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ROMANTISMO de glórias que só existiram nos ideários românticos.

Outra forma
de nacionalismo brasileiro foi conhecida na terceira fase do
Romantismo, quando o escravo e os ideais de liberdade
São livros pertencentes à escola do Romantismo os livros A
ocuparam os versos condoreiros.
Viuvinha e O Moço Loiro dos autores José de Alencar e Joaquim
Manuel de Macedo.
Subjetivismo - atitude individual e única. A poesia não
O romantismo é todo um período cultural, artístico e literário
assume mais os moldes clássicos e, sim, a vontade do Eu
que se inicia na Europa no final do século XVIII, espalhando-se
criador.
pelo mundo até o final do século XIX.
O berço do romantismo pode ser considerado três países:
Egocentrismo - Houve o triunfo absoluto do EU; o reinado
Itália, Alemanha e Inglaterra. Porém, na França, o romantismo
da poesia confessional na qual o sujeito lírico declarava seus
ganha força como em nenhum outro país e, através dos artistas
sentimentos.
franceses, os ideais românticos espalham-se pela Europa e pela
América.
Sentimentalismo - analisa e expressa a realidade por meio
Dentro dos antecedentes históricos pode-se destacar que
de sentimentos; a emoção foi valorizada em detrimento do
Romantismo foi o primeiro movimento literário da era
racionalismo.
denominada romântica ou moderna.
As ideias românticas ganharam maior impulso a partir do
Supervalorização do amor - O amor foi considerado um
advento da Revolução Francesa (1789) e se difundiram pela
valor supremo na vida. Entretanto, a conquista amorosa era
Europa e pelas Américas.
difícil: havia o mito do amor impossível, o estigma da paixão
As transformações revolucionárias atingiram todos os
desesperadora. A perda ou não realização amorosa levava o
segmentos: social, econômicos, político, filosófico e artístico-
romântico ao desespero, à loucura ou à morte.
cultural. A humanidade acompanhava mudanças profundas e
fundamentais para a formação de uma nova identidade mais
Idealização da Mulher - Mulher convertida em anjo, musa,
idealista, o que possibilitou o desenvolvimento da estética
deusa, criatura pura, poderosa, perfeita, inatingível, capaz de
romântica.
maravilhar a vida do homem se lhe correspondesse. A mulher,
Houve vários fatores decisivos para as transformações
porém, tornava-se perversa, maligna, impiedosa, quando pela
vividas na Europa nesse período, entre elas destacam-se:
recusa arruinava a vida do galante que a cortejava.
• A queda dos sistemas de governo tirânicos.
Byronismo (mal do século) - Na ânsia de plenitude
• Os ideais de liberdade e igualdade.
impossível, o artista sentia-se desajustado e insatisfeito, além de
• Formação de uma mentalidade nacionalista. decepcionado, devido á falência da utopia revolucionária:
• A consolidação do pensamento liberal. liberdade, igualdade, fraternidade. Assim, o romântico passou a
• A revolução Francesa. ver o homem da época como um ser fragmentado, peça da
• A Revolução Industrial Inglesa. engrenagem social, sem individualidade ou liberdade. Os
• A Declaração Universal dos Direitos Humanos. desajustes e as insatisfações conduziram ao mal do século,
definido como a aflição e a dor dos descontentes com o mundo.
Romantismo: A arte Burguesa Era a influência do modo de vida byroniano do poeta inglês Lord
George Byron, protótipo do herói romântico, sombrio, elegante e
A burguesia, vitoriosa na Revolução Francesa, desajustado.
experimentou franca ascensão e, afrontando os poderes da
Monarquia, exigiram seu espaço na estrutura sociopolítica, bem Novo aspecto estilístico - Os românticos abandonam a
como o cumprimento dos ideais de sua bandeira revolucionária, forma fixa (raros os sonetos, odes, oitavas e etc.), abandonam o
a utopia: Liberdade, Igualdade, Fraternidade. Valorizaram o uso obrigatório da rima e acabam valorizando o verso branco,
trabalho, o comércio, a indústria e todos os meios capazes de negam os gêneros literários em que abandonam o tradicional,
gerar lucro. fazendo com que alguns gêneros não fizessem mais parte como:
Os burgueses, ansiosos por adquirir cultura, passaram a a tragédia e a comédia, onde foram surgindo outros como: o
ser mecenas, ou seja, patrocinaram a arte que correspondia aos drama, o romance de costumes entre outros.
seus interesses. Foi criado o drama para o público burguês,
inventou-se a narrativa em forma de romance, para os leitores Além desses aspectos não se pode deixar de lado a
ansiosos por consumir cultura e arte burguesistas. contribuição cultural do romantismo pois promoveu uma ruptura
com as concepções clássicas da arte e permitiu uma revolução
ASPECTOS GERAIS DO ROMANTISMO cultural. Enriqueceu a Língua Portuguesa, com a incorporação
de neologismos e a aproximação entre a Língua Literária e a
Valorização de elementos populares - Surgiu de relação Língua oral e coloquial.
entre a burguesia e o Romantismo e objetivava retirar o privilégio
da elite aristocrática. Intensificaram-se os temas ligados á vida ROMANTISMO NO BRASIL
urbana; incentivou-se público a participar de manifestações
culturais. Apogeu: Publicação de "Suspiros Poéticos e Saudades",
de Gonçalves de Magalhães , em 1836.
Imaginação Criadora - Libertação da arte agora afastada
das rígidas regras clássicas. Liberdade para a forma e para o Declínio: Publicação de "Memórias Póstumas de Brás
conteúdo. Criação de mundos imaginários nos quais o romântico Cubas", de Machado de Assis, em 1881, que inaugura o
acreditava. realismo.

Nacionalismo - louvor e exaltação de pátria, resgatava as Não falaremos dos aspectos românticos, pois como a
origens de cada nação, valorizações dos elementos da terra Universidade Vale do Acaraú só cobrou os romances românticos
natal, dos bens e das riquezas nacionais, das paisagens em prosa, então focaremos neles.
naturais. Exaltavam-se as personalidades e os heróis da história, A prosa literária desenvolveu-se no Romantismo, mas no
os valores gloriosos da pátria. No Brasil, houve a valorização do Brasil eram menos frequentes.
passado colonial: o índio foi tomado como herói nacional repleto
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A espécie preferida pelo público era o romance de temática Romance regionalista - Por fim, temos o romance
sentimental. Cultivava-se o gosto pelos folhetins, histórias de regionalista, passado em ambiente rural, mostrando costumes,
amor editadas em jornais com capítulos publicados em série. valores e cultura típica de uma região. Este tipo de romance
O primeiro romance romântico brasileiro, datado em 1843, trazia um maior conhecimento do Brasil sobre si próprio, uma
é O Filho de Pescador, de Teixeira e Souza. vez que voltava seu olhar pra regiões diferentes do Brasil,
Entretanto, o romance que impulsionava o apego trazendo à tona sua diversidade.
sentimental do publico foi A Moreninha, de Joaquim Manuel de Neste cenário rural há um herói do campo, sertanejo,
Macedo, uma historia de amor convencional, publicada em 1844, alguém que pertence à sua terra e é o retrato desta. É bravo e
que fixa os costumes da sociedade carioca da época, honrado, preza a moral e os costumes de seu ambiente,
contaminada por francesismos. colocando-se contrário às liberalidades da cidade e dos homens
de lá. É importante ressaltar que não há tensão social no
O romance de Folhetim romance romântico regionalista, sendo este apenas um retrato
regional de costumes, sem críticas.
Tanto na Europa quanto no Brasil, o romance surgiu sob a
forma de folhetim, publicação diária, em jornais, de capítulos de Romance urbano - Os romances urbanos são os mais
determinada obra literária. Assim, ao mesmo tempo que lidos até hoje. Em sua grande maioria, este tipo no Romantismo
ampliava o público leitor de jornais, o folhetim ampliava o público narrava uma história que geralmente ocorria nas capitais, na alta
de literatura. sociedade. Funcionava como crítica aos costumes, mostrando a
Ao escrever um folhetim, o artista submetia-se às sociedade e os interesses desta em uma determinada época. Os
exigências do público e dos diretores de jornais. Além disso, os heróis e heroínas deste romance faziam ou não parte desta alta
folhetins não podiam criticar os valores da época, reivindicar o sociedade e tinham que superar várias barreiras para a
verdadeiro humanismo, pois obrigatoriamente tinham que se felicidade e a realização do amor e do casamento (que redimia
sujeitar aos valores ideológicos do público, constituindo-se assim as personagens de todo o mal e imoralidade que elas pudessem
numa arte de evasão e alienação da realidade. ter), tal como nos outros tipos de romances românticos.
Eram assim estruturados:
Exemplos de romances urbanos:
1º HARMONIA Lucíola, Diva, Senhora, A Viuvinha, todos de José de
Felicidade = Ordenação social burguesa Alencar; Iaiá Garcia, Helena, A Mão e a Luva, de Machado de
Assis; A Moreninha, Moço Loiro de Joaquim Manuel de Macedo;
2º DESARMONIA e Memórias de um Sargento de Milícias, de Manuel Antônio de
Conflito = Desordem = Crise da sociedade burguesa Almeida, que surge trazendo à tona os costumes da periferia,
indo na contramão do retrato de costumes da alta sociedade,
3º HARMONIA FINAL algo raro neste tipo de romance.
Estabelecimento da felicidade definitiva da sociedade
burguesa, com o triunfo de seus valores ÚRSULA
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Principais aspectos da prosa romântica brasileira

Flash-back narrativo - volta no tempo para explicar, por


meio do passado, certas atitudes das personagens no presente.

O amor como redenção - oposição entre os valores da


sociedade e o desejo de realização amorosa dos amantes = o
amor é visto como único meio de o herói ou o vilão romântico se
redimirem e se “purificarem” = solução: em muitas casos: a
morte.

Idealização do herói - ser dotado de honra, de idealismos


e coragem = põe a própria vida em risco para atender aos apelos MARIA FIRMINA DOS REIS – Vida e Obras
do coração ou da justiça = em algumas obras assume as feições
de “cavaleiro medieval”. Maria Firmina dos Reis foi uma escritora brasileira do
século XIX, nascida em São Luís, no estado do Maranhão, em
Idealização da mulher - são desprovidas de opinião 1822, e falecida em 1917. Ela é conhecida por ser uma das
própria, são frágeis, dominadas pela emoção, obedientes às primeiras escritoras negras da literatura brasileira e uma das
determinações dos pais e educadas para o casamento. pioneiras na abordagem das questões raciais e sociais em sua
obra.
Tipos de Romance Sua obra mais famosa é o romance "Úrsula," publicado
em 1859, que é considerado um dos primeiros romances
São eles: abolicionistas do Brasil. "Úrsula" aborda temas como a
escravidão, a discriminação racial e a luta pela liberdade dos
Romance Indianista: O romance indianista traz à tona a escravizados, além de explorar questões de gênero e classe
vida, cultura, crença e costumes indígenas. O índio surge como social. Maria Firmina dos Reis também escreveu poesia e
herói, representando o Brasil e os brasileiros, sendo corajoso, contos, muitos dos quais tratavam das injustiças sociais e da
heroico, forte, idealizado. Há uma valorização da natureza e o condição das mulheres negras.
espaço onde ocorre a narrativa remete ao natural, à paisagem A obra de Maria Firmina dos Reis é importante não
brasileira. apenas por sua contribuição à literatura brasileira, mas também
por seu papel na promoção da igualdade racial e social. Ela é
Romance Histórico - O romance histórico traz o retrato de uma figura significativa na história da literatura afro-brasileira e
costumes de uma época passada, sendo um relato que muitas continua a ser estudada e celebrada por seu legado literário e
vezes mistura ficção e realidade. ativismo.

