Você está na página 1de 8

Estudo dirigido

Física Estatística

Introdução à Física Estatística – Salinas, Capítulo 3, seções 3.1 e 3.2

Revisões termodinâmicas

1. Conceitos básicos

Um sistema termodinâmico é um sistema macroscópico caracterizado por propriedades


macroscópicas. Um sistema termodinâmico pode ser classificado de três formas:

Isolado: não troca energia e nem matéria com o meio externo.

Fechado: troca energia, porém não troca matéria com o meio externo.

Aberto: troca energia e matéria com o meio externo.

Quando as propriedades macroscópicas de um sistema termodinâmico não variam no tempo,


temos um equilíbrio térmico ou equilíbrio termodinâmico. Este conceito também pode estar
associado entre dois sistemas distintos, onde dizemos que dois sistemas estão em equilíbrio
térmico entre si quando as propriedades macroscópicas de ambos deixam de variar no tempo.
É importante notar que a maneira com a qual um sistema alcança o equilíbrio térmico não é
relevante para sua atual situação.

As variáveis de estado são grandezas macroscópicas que caracterizam um estado


termodinâmico. São definidas em:

Extensiva: seu valor varia proporcionalmente com a variação das dimensões do sistema.

Intensiva: seu valor não se modifica com a variação das dimensões do sistema.

Na figura 1 temos dois recipientes idênticos de volume V, contendo o mesmo gás com pressão
P e temperatura T. Ao conectarmos os dois recipientes, passamos a ter um recipiente único de
volume 2V, onde o gás continua tendo pressão P e temperatura T. Visto que o volume do sistema
dobrou com a duplicação do sistema, V é uma variável de estado extensiva. No entanto, a
pressão e a temperatura não mudaram com o aumento do sistema e, portanto, são variáveis de
estado intensivas.
Figura 1 - Conexão de recipientes idênticos com o mesmo gás às mesmas condições. A pressão e a
temperatura permanecem iguais, enquanto o volume de gás dobra. Isto justifica o fato de que P e T são
variáveis de estado intensivas, enquanto V é extensiva.

O calor é a energia em trânsito entre sistemas termodinâmicos. É importante enfatizar que,

diferente da temperatura, o calor não é uma variável de estado, pois não caracteriza um estado
termodinâmico. Além disso, o calor se propaga espontaneamente sempre do sistema mais
quente para o mais frio.

1.1. Lei Zero da Termodinâmica

Sejam A, B e C três sistemas termodinâmicos. O enunciado da lei zero da termodinâmica diz:


se A está em equilíbrio térmico com B e, por outro lado, B e C também estão em equilíbrio térmico,
então A está em equilíbrio térmico com C.

1.2. Primeira Lei da Termodinâmica

Como em termodinâmica estamos em busca de grandezas macroscópicas efetivas, é comum


termos, basicamente, três formas de energias. Uma delas é o calor, enquanto a outra é a energia
interna de um sistema termodinâmico, a qual está relacionada à média das energias cinética e
potencial dos seus constituintes microscópicos. Por fim, temos também o trabalho como forma
de energia.

1.2.1. Trabalho realizado por um gás

Pela figura 2, podemos calcular o trabalho infinitesimal realizado por um gás para uma

expansão infinitesimal do seu volume.


Figura 2 – Expansão em um recipiente contendo um gás.

Expansão infinitesimal dV de um recipiente contendo um gás de pressão 𝑃 = ⃑⃑⃑


𝐹. 𝑛̂/𝐴 onde A
é a área do êmbolo cinza móvel e 𝑛̂ é o vetor normal unitário à área do êmbolo. O deslocamento
longitudinal infinitesimal é dh. Logo, o trabalho infinitesimal neste caso pode ser escrito como

𝑑𝑊 = 𝑃 𝑑𝑉

e o trabalho de um gás para variar seu volume de 𝑉0 𝑎 𝑉 é

𝑉
𝑊 = ∫ 𝑃 𝑑𝑉
𝑉0

Da mesma forma que um sistema pode realizar ou sofrer trabalho, também pode receber ou
liberar calor. É fundamental que levemos em conta que, independentemente da forma que o
sistema troque energia com o meio externo, esta deve ser conservada. Sendo assim, podemos
interpretar que o calor recebido por um sistema pode ser convertido em trabalho ou em
aumento de energia interna. Matematicamente, esta propriedade de conservação de energia
pode ser expressa como:

