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ISSN: 0365-0596

Online ISSN: 1806-4841

Anais Brasileiros de
Dermatologia
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An Bras Dermatol.| Rio de Janeiro | v.95 | n.1 | p.1-132 | Janeiro/Fevereiro 2020

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Volume 95. Número 1. Janeiro/Fevereiro 2020

Sumário

Educação Médica Continuada


Atualização em dermatoses parasitárias ................................................................................................ 1
Alberto Eduardo Cox Cardoso, Alberto Eduardo Oiticica Cardoso, Carolina Talhari, Monica Santos

Investigação
Características clínicas e associações da pustulose palmoplantar: estudo observacional ....................................... 15
Ayse Oktem, Pınar Incel Uysal, Neslihan Akdoğan, Aslı Tokmak, Basak Yalcin
Consumo de recursos médicos de psoríase moderada/grave em uma organização privada de saúde de Buenos Aires,
Argentina ..................................................................................................................................... 20
María Laura Galimberti, Aldana S. Vacas, Barbara A. Hernández, María L. Bollea Garlatti, María J. Cura
et Ricardo L. Galimberti
Associação entre polimorfismo CYP2J2 e suscetibilidade à psoríase na população turca: estudo caso-controle ............ 25
Yıldız Hayran, Nuran Allı, Pınar İncel Uysal, Tuba Çandar
Seria a arterite macular linfocítica limitada à pele ? Seguimento prolongado de sete pacientes ............................. 32
Thâmara Cristiane Alves Batista Morita, Gabriela Franco Sturzeneker Trés, Paulo Ricardo Criado
Avaliação da razão entre monócitos e lipoproteínas de alta densidade, linfócitos, monócitos e plaquetas na psoríase ... 40
Ezgi Aktaş Karabay, Damla Demir, Aslı Aksu Çerman
Padronização de cultura organoide para avaliação da melanogênese induzida por UVB, UVA, luz visível .................... 46
Thainá Oliveira Felicio Olivatti, Giovana Piteri Alcantara, Ana Cláudia Cavalcante Espósito Lemos,
Márcia Guimarães da Silva, Hélio Amante Miot
Incapacidades na hanseníase: análise retrospectiva aberta de registros institucionais ......................................... 52
Santoshdev P. Rathod, Ashish Jagati, Pooja Chowdhary
Sarcoidose cutânea: perfil clínico-epidemiológico de 72 casos de um hospital terciário em São Paulo, Brasil .............. 57
Mariana Fernandes Torquato, Marcella Karen Souza da Costa, Marcello Menta Simonsen Nico

Caso Clínico
Pitiríase rubra pilar acantolítica associada ao uso tópico de imiquimode a 5%: relato de caso e revisão da
literatura ..................................................................................................................................... 63
Oriete Gerin Leite, Sandra Tagliolatto, Elemir Macedo de Souza, Maria Letícia Cintra
Eritrodermia como primeira manifestação de carcinoma epidermoide do pulmão: relato de caso raro...................... 67
Jorge Arandes-Marcocci, Maribel Iglesias-Sancho, Núria Setó-Torrent, María Teresa Fernández-Figueras
Nevos de Spitz eruptivos disseminados – Relato de caso ............................................................................. 71
Pablo Vargas, Rodrigo Cárdenas, Roberto Cullen e Andrés Figueroa
Pênfigo familiar “benigno”? Eritrodermia, desfecho fatal ........................................................................... 75
Paula Baldissera Tansini, Ana Letícia Boff, Magda Blessmann Weber, Renan Rangel Bonamigo

Dermatopatologia
Dermatoscopia in vivo e ex vivo na implantação do papilomavírus humano em tatuagens: relato de dois casos ........... 78
John Verrinder Veasey, Ana Luisa Nasser Erthal, Rute Facchini Lellis

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Revisão
Segurança dos anestésicos locais ......................................................................................................... 82
Ana Carolina Figueiredo Pereira Cherobin, Glaysson Tassara Tavares

Dermatologia Tropical/Infectoparasitária
Hanseníase na população idosa em um estado endêmico do nordeste brasileiro (2001–2017): cenário epidemiológico ......... 91
Carlos Dornels Freire de Souza, Tânia Rita Moreno de Oliveira Fernandes, Thais Silva Matos, Clódis Maria Tavares

Imagens em Dermatologia
Dermatoscopia do fenômeno de Borst-Jadassohn no hidroacantoma simples ..................................................... 95
Bruno de Castro e Souza, Maria Cláudia Alves Luce, Thais do Amaral Carneiro Cunha, Neusa Yuriko Sakai Valente
Forma completa da paquidermoperiostose ............................................................................................. 98
Mônica Larissa Padilha Honório, Guilherme Holanda Bezerra, Vivianne Lira da Câmara Costa

Qual o seu diagnóstico?


Múltiplas pápulas esbranquiçadas na região cervical posterior de uma idosa ..................................................... 102
Joana Calvão, Bárbara Roque Ferreira, José Carlos Cardoso

Carta - Investigação
Adalimumabe para psoríase grave em pacientes pediátricos chilenos ............................................................. 105
Daniela Armijo Fernandez, Fernando Valenzuela, Gustavo Saint-Pierre Contreras, Andrea Cortés González
Exames de imagem no estadiamento do melanoma cutâneo: uma coorte retrospectiva ....................................... 106
Luiza Boava Souza, Gabriel Peres, Juliano Vilaverde Schmitt
Transmitância do UVB, UVA e luz visível (azul-violeta) dos principais filtros solares opacos vendidos no Brasil ............. 108
Gabriel Peres, Hélio Amante Miot

Carta - Caso Clínico


Siringocistoadenoma papilífero em localização incomum ............................................................................ 112
Giovanna de Araujo Horcel, Juliana Milhomem, Samuel Henrique Mandelbaum, Rodrigo Ieiri
Xantogranuloma múltiplo do adulto ..................................................................................................... 113
Renata da Costa Almeida, Óscar Tellechea, Mariana Pinho Pereira, Rosa Cristina Correia Mascarenhas
Tratamento da doença de Kimura com corticosteroide oral e metotrexato ....................................................... 115
Han Ma
Xantogranuloma necrobiótico com lesões anulares disseminadas ................................................................... 117
Isaura Azevedo Fasciani, Neusa Yuriko Sakai Valente, Maria Claudia Alves Luce, Priscila Kakizaki
Um caso de atrofodermia linear de Moulin ............................................................................................. 119
Li-Wen Zhang, Meng-Sha Ma, Tao Chen, Li-Xin Fu
Micose fungoide folicular com espículas e lesões similares a hidradenite supurativa em um paciente – Remissão completa
com interferon alfa ......................................................................................................................... 121
Mónica Garcia-Arpa, Miguel A. Flores-Terry, Monserrat Franco-Muñoz, Isabel María de Lara-Simón
Anetodermia: um alerta para a síndrome do anticorpo antifosfolípide ............................................................ 123
Mariana Piraja Genta, Marilda Aparecida Milanez Morgado de Abreu, Gisele Alborghetti Nai
Alopecia frontal fibrosante familiar em seis irmãs .................................................................................... 125
Vanessa Barreto Rocha, Mario Cezar Pires, Leticia Arsie Contin

Correspondência
Cuidado com artefatos na microscopia confocal de reflectância ao pesquisar hifas na pele acral ............................ 129
Elisa Cinotti, Jean Luc Perrot, Pietro Rubegni
Cuidado com artefatos à microscopia confocal de reflectância ao pesquisar hifas na pele acral – Resposta ................ 130
John Verrinder Veasey

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An Bras Dermatol. 2020;95(1):1---14

Anais Brasileiros de
Dermatologia
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EDUCAÇÃO MÉDICA CONTINUADA

Atualização em dermatoses parasitárias夽,夽夽


Alberto Eduardo Cox Cardoso a , Alberto Eduardo Oiticica Cardoso b,∗
,
Carolina Talhari c,d e Monica Santos e

a
Universidade Federal de Ciências da Saúde de Alagoas, Hospital Universitário Professor Alberto Antunes, Maceió, AL, Brasil
b
Universidade Federal de Ciências da Saúde de Alagoas, Departamento de Dermatologia, Maceió, AL, Brasil
c
Universidade do Estado do Amazonas, Programa de Pós-Graduação, Manaus, AM, Brasil
d
Fundação Alfredo da Matta de Dermatologia, Departamento de Ensino e Pesquisa, Manaus, AM, Brasil
e
Universidade do Estado do Amazonas, Departamento de Dermatologia, Ambulatório de Dermatologia Tropical, Manaus, AM,
Brasil

Recebido em 19 de fevereiro de 2019; aceito em 19 de outubro de 2019


Disponível na Internet em 2 de março de 2020

Resumo Dermatoses parasitárias são afecções cutâneas causadas por insetos, vermes, pro-
PALAVRAS-CHAVE
tozoários ou celenterados que tenham vida parasitária ou não. Nesta revisão serão estudados
Dermatopatias
os principais agentes etiológicos, aspectos clínicos, exames laboratoriais e tratamentos das
parasitárias;
doenças dermatológicas englobadas nesse contexto.
Doença de Lyme;
© 2020 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um
Escabiose;
artigo Open Access sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).
Infestações por
piolhos;
Larva migrans;
Miíase;
Oncocercose;
Terapêutica;
Tungíase

Introdução

DOI referente ao artigo: Nesta revisão serão discutidos os principais aspectos clínicos
https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.12.001 e terapêuticos da escabiose, pediculose, miíase, tungíase,
夽 Como citar este artigo: Cardoso AEC, Cardoso AEO, Talhari
larva migrans, doença de Lyme e oncocercose.
C, Santos M. Update on parasitic dermatoses. An Bras Dermatol.
Essas diferentes enfermidades são, basicamente,
2020;95:1---14.
夽夽 Trabalho realizado na Universidade Federal de Alagoas e Uni- afecções cutâneas ocasionadas por insetos, vermes, pro-
versidade Federal de Ciências da Saúde de Alagoas, Maceió, AL, tozoários ou celenterados que tenham vida parasitária ou
Brasil; Universidade do Estado do Amazonas e Fundação Alfredo da não. O conhecimento desses agravos tem importância cada
Matta de Dermatologia, Manaus, AM, Brasil. vez maior, face aos deslocamentos, relativamente fáceis,
∗ Autor para correspondência. das pessoas para diferentes regiões do planeta.
E-mail: albertooiticica@gmail.com (A.E.O. Cardoso).

2666-2752/© 2020 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma
licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

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2 Cardoso AEC et al.

Escabiose

A escabiose ou sarna é doença reconhecidamente contagi-


osa. O agente etiológico é um ácaro, o Sarcoptes scabiei
var. hominis. Estudos epidemiológicos moleculares recentes
demonstraram que a escabiose ocasionada pelo S. scabiei
var. hominis é exclusivamente humana; não afeta animais
e a transmissão ocorre através do contato pessoal, não tem
preferência por idade, etnia ou gênero. A transmissão por
fômites é excepcional.1,2
A epidemiologia da escabiose tem caráter cíclico, prin-
cipalmente nos países desenvolvidos. O intervalo entre os
ciclos são de, aproximadamente, 10 a 15 anos.
De acordo com estudos em amostras da poeira de
casas de pacientes infectados, fora do hospedeiro, em
condições ambientais normais, o S. scabiei sobrevive Figura 1 Escabiose nodular --- intenso prurido e lesões
por 24 a 36 horas.1,2 eritêmato-pápulo-nodulares.

Biologia e morfologia do ácaro Nos idosos, a reação cutânea à presença do ácaro pode
ser menor e ocasionar quadros atípicos. Lesões na região
Depois do acasalamento, o macho morre e as fêmeas pene- dorsal podem ser confundidas com prurido senil. Lesões
tram na epiderme, cavam sulcos onde depositam ovos e vésico-bolhosas, similares clínica e histologicamente ao pen-
fezes. figoide bolhoso, foram relatadas em pacientes com mais
Em 4 a 6 semanas, as fêmeas podem liberar 40 a 50 ovos. de 6 anos, sem doenças debilitantes.
Após a eclosão, as larvas, hexápodes, deixam os sulcos. O A sarna crostosa, ou norueguesa, é variedade clínica da
número de ácaros adultos em indivíduo infectado é estimado escabiose que ocorre devido à hiperinfestação de ácaros;
em 12 parasitas. mais de um milhão de parasitas podem ser encontrados
nesse quadro. Atualmente, é observada principalmente em
Manifestações clínicas doentes imunodeprimidos, sob tratamento quimioterápico,
neoplasias malignas e transplantadas. A frequência dessa
forma clínica tem aumentado em pacientes HIV-positivos.7,8
O prurido é o principal sintoma da escabiose, é mais intenso
Aborígenes australianos e portadores do vírus HTLV1 também
à noite. Esse começa, na maioria dos casos, de maneira
são acometidos com relativa frequência.9 Clinicamente,
insidiosa, intensifica-se progressivamente e pode acometer
caracteriza-se por lesões hipercetatósicas, crostosas, com
quase todo o corpo; raramente a face é afetada.
fissuras cutâneas, unhas espessadas e distróficas (fig. 2).
A lesão característica é linear, ‘‘serpiginosa’’, elevada,
Infecções secundárias podem ocorrer nesses pacientes. Na
mede alguns milímetros; numa das extremidades pode-se
grande maioria dos casos o prurido é muito intenso. O diag-
observar lesão pápulo-vesiculosa, descrita por alguns auto-
nóstico diferencial é feito, principalmente, com doença de
res como ‘‘ponto preto’’. Essas lesões são encontradas com
Darier e psoríase.
maior frequência na face lateral de dedos, regiões palmares,
mãos, punhos e pés.
A escabiose do couro cabeludo não é comum em adul- Diagnóstico diferencial
tos; porém, pode acompanhar ou assemelhar-se à dermatite
seborreica. O diagnóstico diferencial é feito com a maioria das
Sem tratamento, surgem lesões eritemato-papulosas, doenças pruriginosas, tais como dermatite atópica, erupção
localizadas em axilas, mamas, pênis, nádegas, espaços medicamentosa, urticária papulosa, picadas de insetos e
interdigitais, cintura e pés. piodermites.
Em pacientes com longa evolução podem surgir lesões
pápulo-nodulares, de coloração vermelho-acastanhada, que
se localizam principalmente na genitália, nas axilas, no Diagnóstico
tronco e nos cotovelos; são muito pruriginosas e regri-
dem lentamente, mesmo após tratamento adequado. Essas O exame direto das lesões deve ser feito rotineiramente,
manifestações são denominadas sarna, ou escabiose nodu- principalmente nos casos atípicos. Colocam-se duas gotas
lar (fig. 1). Admitia-se que não houvesse ácaro nessas de óleo mineral sobre as lesões e depois escarifica-se com
lesões. Porém, em trabalhos recentes tem-se demonstrado a lâmina de bisturi, ou cureta, remove-se o teto do sulco,
presença do S. scabiei.3,4 Em crianças, a sarna nodular pode que é colocado sobre a lâmina de vidro. A seguir, examina-
simular mastocitose.5 -se ao microscópio com aumento de 10 × e 40 × . Podem-se
Em recém-nascidos e crianças de baixa idade, a face encontrar o ácaro, ovos e/ou fezes. Pode-se, também, colo-
e o couro cabeludo podem ser acometidos, até com car algumas gotas de hidróxido de potássio a 30% sobre o
aparecimento de micropoliadenopatias cervicais. Lesões material coletado e examinar ao microscópio.
eczematizadas ou urticadas podem dificultar o diagnóstico, A reação de PCR pode ser útil em casos clinicamente
principalmente em lactentes.6 atípicos.10

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Atualização em dermatoses parasitárias 3

Figura 2 Sarna crostosa. Prurido intenso, constante, e lesões


eritemato-escamosas, generalizadas. HTLV+ paciente. Arquivo
pessoal: Dr. Paulo Roberto Machado.

A dermatoscopia também pode ser empregada para o


encontro do parasita (fig. 3).11 A microscopia de epilumines-
cência é outro método recomendado para a visualização do
ácaro.12 A microscopia confocal e tomografia de coerência
óptica também podem ser usadas.13
Figura 3 Sarcoptes scabiei. Dermatoscopia. Na extremidade
Tratamento inferior, visualiza-se ponto escuro, em formato de ‘‘asa-delta’’
corresponde ao segmento anterior do ácaro.
No tratamento da escabiose é importante que todos os mora-
dores do domicílio sejam tratados para evitar reinfestações.
Permetrina - É um piretroide sintético, eficaz e atóxico. Deve ser aplicada em todo o corpo e repetida após uma
É empregado na forma de creme ou loção 5%. Pode ser usado semana.14
em crianças, adultos, gestantes e nutrizes. Deve ser usado Novos medicamentos estão em estudos. O uso da loção de
em todo o corpo, do pescoço aos pés. Nas crianças deve ser tinospora cordifolia mostrou eficácia semelhante à perme-
aplicado também no couro cabeludo e sulcos retroauricu- trina, sem efeitos colaterais no tratamento.15 A moxidectina
lares. O medicamento deve ser aplicado à noite, por duas é outra medicação promissora, com eficácia e segurança já
noites consecutivas. No terceiro dia de manhã, toda a roupa comprovadas.16
de cama deve ser removida e lavada. Na sarna nodular usa-se corticoide tópico, potente, 2 a 3
Enxofre precipitado --- É recomendado em concentrações vezes ao dia. Pode-se, também, fazer oclusão ou mesmo
de 5% a 10%, em vaselina. Não provoca reações colaterais. infiltrar triancinolona 3 a 4 mg por mL.17 Pimecrolimus e
Pode ser usado em crianças, gestantes e nutrizes. Deve ser tracolimus tópicos foram usados em casos de resistência
aplicado em todo corpo, quatro noites seguidas e removido ao corticoide, com bons resultados.18 Em casos recalcitran-
durante o dia. tes, em obediência às restrições legais, pode ser usada a
Ivermectina - Usada por via sistêmica. É uma lac- talidomida, na dose de 100 mg ao dia, por via oral.
tona macrocíclica, semissintética, indicada para adultos e
crianças acima de 5 anos. A dose empregada é 200 ␮g/Kg
de peso, administrada em dose única, pode ser repetida Pediculose
após 7 dias. Nos imunodeprimidos devem-se aplicar duas
doses com intervalo de uma semana. É considerado o Os humanos podem ser parasitados por três espécies da
padrão-ouro no tratamento da sarna crostosa, na qual é subordem Anoplura: Pediculus humanus capitis, agente eti-
associada com queratolíticos tópicos, tais como vaselina ológico da pediculose da cabeça; Pediculus humanus, que
salicilada a 5%. A ivermectina pode ainda ser usada topica- infesta o corpo; e Pthirus pubis, piolho da região pubiana.
mente, diluída a 1%, em propilenoglicol ou loção cremosa. Todos se alimentam de sangue.

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4 Cardoso AEC et al.

Tratamento

Pediculose do couro cabeludo


Os pediculocidas tópicos permanecem como principal trata-
mento.
A permetrina a 1%, sob forma de xampu, deve ser deixada
no couro cabeludo durante 10 minutos e depois enxaguada.
O piperonil-bútoxi a 15% também pode ser usado como
xampu.
Também pode ser usada a permetrina a 5%. É aplicada no
couro cabeludo à noite e removida no dia seguinte. O trata-
mento deve ser repetido após 7 a 10 dias, pois nesse período
as lêndeas eclodem. O malathion (0,5%) é um organofosfa-
rado muito usado no Reino Unido.
Face à crescente resistência aos piretoides, novos produ-
tos têm sido desenvolvidos para o tratamento da pediculose.
O Spinosad é um inseticida composto pela mistura natu-
ral de macrolídeos tetracíclicos, spinosyn A e D. Interfere
nos receptores nicotínicos de acetilcolina, produz excitação
neuronal e consequente paralisia dos piolhos, por fadiga
neuromuscular, após longos períodos de hiperexcitação. O
Spinosad mata as populações de piolhos suscetíveis e resis-
Figura 4 A, Pediculus capitis, no couro cabeludo (Foto cedida
tentes à permetrina. Também é ovicida, inviabiliza os ovos.
por Dr. Daniel França). B, Lêndeas, aderidas aos cabelos.
O Spinosad é usado na concentração de 0,9% em suspen-
são. Foi aprovado pelo FDA em 2011 para crianças a partir
Etiologia e patogenia dos 4 anos. Não foi detectada absorção sistêmica nos estu-
dos feitos com o produto. Deve ser aplicado por 10 minutos,
Pediculose do couro cabeludo enxagua-se a seguir. Recomenda-se repetir o tratamento
O agente etiológico é o Pediculus humanus capitis (fig. 4A). depois de 7 dias.20,21
A saliva do piolho é provavelmente o indutor do prurido que O álcool benzílico a 5%, em óleo mineral, foi o primeiro
ocorre no couro cabeludo. produto não neurotóxico aprovado pelo FDA. Age, aparen-
As ninfas e os adultos são difíceis de ser visualizadas, temente, ao impedir que o piolho feche seus espiráculos
porém as lêndeas ou ovos que se prendem aos cabelos são respiratórios e possibilita que o veículo penetre e os obs-
facilmente identificados (fig. 4B). trua, asfixia os parasitas. Por não ser ovicida, devem ser
A lâmpada de Wood e o dermatoscópio podem ser usados feitas duas aplicações com 7 dias de intervalo, durante
no auxílio ao diagnóstico. 10 minutos. É aprovado pelo FDA (categoria B) e pode ser
Quando um paciente referir prurido no couro cabeludo, usado a partir dos 6 meses de idade.22
a pediculose não deve ser descartada.19 Outro produto, denominado dimeticone (loção a 4%), foi
aprovado em 2006; posteriormente, foi comercializado em
Pediculose do corpo gel líquido. O modo de ação ainda é discutível. Haveria
Ao picar a pele, o Pediculus humanus provoca coceira obstrução dos espiráculos respiratórios do piolho e morte por
de intensidade variável, surgem máculas eritematosas, asfixia. A inibição da excreção de água, que causa estresse
pápulas, crostas e escoriações, observadas principalmente fisiológico e morte por paralisia ou ruptura dos órgãos inter-
no tronco, nas axilas e nádegas. Infecção secundária, nos, é outra hipótese.23 O modo de aplicação varia de acordo
hiperpigmentação e liquenificação podem ocorrer. A enfer- com o produto: o gel deve ser aplicado durante 10 a 15 min.;
midade também é chamada de ‘‘doença do vagabundo’’. a loção durante 8 horas. A aplicação deve ser repetida em
O diagnóstico é confirmado através do achado do pedículo 7 a 10 dias. Tem ação ovicida.24---26
ou lêndeas, nas pregas das roupas. A ivermectina tópica, em loção a 0,5%, foi aprovada pelo
FDA em 2012, para tratamento de crianças, a partir de seis
Pediculose do púbis ou ftiríase meses. Deve ser aplicada durante 10 minutos e logo após
O agente causal é o Pthirus pubis, que parasita os pelos enxaguada. Apresenta ação ovicida.27
da região genitoanal e, eventualmente, os pelos de coxas, Também se mostrou eficaz o uso de que tem por base óleo
tronco, axilas, barba, cílios, supercílios e margens do couro mineral e azeite de oliva saponificado.28
cabeludo. A ivermectina 200 ␮/kg de peso, em dose única, tam-
A manifestação clínica principal é o prurido. O diag- bém é eficaz. Recomenda-se repetir o medicamento após
nóstico é feito por meio do encontro do parasito na pele, 7 a 10 dias.
geralmente com a parte da cabeça introduzida no folículo Trabalho recente preconiza o uso do levamisol como
piloso, ou lêndeas presas na base dos pelos. pediculocida.29
Além das escoriações, as maculae caerulae (manchas As lêndeas devem ser removidas. A aplicação de solução
cinza-azuladas) podem ser encontradas nas coxas e tronco, de vinagre a 50%, para molhar os cabelos, facilita sua
do mesmo modo que na pediculose do corpo. remoção.

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Atualização em dermatoses parasitárias 5

O uso da solução de ácido fórmico a 8% também facilita


a remoção das lêndeas.
As escovas e os pentes devem ser colocados em contato
com os pediculocidas durante 10 a 15 minutos e depois lava-
das com água quente.

Pediculose do corpo
A melhoria da condição de higiene e a lavagem das roupas
promovem a cura.

Pediculose do pubis ou ftiríase


Trata-se com permetrina a 5% ou deltametrina a 0,02%,
em creme, aplicado à noite e removido no dia seguinte.
Recomenda-se usar durante dois dias consecutivos e repe-
tir após 7 a 10 dias. Os contatos sexuais também devem ser
tratados. Tem havido diminuição dos casos devido ao hábito
de depilação dessa região.
Quando há lesões nos cílios pode-se usar a vaselina, apli-
cada duas vezes ao dia, durante 8 dias, removem-se as
lêndeas mecanicamente.

Dermatoses causadas por pulgas ou pulicose

As picadas provocam pápulas urticadas nos indivíduos não


sensibilizados. Quando há sensibilização, principalmente em
crianças, o antígeno salivar é capaz de provocar lesões no
local e a distância, causa o prurido agudo infantil e o prurido
de Hebra.30
Algumas espécies podem transmitir bactérias que causam
doenças, tais como peste, doença da arranhadura do gato e
angiomatose bacilar.
Para o tratamento das picadas de pulga são indicados cre-
mes de corticoide e, se necessário, anti-histamínicos por via
oral.31,32
Para a profilaxia, deve-se colocar inseticida nos aloja- Figura 5 A, Tunguíase --- aspecto típico. Lesão isolada. Obser-
mentos e tratar os animais domésticos para eliminar as var pústula, em regressão, com área crostosa central. B e C,
pulgas. Tunguíase. Multiplas lesões, isoladas e confluentes.

Tratamento
Tungíase ou tunguíase A pulga é retirada com agulha e aplica-se antisséptico
no ferimento. Nos casos generalizados usa-se tiabenda-
É ocasionada pela Tunga penetrans, a menor das pulgas; zol 25 mg/kg de peso, por via oral, durante 10 dias.38
mede, em média, 1 mm; vive em lugares secos e arenosos, A profilaxia é feita com o uso de calçados.
principalmente em zonas rurais, nos chiqueiros e currais. Recentes estudos mostraram que a dimeticona de baixa
Seus principais hospedeiros são os porcos e o homem. São viscosidade (NYDA), aplicada durante 7 dias, é eficaz e
hematófagas. Após alimentar-se, o macho deixa o hos- segura.39
pedeiro; a fêmea fecundada penetra na pele, introduz a
cabeça e o tórax na epiderme, deixa de fora os estigmas res-
piratórios e o orifício ovopositor.33 Os ovos desenvolvem-se Cimicidíase
e o abdômen dilata-se, surge nódulo amarelado com ponto
enegrecido no centro (fig. 5A). Há prurido e, eventualmente, Todos os cimicídeos (percevejos) são parasitas sugadores de
dor. São encontrados geralmente nas pregas ungueais dos sangue de aves e mamíferos. Dois terços das espécies são
dedos dos pés, espaços interdigitais e regiões plantares.34---36 parasitas de morcegos. O gênero Cimex, com as espécies
Quando ocorrem muitas lesões próximas dão o aspecto de Lectularius e hemíptera, parasitam os seres humanos. Tam-
favo de mel (fig. 5B e 5C). Podem ocorrer infecções secun- bém chamados bed bugs, esses insetos têm hábitos noturnos
dárias e as lesões servir de porta para outras doenças.37 Após e vivem nas fendas e nos buracos dos moveis e colchões.
o desenvolvimento dos ovos, a pulga começa a expulsá-los À noite, principalmente na madrugada, picam as pessoas.
no período de duas semanas; na sequência, ocorre a morte Durante o repasto injetam saliva, que contém anticoagu-
da fêmea. lante e anestésico.

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6 Cardoso AEC et al.

Figura 6 Cimicidíase. Múltiplas lesões eritemato-papulosas Figura 7 Miíase furunculoide. Lesão ulcero-nodular e agente
em disposição linear, características, localizadas no abdômen. etiológico (Dermatobia hominis).

As picadas ocorrem mais comumente em face, pescoço, no abdômen de sua presa, sem afetar sua capacidade de
braços e mãos. Provocam lesões urticadas, pruriginosas voar.47 Ao pousar na pele do homem ou de algum animal,
(fig. 6), muitas vezes em disposição linear. Podem ocor- ocorrerá a eclosão dos ovos e liberação das larvas, que pene-
rer lesões a distância, por sensibilização, inclusive lesões trarão no hospedeiro, através dos folículos pilosos ou do
bolhosas.40,41 orifício da picada do inseto. A penetração da larva, geral-
Os bed bugs compartilham traços importantes com mente, não é notada. No local de entrada da larva surge
insetos triatomíneos, mas ainda não está claro se essas lesão eritêmato-papulosa, pruriginosa, dolorosa. A pápula
semelhanças incluem a capacidade de transmitir o Trypa- aumenta de tamanho, evolui para o aspecto furunculoide,
nosoma cruzi, causador da doença de Chagas. com pequena ulceração e saída de exsudato seroso. Nessa
Estudo recente mostrou a transmissão eficiente e bidire- abertura, é possível observar a cauda da larva. As lar-
cional de T. cruzi entre hospedeiros e bed bugs. A maioria vas alimentam-se de material da hipoderme, em média,
dos bed bugs alimentados em camundongos infectados durante 5 a 12 semanas. Depois desse período, as larvas
adquiriu o parasita; a maioria dos camundongos foi infec- abandonam o hospedeiro e caem no solo, transformam-se
tada após período de coabitação com bed bugs expostos. O em pupa. Entre 60 e 80 dias, a pupa evolui para inseto alado.
T. cruzi também foi transmitido para camundongos depois Ao pressionar a lesão, pode-se expor a larva (fig. 7).47,48
que as fezes de percevejos infectados foram aplicadas dire- A larva move-se ativamente, e os pacientes referem
tamente à pele do hospedeiro. Os achados sugerem que os ‘‘dor em ferroada’’ no local. Eventualmente, pode ocorrer
bed bugs podem ser um vetor de T. cruzi.42 infecção secundária, com abscesso, celulite e adenopatias.
O tratamento é feito com creme de corticoide e, a depen- Quando a larva deixar o nódulo haverá regressão e
der do prurido, anti-histamínicos. Os percevejos devem ser cicatrização da lesão.47,48
erradicados com o uso de inseticidas. O tratamento consiste na retirada da larva, que pode
Vários relatos sugerem o aumento do número de casos ser feita por meio da compressão do nódulo, depois de
em todo mundo, inclusive Europa e Estados Unidos.43,44 pequena incisão no orifício da lesão. A obstrução do orifício
com vaselina e a colocação de esparadrapo, que impedem a
Miíase respiração da larva, facilitam a sua remoção. Há, também,
um tratamento leigo, no qual se coloca toucinho aquecido
A miíase é caracterizada pela invasão de larvas de dípteros sobre o orifício da lesão --- para respirar, a larva penetra no
na pele, mucosas e órgãos, de homens e animais. toucinho.
Entre as diversas famílias de dípteros destacam-se as
moscas que, entre outras enfermidades, ocasionam as miía- Miíase secundária
ses. É causada por larvas de moscas que não são parasitas obri-
De acordo com o ciclo evolutivo dos dípteros, as miíases gatórios. A depender do local onde os ovos são depositados,
são classificadas em primárias e secundárias. recebem as denominações cutânea e cavitária. Quando os
Nos pacientes com miíase primária, as larvas invadem ovos são ingeridos, acidentalmente, pode ocorrer a forma
os tecidos sadios. Essa variedade é denominada miíase intestinal.
furunculoide. Na forma secundária, conhecida como miíase Na forma cutânea, a mosca deposita os ovos sobre
cavitária, as moscas colocam os ovos sobre ferimentos cutâ- ulcerações cutâneas. Os ovos eclodem e as larvas
neos ou nas mucosas.45,46 desenvolvem-se. Os principais agentes etiológicos são as lar-
vas das moscas Cochliomya macellaria, C. hominivorax e
Miíase furunculoide outras espécies da família Sarcophagidae e gênero Lucilia.49
É observada em regiões tropicais do continente americano, O diagnóstico é clínico, pois as larvas são facilmente
estende-se do sul do México ao norte da Argentina. O ciclo visualizadas. Tradicionalmente, o tratamento é feito com
de vida da D. hominis é único. A fêmea, após a cópula, a retirada das larvas, após a aplicação tópica de éter.
voa e captura um díptero hematófago. Coloca 10 a 50 ovos O emprego da ivermectina a 1% em propilenoglicol é

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Atualização em dermatoses parasitárias 7

outro método que tem sido usado --- duas horas depois da
aplicação, faz-se a limpeza da lesão e retirada das larvas.50

Miíase cavitária
Nesses casos, a mosca deposita os ovos em cavidades natu-
rais, tais como narinas, ouvido, órbitas oculares e vagina. Os
quadros mais graves são ocasionados pela espécie C. homi-
nivorax.
O tratamento de escolha consiste no uso de ivermec-
tina 200 ␮g/Kg de peso em dose única.
Antes da ivermectina, empregava-se o oxcianureto de
mercúrio a 1%.