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Tendo se tornado uma figura inestimável tanto para a em uma sociedade marcada por questões de raça, classe e
literatura negra quanto para o romantismo brasileiro, pois sua gênero.
obra e legado transcenderam as fronteiras de seu tempo e ainda O foco narrativo em terceira pessoa permite que o leitor
ecoam como fonte de inspiração e reflexão. A importância de tenha uma visão mais objetiva dos eventos e das circunstâncias
Maria Firmina pode ser compreendida sob duas perspectivas que afetam os personagens, enquanto os trechos em primeira
cruciais: sua contribuição para a literatura negra e seu impacto pessoa fornecem uma perspectiva mais íntima e pessoal dos
no contexto do romantismo brasileiro. protagonistas. Isso enriquece a narrativa e ajuda a destacar as
complexas questões sociais e emocionais abordadas ao longo
Contribuição para a Literatura Negra: do romance.
A autora é reconhecida como uma das primeiras
escritoras negras do Brasil, uma pioneira que quebrou barreiras TEMPO
significativas em um momento em que as vozes negras eram
frequentemente silenciadas e marginalizadas. Sua obra mais A obra segue uma estrutura narrativa cronológica, na qual
notável, o romance "Úrsula," é uma conquista literária que os eventos são apresentados na ordem em que ocorrem no
transcende a narrativa em si. Este romance abolicionista ousado tempo. A história se desenrola ao longo de vários anos,
enfrentou questões essenciais da escravidão, da liberdade e da abrangendo um período significativo. No entanto, a narrativa não
dignidade humana, lançando um olhar crítico sobre a crueldade faz referências explícitas a datas específicas, e a cronologia
do sistema escravocrata. exata dos eventos não é detalhada na obra.
Maria Firmina dos Reis deu voz às experiências dos Embora o livro não forneça datas precisas para os
afrodescendentes no Brasil, destacando a brutalidade da eventos, ele oferece uma visão geral do tempo em que se passa,
escravidão e a busca pela liberdade. Sua escrita revela a destacando a passagem das estações, ciclos de plantações e
profundidade de seu compromisso com a justiça social e sua colheitas e o envelhecimento dos personagens.
determinação em desafiar as normas opressivas de sua época. Essa abordagem cronológica permite à autora explorar a
Assim, ela estabeleceu um precedente importante para futuras evolução das relações e dos conflitos ao longo do tempo, à
gerações de escritores afro-brasileiros, que encontraram em sua medida que os personagens enfrentam desafios e dilemas
obra um modelo a ser seguido e uma fonte de inspiração para pessoais e sociais.
abordar questões raciais em suas próprias criações literárias.
ESPAÇO
Impacto no Romantismo Brasileiro:
No contexto do romantismo brasileiro, Maria Firmina dos Na obra "Úrsula," de Maria Firmina dos Reis, diversos
Reis desempenhou um papel significativo ao trazer uma espaços são explorados, cada um deles desempenhando um
abordagem inovadora para o gênero. Enquanto o romantismo papel significativo na narrativa. Apesar de a narradora não
muitas vezes se concentrou em temas idealizados, amorosos e conceder nomes de locais, como cidade de ****, convento de
bucólicos, Maria Firmina optou por explorar questões sociais e ****, esses espaços são representativos das condições sociais e
raciais de forma crítica e comprometida em suas obras. Isso das relações entre os personagens. Vamos explorar alguns dos
representou uma ruptura com as tendências literárias principais espaços dentro do romance:
predominantes da época e estabeleceu um novo caminho para a
literatura brasileira. Fazenda de Santa Cruz: é um dos cenários centrais da
Seu romance "Úrsula" é frequentemente apontado como história. É uma fazenda onde se pratica a produção de açúcar e
uma das primeiras manifestações do romantismo social no a escravidão é uma parte fundamental da dinâmica desse
Brasil, antecipando uma tendência literária que ganharia força espaço. A autora retrata as condições cruéis enfrentadas pelos
nas décadas seguintes. Maria Firmina trouxe uma voz única para escravizados, bem como as relações entre senhores e escravos,
o romantismo brasileiro ao abordar temas de opressão, injustiça destacando as injustiças e a brutalidade do sistema
e desigualdade, contribuindo assim para a evolução do escravocrata. Pertencente ao comendador Fernando tem lá um
movimento literário no país. cemitério aonde será enterrada Luíza B.
Maria Firmina dos Reis é uma figura essencial para a
literatura negra e para o romantismo brasileiro. Sua coragem em Convento dos Carmelitas: O convento é outro espaço
enfrentar questões sociais e raciais em uma época de grande importante na narrativa, especialmente na segunda parte do
adversidade, combinada com sua maestria literária, torna-a um romance. É onde Frei Fernando (antigo comendador Fernando)
ícone que continua a inspirar escritores, leitores e defensores da encontra refúgio e busca redenção espiritual. O convento
igualdade racial e social no Brasil e além. representa um contraste com o engenho, pois é um local de
Seu legado perdura como um farol de luz na luta contra a religiosidade e contemplação, onde os personagens confrontam
discriminação e como um exemplo do poder da literatura para questões morais e espirituais.
promover a justiça e a mudança.
Jardim do Comendador: O jardim da propriedade do
ELEMENTOS DA NARRATIVA E RESUMO Comendador Fernando é um espaço onde o protagonista passa
momentos de reflexão e remorso. Ele é descrito como um lugar
FOCO NARRATIVO de beleza natural, mas também é onde Fernando enfrenta seus
sentimentos de culpa e sofrimento interior.
O foco narrativo é predominantemente em terceira
pessoa, com um narrador onisciente que tem conhecimento dos Sítio de Luíza B.: A casa de Luíza B., uma personagem
pensamentos, sentimentos e ações de vários personagens ao importante na história, é onde se desenvolvem algumas das
longo da narrativa. No entanto, a obra também apresenta tramas amorosas e conflitos.
algumas passagens em primeira pessoa, onde os próprios
personagens compartilham suas perspectivas e experiências Paisagens Naturais: Ao longo do romance, a autora
como é o caso de Suzana e Túlio. descreve paisagens naturais, como florestas, campos, rios e
Essa técnica narrativa permite ao leitor obter insights praias. Esses cenários naturais muitas vezes refletem o estado
profundos sobre os personagens, seus conflitos internos, emocional dos personagens e servem como pano de fundo para
motivações e interações sociais. Ao alternar entre a visão eventos importantes na trama.
onisciente e os relatos em primeira pessoa, a autora oferece
uma visão mais abrangente da vida e das lutas dos personagens

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Os espaços explorados na obra contribuem para a relações humanas. A autora oferece uma visão crítica da
compreensão das relações sociais, das tensões raciais e das sociedade de sua época e dos dilemas enfrentados pelos
questões morais que permeiam a história. Eles também personagens à medida que buscam amor, redenção e
desempenham um papel simbólico na medida em que significado em suas vidas.
representam aspectos da vida e das experiências dos
personagens, adicionando profundidade à narrativa. LINGUAGEM

TEMÀTICA CENTRAL A linguagem de "Úrsula" de Maria Firmina dos Reis é


caracterizada por sua riqueza descritiva e emocional. Sendo
A temática central do romance "Úrsula," abrange várias assim, podemos encontrar as seguintes características:
questões sociais, morais e psicológicas, sendo difícil resumir a
obra a uma única temática. No entanto a perspectiva do Amor e 1. Descritiva: A autora usa uma linguagem descritiva
da Vingança parece ser a mais importante haja vista que a detalhada para pintar imagens vívidas na mente do
trama gira em torno de complexas relações amorosas e de leitor. Ela descreve a paisagem, o estado do cavaleiro,
vingança entre os personagens. O amor, muitas vezes não a natureza ao redor e até mesmo as emoções dos
correspondido, é um tema recorrente, enquanto a vingança personagens de forma minuciosa.
motiva ações que têm repercussões ao longo da narrativa.
O amor entre Úrsula e Tancredo domina os dez primeiros 2. Emocional: A linguagem transmite as emoções dos
capítulos que depois segue para a possessividade de Fernando personagens de forma profunda. O leitor pode sentir a
que o consome por inteiro gerando como efeito um imenso compaixão de Túlio pelo cavaleiro ferido, a gratidão do
remorso que o domina nos capítulos finais. cavaleiro e a tristeza de Túlio por causa de sua
Entretanto, o livro não trata apenas disso e desenvolve condição de escravo. A narrativa evoca empatia e
outras temáticas importantes, vejamos algumas delas: simpatia pelos personagens.

Escravidão e Racismo: A obra aborda de maneira 3. Simbolista: A autora usa simbolismo em várias partes
contundente a instituição da escravidão no Brasil do século XIX, para transmitir significados mais profundos. Por
destacando as injustiças, crueldades e desumanidades sofridas exemplo, a comparação do sol com um homem maligno
pelos escravizados. O romance também examina as e a donzela e a flor que choram em silêncio podem ser
consequências do racismo e da discriminação racial na interpretadas como metáforas para as complexidades
sociedade da época. Em personagens como Suzana e Túlio, das emoções humanas e as injustiças da sociedade.
podemos observar o quão devastador é a escravidão e como a
vida do escravo era árdua e difícil, como no momento em que 4. Criticidade Social: Maria Firmina dos Reis utiliza sua
Suzana narra seu sequestro na África, como Túlio narra o prosa para fazer uma crítica social à escravidão e às
sofrimento da mãe em posse do comendador, como Antero, o desigualdades raciais da época. Através da voz dos
velho, conta sobre seus vícios e dores. personagens, ela chama a atenção para a crueldade da
escravidão e para a necessidade de compreensão e
Remorso e Redenção: O remorso também é uma igualdade entre todos os seres humanos.
emoção central no livro, especialmente para um dos
protagonistas, Comendador Fernando. Ele é assombrado pelos 5. Expressividade: A linguagem é expressiva e poética
remorsos de suas ações passadas e busca redimir-se em muitos momentos, criando um tom melódico e
espiritualmente ao entrar para o convento dos carmelitas. envolvente que cativa o leitor.

Religião e Espiritualidade: A obra explora a religião de PERSONAGENS


maneira significativa, com personagens que buscam conforto
espiritual e redenção. O convento e as reflexões religiosas Úrsula – filha de Luíza B. e Paulo B., uma bela moça,
desempenham um papel importante na transformação dos ingênua que cuida da mãe paralítica, apaixona-se por Tancredo
personagens. O sacerdote amigo de Fernando exerce um papel com que vive um grande amor, mas também é alvo da
de consciência alertando-o para seus crimes e maldades, chega possessão de Fernando.
a dizer que uma das formas dele se redimir seria dar a liberdade
a todos os escravos da fazenda. Fernando – Tio de Úrsula, irmão de Luíza B., ao longo da
obra ele aparece efetivamente no capítulo 10, apesar de já
Condição da Mulher: O romance também aborda a mencionado ao longo da obra como alguém que possui o rancor
condição limitada da mulher na sociedade do século XIX, de Úrsula. Extremamente possessivo deseja a todo custo obter
destacando as restrições que as mulheres enfrentavam. As um casamento, ao longo da obra ele revela ser o assassino de
personagens femininas, como Úrsula e Luíza B., enfrentam Paulo B., assassina Túlio, prende Suzana, o que também leva a
desafios em busca de autonomia e felicidade, mas que sua morte, mata Tancredo, e é responsável pela loucura e morte
infelizmente não conseguem. de Úrsula. Ao final, enclausura-se em um convento e morre com
A mãe de Tancredo sofre os abusos de seu pai, Luíza B. remorso e um arrependimento assumido no último suspiro.
sofreu nas mãos do irmão e do marido (Paulo B.), e Úrsula sofre
pelas mãos do tio, revelando as tristes consequências de uma Tancredo – a obra inicia com Tancredo caído ao chão e
sociedade dominada pela patriarcalismo e o machismo. quase morto, mas após ser salvo por Túlio fica no sítio de Luíza
e se apaixona por Úrsula onde revela que sofrera uma imensa
Natureza e Paisagem: A descrição da natureza e da decepção amorosa por parte de Adelaide e de seu pai. Depois
paisagem é uma característica marcante na obra, e esses de casar com Úrsula acaba sendo assassinado por Fernando.
elementos muitas vezes refletem o estado emocional dos
personagens. A natureza desempenha um papel simbólico, Túlio – escarvo liberto por Tancredo após salvá-lo, é
representando a beleza e a fragilidade da vida. como um fiel escudeiro de Tancredo, é assassinado na mesma
emboscada que ceifa a vida de seu amigo.
"Úrsula" é uma obra rica em temas e camadas,
explorando questões sociais, morais e psicológicas em um Luíza B. – mãe de Úrsula, uma senhora paralítica que
contexto histórico marcado pela escravidão e pelas complexas inicia o romance bastante doente e precisando de cuidados que

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são apenas paliativos. Ela morre logo após a chegada do irmão tarde demais para evitar a queda. O cavalo morre, e o cavaleiro
ao mesmo tempo que este confessa ter matado seu marido. desmaia devido aos ferimentos na cabeça.²
Era o alvorecer do dia e entra em cena um dos
Paulo B. – esposo de Luíza, apenas mencionado na personagens centrais que passava pelo mesmo trajeto, eis a sua
obra, tendo sido inicialmente um marido ruim tenta se redimir, descrição:
mas sem tempo, pois é assassinado por Fernando.
O homem que assim falava era um pobre rapaz, que
Suzana – escrava velha do sítio de Luíza que é tida como ao muito parecia contar vinte e cinco anos, e que ria franca
uma mãe para Túlio, acaba morrendo após ser presa por expressão de sua fisionomia: deixava adivinhar toda a
Fernando em duras correntes por não revelar a localização de nobreza de um coração bem formado. O sangue africano
Úrsula. fervia-lhe nas veias; o mísero ligava-se à odiosa cadeia da
escravidão; e embalde o sangue ardente que herdara de
Antero – velho africano viciado em álcool que trabalha seus pais, e que o nosso clima e a servidão não puderam
em Santa Cruz, fica responsável de vigiar Túlio que Fernando o resfriar, embalde — dissemos — se revoltava, porque se lhe
prende, mas acaba bebendo e dorme permitindo a fuga de Túlio. erguia como barreira o poder do forte contra o fraco.³

