Muito molhada — falei.
Encarei John de maneira sapeca, quase rindo de sua reação
ao escutar minhas palavras. Com a mesma cara de predador, pude
jurar que o escutei grunhir, cerrando seus punhos com força.
— Mas que bom que foi só isso, não é? Agora, se me derem
licença, vou subir. Boa noite — finalizei, acenando com a cabeça
para ela e para ele.
— Boa noite, querida.
Andei para as escadas com pressa e comecei a subir.
— Também já vou indo. Boa noite, senhora Johnson. E se
cuide.
— Boa noite, querido e obrigada!
Escutei a porta dela se fechar e o senti perto de mim.
— Muito molhada?! — ele disse.
Parei e o olhei, arqueando minhas sobrancelhas, ele ficou no
mesmo degrau que eu, e consequentemente, tive que olhar para
cima, já que ele é uma parede alta de músculos. E lá estava aquele
olhar, fazendo-me arrepiar. Eu bem que poderia entrar nos seus
joguinhos, que pelo andar da carruagem, irá acabar na minha cama
ou na dele, mas eu estou brava! Brava porque eu estava tomando
um banho delicioso e me interromperam no meio do que eu estava
fazendo. Não bastava isso, ele fez aquilo de propósito só para ficar
me olhando e tirar uma com a minha cara. Hoje não,
Senhor Gostosão!
— Sim! Reparou só agora, gênio?! — gesticulei com a mão e
continuei subindo.
Ele riu e me acompanhou.
— Você deveria ter ficado onde eu te falei para ficar.
— E deixar a senhora Johnson naquele estado? Não dava
para ficar ali, sem fazer nada — falei, quando chegamos ao nosso
corredor.
— Mas foi perigoso, não poderia ter feito aquilo — me
repreendeu, quando chegamos em frente à minha porta.
Virei para ele e ri, enquanto ele me olhava sem entender o
motivo da graça.
— Ok, Super Agente do FBI! Um rato em um apartamento é
classificado como perigoso para vocês? — continuei rindo.
Ele revirou os olhos e me encarou.
— Engraçadinha. Você sabe do que eu estou falando.
Ele estava indo em direção à sua porta e, quando se virou para
mim novamente, percebi sua ereção enorme e bem visível na sua
cueca boxer. Puta merda! Não disfarcei e olhei descaradamente,
encostando-me no batente de minha porta para não perder o
equilíbrio.
— Aliás, você deveria sair mais assim... ou sem isso, por
exemplo — ele falou, apontando para minha toalha.
Ele me olhou com aquele olhar novamente, também
encostando em seu batente. Passei minha língua nos lábios e levei
meu dedão a boca, o mordendo de maneira sedutora. Ele trincou
sua mandíbula em resposta, emitindo um grunhido baixo, que agora
eu escutei! Não serei eu a ceder primeiro, mas continuarei
a provocá-lo.
— Ah... mas eu costumo andar muito sem isso aqui dentro,
sabe como é, aqui dentro é muito quente e quanto menos
roupa, melhor — falei descaradamente, apontando para dentro — E
agora, se me der licença, vou voltar para o meu delicioso e longo
banho.
Ele grunhiu, dessa vez bem mais alto, me olhando de maneira
ameaçadora, o que me fez dar um sorriso sapeca, e me atrevi a
continuar.
— Boa noite, vizinho — lhe joguei um beijinho e uma
piscadela, fechando a porta em seguida.
Ah, vitória! Encostei-me na porta e ri, logo depois me virei e
coloquei meu ouvido encostado para ouvir se ele irá dizer alguma
coisa. E voilá!
— Filha da mãe! Irei dormir duro de novo! — resmungou
ele, fechando sua porta em um estrondo.
Foi inevitável não gargalhar! E pronto, havia ganhado minha
noite novamente!
Levantei cedo nesta manhã para minha corrida matinal de
sábado. Já estava com minha roupa de corrida e fui até o Central
Park, correr por lá. Eu amo aquele lugar, mesmo em épocas tão
geladas. É quase maio, início da primavera, e eu mal posso esperar
para ver esse lugar cheio de vida com as flores colorindo tudo.
Coloquei meus fones de ouvido e selecionei o modo Shuffle. A
primeira música que tocou foi da Rihanna, ajudando-me a aquecer
com o ritmo agitado. Comecei minha corrida a todo vapor, assim
como comecei a pensar sobre coisas do trabalho e nele... no meu
vizinho de pau grande e grosso. Só de lembrar me dá água na boca.
Soltei um grande suspiro, me lembrando da falta que eu sinto de
fazer sexo. Hoje à noite vou tentar acabar com essa seca de
algumas semanas, mas John estará fora do meu cardápio. Mas, se
for ele a tomar a iniciativa, ao invés de ficar apenas provocando,
como fez ontem — com a real intenção de mostrar seu volume —,
eu até que poderia ceder. Mas parece que o nosso jogo de provocar
um ao outro só está começando, pois percebo que ele tem a mesma
intenção que eu, só para me fazer ceder primeiro, aposto! Bom, ele
ficará frustrado, porque não irei ceder primeiro... assim espero.
Corri por quase uma hora e já estava a poucas ruas de casa
quando senti algo grande trombar em mim. Me virei para ver — e
xingar — quem fez aquilo, mas fiquei muda quando vi quem era. Ele
estava literalmente me seguindo.
— Ei, desculpe, não te vi aí embaixo — riu ele.
Cara de pau! Já está até me zoando por conta da minha altura.
Fiz um riso falso e forçado para ele, que continuou e rir da minha
atitude.
— Engraçadinho. Você está mesmo me seguindo, não é?
Pode ficar tranquilo, não é só porque sou sua nova vizinha que eu
irei te matar.
Mantive o ritmo da corrida, e ele fez o mesmo. A julgar por sua
roupa, um moletom cinza escuro, bermuda preta de tactel e tênis de
corrida, ele também estava correndo. Ele olhou para mim,
desconfiado.
— Já disse que quem está me seguindo é você — olhou para
mim e arqueou suas sobrancelhas grossas. — E isso está muito
estranho, terei que investigá-la.
Viramos a rua do nosso edifício, e eu ri com o que ele disse.
— Aí sim, eu terei que matá-lo — disse, com uma cara de
quem teve uma ideia sórdida, e ele riu, exageradamente.
— Me desculpe por rir, mas é até fofo ver alguém de um metro
e meio falando que irá matar alguém perto dos um e noventa.
Ele colocou uma mão em meu ombro, fingindo tentar me
confortar. Eu o olhei, com um olhar ameaçador, enquanto ainda
mantínhamos o ritmo da corrida. Não vou deixar ele tirar uma com a
minha cara assim, então, em um movimento rápido, reuni toda a
força e agilidade que eu tinha, pegando sua mão e seu braço, que
estava em meu ombro, o puxando para a frente usando toda a força
do meu ombro para trás, o jogando para frente com o impulso, e o
fazendo cair de costas no chão. De vez em quando faço muay thai,
além de saber muito bem sobre defesa pessoal. Foi tudo tão rápido.
Ele é muito pesado e não sei como eu consegui derrubá-lo. O
olhei espantada, e ele mais ainda. Achou que por ter sido pego de
surpresa, e por não esperar que “uma pessoa de um metro e meio”,
pudesse fazer algo assim, ele nem teve tempo de reagir. Comecei a
rir, enquanto ele ainda me olhava pasmo, caído no chão.
— Mas que porra foi essa?! — exclamou, cerrando o olhar
para mim.
— Isso foi uma pessoa de “um metro e meio” — enfatizei,
fazendo aspas com meus dedos. — Derrubando uma pessoa de
"quase um e noventa" no chão.
Acenei com a cabeça enquanto um sorriso torto de vitória
surgiu no canto dos meus lábios, e continuei caminhando para a
entrada do prédio. Olhei para trás e ele estava levantando,
rapidamente ficando ao meu lado de novo. Virei-me para ele e ele
ainda me encarava, mas não sabia se era por estar surpreso
ou bravo, com uma ruga evidente no meio de sua testa.
— O que foi? — perguntei, enquanto entrávamos no prédio.
— Eu estava despreparado. Só para você saber. — Olhou para
frente e cumprimentou James, assim como eu.
Não pude deixar de rir com sua resposta. Começamos a subir
os degraus da escada e ele continuou.
— É sério. E isso terá volta — disse ele, olhando para mim
com uma cara de desafio.
— Uh, isso é uma ameaça?!
— Pode apostar, vizinha.
— Tudo bem, Super Agente, essa eu quero ver — rimos
juntos, chegando ao nosso corredor.
Parei em frente à minha porta, e ele na frente da dele.
— Vai fazer algo hoje à noite? — perguntou.
— Sim, vou sair com uns amigos E você?
— Também. — Nos encaramos, ainda com nossas portas
abertas. Sabia que ele iria hoje! — Tudo bem então, se você
precisar de alguma coisa em relação ao apartamento, pode me
procurar. A senhora Johnson está viajando neste fim de semana.
— Tudo bem. Até logo, vizinho — falei, me despedindo.
— Mal posso esperar, vizinha — respondeu, dando uma
piscadela e fechando sua porta.
Fechei a porta, entrando e pensando no que acabou de
acontecer. E eu mal podia esperar mesmo.
Sofya: “Pervertido.”
John: “Sempre. Me manda mais, por favor?!”
John: “Bom dia, vizinha! Desculpe não ter ficado, tive que sair
bem cedo para resolver alguns problemas. Acho que quando eu
voltar você deverá estar acordada, então use a minha chave e
venha tomar um café comigo. Estarei te esperando. *emoji
piscando”
John: “Acordou?”
Enviei a mensagem.
Sebastian continuava a falar e eu fingia que estava lhe dando
atenção. Na verdade, minha adrenalina está nas alturas. Vi quando
West saiu da sala e veio em nossa direção.
— Gata, vem comigo. Falei de você para Ramon e ele quer te
conhecer.
Puta. Que. Pariu.
— O que? — disse, dando um sorriso nervoso. — Ah, não,
tudo bem. Eu estou bem aqui.
— Vem gata, não vai querer que ele peça de novo, vai?
— Eu vou com voc...
— Não, só ela, cara. Foi mal.
Dei um grande suspiro, encarando os fatos. Parabéns, Sofya,
como sempre se metendo em roubada.
— Tá legal, vamos lá — falei, indo na frente.
Acompanhei West até a sala, parando em frente ao
segurança gigante, que me olhou de cima a baixo, liberando o
caminho para nós. Entrei e vi três homens sentados em uma mesa,
com várias mulheres e cercados por mais cinco seguranças.
Preciso manter a calma e o controle. O homem que está sentado no
centro, me encarou com um olhar malicioso.
— Muy hermosa! Ela é mesmo linda, West. O que te traz aqui
hoje, cariño? — perguntou ele.
— Só quero curtir um pouco.
— Então junte-se a nós!
— Na verdade, eu só quero o que pedi a West, meus amigos
estão me esperando — Disse, sendo direta.
— Ah... mas seria uma desfeita se você fosse embora assim.
Presumi que esse tal Ramon seria o fornecedor.
— Seria uma desfeita se eu não tivesse dinheiro para te pagar
pelo que eu pedi. Mas esse não é o caso — disse, o encarando.
Vi os homens ao seu lado rirem, inclusive ele. Bem, se já está
no inferno, então abrace o capeta. Eu estou com medo, mas não
irei demonstrar isso para esses canalhas.
— Baixinha e bocuda, interessante.
Ele iria continuar a falar, mas um segurança passou por mim,
indo em direção a ele, falando algo em seu ouvido e o deixando
totalmente alerta. Ele chegou, John já está aqui.
— Hora de irse, todos afuera. ¡El FBI está aquí! ¡Todos afuera!
¡Vamos, vamos, vamos! [5]— gritou Ramon, confirmando o que eu
pensava.
Esperei a muvuca da porta se dissipar e saí apressadamente,
mas parei quando senti uma mão segurando-me pelo braço.
— Você não, chica. Algo me diz que você tem alguma coisa a
ver com isso.
Então escutei tiros e uma grande gritaria. Abaixamos e eu
tentei me desvencilhar dele, que é mais alto e forte do que eu
imaginava.
— É melhor andar direitinho. — Senti algo gelado encostando
em minha cintura e não precisa ser um gênio para adivinhar o que é.
— Ou vou ter que atirar nesse corpinho lindo.
Fechei meus olhos e deixei que ele me guiasse no meio
daquele caos. Estávamos quase chegando na saída de emergência
quando escutei uma voz bem conhecida.
— Hey, compadre, pare aí mesmo onde está.
Ele se virou e eu o acompanhei. John é um colírio para os
meus olhos! Escutei Ramon engatilhando sua arma e apontando
para minha cabeça. Mas que droga!
— É melhor deixá-la ir, se não as coisas vão ficar ainda mais
feias aqui — rosnou John, apontando sua arma para ele.
— Olá, Agente! Não deveria estar perseguindo barcos de
cigarros por aí? — Disse Ramon, rindo.
Minhas mãos estão na lateral de meu corpo e eu preciso agir
de alguma maneira.
— Se você não se afastar eu terei que estragar esse lindo
rostinho aqui.
Vi John trincando sua mandíbula, ainda com sua arma
apontada.
— Solta ela, AGORA.
Senti o filho da puta puxar meu cabelo e encostar sua arma em
minha bochecha.
— Seu... — comecei.
— Xiii, quietinha. Abaixe essa arma ou ela já era!