Demodecidose

É ocasionada pelo Demodex folliculorum, um ácaro, parasita


obrigatório do folículo piloso. Esses ácaros têm predileção
pelas áreas com grande produção sebácea, tais como face e
tórax.
Frequentemente, o Demodex tem sido implicado na eti-
opatogênese da rosácea.51---54 No entanto, a resistência do
ácaro a altas concentrações de metronidazol, demonstrada
in vitro, coloca em dúvida o papel do parasita na patogeni-
cidade da rosácea.55
É possível que por meio da obstrução dos óstios foli-
culares, o Demodex contribua para a reação inflamatória
observada na rosácea, possibilita a proliferação bacteriana
ou induz mecanismos de hipersensibilidade aos antígenos do Figura 8 A, Larva migrans. Intenso prurido. Lesão típica, com
ácaro. aspecto linear, serpiginoso. B, Larva migrans. Numerosas lesões,
Tem sido atribuído ao D. folliculorum papel patogênico na ocasionadas por múltiplas larvas.
Pitiryasis folicullorum, quadro dermatológico que ocorre,
predominantemente, em mulheres de meia-idade. Essa der- Europa), Bunostomum (verme do gado) e Phebotumum ste-
matose é caracterizada pela presença de eritema difuso nocephala também podem ocasionar a doença.
e foliculite na face. No exame microscópico, evidencia-se
grande número de ácaros. O tratamento é feito com acari-
cidas tópicos.53 Manifestações clínicas
Erupções papulosas ou pápulo-pustulosas em face, tronco
e membros, observadas em indivíduos imunodeprimidos Em geral, as lesões são lineares, salientes, eritematosas e
(pacientes HIV positivos, crianças com leucemia e um serpiginosas (fig. 8A). Também podem surgir vesículas e até
caso de micose fungoide), também têm sido atribuídas ao bolhas. As áreas mais afetadas são pés, pernas, nádegas e,
Demodex.56,57 menos frequentemente, outras regiões, tais como face, axi-
O tratamento sistêmico com ivermectina (200 ␮g/kg de las e pênis. Há caso descrito com lesões na mucosa oral. O
peso, em dose única), ou metronidazol 250 mg ao dia, com deslocamento das larvas desencadeia intenso prurido.59
duração variável, depende da resposta, é eficaz. Quando ocorre eczematização e infecção secundária, o
diagnóstico pode ser muito difícil. Nesses casos, recomenda-
Larva migrans cutânea -se, primeiro, usar pomadas para o quadro alérgico e, se
necessário, antibiótico. Assim, o aspecto clínico da larva
migrans fica mais evidente.
É também denominada dermatite linear serpiginosa, bicho
Quando os espaços interdigitais são afetados pode ocor-
geográfico ou de praia e verme da areia.
rer maceração; esse aspecto clínico pode ser confundido
O indivíduo adquire a doença quando entra em contato
com dermatofitose dos pés.
com a areia ou solo contaminado com fezes de cães e gatos.
Também pode ocorrer alteração hematológica, com eosi-
Na época das chuvas, o número de pessoas infectadas
nofilia, que, em alguns casos, chega a 30%. Nas infestações
aumenta, provavelmente pela dissolução das fezes dos cães
intensas (fig. 8B), as larvas podem invadir a corrente sanguí-
e gatos, que facilita a eclosão dos ovos e a penetração das
nea e desencadear a síndrome de Loeffler, caracterizada por
larvas na pele das pessoas.
pneumonia eosinofílica, associada à eosinofilia sanguínea.60
A doença ocorre pela penetração na pele das for-
mas larvárias de nematódeos de cães e gatos que estão
aptos a penetrar na pele provavelmente pela secreção de Tratamento
hialuronidase.58
O Ancylostoma brasiliensis é o agente etiológico mais De acordo com o número de lesões e sua localização, o tra-
frequente. O A. caninum, Uncinaria (vermes dos cães da tamento pode ser tópico ou sistêmico. Nos pacientes com

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8 Cardoso AEC et al.

múltiplas lesões, ou acometimento de áreas hipercerató- mamíferos, tais como gambás, parecem participar do ciclo
sicas, como as regiões palmo-plantares, recomenda-se o epidemiológico da DL.76
tratamento sistêmico. Os principais transmissores da doença são carrapatos do
O albendazol, na dose de 15 mg/kg/dia, durante 3 dias gênero Ixodes. No continente europeu, predomina o Ixo-
é ótima opção terapêutica. O seu uso não impede o aleita- des ricinus. Nos Estados Unidos, o Ixodes dammini, também
mento e o risco fetal é categoria C. A taxa de cura é variável, conhecido como I. scapularis. No Brasil, acredita-se que o
de 77% a 100%.61,62 carrapato responsável pela transmissão da DL seja o Amby-
A ivermectina, na dose de 200 ␮g/kg de peso, em dose lomma cajannense. No entanto, não se exclui a participação
única, é também eficaz. A depender da evolução, a mesma de outras espécies de carrapato. As formas evolutivas dos
dose pode ser repetida depois de 7 dias.63 carrapatos mais associadas com a transmissão da Borrelia
Quando o número de lesões for reduzido, e com são as ninfas e carrapatos adultos. As picadas das ninfas
localização na pele glabra, o tratamento tópico com pomada desses carrapatos são indolores, o que explicaria o fato de
de tiabendazol a 5% pode ser indicado. muitos pacientes infectados não se lembrarem de terem sido
A neve carbônica ou nitrogênio líquido também são picados por carrapatos.77
usados.64,65
Quadro clínico
Doença de Lyme
As manifestações cutâneas da DL são divididas em loca-
A doença de Lyme (DL), também denominada borreliose de lizadas, iniciais (eritema migrans e linfocitoma cutis),
Lyme, é uma zoonose transmitida por carrapatos, princi- disseminadas (EM e linfocitomas múltiplos, que podem ser
palmente do gênero Ixodes, infectados com espiroquetas acompanhados de alterações em outros órgãos) e tardias
pertencentes ao complexo Borrelia burgdorferi sensu lato.66 (acrodermatite crônica atrófica).78
Atualmente, já foram reconhecidas 20 espécies dentro do
complexo sensu lato, seis relacionadas à doença, em huma- Manifestações dermatológicas
nos: B. burgdorferi strictu sensu e B. mayonii (Estados
Unidos), B. bavariensis, B. garinii, B. afzelli e B. spielmanii
O EM é a principal manifestação clínica inicial da DL. Três
(Europa).67
a 30 dias após a picada do carrapato aparece no local de
Afzelius, na Suécia, em 1909, e Lipschutz, na Áustria,
inoculação uma pápula ou pequena placa eritematosa que
em 1913, descreveram os primeiros casos de pacientes com
aumenta de tamanho, forma placa com bordas descontínuas
placas eritematosas, de crescimento centrífugo, aos quais
e centro claro, cianótico e/ou descamativo, que se expande
denominaram eritema crônico migratório (ECM).68,69 Em
centrifugamente, pode atingir grande diâmetro (fig. 9). É
1977, Steere et al. verificaram a associação de ECM e artrite.
comum a progressão rápida das lesões, as quais podem atin-
Os casos foram estudados na cidade de Lyme, Connecticut
gir 20 a 30 cm ou mais, em dias ou semanas. Na maioria dos
(EUA). A partir dessa publicação, surgiram as denominações
artrite de Lyme e DL. Além da associação com artrite, Steere
et al. observaram sintomas inespecíficos (mal-estar, fadiga,
cefaleia, febre e outras manifestações), alterações cardía-
cas, oftalmológicas e neurológicas.70 Devido à evolução,
nem sempre crônica, das lesões cutâneas, Detmar et al.,
em 1989, propuseram o nome eritema migratório (EM),
denominação que tem sido muito usada.71 No Brasil, os
primeiros casos foram relatados, em Manaus, por Talhari
et al.72,73 Filgueira, Azulay e Florião74---76 também descreve-
ram casos clinicamente compatíveis no Rio de Janeiro. Em
1992, foram descritos os primeiros casos de pacientes brasi-
leiros com manifestações articulares associadas à infecção
por B. burgdorferi.74

Patogenia

O agente etiológico do EM/DL, um espiroqueta, foi isolado


pela primeira vez por Burgdorfer, em 1982, no intestino de
carrapatos da espécie Ixodes dammini.75 Atualmente, esse
espiroqueta é denominado Borrelia burdorgeri sensu lato.
Já foi identificado em biópsias de lesões cutâneas, sangue,
líquor, tecido sinovial, miocárdio e olhos de pacientes com
DL.12
Nos Estados Unidos, camundongos e cervos são reser-
vatórios importantes desse espiroqueta. Títulos sorológicos Figura 9 Doença de Lyme. Placa, apresenta crescimento
elevados para Borrelia foram observados em cavalos, vacas, centrífugo, com bordas eritemato-violáceas, mede, aproxima-
carneiros e gatos. No Brasil, roedores silvestres e outros damente, 18 cm, localizada na face posterior da coxa.

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Atualização em dermatoses parasitárias 9

pacientes, essas lesões são assintomáticas. EM com diferen- fluorescência indireta (IFI), que, no entanto, apresentam
tes dos aspectos clínicos já foram descritos: erisipeloides, resultados falso-positivos, em vista da reação cruzada com
eritemato-edematosas, liquenoides.79 Os casos europeus de outras enfermidades, tais como colagenoses, leishmaniose
EM tendem a apresentar-se com pequeno número de lesões e sífilis. Assim, em áreas não endêmicas, para o diagnóstico
e sem tendência à disseminação cutânea.80 definitivo necessita-se de exame confirmatório que demons-
Além do EM, outra manifestação cutânea importante da tre a presença do agente.88
fase inicial da DL é o linfocitoma cutis, também denominado No exame histopatológico das lesões de EM podem-
linfadenose benigna cutis, que simula pseudolinfoma de lin- -se observar, na derme, proliferação e dilatação dos
fócitos B. Clinicamente, caracteriza-se por nódulo ou placa vasos sanguíneos associados a infiltrado inflamatório cen-
eritematosa, única, de um a cinco centímetros de diâmetro, tral constituído por macrófagos, mastócitos, neutrófilos,
localizado, geralmente, em face, pavilhão auricular, bolsa plasmócitos, linfócitos e raros eosinófilos. Vasculite predo-
escrotal ou aréola mamária. O linfocitoma está frequente- minantemente linfocítica pode ser evidenciada. Em lesões
mente associado à infecção pelas B. afzelli e B. garinii.81 Em mais antigas, pode ocorrer atrofia da epiderme e derme,
2007, foi publicado caso de linfocitoma cútis em associação além de diminuição do infiltrado inflamatório dérmico.89
com DL, no Brasil.82 A técnica de reação em cadeia da polimerase (PCR) tem
Nessa fase aguda, podem aparecer também sido usada para detectar sequências de ácido nucleico da
manifestações sistêmicas, tais como astenia, artralgia, Borrelia, apresenta alta especificidade. No entanto, a sen-
mialgia, rash cutâneo, adenopatia, esplenomegalia e sibilidade desse método diagnóstico é variável (20% a 81%).
sinais de irritação meníngea. As lesões iniciais da DL Cerar et al., em 2008, demonstraram que a nested-PCR, com
podem desaparecer sem tratamento e as manifestações o uso do gene flagelina, apresentava sensibilidade maior do
do segundo e terceiro estágios podem surgir meses ou que a PCR (64,6% vs. 24%). A positividade da PCR é maior
anos após a infecção inicial. Entre as principais alterações, quando são usados fragmentos de lesões cutâneas ou de
encontram-se comprometimentos articulares, cardíacos, membrana sinovial. É menos sensível quando feita a partir
neurológicos, oftalmológicos e cutâneos. Mais raramente, de blocos parafinados, sangue, líquido sinovial e líquor.90
alterações tardias podem ocorrer na vigência de lesões de A cultura, com o meio BSK (Barbour, Stroenery, Kelly) ou
EM.83 Entre as manifestações das fases tardias, cutâneas, variações dele, apresenta especificidade de 100%, mas sua
destaca-se a acrodermatite crônica, também denominada sensibilidade é relativamente baixa. Diante das dificulda-
acrodermatite crônica atrófica (ACA) ou doença de Pick- des de execução da técnica e da contaminação do material,
-Herxheimer, mais associada com infecção por B. afzelii, é os resultados são positivos em aproximadamente 45% dos
geralmente descrita na Europa. A ACA é mais comum em casos.91
adultos e pode manifestar-se de seis meses a oito anos após Eisendle et al., em 2007, por meio do exame de imuno-
a picada do carrapato. Clinicamente, começa com placa -histoquímica específica para a detecção de Borrelia sp.,
eritematosa, evolui com atrofia cutânea e vasos sanguíneos associado à técnica de microscopia de focagem flutuante
bem proeminentes, localiza-se, em particular, nos membros (FFM), obtiveram resultados superiores à nested-PCR na
inferiores. A face e o tronco também podem ser afetados.84 identificação de Borrelia (96% vs. 45,2%), com especifici-
dade similar (99,4% vs. 100%). A FFM consiste em examinar
Outras doenças dermatológicas associadas a lâmina em vários planos, simultaneamente horizontal e
vertical, aproxima-se e distancia-se a objetiva do micros-
à infecção por Borrelia
cópio, com aumentos de até 400 × , sob forte iluminação.
Segundo os autores, esses movimentos simultâneos facili-
A infecção pela B. burgdorferi tem sido associada a outras
tam a observação da Borrelia.92 Com essa mesma técnica,
doenças dermatológicas, tais como esclerodermia em placa,
em 2010, Talhari et al. demonstraram, pela primeira vez no
líquen escleroso, atrofodermia de Pasini-Pierini, linfoma de
Brasil, a presença de Borrelia em pacientes com EM proce-
células B cutâneo e granuloma anular.85 Em trabalho feito
dentes de Manaus, com o uso de imuno-histoquímica com
em Manaus, em 2009, pacientes com esclerodermia e atro-
anticorpo policlonal anti-Borrelia e observação pela técnica
fodermia de Pasini-Pierini foram analisados com a técnica de
de microscopia de focagem flutuante, originalmente deno-
imuno-histoquímica com anticorpo policlonal anti-B. burg-
minada Focus Floating Microscopy ? FFM.93
dorferi e a presença da espiroqueta foi confirmada em
amostras de ambas as doenças.86
Tratamento
Diagnóstico
O tratamento da doença é feito de acordo com o estágio
O diagnóstico da doença baseia-se nos aspectos epidemio- e a manifestação clínica apresentada. Em pacientes adultos
lógicos, clínicos e laboratoriais. O diagnóstico laboratorial com DL localizada, inclusive os casos de EM que não apresen-
fundamenta-se nas provas sorológicas (detecção de anticor- tam manifestações neurológicas específicas, o tratamento
pos específicos) e/ou no encontro do agente etiológico. Além recomendado é a doxiciclina (100 mg, 2 × por dia), amoxi-
da sorologia, são importantes os exames histopatológico e cilina (500 mg, 3 × por dia) ou cefuroxima axetil (500 mg,
imuno-histoquímico, cultura e, se disponível, PCR.87 2 × por dia) durante 14 dias. Para crianças e pacientes
A detecção de anticorpos IgM ou IgG anti-B. burgdor- com hipersensibilidade à doxiciclina, usa-se a amoxicilina
feri é comumente usada para o diagnóstico sorológico e na dose de 500 mg ou 50 mg/Kg de peso/dia, 3 × ao dia;
investigação epidemiológica. São mais usados os exames ou cefuroxima 500 mg ou 30 mg/kg/dia, 2 × ao dia, pelo
de ELISA (Enzime-Linked Immunosorbent Assay) e imuno- mesmo período. As manifestações articulares e os casos de

03-fm1.pdf 15 30/03/20 12:57


10 Cardoso AEC et al.

acrodermatite atrófica são tratados com os mesmos anti-


bióticos, durante 28 dias. Nos casos de meningite e outras
manifestações da DL neurológica precoce, recomenda-se
ceftriaxona, 2 g/dia, por via intravenosa, ou penicilina G
cristalina, na dose de 18 a 24 milhões de UI, intravenosa, dia-
riamente, por 14 dias. Para o tratamento da artrite erosiva
crônica recomenda-se sulfasalazina, cloroquina, metotre-
xate e corticoide.80,94

Oncocercose

A oncocercose, também conhecida como oncocercíase,


oncocerquíase e ‘‘cegueira dos rios’’, é doença parasitá-
Figura 10 A, Oncocercose. Intenso prurido, presença de
ria crônica, não contagiosa, caracterizada pela presença
liquenificação, exulcerações e hiperpigmentação. Paciente da
de lesões cutâneas e, muitas vezes, graves lesões oftal-
Clínica de Doenças Infecciosas de Ibadan, Nigeria. (Arquivo pes-
mológicas. É causada pelo nematoide filariano Onchocerca
soal: Prof. Dr. Sinésio Talhari).
volvulus.95
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS),
198 milhões de pessoas apresentam risco de infecção em adultos, machos e fêmeas, tendem a se alojar nos espaços
31 países endêmicos.96 A oncocercose é a segunda causa intersticiais e no tecido adiposo, formam os oncocercomas.
de cegueira infecciosa no mundo. Aproximadamente, 99% Acasalam-se nesses locais. Após o acasalamento, as fêmeas
das pessoas infectadas pela O. volvulus habitam países da dão origem às microfilárias, que migram para o tecido con-
África sub-sahaariana, os demais pacientes encontram-se no juntivo, a derme superficial e o globo ocular. Cada fêmea
Iêmem, Sudão e continente americano. No último, a onco- pode gerar aproximadamente um milhão de microfilárias por
cercose já foi endêmica em seis países: Brasil, Colômbia, ano, as quais vivem até dois anos e meio. As fêmeas, adultas,
Equador, Guatemala, México e Venezuela.96 podem viver entre 9 e 16 anos.99
Atualmente, o único foco de oncocercose no continente
americano, reconhecido pela OMS, continua a ser a região Quadro clínico
limítrofe entre a Venezuela e os estados de Roraima e Ama-
zonas, no Brasil, habitada pelos índios Yanomami.96 No tegumento, a manifestação mais comum e precoce da
Desde 1974, o Programa de Controle da Oncocercose, oncocercose é o prurido crônico, constante, pode simular
desenvolvido pela OMS e financiado pelo Banco Mundial escabiose (fig. 10A). Áreas com escoriações, liquenificação
e pelas Nações Unidas, promove o controle de vetores e e hiperpigmentação são frequentes. Esse quadro é conhecio
tratamento da oncocercose com invermectina (usada pelo como lizard skin (pele de lagarto).100,101
programa a partir de 1987) em 33 países africanos.95 Em A despigmentação tardia e acromia secundária ao pru-
2016, mais de 133 milhões de pessoas que viviam em áreas rido crônico são frequentes, principalmente nos membros
de risco receberam tratamento para oncocercose.97 inferiores (denominada leopard skin, ou seja, pele de leo-
Em 1990, o Programa de Eliminação da Oncocercose nas pardo). Atrofia pode ocorrer nas fases tardias da doença, a
Américas, semelhante ao modelo africano, foi implantado qual pode ser discreta (fig. 10B) ou muito acentuada, oca-
para eliminação da doença nas 13 regiões endêmicas do con- siona o aumento da bolsa escrotal e da hérnia inguinal. As
tinente americano.96 Desde então, os doentes são tratados hérnias inguinais recebem a denominação de hanging groin
com invermectina, 2 ou 4 vezes durante o ano. Até novem- (virilha caída) (fig. 11).101,102 Em alguns casos, as lesões
bro de 2017, em 11 das 13 áreas com transmissão ativa de encontram-se limitadas a determinada área cutânea, princi-
O. volvulus a doença foi considerada eliminada.96 palmente na perna, coxa e região glútea. Esse quadro clínico
é conhecido como sowda. Os oncocercomas são indolores,
Patogenia de consistência firme, arredondados ou alongados e apre-
sentam tamanho variável (0,5 a 10 cm de diâmetro). Essas
A transmissão da O. volvulus ocorre através da picada de lesões localizam-se, geralmente, na pelve, nas faces laterais
insetos do gênero Simulium (‘‘borrachudo’’ ou ‘‘pium’’); do tórax e nos membros inferiores em pacientes africanos;
esses são encontrados, em maior abundância, próximo nas Américas, os oncocercomas são observados, principal-
das margens de rios encachoeirados (daí a denominação mente, no couro cabeludo, nos braços e no tórax.100
‘‘cegueira dos rios’’).95 As microfilárias podem ser trans- As principais lesões oftalmológicas são as ceratites, as
mitidas por diferentes espécies de Similium. No Brasil, as iridociclites, a catarata, as lesões coroidorretinais, a atrofia
principais espécies são o S. guyanense, S. incrustatum e óptica pós-neurítica e a amaurose. A amaurose produzida
S. oyapockense.98 pela oncocercose é extremamente comum na África e acar-
O principal hospedeiro da doença é o homem. Ao picar o reta grandes prejuízos socioeconômicos.95,101
homem infectado, as fêmeas hematófagas ingerem as micro-
filárias, as quais, após 2 a 3 semanas, transformam-se em Diagnóstico
larvas infectantes. Após período de 6 a 12 meses, essas lar-
vas evoluem para vermes adultos; os machos medem 2-4 cm O diagnóstico da oncocercose é baseado na observação
de comprimento e as fêmeas, 40 a 50 cm de. Os vermes das microfilárias ou do verme adulto, através do exame

03-fm1.pdf 16 30/03/20 12:57


Atualização em dermatoses parasitárias 11

Tratamento

O tratamento é feito, principalmente, com a ivermectina,


por via oral, na dose de 150 ␮g/kg de peso, em dose
única, a cada 6 meses. Essa droga é microfilaricida e não
elimina os vermes adultos, os quais permanecem vivos,
produzem novas microfilárias.95 Estudo controlado e rando-
mizado sugere que o uso da invermectina, de 3 em 3 meses,
eliminaria mais parasitas adultos fêmeas, diminuiria, ainda
mais, a transmissão da O. volvulus.104

Suporte financeiro

Nenhum.

Contribuição dos autores


Figura 11 A. Oncocercose. Presença de áreas atróficas em
pacientes com longa evolução. B. Oncocercose. Observar o Alberto Eduardo Cox Cardoso: Aprovação da versão final
aspecto clássico da ‘‘virilha caída’’ (conhecida como hanging do manuscrito; concepção e planejamento do estudo;
groin) decorrente de longa evolução. Há, também, alongamento elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da lite-
da bolsa escrotal (secundário à atrofia cutânea), nódulos na ratura; revisão crítica do manuscrito.
crista ilíaca e virilha esquerda --- provavelmente, oncocercomas. Alberto Eduardo Oiticica Cardoso: Aprovação da versão
(Arquivo pessoal: Prof. Sinésio Talhari). Indígena Yanomami. final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo;
revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Carolina Talhari: Aprovação da versão final do manus-
crito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e
redação do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão
crítica do manuscrito.
Monica Santos: Aprovação da versão final do manuscrito;
concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação
do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica
do manuscrito.

Conflitos de interesse

Nenhum.

Figura 12 Oncocercose. Observar duas microfilárias (Oncho-


Questões EMC
cerca volvulus). Exame direto, em soro fisiológico. Aumento
40 × . (Arquivo pessoal: Prof. Dr. Sinésio Talhari).
1. A ivermectina, quando usada no tratamento sistêmico da
escabiose, deve ser empregada na seguinte dose:
a) 100 mcg/kg em dose única.
direto. O procedimento é simples e feito sem anestésico, b) 200 mcg/kg em dose única.
pregueia-se a pele entre o polegar e o indicador, para evi- c) 200 mcg/kg durante 7 dias.
tar o sangramento durante a colheita do material. Colhe-se d) 20 mcg/kg durante 7 dias.
fragmento superficial de pele. A amostra de pele obtida 2. Os indivíduos imunossuprimidos quando infectados pelo S.
é colocada em soro fisiológico e dividida em pequenos scabiei var. hominis tendem a desenvolver:
pedaços, com o auxílio de dois estiletes. A pesquisa de a) Escabiose nodular.
microfilárias faz-se ao microscópio, sem qualquer coloração b) Escabiose bolhosa.
e aumento de 40?50 vezes (fig. 12).101 A O. volvulus tam- c) Escabiose crostosa.
bém pode ser visto por meio do exame histopatológico das d) Escabiose clássica.
lesões cutâneas e exame oftalmológico. As técnicas habitu- 3. Na pediculose do couro cabeludo, o principal sintoma e os
ais de biópsia, fixação em formol a 10% e a coloração pela achados clínicos são:
hematoxilina-eosina são empregadas.101,102 As microfilárias a) Escoriações no couro cabeludo e prurido.
podem ser identificadas através do exame com a lâmpada b) Prurido e visualização de ovos (lêndeas) nos cabelos.
de fenda.101,102 Recentemente, métodos imunológicos para c) Prurido e crostículas sanguíneas no couro cabeludo.
identificar anticorpos antioncocerca, específicos (ELISA e d) Prurido e adenopatia cervical.
imunofluorescência) e DNA de oncocerca (PCR) têm sido
empregados.103

03-fm1.pdf 17 30/03/20 12:57


12 Cardoso AEC et al.

2. Arlian lG, Estes SA, Vyszenskimoher DL. Prevalence of Sar-


4. Na miíase furunculoide, o tratamento consiste em: coptes scabiei in the homes and nursing homes of scabietic
a) Ivermectina ? 200 mcg/Kg, via oral, 3 vezes por semana. patients. J Am Acad Dermatol. 1988;19:806---11.
b) Albendazol ? dose única de 400 mg. 3. Rubegni P, Mandato F, Risulo M, Fimiani M. Non-invasive diag-
c) Tiabendazol ? 25 mg/kg de peso, durante 5 dias. nosis of nodular scabies: the string of pearls sign. Australas J
d) Retirada da larva. Dermatol. 2011;52:79.
5. Dentre os medicamentos abaixo, qual deles não é usado no 4. Suh KS, Han SH, Lee KH, Park JB, Jung SM, Kim ST, et al.
Mites and burrows are frequently found in nodular scabies
tratamento da larva migrans cutânea:
by dermoscopy and histopathology. J Am Acad Dermatol.
a) Ivermectina - 200 mcg/Kg.
2014;71:1022---3, 1:.
b) Albendazol - 400 mg, em dose única, ou 15 mg/kg de 5. Cölgeçen-Özel E, Ertaş R, Utaş S, Kontaş O. Scabies mimicking
peso/dia, durante 3 dias, quando o paciente pesar mais de mastocytosis in two infants. Turk J Pediatr. 2013;55:533---5.
60 kg. 6. Kim KJ, Roh KH, Choi JH, Sung KJ, Moon KC, Koh JK. Sca-
c) Azitromicina - 500 mg/dia, durante 5 dias. bies incognito presenting as urticaria pigmentosa in an infant.
d) Tiabendazol - 25 mg/kg de peso, durante 5 dias. Pediatr Dermatol. 2002;19:409---11.
6. Na pediculose do púbis ou fitiríase, qual o principal achado 7. Chosidow O. Scabies and pediculosis. Lancet.
para confirmar o diagnóstico: 2000;355:819---26.
a) Prurido na região genital. 8. Meinking TL, Taplin D, Hermida JL, Pardo R, Kerdel FA.
The treatment of scabies with ivermectin. N Engl J Med.
b) Adenopaita dos gânglios da região inguinal.
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c) Encontro do parasita na pele com a parte da cabeça
9. Huffan SE, Currie BJ. Ivermectin for Sarcoptes scabiei hype-
introduzida no folículo piloso ou pelas lêndeas presas rinfestations. Int J Infect Dis. 1998;2:152---4.
próximas a base dos pelos. 10. Bezold G, Lange M, Schiener R, Palmedo G, Sander CA, Kers-
d) Encontro de manchas cinza azuladas na região genital. cher M, et al. Hidden scabies: diagnosis by polymerase chain
7. As formas evolutivas de carrapato mais frequentemente reaction. Br J Dermatol. 2001;144:614---8.
associadas com a transmissão da Borrelia budorgeri são: 11. Dupuy A, Dehen L, Bourrat E, Lacroix C, Benderdouche M,
a) Larvas e carrapatos adultos. Dubertret L, et al. Accuracy of standard dermoscopy for diag-
b) Ninfas e carrapatos adultos. nosing scabies. J Am Acad Dermatol. 2007;56:53---62.
c) Ovos e ninfas. 12. Argenziano G, Fabbrocini G, Delfino M. Epiluminescence
microscopy: a new approach to in vivo detection of Sarcoptes
d) Ninfas e larvas.
scabiei. Arch Dermatol. 1997;133:751---3.
8. Em relação ao eritema migratório, assinalar a assertiva
13. Micali G, Lacarrubba F, Verzì AE, Chosidow O, Schwartz RA.
correta: Scabies: Advances in Noninvasive Diagnosis. PLoS Negl Trop Dis.
a) Aparece de 3 a 5 dias após a picada do carrapato. 2016;10:e0004691.
b) As lesões progridem lentamente e podem atingir até 30 cm 14. Vitoria J, Trujillo R. Topical ivermectin: A new successful tre-
de diâmetro. atment for scabies. Pediatr Dermatol. 2001;18:63---5.
c) Na maioria dos pacientes, o eritema migratório é 15. Castillo AL, Osi MO, Ramos JD, De Francia JL, Dujunco MU,
assintomático. Quilala PF. Efficacy and safety of Tinospora cordifolia lotion
d) O exame histopatológico é típico e confirma o diagnóstico. in Sarcoptes scabiei var-infected pediatric patients: A single
9. Em relação às manifestações clínicas da oncocercose, as blind, randomized controlled trial. J Pharmacol Pharmacother.
2013;4:39---46.
expressões sowda e lizard skin referem-se, respectivamente
16. Mounsey KE, Bernigaud C, Chosidow O, McCarthy JS. Prospects
a:
for Moxidectin as a New Oral Treatment for Human Scabies.
a) Depigmentação e acromia tardia. PLoS Negl Trop Dis. 2016;10:e0004389.
b) Depigmentação e liquenificação. 17. Almeida HL. Treatment of steroid-resistant nodular sca-
c) Lesões limitadas aos membros superiores e liquenificação. bies with topical pimecrolimus. J Am Acad Dermatol.
d) Lesões limitadas aos membros inferiores e liquenificação. 2005;53:357---8.
10. Em relação ao tratamento da oncocercose com 18. Mittal A, Garg A, Agarwal N, Gupta L, Khare AK. Treatment
ivermectiva, assinalar a assertiva correta: of nodular scabies with topical tacrolimus. Indian Dermatol
a) A droga é microfilaricida. Online J. 2013;4:52---3.
b) Deve ser administrada semanalmente, durante 6 meses. 19. Hung Lai H, Chuang S-D, Hu C-H, Lee W-R. Phthiriasis captis.
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c) Deve ser administrada semestralmente, durante 3 anos.
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d) Elimina os vermes adultos.
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03-fm1.pdf 20 30/03/20 12:57


An Bras Dermatol. 2020;95(1):15---19

Anais Brasileiros de
Dermatologia
www.anaisdedermatologia.org.br

INVESTIGAÇÃO

Características clínicas e associações da pustulose


palmoplantar: estudo observacional夽,夽夽
Ayse Oktem ∗ , Pınar Incel Uysal , Neslihan Akdoğan , Aslı Tokmak
e Basak Yalcin

Departamento de Dermatologia, Ankara Numune Training and Research Hospital, Ankara, Turquia

Recebido em 14 de novembro de 2018; aceito em 16 de abril de 2019


Disponível na Internet em 17 de fevereiro de 2020

Resumo
PALAVRAS-CHAVE Fundamentos: A pustulose palmoplantar é doença crônica e recorrente das palmas das mãos e
Dermatite; plantas dos pés, caracterizada por aglomerados dispersos de pústulas estéreis.
Dermatite de contato Objetivo: Determinar características demográficas da pustulose palmoplantar, suas comorbi-
alérgica; dades e sua relação com a psoríase. Foram incluídos no estudo 48 pacientes (M/F: 15/33).
Glândulas écrinas; Foi obtido um histórico detalhado sobre idade de início, duração da pustulose palmoplantar,
Psoríase número de recorrências, história pessoal e familiar de psoríase, artrite concomitante, sensibi-
lidade esternoclavicular, preenchimentos dentários, tabagismo e doença autoimune. Também
realizou-se um exame dermatológico completo. Os resultados dos testes de contato e as análises
laboratoriais para doença autoimune da tireoide foram registrados.
Resultados: Dos 48 pacientes, 35 (72,9%) eram tabagistas atuais; 20 (41,7%) apresentaram
restauração dentária. Não foi observada correlação significativa entre a duração da pustulose
palmoplantar e a duração do preenchimento dentário (p = 0,170). Psoríase não foi detec-
tada, tanto no histórico médico quanto no exame dermatológico. Comprometimento ungueal e
queixas articulares foram observados em sete (14%) e em nove dos 48 pacientes (18%), respecti-
vamente. Tireoidite autoimune foi observada em quatro pacientes (12%). Pacientes com testes
de contato positivos (12,5% dos pacientes, M/F: 1/5) não apresentaram associação considerável
para histórico de contato externo com esses materiais.

DOI referente ao artigo:


https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.04.008
夽 Como citar este artigo: Oktem A, Uysal PI, Akdoğan N, Tokmak A, Yalcin B. Clinical characteristics and associations of palmoplantar

pustulosis: an observational study. An Bras Dermatol. 2020;95:15---9.


夽夽 Trabalho realizado no Departamento de Dermatologia, Ankara Numune Training and Research Hospital, Ankara, Turquia.
∗ Autor para correspondência.

E-mail: ayseoktem@yahoo.com (A. Oktem).

2666-2752/© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma licença
CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

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16 Oktem A et al.

Limitações do estudo: Análise retrospectiva.