Sacerdote – convocado por Fernando para realizar um Sensibilizado pela dor do outro, mesmo quando não se
casamento forçado com Úrsula ele não tem seu nome revelado, havia esperança de alguém aparecer por ali, o negro o retirou o
ao longo da trama se torna o confessor de Fernando e é a voz a cavalo morto, foi pegar água, passou-a em sua testa e deu-lhe
consciência e do seu remorso. de beber fazendo com que aos poucos o jovem rapaz
recobrasse os sentidos.
Feitor branco – capataz de Santa Cruz que enfrenta A conotação religiosa permeia todo o capítulo quando
verbalmente Fernando e se nega a penalizar Suzana, ao sair indica que só Deus teria visto tal cena e piedade e caridade.
oferece um cavalo para que a escrava fuja, mas ela não o O jovem tendo recobrado o sentido perguntou quem era
atende. aquela alma caridosa que tinha interesse em sua pessoa. O
jovem escravo, com a retidão e o medo, pediu perdão pela ação
RESUMO COMPLETO e disse que queria apenas prestar auxílio a ele.
O jovem novamente pede por socorro, pois sentia que
Capítulo 1 tinha febre e o escravo que ainda não tinha se apresentado, diz
que poderia levá-lo a fazenda de Luíza B. e que lá seria bem
DUAS ALMAS GENEROSAS tratado.
Ao insistir no nome do seu salvador somos apresentados
O capítulo começa com uma vasta descrição da natureza, ao primeiro personagem da história. Seu nome é Túlio, um
bem ao estilo da escola romântica. O narrador estabelece uma “mísero escravo”. Túlio se lamenta pela sua condição de
relação de vários adjetivos com hipérbato para destacar os escravo, mas logo o jovem o repreende e até profetiza:
predicativos do ambiente. “São vastos e belos os nossos
campos.” — Cala-te, oh! Pelo céu, cala-te, meu pobre Túlio —
O narrador menciona a sensação de tranquilidade e interrompeu o jovem cavaleiro. — Dia virá em que os
encanto que as águas calmas e a brisa suave proporcionam aos homens reconheçam que são todos irmãos. Túlio, meu
habitantes locais, que expressam sua reverência a Deus através amigo, eu avalio a grandeza de dores sem lenitivo, que te
de cânticos de amor e saudade. Esses cânticos são descritos borbulha na alma, compreendo tua amargura, e amaldiçoo
como notas de uma harpa eólica, evocadas pelo roçar da brisa em teu nome ao primeiro homem que escravizou a seu
ou pelo sussurrar da folhagem na mata. semelhante. Sim — prosseguiu — tens razão; o branco
Conforme a estação muda e as chuvas desaparecem, a desdenhou a generosidade do negro, e cuspiu sobre a
paisagem se transforma novamente, com o leito que antes pureza dos seus sentimentos! Sim, acerbo deve ser o seu
estava sob a água se tornando um tapete verde e úmido, sofrer, e eles que o não compreendem! Mas, Túlio, espera;
adornado por flores tropicais perfumadas. As carnaubeiras altas porque Deus não desdenha aquele que ama ao seu próximo.
se curvam com o vento, criando uma cena impressionante. . . e eu te auguro um melhor futuro. E te dedicaste por mim!
O narrador destaca a beleza efêmera da vegetação e da Oh, quanto me hás penhorado! Se eu te pudera compensar
flora local, onde o orvalho noturno parece uma lágrima generosamente. . . Túlio — acrescentou após breve pausa —
pendurada nas folhas, pronta para ser recolhida pelo primeiro , oh dize, dize, meu amigo, o que de mim exiges; porque
suspiro da saudade. O sol, ao nascer, seca esse pranto, mas a toda a recompensa será mesquinha para tamanho serviço.
beleza dos campos permanece.
O narrador expressa seu amor pela solidão, enfatizando Túlio diz apenas que desejava em troca que ele sempre
como a natureza proporciona uma conexão direta com Deus. Ele tratasse os seus amigos negros e vítimas da escravidão daquela
descreve a sensação de paz e humildade que a solidão oferece, forma piedosa e bondosa, e aquilo impressionou ainda mais o
permitindo que a alma se volte para Deus e o encontre, pois resgatado.
Deus está presente em toda parte.¹ Ambos chegam à frente da casa, Túlio cansado, o jovem
Em seguida, a narrativa introduz um jovem cavaleiro que caiu em desmaio.
atravessa os campos durante uma manhã de agosto, em um
cenário deslumbrante onde a natureza está em pleno esplendor. Notas e análises:
O cavaleiro parece estar em profunda meditação e indiferente ao ¹ Note como há o elemento religioso associado à paisagem, no
estado exausto de seu cavalo, que mal consegue se manter de contexto da obra, essa descrição extensa e bem subjetiva serve como
pé. uma introdução à história e aos temas que serão explorados
O narrador especula sobre o motivo da melancolia do posteriormente, como as relações humanas, a escravidão e a luta por
jovem cavaleiro, sugerindo que pode estar relacionada a uma justiça e liberdade.
ideia ou lembrança dolorosa. O cavaleiro continua sua jornada, ² A cena cria um mistério em torno do personagem
desconhecido, revelando seu estado de melancolia e sugerindo que algo
aparentemente alheio ao cenário ao seu redor.
profundo e perturbador está acontecendo em sua vida.
Entretanto, o cavalo, já sem energia, eventualmente cai, ³ nesse momento também se aproveita para analisar o martírio
levando o cavaleiro ao chão também. O impacto da queda do negro que andava naquele momento para identifica-lo como escravo:
parece acordar o viajante de sua meditação profunda, mas é “Assim é que o triste escravo arrasta a vida de desgostos e de martírios,

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sem esperança e sem gozos!” E ainda aproveita para apelar a Deus: Capítulo 2
“Senhor Deus! Quando calará no peito do homem a tua sublime máxima
— ama a teu próximo como a ti mesmo —, e deixará de oprimir com tão O DELÍRIO
repreensível injustiça ao seu semelhante. Àquele que é seu irmão!”
Novamente com elementos adjetivos “Violente, terrível e
Esse primeiro capítulo tem um impacto narrativo único, e a espantosa...” o narrador iniciar para falar da febre que assola a
descrição da natureza é feita de forma subjetiva e intimista, como se saúde frágil do rapaz. O jovem continua doente e delirando, Túlio
escondesse nela algo, pois reflete o mistério que havia no jovem ficava à cabeceira sempre velando por sua saúde, era um delírio
cavaleiro errante, o teor é simbolicamente religioso, pois a ação de Túlio
assustador que ali estava, nesse momento nos é apresentado a
se assemelha a do bom samaritano.
Quis até mesmo comparar com algumas obras de Alencar e filha de dona Luíza B., Úrsula, descrita como sendo bela assim
Bernardo Guimarães, mas Úrsula antecipa esses aspectos, tendo sido como o primeiro raio da esperança e que se comovia
lançado em 1859, antes mesmo de Iracema (1862) e O Seminarista imensamente com a dor do doente que ali sofria:
(1870)
O que torna interessante é o porquê do título do primeiro Era ela tão caridosa. . . tão bela. . . E tanta compaixão
capítulo: Duas almas caridosas, na verdade tal elemento se encontra na lhe inspirava o sofrimento alheio, que lágrimas de tristeza e
ação e na palavra, no ato de Túlio e no discurso do jovem. Túlio se de sincero pesar se lhe escaparam dos olhos, negros,
revela um bom homem pela sua ação cristã, e o jovem tem um discurso
formosos, e melancólicos. Úrsula, com a timidez da corsa,
que reconhece a maldade da escravidão e o fato de estar em dívida com
o escravo. vinha desempenhar à cabeceira desse leito de dores os
Nesse caso a autora já coloca dois elementos, ou teses centrais cuidados que exigia o penoso estado do desconhecido.
a serem desenvolvidas na trama: a primeira, o que teria acontecido ao
jovem, segunda, o que ocorrerá com Túlio. Depois pôs-se a tocar as mãos do rapaz que estavam
Na cena no resgate por parte de Túlio o narrador insere o quentes como “larvas de um vulcão”, quando ele a viu julgou
contexto da escravidão com imenso intimismo. A cena destaca a estar diante de um anjo, se ele a teria amado, chamando-se de
crueldade da escravidão e a falta de esperança e alegria na vida dos louco, usando termos como “assassina” e “minha pobre mãe” era
escravos, que enfrentam muitos sofrimentos sem a liberdade de
um série de palavras desconexas que deixavam tanto Úrsula
expressar suas dores.
A narrativa enfatiza a importância da esperança e sugere que a quanto Túlio mais assustados e o escravo ainda mais temeroso
verdadeira libertação pode ser encontrada apenas na eternidade. de perder o recém-amigo.
Até que um nome é proferido de sua boca: Adelaide. E
Glossário do capítulo 1: isso é o bastante para instigar ainda mais a curiosidade de
Úrsula que já a imaginava como alguém bela e demoníaca ao
exíguo esquife: "E a sua beleza é amena e doce, e o exíguo¹ esquife², mesmo tempo.
que vai cortando as suas águas hibernais mansas e quedas". - ¹ Depois ambos, o doente e a jovem dormem, ela o
Pequeno, limitado. - ² Pequeno barco. – nesse trecho descreve-se o vigiando, e partilhando os cuidados entre o hospede e sua mãe,
tamanho ou espaço e referindo-se ao campo em que o cavaleiro viaja. sempre debilitada, quando repentinamente ele acorda sentindo
algente: " Expande-se-nos o coração quando calcamos sob os pés a dor no peito e Úrsula vai para acalmá-lo e medicá-lo.
erva reverdecida, onde gota a gota o orvalho chora no correr da noite Ambos se falam e o jovem rapaz expressa sua gratidão.
esse choro algente." – Gélido, muito frio. O enfermo continua a falar em delírio, alternando entre
páramos: “Quem haverá aí que se não sinta transportado ao lançar a lembranças de amor e momentos de desespero. Úrsula,
vista por esses vastos páramos ao alvorecer do dia” - Planícies ou áreas comovida pelas palavras do enfermo, derrama uma lágrima, mas
planas e desoladas. - Descreve o terreno onde ocorreu o acidente com o ela passa despercebida por ele.
cavaleiro e seu cavalo. O enfermo fala sobre a importância do amor e como o
coração se enche de felicidade quando se ama alguém. Úrsula,
ubiquidade: “[...] e o encontra, porque com o dom da ubiquidade Ele aí
está!” - Habilidade de estar presente em todos os lugares ao mesmo por sua vez, fica confusa com seus próprios sentimentos,
tempo. Refere-se nesse caso ao elemento da solidão provocado pelo misturando sua compaixão pelo enfermo com uma sensação
ambiente. estranha e inexplicável, repare nesse momento:
axixá: “[...] e mais belas se ostentavam, em que o axixá com seus frutos
— Não vedes? — prosseguiu fitando Úrsula — como
imitando purpúreas estrelas esmaltava a paisagem." - Planta típica da
região, provavelmente se referindo a uma espécie de palmeira. Descreve é belo amar-se! Como se nos expande o coração, como nos
a beleza e a vegetação exuberante da paisagem em agosto. transborda a alma de felicidade?
E a moça dizia consigo — Meu Deus! Meu Deus, que é
ginete: “com a outra frouxamente tomava as rédeas ao seu ginete.” o que eu sinto no coração que me enternece? Deve ser sem
Cavaleiro, pessoa que monta a cavalo. Contexto - Refere-se ao cavaleiro
dúvida esta forçada vigília, este lidar de todos os momentos.
e seu cavalo no momento do acidente.
O estado de minha pobre mãe. . . a compaixão que me
baldo: "De repente o cavalo, baldo de vigor, em uma das cavidades inspira este infeliz mancebo, tão próximo talvez da morte!. . .
onde o terreno se acidentava mais,[...]" - Desprovido de força ou vigor. Oh, terrível ideia! A morte! É ele tão jovem. . . Tão leal, e tão
Contexto - Descreve o estado debilitado do cavalo no momento da franca é a sua fisionomia. . . meu Deus! Seria bem duro vê-lo
queda.
morrer! Poupai-o, Senhor. Se eu pudesse, duplicaria os
dardejava: “E o sol já mais brilhante, e mais ardente e abrasador, subia meus cuidados para salvá-lo! Oh, se eu pudesse. . .
pressuroso a eterna escadaria do seu trono de luz, e dardejava seus
raios sobre o infeliz mancebo! - Lançar ou emitir com intensidade, no À medida que o delírio do enfermo diminui, ele entra em
contexto, os raios do sol. - Descreve a ação dos raios solares que iam ao um estado de alucinação mais tranquilo, onde parece estar
encontro do jovem.
cercado por ilusões reconfortantes. Úrsula fica aliviada ao ver a
enterneceu-se: “[...]e por isso seu coração enterneceu-se em presença sua melhora. No entanto, o enfermo tenta segurar a mão de
da dolorosa cena que se lhe ofereceu à vista.” - Comover-se com alguém que parece estar presente em suas visões, mas essa
compaixão ou ternura. Contexto - Descreve a emoção do homem ao mão escapa dele.
encontrar o cavaleiro ferido e desmaiado. Nesse momento ele vislumbra o amigo Túlio, e começa a
lenitivo: “Túlio, meu amigo, eu avalio a grandeza de dores sem lenitivo, refletir sobre a escravidão e a liberdade, e como tal liberdade
que te borbulha na alma” - Algo que alivia ou suaviza uma situação pode se fazer a mente, através da imaginação, como o escravo
difícil. O jovem reconhece o sofrimento de Túlio e sua situação como que, cativo em terra alheia, sonha com o seu sertão africano.
escravo.