Sem saída, John abaixou sua arma, ainda fuzilando Ramon
com os olhos. Escutei o desgraçado rir, até que tiros ecoaram do
lado de fora, fazendo ele perder o foco por um momento e afrouxar
seu aperto em mim. Essa era a oportunidade que eu estava
esperando. Com um movimento rápido, o desarmei, logo depois, dei
um soco certeiro em sua cara, o fazendo ir para trás, encostando-se
na parede, e consegui ser ainda mais rápida, dando uma joelhada
em suas partes íntimas, o fazendo gemer de dor e inclinar para
frente. Quando eu ia finalizá-lo, senti John me puxando para trás
dele, e, logo depois, indo para cima do cara, dando-lhe um baita
soco na cara, o fazendo cair de bruços no chão, colocando as
algemas nele.
— Quem é a baixinha agora? Idiota — disse para aquele
idiota, caído no chão e gemendo de dor.
John se ergueu e encontrei seu olhar gélido em mim. Ele está
bravo, muito bravo. Dei de ombros, levantando as mãos.
— De nada — falei, ironicamente.
— Preston! — gritou ele, me fazendo pular.
Preston apareceu logo em seguida com outros agentes,
olhando-me com uma cara de “que porra é essa?”.
— Tire ela daqui — rosnou John.
Quando Preston foi me pegar para me levar de lá, levantei
minhas mãos e fui me retirando, ainda olhando para John.
— Eu sei onde fica a saída! — exclamei, o fuzilando da mesma
maneira, virando-me para a saída.
Preston me alcançou e saímos juntos. Meu Deus, isso
está uma zona! Há viaturas, carros pretos — que deduzo serem do
FBI — e ambulâncias por toda parte, sem contar na multidão de
pessoas que se formou.
— No que você estava pensando, Sofya?! — escutei Preston.
— Em ajudar vocês! — respondi brava, continuando a andar.
— Hey, espera! Obrigado por isso. Conseguimos pegar todos
e, pelo que parece, eles são mesmo quem estávamos procurando.
— Dei um suspiro, aliviada, parando de caminhar. — Mas você não
deveria se colocar em perigo assim. Shantell irá te matar! —
continuou ele, me fazendo rir.
— Preston, onde está Neeson? — disse um cara um pouco
alto, gordinho e com cavanhaque.
— Está lá dentro, chefe.
— Ok. Foi você que deu o telefonema, garota?
— Sim, senhor — respondi.
— E foi você que deu uma surra naquele cara? — perguntou
ele, apontando para o homem preso no carro de polícia.
— É... — disse, rindo, os fazendo rir também.
— Obrigado por isso, mas nunca mais se arrisque dessa
maneira de novo. Pode ir para casa.
— Obrigada... senhor — respondi e ele entrou.
— Sofya, isso fica aqui. Nós demos nossa palavra que você
ficará segura e que esses caras irão para prisão — disse Preston.
— Tudo bem, eu acredito em vocês.
— SOFYA!
Virei-me assustada e vi Lea, Nigel e Kate, me abraçando.
— O QUE VOCÊ TEM NA CABEÇA? — continuou Nigel.
— Ideias erradas — respondi.
— Você é louca, sabia!? — disse Kate.
— E a chefe mais fodona de todas! — continuou Lea, me
fazendo rir.
Não vejo John em nenhum lugar. Eu olhava para os lados,
mas não o encontro.
— Ele ainda está lá dentro, Sofy. Vá para casa com seus
amigos agora. Acabou — disse Preston.
— Tudo bem. Obrigada, Preston.
Nos despedimos e fomos para o carro de Kate. Tinha me
livrado do interrogatório da polícia, mas não consegui me livrar do
interrogatório deles, os contando tudo no caminho até em casa. Já
se passa das 3h da manhã e eu, finalmente, estou em casa, depois
de tudo que passei. Por um momento, pensei que morreria hoje.
Sim, eu tive medo, mas, para falar a verdade, ser órfã e não ter
ninguém com quem se preocupar me faz ser mais forte e
desprendida das coisas.
Entrei no chuveiro quente e refleti sobre tudo o que aconteceu.
Eu sei que tenho amigos que me amam, mas eu os amo também,
por isso que eu fiquei lá, justamente para ajudar um amigo em
especial. Então, fazer aquilo foi fácil para mim, mesmo sabendo que
John reprovava minha atitude e que ainda deve estar muito bravo
comigo. Depois de um longo banho e milhares de pensamentos, me
deitei na cama, e o sono não deu mais espaços para eles, me
levando profundamente consigo.
Depois de horas interrogando o filho da puta, ele decidiu abrir
a boca, após fazer um acordo em troca de menos tempo na prisão.
Ele foi bem mais difícil do que os outros que estavam com ele.
Agora já temos boas informações para continuarmos com o caso e
irei continuar à frente das investigações, graças a Sofya. Eu queria
matá-la, mas também a encher de beijos. Vê-la com uma arma
apontada para sua cabeça, correndo perigo, foi uma das piores
coisas que já vivenciei na vida. Eu preferiria mil vezes ter perdido o
caso do que tê-la visto passar por aquilo. Se eu soubesse que ela
iria se envolver nisso, eu mesmo teria saído do caso antes. Ela foi
tão corajosa e fiel. Mesmo naquela situação, ela se manteve calma
e, quando abaixei minha arma apontada para Ramon, eu sabia que
ela agiria na primeira oportunidade, mesmo eu querendo agir
primeiro e tirá-la dos braços daquele infeliz eu mesmo. Então, tive
que arriscar e deixar que ela agisse, e assim ela fez, para o meu
alívio. E orgulho.
Está amanhecendo, entrei no prédio, subindo as escadas e
pensando. Eu preciso vê-la, para ter certeza de que está
mesmo segura e bem, então usei sua chave e entrei em seu
apartamento. Fui em direção ao quarto e parei na porta, dando um
pequeno suspiro de alívio quando a vi dormindo, serena. Ela
está virada para a janela, na posição que sempre costuma dormir,
com um braço pousado na lateral de seu corpo, o outro embaixo do
travesseiro e com pouca roupa, vestindo apenas uma calcinha
confortável e uma blusinha colada. Seus cabelos caem
como cascata pelo travesseiro e sua coberta foi parar nos seus pés.
Pelo visto, ela não teve uma noite muito tranquila. Me aproximei e
sentei-me na cama, a observando mais de perto.
O pensamento e o medo de perdê-la hoje me fez pensar e
repensar nos meus sentimentos em relação a ela. Sofya já virou
uma grande amiga para mim, uma amiga na qual eu não posso mais
ficar longe por muito tempo. Se eu já tive um sentimento assim por
alguma garota? Talvez... por Jenna, por exemplo, mas com ela eu
não tinha a mesma cumplicidade e sintonia que tenho com Sofya.
Marisa? Não, com Marisa era apenas sexo. Eu pensei que com
Sofya seria só isso também, mas ela continua me surpreendendo e
me intrigando cada vez mais. Eu nunca fui de contar meus
problemas e o que acontece na minha vida para as pessoas, nem
mesmo para meu pai, meu irmão e meu avô, que sabem apenas o
essencial, mas com Sofya está sendo diferente. Ela virou minha
confidente, me transmitindo confiança, paz e calma, alguém que eu
posso recorrer quando precisar.
Tentei não chegar a essa conclusão no caminho para cá, mas
se nem bandidos e traficantes conseguem esconder a verdade de
mim, imagine eu mesmo. Eu estou começando a gostar de Sofya,
não que eu não gostasse antes, mas ter sentimentos "a mais" por
ela. Não queria isso, ainda mais sabendo que Sofya não quer isso e
vai continuar assim, além disso, esse não é o momento. Mesmo eu
não tendo transado com mais ninguém desde que eu e ela
transamos pela primeira vez, eu me sinto bem assim, tudo bem que
eu ainda olho para mulheres na academia ou na rua, mas se
acontecer de transar com outra mulher será consequência, não
porque eu fui atrás.
Ainda continuava a olhando, com os pensamentos à tona em
minha mente, quando ela se virou, ficando para cima e colocando
seus braços ao lado de sua cabeça. Percebi que ela está
suando, começando a se remexer mais, sua respiração começando
a acelerar, seu cenho franzir e seus punhos se fecharem. Tem
alguma coisa errada. Tirei meus sapatos, subindo na cama, e ela se
remexeu ainda mais. Gemidos de angústia saíram de sua boca e
então agi.
— Hey, hey, Boneca! — Coloquei minhas mãos em seus
ombros, os apertando delicadamente. — Sofya! Acorde — disse
mais alto. — Sofya!
Ela acordou, ofegante, se desvencilhando de mim e indo para
trás rapidamente, se encolhendo, encostando-se na cabeceira da
cama. Seus olhos estão assustados de uma maneira que nunca
havia visto antes. Ela abaixou a cabeça, recuperando o fôlego
e colocando uma mão em seu peito.
— Você está bem? Hey, fique calma, ok? Sou eu — disse, me
aproximando lentamente dela, quando na verdade eu queria abraçá-
la forte e protegê-la de tudo.
Ela começou a limpar os olhos com as costas das mãos e
percebi que algumas lágrimas caem involuntariamente enquanto ela
ainda tentava acalmar a respiração.
— Estou bem, foi só um pesadelo — disse ela, ainda com a
voz rouca e o rosto abaixado, enxugando os vestígios das lágrimas.
Fui até ela e, finalmente, a abracei fortemente, beijando seus
cabelos e envolvendo seu corpo no meu.
— Está tudo bem, você está segura, ok? Quer falar sobre o
pesadelo? — perguntei, apertando ela ainda mais.
— Não. É sempre o mesmo pesadelo, já estou acostumada.
Aquilo me cortou por dentro. Já imagino o que poderia ser,
mas não irei ficar abrindo mais sua ferida. Ficamos em silêncio por
alguns segundos e eu ainda a mantenho em meus braços.
— Nunca mais faça aquilo de novo, entendeu? — sussurrei.
Ela riu em meu peito, se afastando logo em seguida, e nos
encaramos.
— Pelo menos me diga que deu tudo certo?
Seus grandes olhos ainda estão vermelhos e passei minha
mão em seu rosto, ainda a encarando.
— Sim.
— Então você ainda está no caso? — perguntou ela, sorrindo.
— Sim, graças a você. Obrigado, Boneca — falei, retribuindo o
sorriso e lhe dando um beijo na testa.
Seu cenho franziu de repente e ela entortou sua cabeça, ainda
me olhando.
— Você está aqui desde quando? — perguntou.
— Já faz um tempo. Precisava ver se estava tudo bem mesmo.
— Entendi. — Ela se aproximou de mim, ainda com a
cara fechada, e me cheirou. — Se você quiser ficar aqui, vai ter que
tomar um banho antes! — continuou ela, me fazendo rir.
— Ah qual é, não está tão ruim assim — falei, cheirando
minhas axilas.
— Não, mas foi uma longa noite e eu não quero você
cheirando a “bandido” aqui.
Gargalhei mais ainda e ela jogou um travesseiro em minha
direção.
— Agora vá!
Ela se preparava para deitar novamente, mas a puxei de volta
para mim, a fazendo cair em meu colo, com suas pernas ficando de
um lado e sua cabeça do outro lado do meu corpo. E, então, fiz o
que eu estava com vontade de fazer desde quando a vi sã e salva, a
beijei. Me levantei, a carregando em meus braços, até que ela
interrompeu nosso beijo.
— Hey, o que você está fazendo?
— Indo para o banho, por quê?
— Mas que mania você tem de querer me levar com você! Eu
já tomei banho, pode me soltar, por favor?
Eu ainda ia em direção ao banheiro enquanto ela tentava se
desvencilhar de mim. É até fofo ver sua tentativa, mas só me fez rir.
— John! Por favor, me deixe dormir! — choramingou ela,
desabando seu corpo em meus braços, amolecendo seus braços e
sua cabeça, exageradamente, me fazendo parar e me virar
novamente em direção a cama.
— Ok então.
Com apenas um pouco de força, a arremessei em direção a
cama, a fazendo voar e cair nela, quicando algumas vezes
e fazendo alguns travesseiros se lançarem para o ar. Aquilo me fez
gargalhar, até que a vi se sentando na cama e começar a jogar
travesseiros em mim.
— Seu idiota! Isso não foi legal! — exclamou ela, claramente
brava, e me fazendo rir ainda mais.
Ela se levantou, correndo em minha direção, e eu corri para o
banheiro, me trancando lá.
— Seu covarde! Saia e vá tomar banho no seu banheiro!
Se ela está achando que pode me chamar assim está muito
enganada. Com a minha melhor cara de bravo, abri a porta e a
encarei, e ela fez o mesmo, ainda brava. Estava esperando sua
reação, mas ela não falou nada. Ri e, com um movimento rápido, a
peguei por debaixo dos seus braços e a lancei, ainda mais alto, em
direção a cama novamente. Antes que ela pudesse cair, fui em
disparada para porta de saída, a escutando me xingar ainda mais.
Entrei em meu apartamento rindo e, finalmente, descontei os dois
golpes que ela havia me dado antes. Aquilo foi hilário.
Eu disse a ela que vou tentar, mas só o tempo irá dizer. Assim
que virei a chave da minha porta, escutei a porta de John abrir. E,
assim como eu, ele está preparado para enfrentar uma nevasca lá
fora, vestindo um grande casaco de nylon preto — igual ao meu —
por cima de uma blusa grossa de lã verde escura, um cachecol
preto, coturnos preto e um gorro preto. O encarei e vi seu grande
sorriso se abrir, derretendo meu coração.
— Isso é um péssimo sinal! — falei quando ele veio em minha
direção.
Antes de me responder, ele me agarrou pela cintura, me
tirando do chão, e me deu um beijo suave em meus lábios.
— O que? — perguntou, me encarando quando eu já estava
de volta ao chão.
— Você tem certeza de que quer sair nessa neve toda? —
falei, o fazendo rir.