𝑑𝑈 = 𝑑𝑄 + 𝑑𝑊

podemos integrar a equação acima de um estado inicial a um estado final, obtendo

Δ𝑈 ≡ 𝑈 − 𝑈0 = 𝑄 + 𝑊

Esta lei de conservação de energia em sistemas termodinâmicos é conhecida como a primeira


lei da termodinâmica, a qual pode ser enunciada como: a variação de energia interna de um
sistema termodinâmico é igual ao calor absorvido pelo sistema menos o trabalho exercido por
este.

1.3. Segunda Lei da Termodinâmica

Para um sistema isolado a entropia é máxima. Qualquer diminuição nas restrições do sistema
implica que
𝚫𝑺 ≥ 𝟎

2. Postulados da Termodinâmica em Equilíbrio

Antes de introduzir os postulados da termodinâmica em equilíbrio, é necessário definir


sistemas simples e compostos:

Sistema simples

Sistemas são caracterizados como simples quando são macroscopicamente homogêneos,


isotrópicos, não carregados, grandes o suficiente para que efeitos de superfície possam ser
desprezados. Além disto, não estão sob o efeito de campos elétricos, magnéticos ou
gravitacionais.

Sistema composto

Formado pela união de dois ou mais sistemas simples, separados por vínculos (em geral
paredes) internos ao sistema composto.

O problema fundamental da termodinâmica consiste em determinar o estado final de


equilíbrio após a remoção de vínculos internos de um sistema composto. Isso é determinado
através de postulados.

Primeiro postulado: Existem estados específicos (chamados de estados de equilíbrio) de


sistemas simples que, macroscopicamente, são caracterizados completamente pela energia
interna U, o volume V, e o número de moles 𝑁1 , 𝑁2 , . . . , 𝑁𝑟 das componentes químicas.

Segundo postulado: Existe uma função, chamada de entropia S, dos parâmetros extensivos
de qualquer sistema composto, 𝑆 = (𝑈, 𝑉, 𝑁1 , … , 𝑁𝑟 ) definida para todos os estados de
equilíbrio.

A entropia possui a seguinte propriedade: os valores assumidos pelos parâmetros extensivos,


na ausência de um vínculo interno, são aqueles que maximizam a entropia sobre os possíveis
estados de equilíbrio.

Terceiro postulado: A entropia de um sistema composto é aditiva sobre os subsistemas que


definem o sistema composto,

𝑆(𝑈1 , 𝑉1 , 𝑁1 ; 𝑁1 𝑈2 𝑉2 𝑁2 ) = 𝑆1 (𝑈1 , 𝑉1, 𝑁1 ) + 𝑆2 (𝑈2 , 𝑉2 , 𝑁2 ),

ou seja, é extensiva

𝑆(𝜆𝑈, 𝜆𝑉, 𝜆𝑁1 , … , 𝜆𝑁𝑟 ) = 𝑆𝜆(𝑈, 𝑉, 𝑁1 , … , 𝑁𝑟 ).


A entropia é uma função contínua, diferenciável e monotonicamente crescente com a energia,
𝜕𝑆
> 0
𝜕𝑈𝑉,𝑁

Quarto postulado: A entropia de qualquer sistema se anula num estado para o qual
𝜕𝑆
= 0
𝜕𝑈𝑉,𝑁1 ,...,𝑁𝑟

ou seja, à temperatura zero.