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Ele compartilha a visão de que a mente humana é livre e esclarecendo- a, ela julgava-se humilhada; reassumia toda a
que, mesmo em condições de escravidão, o pensamento pode sua dignidade em face do cavaleiro, e só na solidão
voar para longe da realidade opressora. derramava o pranto de amargo e oculto padecer.
Túlio chora, e naquele momento o jovem volta a dormir
estando mais frio como nunca, seria a febre a acabar? Ou a Ela realizava passeios matinais secretos pela mata, onde
morte a o levar? Túlio e Úrsula estão agora conectados àquele buscava alívio para seus pensamentos. Sua mãe apreciava sua
jovem tão romântico, ao mesmo tempo tão misterioso e gentileza e cuidado. No entanto, os problemas de saúde da mãe
enigmático e dia após dia redobraram seus cuidados, e no pioravam a cada dia.
fundo, mesmo sempre dormindo em acalento, um sentimento O cavaleiro, quase totalmente recuperado, estava prestes
misterioso e novo também nascia no peito do jovem rapaz. a partir, mas ele não podia fazê-lo sem explicar algo a Úrsula. A
partida dele se aproximava, e ele não conseguia evitar a
Notas e análises saudade.
Nesse capítulo, o narrador cria uma atmosfera densa e Nessa manhã, Úrsula, mais cedo do que o habitual, se
misteriosa, introduzindo elementos de intriga e drama emocional. Os aventurou profundamente na mata e descansou sob uma grande
delírios do enfermo e a compaixão de Úrsula estabelecem uma base árvore jatobá. Ela estava oprimida por uma profunda angústia.
para o desenvolvimento dos personagens e a progressão da trama. A
Ela é surpreendida por um homem, o cavaleiro
autora soube genialmente utilizar a natureza e a noite como elementos
simbólicos para realçar as emoções e os conflitos internos dos convalescente, que antes de declarar sua partida, ajoelha-se e
personagens, criando assim uma narrativa rica em atmosfera e se declara apaixonado por ela. Úrsula fica inicialmente
sentimentos. Além disso há os elementos não ditos que ainda nos põe assustada, mas depois de uma conversa emocional, ela também
em curiosidade e há mais deixas para questionamentos do que confessa seu amor por ele. O cavaleiro compartilha sua história
respostas: quem é Adelaide? Por que sua mãe foi citada? O que ocorreu de amor passado e como Úrsula o curou desse amor anterior,
para ele estar assim? E o mais importante: qual o nome desse homem que era doloroso.
que ali sofre? Ele pede que Úrsula o aceite e o ame em troca. Ela
concorda e também promete amá-lo profundamente. O capítulo
Glossário do capítulo 2: termina com o cavaleiro prestes a contar a Úrsula a história de
sua vida, particularmente sobre sua mãe.
Noitibó, acauã – “ou pelo gemido triste de sentido noitibó, ou os
agoureiros pios do acauã.” – O noitibó é uma ave noturna, pertencente à
família dos caprimulgídeos, conhecida por seu canto triste e melancólico Notas e análises
durante a noite. É frequentemente associado a ambientes noturnos e ¹ Interessante notar nessa passagem como a tristeza pela parte
misteriosos. O acauã é outra ave noturna, também conhecida por seu da noite influencia seus pensamentos ao molde do romantismo, ela
canto noturno característico. É uma ave típica das regiões da América do ansiava pelo dia que lhe traria mais felicidade.
Sul, especialmente do Brasil. A palavra "acauã" é mencionada para
descrever o som que se une ao gemido do noitibó, contribuindo para a Glossário do capítulo 3
atmosfera silenciosa e melancólica da noite nos bosques.
engolfava – “Pobre menina! Toda entregue a uma preocupação,
Patentear – “e a donzela não se envergonhava de o patentear.” – tornar cuja causa não podia conhecer ainda, engolfava-se de dia para dia em
algo evidente, claro ou manifesto, geralmente por meio de ações, mais profunda tristeza.” – O termo "engolfava" refere-se a um processo
expressões ou demonstrações. Também pode se referir a revelar ou de afundamento ou imersão profunda em algo, muitas vezes
mostrar algo abertamente. No trecho, Úrsula não se envergonha de descrevendo um estado de absorção ou envolvimento completo. No
mostrar abertamente seus cuidados e compaixão pelo jovem enfermo. contexto do trecho, indica que a personagem estava afundando cada vez
Ela expressa sua preocupação e carinho de forma visível, sem tentar mais em sua tristeza, sem compreender completamente a causa.
esconder seus sentimentos.
eflúvios, cândido, langor - “[...]fazendo-lhe vibrar nas suas
Capítulo 3 cordas todos os simpáticos eflúvios¹ que emanavam do peito cândido² e
descuidoso da virgem. Esse alguém amava a palidez de Úrsula, esse
DECLARAÇÃO DE AMOR alguém adorava-lhe a suave melancolia, e o doce langor³ de seus negros
olhos[...]” – ¹ influências ou emanações sutis e muitas vezes
Vários dias se passaram, e o estado de saúde do imperceptíveis que podem afetar alguém ou algo. No trecho, os eflúvios
hóspede de Luíza B. estava melhorando. Túlio, o jovem negro, e são descritos como provenientes do peito cândido, ou seja, ²puro da
a bela Úrsula cuidavam dele e do ambiente saudável da região virgem, sugerindo uma conexão emocional ou espiritual. ³ se refere a
uma sensação de fraqueza, fadiga ou languidez. Pode também estar
contribuía para sua recuperação. No entanto, o cavaleiro falava
associado a um estado de melancolia suave e tranquilidade, como
sobre sua partida iminente, o que entristecia Úrsula. mencionado no trecho.
Túlio havia sido alforriado pelo mancebo em
agradecimento por sua dedicação. Agora, Túlio estava livre e louça – “[...]tão bela, tão pura, tão ingênua e tão louçã,[...]” –
disposto a segui-lo para onde quer que fosse. A relação entre os adjetivo que descreve algo que é belo, puro, delicado e imaculado. No
trecho, é usado para caracterizar Úrsula, sugerindo sua beleza e pureza.
dois era marcada por profunda gratidão chegando a causar uma
certa inveja a garota confusa de seus sentimentos. exprobava, acremente - “lembrando-se de sua mãe, que tudo
Enquanto a saúde do hóspede melhorava, a mãe de ignorava, exprobava¹-se a si acremente² de tão leve procedimento.” – ¹
Úrsula estava cada vez mais doente, aproximando-se da morte. adjetivo que descreve algo que é belo, puro, delicado e imaculado. No
Úrsula cuidava dela com carinho, mas sua própria melancolia trecho, é usado para caracterizar a virgem, sugerindo sua beleza e
pureza. ² "Acremente" é uma palavra que modifica o verbo "exprobava" e
aumentava a cada dia.¹ Ela passava noites inquietas e
indica que a personagem estava se censurando ou repreendendo de
contemplava amanheceres pensativos. forma severa e amarga por sua ação leve. Significa que ela estava
A jovem não conseguia entender a causa de seus sendo muito dura consigo mesma.
sentimentos e estava perdendo sua alegria juvenil. Alguém
observava essa transformação nela com amor e apreciava sua Capítulo 4
melancolia e palidez, mas Úrsula não compreendia seus próprios
sentimentos, ela experimentava ali o sentimento do primeiro A PRIMEIRA IMPRESSÃO
amor
Aqui se inicia a história contada pelo jovem, alegava que
Úrsula, malgrado seu, experimentava todo o fogo de relembrar tal fato lhe trará imensa dor, mas que amor a ela
um primeiro amor, bem o conhecia, e revoltava-se contra assim o fará. Tendo ele se separado de sua terra natal e de sua
esse sentimento, que supunha não ser compartilhado, e mãe, foi cursar Direito em São Paulo e lá permaneceu por seis
atribuía-o a simples amizade. Embalde o coração lhe gritava, meses, tempo esse que utriu uma imensa saudade pela mãe e

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tendo recebido o diploma voltou para os braços dessa mulher a a aceitar o desejo de seu filho. Sua falta de poder e influência na tomada
quem ele tanto amava. de decisões familiares reflete a realidade de muitas mulheres na
No entanto, ao vê-la percebeu que ela estava abatida, sociedade patriarcal.
mas depois tal suposta desfalecimento foi substituído pela
4. Amor e casamento por escolha: A história de amor entre
alegria de ver o filho e foi então que a mãe apresentou Adelaide, Tancredo e Adelaide contrasta fortemente com o casamento arranjado e
moça e dama de companhia a qual mãe jurou proteger e cuidar as pressões sociais. Eles representam a ideia crescente de que o amor
e pediu que o filho fizesse o mesmo. O rapaz beijou a mão da deveria ser uma parte central do casamento, em oposição às uniões
mãe alegando tal promessa. Nessa hora conhecemos o seu baseadas apenas em interesses materiais ou familiares. No entanto, a
nome, Tancredo. resistência do pai de Tancredo destaca o desafio que casais
enfrentavam ao tentar seguir seus próprios desejos românticos em uma
O pai veio cumprimentá-lo, contudo fala que não sociedade onde o poder paterno era supremo.
sentia pelo pai o mesmo amor pela mãe, pois era ele um
É incrível vermos como a autora genialmente nos coloca em um
tirano e sua mãe, uma vítima da crueldade paterna. enredo envolvente, com o pai como um vilão, rígido e desalmado que
É que entre ele e sua esposa estava colocado o mais contrasta com a figura bondosa da mãe. Tais elementos de um membro
despótico poder: meu pai era o tirano de sua mulher; e ela, da família cruel serão vistos mais tarde em O Seminarista, em que o pai
triste vítima, chorava em silêncio, e resignava-se com de Eugênio proíbe o amor dele com Margarida, em Helena, de Machado
sublime brandura. de Assis, em que a mãe de Jorge o obriga a ir para a Guerra do
Meu pai era para com ela um homem desapiedado e Paraguai para esquecer Estela e fazê-la se casar com outro, em O
orgulhoso — minha mãe era uma santa e humilde mulher. Cabeleira, em que o pai, cangaceiro, retira o filho do seio materno para
torná-lo bandido o que o afasta de Luísa, todos esses exemplos foram
Quantas vezes na infância, malgrado meu,
de livros publicados anos depois de Úrsula.
testemunhei cenas dolorosas que magoavam, e de louca
prepotência, que revoltavam! E meu coração alvoroçava-se
nessas ocasiões apesar das prudentes admoestações de Capítulo 5
minha pobre mãe. A ENTREVISTA

Tanto que o pai, por ciúmes da mãe não deixara, nos seis Tancredo interrompe a história para expressar sua
de curso fora de casa, o filho fazer visitas apenas para maltratar profunda dor a Úrsula devido à humilhação que ele e sua mãe
a esposa que chorava de saudades suas. Agora era diferente, e sofreram nas mãos de seu pai. Ele explica como tentou chorar
ele estava de volta, gostava de ver Adelaide e tinha por ela diante de sua mãe, que aceitou a situação com humildade e
grande afeição e gostava pelo fato de que a moça dava alegria à resignação, enquanto ele próprio estava cheio de indignação.
sua mãe. Adelaide, a jovem por quem Tancredo está apaixonado,
Descobriu ao longo do tempo que estava apaixonado está presente e pede que a discussão e o sofrimento parem. Ela
pela jovem órfã, e depois declarou seu amor, mas Adelaide teria restitui os votos de Tancredo e pede que não desafie a cólera do
dito que era pobre e que o pai não permitiria tal união. pai.
A mãe, ao saber do amor de ambos, estremeceu de Tancredo se oferece para sacrificar seu amor por
medo, pois sabia que o pai não permitiria tal casamento, mas Adelaide para evitar o sofrimento de sua mãe, mas ela recusa
Tancredo acredita que o pai não lhe negaria o único pedido de essa oferta e chora, nesse momento Tancredo na narrativa nos
sua vida, não mesmo. concede uma oferta de uma ação futura e cruel, note:
No dia do aniversário de Adelaide, o jovem iludido pelo
amor, quis falar ao pai, mas a mãe disse que iria em seu lugar e — Úrsula, minha Úrsula, só agora sei que essa mulher
ele ficou a ouvir a conversa dos dois. mentia, que suas lágrimas eram encadeadas¹ aleivosias², e
O que ele ouviu foi aterrador. Percebeu ele que o pai era suas palavras refalsadas³ como o seu coração.
mais cruel do que o imaginado, um homem vil e desumano,
maltratou a esposa e não consentiu em sua união, por mais que Tancredo então procura seu pai para obter sua permissão
a mãe argumentasse ele ordenou que se retirasse de sua frente para se casar com Adelaide. Seu pai, inicialmente com uma
e ela obedeceu. expressão de ódio, concorda em ouvir o motivo da visita de
Tancredo, ao longo da conversa ele vai se acalmando e
Notas e análises: tentando explicar para o filho a procedência do pai de Adelaide,
Esse capítulo é uma excelente oportunidade para se analisar o mas o jovem corta a conversa e insiste no casamento.
aspecto feminino dentro da obra principalmente por oferecer um Tancredo explica seu amor por Adelaide e pede a
vislumbre vívido das questões patriarcais e das normas sociais permissão de seu pai para casar com ela. Seu pai concorda,
relacionadas ao casamento que prevaleciam na época em que a história mas com a condição de que eles esperem um ano antes do
se passa.
casamento e aproveita para lhe chamar a atenção para a
Quatro pontos não podem passar despercebidos:
seriedade do casamento e o papel da mulher no matrimônio:
1. Patriarcado e Poder Masculino: o personagem masculino,
no caso, o pai de Tancredo, a qual seu nome não é revelado, detém um - [...] A esposa que tomamos é a companheira eterna
poder quase absoluto sobre a família. Ele toma decisões importantes, dos nossos dias. Com ela repartimos as nossas dores, ou
como quem seu filho deve ou não se casar, sem levar em consideração os prazeres que nos afagam a vida. Se é ela virtuosa,
os desejos ou sentimentos de outros membros da família, incluindo sua nossos filhos crescem abençoados pelo céu, porque é ela
esposa. Isso ilustra como, naquela época, os homens frequentemente que lhes dá a primeira educação, as primeiras ideias de
exerciam autoridade desmedida sobre as vidas e as escolhas de suas
moral; é ela enfim que lhes forma o coração, e os mete na
esposas e filhos.
carreira da vida com um passo, que a virtude marca. Mas, se
2. Casamento arranjado e interesses financeiros: A oposição pelo contrário, sua educação abandonada torna-a uma
do pai de Tancredo ao casamento com Adelaide também destaca como mulher sem alma, inconsequente, leviana, estúpida, ou
os casamentos eram frequentemente arranjados por razões financeiras e impertinente, então do paraíso das nossas sonha- das
sociais. O pai vê Adelaide como uma órfã sem fortuna e, portanto, venturas despenhamo-nos num abismo de eterno desgosto.
inadequada para seu filho.
O pai novamente tenta alertar para o fato de que Adelaide
3. Submissão das mulheres: A mãe de Tancredo, por outro
era muito nova e ele ainda não a conhecia, e novamente o filho o
lado, representa a figura feminina típica daquela época, caracterizada
por sua submissão ao marido. Ela se esforça para apaziguar seu interrompe. Depois o pai apresenta a Tancredo uma oferta de
esposo, mesmo diante de seu tratamento desumano, e tenta persuadi-lo