Conclusão: A pustulose palmoplantar parece ser uma entidade distinta da psoríase. Avaliação
de rotina das funções da tireoide está indicada, mas testes de contato não são necessários
em pacientes com pustulose palmoplantar. Além disso, sinais e sintomas musculoesqueléticos
devem ser pesquisados em pacientes com pustulose palmoplantar.
© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um
artigo Open Access sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

Introdução de inclusão foram: idade ≥ 18 anos e concordar voluntaria-


mente em participar. Foram coletadas informações quanto
A pustulose palmoplantar (PPP) é doença crônica e recor- às exposições ocupacionais dos participantes, bem como
rente das palmas das mãos e plantas dos pés, caracterizada características demográficas e clínicas, inclusive idade de
por aglomerados dispersos de pústulas estéreis do tama- início, duração da PPP, número de recorrências, histórico
nho de cabeças de alfinete, localizadas principalmente nas pessoal e familiar de psoríase, presença de lesões psoriási-
áreas tenar, hipotenar ou central das palmas, de forma simé- cas no momento da coleta de dados, artrite associada e/ou
trica ou assimétrica (fig. 1). Embora inicialmente tenha sido sensibilidade esternoclavicular, presença de restauração
considerada uma variante da psoríase,1 a PPP hoje é classi- dentária, tabagismo e histórico de doença autoimune. Em
ficada como uma entidade separada e não uma doença no cada paciente foi feito um exame dermatológico com-
espectro da psoríase.2,3 Apesar de alguns pacientes apre- pleto. Especificamente, os pacientes foram examinados
sentarem placas psoriasiformes em outras partes do corpo, cuidadosamente para detectar possíveis lesões psoriásicas
essas lesões não são consideradas placas psoriásicas típicas4 . concomitantes no resto do corpo. Os resultados dos testes de
As glândulas sudoríparas écrinas e o acrossiríngeo desem- contato e as análises laboratoriais para doença autoimune
penham um papel importante na patogênese da PPP5,6 . A da tireoide foram registrados.
PPP é uma doença com predominância feminina. Existe tam-
bém uma associação bem reconhecida com o tabagismo1,7 .
Além disso, alguns autores relatam que anormalidades nas Análise estatística
funções da tireoide7,8 e sensibilidade ao contato9 estão
associadas à PPP. O objetivo do presente estudo foi deter- O software SPSS v. 21.0 foi usado para todas as análises
minar características demográficas, frequência de doença estatísticas. As variáveis paramétricas são apresentadas
autoimune da tireoide, sensibilidade ao contato, artrite como médias (média ± DP) e as variáveis não paramé-
associada, comprometimento das unhas e presença de tricas como medianas (mediana ± intervalo interquartil
lesões psoriásicas no exame dermatológico em pacientes [IIQ]). Variáveis categóricas foram descritas por meio de
com PPP. frequências e porcentagens. Comparações estatísticas entre
variáveis contínuas normalmente distribuídas e variáveis
Métodos categóricas foram feitas com o teste t de Student. O critério
de Kolmogorov-Smirnov foi usado para avaliação da norma-
lidade. Para comparar proporções (variáveis qualitativas),
Estudo observacional transversal. Foram incluídos 48 pacien-
foram usados o teste qui-quadrado e o teste exato de
tes consecutivos (15 homens e 33 mulheres) diagnosticados
Fisher (caso os valores esperados fossem < 5%). Os testes de
com PPP entre janeiro de 2014 e janeiro de 2018 que aten-
Mann-Whitney U e Kruskal-Wallis foram usados para com-
deram aos critérios de inclusão.
parar as variáveis numéricas não normalmente distribuídas.
O estudo foi conduzido de acordo com os princípios da
Todos os valores de p foram bicaudais e as diferenças
Declaração de Helsinque e aprovado pelo comitê de ética
foram consideradas estatisticamente significativas se
local. Todos os pacientes assinaram o termo de consenti-
p < 0,05.
mento livre e esclarecido antes de sua inclusão. Os critérios

Resultados

Características demográficas e clínicas

Foram incluídos no estudo 48 pacientes consecutivos


(15 homens e 33 mulheres; idade média, 50,9 ± 10,4 anos
[intervalo: 21-65 anos]). Não houve associação significativa
entre homens e mulheres para a idade de início da doença
(p = 0,297). O número mediano de recorrências foi de dez nas
mulheres e duas nos homens. A duração mediana da doença
foi de 36 meses nas mulheres e de 12 meses nos homens.
Figura 1 Pústulas localizadas em pele normal e eritematosa A duração da PPP variou de um a 360 meses e o número de
das palmas das mãos, com pigmentação marrom. recorrências variou de 1 a 50 no grupo de estudo. O número

03-fm1.pdf 22 30/03/20 12:57


Características clínicas e associações da pustulose palmoplantar 17

de recidivas (p = 0,01) e a duração da doença (p = 0,01) foram diferença significativa entre homens e mulheres quanto à
significativamente maiores nas mulheres. frequência de artrite associada. Sensibilidade ao toque da
articulação esternoclavicular foi relatada por quatro paci-
Tabagismo entes (8,3%, M/F: 1/3). Um desses pacientes tinha histórico
de espondilite anquilosante. Como nenhum desses pacientes
apresentou manifestações típicas, como dor, edema local ou
Dos 48 pacientes, 35 (72,9%) eram fumantes atuais e 13
calor10,11 , não foram feitas imagens para verificar alterações
(27,1%) eram não fumantes. Entre os não fumantes, 11 dos
radiográficas. Considerou-se que esses pacientes não tinham
13 nunca haviam fumado, enquanto dois dos 13 eram ex-
alteração da articulação esternoclavicular, inclusive hipe-
-fumantes. Os ex-fumantes não haviam fumado nos últimos
rostose.
dois a três anos e tinham hábitos tabagistas de 25 e 30
Cinco pacientes com queixas musculoesqueléticas no pre-
maços-ano, respectivamente. O valor médio de maços/ano
sente estudo já haviam sido avaliados por um reumatologista
foi de 20 ± 13,3 (3-60 maços/ano) no grupo de estudo.
quanto ao comprometimento articular. Dois foram diagnos-
Observou-se diferença estatisticamente significante entre
ticados com artrite reumatoide, dois tiveram diagnóstico de
homens e mulheres quanto ao tabagismo. O valor médio de
espondilite anquilosante e uma paciente estava em acom-
maços-ano foi significativamente maior nos homens do que
panhamento para artrite soronegativa com terapia com
nas mulheres (p = 0,044).
metotrexato. Outros quatro pacientes que não procuraram
atendimento médico para suas queixas musculoesqueléti-
Restauração dentária cas foram atendidos pelos departamentos de reumatologia,
ortopedia e medicina do esporte e reabilitação. Um paciente
Dos 48 pacientes, 20 (41,7%) apresentaram restauração que sofria de dor no joelho foi diagnosticado com menisco
dentária. Não foi observada diferença significativa entre discoide. Três pacientes apresentavam dor nas pequenas
homens e mulheres quanto à duração da restauração den- articulações das mãos, enquanto um apresentou dor apenas
tária. Além disso, não foi observada correlação significativa nas pequenas articulações da mão esquerda e recebeu final-
entre a duração da PPP e a duração da restauração dentária mente o diagnóstico de hérnia de disco cervical, por parte
(p = 0,170). Dos 11 pacientes que apresentaram obturações de um cirurgião ortopédico. Outros dois pacientes, avali-
dentárias, dois apresentaram positividade ao níquel no teste ados pelo departamento de reumatologia, não receberam
de contato. diagnóstico específico. Quanto à relação entre comprome-
timento articular e ungueal, sete pacientes apresentaram
Exposição profissional onicólise e três tiveram artralgia (um com diagnóstico de
espondilite anquilosante, um com diagnóstico de artropatia
Seis dos 48 pacientes relataram exposição ocupacional. As soronegativa e um com artralgia nas pequenas articulações
ocupações desses pacientes foram as seguintes; pessoal de das mãos com diagnóstico inespecífico).
limpeza (2), trabalhador da construção civil (2), trabalhador
de confecções (1) e cabeleireiro (1). O teste de contato foi Doenças autoimunes
positivo em todos os pacientes com histórico de exposição
ocupacional. A exposição ocupacional foi maior nos homens Tireoidite autoimune foi observada em quatro (12%) dos
do que nas mulheres; no entanto, os resultados não apre- 48 pacientes, todas do sexo feminino. Outras doenças
sentaram significância estatística (26% vs. 6%, p = 0,067). autoimunes foram observadas em seis (M/F: 1/5) dos 48
pacientes (12,5%). Quanto à frequência de doenças autoi-
Psoríase no histórico médico e ao exame munes, inclusive tireoidite autoimune, não se observou
dermatológico diferença estatisticamente significativa entre pacientes do
sexo masculino e feminino (p > 0,05).
Nenhum paciente apresentou psoríase, nem no histórico
médico nem ao exame dermatológico. Um histórico fami- Remissão espontânea
liar de psoríase ou dermatite palmoplantar foi relatado por
dois dos 48 pacientes (4,2%). Remissão espontânea foi observada em 19 pacientes (39,5%).
A frequência de remissão espontânea foi similar entre
Comprometimento ungueal homens e mulheres (40% vs. 39%, p > 0,05).

Comprometimento ungueal foi observado em sete dos 48


Resultados dos testes de contato
pacientes (14%). Todos os pacientes com comprometimento
ungueal apresentaram onicólise; três dos sete também apre-
O teste de contato foi positivo em 12,5% dos indivíduos (um
sentaram pitting (depressões puntiformes).
homem, cinco mulheres). A análise estatística indicou que
não houve diferença significativa entre homens e mulheres
Artrite associada, sensibilidade da articulação quanto à positividade do teste de contato (p > 0,05). A positi-
esternoclavicular vidade do teste de contato foi observada em cinco pacientes
com níquel e em um paciente concomitantemente com
Dos 48 pacientes, nove (18%) apresentaram queixas muscu- o bálsamo do Peru e 2-metoxi-6-n-pentil-4-benzoquinona.
loesqueléticas. A análise estatística revelou a ausência de Pacientes com teste de contato positivo não apresentaram

03-fm1.pdf 23 30/03/20 12:57


18 Oktem A et al.

O tabagismo e a disfunção da glândula tireoide são as


condições coexistentes mais frequentemente investigadas
em pacientes com diagnóstico de PPP e a associação entre
uso de tabaco e PPP está bem estabelecida.1,15 O presente
estudo também encontrou uma proporção considerável de
tabagismo, principalmente em pacientes do sexo masculino.
A disfunção da glândula tireoide, inclusive tireoidite autoi-
mune, tem sido relatada em muitos estudos clínicos1,16 . O
presente estudo detectou doença autoimune da tireoide
em quatro de 48 pacientes, que apresentavam anticorpos
elevados contra peroxidase antitireoidiana, baixos níveis
de T4 livre e achados ultrassonográficos de tireoidite de
Hashimoto.
Figura 2 Descamação e pigmentação marrom em pele erite- Com base no relatório que sugeriu regressão espontânea
matosa das palmas das mãos. da PPP após a remoção do amálgama dentário9 , todos
os pacientes foram questionados quanto à presença de
associação considerável com histórico de contato externo restaurações dentárias. Não foi observada correlação signi-
com esses materiais. Dois pacientes com sensibilidade ao ficativa entre a duração da PPP e a duração da restauração
níquel apresentavam restauração dentária. dentária (p = 0,170). Dos 11 pacientes com restauração
dentária, dois apresentaram positividade no teste de
PPP induzida por drogas contato ao sulfato de níquel. Com base nesses resultados, é
difícil afirmar que existe uma sensibilidade de contato com
o amálgama da restauração dentária. A literatura relata
Um paciente foi diagnosticado com espondilite anquilo-
associações de PPP com artralgia predominantemente
sante, no qual as lesões nas palmas das mãos e plantas
localizada nas mãos e nos dedos16 , artropatia psoriásica17
dos pés eram compatíveis com PPP pós-terapia com etaner-
e artro-osteíte e pústulas palmoplantar (síndrome de
cepte.
Sonozaki)18 . No entanto, alguns achados desses estudos
são discutíveis. Por exemplo, no estudo retrospectivo de
Discussão Becher et al.17 , que relatou artropatia psoriásica em 12,3%
dos pacientes, uma proporção significativa dos pacientes
A PPP afeta principalmente mulheres e a idade de início apresentava histórico familiar de psoríase em placas ou
da doença varia de 45 a 65 anos1,3 . As lesões são fre- psoríase em placas concomitante. Por esse motivo, é difícil
quentemente acompanhadas de descamação e pigmentação concluir que exista um elo entre a artropatia psoriásica e
marrom durante a regressão (fig. 2). Recorrências e remis- a PPP. A hiperostose esternocostoclavicular (HECC), que se
sões espontâneas são comuns. As pústulas podem estar apresenta com inchaço e dor na articulação esternoclavi-
localizadas na pele normal ou eritematosa. Ausência de cular, foi relatada primeiramente em um paciente japonês
placas psoriásicas, de pústulas localizadas em outras áreas com PPP. Após esse relato de caso, Sonozaki denominou essa
que não a região palmoplantar e/ou de eritrodermia ou entidade clínica como artro-osteíte pustulótica (síndrome
ainda falta de histórico pessoal/familiar de psoríase são as de Sonozaki, PAO)19 . Devido à associação frequente entre
características da doença. Os pacientes que participaram PPP e artro-osteíte pustulótica, esses autores sugeriram
do presente estudo não apresentavam lesões clássicas de que a HECC pode ser uma manifestação musculoesquelética
psoríase em placas nem história pessoal ou familiar de pso- da PPP. No presente estudo, nenhum dos pacientes com PPP
ríase. Foi sugerido que a PPP seria uma doença autoimune apresentou achados clínicos ou histórico de HECC.
desencadeada pela nicotina7,8 ; entretanto, é sabido que a Sabe-se que a doença psoriásica das unhas, especial-
cessação do tabagismo nem sempre tem um efeito favo- mente a desintegração e a onicólise, está relacionada à
rável na progressão da doença. No presente estudo, uma suscetibilidade à artrite interfalângica distal (AID) em paci-
proporção significativa de pacientes apresentava história entes com psoríase20 . Uma de nossas pacientes que sofria
ativa ou prévia de tabagismo. No entanto, 11 de 48 pacientes de artralgia nas pequenas articulações das mãos também
não tiveram exposição ativa ou passiva à fumaça do tabaco. apresentava onicólise, mas não apresentava achados clíni-
Embora a PPP tenha sido associada à psoríase e lesões cos objetivos de AID. Nesse contexto, os autores acreditam
psoriásicas localizadas em áreas do corpo que não as palmas que o comprometimento das unhas e articulações deve ser
das mãos e as plantas dos pés1, foi relatado que a ligação avaliado entre pacientes com PPP em estudos futuros com
dessas lesões à psoríase era incorreta; na verdade, essas maior tamanho amostral.
lesões psoriasiformes não se assemelham às placas psoriási- A positividade do teste de contato com alérgenos, espe-
cas clássicas4 . Atualmente, sabe-se que a psoríase e a PPP cialmente com metais, foi relatada em pacientes com PPP.
são entidades quase separadas no que diz respeito ao perfil Nesses relatos de caso, a positividade do teste de contato
de citocinas, achados clínicos e suscetibilidade genética12,13 . está correlacionada com restaurações dentárias, incluindo
O comprometimento ungueal --- incluindo pitting (depres- níquel, cobalto e zinco9,21,22 . Remoção das restaurações
sões puntiformes), onicólise e distrofia --- pode ser detectado dentárias levou à regressão das lesões de PPP nos rela-
em pacientes com PPP1,14 . Sete pacientes (14%) apresen- tos de casos esporádicos9 . É sempre importante relacionar
taram onicólise não relacionada à onicomicose em nosso os resultados dos testes com o histórico e os achados clí-
estudo; além disso, três dos sete também tiveram pitting. nicos. É difícil dizer que um dos fatores etiopatogênicos

03-fm1.pdf 24 30/03/20 12:57


Características clínicas e associações da pustulose palmoplantar 19

da PPP é a sensibilidade sistêmica ao contato devido à 2. Ammoury A, El Sayed F, Dhaybi R, Bazex J. Palmoplantar pus-
ausência de grandes estudos de casos com controle. Na pre- tulosis should not be considered as a variant of psoriasis. J Eur
sente série, dois pacientes apresentaram positividade ao Acad Dermatol Venereol. 2008;22:392---3.
níquel e restaurações dentárias; no entanto, a duração da 3. de Waal AC, van de Kerkhof PC. Pustulosis palmoplanta-
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dominância feminina, alta prevalência de tabagismo e
Dermatol. 2010;130:2010---6.
comprometimento ungueal --- são compatíveis com a lite- 6. Murakami M, Kaneko T, Nakatsuji T, Kameda K, Okazaki H, Dai X,
ratura. Com base nas evidências crescentes e nos dados et al. Vesicular LL-37 contributes to inflammation of the lesional
apresentados aqui, a PPP parece ser uma entidade distinta skin of palmoplantar pustulosis. PLoS One. 2014;9:e110677.
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ticados com PPP devido à alta prevalência de anormalidade tal amalgams: a report of two cases. Australas J Dermatol.
dessa função nesses pacientes. Além disso, sinais e sintomas 2016;57:e93---6.
osteomusculares devem ser avaliados em pacientes com PPP. 10. Dihlmann W, Dihlmann SW. Acquired hyperostosis syndrome:
Não está claro se a PPP típica está associada à artrite pso- spectrum of manifestations at the sternocostoclavicular
riásica ou a outras artropatias inflamatórias. Para esclarecer region. Radiologic evaluation of 34 cases. Clin Rheumatol.
esse tópico, os sintomas artríticos devem ser investigados 1991;10:250---63.
em grandes grupos de pacientes. 11. Chigira M, Shimizu T. Computed tomographic appearan-
ces of sternocostoclavicular hyperostosis. Skeletal Radiol.
1989;18:347---52.
Suporte financeiro 12. Asumalahti K, Ameen M, Suomela S, Hagforsen E, Michaëlsson
G, Evans J, et al. Genetic analysis of PSORS1 distinguishes gut-
Nenhum. tate psoriasis and palmoplantar pustulosis. J Invest Dermatol.
2003;120:627---32.
13. Bissonnette R, Suárez-Fariñas M, Li X, Bonifacio KM, Brodmerkel
Contribuição dos autores C, Fuentes-Duculan J, et al. Based on molecular profiling of gene
expression, palmoplantar pustulosis and palmoplantar pustular
Ayse Oktem: Aprovação da versão final do manuscrito; psoriasis are highly related diseases that appear to be distinct
elaboração e redação do manuscrito; participação efetiva from psoriasis vulgaris. PLoS One. 2016;11:e0155215.
na orientação da pesquisa; revisão crítica da literatura. 14. Burden AD, Kemmett D. The spectrum of nail involvement in
Pinar Incel Uysal: Análise estatística; participação efetiva palmoplantar pustulosis. Br J Dermatol. 1996;134:1079---82.
15. Misiak-Galazka M, Wolska H, Rudnicka L. What do we know
na orientação da pesquisa.
about palmoplantar pustulosis? J Eur Acad Dermatol Venereol.
Neslihan Akdoğan: Concepção e planejamento do estudo; 2017;31:38---44.
revisão crítica da literatura. 16. Eriksson MO, Hagforsen E, Lundin IP, Michaëlsson G, Palmo-
Aslı Tokmak: Elaboração e redação do manuscrito; plantar pustulosis: a clinical, immunohistological study, Br J.
obtenção, análise e interpretação dos dados. Dermatol. 1998;138:390---8.
Basak Yalcin: Aprovação da versão final do manuscrito; 17. Becher G, Jamieson L, Leman J. Palmoplantar pustulosis --- a
revisão crítica do manuscrito. retrospective review of comorbid conditions. J Eur Acad Der-
matol Venereol. 2015;29:1854---6.
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03-fm1.pdf 25 30/03/20 12:57


An Bras Dermatol. 2020;95(1):20---24

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Dermatologia
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INVESTIGAÇÃO

Consumo de recursos médicos de psoríase


moderada/grave em uma organização privada de saúde
de Buenos Aires, Argentina夽,夽夽

María Laura Galimberti , Aldana S. Vacas , Barbara A. Hernández ,
María L. Bollea Garlatti , María J. Cura e Ricardo L. Galimberti

Departamento de Dermatologia, Hospital Italiano de Buenos Aires, Buenos Aires, Argentina

Recebido em 6 de novembro de 2018; aceito em 19 de abril de 2019


Disponível na Internet em 15 de fevereiro de 2020

Resumo
PALAVRAS-CHAVE Fundamentos: Apesar do ônus econômico da psoríase para os pacientes e a sociedade, existem
Argentina; poucas informações sobre o impacto e o ônus dessa doença na Argentina.
Custo da doença; Objetivo: Estimar o consumo de recursos médicos e os custos diretos de assistência médica
Psoríase para pacientes com psoríase moderada/grave em Buenos Aires, Argentina, pela perspectiva do
pagador.
Métodos: Adultos com psoríase moderada/grave (a gravidade foi definida como paciente em
tratamento sistêmico), de janeiro de 2010 a janeiro de 2014, com 18 anos ou mais, membros do
Programa de Assistência Médica Hospitalar Italiana (PAMHI) com pelo menos 18 meses de acom-
panhamento foram incluídos. Todos os dados de hospitalizações, prescrição de medicamentos,
visitas ambulatoriais, consultas e investigações/testes nos 12 meses anteriores à inclusão no
estudo foram considerados para a estimativa do consumo de recursos médicos e dos custos dire-
tos dos cuidados de saúde. Os custos do primeiro trimestre de 2018 foram coletados do PAMHI
e convertidos em dólares americanos (com a taxa de câmbio de janeiro de 2018).
Resultados: Foram incluídos 791 pacientes. A idade média ao diagnóstico foi de 34 ± 12 anos.
Quase 65% dos pacientes eram atendidos habitualmente por um dermatologista, 43% por inter-
nistas e 14% por reumatologistas. O custo médio anual direto por paciente foi de US$ 5.326 (IC
95%: 4.125---7.896) por paciente por ano.

DOI referente ao artigo:


https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.04.007
夽 Como citar este artigo: Galimberti ML, Vacas AS, Hernandez BA, Bollea Garlatti ML, Cura MJ, Galimberti RL. Medical resource consumption

of moderate/severe psoriasis in a private health organization of Buenos Aires, Argentina. An Bras Dermatol. 2020;95:20---4.
夽夽 Trabalho realizado no Departamento de Dermatologia do Hospital Italiano de Buenos Aires, Buenos Aires, Argentina.
∗ Autor para correspondência.

E-mail: maria.galimberti@hospitalitaliano.org.ar (M.L. Galimberti).

2666-2752/© 2019 Publicado por Elsevier España, S.L.U. em nome de Sociedade Brasileira de Dermatologia. Este é um artigo Open Access
sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

03-fm1.pdf 26 30/03/20 12:57


Consumo de recursos médicos de psoríase moderada/grave 21

Limitação do estudo: O design do estudo (único centro) e sua natureza retrospectiva são as
principais limitações.
Conclusão: Este é o primeiro estudo argentino que avaliou os custos da psoríase mode-
rada/grave e levou em consideração os custos médicos diretos da doença.
© 2019 Publicado por Elsevier España, S.L.U. em nome de Sociedade Brasileira de Dermatologia.
Este é um artigo Open Access sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/
by/4.0/).

Introdução Internacional de Doenças, Nona Revisão, na admissão


no hospital. Cada paciente potencialmente elegível foi
A psoríase é uma alteração cutânea crônica, inflamatória, submetido a um procedimento padrão (exame clínico e
proliferativa e mediada imunologicamente que compromete biópsia) para que o diagnóstico fosse confirmado por um
predominantemente pele, unhas e articulações.1,2 dermatologista. O protocolo e o questionário usados foram
Em 2014, os Estados Membros da Organização Mun- aprovados pelo Comitê de Ética antes do início do estudo.
dial da Saúde (OMS) reconheceram a psoríase como uma
doença grave não transmissível e adotaram a resolução Uso de recursos
World Health Assembly (WHA), que exige esforços multilate-
rais para aumentar a conscientização e combater o estigma. Dados de hospitalizações, prescrição de medicamentos,
A prevalência mundial de psoríase é estimada em 1% a 3%.2,3 visitas ambulatoriais, consultas com médicos gerais ou espe-
Embora essa não seja geralmente uma doença com risco cialistas e investigações/testes nos 18 meses anteriores à
de vida, vários estudos demonstraram que ela tem um inclusão no estudo foram coletados dos prontuários ele-
impacto significativo no consumo de recursos médicos pelos trônicos dos pacientes incluídos no estudo. Os prontuários
pacientes afetados.4,5 eletrônicos de pacientes do PAMHI fornecem informações
Apesar do ônus econômico da psoríase para os pacientes e diárias de rotina sobre suas doenças e tratamento.
a sociedade, relatado por diversos autores,6---8 existem pou-
cas informações sobre o impacto e o ônus dessa doença na
Argentina. Para entender melhor esse impacto, o objetivo Custos
deste estudo foi estimar o consumo de recursos médicos e
os custos diretos de assistência médica para pacientes com Os custos foram calculados com a abordagem ascendente
psoríase moderada/grave em Buenos Aires, Argentina, pela e agrupados por perspectiva. Para obter o custo anual
perspectiva do pagador. por paciente por ano, os recursos anualizados foram
multiplicados pelos respectivos custos unitários. Os custos
unitários de janeiro de 2018 foram derivados do PAMHI.
Métodos Os custos unitários em pesos argentinos foram convertidos
para dólares americanos com a taxa de câmbio de 2 de
janeiro de 2018 (US$ 1 = AR$ 19,23). Os custos unitários
Foi feito um estudo retrospectivo, epidemiológico e obser-
derivados do PAMHI foram comparados com os de fontes
vacional. A população estudada incluiu os membros do
públicas da Argentina, inclusive o Instituto Nacional de
Programa Assistência Médica do Hospital Italiano (PAMHI),
Estatística e Pesquisas,9 o Banco de Dados Nacional de
uma organização pré-paga de manutenção da saúde.
Custos (Nomenclador Nacional)10 e a Lista Pública de Preços
O PAMHI fornece serviços médicos e de saúde abrangentes
de Medicamentos11 para evitar diferenças significativas.
a mais de 164.456 membros em dois hospitais princi-
Para o custo da análise direta, a terapia sistêmica foi
pais e 24 consultórios médicos, localizados no perímetro
estratificada nos seguintes itens: a) tratamento sistêmico
urbano da cidade autônoma de Buenos Aires, na Argentina.
biológico; b) tratamento sistêmico não biológico; e c) outro
A cidade tem 202 km2 e apresenta um clima subtropical.
tratamento sistêmico que incluísse terapia com UV e PUVA.
Está localizada na margem oeste do Rio da Prata e tem uma
A tabela 1 apresenta os custos unitários.
população de 2.890.151 habitantes.9 Todos os pacientes
diagnosticados com psoríase moderada/grave (a gravidade
foi definida como paciente em tratamento sistêmico) de Análise estatística
janeiro de 2010 a janeiro de 2014, com 18 anos ou mais,
membros do PAMHI e com pelo menos 18 meses de acom- As características demográficas e clínicas dos pacientes,
panhamento foram incluídos no estudo.6 Vários métodos de bem como o uso e os custos dos recursos, foram ana-
coleta de casos foram usados para garantir uma verificação lisados por meio de estatística descritiva (porcentagem,
completa: 1) pacientes incluídos em bancos de dados de média e DP). Intervalos de confiança (95%) foram estimados
dermatologia; 2) pacientes identificados com o código de com bootstrapping não paramétrico. Um teste estatís-
Classificação Internacional de Atenção Básica no sistema tico não paramétrico (teste de Wilcoxon-Mann-Whitney)
computadorizado de registro de pacientes do PAMHI; e para amostras independentes foi usado para determi-
3) pacientes identificados com o Código de Classificação nar se as diferenças entre as comparações feitas eram

03-fm1.pdf 27 30/03/20 12:57


22 Galimberti ML et al.

Tabela 1 Custos unitários em dólares americanos Tabela 3 Tratamento recebido pelos pacientes incluídos

Custos unitários Dólares n %


americanos
Pacientes que receberam tratamento 99 12,5
Consulta especializada, dermatologia 36 biológico sistêmico
Consulta geral 26 Pacientes que receberam tratamento 675 85
Consulta especializada, reumatologia 34 não biológico sistêmico
Atendimento de emergência (dia) 110 Pacientes que receberam outro 323 41
Internações hospitalares (dia) 186 tratamento sistêmico (PUVA e UVB)
Terapia com PUVA (por ciclo de 24 sessões) 1.745
UVB (por ciclo de 24 sessões) 2.153
Ciclosporina (custos mensais) 312 Custos
Metotrexato (custos mensais) 26
Acitretina (custos mensais) 74 Como descrito anteriormente, os custos diretos foram obti-
Etanercepte (custos mensais) 2.398 dos pelo consumo de recursos. A fonte mais relevante de
Adalimumabe (custos mensais) 2.389 custos foi o tratamento médico recebido, seguido pelas con-
Ustequinumabe (custos mensais) 2.480 sultas médicas. O custo médio anual direto por paciente foi
Infliximabe (custos mensais) 3.968 de US$ 5.326 (IC 95%: 4.125---7.896).
Certolizumabe (custos mensais) 2.294 A tabela 4 apresenta todos os custos obtidos com o uso
Golimumabe (custos mensais) 2.250 dos recursos.

Tabela 2 Características basais dos pacientes inscritos Discussão


n 791
A introdução de medicamentos biológicos nos últimos anos
Sexo masculino 387
levou a uma mudança acentuada nas modalidades de trata-
Sexo feminino 404
mento, que por sua vez resultou em uma grande necessidade
Idade média (anos ± DP) 34 ± 12
de atualização de custos.8 Este é o primeiro estudo feito na
Anos desde o diagnóstico, DP 10 ± 16
Argentina e na região que avalia os custos da psoríase e leva
Palmoplantar, n (%) 31 (4)
em consideração os custos médicos diretos da doença no
Em gotas, n (%) 55 (7)
estágio moderado a grave. O custo médio anual por paciente
Placas, n (%) 672 (85)
foi estimado em US$ 5.326.
Pustulosa, n (%) 16 (2)
Os achados do presente estudo foram consistentes com
Eritrodérmica, n (%) 16 (2)
estudos anteriores de custo de doença feitos na Alemanha e
DP, desvio-padrão. em alguns países europeus.6,8,12 Na Alemanha, Jungen et al.
avaliaram dados primários de 1.158 pacientes coletados em
um ambiente de assistência real (uma amostra aleatória de
estatisticamente significativas (p < 0,05). O software Stata 132 centros na Alemanha).8 O custo médio foi de D 5.543
v. 10.1 (Stata Corp. --- College Station, TX, EUA) foi usado (mediana D 2.030).8 Os custos totais encontrados por outros
para a análise estatística. autores variaram entre D 1.079 por paciente por ano na
Espanha, de D 387 a D 6.398 na Suíça (inclusive medica-
Resultados mentos biológicos) e D 11.434 na Itália (PASI > 20).13 As
variações nos custos podem ser explicadas pelo ano dos
Características dos pacientes dados, diferenças nos sistemas de saúde (principalmente
quanto aos preços dos medicamentos) e diferenças meto-
Foram incluídos no estudo 791 pacientes. A idade média dológicas, como a perspectiva do pagador e a gravidade da
ao diagnóstico foi de 34 ± 12 anos; 49% dos pacientes eram doença.13 Na Alemanha, em casos de psoríase tipo placa
mulheres e a duração média da doença foi de 10 ± 16 anos. moderada a grave, os custos diretos foram estimados em D
A tabela 2 apresenta outras características dos pacientes. 794 por ano, em média (15% dos custos totais médios daquele
Os pacientes foram tratados com medicamentos biológi- estudo).6 Já Berger et al. estimaram o custo em D 562 (20%
cos e não biológicos. Os pacientes são apresentados de forma do custo total médio daquele estudo).14 Outro estudo feito
descritiva na tabela 3. em nove estados dos Estados Unidos, que incluiu 200 paci-
entes com psoríase moderada a grave e avaliou recursos de
saúde por seis meses, mostrou que os custos diretos nessa
Uso de recursos população eram de US$ 11.291 e os custos indiretos eram
de US$ 2.101.12 Nesse grupo de pacientes, 79,5% recebe-
Quase 65% dos pacientes eram atendidos habitualmente por ram um ou mais medicamentos biológicos para controle da
um dermatologista, 43% por internistas e 14% por reumato- psoríase.12
logistas. Apenas 8% dos pacientes foram submetidos a uma O presente estudo apresenta várias limitações. Primeiro,
internação de emergência para controlar os sintomas da pso- a amostra envolveu pacientes de apenas um centro. Por-
ríase. A tabela 4 apresenta os dados sobre o uso de outros tanto, uma amostra maior que envolvesse mais centros
recursos pelos pacientes. seria necessária para generalizar os resultados. A segunda

03-fm1.pdf 28 30/03/20 12:57


Consumo de recursos médicos de psoríase moderada/grave 23

Tabela 4 Uso de recursos e custos médicos diretos anuais dos pacientes incluídos (n = 791)

n = 791

Consumo de recursos Custos médicos diretos anuais

Recursos Unidade % (n) de uso de Média ± DP de uso Média IC 95%


recursosa de recursosa
Consulta especializada, Visitas 65 (1.536) 0,7 (0,3) 16,3 9---21,2
dermatologia
Consulta geral Visitas 47 (1.583) 1,01 (0,6) 12,3 8,5---15,5
Consulta especializada, Visitas 14 (331) 0,1 (0,01) 5,2 3,1---7,2
reumatologia
Cuidados de emergência Visitas 8 (189) 0,09 (0,01) 2,5 1,1---3,7
Internações hospitalares Dias 14 (330) 0,08 (0,009) 4,1 2,1---5,8
Tratamento biológico Pacientes 12,5 (99) NA 3.450 3.113---4.560
sistêmico
Tratamento não Pacientes 85 (675) NA 1.097 867---1.234
biológico sistêmico
Outro tratamento Pacientes 41 (323) NA 867 1.123---1.879
sistêmico (PUVA e UVB)
Custos médicos diretos --- --- --- 5.326 4.125---7.896
totais (US$)
a Uso de recursos por paciente por ano.