— Não vejo por quê não. Além disso, você está perfeita para
“sair nessa neve toda” — respondeu, usando minhas últimas
palavras.
Sim, eu estou preparada para uma nevasca, diga-se de
passagem: casaco de nylon preto, indo até os joelhos, uma blusa
gola alta quentinha de cashmere creme, além da malha térmica por
baixo dela, claro, calça skinny grossa de poliéster preta — sem
contar a meia calça fio 80 que está por baixo —, coturnos pretos
sem salto e um gorro de cashmere da mesma cor da blusa, com um
pomponzinho no topo dele. Cabelos soltos como um método para
esquentar a nuca conta como parte deste look inverno também?
— Vamos!
— Para onde? — Antes de me responder, ele já estava me
arrastando escada abaixo.
— Você vai ver.
— Eu disse para ele que ele foi o meu primeiro nota dez, que
eu queria arriscar porque ele me disse que quer isso, ele me quer,
mas nunca imaginaria que ele fosse tão rápido assim! John nem me
contou que dará um jantar para oficializar a gente! Quer dizer,
estávamos oficiais? Eu sei que nessa semana não tivemos muito
tempo para conversar, mas por que DIABOS ele não me disse
isso?! Sem contar que Lúcifer veio até mim hoje e disse que eu não
sou boa o bastante para o seu filho, me ameaçando! QUEM ela
pensa que ela é? Oh meu Deus, o que ela vai dizer amanhã no
Baile, quando ver que John irá me acompanhar? E O QUE ELA
DIRÁ PARA DONATELLA? E se ela fizer algum comentário
maldoso, porque ela ama fazer isso! E O MEU VESTIDO? O que eu
vou fazer? — choraminguei, tagarelando sem parar como costumo
fazer quando estou nervosa, e um pouco bêbada também, mas
meus devaneios cessaram quando senti a mão de Nigel atingir em
cheio meu rosto, mas sem força.
— PARA! SE ACALMA GAROTA! Pelo amor de Deus, assim
você vai me deixar maluco! — disse, me chacoalhando pelos
ombros.
Eu estou com muita vontade de chorar agora. Como eu odeio
TPM misturada com fortes emoções!
— Ok — murmurei, tentando engolir o choro.
Senti Shantell me abraçar, numa tentativa de me acalmar.
— Tudo bem, vamos por partes! — disse Nigel, sentando em
seu sofá macio, enquanto Kate enchia os copos novamente.
— John, finalmente, é o seu dez? — perguntou Shantell,
sorridente.
Confirmei com a cabeça, sorrindo.
— Ah! Isso é maravilhoso Sofy! Você não percebe?
— Percebe o que? — Kate e eu perguntamos ao mesmo
tempo, fazendo Shantell e Nigel bufarem.
— Ele é o seu dez porque você o ama! Não foi somente sexo
dessa vez! Vocês fizeram amor! Você se permitiu isso Sofya, porque
a verdade é que John sempre foi seu 10!
— Você acha mesmo que aquele homem era um mísero 9,5?
Amor, pelo amor de Deus, ACORDA! Até nos meus sonhos eróticos
John é nota 10! — exclamou Nigel.
Oh Deus. Virei meu copo, desviando dos olhares
esperançosos.
— Isso é lindo, Sofya! — disse Kate, colocando a mão em seu
lado esquerdo do peito. — Finalmente alguém derreteu seu coração
de gelo! Estou emocionada! — continuou ela, tirando sarro da minha
cara, mas que logo parou quando lhe joguei uma almofada.
— Ok, mas e a mãe dele? E se estivermos indo muito rápido!?
Eu não sei se isso poderia dar certo... — falei, desesperada.
— Você não pode deixar essa mulher doida no caminho de
vocês. Está mais do que claro que vocês se gostam, Sofya! E eu
quero ver a minha melhor amiga finalmente com alguém que a
mereça ao seu lado!
Eu não quero pensar nisso agora, há muito se passando pela
minha cabeça. Me sentei, derrotada, olhando para o fogo da lareira.
— Tudo bem! — Nigel falou, se levantando com um bater de
palmas. — Tem algo aqui que vai colocar um sorriso nessa sua cara
de derrota, garota — continuou, indo pegar algo em sua suíte. — Eu
acho... — Surgiu ele novamente com o vestido mais lindo que eu já
tinha visto na vida, nos fazendo gritar! — Que você ficará
deslumbrante com este Balmain feito exclusivamente para você.
— O QUE? — bradei, correndo para ele.
— Não acredita? Tenho aqui a prova — disse, com um bilhete
escrito pelo próprio Olivier Rousteing, Diretor Criativo da Balmain.
OH. MEU. DEUS.
— Eu estou morrendo de inveja de você agora, sua vadia! —
falou Kate.
— Leia logo, Sofya! — gritou Shantell.
Peguei o bilhete, ainda com as mãos trêmulas e suspirei ao
abri-lo.
— “Querida Sofya, tivemos um encontro tão rápido que mal
podemos nos conhecer direito, mas foi o suficiente para ver a
mulher de garra e com todo o GIRLPOWER de que me falaram.
Nigel me disse que você ainda não tinha um vestido para o Baile,
por isso, aceite este modelo que fiz para você, e, se não se
incomodar, ele estará na coleção do próximo Paris Fashion Week.
Espero que goste e nos vemos lá! Com amor, Olivier Rousteing.”
Eu mal posso acreditar nisso! Peguei meu tão precioso vestido
em minhas mãos. Preto, cravejado de pedras pretas e com muitas
franjas, ele fará jus ao tema “Burlesco” deste ano. Ele é o vestido
perfeito, com a cara da Balmain!
— Awn, Nigel! — disse emocionada, o abraçando.
— Ah, por favor, não foi nada. E não deixe essa TPM te
consumir, garota, você está um poço de emoções!
É verdade, preciso me recompor. Engoli minhas lágrimas
novamente.
— Certo. Kate, preciso de você um minuto — Nigel falou.
— Para quê? Tem um vestido para mim também?
— Você vai de Dolce, querida, não reclame! Preciso do seu
drink de maçã verde, venha! — Nigel arrastou Kate para o bar do
seu flat, deixando Shantell, eu e meu lindo vestido a sós.
Vi meu celular vibrando, de novo.
— Você não vai atender... de novo? — perguntou Shantell. Já
tinha perdido as contas de quantas vezes John havia me ligado.
— Não, não estou preparada.
— Hey, fique calma. Amanhã dará tudo certo, afinal, é meu
aniversário! — disse ela, nos fazendo rir — Depois do Baile iremos
ao Pub comemorar e, principalmente, relaxar!
— Como eu poderia me esquecer da minha sagitariana
preferida?! — falei, a abraçando.
— Isso mesmo. Agora eu vou indo, Preston disse que tem uma
surpresa pra mim!
— Uh! Depois me conta! — gritei para ela, que já estava a
caminho da porta.
— Ok! E vê se relaxa, ok? — Me mandou um beijinho e fechou
a porta.
Sim, eu preciso relaxar, mas é impossível. Depois de muito
pensar e conversar com Nigel, decidi dormir aqui hoje. A verdade é
que não estou pronta para ver John e tenho certeza que ele está me
esperando chegar em casa, por isso enviei-lhe uma mensagem
dizendo que ficarei por aqui hoje, e que amanhã o encontraria no
Baile direto. O meu foco agora é não ter um ataque de pânico de
verdade.
Meu corpo ficou aliviado ao ver a beleza que está tudo isso
aqui! O Baile está perfeito, com a melhor decoração em anos! Sem
falar que Donatella disse estar no céu com o evento. Recebi muitos
elogios e tudo está ocorrendo maravilhosamente bem, tirando o fato
de que John ainda não apareceu. Já estavam todos aqui, inclusive
Shantell e Preston, que estão mais felizes do que o normal.
— Sofya — escutei a voz de John atrás de mim, me
chamando.
Virei e me deparei com o homem mais lindo do mundo à
minha frente, absolutamente maravilhoso com um smoking preto e
perfeito.
— Uau... — suspirei.
— Você está... deslumbrante — disse ele.
— Obrigada — respondi, tímida.
Ele veio em minha direção, mas seu semblante está caído.
Ele está estranho.
— Sofya o que está acontecendo? — perguntou,
exasperado.
— John...
— Aí estão vocês! Finalmente! — disse Preston com Shantell
ao seu lado, ambos sorridentes. — Os padrinhos do ano!
— O que? — John e eu perguntamos juntos.
Ainda mais sorridente, Shantell estendeu sua mão esquerda,
mostrando o anel de brilhante reluzindo em seu dedo. Surpresa,
levei minhas mãos à boca.
— Estamos noivos! — gritou ela, me pegando de surpresa
com um abraço afobado.
— Parabéns, cara! — John parabenizou, com um super hi-5
e um abraço apertado em Preston.
— Oh meu Deus, parabéns, Shant! — falei, ao desfazer
nosso abraço.
— Então você conseguiu, Shantell! Parabéns! — disse John,
ao abraçá-la.
— Engraçadinho! — falou ela, rindo.
— Estou muito feliz por vocês! Parabéns, Preston! — disse, o
abraçando.
Meu Deus. Minha melhor amiga vai casar! Novamente, meu
coração começou a acelerar.
— Obrigado! E vocês, hein? Será que serão os próximos? —
perguntou Preston.
Vi um garçom passar ao meu lado servindo taças de
champanhe e não hesitei em pegar uma, virando todo o conteúdo
goela abaixo em um só gole, fazendo Shantel dar um pigarro.
— Ahm, Baby, vamos deixá-los conversando um pouco. Nos
encontramos depois! — disse Shantell, arrastando Preston de volta
ao salão junto a ela.
Sem olhar para John, comecei a esfregar minha nuca em
uma atitude nervosa, até que John me fez encará-lo, puxando-me
pelos ombros, ficando de frente a ele.
— Por que você está fugindo de mim? — perguntou.
— Eu não estou fugindo de você! É que vem acontecendo
tanta coisa... — Olhei por trás de John e avistei Miranda nos
encarando.
Cinicamente, ela jogou-me uma piscadela e depois
desapareceu do outro lado do salão.
— John! Aí está você! Não tive tempo de lhe agradecer a
carona até aqui — disse Jenna, que está tão linda quanto qualquer
anjo do céu. — Obrigada! — continuou ela, dando-lhe um beijo no
rosto, e logo após me medindo de cima a baixo.
— Sofya — cumprimentou-me ela com desdém em um
aceno, e logo depois voltou para o centro do salão.
Me virei, quase sem fôlego, indo em direção a grande sacada
que dá ao Central Park.
— Sofya! — chamou John, atrás de mim.
Minha mão estava sob meu peito, suada e trêmula, assim
como a outra. Preciso me acalmar. E se Miranda estiver certa? E se
John, com seu jeitinho, me abandonasse também, como todos que
eu amei um dia fizeram? O que eu vou fazer? Eu não sei se sou
capaz de arriscar isso. Finalmente o ar gelado atingiu meus
pulmões. Novamente, John me virou para si, desesperado.
— Me escuta! Não fuja de mim, por favor! Aquilo não foi nada
além de uma carona! — justificou, pegando em meus cabelos no
alto de minha nuca, me olhando com um olhar triste.
— John, nós não podemos fazer isso. — As palavras saíram
da minha boca como se fossem navalhas, num sussurro quase
inaudível.
Ele agarrou mais meu cabelo, me trazendo para mais perto
dele, fazendo com que eu pegasse em seu braço que me agarra,
numa súplica. As lágrimas que eu estava segurando a dias caíram,
teimosas.
— Por favor...
— Não. Eu não vou deixar! Eu te disse que eu quero isso,
que eu te quero! E você sabe o porquê disso, não sabe? Eu sei que
no fundo você sabe, Sofya! — falou, agora agarrando meu rosto
com suas mãos grandes.
Fechei os olhos, covardemente negando, porque eu sei o
que ele quer dizer.
— Não John, por favor, não...
— Porque EU AMO VOCÊ, Sofya! — exclamou ele, me
chacoalhando pelos ombros, fazendo-me abrir os olhos novamente.
Seus olhos azuis e brilhantes que eu tanto amo estão em
tempestade.
— John, não... — supliquei.
— EU TE AMO, PORRA! Eu te quero para mim! Por que é
tão difícil para você aceitar isso, Sofya?!
— Eu não posso, John! Eu não consigo, me desculpa! —
Tentei controlar minha voz embargada, mas não tive sucesso.
No seu olhar, vi algo se partir, me destruindo da pior maneira.
Lentamente ele foi me soltando, dando passos para trás e olhando a
paisagem que nos rodeava, coçando sua barba.
— Você me disse que iria arriscar.
— John...
— MENTIROSA! — gritou ele, furioso, fazendo com que eu
fechasse os olhos de novo. — Acima de tudo, Sofya, TÍNHAMOS
UMA AMIZADE! — continuou, apontando o dedo para mim.
— John, por favor... — Tentei me aproximar dele, mas parei
ao notar que ele deu outro passo para trás, querendo distância.
— É isso o que você quer, não é? Parabéns, Sofya,
conseguiu! E quer saber? Se você não quer ter isso, TAMBÉM NÃO
TERÁ MAIS A PORRA DA MINHA AMIZADE!
— Não, John! — Coloquei minhas mãos na boca, tentando
controlar as lágrimas que caem sem parar.
— Nossa amizade acaba aqui, Sofya. Adeus — falou, saindo
apressadamente da grande sacada.
Um nó na boca do meu estômago me impedia de respirar e a
dor em meu coração é ainda pior do que me lembrava... uma coisa
tão horrível na qual eu nunca havia sentido antes. Eu preciso sair
daqui... mas estou sem rumo.