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emprego que o levará para longe de sua província natal, alega
que não poderá rejeitar tal emprego. Mulher odiosa, eu vos amaldiçoo! Por cada um dos
Tancredo fica devastado com a notícia de que será transportes de ternura, que outrora meu coração vos deu,
exilado de sua terra natal e pede a seu pai que ele possa se tende um pungir agudo de profunda dor; e dor, que me
casar com Adelaide antes de partir. Seu pai fica furioso e exige dilacera agora a alma, seja a partilha vossa na hora
que Tancredo aceite a condição imposta anteriormente. derradeira. Por cada uma só das lágrimas de minha mãe
O capítulo termina com Tancredo aceitando a condição choreis um pranto amargo, mas árido como um campo
de seu pai, embora com relutância e dor em seu coração. pedregoso, doído como a desesperação de um amor traído.
E nem uma mão, que vos enxugue o pranto, e nem uma voz
Notas e análises: meiga, que vos suavize a dor de todos os mo- mentos. O fel
¹ ato de ligar ou conectar algo em uma sequência ordenada de um profundo, mas irremediável remorso, vos envenene o
² ações ou palavras traiçoeiras futuro e o desejado prazer, e no meio da opulência e do
³ ato de tornar algo falso. luxo, firam-vos sem tréguas os insultos de impiedosa sorte.
Este capítulo destaca os conflitos familiares, as emoções
Arfe o vosso peito, e estale por magoados suspiros, e
intensas dos personagens e a pressão social que afeta suas escolhas.
Ele também mostra a complexidade das relações entre os personagens ninguém os escute; e sobre esse sofrimento terrível cuspam
e as decisões difíceis que precisam tomar em nome do amor e do dever. os homens, e riam-se de vós.
Entretanto a função central desse capítulo é jogar luz no caráter ambíguo
que permeia a personalidade de Adelaide, o narrador mostra indícios de Ele se retirou da casa e encerrou a história para Úrsula
que a experiência amorosa será mais desastrosa do que feliz, o que leva que concedeu sua mão para ele a beijasse.
novamente o leitor a curiosidade e mantê-lo preso ao próximo capítulo.
Capítulo 8
Capítulo 6 LUÍZA B.
A DESPEDIDA
Esse capítulo se concentra em Luiza B., mãe de Úrsula,
Em capítulo bastante curto em relação aos demais, a mãe como já dito anteriormente, a mãe de Úrsula padecia por uma
fica sabendo das condições impostas e da repentina ida do filho, grave doença, era paralítica e essa condição fragilizou bastante
o que a põe ainda mais em pranto. sua saúde.
Sobre Adelaide ele alega que o sentimento de sofrer não A filha tinha demorado ao encontro da mãe por conta da
era verdadeiro e ao pai disse aliviasse a dor da mãe em sua conversa com Tancredo, ela expressou preocupação sobre o
ausência e que cuidasse de sua futura esposa. jovem que desejava ir embora e tal lembrança a magoou ainda
O capítulo culmina com Tancredo se despedindo de sua mais.
mãe e de Adelaide. Apesar de sua determinação em não ceder à O jovem entrou na sala para cumprimentar a senhora que
emoção, ele acaba chorando diante delas. O último olhar de cuidara de sua saúde e a mãe de Úrsula passou a vê-lo e tentou
Adelaide é descrito como “cheio de ternura” e “dor”, pois ela até mesmo ler seu coração.
compreende a gravidade da situação e a incerteza do futuro. Viu como alguém bom e pensou em pedir que cuidasse
de sua filha, mas hesitou, o jovem insistiu que ele pedisse o que
Capítulo 7 desejasse.
ADELAIDE Ela então pediu que cuidasse de sua filha, alegou
também que seu irmão F de P. tinha por ela imenso ódio. O
Tancredo reflete sobre sua vida no exílio e a ausência de motivo? Havia se casado com alguém inferior a escala da
notícias de Adelaide. Ele relembra a correspondência que família.
recebia de sua mãe e como essa correspondência diminuiu Tendo despertado o ódio do irmão, o marido lhe trouxe
gradualmente até cessar completamente. A falta de notícias o grandes infelicidades até ter Úrsula, a paternidade, transformou-
deixou angustiado, mas ele se recuperou de uma doença grave o, o que o fez querer reaver o dinheiro gasto com os vícios e os
e decidiu voltar para casa. amores banais. Infelizmente, não teve tempo, o marido acabou
Antes de retornar à sua terra natal, Tancredo escrita com sendo assassinado e irmão vingativo comprou a dívida da
letras frágeis, como se houvesse dificuldade em escrevê-la, uma fazenda, elas viviam a mercê dele.
carta de sua mãe, mas não acusa seu pai de nada e não havia Tancredo também se identifica, o seu sobrenome revela
mencionado Adelaide. Ele também lê cartas de seu pai e de uma posição social rica e bem estabelecida o que deixa Luiza
amigos, e descobre de fato que aquela carta de sua mãe tinha ainda mais surpresa.
sido a última, ela estava morta. Além disso, Úrsula revela o seu amor a ele e ele deseja
O jovem cavalgou intermitente por quinze dias e ao chega desposar Úrsula, a mãe não quer conceder a mão da filha, pois
sentiu o clima fúnebre do ambiente. eles eram de posição mais baixa que a dele.
Quando finalmente encontra Adelaide em sua casa, fica Entretanto, após a insistência de ambos a mãe os pede
encantado com sua beleza, chega por um instante a esquecer que se ajoelhem e assim abençoa o casal concedendo a tão
sua dor, mas sua felicidade é efêmera. Adelaide se mostra fria e sonhada promessa de um casamento.
distante, e diz:
Capítulo 9
— Tancredo, respeitai a esposa de vosso pai! A PRETA SUZANA
Tancredo fica arrasado e acusa Adelaide de traição Para mim, um dos mais belos capítulos desse romance,
alegando inclusive que sua mãe teria morrido provavelmente Túlio irá partir com Tancredo e fora se despedir de sua “mãe”
devido à tristeza e ao sofrimento causados por essa situação. Suzana, uma velha senhora e fiadeira da fazenda. A preta o
Ele confronta seu pai e Adelaide, expressando seu recrimina e chama-o de ingrato, pois em breve Úrsula ficará
profundo desgosto e amaldiçoando a tal madrasta, enquanto sozinha e ela também tem pouco tempo aquele mudo, quem
isso, a recém desposada ordena ao pai que o retire da sala, o cuidaria da jovem moça? Ainda mais pelo fato de que dona Luiza
pai fica sem reação apenas olhando para o chão, o clima fica B. tratara-o como filho.
intenso quando Tancredo alega que o pai havia sido um tirano Túlio pede perdão, e diz que não estava trocando um
para um mulher santa e que agora era um covarde para uma cativeiro por outro, pois Tancredo havia sido alforriado pelo
mulher demoníaca e continua a amaldiçoa-la: jovem rapaz, ele tinha enfim liberdade. Isso comove

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imensamente Suzana que até chora, Túlio se sente mal por A história se desenrola com Úrsula, a protagonista,
despertar tamanha mágoa, mas a velha diz tais lágrimas a experimentando uma mistura de emoções. Ela sente uma
faziam recordar de que também provara da liberdade.¹ saudade profunda de Tancredo, o homem que ama, mas que
A velha começa a contar sua história, no tempo da está prestes a partir. Esta saudade é temperada pela esperança
colheita de milho e amendoim de sua terra africana, era moça, de um reencontro, pois ambos compartilharam seus sentimentos
virtuosa, havia casado com um homem a quem muito amara, e paixão.
tivera um filho a quem muito lhe tinha amor, mas um dia, em O capítulo começa com Úrsula despedindo-se de
meio a colheita, ouvira um assobio, e por um momento de Tancredo, que está prestes a partir. Ambos têm um amor
descuido se vira amarrada por cordas, mesmo implorando pela intenso, mas sua despedida é repleta de tristeza e ansiedade.
liberdade os homens riam dela e veio para uma terra Tancredo promete retornar em breve, e Úrsula fica com a
desconhecida, sofrer maus-tratos e abusos, narra com amargor lembrança de seu amado.
a vinda de 30 dias passando fome, bebendo água podre e vendo No entanto, enquanto Úrsula está imersa em suas
muitos dos seus morrerem, ela assim diz: reflexões e saudades, ela se aventura na mata, onde Tancredo
havia confessado seu amor a ela anteriormente. Lá, ela começa
Meteram-me a mim e a mais trezentos companheiros a chorar e lamentar a partida de Tancredo. Ela se lembra de
de infortúnio e de cativeiro no estreito e infecto porão de um seus momentos juntos e entalha o nome dele em uma árvore
navio. Trinta dias de cruéis tormentos, e de falta absoluta de como um ato de carinho.
tudo quanto é mais necessário à vida passamos nessa Enquanto Úrsula está na mata, um tiro de arcabuz é
sepultura, até que abordamos às praias brasileiras. Para disparado, assustando-a. Ela encontra uma perdiz ferida e
caber a mercadoria humana no porão fomos amarrados em agonizante, e seu coração se enche de compaixão pela ave que
pé, e, para que não houvesse receio de revolta, chega a abraçá-la em seu peito sujando seu vestido. Neste
acorrentados como os animais ferozes das nossas matas, momento, um homem desconhecido aparece diante dela, e ela
que se levam para recreio dos potentados da Europa: fica assustada e perturbada por sua presença enquanto o
davam-nos a água imunda, podre e dada com mesquinhez, a homem misterioso a olhava com imenso afeto e carinho.
comida má e ainda mais porca; vimos morrer ao nosso lado O desconhecido tenta se comunicar com Úrsula, mas ela
muitos companheiros à falta de ar, de alimento e de água. É inicialmente o rejeita, sentindo medo e desconfiança. No entanto,
horrível lembrar que criaturas humanas tratem a seus ele insiste e revela seus sentimentos por ela, chama-a pelo
semelhantes assim, e que não lhes doa a consciência de nome e vai expressando um amor intenso e pedindo seu afeto
levá-los à sepultura asfixiados e famintos! em troca. Úrsula se sente pressionada pela presença e pelas
Muitos não deixavam chegar esse último extremo — palavras do desconhecido, mas mantém sua distância e pede
davam-se à morte.² para ser deixada em paz. Ele é assim descrito:

Chegando ao Brasil fora comprado pelo comendador P., Esse homem não estava no verdor dos anos; mas sua
homem cruel que torturava e maltratava os escravos, depois fisionomia, suposto que severa e pouco simpática, nessa
houve o casamento de dona Luiza B. e viu a mulher também hora crepuscular, que dá certa sombra a toda a natureza,
sofrer pela forma como o marido tratava os escravos, quando ele não denunciava a sua idade. A pele sem rugas, os olhos
morreu, dona Luíza passou a tratá-los melhor, mas a magia e a negros e cintilantes, tinham um quê de belo, mas que não
saudade de sua liberdade eram insubstituíveis.³ atraía. Era de estatura acima da medíocre, esbelto, e bem
“Túlio ajoelhou-se respeitoso ante tão profundo sentir” e conformado; e as feições finas davam-lhe um ar
mãe Suzana abençoou sua partida. aristocrático, que, quando não atrai, sempre agrada.

Notas e análises O homem misterioso diz ser amigo de sua mãe e até se
¹ Na literatura do século XIX, especialmente no contexto do emociona ao citá-la, mas ela o repreende dizendo que sua mãe
Romantismo, as vozes negras eram frequentemente silenciadas ou sofrera muitas amarguras e que não tinha amigos.
retratadas de maneira estereotipada. Maria Firmina dos Reis, como uma O capítulo termina com o desconhecido implorando a
das primeiras escritoras negras no Brasil, quebrou essa tendência ao dar
Úrsula que não o odeie e afirmando que seu amor é ardente e
voz à personagem Suzana, uma escrava negra. Isso é notável porque
permitiu que os leitores vissem a perspectiva e as experiências das respeitoso chegando a se ajoelhar e dizer que a partir daquele
pessoas escravizadas sob uma luz humanizada e autêntica, aspecto momento seria seu escravo.¹ No entanto, Úrsula continua a se
esse que só veriam duas décadas depois em Castro Alves. sentir angustiada e desconfortável com a situação, enquanto o
² Isso funciona como uma denúncia contundente da crueldade e desconhecido expressa sua paixão e desejo de conquistá-la. O
desumanidade do sistema escravista. homem pede o amor em nome de sua mãe, e ainda pede uma
³ O capítulo também destaca a complexidade das relações entre palavra que o anime, mas ela diz que não poderá ceder tal
senhores e escravos. Enquanto Suzana critica a crueldade de alguns palavra e pede que se identifique.
senhores, ela também elogia a bondade da Senhora Luíza B. e sua filha.
Ele diz que não poderá fazê-lo, pois se ela soubesse
Isso demonstra que as relações entre senhores e escravos não eram
unidimensionais, mas sim nuances e afetadas pela personalidade e quem era, preferia que fosse amado como um desconhecido e
caráter individual de cada pessoa. até chega em alguns momentos a trocar a palavras doces por
A narrativa de Suzana ressalta a resiliência e a luta dos ameaças do tipo:
escravizados por liberdade e dignidade. Túlio, também representa essa
busca por liberdade ao escolher seguir o senhor Tancredo em busca de Rogai ao céu — acrescentou —, meiga e inocente
uma vida melhor. donzela, rogai ao céu para que vos possa esquecer; porque
se o meu amor prosseguir assim, extremoso, indomável,
Glossário do capítulo 9 apaixonado, haveis de ser minha, porque ninguém me
desdenha impunemente. Ouvis?
rutilante – “via despontar o sol rutilante e ardente do meu país” - algo
que brilha intensamente. – Nesse trecho Suzana descreve o seu país
Úrsula se retira da floresta prometendo a si mesma nunca
antes de ser capturada.
mais voltar lá. O homem fica a refletir sobre a donzela Úrsula
quando ele diz:
Capítulo 10
NA MATA — Mulher! Anjo ou demônio! Tu, a filha de minha
irmã! Úrsula, para que te vi eu? Mulher, para que te amei?
Muito ódio tive ao homem que foi teu pai: ele caiu às minhas

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mãos, e o meu ódio não ficou satisfeito. Odiei-lhe as cinzas; embrutecido, e tanto lhe afeiaram a moral, que era odiado, e
sim odiei-as até hoje; mas triunfaste do meu coração, temido de quantos o praticavam ou conheciam de nome.
confesso-me vencido, amo-te! Humilhei-me ante uma Ele tornara-se odioso e temível aos seus escravos:
criança, que desdenhou-me e parece detestar-me! Hás de nunca fora benigno e generoso para com eles; porém o
amar-me. Humilhado pedi-te o teu afeto. Maldição! Paulo B., ódio, e o amor, que lhe torturavam de contínuo, fizeram-no
estás vingado! uma fera, um celerado.
Nunca mais cansou de duplicar rigores às pobres
Sim, o homem em questão é o tio de Úrsula F. de P *** criaturas que eram seus escravos! Apraziam-lhe os
citado no capítulo anterior. sofrimentos destes porque ele também sofria.¹

Notas e análises Para Úrsula a percepção era a mesma e o temor da


¹ nota-se aqui uma situação de vassalagem amorosa, em que morte da mãe jogava ela em um abismo de aflições, se ela
o homem não tendo o amor de sua amada deseja ao menos servi-la morresse o homem iria querer se casar com ela, e Fernando
como escravo para se manter próximo. triunfaria, para ela, ele não passava de um aproveitador.
Nesse capítulo, a autora explora as emoções complexas de
Foi quando veio ao encontro de Úrsula a preta Suzana
Úrsula, sua saudade e esperança em relação a Tancredo, e a introdução
de um elemento misterioso na história com a aparição do desconhecido, aos prantos dizendo que a mãe, dona Luíza B. estava a falecer e
que parece nutrir um amor obsessivo por ela justo quando Tancredo precisava dar o último adeus ao grande amor de sua vida, sua
parte. A narrativa enfoca os conflitos emocionais e as tensões que filha amada. A cena termina com Úrsula sendo levada para ver
Úrsula está enfrentando, enquanto também introduz intrigas adicionais à sua mãe, enquanto enfrenta uma mistura de emoções e
trama. preocupações.