IC, intervalo de confiança; NA, não aplicável.

limitação é a maneira como as informações foram obtidas Contribuição dos autores


(retrospectivamente, com informações coletadas dos pron-
tuários médicos). No entanto, considerando que os pacientes María Laura Galimberti: Aprovação da versão final do manus-
do PAMHI são atendidos apenas em seus próprios centros e crito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e
que todos os prontuários médicos são registrados, a possibi- redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação
lidade de viés é baixa. A terceira limitação é que os custos dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa;
indiretos não foram calculados. participação intelectual na conduta propedêutica e/ou tera-
Na Argentina, este foi o primeiro estudo projetado para pêutica dos casos estudados; revisão crítica da literatura;
mensurar a carga econômica da doença. As informações revisão crítica do manuscrito.
importantes e inovadoras fornecidas sobre a carga econô- Aldana S. Vacas: Aprovação da versão final do manuscrito;
mica da doença são a principal contribuição deste estudo obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica
para a literatura existente sobre psoríase na Argentina e da literatura.
na região em termos de custos em um país em desenvolvi- Barbara A. Hernández: Aprovação da versão final do
mento. Essas informações são uma ferramenta valiosa para manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados;
a tomada de decisão relevante e sábia no campo, enten- revisão crítica da literatura.
der o comportamento exato da doença no cenário local, e María L. Bollea Garlatti: Aprovação da versão final do
são complementares às informações da Europa e da Amé- manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados;
rica do Norte, onde tanto o uso de recursos quanto os custos revisão crítica da literatura.
podem ser bem diferentes daqueles observados em um país María J. Cura: Aprovação da versão final do manuscrito;
em desenvolvimento como a Argentina.2,7 obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica
da literatura.
Ricardo L Galimberti: Aprovação da versão final do
Conclusão manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados;
revisão crítica da literatura.
O estudo fornece informações importantes sobre a carga
econômica da doença na Argentina. Pesquisas futuras fei-
Conflito de interesses
tas neste e em outros países da região, que levem em
consideração os custos diretos e indiretos da doença, ampli-
arão o conhecimento e melhorarão o manejo da doença na Nenhum.
região, uma questão de grande importância.
Agradecimentos
Suporte financeiro A Leidy V. Gomez Santana, Maria C. Quintero Viana, Daniela
Capacho Estrada, Agustin Estofan, Gina C. Pizarro Guevara,
Nenhum. Ivonne A. Buitrago Gonzalez, Karen Y. Cueto Sarmiento e

03-fm1.pdf 29 30/03/20 12:57


24 Galimberti ML et al.

Marina Abed Dickson por sua contribuição no desenvolvi- 7. Yu AP, Tang J, Xie J, Wu EQ, Gupta SR, Bao Y, et al.
mento do projeto de pesquisa. Economic burden of psoriasis compared to the general popu-
lation and stratified by disease severity. Curr Med Res Opin.
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An Bras Dermatol. 2020;95(1):25---31

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INVESTIGAÇÃO

Associação entre polimorfismo CYP2J2 e


suscetibilidade à psoríase na população turca: estudo
caso-controle夽,夽夽
a,∗ a a b
Yıldız Hayran , Nuran Allı , Pınar İncel Uysal e Tuba Çandar

a
Departamento de Dermatologia, Ankara Numune Training and Research Hospital, Ankara, Turquia
b
Departamento de Bioquímica Médica, Ufuk University Faculty of Medicine, Ankara, Turquia

Recebido em 10 de setembro de 2018; aceito em 19 de abril de 2019


Disponível na Internet em 17 de fevereiro de 2020

Resumo
PALAVRAS-CHAVE
Fundamentos: O citocromo P450 (CYP) 2J2 é principalmente expresso em tecidos extra-
Nucleotideo único;
-hepáticos. Ele metaboliza o ácido araquidônico (AA) em ácidos epoxieicosatrienoicos (EETs),
Polimorfismo;
com vários efeitos cardioprotetores e anti-inflamatórios. O polimorfismo do CYP2J2 foi identifi-
Psoríase;
cado como um fator de risco para doenças cardiovasculares, mas sua associação com a psoríase
Suscetibilidade a
permanece desconhecida.
doenças
Objetivo: Avaliar se o polimorfismo do CYP2J2 é um fator de risco para psoríase em uma
população turca.
Métodos: O estudo incluiu 94 pacientes com psoríase e 100 controles saudáveis, pareados por
idade e sexo. Características demográficas e clínicas detalhadas foram registradas e os escores
do Índice de Área e Gravidade da Psoríase (PASI, do inglês Psoriasis Area and Severity Index)
foram calculados para pacientes com psoríase. Amostras de sangue venoso foram coletadas de
todos os participantes e o polimorfismo CYP2J2 50G > T (rs890293) foi analisado por reação em
cadeia da polimerase (PCR).
Resultados: As frequências do alelo T e do genótipo TT + GT aumentaram em pacientes com
psoríase vulgar (PsV) em comparação ao grupo controle (p = 0,024 e p = 0,029, respectivamente;
OR = 2,82; IC 95%: 1,11---7,15). Não foi identificada associação entre o polimorfismo do CYP2J2
e as características clínicas da psoríase.

DOI referente ao artigo:


https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.04.006
夽 Como citar este artigo: Hayran Y, Allı N, Uysal Pİ, Çandar T. Association of CYP2J2 polymorphism with susceptibility to psoriasis in Turkish

population: a case-control study. An Bras Dermatol. 2020;95:25---31.


夽夽 Trabalho realizado no Departamento de Dermatologia, Ankara Numune Training and Research Hospital, Ankara, Turquia.
∗ Autor para correspondência.

E-mail: yildiz kantarci@yahoo.com (Y. Hayran).

2666-2752/© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma licença
CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

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26 Hayran Y et al.

Limitações do estudo: Um número reduzido de pacientes foi incluído no estudo.


Conclusão: O polimorfismo CYP2J2 50G > T (rs890293) foi associado a um risco aumentado de
PsV na população turca.
© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um
artigo Open Access sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

Introdução O objetivo deste estudo foi investigar o polimorfismo do


CYP2J2 na psoríase, uma doença dermatológica inflamatória
A psoríase é uma doença dermatológica inflamatória crô- crônica que pode ser acompanhada por doenças cardiovas-
nica, caracterizada por pápulas e placas bem delimitadas culares.
com escamas prateadas. No entanto, os estudos relatam
uma ampla variação na prevalência (0---11,8%), de acordo Material e métodos
com idade, sexo e etnia. Acredita-se que a psoríase afete
cerca de 2% da população em geral,1 incide igualmente em População do estudo
homens e mulheres. Embora possa começar em qualquer
idade, foram observados dois picos etários de incidência: No presente estudo, 94 pacientes com psoríase diagnos-
o primeiro na segunda e terceira décadas e o segundo ticada clínica ou histopatologicamente foram admitidos
na quinta e sexta décadas.2 O comprometimento de pele, no Hospital de Pesquisa e Treinamento Ankara Numune
unhas ou articulações pode ser observado em até 50% entre janeiro de 2015 e julho de 2016. Como grupo con-
dos pacientes. A associação da psoríase com vários distúr- trole, foram recrutados 100 pacientes pareados por sexo
bios sistêmicos, como doenças cardiovasculares, infecções, e idade admitidos no ambulatório de dermatologia, com
distúrbios metabólicos, doenças renais, doenças gastrintes- uma doença dermatológica que não psoríase e sem histórico
tinais e câncer, está bem documentada.3---5 A etiopatogênese de doença inflamatória crônica. As características demo-
da doença ainda não está bem esclarecida. A psoríase é clas- gráficas e clínicas (subtipo da doença, duração, gravidade,
sificada como uma doença multifatorial; fatores genéticos, histórico familiar, tratamentos, histórico de artrite pso-
ambientais, imunológicos e inflamatórios contribuem para riásica e comprometimento de localização especial, como
sua patogênese.6 Inflamação, tanto lesional quanto sistê- couro cabeludo, áreas flexurais e unhas) dos pacientes com
mica, é uma característica importante da psoríase. Muitos psoríase e do grupo controle foram registradas. A artrite
estudos que avaliaram a inflamação sistêmica na psoríase psoriásica foi avaliada em todos os pacientes. O histórico de
apontaram que marcadores de inflamação (especialmente artrite psoriásica foi coletado; os pacientes com artralgia
proteína C-reativa, fator de necrose tumoral [TNF]-␣, ou artrite ativa foram encaminhados ao departamento de
molécula de adesão intercelular [ICAM]-1, E-selectina e reumatologia para um diagnóstico definitivo de artrite pso-
interleucinas [IL]-1␤, IL -6, IL-10) estão aumentados em riásica. Pacientes com idade < 18, participantes grávidas ou
pacientes psoriásicos, criam um estado inflamatório sis- lactantes e participantes com histórico de doenças imuno-
têmico que pode levar a comorbidades como doenças lógicas ou inflamatórias foram excluídos do estudo.
cardiovasculares.7 O estudo foi aprovado pelo comitê de ética local (E-
As enzimas do citocromo P450 (CYP) são hemoproteí- 15-612) e todos os participantes assinaram um termo de
nas localizadas principalmente no retículo endoplasmático consentimento livre e esclarecido antes do estudo.
(RE) ou na membrana mitocondrial em humanos. A principal
função dos CYPs é metabolizar medicamentos, xenobió-
ticos não medicamentosos e endobióticos, como ácidos Análise do polimorfismo
graxos, esteroides e hormônios esteroides, ácidos biliares,
vitamina D, prostaglandinas e ácido araquidônico (AA).8---10 O desenho do primer foi feito para a amplificação por
O AA é metabolizado em quatro ácidos epoxieicosatri- reação em cadeia da polimerase (PCR) da região do
enoicos (EETs) 5,6-EET, 8,9-EET, 11,12-EET e 14,15-EET. polimorfismo CYP2J2 -50G > T, de modo que o local do
Os EETs promovem relaxamento vascular, têm efeito anti- polimorfismo estivesse a 150 bp de ambas as extremidades
-inflamatório no endotélio e efeito cardioprotetor durante do amplicon de PCR. Isso foi necessário porque foi usado
eventos isquêmicos.11,12 Além de seu efeito favorável sobre um kit de sequenciamento que faz a leitura a 150 pb
doenças cardiovasculares e inflamatórias, os EETs também das duas extremidades. Antes de pedirem os primers, os
podem promover proliferação, migração e sobrevivência nas autores adicionaram sequências específicas de cerca de 30
células tumorais.13 O CYP2J2 (isoforma do CYP, expresso nucleotídios às extremidades 5’ dos primers, para tornar os
principalmente no fígado, coração, intestino delgado, rim amplicons adequados para o sequenciamento indexado nas
e cérebro) é um dos principais CYPs que convertem AA em plataformas Illumina. A tabela 1 resume os pares de primers
EETs.14 O polimorfismo do CYP2J2 foi estudado em doenças de PCR, as sequências específicas de locus e as sequências
cardiovasculares, acidente vascular cerebral isquêmico e adicionadas para a PCR índice. As amostras de DNA foram
doença de Alzheimer e demonstrou-se que ele aumenta a obtidas isolando-se 200 ␮L de amostras de sangue de cada
suscetibilidade a essas doenças.15---18 participante, com um QIAamp DNA Blood Mini Kit (Qiagen

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Associação entre polimorfismo CYP2J2 e suscetibilidade à psoríase na população turca 27

Tabela 1 Pares de primers de PCR, as sequências específicas de locus e as sequências adicionadas para a PCR índice

Primers
CYP2J2 -50 F TCGTCGGCAGCGTCAGATGTGTATAAGAGACAGCTCCTAGCCTGGCCTTTTCTGAGAC
CYP2J2 -50 R GTCTCGTGGGCTCGGAGATGTGTATAAGAGACAGCATGGCTCAGACGTCCTCCTGCTC
Sequências específicas de locus
CYP2J2 -50 F CTCCTAGCCTGGCCTTTTCTGAGAC
CYP2J2 -50 R CATGGCTCAGACGTCCTCCTGCTC
Sequências adicionadas para a PCR índice
seq (i5) + adaptador no TCGTCGGCAGCGTCAGATGTGTATAAGAGACAG
primer construído
seq (i7) + adaptador no GTCTCGTGGGCTCGGAGATGTGTATAAGAGACAG
primer construído

Inc.). As PCRs foram feitas em amostras de DNA isoladas O PASI médio dos pacientes com psoríase foi 4,51
com os primers projetados; as reações foram verificadas (DP = 3,86). A psoríase vulgar (PsV) foi o tipo mais comum,
usando eletroforese em gel de agarose a 2%. Uma segunda identificada em 76% de todos os pacientes com psoríase.
PCR para fins de indexação foi feita para adicionar sequên- A psoríase palmoplantar foi o segundo tipo mais comum
cias índice aos amplicons, para alcançar a multiplexação (11%), seguida pela gutata (6%), eritrodérmica (4%) e pus-
no sequenciamento de próximo gene. Para cada uma das tulosa (3%). O comprometimento de pelo menos uma das
amostras, foi usada uma combinação diferente de primers localizações especiais, como couro cabeludo, região flexu-
índice. As reações de indexação por PCR também foram ral ou região genital, foi observado em 74,5% dos pacientes
verificadas com eletroforese em gel de agarose a 2%. Volu- com psoríase. O couro cabeludo foi a localização especial
mes iguais de reações de PCR indexadas foram misturados mais frequentemente afetada. Artralgia foi identificada em
para obter um pool de PCR, que incluía todos os amplicons 47% dos pacientes com psoríase e 23% dos pacientes foram
de todas as amostras. O pool de PCR foi purificado com um diagnosticados com artrite psoriásica.
kit NucleoFast® 96 PCR (Macherey-Nagel GmbH). O pool Os tratamentos anteriores e atuais estão resumidos na
purificado foi quantificado com um espectrofotômetro de tabela 2. Os esteroides tópicos foram o tratamento anterior
microvolume e diluído de acordo com as recomendações e atual mais comum em pacientes com psoríase (99% e 90%,
da Illumina Inc. O sequenciamento de segunda geração das respectivamente). Entre os pacientes, 23,1% apresentavam
amostras foi feito com o sistema Miseq (Illumina Inc.). A pelo menos uma doença sistêmica ou comorbidade associ-
genotipagem das amostras foi finalizada quando os dados ada. Doenças cardiovasculares foram observadas em 11,7%
foram analisados no software IGV v. 2.3 (Broad Institute). dos pacientes, e outras doenças sistêmicas em 22,2% (tabela
2).

Análise estatística
Análise do polimorfismo do gene CYP2J2
O SPSS Statistics para Windows v. 21.0 (IBM Corp. --- Armonk,
NY, Estados Unidos) foi usado para análise estatística. As A frequência alélica e a distribuição do genótipo do gene
variáveis quantitativas foram analisadas com o teste qui- CYP2J2 em pacientes com psoríase e controles estão descri-
-quadrado ou o teste exato de Fisher, quando necessário; tas na tabela 3. O alelo T e o genótipo TT + GT no modelo
as variáveis qualitativas foram analisadas com o teste U dominante foram mais frequentes em pacientes com pso-
de Mann-Whitney. A correlação entre variáveis qualitati- ríase em comparação com os controles (frequência do alelo
vas foi avaliada pelo teste de correlação de Spearman. T 9,04% vs. 4,5% e frequência do genótipo TT + GT 17,02%
Valores-p < 0,05 foram considerados como diferenças esta- vs. 8%), mas essa diferença clínica não foi estatisticamente
tisticamente significativas em todas as análises. significativa (p = 0,063 e p = 0,062, respectivamente). Os
pacientes com psoríase foram divididos em dois subgrupos:
vulgar (PsV) e não vulgar (nVP). A análise de subgrupos mos-
Resultados trou que as frequências do alelo T e do genótipo TT + GT
eram maiores em pacientes com PsV em comparação com
Características dos pacientes e características o grupo controle (p = 0,024 e p = 0,029, respectivamente),
clínicas da psoríase indicou que o polimorfismo do CYP2J2 estava associado
a um aumento do risco de desenvolver PsV (OR = 2,82; IC
As características dos pacientes e os aspectos clínicos da 95%: 1,11-7,15; p = 0,029).
psoríase estão resumidos na tabela 1. Na distribuição por As características demográficas e as características da
sexo, 47% dos pacientes eram do sexo masculino e 53% do doença de pacientes com psoríase com genótipo GG (tipo
feminino. A idade média dos pacientes foi de 44,66 anos selvagem) e genótipo GT + TT (polimorfismo homozigoto ou
(DP = 12,6) e a idade média ao diagnóstico de psoríase foi heterozigoto) foram comparadas e resumidas na tabela 4.
de 33,21 anos (DP = 14,9). A idade dos pacientes e a idade Embora o grupo polimórfico apresentasse mais pacientes
ao diagnóstico foram semelhantes nos pacientes do sexo com PsV do que pacientes com PsnV (> 2 vezes), o resul-
masculino e feminino (p = 0,39 e 0,53, respectivamente). tado não foi estatisticamente significativo (p = 0,22). A idade

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28 Hayran Y et al.

Tabela 2 Características dos pacientes e características para psoríase, presença de doenças associadas e modalida-
clínicas da psoríase des de tratamento foram semelhantes entre pacientes com
psoríase com e sem polimorfismo.
Característica n (%)
Idade (anos) 45 (36---54)a
Discussão
Sexo masculino 45 (47,9)
Tipo clínico
Psoríase vulgar 71 (75,5) Este estudo investigou o possível papel do polimorfismo do
Psoríase não vulgar 23 (24,5) CYP2J2 como fator de risco em pacientes com psoríase. Os
Idade ao diagnóstico de psoríase 31 (21---46)a resultados demonstram uma frequência significativamente
PASI 4,2 (1,85---6,9)a mais alta do alelo T em pacientes com PsV e um risco aumen-
tado de psoríase em pacientes com polimorfismo CYP2J2 no
Presença de comprometimento de localizações especiais modelo dominante. Tanto quanto é do conhecimento dos
Couro cabeludo 57 (60,6) autores, este é o primeiro estudo que investiga o papel do
Unha 31 (33) polimorfismo CYP2J2 na psoríase.
Região flexural 24 (25,5) O CYP2J2 50G > T é um dos polimorfismos funcionais
Região genital 21 (22,3) do CYP2J2 mais estudados. Spiecker et al. estudaram
Presença de artralgia 46 (48,9) o efeito do polimorfismo CYP2J2 50G > T e observaram
Presença de artrite 23 (24,5) uma diminuição na ligação do fator de transcrição Sp1
Histórico familiar positivo para psoríase 26 (7,7) ao DNA, uma redução na atividade do promotor e meno-
Tratamentos anteriores res concentrações plasmáticas de EET em pacientes com
Esteroides tópicos 93 (98,9) polimorfismo G-50T em comparação com participantes
Tratamentos sistêmicos 52 (55,3) com tipo selvagem.19 EETs derivados do CYP2J2 induzem
Fototerapia 3 (3,2) vasodilatação, inibem inflamação, apoptose e trombose
Agentes biológicos 2 (2,1) e apresentam efeitos cardioprotetores.20 Ao alterar suas
concentrações plasmáticas, o polimorfismo do CYP pode afe-
Tratamentos atuais tar o papel cardioprotetor dos EETs e desempenhar um papel
Esteroides tópicos 85 (90,4) na patogênese das doenças cardiovasculares.
Tratamentos sistêmicos 39 (41,5) O polimorfismo do CYP2J2 foi estudado principalmente
Fototerapia 12 (12,8) em doenças cardiovasculares, apresentou resultados con-
Agentes biológicos 21 (22,3) traditórios entre diferentes grupos étnicos. Estudos que
Doenças internas associadas e comorbidades investigaram o polimorfismo CYP2J2 em doenças coronari-
Doenças cardiovasculares 11 (11,7) anas revelaram um aumento do risco na população alemã,
Outras doenças sistêmicas 22 (22,2) diminuição do risco em negros e nenhuma associação em
brancos e na população sueca.18,19,21,22 Polonikov et al. evi-
a
Dados apresentados como mediana (IIQ). denciaram um risco aumentado de hipertensão em pacientes
PASI, Índice da Gravidade da Psoríase por Área. russos; no entanto, essa associação não foi confirmada em
negros ou brancos.23---25 Polonikov et al. também descre-
e o sexo dos pacientes, idade ao início da doença, PASI, veram uma relação sexo-específica entre o polimorfismo
presença de comprometimento de localizações especiais, do CYP2J2 e a hipertensão em pacientes russas do sexo
presença de artralgia e artrite, histórico familiar positivo feminino.26 Não foi identificada associação significativa

Tabela 3 Frequência alélica e distribuição de genótipos do gene CYP2J2 em pacientes com psoríase e controles

Psoríase PsV (n = 71) Controle (n p p OR (IC 95%) OR (IC 95%)


(todas as n (%) = 100) (psoríase (PsV vs. (psoríase (PsV vs.
formas; n = n (%) [todas as controle) [todas as controle)
94) formas] vs. formas] vs.
n (%) controle) controle)
Genótipo
Modelo TT+GT 16 (17,02) 14 (19,8) 8 (8) 0,062 0,029 2,35 2,82
dominante (0,96?5,8) (1,11?7,15)
GG 78 (82,97) 57 (80,2) 92 (92)
Modelo TT 1 (1,06) 1 (1,4) 1 (1) 0,96 0,807 1,07 1,41
recessivo (0,07?17,3) (0,09?22,9)
GT+GG 93 (98,94) 70 (98,6) 99 (99)
Alelo
G 171 (90,96) 127 (89,5) 191 (91,2) 0,063 0,024
T 17 (9,04) 15 (10,5) 9 (4,5)

PsV, psoríase vulgar.

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Associação entre polimorfismo CYP2J2 e suscetibilidade à psoríase na população turca 29

Tabela 4 Características demográficas e características da doença em pacientes com psoríase com genótipo GG e genótipo
GT + TT

CYP2J2 GG CYP2J2GT + TT p
Tipo de psoríase (PsV/PsnV) 57/21 14/2 0,22
Idade 44,6 (10,9) 46 (15,9) 0,90
Idade ao início 30 (13,7) 31 (16,1) 0,41
PASI 4,5 (4) 5,2 (2,8) 0,81
Sexo masculino/feminino 27/29 7/8 0,92
Presença de comprometimento de localizações especiais
Couro cabeludo 66,1 73,3 0,59
Unha 37,5 26,7 0,44
Região flexural 26,8 26,7 0,99
Região genital 25 13,3 0,34
Presença de artralgia 50 53,3 0,82
Presença de artrite 21,4 26,7 0,67
Histórico familiar positivo para psoríase 35,7 20 0,25
Doenças internas associadas e presença de comorbidades 26,8 20 0,59

entre o polimorfismo CYP2J2 e acidente vascular cere- com psoríase, embora o polimorfismo do CYP tenha sido
bral nas populações sueca e chinesa.18,27 Estudos recentes maior em pacientes com psoríase, os resultados não atin-
também demonstraram que o CYP2J2 aumentou os níveis cir- giram significância estatística. Na análise de subgrupos de
culantes de EET e angiogênese induzida e melhorou a função subtipos de psoríase, observou-se uma diferença estatistica-
cardíaca em ratos após infarto do miocárdio.28 As doenças mente significativa entre o polimorfismo CYP em pacientes
cardiovasculares são comorbidades frequentes e importan- com PsV e o grupo controle. O polimorfismo do CYP foi iden-
tes na psoríase. O presente estudo avaliou a associação tificado como um fator de risco para PsV, mas não para PsnV.
entre polimorfismo do CYP2J2 e comorbidades cardiovascu- A psoríase é um distúrbio dermatológico inflamatório, no
lares. Não foi observada uma associação significativa entre qual a suscetibilidade genética tem um efeito significativo
o polimorfismo do CYP2J2 e a frequência de comorbidade, na patogênese da doença. O histórico familiar de psoríase
sugeriu-se que o CYP2J2 pode aumentar o risco do surgi- difere entre os grupos étnicos; a prevalência de histórico
mento de PsV, mas não está associado a um risco aumentado familiar positivo é estimada em aproximadamente 30%.32,33
de comorbidades cardiovasculares em pacientes com pso- PSORS1 e PSORS2 são dois dos loci de suscetibilidade mais
ríase. conhecidos para a psoríase. O HLA-C*06:02 está localizado
Além de seus efeitos cardiovasculares, os EETs deri- no locus PSORS1 e o papel do HLA-C*06:02 na psoríase é bem
vados do CYP2J2 também modulam a inflamação.29 Node estabelecido. Estudos recentes confirmaram a importância
et al. estudaram o efeito dos EETs derivados do CYP2J2 na do HLA-C*06:02 na suscetibilidade genética da psoríase,
inflamação vascular. Seu estudo revelou que os EETs podem bem como seu impacto na resposta ao tratamento.34 Junta-
modular a resposta inflamatória pela inibição da expres- mente com o HLA-C*06:02, um grande estudo genético feito
são induzida por citocinas pró-inflamatórias (TNF-␣, IL-1␣ por Zhou et al. revelou vários novos locais de suscetibili-
e lipopolissacarídio bacteriano) das moléculas de adesão dade, como HLA-C*07:04, rs118179173, HLA-B aminoácido
endotelial vascular (VCAM-1, ICAM-1 e E-selectin) e diminuir 67, HLA-DPB1*05:01 e BTNL2 aminoácido 281.35 O membro
o número de leucócitos mononucleares móveis/aderentes.29 da família de recrutamento de caspase 14 (CARD14) está
Os EETs também apresentam efeitos anti-inflamatórios pela localizado no locus PSORS2 e ativa a via NF-␬B. O CARD14
inibição do fator nuclear kappaB (NF-␬B) e I␬B quinase, foi classificado como um gene de suscetibilidade à psoríase
ativação dos receptores ativados pelo proliferador de pero- e muitos estudos recentes se propuseram a demonstrar o
xissoma, aumento da expressão da eNOS e regulação da papel do CARD14 na patogênese da psoríase. As mutações de
homeostase do retículo endoplasmático.30 ganho de função do CARD14 ativam a via de transdução de
Embora o efeito anti-inflamatório dos EETs esteja bem sinal NF-␬B e foi demonstrado que a atividade aumentada
documentado, poucos estudos investigaram o polimorfismo do NF-␬B devido a mutações no CARD14 está ligada à pso-
do CYP2J2 em doenças inflamatórias. Wang et al. estuda- ríase pustulosa.36 Zhu et al. também investigaram variantes
ram o polimorfismo do CYP2J2 em pacientes com diabetes do CARD14 em pacientes com PsV. O estudo revelou cinco
mellitus. Embora não tenha sido observada diferença signi- mutações, mas as mutações também foram observadas no
ficativa entre pacientes diabéticos e um grupo controle, em grupo controle e não foi possível estabelecer uma clara
pacientes diabéticos o polimorfismo do CYP2J2 demonstrou relação mutação-doença.37 Tanaka et al. investigaram o
estar associado a menor idade de início.31 Os autores papel imunológico de CARD14 no modelo murino de psoríase
estudaram o polimorfismo CYP2J2 na psoríase, uma doença e demonstraram que a expressão do mRNA de IL-23 e a
dermatológica inflamatória crônica, e observaram um risco infiltração de células T produtoras de IL-17 diminuíram em
aumentado de psoríase em pacientes com polimorfismo camundongos com deficiência de CARD14.38 O estudo tam-
CYP2J2. Na análise agrupada, que incluiu todos os pacientes bém mostrou que as alterações inflamatórias psoriasiformes

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30 Hayran Y et al.

da pele eram menores em camundongos com deficiência de Nuran Allı: Aprovação da versão final do manuscrito; revi-
CARD14, sugeriu o possível papel imunológico inflamatório são crítica do manuscrito.
da CARD14 na patogênese da psoríase.38 Além do PSORS1 Pınar İncel Uysal: Elaboração e redação do manuscrito;
e PSORS2, muitos loci de suscetibilidade à psoríase foram obtenção, análise e interpretação dos dados.
identificados com estudos de associação ampla do genoma Tuba Çandar: Participação efetiva na orientação da pes-
(genome-wide association studies [GWAS]). Tsoi et al. quisa; revisão crítica do manuscrito.
fizeram uma metanálise de GWAS e identificaram 16 novos
locais de suscetibilidade que regulam I-␬B quinase/via Conflitos de interesse
NF-␬B e citotoxicidade e que respondem a estímulos
externos e diferenciação de leucócitos.39 Além dessas Nenhum.
variações genéticas, também foram identificadas algumas
mutações e polimorfismos específicos do subtipo. Li et al.
demonstraram que o polimorfismo no gene antagonista do Referências
receptor de IL-36 (IL36RN) estava associado ao aumento do
risco de psoríase pustulosa.40 Twelves et al. investigaram as 1. Christophers E. Psoriasis --- epidemiology and clinical spectrum.
Clin Exp Dermatol. 2001;26:314---20.
frequências de mutação IL36RN entre diferentes subtipos
2. Springate DA, Parisi R, Kontopantelis E, Reeves D, Griffiths CE,
de psoríase pustulosa e observaram que as mutações IL36RN
Ashcroft DM. Incidence, prevalence and mortality of patients
eram mais frequentes entre pacientes com psoríase pustu- with psoriasis: a U.K. population-based cohort study. Br J Der-
losa generalizada.41 Estudos com diferentes antecedentes matol. 2017;176:650---8.
genéticos em diferentes subtipos de psoríase sugerem que 3. Jiaravuthisan MM, Sasseville D, Vender RB, Murphy F, Muhn CY.
a PsnV pode ser uma doença diferente, e não um subtipo de Psoriasis of the nail: anatomy, pathology, clinical presentation,
psoríase, o que é consistente com os presentes resultados. and a review of the literature on therapy. J Am Acad Dermatol.
No presente estudo, não foi observada associação entre 2007;57:1---27.
o polimorfismo CYP2J2 e as características clínicas da pso- 4. Henes JC, Ziupa E, Eisfelder M, Adamczyk A, Knaudt B, Jacobs
ríase. A maioria dos pacientes com psoríase incluídos no F, et al. High prevalence of psoriatic arthritis in dermatological
patients with psoriasis: a cross-sectional study. Rheumatol Int.
estudo estava em tratamento. Com o tratamento, as princi-
2014;34:227---34.
pais características clínicas, como PASI, comprometimento
5. Takeshita J, Grewal S, Langan SM, Mehta NN, Ogdie A, Van
das unhas, artralgia e artrite podem ser modificadas. Voorhees AS, et al. Psoriasis and comorbid diseases: Epidemio-
Uma das limitações deste estudo é que ele não verificou logy. J Am Acad Dermatol. 2017;76:377---90.
as concentrações de EET e sua associação com o polimor- 6. Griffiths CE, Barker JN. Pathogenesis and clinical features of
fismo do CYP2J2. O polimorfismo do CYP2J2 pode contribuir psoriasis. Lancet. 2007;370:263---71.
para o processo inflamatório e a patogênese da psoríase pela 7. Dowlatshahi EA, van der Voort EA, Arends LR, Nijsten T. Markers
alteração das concentrações de ETT; porém, mais estudos of systemic inflammation in psoriasis: a systematic review and
são necessários para compreender a relação entre psoríase meta-analysis. Br J Dermatol. 2013;169:266---82.
e polimorfismo do CYP-ETT. Outra limitação foi o número 8. Berka K, Hendrychová T, Anzenbacher P, Otyepka M. Mem-
brane position of ibuprofen agrees with suggested access path
restrito de pacientes com psoríase com comorbidades car-
entrance to cytochrome P450 2C9 active site. J Phys Chem A.
diovasculares. O presente estudo não demonstrou relação
2011;115:11248---55.
entre o polimorfismo do CYP e as comorbidades, mas isso 9. Guengerich FP. Cytochrome p450 and chemical toxicology. Chem
pode ser devido ao erro do tipo II (beta). Res Toxicol. 2008;21:70---83.
A base genética da psoríase é complexa e difere entre os 10. Guengerich FP. Cytochrome P450: what have we learned and
grupos étnicos e os subtipos de psoríase. O polimorfismo CPY what are the future issues? Drug Metab Rev. 2004;36:159---97.
--- como outros polimorfismos --- pode variar entre os grupos 11. Spector AA. Arachidonic acid cytochrome P450 epoxygenase
étnicos. Para generalizar os presentes resultados, são neces- pathway. J Lipid Res. 2009;50Suppl:S52---6.
sários estudos adicionais com diferentes grupos étnicos e 12. Chen W, Yang S, Ping W, Fu X, Xu Q, Wang J. CYP2J2 and
diferentes subtipos de psoríase. EETs protect against lung ischemia/reperfusion injury via anti-
-inflammatory effects in vivo and in vitro. Cell Physiol Biochem.
2015;35:2043---54.
13. Panigrahy D, Kaipainen A, Greene ER, Huang S. Cytochrome
Suporte financeiro
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da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêu- ciation between polymorphisms of CYP2J2 and EPHX2 genes
tica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da and risk of coronary artery disease. Pharmacogenet Genomics.
literatura; revisão crítica do manuscrito. 2011;21:489---94.

03-fm1.pdf 36 30/03/20 12:57


Associação entre polimorfismo CYP2J2 e suscetibilidade à psoríase na população turca 31

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An Bras Dermatol. 2020;95(1):32---39

Anais Brasileiros de
Dermatologia
www.anaisdedermatologia.org.br

INVESTIGAÇÃO

Seria a arterite macular linfocítica limitada à pele?


Seguimento prolongado de sete pacientes夽,夽夽
a,∗ a
Thâmara Cristiane Alves Batista Morita , Gabriela Franco Sturzeneker Trés
e Paulo Ricardo Criado a,b

a
Departamento de Dermatologia, Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
b
Faculdade de Medicina do ABC, Santo André, SP, Brasil

Recebido em 24 de setembro de 2018; aceito em 4 de maio de 2019


Disponível na Internet em 20 de fevereiro de 2020

Resumo
PALAVRAS-CHAVE Fundamentos: A arterite macular linfocítica apresenta-se mais comumente como máculas
Lipoproteina(a); hiperpigmentadas nos membros inferiores. A patogênese da doença ainda é incerta e há uma
Livedo reticular; discussão em curso se ela de fato representa uma nova vasculite cutânea ou se trata de uma
Pele; forma indolente de poliarterite nodosa cutânea.
Poliarterite nodosa; Objetivo: Descrever achados clínicos, histopatológicos e laboratoriais de pacientes que rece-
Trombose; beram o diagnóstico de arterite macular linfocítica.
Vasculite Métodos: Foi conduzida uma pesquisa retrospectiva, em que foram revistos os casos seguidos
na Clínica de Vasculites da Divisão de Dermatologia, Faculdade de Medicina, Universidade de
São Paulo, entre 2005 e 2017. Sete pacientes foram incluídos.
Resultados: Todos os pacientes eram do sexo feminino, entre 9-46 anos, e tinham máculas hiper-
pigmentadas principalmente nas pernas. Três pacientes relataram sintomas. As biópsias de pele
evidenciavam infiltrados predominantemente linfocíticos que acometiam arteríolas da junção
derme-subcutâneo, bem como um típico anel de fibrina luminal. Nenhum paciente desenvolveu
úlceras necróticas, dano neurológico ou manifestações sistêmicas. O seguimento variou de 18
a 151 meses, com duração média de 79 meses.
Limitações do estudo: Pequena amostra de pacientes e desenho retrospectivo e não contro-
lado.

DOI referente ao artigo:


https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.05.001
夽 Como citar este artigo: Morita TCAB, Trés GFS, Criado PR. Is macular lymphocytic arteritis limited to the skin? Long-term follow-up of

seven patients. An Bras Dermatol. 2020;95:32---9.


夽夽 Trabalho realizado no Departamento de Dermatologia, Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São

Paulo, SP, Brasil.


∗ Autor para correspondência.

E-mail: thamaramorita@usp.br (T.C.A.B. Morita).