— Sofya! O que aconteceu? — questionou Shantell, me
acudindo.
— Preciso sair daqui — sussurrei.
O que eu fiz?
Ainda não consigo acreditar que Sofya fez isso comigo. Ela
tinha me dito que iria arriscar, que iria tentar... e aqui estou eu,
enchendo a cara novamente em um bar barato, com strippers
baratas, para ver se essa dor irritante em meu peito some,
procurando alguma forma de esquecê-la. Estou hospedado em um
hotel há uma semana, somente para não ter que cruzar com ela de
alguma forma, e somente Preston sabe disso. Há uma semana que
eu não a vejo, não ouço a voz dela e recuso todas as suas
insistentes ligações, que por falta de uma resposta cessaram ontem.
Preston me disse que ela também está arrasada. Ela está arrasada?
E eu? Ela pensou em algum momento em como estou me sentindo?
Pensou que o GRANDE IDIOTA aqui disse “eu te amo” com todas
as letras e a única coisa que consegui com isso foi ser humilhado
por ela?! Eu pensei que ela fosse grandinha o suficiente para deixar
o passado dela de lado, já que a provei de todas as maneiras que
eu estava ao seu lado!
Virei outro copo de whisky e já perdi as contas de quantos
havia tomado, de quantas vezes fui à academia nesta semana e
destroçado centenas de sacos de areia para descarregar minhas
energias. Deus, preciso tirar essa garota da minha cabeça, não
posso deixar isso me consumir!
— Vai com calma, rapaz! Preciso de você na ativa amanhã —
escutei Rhodes falar, sentando-se ao meu lado. — Você anda muito
pilhado esta semana, o que aconteceu?
— Nada com que deva se preocupar, chefe — respondi, dando
outro gole em meu whisky e olhando a stripper fazer o seu show.
— Hum, sei. É aquela baixinha marrenta, não é?
Mas como ele sabe? Olhei para ele, com meu cenho franzido e
com essa pergunta estampada em minha cara, o fazendo rir e
balançar a cabeça.
— É, logo deu para notar.
— E como o senhor sabe?
— Não me entenda mal, rapaz, mas a sua fama de
mulherengo está em baixa nestes últimos meses, e naquela noite
em que ela nos ajudou na boate eu vi como você ficou preocupado.
Com certeza não era só por isso que ele sabia.
— Foi meu pai, não é? — perguntei, o fazendo erguer as
sobrancelhas.
— Tudo bem, foi ele sim, mas já estava na cara — confirmou
ele.
Bufei e continuei a olhar para a stripper, que está com os olhos
grudados em mim desde o começo do seu show.
— Olha, seja lá pelo que vocês se desentenderam, deixe isso
de lado. Encher a cara num bar não vai adiantar nada, rapaz. Vá
para casa e se acerte com ela.
— Não há nada o que acertar com ela, Rhodes. Eu fui chutado
e lidarei com isso da minha maneira. — Peguei minha carteira e
paguei o barman. — Agora, se me der licença, vou indo.
Me despedi dele sem olhá-lo, saindo do bar e indo em direção
a stripper que se retirava do palco. Eu irei lidar com meus problemas
da maneira que sempre lidei, ou seja, da maneira que sempre me
fez bem e, principalmente, relaxar e descarregar as energias com
um bom sexo selvagem. Apenas de calcinha e sutiã, a loira que
ainda me encarava de maneira maliciosa, parou ao me ver se
aproximar.
— Vamos sair daqui, querida? — perguntei, na minha melhor
voz de cafajeste.
— Achei que não iria perguntar — respondeu, se aproximando
de mim.
Que se foda.
Nigel sempre me alertou, “cuidado, querida, quando sua vida
profissional estiver nas alturas, significa que sua vida pessoal estará
no inferno”, e estou tirando isso à prova neste momento da minha
vida. Donatella ficou tão feliz com meu trabalho que, além de me dar
um aumento, me quer ao seu lado em todos os maiores
acontecimentos e eventos do ano. Sem contar que a Paris Glam me
propôs uma oferta magnífica de “intercâmbio de redação” por seis
meses, já que meu "excelente trabalho” chegou aos ouvidos de
gente muito importante, segundo as palavras da diretora de redação
de Paris, Emmanuelle Delacroix, a qual é uma excelente colega.
Tudo isso seria perfeito, tirando o fato de John não querer mais ao
seu lado. Eu perdi as contas de quantas vezes o liguei, mandei
mensagem e invadi seu apartamento, que está vazio desde a noite
do ocorrido. Eu não sei o que fazer... eu até ameacei Preston com
minha pantufa em uma das vezes que ele veio até aqui para buscar
Shantell, mas de nada adiantou, já que ele foi claro em não dizer
onde John está.
Depois do que aconteceu naquela noite eu fugi... fugi de tudo o
que me assombrava durante aqueles dias e chorei, como nunca
havia chorado antes. Eu estava tão confusa, tão perdida, não
deveria ter agido daquela maneira com John, não deveria ter
deixado a mãe dele vencer e, principalmente, não deveria ter
deixado ela falar aquelas coisas para mim. Fui uma garota tola,
diferente da mulher decidida que venho sendo durante anos, me
deixei ser consumida pelo pânico. Claro que minha TPM ajudou
também, mas não posso colocar a culpa de tudo em cima disso.
Além de chorar, nunca havia comido tanto chocolate e sorvete como
comi nesta última semana, até finalmente acordar para a vida e
resolver agir. Eu não posso perder John, não posso perder a
amizade que cultivamos durante meses, afinal, somos parceiros. Eu
não posso e NÃO VOU perdê-lo, mesmo que tenha que deixar meu
orgulho de lado para isso.
Durante esses dias difíceis, o apoio dos meus amigos foi
fundamental para mim. Nigel, Kate e Lea não me deixaram recair
durante todos os dias na redação, me ajudando em tudo o que eu
precisasse. E Shantell, a irmã que nunca tive por laços sanguíneos,
mas que tenho pelo coração. Não tenho palavras para descrever
seu apoio. Confesso que, se não fosse por ela, eu não teria forças
para encarar os fatos e ir atrás de John, e também, graças a ela, eu
não aceitei a oferta de Emmanuelle para ir para Paris, com a real
intenção de fugir de tudo isso, como a covarde que estava sendo.
Ela disse que vai pedir a Preston para que John volte para casa, e
assim eu pudesse conversar com ele melhor, dizer tudo o que não
tive coragem de dizer antes. Por isso, aqui estou eu, embrulhando o
presente de Natal dele com um papel pardo e uma fita vermelha,
olhando para o cartão de Natal — que mais parece uma carta —
que escrevi para ele na tentativa de me redimir, pensando nos
nossos dias maravilhosos em Miami, de onde surgiu a ideia deste
presente.
“Querido John,
Eu sei que isso deveria ser um cartão de Natal, porém fiz dele
uma carta, pois sei que poucas palavras como “Feliz Natal” e
“desculpas” junto a minha assinatura não serão suficientes para te
dizer o quão arrependida estou. Deixei que meu medo e minhas
dúvidas confundissem minha cabeça, fui tola e fugi do que estou
sentindo, mas não quero mais fugir disso.
Se me der mais uma chance, irei me arriscar, como tinha lhe
prometido. Estou disposta a viver tudo o que vivemos em Miami
todos os dias, só que aqui, em Nova York. Estou disposta a ter isso
todos os dias com você. Quero isso e quero você ao meu lado, e se
você não estiver ao meu lado, não irei conseguir sozinha. Somente
eu e você já me basta e será o suficiente para mim.
Acredite, eu queria estar te dizendo tudo isso na sua frente,
mas você sumiu, e a única maneira que encontrei foi colocar essas
palavras no papel para que elas nunca mais se percam, com a
esperança de que você possa ler e voltar para mim um dia. E se
isso acontecer será o melhor presente de Natal que já tive na vida.
Me desculpe, e volte para mim!
Feliz Natal, Ursão.
Com amor, Garota Rolling Stones/Boneca ou Sofya.”
— Kate...
— Não, Sofya, você não tem noção da bagunça que está isso
aqui! Nós temos que entregar isso amanhã e eles ainda não
chegaram! Esse blackout fodeu a gente! Estamos sem
computadores e Donatella não para de ligar para Nigel! — exclamou
Kate, desesperada no telefone.
Hoje pela manhã, Nova York sofreu outro dos seus famosos
blackouts, deixando todos sem energia elétrica. A energia está
voltando aos poucos, mas nem mesmo os geradores foram o
suficiente para segurar a barra da redação. Respirei fundo, pegando
minhas coisas correndo e engolindo uma maçã. Por sorte, John saiu
mais cedo hoje também, deixando o caminho livre para eu sair em
“paz”.
— Kate, me escuta, estou voando pra aí. Vamos resolver isso!
— Fechei a porta e coloquei meu casaco.
— VEM LOGO! — gritou, desligando o telefone na minha cara.
— Merda! — Corri em direção à escada, mas congelei ao ver
John bem na minha frente. — Ótimo. Era o que faltava — sussurrei.
— Você não me deu escolha —disse ele. — Preciso falar com
você.
— Você já me disse tudo o que tinha para me dizer — falei,
sem esconder a mágoa em minhas palavras.
Novamente, meu coração pula em meu peito. Tentei desviar
dele para seguir meu caminho, mas aquela parede humana
me bloqueou de novo.
— Sofya, por favor. Eu sei que você tem todos os motivos do
mundo para isso, mas eu preciso fazer isso — sussurrou,
completamente desestabilizado.
Bufei e cruzei meus braços no peito, esperando.
— Eu sei que o que eu fiz não tem perdão, mas quero te dizer
que sinto muito, sinto muito mesmo. Eu estava de cabeça quente e
quero que saiba que aquilo que falei não é verdade, e me arrependo
disso. Espero que um dia você possa me perdoar — continuou, com
aqueles olhos azuis irritantemente lindos e arrependidos para mim,
feito um cachorro arrependido.
— Deveria ter pensado nisso antes, porque agora já não me
importa mais — respondi.
Ele abaixou o olhar quando minhas palavras o atingiram.
— Tenho que ir agora. — Desviei, mas ele agarrou meu braço,
fazendo com que eu o encarasse. — Me solta!
— Pelo menos pense nisso, Sofya, por favor. Eu fui um
completo idiota e não posso te perder — choramingou, a
centímetros do meu rosto.
— Me solta, agora — rosnei.
Ele me soltou, ainda me encarando, esperando que eu o
respondesse.
— Como eu disse antes, já não me importa mais, John. Na
verdade, nem a você importa, já que Jenna voltou, não é? — soltei,
sem ao menos pensar! Mas que droga, Sofya!
— O que? Não! Jenna não tem nada a ver com isso, Sofya!
Por favor, mesmo que eu não mereça mais sua amizade, preciso
saber se me perdoa!? — perguntou, em uma súplica.
— Eu tenho que ir — Comecei a descer a escada
apressadamente, com ele me seguindo.
— Sofya! — chamou ele.
Entrei no meu carro e dei a partida, sem olhar para trás.
“Querida Sofya,
Sei o quanto meu filho errou com você e sei que ele não
medirá esforços até que você aceite o perdão dele, coisa na qual
estou contando. Mas até que isso não aconteça, espero que aceite
essas flores para alegrar seu dia, afinal você é uma garota incrível e
a filha que nunca tive.
Espero lhe ver em breve, minha querida.
Com amor, Leon Neeson.”
John está machucado, mas Steve saiu daqui bem pior. Lembra
quando eu disse que não era trouxa? Era mentira, se tem uma
pessoa para ser trouxa nessa vida sou eu, porque aqui estou, no
apartamento de John, cuidando dos seus machucados. Agora sou
eu quem queria me socar. Queria não me importar mais, mas não
consigo, é mais forte que eu.
— Para quieto, por favor! — pedi para ele, que
está encostando na cadeira, tomando whisky direto da garrafa.
Terminava de dar pontos em seu corte e de limpar o resto do
sangue com algodão.
— Pronto. Agora vê se não faz outra besteira que possa abrir
os pontos.
Novamente ele levou a garrafa à boca, dando um super gole.
— John, me dê isso aqui. Chega, você já bebeu demais. —
Tirei a garrafa das suas mãos.
— E que escolha eu tenho? Se eu não tenho mais você?
Agora você quer tirar minha garrafa também?
— Cala boca, John! — O ignorei e fui em direção ao freezer,
pegar gelo para minha mão.
— Volte para mim — sussurrou ele em meu pescoço, me
fazendo pular.
Suas mãos me agarraram pela cintura, chegando em mim do
jeito que eu mais gosto... ai meu Deus, Sofya, não!
— John, me larga — disse, pegando o pouco de sanidade que
ainda me restava e tirando as mãos dele de mim.
Voltei à sala e peguei minhas coisas, obstinada a sair daqui.
— Por favor, me perdoe... me perdoe! — continuou ele, se
ajoelhando e me abraçando pela cintura, com sua cabeça
encostada em minha barriga. — Eu não consigo ficar sem você! —
balbuciou, completamente desesperado.
Respirei fundo, olhando para o teto para evitar as lágrimas que
ameaçavam cair. Eu não posso, não posso.
— John... preciso ir agora — disse, com a voz embargada, me
livrando do seu aperto e fugindo rapidamente para meu
apartamento.
Assim que entrei, peguei meu celular e liguei para quem eu
mais precisava ligar nesse momento.
— Alô?
— Preston! Graças a Deus!
— Sofya? O que aconteceu? Está tudo bem?
— É o John.
— O que tem ele? O que aconteceu? — perguntou ele, aflito.