Capítulo 11 Notas e análises


O DERRADEIRO ADEUS ¹ Neste capítulo, Maria Firmina brinca e nos confunde, será que
Fernando está tão arrependido assim, ele teria mesmo mudado? Havia
de fato remorso em suas falas e ações? O narrador nos enceta duas
Úrsula está passando por uma série de emoções visões, a visão da alma, por dentro de suas ações perversas movidas
conflitantes. Ela se sente sobrecarregada com as reviravoltas pelo sofrimento e a visão de Úrsula que tem pelo tio um imenso rancor
que ocorreram em sua vida. Inicialmente, ela estava feliz com o pelo que fizera a sua mãe. Sendo assim fica o ponto, se Fernando faz
amor de Tancredo, mas agora está perturbada por um encontro sofrer sofrendo, se ele for rejeitado, será um vilão ou um homem que
na mata com um homem misterioso e ameaçador. busca perdão? Tudo isso nos é jogado e deixado para pensar, ou
Úrsula se preocupa com as palavras apaixonadas e melhor, para ler nos próximos capítulos.
ameaçadoras do homem da mata, temendo que ele represente
uma grande desgraça para ela. Ela também se recorda das Capítulo 12
manchas de sangue em suas roupas, que a perturbaram FOGE!
profundamente.
A personagem deseja que Tancredo a proteja contra esse Em um curto capítulo, temos o diálogo derradeiro de mãe
homem desconhecido e acredita que o amor dele lhe dará forças e filha, a mãe moribunda fala que o irmão veio lhe pedir perdão,
para enfrentar as ameaças do estranho. pois algo para falar, Fernando havia lhe confessado que no
No entanto, Úrsula é atormentada por pesadelos durante passado havia assassinado o pai de Úrsula e que agora, a filha o
a noite, nos quais o homem misterioso a assombra. Ela luta para rejeitava, mas ele queria mostrar tal arrependimento cuidando de
encontrar paz e se desespera com a visão do homem Úrsula no sentido de tê-la como esposa.
ameaçador. O pior ainda vem por aí, a mãe revela que Fernando após
A situação piora quando Úrsula recebe uma carta de seu sair da presença da irmã iria à cidade para voltar com um
tio, o nome de Fernando nos é trazido ao final da assinatura. sacerdote e executar o casamento à força com Úrsula.
Luíza, sua mãe, fica preocupada com o motivo da visita de seu A moça entra em desespero e sua mãe lhe pedi entre i
irmão e teme que ele ainda busque vingança, mas a carta
expressa um tom imenso de arrependimento e retidão, dona — Úrsula, minha filha, teme a cólera de Fernando;
Luiza fica em dúvida, mas a moça duvida de tal boa vontade, mas sobretudo teme e repele seu amor desenfreado e
Úrsula também fica apreensiva e se pergunta por que Fernando libidinoso. Meu Deus, perdoai-me se peco nisto. . .
está perturbando a paz de ambas naquele momento. Aconselho-te. . . . que fujas. . .Foge, minha filha. Foge!
Quando Fernando chega, repentinamente após a
conversa de Luiza e Úrsula, e se agarra ao peito da irmã, ele e Úrsula vê a vida de sua mãe se esvair, partir, ela chora
Luíza têm um encontro emotivo e surpreendente, e Úrsula entra copiosamente pela perda da mãe e devido a triste ideia de se ver
em pânico, reconhecendo nele o homem misterioso da mata e forçada a casar com Fernando.
temendo por sua segurança, isso acarreta ainda mais o Pela manhã o corpo de dona Luíza atravessa a fazenda
desespero e ansiedade na menina. em direção ao cemitério.
O narrador adentra no espírito de Fernando, inclusive a
forma como tratava os escravos da casa, observe: Notas e análises
Nesse momento temos a certeza das reais intenções de
Fernando combatia a dezoito anos o poder desse Fernando, o amor que possui por Úrsula não passa de uma
amor fraterno, e seu orgulho conseguiu por algum tempo o possessividade, a verdade em seu arrependimento, mas há uma má
que o coração repugnava, o que a razão e a inteligência intenção no casamento forçado com Úrsula, e se a mãe a mandou fugir
era porque sabia que não tinha como Úrsula resistir ao casamento.
condenavam, e o que ele sentia dolorosamente, porque só
nesse afeto lhe estava a ventura de toda a sua vida.
E para vencer-se obstinadamente evitava a vista de Capítulo 13
sua irmã, a que não poderia resistir, para bem saciar a sua O CEMITÉRIO DE SANTA CRUZ
vingança, para bem flagelar-se, flagelando-a na sua
desgraça. Inicia-se com a descrição do cenário como uma tarde que
Fernando tinha vivido solitário, e desesperado com encapsula toda a beleza, luxúria e poesia do equador. A
essa luta terrível do coração com o orgulho: e esses descrição sugere uma tarde de cores vibrantes, com o sol se
desgostos íntimos, que ele próprio forjava, o tinham pondo e a lua surgindo no horizonte. Os últimos raios de sol se

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misturam com os raios prateados da lua de agosto, criando um Deveis saber que esse homem amaldiçoado comprou
ambiente mágico.¹ as numerosas dívidas que meu senhor legou à órfã e à sua
O capítulo se passa no cemitério de Santa Cruz, que está viúva, com o intuito tão somente de reduzi-la ao último
silencioso e deserto, com apenas o vento que sussurra entre as extremo de miséria, como a reduziu; porque seus diversos
árvores quebrando a monotonia e a solidão do lugar. O narrador credores ter-se-iam comovido, e talvez lhe facultassem os
reflete sobre o esquecimento que a morte traz e como os meios de os ir pagando sem grande detrimento de sua
segredos dos mortos são guardados pelo sepulcro. fortuna, aliás tão arruinada.
O cemitério de Santa Cruz é descrito como simples e
despojado, sem monumentos extravagantes, apenas uma À medida que avançam pela fazenda de Santa Cruz,
capelinha singela e uma cruz. A estrada que leva a Santa Cruz Túlio relembra os sofrimentos de sua mãe e expressa seu ódio
passa por perto do cemitério. inicial por vingança, mas sua “mãe”, Susana, o ajudou a superar
Úrsula, chega ao cemitério no crepúsculo. Ela está esse desejo. Tancredo e Túlio, ambos marcados por suas
sofrendo muito e busca a sepultura de sua mãe. Ajoelha-se junto próprias dores, compartilham lágrimas e empatia pela história do
à sepultura e chora esta perda irreparável. Ela está sozinha e outro.
entregue ao destino que começa a experimentar com tanta Ao chegarem à casa de Luíza B., eles encontram Susana,
dureza. que revela que Úrsula saiu para orar no cemitério de Santa Cruz
Profundamente abalada chega até mesmo a esquecer do sobre a sepultura de sua mãe. Tancredo e Túlio partem
seu amor por Tancredo e até mesmo o ódio que sente pelo imediatamente para encontrar Úrsula, preocupados com as
comendador. Sua dor é intensa e sua única conexão com a vida revelações de Susana sobre a perseguição de Fernando P., o
é seu amor por Tancredo. comendador, que havia abreviado os dias da mãe de Úrsula e
No auge de seu sofrimento, Úrsula desmaia junto à agora ameaça se casar com ela à força.
sepultura de sua mãe, e sua vida parece estar se esvaindo. Ela O capítulo termina com Tancredo e Túlio galopando em
está sozinha e sem ajuda. busca de Úrsula, determinados a protegê-la do comendador e a
Enquanto isso, ao longe, um barulho de cavalos se reunir-se com ela.
aproxima. Dois homens, Tancredo e Túlio, chegam ao cemitério.
Eles encontram Úrsula desmaiada junto à sepultura. Tancredo, Capítulo 15
profundamente apaixonado por ela, a reconhece e a abraça. NO CONVENTO DE ****
Úrsula desperta ao toque de Tancredo, e há um momento
emocionante de reencontro.
Após uma breve oração, Úrsula e Tancredo decidem fugir
No entanto, Túlio lembra a Tancredo que eles precisam
do comendador Fernando P. Úrsula está aterrorizada com a
partir rapidamente, pois Úrsula está debilitada e não pode
perseguição dele e implora para que fujam antes que ele os
suportar uma jornada lenta. Tancredo concorda, preocupado
alcance. Tancredo concorda e eles partem em uma viagem para
com a saúde de Úrsula. Eles planejam levar Úrsula com eles, e a
escapar do comendador.
esperança de um futuro melhor parece brilhar novamente para a
Eles deixam a estrada real e tomam um atalho mais longo
protagonista.
para evitar o comendador. Durante a viagem, Tancredo
O capítulo termina com Tancredo, Úrsula e Túlio orando
compartilha com Úrsula os tristes eventos que ocorreram
pelo descanso eterno da mãe de Úrsula, Luíza B.
durante sua ausência.
Finalmente, eles chegam à cidade de ***, onde procuram
Glossário do capitulo 13
abrigo no convento de Nossa Senhora da ***. O convento é
descrito como um edifício antigo, simples e melancólico,
alvião – “De joelhos beijou a terra úmida, e ainda revolta pelo
alvião[...]” - O termo "alvião" neste contexto refere-se a uma ferramenta afastado do mundo, onde vivem as virgens dedicadas ao
agrícola usada para revirar a terra, geralmente uma enxada ou um Senhor. As freiras levam uma vida de castidade e oração, longe
instrumento semelhante dos prazeres mundanos.
Úrsula e Tancredo param diante das paredes do convento
Capítulo 14 e, após observarem o local, Tancredo a conduz à porta do
convento, que se abre para eles. Úrsula está radiante de beleza
O REGRESSO e parece estar em paz ao entrar no convento.
Tancredo expressa sua determinação em proteger Úrsula
“AGORA É PRECISO SABERMOS como Tancredo, de
do comendador e declara seu amor por ela. Ele acredita que o
volta de sua viagem, pôde saber onde estava Úrsula, e o que lhe
comendador não conseguirá separá-los, pois a mulher só ama
havia acontecido.” O capítulo agora pretende explicar o que
verdadeiramente uma vez em sua vida.
poderia ser uma incoerência de roteiro, mas como Tancredo
O capítulo termina com Tancredo refletindo sobre a
sabia onde Úrsula estava?
verdadeira natureza da mulher, contrastando aquelas que
Tancredo, depois de concluir sua missão na comarca de
compreenderam sua nobre missão de amor e paz com aquelas
***, retorna apressadamente para reencontrar sua amada,
que trocaram seus afetos genuínos por ouro e ganância,
Úrsula. Ele está dominado pela ideia de revê-la e está ansioso
perdendo assim sua honra.
para chegar até ela. Ao longo do caminho, ele expressa seu
amor profundo por Úrsula e sua impaciência em revê-la.
Tancredo está acompanhado por Túlio que lhe oferece Capítulo 16
um caminho mais rápido pela fazenda Santa Cruz, o ex escravo O COMENDADOR FERNANDO P.
tem lembranças dolorosas da fazenda de Santa Cruz, onde sua
mãe, uma escrava, sofreu terrivelmente nas mãos do cruel A narrativa se volta novamente para Fernando que havia
Comendador Fernando P., chegando a chorar e ter tais lágrimas sido deixado de lado, mas agora volta a ter a atenção narrativa.
compartilhadas por Tancredo. Em um capítulo tenso, o comendador quer acima de tudo
Enquanto Tancredo e Túlio se aproximam da fazenda de obter o amor e o casamento a força. Ao descobrir que Úrsula
Santa Cruz, Túlio compartilha a triste história de sua mãe e fugiu com Tancredo, um jovem de quem desaprova
como ela foi submetida a tratamentos brutais e separada dele profundamente, Fernando P. entra em um estado de desespero.
quando criança. Ele também revela que Fernando P., o Sua busca por Úrsula se torna uma obsessão, e ele está
comendador, comprou as dívidas que o marido de Luíza B., irmã determinado a encontrá-la a qualquer custo. Foi até o sacerdote,
de Úrsula, deixou, com o objetivo de reduzi-las à miséria. que eram “amigos” o tipo que um suporta o outro, e levou-o para
que assim que visse Úrsula casasse logo com ela.