3. Parâmetros intensivos da termodinâmica

Na representação da energia, a equação fundamental de um fluido puro é dada pela relação


𝑈 = 𝑈(𝑆, 𝑉, 𝑁). Temos, então, a forma diferencial
𝜕𝑈 𝜕𝑈 𝜕𝑈
𝑑𝑈 = ( ) 𝑑𝑆 + ( ) 𝑑𝑉 + ( ) 𝑑𝑁 ,
𝜕𝑆 𝑉,𝑁 𝜕𝑆 𝑆,𝑁 𝜕𝑁 𝑆,𝑉

que descreve um processo termodinâmico quase-estático (uma sucessão infinitesimal de


estados termodinâmicos de equilíbrio). Se compararmos com a expressão usual da lei da
conservação de energia,
Δ𝑈 = Δ𝑄 + Δ𝑊𝑚𝑒𝑐â𝑛𝑖𝑐𝑜 + Δ𝑊𝑞𝑢í𝑚𝑖𝑐𝑜

= 𝑇ΔS − ρΔV + μΔN


temos os parâmetros intensivos ou campos da termodinâmica:
𝜕𝑈
Temperatura(t): 𝑇 = ( ) ;
𝜕𝑆 𝑉,𝑁

𝜕𝑈
Pressão (p): 𝑝 = − ( 𝜕𝑆 ) ;
𝑆,𝑁

𝜕𝑈
Potencial químico (𝜇): 𝜇 = (𝜕𝑁)
𝑆,𝑉

Na representação da Entropia, temos

𝑆 = 𝑆(𝑈, 𝑉, 𝑁)
𝜕𝑆 𝜕𝑆 𝜕𝑆
𝑑𝑆 = ( ) 𝑑𝑈 + ( ) 𝑑𝑉 + ( ) 𝑑𝑁
𝜕𝑈 𝑉,𝑁 𝜕𝑉 𝑈,𝑁 𝜕𝑁 𝑈,𝑉

Se

𝑑𝑈 = 𝑇dS − ρdV + μdN


1 𝑝 𝜇
𝑑𝑆 = 𝑑𝑈 + 𝑑𝑉 − 𝑑𝑁
𝑇 𝑇 𝑇
dessa forma, podemos escrever os parâmetros intensivos em função dos parâmetros extensivos
na representação da entropia:
𝜕𝑆 1
( ) =
𝜕𝑈 𝑉,𝑁 𝑇
𝜕𝑆 𝑝
( ) =
𝜕𝑉 𝑈,𝑁 𝑇
𝜕𝑆 𝜇
( ) = −
𝜕𝑁 𝑈,𝑉 𝑇

As funções T = T(S, V, N), 𝑝 = 𝑝(S, V, N) e 𝜇 = 𝜇(S, V, N) fornecem as equações de estado.


O conhecimento de uma única equação de estado não é suficiente para construir uma equação
fundamental. No entanto, duas equações de estado já seriam suficientes, pois T = (S, V, N), 𝑝 =
𝑝(S, V, N) e 𝜇 = 𝜇(S, V, N) são funções homogêneas de grau zero, ou seja, T(𝜆S, 𝜆𝑉, 𝜆N) =
T(S, V, N).
Portando, sendo U uma grandeza extensiva, temos U(𝜆S, 𝜆𝑉, 𝜆N) = 𝜆U(S, V, N)
1 𝑆 𝑉 𝑈
𝜆= 𝑁
= 𝑈(𝑁 , 𝑁)= 𝑁 (𝑆, 𝑉, 𝑁)

𝑈 𝑆 𝑉
𝑢= ;𝑠= ;𝑣=
𝑁 𝑁 𝑁
Ou seja, u = u(s, v); s = s(u, v). Dessa situação, temos:

𝑑𝑢 = 𝑇𝑑𝑠 − 𝑃𝑑𝑣
1 𝑃
𝑑𝑠 = 𝑇
𝑑𝑢 + 𝑇 dv

EXEMPLO 01

4. Equilíbrio entre dois sistemas termodinâmicos

Como exemplo de equilíbrio térmico, vamos considerar um sistema composto constituído por
dois fluidos puros. O sistema global está fechado. Inicialmente, os fluidos estão separados por
uma parede adiabática, fixa e impermeável. Em um determinado instante é alterado um vínculo
interno: a parede se torna diatérmica, mas permanece fixa e impermeável. Passado algum
tempo, atinge-se um novo estado termodinâmico de equilíbrio. Esse novo estado de equilíbrio
será dado pela maximização da entropia, que pode ser escrita na forma