— John me viu com Steve, e os dois tiveram uma briga
horrível. Ele está muito bêbado e se machucou, tentei cuidar dos
ferimentos dele, mas acho que não é bom que ele fique sozinho.
— Mas que merda! Ok, obrigado por avisar, Sofya, estou a
caminho — falou, encerrando a chamada.
Logo após eu desligar, meu celular tocou novamente.
— Alô?
— Espero que você esteja trancada e segura em seu
apartamento agora — disse Steve.
— Estou sim, você está bem?
— Acabei de cuidar disso, não se preocupe. E a sua mão?
Olhei para ela e percebi que ainda está inchada. Fui para a
cozinha, apanhar um pouco de gelo.
— Estou cuidando disso, não se preocupe você também.
— Certo, queria conversar mais, mas não posso. Nos vemos
em breve, ok?
— Ok, se cuida.
— Você também — falou, encerrando a ligação.
Eu não consegui relaxar, pensando em John do outro lado da
parede, pensando se ele está mesmo bem. Andava pra lá e pra cá,
com o gelo em minha mão, até que escutei barulhos do lado de fora
e minha campainha tocar.
— Graças a Deus! — Fui em direção à porta, a abrindo com
tudo. — Pres...
— Eu não vou desistir de você — disse John, decidido,
andando em minha direção, enquanto eu tentava recuar.
— John, vá para a casa — sussurrei, enquanto ele fechava a
porta atrás de si.
— Eu não vou até você me dizer que não me quer mais —
murmurou.
Sem saída, estava encostada na parede, enquanto ele
avançava para mim, com seu olhar de caçador. Com um puxão, ele
agarrou minha cintura, me trazendo para si, enquanto sua outra mão
me agarrava pelo alto da nuca, puxando um tufo do meu cabelo.
— Olha para mim, e me diga — falou baixinho, perto dos meus
lábios.
Meu coração acelerava, e fechei meus olhos para dissipar
minha vontade de estar nos braços dele de novo. Mas ele me
possuía, com cada respiração que eu inalava seu cheiro, com o
calor do seu corpo junto ao meu, com seu olhar... meu controle se
perdia. Ele ergueu minha cabeça ainda mais, fazendo com que eu
voltasse a encarar seus olhos azuis selvagens.
— Diga!
— John, por favor...
— Resposta errada. — Ele tomou minha boca de maneira
possessiva e urgente para si, num beijo que me provoca até a alma
com seu calor.
Me prensou na parede com seu corpo, me agarrando de uma
maneira como se não quisesse mais me soltar jamais. Eu estava
nos braços dele novamente, completamente e perdidamente rendida
a ele, numa paixão avassaladora.
— John! ABRA A PORTA, CARA!
De repente, como se fosse mais uma chance para que eu
acordasse dessa loucura, escutamos batidas na porta ao lado.
— Sofya! Abre! — chamou Shantell, batendo na minha porta.
Graças a Deus. Interrompi nosso beijo e, com dificuldade, saí
dos braços de John, me ajeitando.
— Droga! — reclamou, dando um soco na parede.
— Vá embora, John — pedi, ao abrir a porta.
— Hey! Você está... John? — disse Shantell, surpresa.
— Jesus, cara. O que aconteceu com você? — perguntou
Preston ao ver o amigo machucado.
— Isso não acabou aqui — sussurrou John ao passar por mim.
— Vem, vamos entrar — disse Preston, o levando para o
apartamento ao lado.
— Mas que merda aconteceu aqui? — perguntou Shantell,
entrando em casa.
— Todas as merdas possíveis.
Como eu disse: trouxa, eu sou muito trouxa! Fui para a
cozinha, pegando a vodka na geladeira. Agora quem precisa ficar
bêbada sou eu.
Tive que insistir com Shantell e Nigel que eu realmente queria
ficar em casa na virada de ano. Eu sei que é muita deprê, mas não
estou a fim de festas. A verdade é que eu não suporto essas festas
de fim de ano, e as desse ano fizeram com que eu as odiasse ainda
mais. O que aconteceu entre eu e John mexeu muito comigo, e
pensando em tudo o que aconteceu nas últimas semanas, minha
crise de ansiedade se deve a ele também. Novamente, na noite
passada, assim como em todas as outras noites, eu não consegui
parar de pensar nele. Mas que droga! Eu jurei para mim mesma que
não ficaria assim por alguém nunca mais em minha vida. Mas não,
outra pessoa foi embora da minha vida, partindo e me deixando
despedaçada. Não posso simplesmente perdoá-lo, pois sei que ele
irá fazer de novo, é o que ele é... esse é o John.
Peguei outra garrafa de vinho enquanto a música Time After
Time, da Cyndi Lauper, toca em minha vitrola, aliás, selecionei
várias coletâneas de fossa para hoje. Já é quase meia noite, e
mesmo com esse frio lá fora, e querendo ficar por aqui mesmo,
decidi ver os fogos de artifício do topo do prédio. Coloquei um
casaco bem quente, um gorro e minha bota UGG, sem esquecer
dos clips para “abrir” a porta, já que não tenho a chave. Abri a porta
de incêndio, subindo em direção a porta que dá ao topo do prédio e,
sem muita dificuldade, a abrindo com um simples clips. Assim que o
ar gelado da cidade bateu em meus cabelos, vi que o show de fogos
de artifício começava em toda parte, anunciando que já era meia
noite. Dei um grande suspiro, fazendo minhas preces mentais para
este novo ano que começou. Os fogos brilham no céu, olhei em
volta e as lembranças da última vez que estive aqui me atingiram. O
piano de John está coberto, e no fundo da minha mente, eu posso
escutar as músicas que ele tocou para mim naquela noite. Como foi
bom.
Fechei meus olhos, implorando para Deus que o tirasse da
minha cabeça. Depois de um tempo, refletindo, purificando meus
pulmões com o ar gélido e criando boas energias para um bom
começo de ano, vi os fogos de artifícios deixarem o céu, e essa era
a minha deixa. Assim que me virei para voltar para meu
apartamento, vi John parado a uma certa distância de mim, me
olhando. Ele está com o olho roxo e feições de tristeza, vestindo um
terno preto, uma camisa branca e um sobretudo preto por cima.
— Como... como você soube que eu estava aqui? —
Perguntei.
Ele ergueu um clips e falou.
— Segui os clips. Você não para de me surpreender — falou,
dando seu sorriso torto que eu tanto amo.
Assenti com a cabeça e voltei a andar, indo em direção à
porta.
— Feliz Ano Novo, John — disse ao passar por ele, mas parei
ao sentir sua mão me puxando pelo meu braço, me deixando à sua
frente.
— Você não respondeu.
— Responder o que John? Não tem nada o q... — sussurrei.
— Tem sim, Sofya! Se você me disser que não me quer mais,
eu te deixarei em paz — sussurrou ele a centímetros do meu rosto.
— Caso contrário, eu juro que nunca mais vou deixá-la sair da
minha vida… e nunca mais serei idiota de te perder de novo.
— John... — pedi com a voz embargada, tentando segurar as
lágrimas.
— Sofya, me responde! — exclamou ele, me dando um
chacoalho de leve.
Fechei os olhos, liberando as lágrimas teimosas pelo meu
rosto. Deus... eu não quero mais sofrer, não posso mais sofrer. Abri
os olhos encarando os lindos olhos azuis ansiosos de John.
— Eu não te quero mais — sussurrei.
Foi como engolir fogo. Eu pensei que meu coração já estivesse
partido, mas nada se compara a dor que estou sentindo agora, ao
ver as lágrimas de John presas em seus olhos.
— Me deixe em paz, por favor.
— É isso mesmo o que você quer? — sussurrou, controlando
sua voz.
Sem coragem de responder em voz alta, assenti com a
cabeça. Devagar, ele me soltou, coçando sua barba e olhando para
o céu. Dando passos longos para trás, ele voltou a me encarar, com
seus olhos azuis brilhantes por causa de suas lágrimas não
derramadas.
— Não foi real, não é? — sussurrou ele.
Usando toda a minha força, prendi o choro em minha garganta
e sequei os vestígios das lágrimas teimosas.
— Espero que seja feliz, Sofya, você merece. Adeus — disse,
entrando pela porta e sumindo de vista.
Sem força nas pernas, desabei no chão, colocando a mão em
meu coração que sangrava, liberando o choro contido. E depois de
chorar rios inteiros, desci para meu apartamento, olhando para a
porta dele, antes de entrar pela minha. Estou em frangalhos...
destroçada. Escutei meu celular vibrar com uma mensagem e vi que
era de Steve, perguntando se estou em casa. Não quero ver mais
ninguém hoje, por isso menti e disse que só voltaria amanhã. Fui
para minha cama, e só parei de chorar quando o sono chegou...
trazendo de volta meus piores pesadelos.
Depois de fazer com que ela bebesse muita água, a levei para
o banheiro e deixei a banheira enchendo com água quente. Ela
parece estar em choque, não disse mais nada. Irei fazer tudo o que
Marion me instruiu a fazer pelo telefone, caso não desse certo, eu a
levarei para o hospital. Fui tirando suas roupas molhadas pela neve
até que ela estivesse totalmente despida. A água está bem quente e
devagar fui a colocando na banheira. Sentada, ela abraçou os
joelhos novamente, olhando fixo para frente. Peguei a esponja, a
molhando com água e passando em seus ombros. Com o esguicho,
lavei seus cabelos, que foram ganhando vida novamente. Ao lavar
seu rosto, percebi que suas pupilas estão voltando ao normal. Eu
odeio vê-la assim e daria tudo para que a dor que ela está sentindo
parasse, para que assim ela pudesse voltar a ser a garota que era
antes. A minha garota.
— Hey — sussurrei, passando minha mão em seu rosto. —
Boneca...
Parecendo acordar de um transe, ela voltou seu olhar para
mim, ainda com seus braços presos nos joelhos.
— Me leva para casa, John — sussurrou.
— Não vou deixá-la sozinha, Sofya. Eu tinha prometido te
deixar em paz, mas não sei se sou capaz de fazer isso — confessei.
— Somente por hoje, me deixa cuidar de você.
Ela ainda me olhava, e seus olhos diziam que ela queria soltar
suas lágrimas, mas como sempre, ela engoliu em seco, voltando a
encarar a parede em sua frente. Eu quero muito saber o que
aconteceu neste tempo em que ela sumiu, mas, a conhecendo do
jeito que a conheço, ela está abalada pelo motivo que a fez cometer
essa loucura, pelo pai que a abandonou. Ela está fazendo de tudo
para não chorar, se mostrando forte.
— Sofya, fale comigo, eu ainda estou aqui. Não faça isso com
você, coloque isso para fora, se permita jogar tudo isso para fora.
Ninguém pode ser firme todo tempo, eu sei disso — falei baixinho,
pegando suas mãos.
Ela voltou a me olhar e seus olhos já estão normais, assim
como seu corpo que já não treme mais. Ela começou a suspirar e
suas lágrimas começaram a cair, furtivamente, como a comporta de
uma represa sendo rompida. Seu choro ecoou no banheiro, e seus
soluços encheram seu peito. E lá está... a garota que ela
esconde do mundo em sua casca de mulher forte e destemida que
é. Uma garota que havia perdido a mãe e que foi abandonada pelo
pai, sem tempo a perder com choro ou sentimento de piedade
consigo mesma. A garota que precisava desse momento, a garota
que eu estava vendo pela primeira vez. Tão jovem e com um fardo
horrível em suas costas.
— Está tudo bem — consolei ela, me aproximando mais.
— N-não es-t-tá nã-o — soluçava. — Co-mo e-ele po-po-pôde
f-fazer iss-o comi-comigo, J-John? — continuou ela, chorando sem
parar.
Me levantei, tirando meus sapatos e minha calça, entrando na
banheira de regata e cueca, ficando de frente para ela.
— Sim, eu sei — A trouxe para mim, colocando sua cabeça em
meu peito e afagando seu cabelo.
Ela se afastou de novo, me olhando com seus olhos chorosos.
— É por c-causa dele que eu n-não tenho coração. Eu não
posso mais confiar em ninguém por-porque ele levou m-meu
coração de m-mim — continuava soluçando.
Então era isso. Como se tudo fizesse sentido, o porquê de
estarmos assim, o porquê de termos seguidos caminhos diferentes,
nos separado.
— Eu tenho medo d-de não p-pod-der a-amar ma-mais, John.
A abracei, num abraço apertado, tentando cessar sua dor.
— Isso não vai acontecer — Beijei o topo de sua cabeça
enquanto ela ainda pranteava em meu peito. — Não vai.
A retirei da banheira, a secando gentilmente e a vestindo com
um dos meus moletons, cueca e meia. Assim que chegamos,
aumentei a temperatura do aquecedor para que ela se sentisse
melhor, mesmo eu já estando derretendo. Com dificuldade, penteei
seus cabelos molhados tentando ser o mais delicado possível, coisa
que nunca havia feito na vida, mas aparentemente tinha
conseguido. A coloquei sentada na cama, e fui me trocar, colocando
uma calça de moletom e uma regata branca. Ela parou de chorar,
mas continua aérea e olhando fixo para algo, envolta em seus
pensamentos. Ela precisa se hidratar e comer alguma coisa, fui até
a cozinha e preparei um sanduíche natural e um suco de laranja.
Quando eu voltei ao quarto, ela está abraçada aos joelhos
novamente.
— Hey, você precisa comer, coma isso aqui — disse, mas ela
nem se mexeu. — Sofya? — chamei, levantando seu rosto.
Ela olhou para o lanche e resmungou enquanto eu insistia. De
repente ela ficou de pé, colocando as mãos na boca com a intenção
de vomitar, indo em direção ao banheiro, mas caindo no caminho.
— Vem cá — falei, a pegando e a levando para o vaso
sanitário.