2666-2752/© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma licença
CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

03-fm1.pdf 38 30/03/20 12:57


Seria a arterite macular linfocítica limitada à pele? Seguimento prolongado 33

Conclusões: De nosso melhor conhecimento, esta série de casos apresenta a maior duração de
seguimento já relatada. Durante esse período, nenhum dos pacientes mostrou resolução das
lesões nem progressão para vasculite sistêmica. Similaridades entre os achados das biópsias de
pele dão apoio à hipótese de que a arterite macular linfocítica é uma forma benigna, incompleta
e menos agressiva de poliarterite nodosa cutânea.
© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um
artigo Open Access sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

Introdução C-reativa, urinálise, níveis do complemento, eletroforese


de proteínas séricas, sorologia para hepatites B e C, fator
A primeira descrição da arterite macular linfocítica (AML) antinuclear (FAN), fator reumatoide (FR), anticorpo contra
foi feita por Fein et al. em 2003.1 Ela é caracteri- DNA dupla hélice, anti-SSA, anti-SSB e anticorpos anticito-
zada por máculas eritematosas ou hiperpigmentadas, que plasma de neutrófilos. Uma breve pesquisa de trombofilias
podem ser redondas, lineares ou mais frequentemente incluiu: anticoagulante lúpico; anticorpos anticardiolipina
reticuladas, acometem principalmente os membros inferi- (aCL) [imunoglobulina (Ig) M e IgG]; anticorpos anti-␤2 gli-
ores e em menor extensão as extremidades superiores e coproteína I; proteínas C e S; pesquisa de mutação do fator
o tronco.2---4 Nódulos não são característicos; entretanto, V de Leiden; mutação do gene da protrombina G20210A;
em alguns casos, indurações subcutâneas sutis têm sido e níveis séricos de antitrombina III, fatores VIII e IX, fibri-
observadas.3,5,6 Livedo racemoso pode aparecer isolada- nogênio, homocisteína e lipoproteína(a) [Lp(a)]. Estudos
mente ou junto com outros achados dermatológicos.5,7 As propedêuticos adicionais de ultrassonografia com Doppler
lesões seguem um curso indolente e não evoluem para de aorta abdominal, ilíacas e artérias renais foram feitos
doença sistêmica, embora haja relatos de ulceração cutâ- em três pacientes desta série (pacientes 4, 5 e 6); ultrasso-
nea, infartos testiculares e neuropatia.8---11 nografia com Doppler do sistema venoso, em dois pacientes
Ao exame histológico, a AML mostra um denso infil- (pacientes 5 e 6); e eletroneuromiografia, em um paciente
trado de células mononucleares na parede muscular das (paciente 6).
arteríolas da junção derme-subcutâneo, com estreitamento Para a revisão da literatura, em setembro de 2018 fize-
variável de seu lúmen por um típico anel hialinizado mos buscas nas bases de dados PubMed, Web of Science
de fibrina.12,13 Alguns autores preferem se referir a ela e Scopus com os termos ‘‘arterite macular linfocítica’’,
como ‘‘arterite trombofílica linfocítica’’ para enfatizar o ‘‘arterite macular’’ ou ‘‘arterite trombofílica linfocítica’’.
suposto mecanismo patogênico associado a essa entidade.7 Artigos relevantes foram identificados por inspeção manual
Na verdade, é questionável se a AML tem características das listas de referências. Dois investigadores avaliaram títu-
definidoras suficientes para ser considerada uma vasculite los e resumos de maneira independente para determinar
distinta da poliarterite nodosa cutânea (PAN-C), uma arte- o potencial de inclusão dos trabalhos. Ao todo, 34 arti-
rite necrotizante de vasos de médio calibre com infiltrado gos foram analisados. Após excluir um estudo com dados
predominantemente polimorfonuclear.14 incompletos, foram resumidos os resultados de 23 artigos
Nosso objetivo foi avaliar retrospectivamente uma série identificados como relato ou série de casos. Eles serão dis-
de pacientes com diagnóstico de AML, a fim de analisar suas cutidos posteriormente neste artigo.
características clínicas, histopatológicas e laboratoriais.

Resultados
Métodos
Todos os pacientes nesta série eram mulheres. Elas foram
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Faculdade classificadas de acordo com etnia/cor da pele. Seis eram
de Medicina, Universidade de São Paulo, e todos os partici- brancas e uma era negra. A idade variou de 9 a 46 anos,
pantes preencheram o termo de consentimento informado. com média ao diagnóstico de 26,71 (DP = 12,44). A duração
Foram incluídos sete pacientes diagnosticados com AML no da doença antes do diagnóstico variou de 6 a 96 meses,
Ambulatório de Vasculites da Divisão de Dermatologia entre com média de 34,42 (DP = 32,88). Hiperpigmentação reti-
fevereiro de 2005 e setembro de 2017. Os prontuários foram culada persistente foi encontrada em todas as pacientes,
revisados em busca de informações adicionais, como sexo, seguida por livedo racemoso (duas pacientes) e, em igual
etnia, idade no início da doença, sintomas associados e frequência, placas eritematosas e indurações subcutâneas
história médica prévia, inclusive eventos clínicos trombóti- sutis (uma paciente cada) (fig. 1). Não houve evidência de
cos. No momento do diagnóstico, duas biópsias de pele com ulceração, atrofia branca, nódulos ou púrpura palpável. As
profundidade suficiente para incluir o subcutâneo foram fei- pernas foram afetadas em todas as pacientes, enquanto os
tas em diferentes ocasiões para cada paciente, conforme braços e o tronco em uma paciente cada. As lesões se apre-
definido por protocolo institucional. Para este estudo, os sentaram simetricamente quando acometeram as pernas.
aspectos histológicos de cada caso foram revisados por dois Sintomas referidos no mesmo segmento corporal onde se
dermatopatologistas experientes. A propedêutica labora- encontravam as lesões cutâneas foram encontrados em três
torial consistiu de: hemograma completo, funções renal pacientes. Uma delas (paciente 6) queixou-se de parestesia
e hepática, velocidade de hemossedimentação, proteína e dor; por essa razão, uma eletroneuromiografia foi feita,

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34 Morita TCAB et al.

Figura 1 Apresentação clínica da arterite macular linfocítica nos membros inferiores. A, Múltiplas máculas lineares e por vezes
circulares, veias varicosas e uma cicatriz de biópsia na panturrilha direita; B, Máculas redondas e bem definidas distribuídas nos
membros; C, Máculas hipercrômicas bem definidas, algumas das quais levemente infiltradas à palpação e uma cicatriz de biópsia
na panturrilha esquerda; D, Máculas eritematosas em padrão reticulado associadas a livedo racemoso.

mas não apresentou alterações, enquanto uma ultrassono- apresentava também títulos positivos de FR 41,7 UI/mL
grafia do sistema venoso dos membros inferiores revelou (VR < 20 UI/mL) (paciente 1); A Lp(a) encontrava-se ele-
insuficiência venosa crônica devido a um refluxo primário vada em três pacientes 107, 75 e 50 mg/dL (VR < 30 mg/dL)
da safena magna na perna esquerda. Estudos de ultrasso- (pacientes 2, 4 e 6, respectivamente). O exame histoló-
nografia com Doppler da aorta abdominal, artérias ilíacas gico das biópsias de pele revelou achados similares em
e renais das pacientes 4, 5 e 6 resultaram normais, assim todos os espécimes: epiderme sem alterações dignas de
como uma ultrassonografia do sistema venoso dos membros nota; infiltrado linfocítico ao redor de pequenas artérias
inferiores da paciente 5. Nenhuma das pacientes tinha his- na derme reticular profunda e subcutâneo superficial e um
tória de trombose arterial ou venosa. Uma das pacientes anel hialinizado de fibrina na luz dos vasos em todos os sete
era ex-tabagista, diagnosticada e tratada para tuberculose casos, além de oclusão do lúmen vascular por trombo de
pulmonar quatro anos antes da admissão. Esfregaço para fibrina em duas pacientes (fig. 2). A composição muscular
baciloscopia do escarro e tomografia computadorizada do dos vasos de médio calibre foi mais bem visualizada com
tórax não mostraram sinais de doença ativa. Duas pacientes a coloração de resorcina-fucsina, que revelou uma lâmina
foram diagnosticadas com migrânea e foram acompanhadas elástica interna focalmente descontínua e interrompida em
pela equipe de neurologia do hospital. Dados demográficos, uma paciente. Neutrófilos não estavam presentes. Imuno-
achados histopatológicos, tratamento e duração do segui- fluorescência direta foi feita em três pacientes e apenas em
mento estão representados na tabela 1. uma revelou depósitos de C3 na parede de vasos dérmicos.
A avaliação laboratorial mostrou poucas alterações, Estudo de imuno-histoquímica com anticorpos anti-BCG foi
como baixa atividade de proteína S 28% (VR 55%-160%) conduzido em três pacientes e estava normal.
(paciente 3); FAN de 1:80 com padrão nuclear pontilhado O tratamento medicamentoso usado isolado ou em
fino e nível de fibrinogênio ligeiramente elevado 406 mg/dL combinação incluiu ácido acetilsalicílico em todas as sete
(VR 150-400 mg/dL) (paciente 5). Duas pacientes apresen- pacientes, além de pentoxifilina e hidroxicloroquina em
taram títulos significativamente positivos de anticorpos aCL uma paciente. O seguimento variou de 18-151 meses, com
IgM em testes repetidos (pacientes 1 e 3), uma das quais duração média de 79 meses. Durante esse período, nenhuma

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Seria a arterite macular linfocítica limitada à pele? Seguimento prolongado 35

Tabela 1 Dados epidemiológicos e características clínicas de sete pacientes diagnosticados com arterite macular linfocítica

Caso Sexo/ Etnia/cor História médica Morfologia Duração da Localização Sintomas Tratamento Seguimento
n◦ idade ao da pele prévia doença locais (meses)
início antes do
(anos) diagnóstico
(meses)
1 F/23 Branca Migrânea Máculas hiper- 96 MMII Artralgia AAS, HCQ 92
pigmentadas
2 F/25 Branca Máculas hiper- 60 MMII+T Nenhum AAS, HCQ 62
pigmentadas,
placas
eritematosas
3 F/9 Branca Migrânea Máculas hiper- 18 MMII Nenhum AAS 149
pigmentadas,
livedo racemoso
4 F/29 Branca Máculas hiper- 6 MMII+MMSS Nenhum AAS, PTX, 41
pigmentadas HCQ
5 F/17 Branca Máculas hiper- 12 MMII Dor AAS, PTX, 16
pigmentadas, HCQ
indurações
subcutâneas
sutis
6 F/46 Negra Ex-tabagista, Máculas hiper- 13 MMII Dor, AAS, PTX 41
tuberculose pigmentadas parestesia
pulmonar
7 F/38 Branca Máculas hiper- 36 MMII Nenhum AAS, PTX 146
pigmentadas,
livedo racemoso

AAS, ácido acetilsalicílico; F, feminino; HCQ, hidroxicloroquina; MMII, membros inferiores; MMSS, membros superiores; PTX, pentoxifilina;
T, tronco.

Figura 2 Exame histológico de biópsia de lesões compatíveis com arterite macular linfocítica nas pernas. A, Uma artéria cutânea
de pequeno calibre na derme profunda circundada e infiltrada por linfócitos (Hematoxilina & eosina, 200×); B, Estreitamento da luz
do vaso por espessamento subintimal (Hematoxilina & eosina, 100×); C, Presença de inflamação densa que envolve as paredes de
uma arteríola no subcutâneo superficial (Hematoxilina & eosina, 200×); D, Vaso hipodérmico com trombo organizado (Hematoxilina
& eosina, 200x).

03-fm1.pdf 41 30/03/20 12:57


36 Morita TCAB et al.

A B

Figura 3 Achados histológicos típicos da arterite macular linfocítica. A, Artéria dermo-hipodérmica circundada por infiltrado
linfocítico denso que permeia sua parede; B, Maior ampliação da vista do vaso anterior; C, Um anel hialino concêntrico é mostrado
(Hematoxilina & eosina, 400×).

paciente mostrou resolução das lesões, nem progrediu para Houve relatos isolados de casos associando AML à
vasculite sistêmica. infecção por vírus do HIV ou hepatite B, artrite reumatoide
e lúpus eritematoso discoide e a medicações como minoci-
clina e tabaco.6,12,15---18 Várias alterações laboratoriais têm
Discussão sido descritas, mas pela primeira vez descrevemos níveis
elevados de Lp(a) em três pacientes diagnosticados com
AML. A Lp(a) está envolvida na modulação da agregação
Os resultados do presente estudo estão de acordo com a
plaquetária, no recrutamento de células inflamatórias e
literatura revisada. A principal apresentação clínica da AML
na indução do remodelamento vascular.19 De modo similar,
ocorreu sob a forma de máculas hiperpigmentadas crônicas e
nosso grupo de estudos descobriu níveis elevados de Lp(a)
persistentes, embora outros achados dermatológicos, como
em pacientes com vasculopatia livedoide, uma vasculopatia
livedo racemoso, placas eritematosas e indurações subcu-
trombo-oclusiva de vasos dérmicos que usualmente se apre-
tâneas sutis, tenham sido detectados. Houve predileção
senta com púrpuras reticuladas recorrentes nas pernas e nos
pelas extremidades inferiores. No entanto, a frequência
pés, as quais, por sua vez, levam a lesões ulceradas e cica-
de sintomas reportados foi maior nesta série do que em
trizes estelares atróficas e de cor marfim, conhecidas como
relatos prévios. As características clínicas dos pacientes
atrofia branca.20
com AML já publicados na literatura, bem como seus acha-
Duas pacientes nesta série tinham história de migrâ-
dos laboratoriais, estão resumidos no material suplementar
nea com aura. Em casos semelhantes, é essencial excluir
(Apêndice A).

03-fm1.pdf 42 30/03/20 12:57


Seria a arterite macular linfocítica limitada à pele? Seguimento prolongado 37

Tabela 2 Aspectos clínicos e histológicos da arterite macular linfocítica e poliarterite nodosa cutânea

Arterite macular linfocítica Poliarterite nodosa cutânea


Aspectos Máculas hiperpigmentadas redondas, lineares ou Púrpuras palpáveis, nódulos subcutâneos
clínicos reticulares, e placas dolorosos, úlceras recorrentes e, raramente,
gangrena e necrose digital
Livedo racemoso Livedo racemoso
Lesões são assintomáticas, minimamente Envolvimento extracutâneo pode se manifestar
dolorosas ou pruriginosas como mialgia, neuropatia periférica e artralgia,
Sintomas sistêmicos (infartos testiculares e limitadas a mesma área em que se encontram as
neuropatias) têm sido descritos raramente lesões cutâneas, por vezes acompanhada de febre
e perda de peso
MMII > MMSS > tronco MMII > MMSS > tronco
Aspectos Infiltrado linfocítico na parede muscular de Vasculite leucocitoclástica que acomete as
histológicos pequenas artérias paredes de vasos de médio calibre e arteríolas dos
septos das porções superiores do tecido
subcutâneo
Neutrófilos são ausentes ou escassos
Necrose fibrinoide associada Necrose fibrinoide associada nas lesões ativas
Estreitamento variável do lúmen vascular por Tardiamente no processo da doença, o infiltrado é
deposição concêntrica de fibrina e proliferação predominantemente composto de linfócitos e
intimal histiócitos e a neoangiogênese se torna aparente
Ausência de disrupção da lâmina elástica interna Lâmina elástica fragmentada e descontínua
na maioria dos casos
Imunofluorescência direta negativa para depósitos Imunofluorescência direta pode fornecer
perivasculares ou em membrana basal de IgG, resultados positivos para IgM e C3, tanto
IgM, IgA e C3 isoladamente quanto de forma combinada
Prognóstico Curso crônico e benigno Curso crônico, progressão de poliarterite nodosa
cutânea para poliarterite nodosa generalizada
raramente ocorre

MMII, membros inferiores; MMSS, membros superiores.

a síndrome de Sneddon, uma vasculopatia trombótica não associado à doença.25,26 Apesar de uma de nossas pacien-
inflamatória caracterizada pela associação de livedo, que tes apresentar antecedente de uso de tabaco, desfavorece
acomete tronco e/ou glúteos, e eventos isquêmicos cere- esse diagnóstico a ausência de mudanças na coloração da
brovasculares, já que metade desses pacientes apresenta pele e na temperatura dos membros acometidos, ulcerações
tal padrão de cefaleia.21 Ambas apresentavam duas biópsias isquêmicas e gangrena.
de pele cada em diferentes ocasiões e seguimento supe- Enquanto isso, lesões agudas de PAN-C, a variante da
rior a cinco anos. Uma delas apresentou também títulos poliarterite nodosa limitada à pele, exibem vasculite necro-
positivos de anticorpos aCL de classe IgM em testes repe- tizante fibrinoide de artérias de pequeno e médio calibre
tidos com pelo menos 12 semanas de intervalo. Embora não localizadas na junção derme-subcutâneo com um infiltrado
tivesse história de trombocitopenia, eventos trombóticos predominantemente composto de células polimorfonuclea-
no passado ou manifestações obstétricas, procuramos des- res. Clinicamente, PAN-C se apresenta com maior frequência
cartar síndrome antifosfolípide. Classicamente, os achados como nódulos subcutâneos dolorosos e úlceras nos membros
histológicos nessa síndrome são de trombose sem evidência inferiores, geralmente em associação com livedo racemoso.
significativa de inflamação na parede vascular.22 Sintomas extracutâneos, como neuropatia periférica, mial-
Achados histológicos típicos foram vistos em todas as gia e artralgia, são limitados à mesma área em que estão
biópsias de pele feitas neste grupo (fig. 3), inclusive estu- situadas as lesões cutâneas.27---29 Características relevantes
dos de imunofluorescência direta negativos para depósitos de ambas AML e PAN-C estão apresentadas na tabela 2.
de IgM, IgG e IgA na membrana basal e em torno dos Diversos tratamentos para AML têm sido relatados com
vasos. Como relatado previamente e de maneira contrá- resultados variáveis. Esteroides tópicos já foram tentados
ria à descrição original, em alguns casos a coloração para sem melhoria clínica.15,24,30 Além disso, não houve resposta
tecidos elásticos revelou uma disrupção na lâmina elástica a baixas doses de aspirina, clopidogrel e varfarina. De fato,
interna.15,23,24 Um dos diagnósticos diferenciais histológicos em dois casos as lesões progrediram mesmo durante o uso
da AML é a doença de Buerger (tromboangeíte obliterante), da medicação. Até 80% de melhoria no aspecto das lesões
uma doença inflamatória segmentar não aterosclerótica que foi demostrado durante o uso de dapsona 100 mg/dia e
frequentemente afeta artérias de pequeno e médio calibre, resolução total após o uso de prednisona em baixas doses,
veias e nervos nas extremidades superiores e inferiores. His- metotrexato, bem como de colchicina, embora a duração do
tória atual ou prévia de tabagismo é imprescindível para seguimento relatada nesse último caso tenha sido de apenas
o diagnóstico, uma vez que se trata do principal agente oito meses.30---32 Os autores escolheram ácido acetilsalicílico

03-fm1.pdf 43 30/03/20 12:57


38 Morita TCAB et al.

e pentoxifilina como tratamento de primeira linha para a Apêndice. Material adicional


AML. Em quatro pacientes, a hidroxicloroquina foi acres-
centada por persistência dos sintomas ou por extensão das Pode consultar o material adicional para este artigo
lesões para segmentos além das pernas e elas se mantive- na sua versão eletrónica disponível em doi:10.1016/j.
ram estáveis. Não se observou regressão das lesões cutâneas abdp.2019.05.001.
maculares, nem surgimento de úlceras necróticas, dano neu-
rológico ou manifestações sistêmicas. Do conhecimento dos
autores, a duração do seguimento nesta série é a maior já Referências
relatada na literatura.
1. Fein H, Sheth AP, Mutasim DF. Cutaneous arteritis presenting
with hyperpigmented macules: macular arteritis. J Am Acad
Conclusões Dermatol. 2003;49:519---22.
2. Védie AL, Fauconneau A, Vergier B, Imbert E, De La Valussière G,
Este estudo descreve sete pacientes cuja apresentação Demay O, et al. Macular lymphocytic arteritis, a new cutaneous
clínica e histopatológica é compatível com AML. Dada a vasculitis. J Eur Acad Dermatol Venereol. 2016;30:542---4.
sobreposição de aspectos clínicos, existe um debate em 3. Garcia C, Dandurand M, Roger P, Joujoux JM, Meunier L, Stoeb-
ner PE. Macular lymphocytic arteritis: three cases questioning
curso se a AML poderia ou não ser considerada uma forma
its classification as primary lymphocytic vasculitis. Dermato-
precursora ou indolente de PAN-C. Levando em consideração logy. 2014;228:103---6.
a existência de uma já bem estudada transição de um 4. Kelly RI, Wee E, Tancharoen C, Tam MM, Balta S, Willi-
infiltrado predominantemente neutrofílico para um infil- ams RA. Three cases of lymphocytic thrombophilic arteritis
trado linfocítico nos estados subagudos e reparativos de presenting with an annular eruption. Australas J Dermatol.
PAN-C, assim como o fato de que alguns pacientes com 2018;59:e127---32.
AML podem exibir características histológicas intermediá- 5. Lee JS, Kossard S, McGrath MA. Lymphocytic thrombophilic arte-
rias, como necrose fibrinoide e disrupção da lâmina elástica ritis: a newly described medium-sized vessel arteritis of the
interna, os autores acreditam ser razoável considerá-las skin. Arch Dermatol. 2008;144:1175---82.
como pertencentes a um mesmo espectro de doença. 6. Kolivras A, Thompson C, Metz T, André J. Macular arteritis asso-
ciated with concurrent HIV and hepatitis B infections: a case
Propõe-se que a AML possa representar uma resposta imune
report and evidence for a disease spectrum association with
menos agressiva ao componente arterial dos vasos de médio cutaneous polyarteritis nodosa. J Cutan Pathol. 2015;42:416---9.
calibre, a qual é insuficiente para provocar ulcerações, cica- 7. Gupta S, Mar A, Dowling JP, Cowen P. Lymphocytic thrombophilic
trizes ou sintomas inconvenientes na maioria das vezes. arteritis presenting as localized livedo racemosa. Australas J
Ao longo do tempo, mais pesquisas sobre sua etiopatogê- Dermatol. 2011;52:52---5.
nese podem elucidar se de fato existe alguma relação entre 8. Morruzzi C, Cribier B, Lipsker D. Artérite maculeuse. Ann Der-
ambas. matol Venereol. 2010;137:460---3.
9. Llamas-Velasco M, García-Martín P, Sánchez-Pérez J, Sotomayor
E, Fraga J, García-Diez A. Macular lymphocytic arteritis: first cli-
Suporte financeiro nical presentation with ulcers. J Cutan Pathol. 2013;40:424---7.
10. Shen S, Williams RA, Kelly RI. Neuropathy in a patient with
lymphocytic thrombophilic arteritis. Australas J Dermatol.
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11. Wee E, Nikpour M, Balta S, Williams RA, Kelly RI. Lymphocytic
thrombophilic arteritis complicated by systemic involvement.
Contribuição dos autores Australas J Dermatol. 2018;59:223---5.
12. Saleh Z, Mutasim DF. Macular lymphocytic arteritis: a unique
Thamara Cristiane Alves Batista Morita: Análise estatís- benign cutaneous arteritis, mediated by lymphocytes and appe-
tica; aprovação da versão final do manuscrito; elaboração aring as macules. J Cutan Pathol. 2009;36:1269---74.
e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação 13. Buckthal-McCuin J, Mutasim DF. Macular arteritis mimicking
dos dados; participação intelectual em conduta propedêu- pigmented purpuric dermatosis in a 6-year-old caucasian girl.
Pediatr Dermatol. 2009;26:93---5.
tica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da
14. Valverde R, Garrido C, Leis V, Ruiz-Bravo E. Arteritis macu-
literatura; revisão crítica do manuscrito. lar: ¿en el espectro de la poliarteritis nudosa cutánea? Actas
Gabriela Franco Sturzeneker Trés: Aprovação da versão Dermosifiliogr. 2013;104:263---5.
final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; 15. Munehiro A, Yoneda K, Koura A, Nakai K, Kubota Y. Macular
participação intelectual em conduta propedêutica e/ou lymphocytic arteritis in a patient with rheumatoid arthritis. Eur
terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura. J Dermatology. 2012;22:427---8.
Paulo Ricardo Criado: Aprovação da versão final 16. Kassardjian M, Horowitz D, Shitabata PK, Clark LE. Lymphocytic
do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; thrombophilic arteritis induced by minocycline. J Clin Aesthet
participação efetiva na orientação da pesquisa; participação Dermatol. 2012;5:38---43.
intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de 17. Tan CWX, Koh MJA. Lymphocytic Thrombophilic Arteritis:
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casos estudados; revisão crítica do manuscrito.
2017;34:e160---3.
18. Sadahira C, Yoshida T, Matsuoka Y, Takai I, Noda M, Kubota Y.
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03-fm1.pdf 44 30/03/20 12:57


Seria a arterite macular linfocítica limitada à pele? Seguimento prolongado 39

20. Criado PR, Espinell DPS, Barreto P, Di Giacomo TH, Sotto MN. 27. Nakamura T, Kanazawa N, Ikeda T, Yamamoto Y, Nakabayashi
Lipoprotein(a) and livedoid vasculopathy: A new thrombophilic K, Ozaki S, et al. Cutaneous polyarteritis nodosa: revisi-
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03-fm1.pdf 45 30/03/20 12:57


An Bras Dermatol. 2020;95(1):40---45

Anais Brasileiros de
Dermatologia
www.anaisdedermatologia.org.br

INVESTIGAÇÃO

Avaliação da razão entre monócitos e lipoproteínas de


alta densidade, linfócitos, monócitos e plaquetas na
psoríase夽,夽夽
a,∗ b b
Ezgi Aktaş Karabay , Damla Demir e Aslı Aksu Çerman

a
Departamento de Dermatologia e Venereologia, Faculty of Medicine, Bahçeşehir University, Istambul, Turquia
b
Departamento de Dermatologia e Venereologia, Sisli Hamidiye Etfal Training and Research Hospital, Health Sciences University,
Istambul, Turquia

Recebido em 12 de junho de 2018; aceito em 13 de maio de 2019


Disponível na Internet em 17 de fevereiro de 2020

Resumo
PALAVRAS-CHAVE Fundamentos: A psoríase é uma doença dermatológica inflamatória crônica, mediada imunolo-
Linfócito; gicamente, associada a comorbidades cardiovasculares.
Lipoproteína C de Objetivo: Avaliar a proteína C-reativa (PCR), a razão monócitos/lipoproteínas de alta den-
alta densidade; sidade (RMLAD), a razão neutrófilos/linfócitos (RNL), a razão plaquetas/linfócitos (RPL) e a
Monócito; razão monócitos/linfócitos (RML) como marcadores inflamatórios em pacientes com psoríase e
Plaquetas; procurar uma relação entre esses parâmetros e a gravidade da psoríase, conforme definido pelo
Psoríase Índice de Área e Gravidade da Psoríase (PASI, do inglês Psoriasis Area and Severit Index).
Métodos: O estudo retrospectivo incluiu 94 pacientes com psoríase e 118 controles saudáveis,
pareados por idade e sexo. Os valores de PCR, RMLAD, RNL, RPL e RML dos dois grupos foram
avaliados retrospectivamente.
Resultados: Diferenças estatisticamente significativas foram observadas quanto a PCR, RMLAD,
RNL e RML entre os grupos de pacientes e controles (p = 0,001, p = 0,003, p = 0,038 e p = 0,007,
respectivamente). Foram observadas correlações positivas entre o escore PASI e os valores
de PCR, RMLAD, RNL, RPL e RML (r = 0,381, p = 0,001; r = 0,203, p = 0,045; r = 0,268, p = 0,009;
r = 0,374, p = 0,001; r = 0,294, p = 0,004; respectivamente).
Limitações do estudo: O pequeno tamanho da amostra e o desenho retrospectivo do estudo são
limitações.

DOI referente ao artigo:


https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.05.002
夽 Como citar este artigo: Aktaş Karabay E, Demir D, Aksu Çerman A. Evaluation of monocyte to high-density lipoprotein ratio, lymphocytes,

monocytes and platelets in psoriasis. An Bras Dermatol. 2020;95:40---5.


夽夽 Trabalho realizado no Departamento de Dermatologia e Venereologia, Faculdade de Medicina, Bahçeşehir University, Istambul, Turquia.
∗ Autor para correspondência.

E-mail: ezgiaktasmd@gmail.com (E. Aktaş Karabay).

2666-2752/© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma licença
CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

03-fm1.pdf 46 30/03/20 12:57


Avaliação da razão entre monócitos e lipoproteínas de alta densidade, linfócitos 41

Conclusão: Níveis elevados de PCR, RMLAD, RNL e RML foram significativamente associados à
psoríase. A correlação positiva observada entre a PCR e a RMLAD leva à sugestão de que a
RMLAD possa ser um parâmetro confiável na psoríase durante o acompanhamento. A relação
entre a doença e os parâmetros inflamatórios pode levar à detecção precoce de morbidades
cardiovasculares em pacientes com psoríase.
© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um
artigo Open Access sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

Introdução outra doença inflamatória sistêmica, entre voluntários da


equipe do hospital. Indivíduos com histórico de qualquer
A psoríase, uma doença dermatológica crônica, é caracteri- terapia tópica ou sistêmica para psoríase foram excluídos
zada pela infiltração de células imunes (p.ex., leucócitos do estudo. Apenas aqueles com índice de massa corporal
mononucleares e neutrófilos) na pele, bem como pela normal (IMC; 18,5-25 kg/m2 ) foram incluídos. Os indiví-
proliferação anormal de queratinócitos.1 Sabe-se que a duos no grupo controle tiveram achados normais no exame
psoríase está associada a maior risco de doenças cardiovas- físico e nenhum apresentava DCV ou doença em nenhum
culares (DCV), por compartilharem vias inflamatórias.2 outro sistema de órgãos. Foram excluídos indivíduos com
Os níveis de proteína C-reativa (PCR), um conhecido histórico documentado de qualquer outra doença sistê-
biomarcador de inflamação, apontados como elevados mica, inclusive doença coronariana, infarto do miocárdio,
em pacientes com psoríase, indicaram comorbidades hipertensão, hiperlipidemia, acidente vascular cerebral,
cardiovasculares.3 Foi demonstrado que a razão entre a doença vascular periférica, doença pulmonar obstrutiva
contagem de monócitos e a lipoproteína de alta densi- crônica, doença renal, insuficiência hepática ou evidência
dade (RMLAD) é um marcador inflamatório e um novo fator clínica/bioquímica de doença inflamatória concomitante ou
preditivo e prognóstico para DCV.4 Além disso, a razão neu- qualquer doença autoimune. Indivíduos em qualquer tipo de
trófilos/linfócitos (RNL), a razão neutrófilos/linfócitos (RPL) tratamento foram excluídos. Indivíduos fumantes e/ou com
e a razão monócitos/linfócitos (RML) foram apontadas como hábito de consumo de álcool também foram excluídos.
indicadores de inflamação sistêmica e mau prognóstico em O estudo foi aprovado pelo comitê de ética local e todos
uma variedade de doenças, como câncer, DCV e doenças os participantes assinaram um termo de consentimento livre
inflamatórias autoimunes.5---7 Entretanto, esses novos bio- e esclarecido. O estudo foi feito em consonância com os
marcadores não foram bem investigados na psoríase. princípios expressos na Declaração de Helsinque.
Vários biomarcadores foram estudados em amostras de Os dados demográficos iniciais, as características clíni-
sangue periférico de pacientes com psoríase para encontrar cas e os resultados dos exames de sangue foram obtidos
um marcador sérico adequado para avaliar a gravidade da retrospectivamente nos prontuários dos pacientes. Níveis
doença. O Índice de Área e Gravidade da Psoríase (PASI) é de lipoproteína de alta densidade (HDL-C, do inglês High
uma ferramenta de pontuação usada para avaliar a gravi- Density Lipoprotein), hemograma completo e PCR foram
dade da psoríase,8 mas pode apresentar variações de acordo medidos em todos os indivíduos com amostras de sangue
com o médico. Portanto, seria benéfico encontrar um bio- venoso em jejum. As amostras de sangue venoso foram cole-
marcador clínico objetivo, barato e de fácil acesso para a tadas dos participantes entre as 9h e as 11h, após um período
psoríase. No entanto, ainda não foram estabelecidos bio- de jejum de 12 horas para avaliar hemograma, HDL-C e PCR.
marcadores bem aceitos para essa doença. Os níveis de RMLAD, RNL, RPL e RML dos participantes tam-
Tanto quanto é do conhecimento dos autores, não exis- bém foram registrados.
tem dados atuais sobre os valores de RMLAD ou RML em As medições dos níveis séricos de PCR foram feitas
pacientes com psoríase e poucos estudos avaliaram os valo- com um sistema espectrofotométrico (Cobas c 501; Roche
res de RNL e RPL em pacientes com psoríase.6,9---12 Portanto, Diagnostics --- Mannheim, Alemanha). Os hemogramas
para entender melhor esses parâmetros inflamatórios séri- foram avaliados por um sistema de autoanalisador (Sysmex
cos na psoríase e avaliar a associação com a atividade da XE-2100; Roche Diagnostics --- Mannheim, Alemanha). As
doença, foi feito um estudo retrospectivo para avaliar PCR, concentrações de HDL foram medidas com um sistema
RMLAD, RNL, RPL e RML em pacientes com psoríase. enzimático (Cobas c 701; Roche Diagnostics --- Mannheim,
Alemanha).
A psoríase foi classificada de acordo com o PASI, cal-
Métodos culado no momento da coleta de sangue por um único
dermatologista.8 Os pacientes com psoríase foram divididos
O estudo incluiu 94 pacientes diagnosticados com psoríase em dois grupos de acordo com os escores PASI: leve (≤ 10) e
em placas na fase crônica por exame clínico ou histopa- moderado-grave (> 10). Os níveis de RMLAD, RNL, RPL, RML
tológico, recrutados no ambulatório de dermatologia. Para e PCR dos pacientes com psoríase foram comparados com os
comparação, foram recrutados 118 controles saudáveis, dos controles; as comparações intragrupos foram feitas de
pareados por idade e sexo, sem evidência de psoríase ou acordo com a gravidade da doença.