S = S1 (U1 , V1 , N1 ) + S2 (U2 , V2 , N2 )
onde 𝑉1 , 𝑉2 , 𝑁1 , 𝑁2 são parâmetros fixos, e 𝑈1 + 𝑈2 = 𝑈0 = 𝑐𝑜𝑛𝑠𝑡𝑎𝑛𝑡𝑒, onde U0 é a energia
total do sistema (que também está fixa). Então, temos
𝜕𝑆 𝜕𝑆1 𝜕𝑆2 𝜕𝑆2 1 1
= + − = − =0
𝜕𝑈1 𝜕𝑈 1 𝜕𝑈 1 𝜕𝑈 2 𝑇1 𝑇2
Portanto, no equilíbrio T1 = T2 , correspondendo à expectativa comum de equalização das
temperaturas dos dois subsistemas.

Sistema composto constituído por dois fluidos simples separados por uma parede adiabática, fixa e
impermeável.

Agora, temos de considerar a derivada segunda,

𝜕 2 𝑆 𝜕 2 𝑆1 𝜕 𝜕𝑆2 𝜕 2 𝑆1 𝜕 2 𝑆2
= − ( ) = +
𝜕𝑈12 𝜕𝑈12 𝜕𝑈1 𝜕𝑈 2 𝜕𝑈12 𝜕𝑈22

Utilizando a equação de estado para o inverso da temperatura, temos

𝜕2𝑆 𝜕 1 𝜕 1 1 𝜕𝑇1 1 𝜕𝑇2


2 = 𝜕𝑈 (𝑇 ) + 𝜕𝑈 (𝑇 ) = − 2 𝜕𝑈 − 2 𝜕𝑈
𝜕𝑈1 1 1 2 2 𝑇1 1 𝑇2 2

Para que essa derivada segunda seja negativa, é preciso que


𝜕𝑇
( ) >0
𝜕𝑈 𝑉,𝑁

para o fluido puro.

Invertendo a derivada da função implícita, temos


−1
𝜕𝑇 𝜕𝑈 1
( ) = [( ) ] =
𝜕𝑈 𝑉,𝑁 𝜕𝑇 𝑉,𝑁 𝑁𝐶𝑉

onde
𝑇 𝜕𝑆 1 𝜕𝑈
𝑐𝑣 = ( ) = ( )
𝑁 𝜕𝑇 𝑉,𝑁 𝑁 𝜕𝑇 𝑉,𝑁

é o calor específico a volume constante. Portando, o postulado de maximização da entropia está


intimamente ligado a uma propriedade fundamental da estabilidade térmica da matéria. Num
sistema termicamente estável, o calor específico não pode ser negativo. Podemos reescrever a
condição de estabilidade na forma
𝜕 1 𝜕²S
( ) =( ) <0
𝜕U T 𝑉,𝑁 𝜕𝑈² 𝑉,𝑁

ou seja, a entropia deve ser uma função côncava da energia.

5. Relações de Euler e de Gibbs-Duhem

A propriedade de aditividade pode ser expressa na forma

U(𝜆S, 𝜆V, 𝜆N) = 𝜆U(S, V, N)


Derivando os dois lados em relação a 𝜆 e fazendo 𝜆 = 1, obtemos a relação de Euler da
termodinâmica,

𝑇S − 𝑝𝑉 + 𝜇𝑁 = 𝑈
Na forma diferencial, podemos escrever

𝑇dS + SdT − 𝑝d𝑉 + 𝜇d𝑁 + Nd𝜇 = d𝑈


ou seja,

𝑆𝑑𝑇 − 𝑉𝑑𝑝 + 𝑁𝑑𝜇 = 0


que também pode ser escrita na forma

𝑑𝜇 = 𝑣𝑑𝑝 − 𝑠𝑑𝑇
que é conhecida como relação de Gibbs-Duhem. Essa forma diferencial mostra que o potencial
químico como função da temperatura e da pressão é uma equação fundamental do fluido puro.
Por outro lado, as densidades v e s como funções da temperatura e da pressão não passam de
equações de estado.

Você também pode gostar