Como da outra vez, ela tentava, mas nada saia, então tive que
agir.
— Eu te disse que não iria fazer isso de novo, mas é
necessário, me desculpe Boneca.
Mesmo ela se debatendo em meus braços, enfiei meus dedos
em sua goela, a fazendo se engasgar e começar a regurgitar,
vomitando logo em seguida. Segurei seus cabelos, enquanto ela
vomitava. Assim que ela terminou, seu corpo ficou ainda mais mole
e a puxei para a pia do banheiro, a colocando sentada lá e a
limpando novamente. Completamente grogue, ela mal podia deixar
seus olhos abertos e decidi checar sua temperatura.
— Meu Deus, você está muito quente.
A peguei no colo novamente e a deitei em minha cama,
escutando a campainha. Fui em direção a porta, a abrindo.
— Marion?
— Olá, John... eu fiquei preocupada, como ela está? —
perguntou.
— Entre — falei, a convidando. — Eu não sei, ela ficou
exposta ao frio, sua imunidade está baixa, eu tentei alimentá-la, mas
ela não quer. Ela acabou de vomitar e acho que está com febre.
— Oh Deus. Onde ela está?
— No quarto, venha comigo — pedi, enquanto ela me seguia.
Sofya ainda está deitada, enrolada no cobertor. Marion sentou-
se ao lado dela, colocando a mão em sua testa.
— Ela está muito quente. Preciso de um termômetro e
compressas de água fria.
— Vou providenciar — falei, e fui atrás do que ela havia
pedido.
Fiquei aliviado quando vi que ela veio. Marion realmente é o
que meu pai sempre disse, um anjo.
— Aqui — disse, lhe entregando as coisas.
Ela colocou o termômetro embaixo do braço de Sofya, levando
a compressa gelada a sua testa em seguida.
— 38 graus de febre, isso não é bom. O que aconteceu para
ela ter chegado assim? — perguntou, enquanto cuidava de Sofya
com carinho.
— Ela se descontrolou quando viu o pai que a abandonou em
sua porta.
— Oh, pobre criança.
— E depois ela saiu daqui atordoada, ainda não sei para onde
ela foi, o que aconteceu, mas ela disse que colocaram algo em sua
bebida. Sofya nunca faria isso com si própria — falei, observando
Marion cuidar dela, cruzando meus braços no peito.
— Claro. John, preciso que compre alguns remédios, a febre
precisa baixar.
Ela fez uma lista e eu saí atrás dos remédios, voltando meia
hora depois. Sofya ainda está apagada na cama.
— Aqui está. Ela melhorou?
— Ainda na mesma, mas creio que isso irá ajudar por agora —
Ela pegou os remédios. — Me ajude aqui.
Com dificuldade, fizemos com que Sofya tomasse os
remédios, e deitasse novamente depois. Marion sentou-se ao lado
dela, passando sua mão nos cabelos de Sofya, em um gesto
carinhoso. Sentei-me na beira da cama, observando a cena.
— Agora é esperar pelo melhor — disse ela, dando um meio
sorriso.
— Não sei como te agradecer, Marion.
— Não precisa. Eu gosto de Sofya, é um prazer ajudar.
— Posso te fazer uma pergunta?
Surpresa, ela me olhou com receio.
— Pode.
— Parece que você já enfrentou isso... quer dizer, quando
Sofya ficou assim na casa dos meus pais, você também soube lidar
com a situação. — Ela murchou a cara, como se lembrasse de
coisas desagradáveis. — Me desculpe, eu não deveria...
— Não, está tudo bem. Eu tinha uma irmã mais velha, nós
éramos muito apegadas uma à outra. O nome dela era Meredith.
Perdemos nossos pais bem cedo, em um acidente de carro, e minha
avó ficou cuidando de nós depois disso. Ficamos tão abaladas... foi
difícil para nós, principalmente para Meredith, que nunca mais foi a
mesma depois disso. Ela já era uma adolescente na época, e
começou a ficar muito rebelde depois que ficamos órfãs, andando
com más companhias e fazendo besteiras. Até que virou uma
viciada em drogas. Ela deixava nossa avó louca — riu ela
nostálgica. — Eu fazia de tudo para ajudá-la, éramos irmãs, afinal.
Mas ao passar dos anos, seu vício foi ficando cada vez pior e
insustentável. Meredith estava cada vez mais se perdendo, perdi as
contas de quantas vezes fui buscá-la em lugares horríveis, de
quantas vezes precisei cuidar dela, sair do trabalho para ajudá-la, a
levando para hospitais — falou com a voz embargada, tentando
controlar o choro. — Até que recebemos a terrível notícia... eu
nunca vou me esquecer das palavras do médico. — Ela deixou suas
lágrimas caírem. — Meredith tinha contraído o vírus da AIDS.
Deus... foi tão difícil. Naquela época, diferente de hoje, quem
recebia esse tipo de diagnóstico era como receber sua sentença de
morte. — Ela colocou suas mãos em seu rosto, tentando limpar
suas lágrimas, soltando um riso nostálgico depois. — Eu já tinha
conhecido seu pai naquela época e não sei o que seria de mim, de
nós, se não fosse por ele. Ele pagou o tratamento dela, até que
algum tempo depois, ela faleceu. Eu sinto falta dela até hoje.
— Meredith deve ter orgulho de você, Marion — sussurrou
Sofya, pegando na mão de Marion, nos deixando surpresos.
Marion deu um sorriso, agachando-se no chão e ficando de
frente a Sofya, que a olhava com seus olhos inchados, ainda
deitada.
— Hey. Como se sente? — perguntou Marion, colocando a
mão na testa de Sofya. — Não está mais tão quente, a febre deve
ter passado.
— Estou bem. Na verdade, eu não sei o que pensar — Sofya
falou baixinho, com a voz embargada novamente. — Estou tão
confusa, Marion... — Ela abraçou Marion e chorou.
— Oh, querida. Eu sei. — Me levantei e saí, para lhes dar
privacidade.
Sofya precisa de uma figura materna neste momento e Marion
é a pessoa certa.
— SOFYA!
Abri meus olhos, ainda sem ar, tremendo. O que aconteceu?
Olhei para Steve, que mantém as mãos em meus ombros, me
olhando de maneira assustada.
— O que aconteceu? Eu a escutei gritar! — John questionou,
ao entrar no quarto abrindo a porta violentamente, com Preston logo
atrás dele.
Olhei em volta e estou em um hospital... de novo.
— Foi um daqueles pesadelos, não foi? — perguntou Shantell,
colocando a mão em minha testa, tentando me confortar.
Deus. Acho que nunca tive um pesadelo tão horroroso como
esse. Voltei a me deitar, fechando os olhos e tentando recuperar
meu fôlego.
— Sim.
— Pelo amor de Deus! O que você ainda estava fazendo aqui?
— rosnou Steve para John.
Juro que eles ainda vão me matar.
— SE VOCÊS NÃO QUISEREM QUE EU DÊ UM
ESCÂNDALO NESSE HOSPITAL, É BOM NÃO COMEÇAREM DE
NOVO. E É MELHOR NÃO ME PROVOCAREM — rosnou Shantell,
ficando com aquela cara de nervosa que me dá medo. — Steve,
você sabe muito bem que John é mais teimoso que uma mula e que
não irá sair daqui, então VÊ SE CÊ CONTROLA E FOCA NELA! —
disse ela apontando para mim, ameaçando Steve com o olhar. — E
VOCÊ? Se não se controlar, eu juro por Deus, que PEGO ESSA
SUA CARA TEIMOSA E A ESFREGO NO CHÃO! — rosnou,
apontando para John, e ambos ficaram em silêncio.
— Eu avisei que é um erro provocá-la duas vezes — Preston
disse a John, que concordou com a cabeça.
Pela primeira vez em dias, consegui rir, mas gemi ao perceber
que até com isso meu corpo doía.
— Hey, fique calma, você tem que se recuperar — falou Steve.
Notei que havia uma agulha presa em meu braço, ligada a
uma bolsa de soro.
— O que aconteceu? — resmunguei.
— Você teve outra crise de ansiedade, mas vi que não era
somente isso, então fiz alguns exames de sangue, constatando que
você usou alguma droga que deixou sua imunidade baixa, além do
começo de hipotermia que teve na noite passada, lhe causando
febres altas e dores de cabeça que, por muito pouco, não
viraram um princípio de pneumonia.
— Ela tomou Ecstasy — disse John.
— John me contou que colocaram algo em sua bebida — falou
Shantell, pegando minha mão. — Você precisa dizer o que
aconteceu. — Respirei fundo, ainda com dores pelo corpo.
— Eu fui para aquele bar no Harlem — confessei, fazendo
Shantell murmurar. — Eu só queria beber e dançar um pouco,
precisava esquecer aquele... — Sem coragem de dizer, continuei —
Mas aí, encontrei Georgina. — Shantell arregalou os olhos ao
escutar o nome dela.
— O QUE? Aquela vadia! MAS É CLARO! — bradou ela,
gesticulando furiosamente com os braços. — Pensei que não falava
mais com ela!
— Eu tentei me livrar dela, Shant, mas não consegui. Ela veio
em minha direção, falando que queria voltar aos velhos tempos, até
que vi Sebastian atrás de mim também, e acho que foi nesse
momento que ela colocou algo na minha bebida.
— Voltar aos velhos tempos? — perguntou John, cerrando o
olhar.
— Sofya teve uma fase rebelde. Andava pra lá e pra cá com
essa vadia desmiolada, até que dei uns tapas nela e ela percebeu o
que estava fazendo da vida, seguindo essa vadia por todo lado que
nem um cachorro com fome.
Odeio admitir, mas Shantell está certa. Detesto me lembrar do
meu passado obscuro, como esta parte dele. Por sorte, Shantell
abriu meus olhos, me dando uma surra e mostrando quem Georgina
era de verdade.
— E onde você conheceu essa tal de Georgina? — perguntou
John, cruzando seus braços gigantes em seu peitoral, agindo como
o perfeito Agente que é.
Ainda sem me dar a chance de falar, Shantell me atropelou de
novo.
— Elas se conheceram na faculdade. No começo achei que
estavam apenas se “divertindo”, mas quando Sofya começou a
perder a cabeça, vi que eu estava enganada.
— Se “divertindo”? — perguntaram John e Preston, juntos.
— Shant — adverti.
— Sim, aquelas experiências que garotas malucas da
faculdade tinham umas com as outras... elas transavam — disse
ela, como se quisesse me punir.
— TRANSAVAM? — perguntaram os três em um coral, me
encarando de maneira chocada.
Envergonhada, cocei minha nuca, baixando o olhar.
— Sim, mas depois que consegui clarear as ideias de Sofya,
Georgina não aceitou muito bem, insistindo para que ela voltasse a
cometer loucuras com ela, mas desistiu quando viu que não obteve
sucesso e sumiu do mapa… mas pelo visto ela voltou — concluiu
ela e olhou para mim. — Por favor, me diga que não transou com
ela de novo?!
— NÃO, Shantell! Não transei! Quando saímos da pista de
dança, ela e Sebastian me levaram para um quarto... — falei,
escutando John e Steve resmungar com suas caras fechadas. —
Mas não aconteceu nada porque eu consegui fugir de lá.
— E quem diabos é esse Sebastian? — questionou Steve.
— É o drogado daquela noite na boate, não é? — perguntou
John, cerrando a mandíbula, tentando controlar a raiva em sua voz.
— É... é ele sim.
John assentiu, ainda com a mandíbula trincada.
— Eu vou resolver isso. E você, doutor, é melhor cuidar dela
— falou num tom de ameaça, apontando o dedo para Steve e indo
em direção a porta.
— Cuidarei melhor do que você, pode apostar — devolveu
Steve.
John parou, cerrando o olhar ainda na direção a Steve,
preparado para retrucá-lo.
— Não! — protestou Preston, carregando John para fora ao
ver a reação do amigo, que fez Shantell bufar e revirar os olhos.
— Quanto tempo irei ficar aqui? — perguntei para Steve.
— Até que se recupere, então é melhor ser boazinha. Já já
mandarei a enfermeira vir com sua medicação. Vou deixá-las a sós.
— Ele me deu um beijo na testa e saiu do quarto.
— Foi seu pai que causou tudo isso, não foi?
Suspirando, olhei para Shantell, que retribuía meu olhar de
maneira preocupada. Assenti, tentando evitar as lágrimas que
voltaram para meus olhos com força total.
— Ele voltou como se nada tivesse acontecido, Shant — falei,
e não pude mais evitar as lágrimas.
Shantell me abraçou e contei tudo a ela. Como minha vida
chegou a esse ponto? Se há um ano alguém me contasse que isso
estaria acontecendo comigo hoje, eu jamais acreditaria. Deus, me
ajude, por favor!
“Sofya,
Se recupere logo, precisamos de você aqui e bem. Não se
preocupe, também fiquei assim quando estava subindo para o auge
da minha carreira, agora, já estou acostumada, pois nada é de
graça e tudo tem seu preço, mas você irá se acostumar, espero.
Melhoras,
Donatella Sozzani.”
Sim, nada é de graça e tudo tem seu preço. Não estou assim
somente por conta do trabalho, mas admito que dar o meu máximo
e mais um pouco em meu emprego realmente está me custando
caro. Não quero ser uma dessas workaholics por aí, como
Donatella, que está enfrentando seu terceiro divórcio e praticamente
não viu sua filha crescer. Não me entenda mal, eu adoro meu
trabalho, mas ainda sinto que não estou onde deveria estar. Eu
sonho alto e pretendo chegar aonde eu quero, e o que eu quero?