03-fm1.pdf 47 30/03/20 12:57


42 Aktaş Karabay E et al.

Análise estatística Quando os pacientes com psoríase foram avaliados de


acordo com a gravidade da doença, os valores de PCR,
Foi feita com o programa Number Cruncher Statistical Sys- RMLAD, RNL, RPL e RML foram significativamente maiores
tem 2007 (NCSS; Kaysville --- Utah, Estados Unidos). Os naqueles com psoríase moderada a grave do que em paci-
dados foram expressos com média ± desvio-padrão, mediana entes com psoríase leve e controles saudáveis (p = 0,001,
(primeiro quartil, terceiro quartil), contagem e porcenta- p = 0,003, p = 0,024, p = 0,019 e p = 0,002, respectivamente;
gens. Na análise de variáveis normalmente distribuídas, o tabela 2).
teste t de Student para amostras independentes foi apli- Foram observadas correlações positivas entre o escore
cado para avaliar as diferenças entre dois grupos. Nas PASI e os valores de PCR, RMLAD, RNL, RPL e RML (r = 0,381,
variáveis não normalmente distribuídas, as diferenças entre p = 0,001; r = 0,203, p = 0,045; r = 0,268, p = 0,009; r = 0,374,
dois grupos independentes foram examinadas pelo teste U p = 0,001; r = 0,294, p = 0,004; respectivamente).
de Mann-Whitney. O teste Anova unidirecional, com testes Observou-se uma correlação positiva entre os valores de
post-hoc de Bonferroni corrigidos, foi usado para compa- PCR e RMLAD (r = 0,273, p = 0,001). Os valores de MHR e
rar variáveis normalmente distribuídas entre três ou mais NLR apresentaram correlação positiva entre os valores de
grupos. O teste de Kruskal-Wallis, com os testes post hoc PCR e RMLAD (r = 0,163, p = 0,018), enquanto uma correlação
de Dunn-Bonferroni, foi usado para comparar variáveis não negativa foi observada entre os valores de RMLAD e RPL
normalmente distribuídas entre três ou mais grupos. O teste (r = − 0,161, p = 0,019). Foi observada correlação positiva
qui-quadrado de Pearson foi usado para comparar variáveis entre os valores de RNL e RPL (r = 0,461, p = 0,001). Nenhuma
categóricas. A associação entre variáveis foi avaliada pelo outra relação estatisticamente significativa foi observada
coeficiente de correlação de postos de Spearman. Um valor- entre os parâmetros (entre PCR e RNL, p = 0,243; PCR e RPL,
-p < 0,05 foi considerado estatisticamente significativo. p = 0,116).
Não foram encontradas correlações entre os valores de
PCR, RMLAD, RNL, RPL e RML e duração da doença (p = 0,164,
Resultados
p = 0,056, p = 0,190, p = 0,584, p = 0,091, respectivamente).
O estudo incluiu 94 pacientes com psoríase e 118 con-
troles saudáveis. O grupo psoríase foi composto por Discussão
50 pacientes com doença leve e 44 pacientes com doença
moderada a grave. Não foram observadas diferenças signi- Neste estudo, foram observados níveis elevados de PCR,
ficativas na proporção de sexo ou idade entre os pacientes RMLAD, RNL e RML e uma correlação positiva entre a gra-
com psoríase e controles saudáveis (p = 0,393, p = 0,222, res- vidade da doença e os valores de PCR, RMLAD, RNL, RPL
pectivamente). Todos os participantes estavam dentro dos e RML. Curiosamente, a PCR, um conhecido biomarcador
limites normais de IMC. O valor mediano (primeiro quartil, de inflamação, só foi correlacionada com a RMLAD. A pso-
terceiro quartil) da duração da doença foi de 120 (72-180) ríase é uma doença dermatológica inflamatória crônica,
meses entre os pacientes com psoríase. Os escores do PASI mediada imunologicamente, associada a comorbidades car-
dos pacientes variaram de 0,6 a 32,4, com uma mediana diovasculares. Muitas células inflamatórias e citocinas estão
(primeiro quartil, terceiro quartil) de 9,65 (4,9 ± 15,4). envolvidas na patogênese da doença.1,2 Fator de necrose
Uma diferença estatisticamente significativa nos níveis tumoral (TNF)-␣, interferon (IFN)-␣, IFN-g, interleucina (IL)-
de PCR foi observada entre os grupos de pacientes e de 1␤, IL-6, IL-12, IL-17A, IL-17F, IL-22 e IL- 23 de várias células
controle: 3,3 (3---5) vs. 3 (1,37---3,44), p = 0,001, respecti- imunes, principalmente as células T auxiliares tipo 1 (Th1)
vamente. Também foi observada diferença estatisticamente e tipo 17 (Th17), também contribuem para a fisiopatologia
significante em termos de RMLAD, RNL e RML entre os grupos da psoríase, bem como queratinócitos, outras células T e
de pacientes e de controles (p = 0,003, p = 0,038 e p = 0,007, células dendríticas.13 Avaliações histológicas de lesões pso-
respectivamente). Não foi observada diferença estatistica- riásicas observaram infiltração de linfócitos T e neutrófilos
mente significativa nos valores de RPL entre os dois grupos em lesões psoriásicas.6 Além disso, alguns relatos demons-
(p = 0,865). A tabela 1 apresenta as características clínicas traram aumento da contagem de neutrófilos, monócitos e
do grupo de estudo. linfócitos no sangue periférico de pacientes com psoríase.13

Tabela 1 Características demográficas e valores dos parâmetros inflamatórios dos pacientes e controles

Psoríase (n = 94) Controles (n = 118) p


Idade (anos) 38,28 ± 12,48 36,21 ± 11,98 0,222
PCR 3,3 (3---5) 3 (1,37---3,44) 0,001
RMLAD 0,011 (0,007, 0,016) 0,009 (0,006---0,012) 0,003
RNL 1,96 (1,65, 2,34) 1,77 (1,31---2,43) 0,038
RPL 106,94 (90---141,91) 110,79 (90,61---141,5) 0,865
RML 0,23 (0,18---0,29) 0,2 (0,15---0,25) 0,007

Teste t de Student para amostras independentes, descrito como média ± DP.


Teste U de Mann-Whitney, descrito como mediana (primeiro quartil, terceiro quartil).
PCR, proteína C reativa; RMLAD, razão monócitos/lipoproteínas de alta densidade; RML, razão monócitos/linfócitos; RNL, razão neutró-
filos/linfócitos; RPL, razão plaquetas/linfócitos.

03-fm1.pdf 48 30/03/20 12:57


Avaliação da razão entre monócitos e lipoproteínas de alta densidade, linfócitos 43

Tabela 2 Parâmetros inflamatórios de acordo com a gravidade da psoríase

Psoríase leve Psoríase moderada-grave Controles (n = 118) p


(PASI ≤ 10) (PASI > 10) (n = 44)
(n = 50)
Idade (anos) 38,28 ± 12,48 37,36 ± 10,99 36,21 ± 11,98 0,378
PCR 3 (2,87---4,17)a 3,5 (3,3---5)b 3 (1,37---3,44)a 0,001
RMLAD 0,01 (0,01---0,01)a 0,01 (0,01---0,02)b 0,01 (0,01---0,01)a 0,003
RNL 1,94 (1,59---2,18) 2,02 (1,69---2,86)b 1,77 (1,31---2,43)a 0,024
RPL 101,71 (85,15---119,06)a 125,22 (99,34---159,6)b 110,79 (90,61---141,5) 0,019
RML 0,22 (0,17---0,26) 0,27 (0,19---0,35)b 0,2 (0,15---0,25)a 0,002
a Teste Anova unidirecional, com testes post hoc de Bonferroni corrigidos, descritos como média ± DP.
b Teste de Kruskal-Wallis, com testes post hoc de Dunn-Bonferroni, descritos como mediana (primeiro quartil, terceiro quartil).
a,b Letras iguais não apresentaram diferença no teste de Dunn, considerando-se um nível de significância de 5%.

PCR, proteína C reativa; RMLAD, razão monócitos/lipoproteínas de alta densidade; RNL, razão neutrófilos/linfócitos; RPL, razão plaque-
tas/linfócitos; RML, razão monócitos/linfócitos.

Também foi demonstrado que as plaquetas desempenham Posteriormente, os macrófagos diferenciados dos monócitos
um papel nas reações inflamatórias imunológicas.14 ingerem LDL-C oxidado, causam assim o surgimento das célu-
Recentemente, estudos observaram uma associação las espumosas iniciais.22 No entanto, as moléculas de HDL-C
entre psoríase e indicadores de DCV subclínica, como removem resíduos de colesterol dos macrófagos. Pelas
maior espessura da íntima-média da artéria carótida, maior interações com monócitos, as moléculas de HDL-C apresen-
calcificação da artéria coronária, maior rigidez arterial e tam efeitos anti-inflamatórios e antioxidantes.23 Portanto,
disfunção endotelial.15 Além disso, foi sugerido que a melho- foi sugerido que o aumento dos monócitos e a diminuição
ria na gravidade da psoríase está relacionada a reduções do HDL-C estão relacionados à inflamação. Recentemente,
na inflamação vascular.16 Aterosclerose, o processo pato- demonstrou-se que a RMLAD é um marcador inflamatório e
lógico subjacente às doenças cardiovasculares, e psoríase um novo fator preditivo e prognóstico para DCV.4,21 Kanbay
compartilham características patogênicas comuns, inclusive et al.24 demonstraram que a RMLAD mais alta está associ-
processos imunológicos locais e sistêmicos, perfis inflamató- ada a um mau prognóstico cardiovascular na doença renal
rios de citocinas/quimiocinas e marcadores inflamatórios.2 e a RMLAD foi relatada como preditora de fibrilação atrial
As principais causas relatadas de morbimortalidade de paci- após ablação por cateter em outro estudo.6 Açıkgöz et al.23
entes com psoríase foram eventos cardiovasculares,15 o que relataram que a RMLAD está associada à disfunção endo-
torna ainda mais importante encontrar uma ferramenta telial na doença de Behçet (DB) e sugeriram que essa razão
apropriada para avaliar o risco cardiovascular em pacientes pode ser usada como marcador de inflamação, bem como um
com psoríase. preditor precoce de comprometimento vascular em pacien-
A PCR, uma proteína de fase aguda, é produzida sob tes com DB. Alguns estudos relataram valores mais altos de
a influência de citocinas como IL-6 e TNF-␣. Foi relatado HDL-C em pacientes com psoríase.25 No entanto, nenhum
que a concentração elevada de PCR está relacionada ao estudo até o momento investigou a RMLAD em pacientes
aumento do risco de DCV.17 Em vários estudos, um nível com psoríase. O presente estudo observou uma maior RMLAD
mais alto de PCR foi demonstrado na psoríase, como uma em pacientes com psoríase em comparação com os contro-
condição inflamatória.3 Coimbra et al.18 evidenciaram uma les; uma correlação positiva foi observada entre a RMLAD e
correlação positiva entre PCR e PASI e sugeriram que níveis o escore PASI. Além disso, a correlação positiva observada
elevados de PCR podem ser um preditor de futuras DCV. entre a PCR e a RMLAD leva à sugestão de que a RMLAD possa
Outros estudos não observaram uma correlação significativa ser um marcador de inflamação sistêmica na psoríase.
entre PCR e PASI.19 No presente estudo, os níveis de PCR RNL, RPL e RML foram identificados como indicadores de
também foram mais altos em pacientes com psoríase e inflamação sistêmica e mau prognóstico em várias doenças,
associaram-se ao escore PASI. como câncer, DCV e doenças inflamatórias autoimunes.5---7
Pacientes com psoríase podem apresentar fatores de Essas proporções são mais estáveis do que o hemograma e
risco para DCV, inclusive diminuição dos níveis de HDL-C, são menos afetadas por condições que alteram esse exame.6
que podem estar relacionados à gravidade da psoríase.20 Foi Anteriormente, RNL, RPL e RML foram estudados em
demonstrado que o HDL-C suprime os efeitos pró-oxidantes diabetes mellitus, síndrome coronariana aguda, colite
e pró-inflamatórios dos monócitos. O HDL-C também inibe ulcerativa, doença renal terminal, tuberculose, artrite reu-
a proliferação e diferenciação de células progenitoras de matoide, cirrose, inflamação sistêmica, febre familiar do
monócitos, resulta em uma redução na atividade desses.21 Mediterrâneo e em alguns tipos de câncer para determinar
Os monócitos desempenham um papel importante na pro- prognósticos.7,26---28
gressão da aterosclerose por meio da interação com o Alguns estudos avaliaram RNL e RPL em pacientes com
endotélio ativado, o que resulta na superexpressão de psoríase, apresentaram resultados variados. A literatura
citocinas inflamatórias, inclusive o ligante quimiotático da relata níveis de RNL previamente aumentados em pacientes
proteína 1 dos monócitos, a molécula de adesão celu- com psoríase9---12 e alguns relatos mostraram uma correlação
lar vascular 1 e a molécula de adesão intercelular 1. positiva entre PASI e RNL,9,10 o que é consistente com os

03-fm1.pdf 49 30/03/20 12:57


44 Aktaş Karabay E et al.

achados do presente estudo. No entanto, no estudo feito Conclusão


por Ataseven et al.11 não foi observada associação entre RNL
e o escore PASI. No presente estudo, a RNL foi elevada na A psoríase é uma doença inflamatória sistêmica associ-
psoríase e associada aos escores do PASI. ada a morbidades cardiovasculares. Nos últimos anos, os
Foi relatada uma associação entre aumento da ativação pesquisadores investigaram biomarcadores laboratoriais em
plaquetária e aterosclerose14 ; alguns estudos demonstra- pacientes com psoríase, além do exame clínico pelo PASI.
ram uma elevação significativa da RPL em pacientes com Várias citocinas e mediadores, cuja análise é dispendi-
psoríase.12 Kim et al.9 observaram uma relação significativa osa e demorada, foram determinados na psoríase. Tanto
entre o escore PASI e a RPL, enquanto os valores da RPL quanto é do conhecimento dos autores, este é o primeiro
não apresentaram diferenças estatisticamente significativas estudo que avaliou PCR, RMLAD, RNL, RPL e RML em con-
entre os pacientes com psoríase e os controles. Da mesma junto em pacientes com psoríase. No presente estudo,
maneira, o presente estudo não encontrou diferença signi- PCR, RMLAD, RNL e RML estavam elevados e estavam cor-
ficativa nos valores de RPL entre pacientes com psoríase e relacionados com o PASI. Pode-se supor que, dentre as
controles, mas foi observada uma correlação positiva entre diferentes razões estudadas, a RMLAD possa ser a mais
RPL e PASI. importante, pois é o único marcador correlacionado com a
Atualmente, a RML tem sido apontada como um indicador PCR, o que pode ser devido às muitas funções do HDL-C,
de inflamação sistêmica e um marcador de gravidade de mui- inclusive antioxidante, anti-inflamatória, antiapoptótica e
tas doenças, como DB, câncer e espondiloartrite axial.29,30 antitrombótica.31 Acredita-se que RMLAD, RNL e RML, facil-
Na literatura, não foram observados estudos que avaliassem mente acessíveis na prática diária, possam ser usadas para
a RML em pacientes com psoríase. Entretanto, o presente avaliar a gravidade da psoríase em conjunto com o PASI.
estudo encontrou níveis mais altos de RML em pacientes Esses parâmetros também podem levar à detecção pre-
com psoríase do que em controles e uma correlação positiva coce de comorbidades cardiovasculares em pacientes com
entre RML e PASI. psoríase.
Os diferentes resultados nos parâmetros relatados na
literatura podem ser devidos ao pequeno número de sujei-
tos incluídos nos estudos ou a outros fatores dos pacientes,
Suporte financeiro
como o tipo de psoríase e o método de seleção dos pacientes.
Fatores relacionados à genética, estilo de vida, atividades Nenhum.
diárias e questões alimentares também podem ter contri-
buído para esses achados diferentes. Contribuição dos autores
No presente estudo, PCR, RMLAD, RNL e RML foram maio-
res em pacientes com psoríase do que nos controles. Todos os Ezgi Aktaş Karabay: Análise estatística; aprovação da ver-
parâmetros estudados (PCR, RMLAD, RNL, RPL e RML) esta- são final do manuscrito; concepção e planejamento do
vam positivamente correlacionados com os escores do PASI, estudo; composição do manuscrito; concepção, análise e
o que leva à sugestão de que esses parâmetros possam ser interpretação dos dados; participação efetiva na orientação
usados durante o acompanhamento da psoríase. Além disso, da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêu-
apenas a RMLAD apresentou correlação positiva com a PCR. tica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da
Como a PCR é um marcador bem aceito de inflamação, pode- literatura.
-se sugerir que, entre os parâmetros estudados, a RMLAD Damla Demir: Aprovação da versão final do manuscrito;
tende a ser mais confiável na indicação do estado inflama- concepção, análise e interpretação dos dados; participação
tório da psoríase. efetiva na orientação da pesquisa.
Além de indicar inflamação atual, a PCR, a RNL e a RPL Aslı Aksu Çerman: Aprovação da versão final do manus-
foram reduzidas após o tratamento da psoríase com agentes crito; revisão crítica do manuscrito.
biológicos, o que está relacionado à inibição da inflamação
sistêmica.6 Com base nesses dados, pode-se supor que esses
Conflitos de interesse
parâmetros não apenas confirmem a inflamação atual, mas
também sejam uma maneira de avaliar o efeito do trata-
mento da psoríase. Nenhum.
Como PCR, RMLAD, RNL, RPL e RML foram definidos como
marcadores prognósticos de DCV, valores elevados desses Referências
parâmetros podem atuar como um alerta na detecção e
prevenção de comorbidades cardiovasculares. 1. Dumoutier L, Louahed J, Renauld JC. Cloning and characteri-
O pequeno tamanho da amostra e o desenho retros- zation of IL-10-related T cell-derived inducible factor (IL-TIF),
pectivo são limitações do presente estudo. Os diferentes a novel cytokine structurally related to IL-10 and inducible by
resultados relatados na literatura podem ser devidos à natu- IL-9. J Immunol. 2000;164:1814---9.
2. Lockshin B, Balagula Y, Merola JF. Interleukin-17, inflammation,
reza subjetiva da avaliação com PASI e ao fato de que os
and cardiovascular risk in patients with psoriasis. J Am Acad
estudos podem ter incluído diferentes formas de psoríase.
Dermatol. 2018;79:345---52.
Apesar do pequeno tamanho amostral deste estudo, os auto- 3. Kanelleas A, Liapi C, Katoulis A, Stavropoulos P, Avgerinou G,
res acreditam que a análise estatística revela conclusões Georgala S, et al. The role of inflammatory markers in asses-
importantes. sing disease severity and response to treatment in patients

03-fm1.pdf 50 30/03/20 12:57


Avaliação da razão entre monócitos e lipoproteínas de alta densidade, linfócitos 45

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Austria.

03-fm1.pdf 51 30/03/20 12:57


An Bras Dermatol. 2020;95(1):46---51

Anais Brasileiros de
Dermatologia
www.anaisdedermatologia.org.br

INVESTIGAÇÃO

Padronização de cultura organoide para avaliação da


melanogênese induzida por UVB, UVA e luz visível夽,夽夽
Thainá Oliveira Felicio Olivatti a , Giovana Piteri Alcantara b ,
Ana Cláudia Cavalcante Espósito Lemos c , Márcia Guimarães da Silva d

e Hélio Amante Miot b,∗

a
Faculdade de Medicina de Botucatu, Universidade Estadual Paulista, Botucatu, SP, Brasil
b
Departamento de Dermatologia e Radioterapia, Faculdade de Medicina de Botucatu, Universidade Estadual Paulista, Botucatu,
SP, Brasil
c
Programa de Pós-Graduação em Patologia, Departamento de Dermatologia e Radioterapia, Faculdade de Medicina de Botucatu,
Universidade Estadual Paulista, Botucatu, SP, Brasil
d
Departamento de Patologia, Faculdade de Medicina de Botucatu, Universidade Estadual Paulista, Botucatu, SP, Brasil

Recebido em 9 de abril de 2019; aceito em 13 de junho de 2019


Disponível na Internet em 17 de fevereiro de 2020

Resumo
PALAVRAS-CHAVE
Fundamentos: Culturas organoides são cultivos primários que mantêm características arqui-
Fotobiologia; teturais, relações entre as células e matriz extracelular. São opções para investigação
Melanose; fisiopatológica ou terapêutica, comparados aos ensaios animais e in vitro.
Organoides Objetivo: Desenvolvimento de modelo de cultura organoide cutânea, com vistas ao estudo da
melanogênese induzida por radiações.
Método: Estudo de validação, que envolveu biópsias da pele retroauricular de adultos. Uma
amostra foi irradiada com diferentes doses de UVB, UVA ou luz visível e a outra, mantida ao
abrigo da luz por 72 horas. A viabilidade dos tecidos foi avaliada a partir de parâmetros mor-
fológicos e arquiteturais da histologia e a expressão do gene GAPDH, por PCR em tempo real.
A pigmentação melânica induzida pelas radiações foi padronizada em função das doses de cada
radiação e avaliada por análise de imagem digital (Fontana-Masson).
Resultados: Padronizou-se a cultura primária de pele em temperatura ambiente, com meio
DMEM. As doses de UVB, UVA e LV (luz azul) que induziram melanogênese diferencial foram:

DOI referente ao artigo:


https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.06.005
夽 Como citar este artigo: Olivatti TOF, Alcantara GP, Lemos ACCE, Silva MG, Miot HA. Standardization of organoid culture for evaluation of

melanogenesis induced by UVB, UVA and visible light. An Bras Dermatol. 2020;95:46---51.
夽夽 Trabalho realizado no Departamento de Dermatologia, Faculdade de Medicina de Botucatu, Universidade Estadual Paulista, Botucatu,

SP, Brasil.
∗ Autor para correspondência.

E-mail: heliomiot@fmb.unesp.br (H.A. Miot).

2666-2752/© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma licença
CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

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Padronização de cultura organoide para avaliação da melanogênese induzida por UVB, UVA e luz visível 47

166 mJ/cm2 , 1,524 J/cm2 e 40 J/cm2 . A expressão do gene constitucional GAPHD não diferiu
entre a amostra de pele processada imediatamente após a coleta do tecido e a amostra cultivada
por 72 horas no protocolo padronizado.
Limitações do estudo: Estudo preliminar que avaliou apenas a viabilidade e integridade do
sistema melanogênico e o efeito das radiações isoladamente.
Conclusões: O modelo padronizado manteve viável a função melanocítica por 72 horas sob
temperatura ambiente, tornou possível a investigação da melanogênese induzida por diferentes
radiações.
© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um
artigo Open Access sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

Introdução As culturas organoides são cultivos teciduais primários


que mantêm as características arquiteturais e as principais
A investigação fisiopatológica e de respostas terapêuticas de relações entre os diferentes tipos celulares, além da matriz
certas dermatoses, in anima nobile, pode ser limitada por extracelular.10---12 Apresentam a vantagem adicional de poder
elementos ligados à toxicidade de tratamentos, necessidade ser amostrados a partir da pele sã e da pele com doença do
de diferentes grupos comparativos, aspectos ligados à ade- mesmo hospedeiro, favorecem a comparação ex vivo entre
são em ensaios terapêuticos, além da incerteza quanto à res- os locais.13,14 A pele é um tecido relativamente viável à cul-
posta biológica de uma intervenção (p.ex., carcinogênese). tura organoide, com descrição de manutenção funcional por
A experimentação animal aumenta a extensão de possibi- mais de sete dias à temperatura ambiente.12,15---19
lidades de pesquisa pelo menor custo, maior acessibilidade A melanogênese é um processo complexo, que depende
aos sujeitos e maior controle de exposição e influência principalmente da ação da radiação ultravioleta (UVA e
ambiental.1 Entretanto, as respostas fisiológicas dos animais UVB) sobre a unidade epidermo-melânica, com importante
podem não se assemelhar aos humanos (p.ex., melanogê- regulação parácrina, mas que também sofre interferência
nese), o que pode levar a conclusões equivocadas.2 Além de elementos da derme.20,21 A luz visível (LV) foi descrita
disso, uma série de doenças cutâneas não tem modelos como promotora de melanogênese em fototipos elevados e a
animais (p.ex., melasma), leva à necessidade de outros pro- fração mais biologicamente ativa da LV na pele compreende
cessos investigativos. a faixa azul-violeta (400-500 nm).22
As simulações computacionais de fenômenos biológicos Neste estudo, objetivamos o desenvolvimento de um
são uma opção à experimentação com seres vivos e fornecem modelo de cultura organoide a partir de um fragmento de
resultados bastante verossímeis quando simulam interações pele com vistas ao estudo da melanogênese induzida por
entre variáveis amplamente conhecidas do ponto de vista diferentes radiações.
experimental. Infelizmente, as variáveis que interferem em
processos cutâneos (p.ex., melanogênese) ainda não são Métodos
completamente elucidadas, assim como sua interação com
os demais elementos externos.3 O projeto foi aprovado no comitê de ética em pesquisa da
Culturas celulares humanas primárias ou de linhagens instituição (n◦ 2.700.889) e todos os participantes preenche-
comerciais (p.ex., HaCaT) são amplamente usadas em pes- ram o termo de consentimento antes da inclusão no estudo.
quisa fisiopatológica ou de resposta a estímulos específicos. Foram incluídos 10 voluntários adultos (> 18 anos) aten-
Apesar da homologia com os tecidos humanos, as culturas didos no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de
de linhagens celulares não contemplam a interação entre Botucatu (SP), que se submeteram a biópsias da região retro-
os diferentes tipos celulares que interagem na pele (p.ex., auricular com punch de 3 mm, sob anestesia local (lidocaína
unidade epidermo-melânica).4 2%), após antissepsia com clorexidina alcoólico (2%) e campo
Sistemas comerciais de culturas celulares múltiplas estéril. Os fragmentos foram seccionados no nível da derme
(p.ex., pele 3D: queratinócitos, melanócitos e fibroblas- profunda para evitar grande quantidade de adipócitos que
tos) são propagados como uma solução para perceber a interferem na completa submersão do fragmento no meio
interação entre as células da pele e são mais propensos de cultura.
a estar relacionados à estrutura tecidual do hospedeiro.5---7 Os fragmentos cilíndricos foram divididos longitudi-
Entretanto, as linhagens são usualmente de doadores dife- nalmente em duas partes (semicilindros) equivalentes e
rentes, com padrões de reprodução algo diverso do que armazenadas em meio específico DMEM (Dulbecco’s Modified
se encontra no tecido; também não apresentam endoté- Eagle’s medium, Sigma Inc, UK),23 em frasco plástico trans-
lio, células dendríticas, células de Merkel, que, mesmo parente estéril, segundo protocolo estabelecido por Ayres,
pouco numerosas no tecido, podem oferecer alguma para cultura organoide (padronização de viabilidade) em
interação relevante, depende do fenômeno estudado. Além temperatura ambiente (20 ◦ C), para posterior dosimetria das
disso, até o momento, culturas 3D e coculturas celu- radiações para melanogênese.24 Um fragmento foi irradiado
lares comerciais de pele ainda não caracterizam certas (imediatamente após a coleta) e o outro, mantido ao abrigo
doenças.7---9 da luz por 72 horas.

03-fm1.pdf 53 30/03/20 12:57


48 Olivatti TOF et al.

Os fragmentos foram irradiados com doses crescentes a 1,5 ␮L do conjunto de primers. A amplificação foi feita
de UVA, UVB e LV a partir de fontes artificiais de UVB em um equipamento ABI7300 (Applied Biosystems, Carlsbad,
(230 ␮W/cm2 ; fonte FS72T12/UVB/HO), UVA (1270 ␮W/cm2 ; CA, USA) com parâmetros padronizados pelo fabricante. Os
fonte Phillips TL 100 W/10R) e luz LED (110 mW/cm2 dados foram processados pelo SDS Software System 7300 e
na faixa azul-violeta; fonte GBRLUX 200W), com distân- os resultados expressos como ciclo limiar (Ct) para determi-
cia padronizada de 10 cm. As radiações foram iniciadas nar a expressão do cDNA do GAPHD a partir do número de
como 166 mJ/cm2 , 1,270 J/cm2 e 40 J/cm2 e acrescidos ciclos necessários para atingir o limite de detecção do sinal
20% de radiação cada amostra consecutiva, até identificar fluorescente, que foi predefinido entre 0,2 e 0,3.
pigmentação diferencial. Foi determinada a absorbância da A pigmentação melânica induzida pelas radiações foi
parede dos frascos plásticos para cada radiação. Um volume padronizada em função das doses de cada radiação em
de 10 mL do meio de cultura foi estabelecido para garantir função do aumento de mais de 10% da pigmentação da
a submersão do fragmento. camada basal, avaliada por análise de imagem digital das
A viabilidade dos tecidos foi avaliada a partir de parâ- lâminas coradas pelo Fontana-Masson.25 A padronização foi
metros morfológicos e arquiteturais da histologia (H&E) concluída quando esses critérios fossem atingidos e repro-
e a expressão quantitativa do gene constitucional GAPDH duzidos.
(glyceraldehyde-3-phosphate dehydrogenase) nas peles
recém-coletadas, versus as cultivadas em 72 horas, por PCR
em tempo real. O gene GAPHD codifica uma proteína ele- Resultados
mentar para a execução de funções celulares básicas (p.ex.,
metabolismo energético), usada comumente como controle Padronizou-se a cultura primária de pele em temperatura
positivo em reações de PCR em tempo real, e representa a ambiente com meio DMEM. As doses de UVB, UVA e LV que
manutenção das funções metabólicas basais da célula. induziram melanogênese diferencial foram: 166 mJ/cm2 ,
A quantificação do PCR em tempo real foi feita a partir da 1,524 J/cm2 e 40 J/cm2 (componente luz azul-violeta). A
amplificação do gene-alvo GAPDH por primer e sonda valida- absorbância dos frascos plásticos foi de cerca de 50% para
dos TaqMan. Alíquotas do cDNA (3 ␮L) extraído das amostras todas as radiações.
cutâneas foram submetidas à reação do PCR com o sistema A melanogênese da camada basal pôde ser percebida
TaqMan. Cada reação usou 15 ␮L do TaqMan Gene Expres- pela coloração de Fontana-Masson após 72 horas de cultura
sion Master mix (Life Technologies, Carlsbad, CA, USA) e 1,0 (figs. 1-3).

A B

50 µm 50 µm

Figura 1 Corte histológico de cultura organoide (72 horas) de pele retroauricular (Fontana-Masson, 400×). A, Cultura não irradi-
ada; B, cultura irradiada com 166 mJ/cm2 de UVB.

A B

50 µm 50 µm

Figura 2 Corte histológico de cultura organoide (72 horas) de pele retroauricular (Fontana-Masson, 400×). A, Cultura não irradi-
ada; B, cultura irradiada com 1,524 J/cm2 de UVA.

03-fm1.pdf 54 30/03/20 12:57


Padronização de cultura organoide para avaliação da melanogênese induzida por UVB, UVA e luz visível 49

A B

50 µm 50 µm

Figura 3 Corte histológico de cultura organoide (72 horas) de pele retroauricular (Fontana-Masson, 400×). A, Cultura não irradi-
ada; B, cultura irradiada com 40 J/cm2 de luz visível (azul-violeta 400-500 nm).

Delta Rn vs cycle
1.0e+002

1.0e+001

1.0e+000
Delta Rn

1.0e-001

1.0e-002

1.0e-003

1.0e-004
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40

Número de ciclo

Figura 4 Expressão gênica de culturas organoides (72 horas) de pele retroauricular. Curvas obtidas a partir de amostras ampli-
ficadas por PCR em tempo real para o gene endógeno GAPDH, cujos números de ciclo de amplificação dos limiares (Ct) foram
calculados.