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Foi até a fazenda da falecida Luíza B., invadiu a sala e Era Otelo² no seu ciúme, Satanás expulso do céu e
perguntou pela moça, Úrsula, pensando em ganhar mais tempo, ferido no orgulho.³
disse que a moça fora sozinha ao cemitério, e deduziu que
Tancredo já a teria resgatado. Túlio se viu perdido, como se nada mais pudesse fazer
O comendador foi e lá nada encontrou, sentiu-se pela sua vida, mesmo assim se manteve firme. Fernando
enganado e mandou que seu feitor branco, trouxesse a escrava pergunta por Tancredo, mas Túlio revela que ele estaria em
Suzana arrastada por cavalos. casa, Fernando grita chamando-o de mentiroso, sabia que
O feitor repreende a tortura e se recusa a fazer isso, Úrsula estava em um convento esperando pelo casamento, mas
alegando que avisará a velha para que fuja, mas ao sair, o padre ele queria intercepta-lo para não chegar no convento.
já vinha com os cavalos e Suzana vinha como em procissão. O Fernando propõe que se ele entregasse a localização de
feitor lhe oferece um cavalo para fuga, mas ela diz ser inocente e Tancredo ele daria até mesmo metade da riqueza dele. Túlio se
que não teria nada a temer. esquece do medo e esbraveja com ele que jamais entregaria a
Quando novamente interrogada pelo comendador, ela localização daquele que o tirou da escravidão.
alega não saber do paradeiro da moça e resiste a pressão Fernando golpeia-o na boca e o negro cai desmaiado e
psicológica, o padre defende-a chamando atenção para não ele é entregue aos cuidados de Antero.
derramar sangue inocente.
Fernando manda-a para a cela mais úmida e manda Notas e análises
colocar correntes em seus braços e pernas, o padre recomenda ¹ observe novamente o elemento romântico de idealização
que não faça tal maldade, mas é em vão. feminina, a mulher retratada como objeto de adoração.
Após isso chegou um escravo avisando que Úrsula foi ² Otelo é um personagem mouro shakespiriano que é general do
exército veneziano e é casado com Desdêmona, uma mulher de origem
vista em direção à cidade de ***, ele prepara homens armados e
veneta (italiana). A trama da peça gira em torno dos ciúmes infundados
parte em direção à sua vingança. de Otelo, instigados pelo vilão Iago, que leva Otelo a acreditar
erroneamente que Desdêmona o traiu com seu tenente, Cássio. Esses
Capítulo 17 ciúmes levam a consequências trágicas.
TÚLIO ³ A queda de Satanás faz referência a obra de Milton no Paraíso
Perdido, isso mostra e reflete o sentimento de Fernando, louco de
ciúmes como Otelo e raivoso como o Diabo expulso, no sentido de se
Úrsula continuava escondida no convento, temendo por sentir rejeitado por Úrsula e enganado por Tancredo.
Suzana e pedindo por carta que a trouxessem até ela. Tancredo,
bem no dia de seu casamento, mandara chamar por Túlio para Glossário do capítulo 17
que o amigo realizasse algumas tarefas, mas ele não apareceu,
o que foi estranho. Tancredo não fazia ideia da armadilha que Sicários – “Os sicários saíram — a porta tornou-se a fechar[...]” -
Fernando tramava contra ele. assassinos ou matadores contratados para realizar assassinatos por
Aquela ausência de Túlio lhe foi demasiada estranha e dinheiro ou por motivos políticos, religiosos, ou outros. Nesse momento,
vários pensamentos de temores lhe passou pela mente, mas os assassinos saíram para que Fernando ficasse a sós com Túlio.
tentou afastá-los, decidiu se juntar com alguns amigos
(provavelmente como escolta) e foi ao convento para o Capítulo 18
casamento. A DEDICAÇÃO
Entretanto, diante da alegria de casar não havia felicidade
em imaginar que algo poderia acontecer ao seu amigo. O velho Antero era um escravo africano viciado em
Ele então, indagando a si mesmo, achava estranho o bebidas que vigiava a prisão em que Túlio estava. O prisioneiro
sentimento penível que lhe nascia na alma, porém embalde abominava a ideia de matá-lo, e vendo que estava tudo deserto,
tentava recobrar a serenidade de ânimo. Túlio figurava-se lhe em julgou que o comendador saíra para preparar a armadilha, se
perigo eminente, e toda a felicidade que o aguardava não lhe não podia ter Úrsula como esposa primeiro, teria como viúva
apagava esse crescente desassossego; porque essa felicidade depois.
começava a parecer-lhe que mais tarde se tornaria amarga. Antero aceita o dinheiro e sai em busca de cachaça,
Foi apenas com a presença de Úrsula que Tancredo se deixando Túlio sozinho na prisão.
acalmou, veja como ela é descrita nessa cena: Túlio começa a avaliar a possibilidade de escapar e
encontra instrumentos de tortura na prisão, o que o faz refletir
Assim era ela mais formosa que nunca, e Tancredo, sobre os sofrimentos que outros prisioneiros já enfrentaram ali.
vendo-a tão radiante de mocidade e de amor, olvidou suas No entanto, ele está determinado a salvar seu benfeitor. Antero
penosas inquietações para só rever-se nela, para render-lhe retorna e passa a beber até desmaiar, ele pega as chaves de
um culto de apaixonada veneração. Antero e sai enlouquecido para avisar da armadilha.
E ela sorriu com um sorriso que transportou-o de Corre desesperadamente pela noite afora, encontra um
felicidade, e esse sorriso feiticeiro e angélico arrancou-lhe sacerdote que diz ter feito um casamento, ao chegar na igreja
do fundo da alma o orgulho feminil — era como a lembrança pela noite, ele vê ao longe o casal sair a carruagem em direção a
de que seu amor apagara ainda mesmo as cinzas do de fazenda, Túlio grita avisando da armadilha, mas dois tiros são
Adelaide.¹ disparados e Túlio cai ao chão.
Tancredo tendo ouvido a voz do amigo vai em sua
A narrativa volta para nos contar o que ocorrera a Túlio, direção, mas Úrsula o impede avisando que queriam assassiná-
antes de ir ao encontro de Tancredo, seu amigo fiel, dois lo. Tancredo e Úrsula estavam cercados, mas o jovem não
homens o interceptaram e o colocaram em um casebre fraquejou e tirou duas pistolas, um dos tiros ele erra, mas o
abandonado ameaçando-o matá-lo se ousasse gritar. Dentro do segundo ele acertou de raspão a um homem que reconheceu
casebre estava Fernando: ser o comendador.
Fernando foi em direção ao casal, não havia nada mais a
O comendador cruzava o quarto com passos fazer. Úrsula foi em direção ao tio implorar pela vida do marido.
desordenados. Pálido como um espectro, com os cabelos
erriçados, os lábios convulsos e contraídos, as comissuras — Poupai-o, senhor. Ah, pelo céu, poupai-o! —
dos lábios espumantes, pintava-se-lhe no todo a exclamou Úrsula, aflita e pálida, caindo aos pés desse
desesperação, e o ódio infame, e a vingança não satisfeita. homem desapiedado.

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E por um esforço sublime, que só a mulher — ente de outra pessoa, e o remorso o atinge com força total. Ele tenta
feito para a dedicação e o amor — pode conceber, disse-lhe, implorar o perdão de Úrsula, expressando seu amor por ela e
apresentando-lhe o peito: seu arrependimento por seus atos cruéis.
— Ofendi-vos, senhor, vingai-vos: eis-me, não me No entanto, a resposta de Úrsula é surpreendente e
poupeis: mas ele? Oh, não o assassineis! Oh, não tem culpa perturbadora. Ela sorri de maneira distorcida e parece estar
de que o ame mais que a vida! completamente insana. Fernando percebe que ela enlouqueceu
E caiu prostrada aos pés de Fernando, que devido aos eventos traumáticos que ocorreram.
semelhante à hiena que meneia a cauda e lambe os beiços, O capítulo termina com Fernando sofrendo um colapso
porque a presa lhe não escapará, olhava-a sorrindo de emocional, enquanto observa a loucura de Úrsula. Sua dor é
ferocidade. agravada pela convicção de que seus planos foram arruinados e
suas esperanças de tê-la como esposa foram destruídas. Ele
Tancredo foi ao encontro de Úrsula levantou-a, disse: percebe que está sendo punido por seus atos malignos e
egoístas.
— Amo-te! A dor do remorso era tamanha que seu rosto chega a se
Depois esses dois astros de amor, que guiavam ainda desfigurar a ponto dos escravos não o reconhecerem e ele sabia
no perigo, ou nas trevas da desesperação ao infeliz que não podia encontrar consolo em ninguém, pois sua maldade
mancebo, recaíram em seu lânguido torpor. não permitia que ninguém se aproximasse.
Esse beijo foi a expressão profunda de tão sublime
amor: foi o primeiro, o casto e puro ósculo de amor, que o Glossário do capítulo 19
comendador jurou ser o derradeiro.
Sopitara – “Fernando até ali sopitara esse castigo do céu,” –
Fernando o agarrou e travou-se uma imensa briga, forma conjugada do verbo "sopitar," que significa adormecer ou fazer
ambos se rolavam pelo chão, mas os capangas de Fernando alguém adormecer.
seguraram Tancredo e o tio o golpeou o peito, Tancredo Pusilanimidade - “Por último, vencendo sua pusilanimidade,
amaldiçoou Fernando dizendo que nunca teria o amor de Úrsula, correu desvairado ao seu quarto.” - falta de coragem ou a timidez
a moça em direção ao seu amado que morre em seus braços: excessiva de alguém. Momento esse em que Fernando decide ir ao
quarto de Úrsula.
Então a donzela despertou de seu dorido letargo,
abriu os olhos, e num excesso de amor apaixonado, e de Capítulo 20
uma dor íntima, lançou-se sobre seu desditoso esposo, e A LOUCA
unindo-o ao coração recebeu-lhe o derradeiro suspiro.
Um mar de sangue tingiu-lhe as mãos e os puros No último capítulo, intitulado "A LOUCA", a história chega
seios. Tinha os olhos fixos e pasmados sobre o doloroso a um emocionante clímax. O comendador Fernando P. está
espetáculo, e entretanto parecia nada ver; estava absorta sentado em seu jardim, atormentado pelos remorsos por seus
em sua dor suprema, muda, e impassível em presença de crimes. O cenário ao redor é de uma beleza melancólica, mas
tão monstruosa desgraça. Fernando não presta atenção a isso.
O seu sofrimento era horrível, e profundo, e o que se Ele é interrompido pela chegada de um velho sacerdote,
passava de amargo e pungente naquela alma cândida e que aponta na direção do poente e menciona "Susana". O
meiga foi bastante para perturbar-lhe a razão. comendador observa a cena de dois escravos carregando um
corpo em uma rede para o enterro, e a voz do remorso ecoa em
Capítulo 19 sua mente.
O DESPERTAR O sacerdote repreende Fernando por seus crimes,
destacando o assassinato de Tancredo, Túlio, Paulo e Susana.
O capítulo explora as profundezas da alma de Fernando Ele fala sobre o sofrimento que Fernando infligiu aos inocentes e
P., o comendador, após os eventos recentes que abalaram sua como ele ignorou as súplicas por misericórdia.
vida. A autora descreve as diferenças entre o amor puro e nobre
e o amor corrompido e maligno que Fernando sente por Úrsula, Assassino de Tancredo, de Túlio, de Paulo, e de
observe: Susana. Monstro! Flagelo da humanidade, ainda não
saciastes a vossa vingança? Ah, humilhado e em nome de
O AMOR QUE SE NUTRE no coração do homem Deus, pedi-vos mercê para os infelizes, salvação para a
generoso é puro e nobre, leal e santo, profundo e imenso, e vossa alma. Desdenhastes as minhas súplicas!
capaz de quanta virtude o mundo pode conhecer, de quanta Orgulhoso e vingativo que sois! E não sentistes que
dedicação se possa conceber. Ele o eleva acima de si Deus observa os malvados e que os pune ainda na terra.
próprio, e as suas ações são o perfume embriagador desse Em vossa louca e vaidosa ideia, julgastes-vos grande,
sentimento, que o anima: mas o amor no peito do homem e esmagastes aos vossos semelhantes que eram fracos, e
feroz e concupiscente é uma paixão funesta, que conduz ao estavam inermes.
crime, que lhe mata a alma e a despenha no inferno. Como a fera dos bosques acometestes a Tancredo e
covardemente o assassinastes: como um verdugo cruel
Fernando está assombrado pelos crimes que cometeu em punistes Susana de um crime que não tinha. . . Oh, se o
nome de seu amor doentio por Úrsula. Ele não consegue mais arrependimento vos não apagar a nódoa do pecado, os
encontrar paz de espírito e é atormentado por remorsos. Em crimes vos despenharão no inferno.
suas noites sem sono, ele tenta visitar Úrsula, mas teme sua
rejeição e acusações de seus crimes. O comendador, com o coração partido, pede para ver
Ao chegar ao quarto de Úrsula, ele a encontra dormindo, Úrsula. O sacerdote o leva até o quarto da donzela, onde uma
em meio a um sono agitado. Fernando a observa com uma cena angustiante o aguarda. Úrsula, agora completamente
mistura de adoração e culpa, hesitando em acordá-la. No insana, está sorrindo e falando com sombras invisíveis. Ela
entanto, quando Úrsula finalmente acorda e o vê, ela solta um menciona Tancredo e suas flores de noivado.
grito angustiado. Fernando, testemunhando a loucura de Úrsula, fica
A visão de Úrsula despertando e sofrendo é avassaladora arrasado. Ele percebe que sua esperança de tê-la como esposa
para Fernando. Pela primeira vez, ele começa a entender a dor