Ter um trabalho tranquilo — que às vezes não seja tão tranquilo, e
estaria mentindo se dissesse que não gosto de toda a correria — e
escrever sobre diferentes culturas, política, direitos e que,
principalmente, estes assuntos sejam pautados em meninas e
mulheres, para ajudá-las. Mas ainda sinto que não estou preparada,
preciso de mais um tempo com a Glam Mag, já que querendo ou
não, estou aprendendo, e muito, por lá.
Shantell parou o carro em frente ao local que nós duas
conhecemos muito bem. A madre superiora Deloris nos espera em
frente ao portão. Saí do carro, olhando para Shantell com o cenho
franzido.
— Vai ficar tudo bem — me confortou, e me ofereceu sua mão,
que peguei dando um sorriso tímido.
Atravessando a rua, Deloris abriu seus braços para mim, e
atrás dela avistei as irmãs Robert, Lolla e Lazarus sorrindo. Eu não
sei o porquê, mas acho que de certo modo sempre pertenci a este
lugar e, apesar das dificuldades, esse é meu lar, essas irmãs são
meu lar. Meu coração se apertou e as lágrimas inundaram meus
olhos novamente e corri na direção delas.
— Oh, minha criança.
— Madre — falei, a abraçando.
Eu sempre detestei chorar, mas nos últimos dias tem sido
difícil controlar as lágrimas. Madre Deloris sabe muito bem disso,
pois sabe que para mim é como uma demonstração de fraqueza,
pelo menos era, até que um dia, quando tinhas meus quinze ou
dezesseis anos, ela me disse algo que nunca mais irei me esquecer.
“- Sofya?
Deloris entrou pela porta do quarto, que está vazio, já que
ainda era de tarde. Não respondi, ainda estou bastante abalada com
o que aconteceu mais cedo na escola. As garotas no colégio são
muito cruéis, ainda mais quando se tem família, status e grana.
Quando fiz a prova — praticamente obrigada por Deloris — para
entrar em um dos melhores colégios de Manhattan, não esperava
passar e ganhar uma bolsa, mas passei, porque, segundo Deloris,
eu sou muito inteligente para ficar em uma escola estadual. Não vou
dizer que ela está errada, mas detestei quando isso aconteceu.
Fiquei longe de Shantell e todo dia sofria bullying, até que hoje. Não
me contive e acabei brigando com uma das piores garotas do
colégio, Patty Wilson. Patty tem um pai rico, que conseguiu tirar ela
dessa confusão em um piscar de olhos. Já eu, nem pai tenho, e a
corda sempre arrebenta para o lado mais fraco. Deloris foi até a
escola e, por um milagre ou não, ela conseguiu manter minha bolsa.
— Garota, no que estava pensando?
— Eu não suporto mais aquilo, madre. Não vou deixar aquelas
garotas me encherem o saco todos os dias — Falei, controlando
minha voz.
Eu já estava passando por isso há algum tempo. Na escola
estadual, eu apanhava das garotas mais velhas porque os
namorados delas davam em cima de mim, sem eu ao menos saber
disso, já que sempre fui muito lerda para essas coisas. Esse
também foi um dos motivos para eu ter deixado aquela escola, mas
parece que os problemas me perseguem.
— O que elas fizeram dessa vez? — Perguntou ela, sentando-
se ao meu lado.
Eu não respondi de novo. Não quero parecer fraca. Depois que
aquelas vadias descobriram como eu vim parar em um orfanato,
minha vida virou um inferno.
— Tudo bem, você não quer me dizer, mas o senhor Brown já
me disse. — Droga, esse diretor é um boca aberta.
Eu deveria ter dado uma surra nas seguidoras de Patty
também, pois elas a ajudaram. Aliás eu queria quebrar esse quarto
todo!
— Eu sei que o que elas fizeram foi errado, mas você não
pode agir com raiva.
— E como eu devo reagir? Chorando, demonstrando
fraqueza? Eu queria quebrar a cara dela quando vi que ela tinha
escrito “Sofya drogada igual a mãe” no meu armário! Eu queria
arrancar a cabeça dela, ela nunca me deixará em paz! NUNCA! —
Exclamei, levantando da cama e secando alguns vestígios de
lágrimas em meus olhos.
— Acalme-se, garota. Nada pode ser resolvido com raiva, e
pare de limpar seus olhos, deixem essas lágrimas caírem —
Exclamou ela — Chorar não é fraqueza, Sofya. Todos nós
precisamos descarregar nosso peso das costas, até mesmo Jesus
Cristo fez isso. Olhe para mim — Ela pegou meu rosto e foquei em
seu olhar — Você vem carregando muito por muito tempo, criança.
Está criando uma redoma ao seu redor, ao redor do seu coração,
reagindo a tudo com violência. Pare com isso, deixe isso sair Sofya,
somente assim seu coração ficará em paz, deixando a mente em
paz, clareando nossos pensamentos — Sussurrou ela.
Eu não queria chorar, não posso. Balancei a cabeça
negativamente e ela me chacoalhou.
— VOCÊ SÓ SERÁ FORTE QUANDO LIBERAR ISSO, e
fraqueza não se trata disso, menina, e sim agir violentamente por aí!
Querem te transformar em uma marginal, mas não irei tolerar isso!
VOCÊ QUER ISSO?
— Não. — Disse, deixando minhas lágrimas caírem.
— Ótimo, então esvazie tudo o que está aqui, agora — Disse
ela, tocando em meu coração.
Comecei a chorar, até que senti seu abraço, me confortando.”
Os abraços de Deloris sempre me reconfortam, como agora.
Trazer esta memória à tona, trouxeram também as palavras ditas
recentemente por John, que se assemelham a esta lembrança com
Deloris, “se permita jogar tudo isso para fora. Ninguém pode ser
firme todo tempo, eu sei disso”. Ele tem razão, os dois têm razão,
não posso ser forte o tempo todo.
— Você está em casa, criança. Acalme seu coração — Deloris
ainda me abraçava forte enquanto as lágrimas me consumiam.
Me afastando do seu abraço, senti o afago de Shantell em
meus cabelos e notei que haviam lágrimas caindo dos seus olhos
também.
— Obrigada — falei para todas, sorrindo.
— Tem mais alguém que veio para te ver — disse Shantell,
pegando em meus ombros.
Ao fundo do corredor de entrada do orfanato, vi a doutora
Janney Howard, minha terapeuta durante os anos que fiquei aqui.
Ela sorriu para mim e veio em nossa direção, estendendo seus
braços para mim e, sem perder tempo, a abracei.
— Oh, Sofya! Sofya, a corajosa — disse ela, me fazendo sorrir
por entre as lágrimas quando a escutei me chamando pelo modo
como me chamava na adolescência.
— É bom vê-la novamente, doutora Jay — falei, me
desprendendo de seus braços e tentando limpar minhas lágrimas.
— Que tal entrarmos para conversar um pouco, creio que há
muito para falarmos, não é?
— Você nem imagina o quanto.
— Ótimo, então vamos sair desse frio. Só tomem cuidado para
não acordar as crianças! — Deloris disse, nos colocando para
dentro.
“Jay”, como costumava chamar Janney, me abraçou pelos
ombros enquanto andávamos. Boa parte do que eu sou hoje é
graças à ajuda dessa brilhante psicóloga juvenil. Janney me ajudou
a enfrentar meus traumas de infância, assim como ajudou alguns
outros jovens do orfanato também. Ela trabalha para o governo e
ajuda jovens órfãos que sofreram traumas durante a infância ou
adolescência nos orfanatos da cidade. Quando deixei o orfanato,
nossas sessões tiveram que acabar também, mas de tempos em
tempos nos falávamos por telefone, ela sempre quis saber como eu
estava tocando minha vida. Mal sabe ela o que passei somente
nesse último ano.
Chefe,
Tomei a liberdade de providenciar isso para você. Não se
preocupe, é como se fosse um presente meu, de Nigel, Kate e da
Glam Mag. Não se preocupe com seus cartões de crédito, já
providenciei tudo no banco e tudo estará em suas mãos em até três
dias. Seu novo número está junto ao seu novo celular e se precisar
de mim, me ligue. Espero que melhore logo, isso aqui é muito chato
sem você! E não se esqueça que você é A Chefe!
Feliz aniversário!
Com amor,
Lea, Nigel e Kate.
O soco de Sofya ainda dói, mas não tanto quanto foi ver o
olhar dela ao entrar em seu apartamento. Quando vi ela e Jenna se
encarando em minha porta, soube de imediato que algo estava
acontecendo entre as duas, não sei exatamente o que Jenna falou
para Sofya ter agido daquela maneira, mas sei que foi algo sério. E
assim que fechei a porta, fui tirar satisfações com ela.
— O que foi aquilo Jenna?
— Você não viu? Aquela louca me atacou sem mais nem
menos! — Sentou-se no sofá, alisando seus pulsos e ajeitando seu
cabelo. Sei que se Sofya quisesse mesmo ter machucado ela, teria
feito.
Isso não foi nada, para a sorte de Jenna, e para a minha
também, já que não me machucou muito.
— Ela não teria feito aquilo sem motivo, Jenna. O que você
disse a ela?
— Por que eu? Ela que começou, você viu! E por que você
continua a defendendo? — falou, começando a chorar.
ARGH! Estou farto disso, já chega. Peguei minha jaqueta
pendurada ao lado da porta, minhas chaves e carteira, indo na
direção da porta. Não quero ficar aqui por nem mais um minuto.
— Aonde você vai? — perguntou, levantando-se.
Não respondi.
— John? Você não vai atrás dela, vai? — continuou enquanto
eu abria a porta.
Eu ia sair sem respondê-la, até que ela pegou meu braço,
chamando minha atenção.
— John!
— Eu preciso de um tempo, Jenna. Me deixe em paz — falei,
saindo rapidamente de lá.
Não sei o que estava pensando quando concordei com a ideia
de Jenna em vir morar aqui até que a reforma do seu apartamento
ficasse pronta, na verdade, eu acho que me arrependi assim que
disse “tudo bem” como resposta. Droga! Mas também não poderia
ter dito não a ela. E por que ela havia dito isso a Sofya? Que merda!
Chamei o táxi, entrando nele, dizendo ao motorista onde irei. Olhei
pela janela, ainda pensando no olhar de Sofya, que não sai da
minha cabeça! Droga, o que aquela garota fez comigo? Ficar longe
dela está me deixando louco e não paro de pensar em nosso último
beijo. Por que tudo tem que ser tão difícil? A minha vontade é
arrancá-la dos braços daquele médico folgado e reivindicá-la, para
sempre. O fato de saber que ela quer ir atrás daquele mal caráter do
pai dela me fez ficar em alerta também. Eu não gostei daquele cara
e, se ela for mesmo encontrar com ele, gostaria de estar perto a
todo momento, somente para ele saber que há alguém por perto
para protegê-la sempre que precisar. Há muito se passando pela
minha cabeça, e a única coisa que eu queria é estar ao lado dela,
mas não posso, então vou tentar relaxar um pouco, ou pelo menos
tentar, em um lugar que está se tornando minha segunda casa.
É, pelo visto irá durar bem mais do que imaginei e estou feliz
por isso. Depois que saímos da sala fomos até a porta da igreja,
esperando os últimos preparativos. Por sorte, Jenna precisou viajar
à Califórnia para ajustar algumas coisas para sua “nova coleção”,
segundo ela, e agradeci mentalmente por ela não ter vindo. A
verdade é que se arrependimento matasse eu estaria enterrado a
sete palmos. Naquela noite, quando Steve revelou ser o namorado
da Sofya, meu mundo caiu, e para melhorar, na mesma noite, antes
deste acontecimento, fomos jantar na casa dos meus pais. O que
isso tem a ver? Bom, o fato de que nesta mesma noite minha mãe
fez a minha cabeça, falando sobre casamento e coisas do tipo, me
dando o anel de noivado dela, o mesmo anel que meu pai a pediu
em casamento, para que isso me incentivasse a fazer o mesmo com
Jenna. Sai de lá certo de que isso não iria acontecer realmente, mas
ver Sofya namorando aquele babaca me cegou de ódio... e vocês
me conhecem, quando eu estou, digamos “alterado”, eu faço muitas
coisas sem pensar, por isso, naquela mesma noite, pedi Jenna em
casamento. Bom, foi um pedido meio peculiar.
“Entrei em meu apartamento, batendo a porta com toda a
força. Eu quero matar aquele filho da puta! COMO SOFYA PÔDE
FAZER ISSO! NAMORAR ELE? Eu fui um completo idiota quando
me declarei para ela. ARGH! Minha vontade é voltar lá e tirar toda
essa história a limpo. Inacreditável! Olhei para Jenna, que também
está furiosa, tirando sua maquiagem e resmungando coisas para
mim, mas a minha raiva é tanta que não escuto nada! Minha mãe
tem razão, a vida deve seguir em frente e se Sofya está pensando
que será a única a fazer isso está muito enganada.
— O que acha de nos casarmos? — perguntei, interrompendo
as reclamações dela.
Ela me olhou, boquiaberta e se aproximou.
— Oh... John! — sussurrou surpresa. — Eu achei que iria me
pedir isso, mas não assim — riu.
— Isso é um sim, Jenna? — Já estava impaciente.
— Mas é claro, meu amor! Eu aceito. — Ela veio até mim,
beijando meus lábios.
— Ótimo! Acertamos tudo depois — disse, me distanciando
para pegar minha carteira e sair daqui rapidamente. Eu preciso
beber.
— Mas, amor, não está esquecendo de nada? — perguntou
ela, com uma ruga na testa.
Olhei para o lado, sem entender do que ela estava falando e
neguei com a cabeça.
— John, o anel! — reclamou, erguendo sua mão esquerda
para mim.