No protocolo validado não foram observados destaca- Culturas organoides cutâneas que usam meios ar-líquido
mentos epidérmicos, picnose ou necrose de queratinócitos. são mais empregadas no estudo da queratinização, enquanto
Uma das culturas apresentou contaminação após 72 horas e culturas em suspensão (como a usada neste estudo) permi-
foi descartada, total de nove pacientes para a padronização. tem melhor perfusão e viabilidade.12
A expressão do gene constitucional GAPHD foi equiva- Fragmentos de menor dimensão (p.ex., 2 mm2 ) tendem
lente entre a amostra de pele processada imediatamente a apresentar maior viabilidade e preservação arquitetural,
após a coleta do tecido e a amostra cultivada por 72 horas devido à embebição mais homogênea pelo meio de cultura e
no protocolo padronizado (fig. 4). distribuição de oxigênio ao tecido.19,26 Em nosso estudo, os
fragmentos de 3 mm foram seccionados ao meio, com ade-
Discussão quada preservação da função. Um dos fragmentos que foi
inadvertidamente cultivado sem a secção longitudinal apre-
sentou evidente picnose nuclear no centro da peça (caso não
O presente estudo valida uma opção reprodutível de baixo
incluído no estudo, dados não mostrados).
custo para cultura organoide da pele para o estudo da
Modernos meios de conservação e transporte de tecidos
melanogênese. O modelo padronizado manteve viável a
fornecem subsídio para a formação de bancos de pele e
função melanocítica por 72 horas sob temperatura ambi-
também ao desenvolvimento de culturas organoides para
ente, permite a investigação da melanogênese induzida por
a padronização de experimentos.28---31 O emprego de soro
diferentes radiações. Abundância tecidual da pele, fácil
bovino aumenta o potencial de viabilidade das culturas,
acessibilidade à coleta de material, manutenção arquite-
porém compromete a arquitetura do tecido em função do
tural e funcional incentivam o uso de culturas cutâneas
tempo.12 O cultivo em temperatura corporal (37 ◦ C) também
organoides na pesquisa dermatológica.6,15,18,25,26
aumenta a viabilidade do tecido, assim como sua taxa meta-
Culturas de melanócitos são usadas para estudo de ini-
bólica, potencializa a exploração de fenômenos oxidativos
bidores da melanogênese. Entretanto, em monoculturas,
e mitogênicos como os envolvidos na carcinogênese.
melanócitos irradiados sintetizam mais feomelanina do que
Culturas organoides são mantidas fora da interação com
eumelanina, que depende da interação com queratinócitos.
o organismo, sem estímulos térmicos, neurológicos, hormo-
A investigação de fenômenos ligados à eumelanogênese é
nais, imunitários e sofrem hipóxia, o que penitencia suas
favorecida, portanto, por modelos organoides que mante-
propriedades teciduais em função do tempo.12,32 Os desafios
nham a influência de diferentes grupos celulares.24,27

03-fm1.pdf 55 30/03/20 12:57


50 Olivatti TOF et al.

e estímulos aos fragmentos devem ser impostos precoce- não mostrados). Isso pode ser relevante porque estudos
mente a fim de preservar as respostas de maneira mais clássicos de pigmentação, como o de Mahmoud et al.,
verossímil. empregaram fontes de LV que emitiam 0,19% de UVA e
A melanogênese da camada basal oriunda do estímulo 1,5% de infravermelho; assim como fontes de UVA1, que
precoce pôde ser percebida de maneira evidente no modelo apresentavam 0,12% de UVA2 e 0,0001% de UVB.34 O efeito
proposto. A análise digital da melanogênese basal aumenta da heterogeneidade das radiações nos grupos dificulta sua
a sensibilidade da percepção do fenômeno. Curvas de comparação com resultados de fontes homogêneas.
dose-resposta para cada tipo de radiação (isoladas ou em
combinação) devem ser exploradas posteriormente, assim Conclusão
como a resposta melanogênica no melasma.
Uma limitação adicional ao uso de fragmentos de pele Foi padronizado um modelo de cultura organoide para
total para estudos genômicos acontece pela heterogenei- avaliação da melanogênese induzida por UVB, UVA e LV.
dade das células presentes na amostra e o aumento da
expressão de um gene não pode ser atribuído a um único tipo Suporte financeiro
celular. Para isso, culturas primárias de células, single-cell,
ou técnicas de microdissecção a laser podem ser usadas.33
Fundo de Apoio à Dermatologia de São Paulo (Funader-SP).
Culturas organoides cutâneas são mais disponíveis e
de menor custo que culturas 3D, apresentam maior
complexidade arquitetural, contemplam a totalidade de
Contribuição dos autores
células residentes (p.ex., endotélio, nervos, mastócitos)
e matriz extracelular, podem representar mais adequa- Thainá Oliveira Felicio Olivatti: Aprovação da versão final do
damente diferenças topográficas, permitem de maneira manuscrito; concepção, análise e interpretação dos dados;
semelhante manipulação genética e metabólica, assim como participação intelectual em conduta propedêutica e/ou
o isolamento celular, e podem ser oriundas primariamente terapêutica de casos estudados.
da dermatose, com possibilidade de comparação com a pele Giovana Piteri Alcantara: Aprovação da versão final
normal do mesmo indivíduo. Por outro lado, apresentam do manuscrito; concepção e planejamento do estudo;
cinética menos previsível e não podem ser constituídas a concepção, análise e interpretação dos dados; participação
partir de engenharia genética (p.ex., CRISPR, knock-out efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica da litera-
genes). Ambas as formas de cultura têm limitação experi- tura.
mental em função do tempo e não mantêm o microbioma Ana Cláudia Cavalcante Espósito Lemos: Aprovação da
cutâneo.12 Essas características devem ser ponderadas na versão final do manuscrito; concepção e planejamento do
escolha de modelos experimentais, que devem ser adequa- estudo; composição do manuscrito; participação efetiva na
damente padronizados e validados para cada intervenção. orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta
A irradiação da luz solar, ao meio dia, no interior do propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão
Brasil (latitude: 22◦ 53’09‘‘S; longitude: 48◦ 26’42’’W; alti- crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
tude: 804 m; dia 09-dez-2018), foi de 0,5 mW/cm2 (UVB), Márcia Guimarães da Silva: Composição do manuscrito;
1,7 mW/cm2 (UVA) e 0,2 W/cm2 (luz azul-violeta). Isso leva concepção, análise e interpretação dos dados; participação
à hipótese de que menos de 15 minutos de exposição solar efetiva na orientação da pesquisa.
desprotegida potencialmente induziriam a pigmentação da Hélio Amante Miot: Aprovação da versão final do manus-
camada basal, guardadas as limitações da comparação com crito; concepção e planejamento do estudo; composição do
as radiações independentes, enquanto o efeito das radiações manuscrito; concepção, análise e interpretação dos dados;
combinadas, ou com diferentes regimes de fotoproteção, participação efetiva na orientação da pesquisa; participação
podem apresentar comportamentos diferentes. intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de
Estudos experimentais in vivo resultaram em pigmen- casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica
tação cutânea efetiva a partir de 40 J/cm2 em indivíduos do manuscrito.
melanodérmicos (Fitzpatrick IV e V), mas não em fototipos
claros. Já a pigmentação por UVA1 (340-400 nm) pôde Conflitos de interesse
ser percebida a partir de 5 J/cm2 em participantes com
fototipos mais escuros.34 Nenhum.
Radiações solares representam um continuum de
frequências eletromagnéticas que interagem com os tecidos
Referências
biológicos e promovem estímulos diversos.35 Por razões de
sistematização, os efeitos biológicos das radiações são estu-
1. Olson H, Betton G, Robinson D, Thomas K, Monro A, Kolaja G,
dados a partir de comprimentos de onda separados, porém
et al. Concordance of the toxicity of pharmaceuticals in humans
há certa interação entre eles.36 No caso da pigmentação and in animals. Regul Toxicol Pharmacol. 2000;32:56---67.
cutânea, a LV promove maior intensidade e persistência à 2. Bastonini E, Kovacs D, Picardo M. Skin Pigmentation and Pig-
pigmentação induzida pelo UVA1.22,37 mentary Disorders: Focus on Epidermal/Dermal Cross-Talk. Ann
As fontes de UVA, UVB e LV deste estudo promoveram Dermatol. 2016;28:279---89.
irradiações independentes, já que não apresentaram leitu- 3. Handel AC, Miot LD, Miot HA. Melasma: a clinical and epidemi-
ras significativas dos outros comprimentos de onda (dados ological review. An Bras Dermatol. 2014;89:771---82.

03-fm1.pdf 56 30/03/20 12:57


Padronização de cultura organoide para avaliação da melanogênese induzida por UVB, UVA e luz visível 51

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An Bras Dermatol. 2020;95(1):52---56

Anais Brasileiros de
Dermatologia
www.anaisdedermatologia.org.br

INVESTIGAÇÃO

Incapacidades na hanseníase: análise retrospectiva


aberta de registros institucionais夽,夽夽
a,∗ a b
Santoshdev P. Rathod , Ashish Jagati e Pooja Chowdhary

a
Departamento de Dermatologia, Smt. NHL Municipal Medical College, Hospital V. S., Ahmedabad, Gujarat, Índia
b
Twachha Skin Clinic, Ahmedabad, Gujarat, Índia

Recebido em 18 de dezembro de 2018; aceito em 22 de julho de 2019


Disponível na Internet em 17 de fevereiro de 2020

Resumo
PALAVRAS-CHAVE Fundamentos e objetivos: A hanseníase continua a ser uma das principais causas de neuropatia
Estatísticas sobre periférica e incapacidades no mundo inteiro. O objetivo principal do estudo foi determinar
sequelas e a incidência de deformidades presentes no momento do diagnóstico e o surgimento de novas
incapacidades; deformidades ao longo do período de acompanhamento.
Estigma social; Material e métodos: Um estudo de coorte aberto e retrospectivo foi feito em um centro médico
Hanseníase terciário no oeste da Índia. A fase de recrutamento do estudo foi de dois anos (2009-2010),
seguida de uma fase de observação/acompanhamento de sete anos, encerrada em 31 de dezem-
bro de 2017. Foram incluídos no estudo novos pacientes com hanseníase e deformidade definida
pelo grau de incapacidade da OMS (1998), que já haviam concluído o tratamento e que desen-
volveram novas deformidades durante o período de acompanhamento de até sete anos.
Resultados: O estudo incluiu 200 pacientes com hanseníase. De 254 deformidades, 168 (66,14%)
foram observadas no momento do diagnóstico e 20 (7,87%) surgiram durante a fase de acom-
panhamento. De todos os pacientes, 21,25% apresentaram deformidade de grau 1 e 6,31%
apresentaram deformidade de grau 2 ou mais grave. As deformidades da mão foram as mais
comuns (44,48%), seguidas pelas dos pés (39,76%) e da face (15,74%), respectivamente.
Limitação do estudo: O modo de inclusão dos pacientes foi autorreferido durante a fase de
acompanhamento. Portanto, é possível que as incapacidades tenham sido sub-relatadas.
Conclusão: Novas deformidades continuam a se desenvolver em certas formas de hanseníase,
mesmo após o fim do tratamento. É necessário acompanhamento regular de longo prazo dos
pacientes após o fim do tratamento.
© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um
artigo Open Access sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

DOI referente ao artigo:


https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.07.001
夽 Como citar este artigo: Rathod SP, Jagati A, Chowdhary P. Disabilities in leprosy: an open, retrospective analyses of institutional records.

An Bras Dermatol. 2020;95:52---6.


夽夽 Estudo realizado na Skin OPD, New Civil Hospital, Ahmedbad, Gujarat, Índia.
∗ Autor para correspondência.

E-mail: santosh rathod85@yahoo.com (S.P. Rathod).


2666-2752/© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma licença
CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

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Incapacidades na hanseníase: análise retrospectiva aberta de registros institucionais 53

Introdução Critérios de inclusão

Entre as doenças transmissíveis, a hanseníase continua a ser Os pacientes que apresentavam incapacidades e defor-
uma das principais causas de neuropatia periférica e incapa- midades de acordo com a definição da OMS foram
cidades no mundo inteiro, apesar dos extensos esforços para incluídos no estudo. A fase de recrutamento do estudo
reduzir o número de casos da doença. A ampla implantação foi de dois anos (2009-2010), seguida da fase de
da poliquimioterapia (PQT) tem sido bem-sucedida em curar observação/acompanhamento de sete anos, encerrada em
e reduzir a prevalência da hanseníase no mundo inteiro, 31 de dezembro de 2017. Pacientes que subsequentemente
inclusive na Índia.1 Em 1◦ de abril de 2017, a prevalência desenvolveram novas deformidades durante o período de
de hanseníase na Índia foi de 0,66/10.000. A prevalência acompanhamento de até sete anos foram incluídos no
global de hanseníase foi de 192.713 casos (0,25/10.000 habi- estudo. Durante a fase de acompanhamento, os pacientes
tantes) no fim de 2017, um aumento de 20.765 casos em que completaram o tratamento anti-hanseníase durante a
relação aos valores de 2016.2 Nos últimos anos, sob o pro- fase de recrutamento continuaram a ser acompanhados por
grama de controle da hanseníase, foi dada maior atenção à sete anos. Nenhum outro paciente foi adicionado à coorte do
prevenção das incapacidades. O foco atual das autoridades estudo. Para inclusão, considerou-se a incapacidade autor-
sanitárias e dos governos no mundo inteiro está no combate referida pelos pacientes, seguida de avaliação clínica da
ao estigma da hanseníase. Um dos principais fatores respon- deformidade. No presente estudo, o desfecho analisado
sáveis pela estigmatização dos pacientes com hanseníase são foi incapacidade física expressa por diferentes indicadores,
as deformidades visíveis. como número de casos novos detectados e a ocorrên-
Incapacidade é um termo amplo que abrange qualquer cia de deformidades de grau 1 e grau 2. A avaliação da
comprometimento, limitação de atividade ou restrição de presença e gravidade da deformidade foi feita no momento
participação que afete um indivíduo. Na hanseníase, a inca- da apresentação para diagnóstico e tratamento da hanse-
pacidade física é definida pela Organização Mundial da níase e durante as visitas de acompanhamento.
Saúde (OMS) em três graus:3 grau 0 - ausência de incapaci-
dade (sem anestesia) e nenhum dano visível ou deformidade Critérios de exclusão
nos olhos, mãos e pés; grau 1 - perda de sensibilidade
protetora nos olhos, mãos ou pés, mas nenhum dano ou Pacientes com deformidades traumáticas devido a aciden-
deformidade visível; e grau 2 - presença de deformida- tes de trânsito foram excluídos do estudo. O estudo foi
des ou danos visíveis aos olhos (lagoftalmia e/ou ectrópio, feito como parte de um protocolo de tese submetido à uni-
triquíase, opacidade da córnea, acuidade visual menor do versidade. Foi obtido consentimento para uso de registros
que 0,1 ou dificuldade de contar os dedos a 6 metros), danos médicos e fotografias clínicas de todos os pacientes.
visíveis nas mãos ou pés (mão com ulcerações e/ou trauma,
reabsorção, mão em garra, mão caída, úlceras; pés com
lesões tróficas e/ou traumáticas, reabsorção, pé em garra,
Resultados
pé caído, úlceras, contratura do tornozelo).4
A avaliação da incapacidade é uma medida muito rele- Dos 200 pacientes incluídos no estudo, 134 (67%) eram
vante no controle da hanseníase. No entanto, no sistema de do sexo masculino e 66 (33%) do feminino. A hanseníase
saúde indiano, apenas o grau 2 (OMS) é registrado, enquanto lepromatosa foi o tipo mais comum no presente estudo,
a avaliação do grau 1 é negligenciada, embora seja mais observada em 61 pacientes (30,5%), seguida pela tuber-
importante em termos de prevenção de incapacidades. Por- culoide em 54 (27%), lepromatosa dimorfa em 42 (21%),
tanto, o diagnóstico oportuno da incapacidade de grau 1 é tuberculoide dimorfa em 29 (14,5%), neural pura em seis
urgentemente necessário para limitar e abrandar as inca- (3%), dimorfa/intermediária em um (0,5%) e indeterminada
pacidades. A busca por fatores associados definitivamente em um (0,5%). A proporção de casos multibacilares (MB) foi
ajudará a reduzir o sofrimento de muitos pacientes com han- de 67% em comparação com 33% de casos paucibacilares
seníase. Com esse objetivo, o presente estudo transversal (PB).
foi feito. O comprometimento nervoso foi avaliado no momento
de inclusão no protocolo e em cada visita subsequente. A
avaliação da função dos nervos foi feita por exame sensorial
com monofilamentos de Semmes Weinstein (SW), palpação
dos nervos e avaliação da função motora pelo sistema de
Material e métodos
classificação do Medical Research Council (MRC). O compro-
metimento da função nervosa é a principal razão para o
Este foi um estudo de coorte aberto e retrospectivo, feito desenvolvimento da incapacidade; portanto, é importante
em um centro médico terciário no oeste da Índia. saber a extensão, o tipo e o local do comprometimento. O
nervo ulnar no membro superior foi o nervo mais comumente
comprometido em 83,5% dos pacientes, com comprometi-
mento simétrico em 121 (60,5%) e assimétrico em 46 (23%),
População do estudo seguido pelo nervo tibial anterior em 152 (76%), nervo poplí-
teo lateral em 106 (53%), grande nervo auricular em 34 (17%)
Pacientes com hanseníase que apresentavam incapacidades e nervo supraclavicular em sete (3,5%) (tabela 1).
e deformidades no momento do diagnóstico e aqueles que as Na avaliação da incapacidade pelo sistema de
desenvolveram durante os sete anos de acompanhamento. classificação da OMS, 152 (76%) pacientes não

03-fm1.pdf 59 30/03/20 12:57


54 Rathod SP et al.

Tabela 1 Comprometimento dos nervos Tabela 3 Deformidades funcionais e anatômi-


cas/morfológicas no presente estudo
Nervo Simétrico Assimétrico
Deformidades funcionais
Ulnar 121(60,5%) 46 (23%)
Úlceras tróficas 18
Nervo tibial anterior 92 (60,52%) 60 (39,48%)
Membro superior 32
Poplíteo lateral 70 (35%) 36 (18%)
Membro inferior 17
Auricular maior 26 (13%) 8 (4%)
Mão em garra 01
Supraclavicular 6 (3%) 1 (0,5%)
Pulso caído 02
Outros 4 (2%) 5 (2,5%)
Pé caído 18
Supraorbital 2 (1%) 2(1%)
Total 70
Deformidades anatômicas/morfológicas
Fácies leonina 14
Tabela 2 Grau de deformidades no presente estudo Flacidez 04
Nariz em sela 03
Grau % de Número de pacientes
Madarose 06
deformidades afetados por
Deformidades oculares 03
funcionais deformidades
Megaglóbulos da orelha 13
totais (do total de 200
Reabsorção de dígitos 06
participantes
Total 46
do estudo)
Deformidade 22 17% (n = 34)
grau 1
Mãos 16 Discussão
Pés 16
Face; 21,25% (n = 54) Depois de atingir a meta nacional de eliminação, o foco dos
Deformidade 08 7% (n = 14) cuidados com a hanseníase agora tem mudado, deixou de
grau simplesmente fornecer tratamento para os pacientes afe-
Mãos 04 tados e passou a lidar com as consequências da doença e
Pés 04 principalmente a prevenção das incapacidades.5 Os achados
Face; 6,31% (n = 16) do presente estudo mostraram que a proporção de pacien-
Total 27,56% (n = 70) tes com hanseníase com incapacidade era bastante alta:
de todas as 21,54% apresentavam deficiência grau 1 e 6,31%, grau 2.
deficiências Estudos anteriores de Sarkar et al.5 na Índia e Schreuder
et al.6 na Tailândia evidenciaram prevalência semelhante
de incapacidade grau 1 e grau 2. Na Índia, para avaliar a
eficácia do programa, apenas a incapacidade de grau 2 é
apresentavam comprometimento visível, enquanto 32 registrada; entretanto, para a prevenção de incapacidade,
(21,25%) apresentavam deformidades de grau 1 ou superior a avaliação de grau 1 é mais importante, uma vez que, antes
e 16 (6,31%) apresentavam deformidades graves de grau 2 do surgimento de uma deformidade visível (grau 2), ocorre
ou superior. Dessas deformidades, 113 (44,48%) acometeram o comprometimento da função nervosa (sensorial, motor ou
as mãos, 101 (39,76%) os pés e 40 (15,74%) a face. Isso ambos), ou seja, os pacientes com grau 2 devem ter pas-
sugere que mãos e pés são mais comumente afetados por sado pelo grau 1. Portanto, ao examinar qualquer caso de
deformidades devido a traumas repetitivos causados por hanseníase, após o exame de lesões de pele, um exame
tarefas laborais e domésticas (tabela 2). neurológico completo dos nervos periféricos é essencial.
As deformidades na hanseníase podem ser subdivididas A Estratégia Global para Hanseníase 2016-2020 estabele-
em funcional e anatômica/morfológica. A deformidade fun- ceu as seguintes metas: 1) Eliminação da deformidade de
cional mais comum foi a úlcera trófica da mão ou pé, grau 2 entre os pacientes pediátricos com hanseníase; 2)
observada em 54 (29,34%) pacientes, seguida pela mão em Redução de novos casos de hanseníase com deformidade de
garra em 21 (11,41%), pé caído em dois (1,1%) e punho caído grau 2 a menos de um caso por milhão de habitantes; 3)
em um (0,54%). Entre as deformidades morfológicas, foram Nenhum país terá leis que permitam a discriminação por
observadas fácies leonina em 14 (7,60%), deformidades auri- hanseníase.7 Verificou-se que deformidades e incapacidades
culares em 13 (7,06%), reabsorção de dígitos em seis (3,20%), visíveis contribuem proeminentemente para o desenvolvi-
madarose em seis (3,20%), flacidez em quatro (2,17%), nariz mento do estigma em pessoas afetadas pela hanseníase8 , ao
em sela em três (1,63%) e deformidades oculares em três mesmo tempo em que também desencadeiam o desenvolvi-
pacientes (1,63%; tabela 3). mento de atitudes negativas em relação à hanseníase entre
Das 254 deformidades, 168 (66,14%) foram observadas pessoas não afetadas.9 O número de casos com deformidade
no momento do diagnóstico, 20 (7,87%) surgiram enquanto de grau 2 no momento do diagnóstico reflete diretamente
o paciente estava em tratamento anti-hanseníase com PQT o atraso na detecção dos casos e a falta de conhecimento
por um ano e (21,25%) surgiram durante o período de sobre a hanseníase na comunidade, a baixa capacidade do
acompanhamento em pacientes que haviam concluído o sistema de saúde de diagnosticar a hanseníase precoce-
tratamento. mente e, em certa medida, o alcance dos serviços. Um dos

03-fm1.pdf 60 30/03/20 12:57


Incapacidades na hanseníase: análise retrospectiva aberta de registros institucionais 55

alvos da Estratégia Global para a Hanseníase é a eliminação No presente estudo, 21,25% das deformidades foram
de novos casos de crianças com deformidade de grau 2. Esse observadas em pacientes após o fim do tratamento e, por-
indicador foi relatado por 120 países, dos quais 88 relataram tanto, detectadas durante o período de acompanhamento;
zero caso e 27 relataram entre um e dez casos. Cinco paí- esse achado se deve principalmente a danos contínuos
ses relataram mais casos: Etiópia, Moçambique, República nos nervos, mesmo após o término da PQT. Existe uma
Democrática do Congo, Indonésia e Brasil.2 necessidade urgente de indicadores clínicos e sorológicos
No presente estudo, observou-se uma maior proporção indicativos de lesões nos nervos e para determinar o propó-
de casos de MB (67%) em comparação com os casos de PB sito final da terapêutica. Danos aos nervos estão associados
(33%). Nos últimos anos, essa tendência crescente da razão à incapacidade secundária.16,17 A duração da PQT é conside-
MB/PB foi observada na Índia10 e em outros países. As razões rada o único critério para a cura da doença, admite-se que 12
para esse aumento podem ser as recentes campanhas agres- meses de tratamento serão suficientes para induzir uma cura
sivas de busca de casos em países com grande número de bacteriológica.18 No entanto, o dano neurológico que causa
casos de hanseníase.11 A maior proporção de hanseníase MB as deficiências e deformidades também é observado após
é, por si só, um fator de risco para o desenvolvimento de a conclusão do tratamento. O comprometimento piorou em
incapacidades, conforme sugerido nos estudos de Schreuder 21,25% de todos os pacientes nos 10 anos após o fim do trata-
(PB?11%, MB?33%),6 De Oliveira et al.(PB?12%, MB?37%)12 e mento. Um estudo semelhante feito por Sales et al. indicou
Richardus (PB?9,8%, MB?37,6%).13 que, no fim do período de acompanhamento, 40% dos paci-
Entretanto, as incapacidades físicas ainda permanecem entes apresentaram pioria da incapacidade física após o fim
frequentes tanto no diagnóstico quanto após o tratamento. do tratamento.19 Esse agravamento estava associado ao grau
Outras considerações são necessárias para evitar incapa- de incapacidade, ao número de lesões cutâneas no momento
cidades e intervir na evolução das deficiências existentes. do diagnóstico e à presença de neurite. Assim, a pioria do
No presente estudo, 66,14% das deformidades estavam pre- comprometimento da hanseníase após tratamento especí-
sentes no momento do diagnóstico. A alta proporção de fico está principalmente relacionada ao diagnóstico tardio,
deformidades em casos novos reflete o atraso no diagnóstico à extensão e gravidade da doença e à presença de neurite. As
e pode ser vista como uma medida da ineficácia do programa incapacidades causadas pela hanseníase são mais suscetíveis
de saúde pública, uma vez que a detecção precoce da hanse- de ser diagnosticadas erroneamente e podem apresentar-se
níase por meio de várias informações e atividades educativas a diferentes especialistas, como cirurgiões plásticos, reuma-
pode antecipar a intervenção terapêutica e assim preve- tologistas e cirurgiões vasculares; geralmente o diagnóstico
nir deformidades. O diagnóstico e tratamento precoces da correto demora a ser feito e possibilita o desenvolvimento
doença e em especial das reações continua a ser o prin- de complicações desse reconhecimento tardio.20
cipal meio de prevenção do surgimento de incapacidades Na presente análise, a incapacidade secundária foi mais
físicas.14 Hanseníase MB e comprometimento no momento prevalente em casos com dois ou mais troncos nervosos
do diagnóstico foram os principais fatores de risco para acometidos. Durante a avaliação clínica no diagnóstico da
pioria neurológica após o tratamento/PQT. O diagnóstico hanseníase, os nervos devem ser palpados, porque o número
precoce e o tratamento imediato de episódios reacionais de troncos afetados pode ser usado como um indicador das
continuam a ser os principais meios de prevenção de defici- incapacidades atuais e futuras. Essa avaliação clínica, no
ências físicas. entanto, requer profissionais de saúde qualificados e famili-
No presente estudo, a úlcera trófica de mão ou pé obser- arizados com os sinais clínicos da hanseníase.
vada em 29,34% foi a forma morfológica/anatômica mais
comum de deformidade. Esse achado e a incidência de Conclusão
outras deformidades foram semelhantes aos observados no
estudo de Nayak et al.,15 que relataram a úlcera trófica Em certas formas de hanseníase, novas deformidades conti-
(21,73%) como a deformidade mais comum, seguida por nuam a se desenvolver apesar do tratamento. A deformidade
mão em garra, pé caído, madarose, dedos em garra, lagof- desempenha um papel importante no estigma associado à
talmia, deformidade do lobo da orelha, paralisia facial e, hanseníase. É necessário acompanhamento regular em longo
finalmente, deformidade do nariz. prazo de pacientes liberados do tratamento. O tratamento
Na hanseníase, olhos, mãos e pés são as áreas de da hanseníase não termina com a conclusão da PQT. A
comprometimento mais frequentes, mesmo em estágios avaliação do grau de incapacidade física é uma prática reco-
avançados. Olhos, mãos e pés são fundamentais para a mendada pelo Ministério da Saúde da Índia que deve ser feita
mobilidade e outras atividades vitais da vida diária. No em todos os pacientes diagnosticados.21 Do ponto de vista
presente estudo, 44,48% (n = 113) das deformidades aco- clínico, a avaliação permite determinar o impacto da doença
meteram as mãos e 39,76% (n = 101), os pés. Esses na vida do paciente, monitorar a evolução do tratamento e
achados enfatizam a importância da avaliação de rotina estabelecer estratégias de prevenção, reabilitação e auto-
do comprometimento da função nervosa de todos os novos cuidado. Do ponto de vista epidemiológico, ela permite
pacientes com hanseníase, para identificar aqueles com monitorar a extensão das endemias, a prevalência oculta
deficiência de grau 1. Após o diagnóstico, o fornecimento e a manutenção da cadeia de transmissão, reflete também
de orientações adequadas para o autocuidado, como a a qualidade dos serviços de saúde.22
importância de não se andar descalço, inspeção diária
de mãos/pés em busca de bolhas, manchas vermelhas,
óleo-hidroterapia, fisioterapia, cuidados oculares, mudança Suporte financeiro
de ocupação, dentre outras, previne o surgimento de
deformidade visível. Nenhum.

03-fm1.pdf 61 30/03/20 12:57


56 Rathod SP et al.

Contribuição dos autores 8. Corline B, Van Brakel WH, Cornielje H. Quality of life, percei-
ved stigma, activity and participation of people with leprosy
related disabilities in South East Nepal. Disability CBR Inclusive
Santoshdev P Rathod: Análise estatística; aprovação da ver-
Development. 2011;22:16.
são final do manuscrito; concepção e planejamento do 9. De Stigter DH, De Geus L, Heynders ML, Leprosy:. between
estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, aná- acceptance and segregation Community behaviour towards
lise e interpretação dos dados; participação intelectual em persons affected by leprosy in eastern Nepal. Lepr Rev.
conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; 2000;71:492---8.
revisão crítica da literatura. 10. Anil Kumar BK. Girdhar. Is increasing MB ratio a positive indica-
Ashish Jagati: Aprovação da versão final do manus- tor of declining leprosy? J Commun Dis. 2006;38:24---31.
crito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e 11. WHO Expert Committee on Leprosy. Eighth report WHO Techni-
redação do manuscrito; participação efetiva na orientação cal Report Series, No. 968, 2012.
12. De Oliveira CR, De Alencar Mde J, De Sena Neto SA, Lehman
da pesquisa; revisão crítica da literatura; revisão crítica do
LF, Schreuder PA. Impairments and Hansen’s disease control
manuscrito.
in Rondonia State Amazon region of Brazil. Lepr Rev. 2003;74:
Pooja Chowdhary: Análise estatística; aprovação da 337---48.
versão final do manuscrito; elaboração e redação do 13. Richardus JH, Finlay KM, Croft RP, Smith WC. Nerve function
manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; impairment in leprosy at diagnosis and at completion of MDT: a
participação intelectual em conduta propedêutica e/ou retrospective cohort study of 786 patients in Bangladesh. Lepr
terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura. Rev. 1996;67:297---305.
14. Moschioni C, Antunes CM, Grossi MA, Lambertucci JR.
Risk factors for physical disability at diagnosis of 19,283
Conflitos de interesse new cases of leprosy. Rev Soc Bras Med Trop. 2010;43:
19---22.
Nenhum. 15. Nayak AK, Satheesh R, Shashidhar K. Spectrum of physical defor-
mities in leprosy patients visiting a tertiary care center in
Agradecimentos Mangalore. Ann Trop Med Public Health. 2017;10:22---6.
16. Pimentel MIF, Nery JAC, Borges E, Gonçalves RR, Sarno
EN. O exame neurológico inicial na hanseníase multibacilar:
À Dra. Bela J Shah, por sua orientação na preparação do correlação entre a presença de nervos afetados com incapaci-
manuscrito. dades presentes no diagnóstico e com a ocorrência de neurites
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socio-economic factors in relation to stigmatization, impair- impairments amongst people affected by leprosy in Cebu, the
ment status and selection for socio-economic rehabilitation: A Philippines. Lepr Rev. 2010;81:111---20.
1 year cohort of new leprosy cases in North Bangladesh. Lepr 19. Sales AM, Campos DP, Hacker MA, da Costa Nery JA, Düppre
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6. Schreuder PA. The occurrence of reactions and impairments in vigilância, atenção e eliminação da Hanseníase como
leprosy: Experience in the leprosy control program of three problema de saúde pública: manual técnico-operacional
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1978-1995] III. Neural and other impairments. Int J Lepr Other saude.pe.gov.br/sites/portal.saude.pe.gov.br/files/diretrizes
Mycobact Dis. 1998;66:170---81. para . eliminacao hanseniase - manual - 3fev16 isbn nucom
7. http://www.searo. who.int/srilanka/areas/leprosy/global final 2.pdf.
leprosy strategy 2016 2020.pdf. Page 7.

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An Bras Dermatol. 2020;95(1):57---62

Anais Brasileiros de
Dermatologia
www.anaisdedermatologia.org.br

INVESTIGAÇÃO

Sarcoidose cutânea: perfil clínico-epidemiológico de


72 casos de um hospital terciário em São Paulo,
Brasil夽,夽夽
Mariana Fernandes Torquato ∗ , Marcella Karen Souza da Costa
e Marcello Menta Simonsen Nico

Departamento de Dermatologia, Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil

Recebido em 2 de novembro de 2018; aceito em 17 de junho de 2019


Disponível na Internet em 28 de fevereiro de 2020

Resumo
PALAVRAS-CHAVE Fundamentos: A sarcoidose é uma doença multissistêmica de causa desconhecida, carac-
Brasil; terizada pela presença de inflamação granulomatosa não infecciosa em diversos órgãos. O
Doença envolvimento cutâneo é comum, com incidência relatada entre 9% e 37% dos pacientes. Estudos
granulomatosa sobre sarcoidose cutânea no Brasil são escassos.
crônica; Objetivos: Descrever aspectos clínico-epidemiológicos dos pacientes com sarcoidose cutânea
Epidemiologia; diagnosticada no Departamento de Dermatologia da Universidade de São Paulo, de maio de
Manifestações 1994 a março de 2018.
cutâneas; Métodos: Os aspectos clínicos de pacientes com sarcoidose cutânea confirmada foram revisados
Sarcoidose retrospectivamente e classificados de acordo com gênero, etnia, idade ao diagnóstico, tipo de
manifestação cutânea, envolvimento sistêmico e tratamento efetuado.
Resultados: A sarcoidose cutânea foi diagnosticada em 72 pacientes, predominou no sexo femi-
nino (74%), idade média ao diagnóstico de 49,6 anos, com maioria de etnia branca (61%). Pápulas
e placas foram as lesões mais comuns. Doença sistêmica foi detectada em 81% dos pacientes,
afetando principalmente pulmões e linfonodos torácicos (97%). Tipicamente, as lesões cutâneas
foram a primeira manifestação (74%). Terapia sistêmica foi necessária em 72%, com seguimento
clínico feito por dermatologistas em grande parte dos casos. Os glicocorticoides orais foram os
medicamentos sistêmicos mais usados (92%), com média de 1,98 medicamento sistêmico por
paciente.
Limitações do estudo: Dados insuficientes nos prontuários médicos.

DOI referente ao artigo:


https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.06.004
夽 Como citar este artigo: Torquato MF, Costa MKS, Nico MMS. Cutaneous sarcoidosis: clinico-epidemiological profile of 72 patients at a

tertiary hospital in São Paulo, Brazil. An Bras Dermatol. 2020;95:57---62.


夽夽 Trabalho realizado no Departamento de Dermatologia, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.
∗ Autor para correspondência.

E-mail: marytorquato@hotmail.com (M.F. Torquato).

2666-2752/© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma licença
CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

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58 Torquato MF et al.