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foi destruída e que sua própria vida está repleta de remorso e a) extradiegético; b) homodiegético;
dor. Ele fecha os olhos e se ajoelha em desespero. c) heterodiegético; d) autodiegético;
Úrsula continua a murmurar e a sorrir, e depois, em seu
último suspiro, ela menciona o nome de Tancredo e exala seu 05. Quanto a classificação do romance, podemos classificá-lo
último suspiro. O sacerdote e Fernando estão ajoelhados ao lado como
dela quando sua alma deixa seu corpo. a) de costumes; b) urbano
c) regionalista; d) histórico-indianista
Notas e análises
A cena é carregada de emoção, com a redenção e a punição de 06. Qual é a principal razão pela qual o pai de Tancredo se opõe
Fernando P. como temas centrais. A história termina com um momento ao casamento de seu filho com Adelaide?
de tristeza e reflexão sobre os horrores do orgulho, vingança e
crueldade, contrastados com a redenção tardia e o peso dos remorsos.
a) Porque ele acredita que Adelaide é indesejável para a família.
b) Porque ele deseja que Tancredo se case com uma mulher
EPÍLOGO rica.
c) Porque ele não gosta de Adelaide pessoalmente.
No Epílogo, dois anos se passaram desde os eventos d) Porque ele tem outros planos para o casamento de Tancredo.
trágicos narrados anteriormente, e a província esqueceu os
crimes ocorridos no convento de *** e a morte de Tancredo. A 07. Como a mãe de Tancredo reage à oposição de seu marido
justiça permaneceu cega, os assassinos impunes, e as ao casamento de seu filho?
investigações foram abandonadas.
Apenas um homem sabia a identidade do assassino, mas a) Ela confronta seu marido e exige que ele mude de ideia.
ele se recusava a denunciá-lo, pois sua missão era dedicada à b) Ela aceita passivamente a vontade de seu marido.
paz e à religião. Esse homem, chamado frei Luís de Santa c) Ela foge de casa com Tancredo e Adelaide.
Úrsula, havia entrado para o convento dos carmelitas como d) Ela convence Adelaide a desistir de Tancredo.
noviço.
No convento, frei Luís era considerado um louco por suas 08. Como Tancredo descreve Adelaide, a mulher que ele
intensas práticas religiosas, jejuns e momentos de frenesi conhece após voltar para casa?
durante a oração. No entanto, ninguém conhecia sua verdadeira
identidade ou a história por trás de suas ações. a) Ele a descreve como meiga e encantadora.
Em seu leito de morte, frei Luís revela a um religioso seu b) Ele a descreve como autoritária e irritante.
passado sombrio. Ele confessa ter sido o responsável pelo c) Ele a descreve como distante e fria.
assassinato de Tancredo, movido pela vingança e pelo ciúme d) Ele a descreve como ambiciosa e gananciosa.
em relação a Úrsula. Ele lamenta sua falta de arrependimento
sincero e seu coração ainda cheio de ódio. 09. Como o pai de Tancredo reage quando sua esposa confronta
O religioso tenta trazer conforto espiritual a frei Luís, suas decisões sobre o casamento de Tancredo?
mostrando-lhe um crucifixo e lembrando-o do perdão divino. No
entanto, frei Luís continua atormentado por sua culpa e a) Ele muda de ideia e concorda com o casamento.
desespero. Ele morre com um profundo arrependimento, b) Ele se desculpa com sua esposa e muda suas ações.
buscando o perdão de Deus. c) Ele zomba dela e a rejeita com sarcasmo.
Enquanto isso, Adelaide, a mulher por quem Tancredo d) Ele chora e pede perdão por seu comportamento.
sofrera uma imensa dor também enfrenta suas próprias tristezas
e desgostos na vida, tendo perdido dois esposos. O remorso a 10. Qual é a condição imposta pelo pai de Tancredo para que
assombra, por ter maltratado a mãe de Tancredo e ela depois ele possa se casar com Adelaide, e como Tancredo reage a
falecera em vida de amargura e desesperos. essa condição?
A história termina com a lembrança da infeliz Úrsula em a) O pai de Tancredo exige que ele espere um ano antes de se
uma lápide simples junto ao altar da Senhora das Dores no casar com Adelaide, e Tancredo, inicialmente, aceita a condição
convento, com a inscrição "Orai pela infeliz Úrsula". Ela é uma com alegria.
das vítimas do amor e da tragédia que marcaram a narrativa. b) O pai de Tancredo pede a ele que escolha entre o casamento
com Adelaide e um emprego distante, e Tancredo escolhe o
Exercícios estilo UVA emprego.
c) O pai de Tancredo concorda em deixá-lo se casar com
01. Com base na leitura do romance Úrsula, pode-se afirmar que Adelaide imediatamente, sem impor condições.
uma das temáticas exploradas na obra consiste d) O pai de Tancredo exige que ele se case com Adelaide
a) nas consequências de uma vida solitária. imediatamente, sem esperar um ano, e Tancredo aceita essa
b) nas questões raciais e escravocratas. condição com relutância.
c) na alegoria indígena.
d) no nacionalismo romântico. 11. No capítulo 6 intitulado A despedida, vemos o seguinte
trecho: "Adelaide reclinava-se nos braços de minha mãe, pálida
02. Com base na leitura do livro, quais personagens como a açucena pendurada na corrente; e essa mulher cheia de
representam a questão da escravidão e do racismo? bondade e de virtude esforçava-se por consolá-la de uma dor
a) Túlio e Úrsula; b) Tancredo e Suzana; que só nela era real, mas que supunha igual na donzela que um
c) Fernando e Luíza B.; d) Túlio e Suzana; dia seria minha esposa." Tal fragmento comprova que Adelaide

03. Na leitura da obra, percebe-se algumas estratégias a) Estava realmente sofrendo e expressando sua dor de maneira
narrativas, dentre as quais se destacam: sincera.
a) dar voz e protagonismo a personagens negros; b) Estava indiferente à partida de Tancredo, pois não
b) ausência de idealismo romântico; demonstrou emoção.
c) presença do zoomorfismo naturalista; c) Estava escondendo suas verdadeiras emoções e agindo de
d) ausência de tensão narrativa; forma dissimulada.
d) Estava ansiosa para se tornar a esposa de Tancredo e não se
04. Sobre a narrativa do livro pode-se afirmar que é importava com a separação temporária.

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a) Ele é o mentor espiritual de Fernando.
12. Qual é o nome da personagem que compartilha sua história b) Ele é o responsável pelos assassinatos de Tancredo e Túlio.
de vida e experiências como escrava? c) Ele é o pai de Úrsula.
a) Maria; b) Túlio; d) Ele é um político influente na província.
c) Luíza B.; d) Susana;
25. Qual é o destino de Tancredo no final da história?
13. O que aconteceu com a “mãe” de Túlio? a) Ele se casa com Úrsula.
a) Ela foi comprada pelo Comendador P. b) Ele é assassinado pelo Comendador Fernando.
b) Ela foi libertada e retornou à África. c) Ele foge para outra província.
c) Ela morreu durante a viagem de escravos para o Brasil. d) Ele morre em um duelo de espadas com o Comendador
d) Ela fugiu da escravidão e viveu escondida na fazenda. Fernando.

14. Por que Úrsula fica tão perturbada com o encontro na mata? 26. O que motiva a entrada de Frei Luís de Santa Úrsula para o
a) Porque o homem da mata também a ameaça. convento?
b) Porque ela encontra seu pai lá. a) O amor por Úrsula.
c) Porque o homem da mata é Tancredo disfarçado. b) O desejo de vingança contra Tancredo.
d) Porque ela perde seu amuleto. c) O remorso por seus pecados.
d) A busca por riquezas.
15. O que preocupa Luíza quando Fernando a visita rogando
perdão? 27. Qual é o significado simbólico da lápide no convento com a
a) Ela teme que ele queira reconciliação. inscrição "Orai pela infeliz Úrsula"?
b) Ela teme que ele busque vingança. a) Úrsula era uma santa.
c) Ela quer se casar com ele novamente. b) Úrsula foi esquecida pela sociedade.
d) Ela quer que ele a ajude a cuidar de Úrsula. c) Úrsula encontrou a felicidade no final.
d) Úrsula foi vítima de tragédias e sofrimentos.
16. O “amor” de Fernando por Úrsula revela-se como um
sentimento 28. Túlio acaba sendo assassinado ao
a) puro b) obsessivo c) fiel d) romântico a) se negar a entregar a localização de Úrsula.
b) se negar a entregar a localização de Tancredo.
17. Personagem responsável pela morte de Suzana e Túlio: c) proteger Tancredo de levar um tiro.
a) Fernando b) Feitor branco d) tentar avisar Tancredo de uma emboscada.
c) Antero d) Sacerdote
29. No fragmento: “Os sicários saíram — a porta tornou-se a
18. Para escapar das mãos de Fernando Úrsula fechar[...]”, o termo sicários significa respectivamente
a) recorre à justiça. a) empregados b) assassinos
b) busca refúgio em uma junta militar. c) escravos d) escravocratas
c) busca refúgio em um convento.
d) resiste em sua fazenda às investidas de Fernando. 30. Pode-se dizer que o romance, além de uma questão
regionalista, possui uma pauta
19. Qual é a razão pela qual Frei Luís de Santa Úrsula entra a) científica b) filosófica
para o convento dos carmelitas? c) social d) lírica
a) Para buscar vingança contra o Comendador Fernando.
b) Por amor a Úrsula. Anotações:
c) Para escapar da justiça.
d) Para encontrar a paz espiritual e se redimir de seus pecados.

20 Qual é o destino final de Úrsula?


a) Ela foge com Tancredo. b) Ela se casa com Paulo B.
c) Ela morre enlouquecida. d) Ela é condenada à prisão.

21. Quem é Adelaide e qual é sua relação com a história?


a) Uma escrava que ajuda Úrsula a escapar.
b) Uma amiga de Úrsula.
c) A segunda esposa do pai de Tancredo.
d) A mãe de Úrsula.

22. O que motiva a busca de vingança do Comendador


Fernando?
a) O assassinato de sua esposa por Tancredo.
b) A rejeição de seu amor por parte de Úrsula.
c) O roubo de suas propriedades.
d) A recusa de Tancredo em lhe vender suas terras.

23. O que acontece com o Comendador Fernando no final da


história?
a) Ele encontra a felicidade ao lado de Úrsula.
b) Ele se torna um eremita.
c) Ele é assassinado.
d) Ele entra para o convento.

24. Qual é o papel do Sacerdote na história?

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Em outros vestibulares GABARITO - UVA
01. B 02. D 03. A 04. C 05. C 06. B 07. B 08. A
1. (Ufrgs 2020) Assinale com V (verdadeiro) ou F (falso) as 09. C 10. A 11. C 12. D 13. A 14. B 15. B 16. B
seguintes afirmações sobre o romance Úrsula, de Maria Firmina 17. A 18. C 19. D 20. C 21. C 22. B 23. D 24. A
dos Reis. 25. B 26. C 27. D 28. D 29. B 30. C
( ) O romance é narrado em primeira pessoa por Úrsula,
jovem negra escrava, que aprendeu a ler com a patroa, D. GABARITO – em outros vestibulares
Susana. Resposta da questão 1: [C]
( ) Adelaide é a menina pobre que busca ascensão social
A primeira afirmativa é falsa, pois a obra é narrada em 3ª pessoa, e
através do casamento, como muitas mulheres faziam na época. Úrsula nem é uma jovem negra, nem escrava.
( ) A crítica ao modelo patriarcal está especialmente centrada Como as demais são verdadeiras, é correta a opção [C]: F – V – V – V.
nas figuras de Tancredo e de seu pai.
( ) O romance caracteriza-se como transgressor à produção Resposta da questão 2: [C]
romanesca do período, ao apresentar Túlio e Antero como
sujeitos constituídos de humanidade. As duas primeiras proposições são falsas, pois o romance “Úrsula”
apresenta narrador onisciente com uso uniforme de linguagem, ou seja,
sem variedade de registro, formal ou coloquial, em função da origem
A sequência correta de preenchimento dos parênteses, de cima
étnica dos personagens. Como as demais são verdadeiras, é correta a
para baixo, é opção [C]: F – F – V – V.
a) V – V – F – F. b) V – F – F – V.
c) F – V – V – V. d) F – F – V – V. Resposta da questão 3: [E]
e) V – V – V – F.
Maria Firmina dos Reis, autora de “Úrsula”, obra que esteve cem anos
2. (Ufrgs 2019) Sobre Úrsula, romance de Maria Firmina dos fora do mercado editorial, antecipa, em nota introdutória ao romance,
Reis, assinale com V (verdadeiro) ou F (falso) as seguintes que seu texto conterá traços reveladores da sua condição de mulher
negra e pobre, desculpando-se por enveredar pelo caminho do
afirmações.
intimismo, desconhecido até aquele momento. “Úrsula” denuncia as
injustiças praticadas em uma sociedade autoritária e patriarcal revelando
( ) O romance é narrado em primeira pessoa por Úrsula, ao leitor sentimentos e angústias vivenciados por seus personagens
jovem negra escravizada e depois alforriada por Tancredo, escravizados. Assim, é correta a opção [E], pois todos as proposições
senhor com quem a protagonista se casa. são corretas.
( ) A linguagem apresenta variedade de registro: personagens
negras comunicam-se de forma coloquial, personagens brancas Anotações:
adotam a norma culta da língua.
( ) O enredo está centrado no amor fracassado entre Úrsula e
Tancredo, embora personagens como Túlio e mãe Susana
sejam cruciais para o romance, especialmente na definição de
seu caráter antiescravista.
( ) O escravocrata comendador Fernando P., antagonista de
Tancredo na disputa por Úrsula, arrepende-se de seus crimes no
final da vida e, recolhido em um convento, transforma-se no frei
Luís de Santa Úrsula.

A sequência correta de preenchimento dos parênteses, de cima


para baixo, é
a) V – F – V – F. b) V – V – F – F.
c) F – F – V – V. d) F – V – F – V.
e) V – V – F – V.

3. (Ufrgs 2019) Considere as seguintes afirmações sobre Maria


Firmina dos Reis e seu romance Úrsula.

I. O romance Úrsula foi publicado no Maranhão, em 1859, sob o


pseudônimo de “Uma Maranhense”, e quase não se tem notícia
de sua circulação à época da publicação. Recuperado na
segunda metade do século XX, só então o livro passa a ser
reeditado e minimamente debatido no meio literário.
II. Nas primeiras páginas do romance, uma voz que pode ser lida
como a da autora apresenta, a modo de prólogo, seu livro ao
leitor, consciente das limitações que seriam impostas a ele por
ter sido escrito por uma mulher brasileira de educação
acanhada.
III. A circulação limitada de Úrsula dá mostras de que,
associados ao valor estético, fatores como classe social, gênero
e raça do escritor também participam da definição do cânone
literário.

Quais estão corretas?


a) Apenas I. b) Apenas III.
c) Apenas I e II. d) Apenas II e III.
e) I, II e III.

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