Droga, é mesmo. Bufei, tentando achar o maldito anel no meu
bolso, pegando e jogando a caixinha para ela.
— Pega. Volto mais tarde — falei, dando as costas a ela e indo
em direção a porta, ignorando suas reclamações e fechando a porta
atrás de mim.”
Como John havia me dito, realmente vou ver meu filho crescer,
mas graças a ele, somente a ele, e a Deus, claro. Me lembro que
quando conheci esse branquelo folgado ele ainda nem tinha
músculos, era apenas um jovem, ele e eu. Pensei que ele fosse
igual aos outros branquelos da sala, na academia de polícia, “outro
playboy folgado que está aqui graças ao papai”, pensei comigo. Mas
quebrei a cara quando descobri que esse branquelo alto e magro
havia feito a prova igual eu, ignorando o fato de o pai ser um
influente senador estadual na época. Sem contar que ele foi o único
cara branco que não tirou uma com a minha cara por eu ser o único
policial negro da turma, pelo contrário, ele me ajudou a se livrar de
alguns caras que ficaram no meu pé por conta disso.
“— Você está bem? Não ligue para esses caras, são um bando
de abutres — disse ele, enquanto eu arrumava minha camisa, que
ficou amassada quando fui tirar satisfações com aquele filho da puta
por ele ter tirado uma com a minha cara, mais uma vez.
— Estou bem, não precisava ter me ajudado.
— É, sei. Neeson, John Neeson. — Estendeu a mão para mim,
dando um sorriso torto.
— Preston, Preston Davis — devolvi, pegando sua mão.”
John não mudou nadinha e isso me faz sorrir a toda hora. Subi
as escadas da entrada do prédio e vi a senhora Johnson
conversando com James.
— Olá, senhora Johnson! Olá, James!
— Olá, senhorita — respondeu James, sorrindo.
— Ah, olá, querida! Como está John?
— Está cada vez melhor, mais alguns dias e ele terá alta!
— Que bom! Ahm, será que podemos conversar, querida?
Xiii, pela forma que a senhora Johnson falou, não é coisa boa.
— Claro — Me aproximei dela.
Ela me entregou um papel que estava em suas mãos e me
olhou, começando a falar.
— A imobiliária me mandou essa carta hoje, querida. Você não
renovou o contrato de aluguel, que tinha prazo de um ano, e ele
venceu no mês passado, quando completou um ano neste prédio.
Além disso, você não pagou o aluguel esse mês.
Abri o papel e vi o aviso de despejo. Tenho três dias para sair
do apartamento. Mas que merda! Eu tinha me esquecido
completamente do aluguel e do contrato, que expirou mês passado,
quando fez um ano em que havia me mudado para cá, um ano que
conheci John. Foco, Sofya!
— Droga!
— Se você não tiver um lugar para ficar até achar outro
apartamento, você pode ficar no meu, querida.
— Ah, muito obrigada, senhora Johnson, mas eu já tenho outro
apartamento, só me esqueci de resolver tudo isso enquanto estava
com John no hospital.
Depois de tanto meu pai insistir, eu acabei ficando com o
apartamento que ele comprou para mim. Eu só não queria me
mudar enquanto John estivesse se recuperando aqui, por isso deixei
a mudança para depois, mas esqueci totalmente do contrato e do
aluguel. É, acho que terei que antecipar a mudança.
— Tudo bem, querida.
— Ahm, a senhora pode me acompanhar até lá em cima?
Pagarei o aluguel atrasado.
— Claro. É uma pena ter que se mudar assim, Sofya.
— É sim, senhora Johnson, nem me fale — suspirei.
Já passa das 20h e Sofya ainda não veio para sua visita diária.
Ontem ela chegou atrasada, estava um pouco estranha e ficou
pouco tempo. Tentei arrancar dela o que ela tinha, mas ela disse
que era apenas cansaço. E hoje ela ainda não apareceu e isso é
muito estranho. Já tentei ligar, deixar recado e centenas de
mensagens, mas ela não me retornou nenhuma. Já estou surtando
de tão preocupado e nada dela, nenhuma notícia. Escutei a porta se
abrir e olhei esperançoso, esperando ser ela a entrar, mas não...
— Oi primo! — falou Ed, com Lea em seu encalço. — Como
vai?
— Olá, John! — cumprimentou Lea.
Notei que Preston e Shantell também entraram junto com eles.
— E aí, cara! — disse Preston.
— Hey, como vai o padrinho do ano?! — falou Shantell.
— Onde está Sofya? Ela não veio hoje e não atendeu minhas
ligações!
— Fique calmo, John, ela deve ter trabalhado até tarde hoje —
disse Shantell.
Ela está me escondendo alguma coisa.
— Na verdade, ela está preparando a mudança dela, John. O
contrato de aluguel do prédio terminou no mês passado e... AI! —
Lea parou de falar quando Shantell lhe deu um beliscão.
Eu sabia que estava acontecendo alguma coisa!
— Como assim, mudança? Ela vai se mudar? — perguntei,
ainda sem poder acreditar.
— Ela está terminando a mudança nesta noite, John. O prazo
dela é até amanhã ao meio dia — Shantell falou.
— E por que diabos ela não me avisou?! Mas que droga!
— Porque era essa reação que ela queria evitar! — continuou
ela. — Você vai ter alta amanhã, mas ainda está se recuperando,
não pode fazer esforço.
Merda! Ela não pode se mudar! Tenho certeza de que isso
foi ideia daquele mal caráter do pai dela. Aquele homem não me
engana! Preciso fazer alguma coisa e logo. Já sei!
— Tudo bem, então. Eu preciso fazer uma ligação, podem me
dar licença? — pedi.
Eles se olharam, mas fizeram o que eu pedi.
— Preston, preciso conversar com você — falei, antes que ele
saísse.
Shantell nos olhou, desconfiada, mas nos deixou a sós. Peguei
meu celular e liguei para Daniel, gerente da imobiliária do meu
prédio, que pertence ao império da família da minha mãe.
— Richard’s Imobiliária, Daniel falando.
— Daniel, é o John, John Neeson. Preciso que faça um favor
para mim.
— Isso não está certo, John. Não vou deixar você fazer isso!
— disse Preston, preocupado, enquanto eu colocava uma roupa
decente.
— Ah vai sim, você me deve uma, lembra?
— Mas não vou te ajudar a se matar!
— Bobagem, Preston. Eu já consigo andar, você sabe! E o que
é um dia a menos aqui? Vou sair amanhã de qualquer jeito!
— Então, você pode esperar até amanhã para conversar com
Sofya!
— Não! Amanhã já será tarde demais, e já que ela não me
atende, eu vou até ela!
— Por que eu sempre caio nesses seus planos estúpidos?
— Porque você é meu amigo! E não posso deixar Sofya se
mudar! — disse sorrindo. — Agora me dê cobertura, preciso sair
sem que ninguém me veja.
— Shantell vai me matar, PIOR! Sofya vai me matar,
lentamente!
Não dei mais atenção para as reclamações dele e saímos,
com ele na frente, limpando meu caminho. Perto da saída ele parou,
chamando minha atenção.
— Eu quero que vá me avisando e não faça mais coisas
idiotas, seu idiota! — disse, me abraçando. — Não faça eu me
arrepender disso! Eu já chamei um táxi, vá logo e vê se volta logo, e
inteiro!
— Obrigado, cara! Pode deixar.
Saí, calmamente, para evitar levantar suspeitas, e entrei no
táxi, dando o endereço para o motorista e rezando para que não
fosse tarde.
FIM...
ou quase.
Alguns meses depois…
@carolmcescritora
[1]
Furby é um brinquedo parecido com uma coruja, que foi comercializado pela
Tiger Electronics, e sucesso de vendas no final da década de 1990.
Posteriormente, foi comercializado pela Hasbro, entre 2005 e 2007, e relançado
em 2012.
[2]
Um dos protagonistas da série de ficção científica The X-Files, também
conhecida pelos brasileiros como Arquivo X. William Mulder é um personagem
que trabalha como agente do FBI.
[3]
Boho vem da expressão Bohemian Chic, termo em inglês que se refere ao
estilo boêmio contemporâneo.
[4]
“Vamos abraçar o ponto sem retorno”
[5]
Hora de ir, todos para fora. O FBI está aqui! Todos para fora! Vamos, vamos,
vamos!
[6]
O Apfelstrudel (significando redemoinho de maçã) é uma sobremesa tradicional
austríaca, nascida em Viena, tendo-se tornado popular internacionalmente.
[7]
IRA - Irish Republican Army (Exército Republicano Irlandês)
[8]
Noob (ou n00b) é uma gíria que significa “novato”. É popularmente usada em
comunidades de jogos online pelos jogadores mais experientes.
[9]
Derivado do famoso diálogo "Run, Forrest, Run", do filme Forrest Gump.
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“Todos os véus e neblinas, ruas de azul…”
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“Parecem amêndoas, que rodam frias. Algum momento de seda, vai para
sempre. E estamos deixando corações partidos para trás, uhum…”
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“Mistifique, mistifique-me…"
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“[...] Em tudo o que existe, bem, ninguém tem a sua beleza! Eu vejo seu rosto
e eu vou sobreviver, uhum. Mistifique, mistifica-me, mistifique, mistifica-meeee…”
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Eternamente selvagem com o poder para fazer com que cada momento que
vêm vivo. Todas aquelas estrelas que brilham em cima de você vão beijá-las
todas as noites. Todos os véus e neblinas. Ruas de azul. Parecem amêndoas que
rodam frias. Algum momento de seda, vai para seeempre. E estamos deixando,
sim, estamos deixando para trás corações partidos, uhum!
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“Mistifique, mistifique-me… Mistifique, mistifique-me. Mistifique…”
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Referência a série de animação, voltada para o público infantil, onde o
personagem principal é um pinguim.
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Orfanato Sagrado Coração de Maria.
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O conceito de burlesco está associado ao teatro de variedades. Trata-se de
obras de paródia que apresentam influências do cabaret.
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MILF, Mothers I'd Like to Fuck. Termo utilizado para fetiche sexual com
mulheres mais velhas, traduzido de forma literal: “Mãe que eu gostaria de foder”.
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Um banco traseiro com a amante, é sempre encoberto. E eu falo com seu pai,
que diz: Você ainda não viu nada até que esteja caído. Então certeza que há uma
mudança no seu jeito.
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Barulhos de sininhos.
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Chega de risadas despreocupadas. Silêncio para sempre! Andando por uma
casa vazia, lágrimas nos olhos. Aqui é onde a história termina, isso é adeus. ME
CONHECENDO, CONHECENDO VOCÊ!
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Não há nada que possamos fazer! Me conhecendo, conhecendo você, só
temos que encarar que desta vezzzz terminamos!
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Desta vez terminamos!
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Terminar nunca é fácil, eu sei, mas tenho que ir!
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Eu tenho que ir, desta vez eu sei!
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Me conhecendo, conhecendo você, é o melhor que posso fazer!
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Memórias…
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Bons dias...
[30]
Dias ruins…
[31]
Estarão sempre comigo...
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Deite um sussurro no meu travesseiro. Deixe o inverno no chão... Acordo
sozinho, há um ar de silêncio, no quarto e em todos os arredooores...
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Toque-me agora, fecho meus olhos e sonho... DEVE SER AMOOOR, MAS
AGORA ACABOOOU! Deve ter sido bom, mas... eu o perdi de alguma forma...
desde o momento em que nos tocamos até o tempo acabar...
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Cruzamos a linha. Quem empurrou quem? Não importa para você, importa
para mim. Estamos à deriva, mas ainda flutuando. Estou apenas esperando para
ver você cair, meu amor.
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Eu desapareci em você, você desapareceu de mim. Eu te dei tudo o que você
sempre quis, não era o que você queria. Os homens que te amam, você mais
odeia. Eles passam por você como um fantasma, eles procuram por você, mas
seu espírito está no ar. Querida, você não está em lugar nenhum.
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Oh, amor... você diz que no amor não há regras. Oh, amor... querida, você é
tão cruel!
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“Limão. Ver através da luz do sol, ela usava limão”
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“Nunca à luz do dia. Ela vai te fazer chorar. Ela vai fazer você sussurrar e
gemer.”
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“Mas quando você está seco, ela tira água de uma pedra. Eu sinto que estou
lentamente, lentamente, lentamente escorregando para baixo. Eu sinto que não
estou segurando nada. Ela usava limão, para colorir a fria noite cinzenta. Ela tinha
o céu e se segurou com tanta força.”
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“E eu sinto que estou à deriva, à deriva, à deriva da costa. E eu sinto que
estou nadando para ela. Meia-noite é onde o dia começa...”
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"Limão. Veja através da luz do sol. Um homem derrete a areia para que ele
possa ver o mundo lá fora, (Você vai encontrá-la lá). Um homem faz um carro (Ela
é o seu destino) e constrói uma estrada para conduzi-los (Você tem que chegar
até ela). Um homem sonha em ir embora (Ela é imaginação), mas sempre fica
para trás. E estes são os dias em que nosso trabalho se desfez. E estes são os
dias em que procuramos outra coisa”
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Say Yes to the Dress (no Brasil, O Vestido Ideal) é um reality show americano
da rede de TV TLC que segue os eventos da loja de vestidos de noiva Kleinfeld
Bridal em Manhattan.
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“Lugar de Sofya e Shantell”
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“Por favor, permita-me apresentar-me, sou um homem de riqueza e bom
gosto. Eu estive por aí por longos longos anos, roubei a alma e a fé de muitos
homens”
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“Prazer em conhecê-lo, espero que você tenha adivinhado meu nome. Mas o
que está confundindo você é apenas a natureza do meu jogo...”