Conclusão: Esta série destaca o papel do dermatologista no reconhecimento e diagnóstico da


sarcoidose cutânea, na avaliação do acometimento sistêmico e seu tratamento. A sarcoidose
cutânea já foi considerada extremamente infrequente no Brasil em comparação com doenças
granulomatosas infecciosas; no entanto, a presente casuística parece sugerir que a enfermidade
não é tão rara em nosso meio.
© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um
artigo Open Access sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

Introdução A sarcoidose é considerada infrequente no Brasil; suas


características não são analisadas em detalhe desde 1976,
A sarcoidose é uma doença multissistêmica de causa quando foi feita uma revisão de 40 casos.13 O objetivo deste
desconhecida, caracterizada pela presença de inflamação estudo foi caracterizar os aspectos clínicos e epidemiológi-
granulomatosa não infecciosa em vários órgãos. Estudos cos da sarcoidose cutânea em um hospital terciário de São
mostram que suscetibilidade genética e fatores ambientais Paulo, Brasil.
contribuem para o desenvolvimento de uma resposta imune
exacerbada.1 O curso clínico varia e, na metade dos casos, a Métodos
doença se resolve espontaneamente dentro de dois a cinco
anos. Após cinco anos, a remissão é muito menos provável.2 Após aprovação do comitê de ética institucional, foi feito
Os pulmões e os linfonodos torácicos são os órgãos mais um estudo retrospectivo que analisou os prontuários médi-
comumente afetados (90% dos casos), mas a doença pode cos de 72 casos diagnosticados como sarcoidose cutânea
acometer quase todos os órgãos.3 no Departamento de Dermatologia da Universidade de São
O envolvimento cutâneo é comum, com incidência rela- Paulo, Brasil, de maio de 1994 a março de 2018.
tada entre 9% a 37%.2,4---7 As manifestações cutâneas podem O diagnóstico de sarcoidose cutânea foi baseado em
ser classificadas em duas categorias: lesões específicas, em quadro clínico compatível, evidência histopatológica de
que há evidência histopatológica de granulomas sarcoídeos granulomas sarcoídeos na biópsia de pele e exclusão de
típicos, e lesões não específicas, que se desenvolvem como outras doenças granulomatosas por meio de colorações
resultado de um padrão global de reação inflamatória.2,4---9 especiais para microrganismos e culturas. Todos os paci-
O eritema nodoso é a lesão cutânea não específica mais entes foram submetidos à avaliação dos órgãos internos,
comum, ocorre em formas agudas de sarcoidose, indicando, inclusive história com revisão completa dos sistemas,
em geral, boa prognose.10 As lesões específicas são crônicas, exame físico, radiografia de tórax (estadiamento radiográ-
assintomáticas e requerem tratamento.2,4---9 fico para sarcoidose pulmonar ? RSPS),2,11 testes de função
Máculas, pápulas e placas, lúpus pérnio, nódulos super- pulmonar, avaliação oftalmológica, perfil hematológico e
ficiais e nódulos subcutâneos (conhecidos como nódulos bioquímico, eletrocardiograma e teste tuberculínico. Outras
de Darier-Roussy) constituem as lesões específicas mais investigações haviam sido feitas conforme necessário, de
comuns. Manifestações menos comuns incluem lesões hipo- acordo com o quadro clínico individual. Foram excluídos
pigmentadas, o angiolupoide e formas psoriasiformes, do estudo os casos cujos prontuários médicos não estavam
eritrodérmicas, ulcerativas, ictiosiformes, verrucosas ou disponíveis.
liquenoides.2,4---9 Aparecimento de lesões sobre cicatrizes Os dados clínicos foram revisados retrospectivamente
antigas, que se tornam inflamadas, ou em tatuagens, é para obtenção das variáveis gênero, idade ao diagnóstico,
observado. etnia, morfologia e distribuição de lesões cutâneas, envol-
Quando há suspeita clínica, é importante uma bióp- vimento extracutâneo, manifestação inicial e tratamento
sia de pele para estabelecer evidências histopatológicas estabelecido. Depois disso, dados estatísticos descritivos
de sarcoidose e excluir outras causas de doença granulo- foram usados para sintetizar as informações.
matosa, por meio da demonstração de microrganismos no
tecido em culturas.11 A histopatologia revela granulomas
Resultados
não necrotizantes compostos de histiócitos mononuclea-
res, caracteristicamente com pequeno número de linfócitos
circundantes, além de células gigantes de Langhans.4 Dos 74 pacientes selecionados inicialmente com diagnóstico
Caracteristicamente, a intradermorreação à tuberculina confirmado de sarcoidose cutânea, dois, dos quais não havia
é negativa. Uma vez confirmada sarcoidose cutânea, informação clínica suficiente, foram excluídos. As caracte-
a avaliação de possível comprometimento sistêmico é rísticas clínicas dos 72 casos restantes estão resumidas na
obrigatória.2,11 tabela 1. A razão entre homens e mulheres foi de aproxi-
A terapia geralmente é direcionada ao órgão mais gra- madamente 1:2,8 --- 19 homens (26%) e 53 mulheres (74%).
vemente afetado, o que frequentemente leva à melhora A mediana de idade no momento do diagnóstico foi de 49,6
das lesões cutâneas. Para pacientes com sarcoidose cutânea anos (de 28 a 69). A maioria dos pacientes era de etnia
isolada ou com doença cutânea grave, recomenda-se uma branca (61%).
abordagem gradual com terapias locais, imunomoduladores As lesões cutâneas específicas observadas incluíram pla-
e imunossupressores sistêmicos.12 cas em 32 casos (44%), seguidas por pápulas em 30 (42%),

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Sarcoidose cutânea: perfil clínico-epidemiológico de 72 casos de um hospital terciário em São Paulo, Brasil 59

Tabela 1 Características clínicas de 72 pacientes com sar- Comprometimento sistêmico específico foi detectado
coidose cutânea em 58 pacientes (81%) e as lesões cutâneas foram a pri-
meira manifestação em 43 (74%) desses (tabela 2). O
Características N◦ de pacientes Porcentagem (%) diagnóstico de sarcoidose extracutânea ocorreu antes da
Sexo doença cutânea em 15 casos (26%). Sarcoidose pulmonar
Masculino 19 26 foi a manifestação sistêmica mais frequente, acometeu
Feminino 53 74 56 pacientes (97% dos pacientes com comprometimento
sistêmico). De acordo com o RSPS,1 25 pacientes apresenta-
Etnia vam sarcoidose pulmonar estágio I (linfadenopatia isolada),
Branca 44 61 21 estágio II (infiltração pulmonar com linfadenopatia),
Negra 28 39 dois estágio III (infiltração pulmonar sem linfadenopatia)
Idade, anos e oito estágio IV (fibrose pulmonar). Outros órgãos comu-
Média 49,6 mente envolvidos foram os rins em oito pacientes (14%),
Faixa etária 28-69 linfonodos extratorácicos em oito (14%) e olhos em sete
(12%). Dos pacientes com doença renal, cinco apresentavam
Lesões específicas
apenas hipercalciúria assintomática e três apresentavam
Placas 32 44
nefrolitíase. As manifestações oculares mais comuns foram
Pápulas 30 42
uveíte e hipertrofia da glândula lacrimal em cinco e dois
Subcutânea 11 15
pacientes, respectivamente. Dois pacientes (3%) apresen-
Lúpus pérnio 8 11
taram sarcoidose cardíaca. A doença afetou o fígado, o
Angiolupoide 4 6
baço, o pâncreas, o trato gastrintestinal, o trato respiratório
Hipopigmentada 2 3
superior, os músculos, os ossos e as articulações, sepa-
Associada à tatuagem 2 3
radamente, em casos isolados. A sarcoidose permaneceu
Cicatrizes 1 1
confinada à pele, durante o seguimento, em 14 pacientes
Psoriasiforme 1 1
(19%).
Liquenoide 1 1
Cinquenta e dois pacientes (72%) necessitaram de terapia
≥ 2 tipos 20 28
sistêmica e 12 (17%) receberam apenas terapia local (tabela
Localizações especiais 3). Três pacientes perderam o acompanhamento clínico
Unha 3 4 após o diagnóstico, um teve remissão espontânea e quatro
Cavidade oral 2 3 ainda não haviam iniciado o tratamento quando do levan-
Alopecia cicatricial 2 3 tamento. Dos pacientes que foram tratados apenas com
Genital 1 1 terapia local, uso tópico de corticosteroides foi feito em 10,
corticosteroide intralesional em cinco e inibidor tópico de
Distribuição
calcineurina (tacrolimo) em três. Em metade desses casos,
Cabeça e pescoço 50 69
uma associação de terapias locais foi necessária. Os corti-
Face 44 61
costeroides por via oral constituíram a medicação sistêmica
Somente Face 16 22
mais usada em 48 pacientes (92%), seguido por antimalá-
Nariz 21 29
ricos em 28 (54%), metotrexato em 18 (35%), azatioprina
Membros superiores 38 53
em quatro (8%) e leflunomida em dois (4%), antibióticos da
Membros inferiores 26 36
classe das tetraciclinas em dois (4%), talidomida em um (2%)
Tronco 25 35
e infliximabe em um (2%). Dezessete pacientes (33%) rece-
≥ 2 localizações 40 56
beram corticosteroides orais como monoterapia. O número
médio de medicamentos sistêmicos usados em cada paci-
ente durante o período de acompanhamento foi de 1,98. A
nódulos subcutâneos em 11 (15%), lúpus pérnio em oito terapia sistêmica foi direcionada para lesões cutâneas e,
(11%), angiolupoide em quatro (6%), lesões hipopigmen- portanto, gerenciada exclusivamente pelo dermatologista
tadas em dois (3%), lesões psoriasiformes em um (1%) e em 24 pacientes (46%).
lesões liquenoides em um (1%). Cicatriz e sarcoidose asso-
ciada à tatuagem foram observadas em um (1%) e dois (3%)
pacientes, respectivamente (fig. 1). Vinte pacientes (28%) Discussão
apresentavam mais de um tipo de lesão dermatológica.
Oito pacientes tiveram lesões em outras localizações, como Embora a prevalência de sarcoidose no Brasil ainda não
unhas (três), cavidade bucal (dois), couro cabeludo (alope- tenha sido estabelecida, estima-se que seja menor do que
cia cicatricial específica) (dois) e genitália (um). Cabeça e 10 casos/100.000 habitantes.14 Dermatologistas brasileiros
pescoço foram os locais mais acometidos, com lesões em 50 mais antigos alegavam que a sarcoidose cutânea era extre-
pacientes (69%). Quarenta e quatro pacientes (61%) apresen- mamente rara no Brasil. Em geral, considerava-se que ‘‘um
taram comprometimento facial. As lesões afetaram apenas caso de sarcoidose cutânea é possivelmente um caso mal
a face em 16 pacientes (22%) e 21 (29%) tiveram lesões no diagnosticado de hanseníase ou tuberculose’’. Parece que
nariz. Lesões estavam presentes nas extremidades superi- a incidência da doença tem aumentado gradualmente nas
ores em 38 pacientes (53%), extremidades inferiores em 26 últimas décadas.2 Os números em relação ao sexo e à média
(36%) e tronco em 25 (35%). Cinquenta e seis pacientes (40%) de idade ao diagnóstico na presente série coincidem com
demonstraram lesões em dois ou mais locais. as estatísticas de outros países. No entanto, a maioria de

03-fm1.pdf 65 30/03/20 12:57


60 Torquato MF et al.

Figura 1 Exemplos clínicos de sarcoidose cutânea: A, Forma papulosa; B, Forma subcutânea; C, Lúpus pérnio; D, Angiolupoide,
E, Forma hipocromiante; F, Lesões liquenoides; G, Lesões em cicatriz antiga; H, Infiltração periungueal com osteíte e onicodistrofia;
I, Granulomas compostos predominantemente por histiócitos epitelioides (Hematoxilina & eosina, 40×).

nossos pacientes era branca (61%), ao contrário da maior A presença de placas tem sido associada a um curso crônico
prevalência clássica em negros.2,4,15 da doença.18---20
Lesões cutâneas levaram à detecção de sarcoidose extra- Nódulos subcutâneos específicos (não eritema nodoso)
cutânea em 74% dos pacientes, valor corroborado por outros foram observados em 15% dos pacientes, frequência maior
estudos.16,17 do que a encontrada em outros estudos.8,18,20
De acordo com várias séries anteriormente publicadas, O lúpus pérnio, lesão muito característica da sarcoidose
as lesões específicas mais comuns da sarcoidose são as cutânea, geralmente segue um curso crônico e frequen-
pápulas.18---20 No entanto, a sarcoidose do tipo placa foi temente coexiste com sarcoidose do trato respiratório
a apresentação mais frequente em nosso estudo (44%), superior.7 Em nossa casuística, oito pacientes apresenta-
seguida pelas pápulas (42%). Essa proporção também foi ram lúpus pérnio, todos com doença sistêmica associada,
encontrada em séries recentes do Líbano e em Taiwan.21,22 muitas vezes grave e com envolvimento de muitos órgãos.
Placas podem surgir de novo ou a partir de uma confluên- Apenas um paciente apresentou comprometimento do trato
cia de pápulas. Quando comparadas às pápulas, as placas respiratório superior. Cicatrizes e sarcoidose associada à
tendem a ter uma infiltração mais profunda e são mais tatuagem foram diagnosticadas em um e em dois pacien-
propensas a deixar cicatrizes permanents ao se resolver. tes, respectivamente. Essas lesões podem ser diagnosticadas

03-fm1.pdf 66 30/03/20 12:57


Sarcoidose cutânea: perfil clínico-epidemiológico de 72 casos de um hospital terciário em São Paulo, Brasil 61

Tabela 2 Características do envolvimento extracutâneo cutâneo negativo para tuberculina. Esse protocolo foi sufici-
ente para diagnosticar sarcoidose sistêmica na maioria dos
Características N◦ de Porcentagem,
pacientes. Após o diagnóstico, a avaliação básica incluiu
pacientes %
avaliação oftalmológica, perfil hematológico e bioquímico
Envolvimento extracutâneo 58 81 (nível sérico e urinário de cálcio, função hepática e renal),
Pulmonar 56 97 eletrocardiograma e testes de função pulmonar. Testes
Estágio 1 25 43 adicionais foram solicitados conforme a necessidade. Os
Estágio 2 21 36 níveis séricos de enzima conversora de angiotensina não são
Estágio 3 2 3 medidos em nosso serviço. Apenas 60% dos pacientes com
Estágio 4 8 14 sarcoidose apresentam níveis aumentados dessa enzima, os
Renal 8 14 quais não são específicos para a doença.7
Linfadenopatia extratorácica 8 14 Caso a sarcoidose sistêmica não seja diagnosticada em
Ocular 7 12 um paciente com granulomas sarcoídicos cutâneos, deve
Cardíaco 2 3 ser feito acompanhamento em longo prazo. Em nossa série,
Hepático 1 2 a sarcoidose sistêmica foi detectada em 81% dos paci-
Esplênico 1 2 entes; em quase todos, pôde ser demonstrada logo após
Pancreático 1 2 e como consequência do diagnóstico de doença cutânea.
Trato gastrintestinal 1 2 A sarcoidose pulmonar foi a manifestação sistêmica mais
Muscular 1 2 comum, afetou 97% dos nossos casos. A linfadenopatia foi
Trato respiratório superior 1 2 o achado radiológico mais frequente (82%), seguido de
Articular 1 2 infiltração pulmonar (41%) e fibrose (14%). Outros órgãos
Ósseo 1 2 comumente envolvidos foram os rins (14%), linfonodos extra-
Manifestação inicial torácicos (14%) e olhos (12%). Com exceção do envolvimento
Cutânea 43 74 renal, que esteve presente em maior proporção em nosso
Extracutânea 15 26 estudo, outros acometimentos de órgãos foram encontra-
dos em taxas semelhantes às descritas anteriormente.1
Uma frequência maior de manifestações renais pode ser
Tabela 3 Tratamento dos pacientes com sarcoidose relacionada a um possível subdiagnóstico de hipercal-
cutânea ciúria assintomática em pacientes estudados em outras
publicações. Isso enfatiza a necessidade de dosar não
Característica N◦ de Porcentagem, apenas o nível sérico de cálcio, mas também o cálcio
pacientes % urinário.11,12
Terapia local isolada 12 17 Quatorze pacientes apresentaram apenas manifestações
Corticoide tópico 10 83 cutâneas. É controverso na literatura se esses pacientes
Corticoide intralesional 5 42 apresentarão envolvimento sistêmico adicional ou se sua
Inibidor de calcineurina 3 25 doença ficará restrita à pele.12
tópico Corticosteroides tópicos e intralesionais foram as tera-
Terapia sistêmica 52 72 pias locais mais usadas em nossos pacientes. Essas drogas
Corticoide oral 48 92 são consideradas terapia de primeira linha para sarcoidose
Antimalárico 28 54 cutânea com doença limitada ou leve, ou então como adju-
Metotrexato 18 35 vante para ajudar a controlar o distúrbio cutâneo quando
Azatioprina 4 8 a doença extracutânea está sob controle adequado. Inibi-
Leflunomida 2 4 dores tópicos de calcineurina, que têm baixo perfil geral
Antibióticos - classe 2 4 de efeitos colaterais e são indicados para doenças de pele
das tetraciclinas limitadas, também podem ser usados.12,24 Dos 12 pacientes
Talidomida 1 2 (17%) tratados apenas com terapia local, cinco apresenta-
Infliximabe 1 2 ram lesões cutâneas isoladas e sete doença pulmonar leve,
não necessitaram de tratamento sistêmico.
Para pacientes com doença grave ou que não respondem
à terapia tópica, os corticosteroides orais são terapia sistê-
erroneamente como cicatrizes hipertróficas ou queloides.7 mica de primeira linha. Em caso de recaída ou se os sinais
Em alguns pacientes foram detectadas lesões específicas persistirem, agentes poupadores de esteroides devem ser
menos frequentes, como sarcoidose angiolupoide, hipopig- instituídos isoladamente, ou com baixas doses de corticos-
mentada, psoriasiforme e liquenoide. teroide associado.12,25 Em nossa série, os corticosteroides
Acometimento facial esteve presente em 61% dos pacien- foram os medicamentos mais usados (92%), em alguns casos
tes; uma proporção semelhante tem sido relatada por outros como monoterapia (33%). Antimaláricos (54%) e metotrexato
estudos.22,23 Em 40% dos casos, as lesões acometiam duas ou (35%) também foram usados. Outras medicações poupado-
mais localizações. ras de corticoides incluíram azatioprina (quatro pacientes),
Nosso procedimento inicial de rotina para o diagnós- leflunomida (três), antibióticos da classe das tetraciclinas
tico de sarcoidose incluiu histopatologia e cultura da (três) e talidomida (um). O infliximabe tem sido usado
pele (com feitura de colorações específicas para micror- recentemente para a sarcoidose recalcitrante.25 Esse medi-
ganismos), radiografia de tórax ou tomografia e um teste camento foi prescrito para um paciente que apresentava

03-fm1.pdf 67 30/03/20 12:57


62 Torquato MF et al.

lúpus pérnio, com doença sistêmica e cutânea grave, após Disorders (WASOG) adopted by the ATS Board and Directors and
falha terapêutica com outros esquemas combinados. by the ERS Executive Committee, February 1999. Am J Respir
O número médio de medicamentos sistêmicos usados em Crit Care Med. 1999; 160:736-55.
cada paciente durante o período de acompanhamento foi de 3. Haimovic A, Sanchez M, Judson MA, Prystowsky S. Sarcoidosis:
a comprehensive review and update for the dermatologist: part
1,98, confirmou que a maioria dos pacientes precisou rece-
II. Extracutaneous disease. J Am Acad Dermatol. 2012;66:719,
ber de uma a duas medicações diferentes para alcançar o
e1-10.
controle da doença. A terapia sistêmica foi direcionada para 4. Haimovic A, Sanchez M, Judson MA, Prystowsky S. Sarcoidosis:
lesões cutâneas em 24 pacientes (46%) e, portanto, gerenci- a comprehensive review and update for the dermatologist: part
ada exclusivamente pelo dermatologista nesses casos. Esses I. Cutaneous disease. J Am Acad Dermatol. 2012;66:699, e1-18.
pacientes apresentavam apenas comprometimento cutâneo 5. Marchell RM, Judson MA. Cutaneous sarcoidosis. Semin Respir
(sete) ou tinham comprometimento pulmonar leve, não con- Crit Care Med. 2010;31:442---51.
siderado merecedor de tratamento pelos internistas (17). 6. Marchell RM, Judson MA. Chronic cutaneous lesions of sarcoido-
sis. Clin Dermatol. 2007;25:295---302.
7. Mañá J, Marcoval J. Skin manifestations of sarcoidosis. Presse
Conclusão Med. 2012;41:e355---74.
8. Mayock RL, Bertrand P, Morrison CE, Scott JH. Manifestations of
Os achados clínicos e epidemiológicos do presente estudo sarcoidosis: analysis of 145 patients with a review of nine series
foram, em sua maioria, semelhantes aos publicados na selected from the literature. Am J Med. 1963;35:67---89.
literatura. Suas limitações incluem o desenho retrospec- 9. Marcoval J, Moreno A, Mañá J, Peyri J. Subcutaneous sarcoido-
tivo e, em alguns casos, a falta de dados detalhados nos sis. Dermatol Clin. 2008;26:553---6.
10. Elgart ML. Cutaneous lesions of sarcoidosis. Prim Care.
prontuários dos pacientes. Comparando-se com dados da
1978;5:249---62.
literatura, observou-se uma incidência aumentada de com-
11. Judson MA. The diagnosis of sarcoidosis. Clin Chest Med.
prometimento renal (hipercalciúria). Apesar do pequeno 2008;29:415---27.
tamanho da amostra, representa a maior série brasileira 12. Wanat KA, Rosenbach M. A practical approach to cutaneous sar-
sobre o assunto, sugerindo que a sarcoidose possa não ser coidosis. Am J Clin Dermatol. 2014;15:283---97.
tão infrequente no Brasil. Embora existam muitas doenças 13. Proença NG, Yagima ME. Aspects of cutaneous sarcoidosis in
infecciosas granulomatosas endêmicas em nosso país, a Brazil. Med Cutan Ibero Lat Am. 1976;4:329---30.
sarcoidose certamente se destaca como um diagnóstico 14. Bethlem NM. Epidemiology of sarcoidosis in Brazil. Sarcoidosis.
importante a ser considerado. 1985;2:162.
15. Rybicki BA, Iannuzzi MC. Epidemiology of sarcoidosis: recent
advances and future prospects. Semin Respir Crit Care Med.
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16. Mañá J, Marcoval J, Graells J, Salazar A, Peyrí J, Pujol R.
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crito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão 2003;97:978---82.
crítica da literatura. 19. Olive KE, Kataria YP. Cutaneous manifestations of sarcoido-
Marcella Karen Souza da Costa: Análise estatística; sis Relationships to other organ system involvement, abnormal
laboratory measurements, and disease course. Arch Intern Med.
concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação
1985;145:1811---4.
do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; 20. Elgart ML. Cutaneous sarcoidosis: definitions and types of lesi-
revisão crítica da literatura. ons. Clin Dermatol. 1986;4:35---45.
Marcello Menta Simonsen Nico: Aprovação da versão final 21. Ishak R, Kurban M, Kibbi AG, Abbas O. Cutaneous sarcoidosis:
do manuscrito; participação efetiva na orientação da pes- clinicopathologic study of 76 patients from Lebanon. Int J Der-
quisa; participação intelectual em conduta propedêutica matol. 2015;54:33---41.
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confined to the face and angiolupoid variant. J Eur Acad Der-
Nenhum. matol Venereol. 2013;27:499---505.
24. Baughman RP, Selroos O. Evidence-based approach to the tre-
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the World Association of Sarcoidosis and Other Granulomatous

03-fm1.pdf 68 30/03/20 12:57


An Bras Dermatol. 2020;95(1):63---66

Anais Brasileiros de
Dermatologia
www.anaisdedermatologia.org.br

CASO CLÍNICO

Pitiríase rubra pilar acantolítica associada ao uso


tópico de imiquimode a 5%: relato de caso e revisão da
literatura夽,夽夽
Oriete Gerin Leite a,∗ , Sandra Tagliolatto a,b
, Elemir Macedo de Souza c

e Maria Letícia Cintra d

a
Dermoclínica, Campinas, SP, Brasil
b
Departamento de Dermatologia, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
c
Disciplina de Dermatologia, Departamento de Clínica Médica, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, SP, Brasil
d
Departamento de Anatomia Patológica, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, SP, Brasil

Recebido em 13 de junho de 2018; aceito em 8 de janeiro de 2019


Disponível na Internet em 13 de fevereiro de 2020

Resumo O uso tópico de modificadores da resposta imune, como o imiquimode, tem aumen-
PALAVRAS-CHAVE
tado na dermatologia. Embora seu uso tópico seja bem tolerado, pode estar associado a
Aminoquinolinas;
exacerbações de doenças inflamatórias cutâneas generalizadas, possivelmente pela circulação
Ceratose actínica;
sistêmica de citocinas pró-inflamatórias. Relatamos caso de desenvolvimento de pitiríase rubra
Erupção por droga;
pilar, dermatose rara eritêmato-papuloescamosa, em mulher de 60 anos durante tratamento
Metotrexato;
com imiquimode 5% creme para ceratose actínica. Evoluiu com quadro eritrodérmico e cerato-
Pitiríase rubra pilar
dermia palmoplantar, apresentou resolução clínica progressiva após introdução de metotrexato.
Ressaltamos a importância do reconhecimento de possíveis reações sistêmicas associadas ao uso
tópico do imiquimode.
© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um
artigo Open Access sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

Introdução

Pitiríase rubra pilar (PRP) é uma dermatose eritêmato-


-papuloescamosa rara, semelhante clínico-patologicamente
DOI referente ao artigo: à psoríase. De etiologia não estabelecida, embora descrita
https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.01.009 como autolimitada, pode afetar intensamente a qualidade
夽 Como citar este artigo: Leite OG, Tagliolatto S, Souza EM, Cin-
de vida do paciente.
tra ML. Acantholytic pityriasis rubra pilaris associated with topical
Foi relatada em três artigos a associação da PRP ao
use of imiquimod 5%: case report and literature review. An Bras
Dermatol. 2020;95:63---6.
uso de imiquimode no tratamento de ceratoses actínicas e
夽夽 Trabalho realizado na Dermoclínica, Campinas, SP, Brasil. carcinoma basocelular superficial. Relatamos caso de PRP
∗ Autor para correspondência.

E-mail: oriete.leite@gmail.com (O.G. Leite).

2666-2752/© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma licença
CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

03-fm1.pdf 69 30/03/20 12:57


64 Leite OG et al.

Figura 1 Erupção papulodescamativa eritematosa no tronco e seguimento cefálico.

Figura 2 Confluência das lesões e evolução para eritrodermia, com áreas de pele sã. Note o acometimento palmar com cerato-
dermia alaranjada.

durante uso de imiquimode para ceratose actínica, com boa Discussão


resposta ao tratamento com metotrexato.
A PRP é uma desordem rara da queratinização. A forma clás-
sica (Tipo I) ocorre em adultos de ambos os sexos, com
erupção de pápulas foliculares que se confluem em pla-
cas descamativas eritêmato-alaranjadas, com espraiamento
Relato do caso craniocaudal, geralmente evolui para eritrodermia com ilho-
tas de pele sã e ceratodermia palmoplantar. São descritas
Paciente do sexo feminino, 60 anos, branca, apresentava ainda formas atípicas, acometimento de crianças e uma
ceratose actínica havia três meses na região peitoral direita, forma associada à infecção pelo HIV.1
confirmada por biópsia. Imiquimode creme 5% foi prescrito A histopatologia evidencia hiperplasia psoriasiforme,
para o tratamento tópico cinco vezes por semana. Após duas hiperceratose folicular, hiperparaceratose alternada com
semanas, iniciou quadro de febre, diarreia, mialgia e fadiga ortoceratose e infiltrado linfocitário perivascular superfi-
associada à exulceração da lesão inicial e surgimento de cial. A ocorrência de disceratose acantolítica, como no
lesões eritematosas papulodescamativas no couro cabeludo, presente caso, é comum e pode induzir erros diagnósticos,
face e tronco (fig. 1). O tratamento foi suspenso. Exames pela semelhança histológica com doença de Grover, Darier
laboratoriais não evidenciaram alterações. ou pênfigo.2 Magro e Crowson (1997) sugerem que a presença
Apesar de introduzido corticoide tópico e anti- de disceratose acantolítica seja frequente e possa servir
-histamínico oral, houve pioria da erupção com como fator preditivo de PRP na diferenciação histopatoló-
espraiamento e confluência das lesões sentido crani- gica com psoríase.3
ocaudal (fig. 2). Feita biópsia de lesões e introduzida Apesar da etiologia não elucidada, uma das principais
prednisona 40 mg/d. Na histologia, observou-se hiperplasia hipóteses para PRP seria a resposta imune exacerbada
psoriasiforme da epiderme, hiperparaceratose alternada a gatilhos antigênicos. Acredita-se que infecções virais,
com ortoceratose, áreas de hipogranulose, moderado bacterianas, neoplasias, doenças autoimunes e drogas modi-
infiltrado linfo-histiocitário perivascular superficial e focos ficadoras da resposta imune possam desempenhar papel em
de disceratose acantolítica (fig. 3). sua patogênese.1---3 Estudos evidenciam que na PRP, analoga-
Após quatro semanas do início da erupção, a paciente mente à psoríase, a via de resposta imune T-helper 1 (Th1)
apresentava-se eritrodérmica, com áreas de pele sã, asso- está ativada com aumento de citocinas pró-inflamatórias
ciada a ectrópio e ceratodermia palmoplantar alaranjada. como TNF-␣, INF-␣, IL-1, IL-6, IL-17e IL-23.4
Foi definido o diagnóstico clínico-histopatológico de (PRP). A ativação da resposta Th1 seria também responsá-
Metotrexato foi introduzido por via oral, na dose de 15 mg vel pela ação deficiente da vitamina A encontrada na
por semana, e o corticoide oral foi retirado gradativamente. pele afetada por PRP. Citocinas inflamatórias alteram
Os exames sorológicos (HIV, hepatites B e C) resulta- a sinalização de receptores retinoides dos queratinó-
ram negativos, assim como US abdominal e RX de tórax citos, levam à queratinização anormal e hiperplasia
estavam normais. Houve melhoria progressiva do qua- epidérmica.3 Dentre as opções terapêuticas para PRP
dro eritrodérmico após três meses, quando foi iniciada a encontram-se retinoides orais, metotrexato, fototerapia e
redução do metotrexato. A superfície cutânea normalizou- biológicos com atividade anti-TNF-␣, anti- IL-17 e anti-IL-
-se após nove meses do início do quadro (fig. 4). 23.1,2

03-fm1.pdf 70 30/03/20 12:57


Pitiríase rubra pilar acantolítica associada ao uso tópico de imiquimode a 5% 65

Figura 3 Pele, região abdominal, visão panorâmica: A, hiperceratose, acantose psoriasiforme e moderado infiltrado linfoide
perivascular superficial; B, pormenor da imagem anterior, nota-se hiperparaceratose alternada; C, área de disceratose acantolítica
e fenda intraepidérmica suprabasal; D, acentuada congestão (seta) com eliminação transepidérmica de hemácias. Hematoxilina &
eosina, aumento original de 100× (A) e 400× (B, C, D).

Figura 4 Resolução da doença após nove meses.

O imiquimode é um agente estimulador da resposta tópico em ratos, com aumento de INF-␣ e das IL-1, IL-6,
imunológica, indicado para tratamento tópico de ceratose IL-17, IL-23.7
actínica, carcinoma basocelular superficial e condiloma acu- Yang et al. (2008) relataram exacerbação da PRP em
minado. Nos últimos anos, seu uso tem se ampliado para paciente de 67 anos sob tratamento com imiquimode
tratamento de outras condições dermatológicas off-label.5 tópico 5% para ceratoses actínicas na face e no couro
Como agonista de receptores toll-like7 (TLR-7) presen- cabeludo. Duas semanas após o início do imiquimode,
tes nas células do sistema imune inato (células dendríticas assim como em nosso relato, o paciente desenvolveu qua-
e macrófagos) e queratinócitos, o imiquimode desempenha dro gripal associado ao espraiamento das lesões foliculares
ação antitumoral e antiviral. A ligação ao TLR-7 promove eritêmato-descamativas. Houve melhoria após 26 meses de
aumento da produção de citocinas pró-inflamatórias com tratamento com acitretin.8
perfil Th1, como TNF-␣, IFN-␣, IL-1, IL-6, IL-8, entre outras, Gómez-Moyano et al. (2010) descreveram PRP eritrodér-
assim como inibe a via anti-inflamatória Th2.5 mica em paciente de 56 anos, durante tratamento com
Seu uso tópico é seguro e bem tolerado, com reações imiquimode para CBC superficial no dorso. Como em nosso
locais reversíveis e transitórias, mas efeitos adversos sis- caso, a histopatologia apresentava focos de disceratose
têmicos podem ocorrer. Foram descritos sintomas gripais, acantolítica. Houve melhoria da PRP após dois meses com
mialgia, febre, cefaleia e fadiga, reversíveis com a suspen- acitretin.9
são do medicamento.6 Mais do que à absorção sistêmica do Mesinkovska et al. (2011) publicaram um caso de PRP
imiquimode, credita-se à circulação sistêmica de citocinas acantolítica, em paciente de 65 anos, em uso tópico de
inflamatórias a etiologia desses efeitos adversos.6 imiquimode 3,75% para tratamento de ceratoses actínicas.
Imiquimode foi associado à exacerbação e ao desencade- Apresentou melhoria após fototerapia UVB narrowband.10
amento de erupções cutâneas inflamatórias, como psoríase, A relação causal entre imiquimode e PRP permanece des-
dermatite esfoliativa, eritema multiforme, pênfigo e lúpus conhecida. O imiquimode pode ter sido gatilho para PRP na
subagudo.7 Psoríase tem sido induzida por imiquimode medida em que promoveu ativação da via inflamatória Th1

03-fm1.pdf 71 30/03/20 12:57


66 Leite OG et al.

e a circulação sistêmica de citocinas TNF-␣, INF-␣, corro- Conflitos de interesse


borou a principal teoria para sua patogênese.1,4,5 Sintomas
sistêmicos flu-like ocorreram após uso do imiquimode, sem Nenhum.
qualquer evidência de processo infeccioso, configuraram
efeito adverso já bem documentado.5,6 Além disso, o uso
do metotrexato, com ação antagonista do TNF-␣,4 resultou
Referências
na regressão das lesões.
O uso de medicamentos com atividade imunológica na 1. Wang D, Chong VC, Chong WS, Oon HH. A Review on Pityriasis
Rubra Pilaris. Am J Clin Dermatol. 2018;19:377---90.
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2. Klein A, Landthaler M, Karrer S. Pityriasis rubra pilaris: a
logista deve estar apto ao reconhecimento de possíveis review of diagnosis and treatment. Am J Clin Dermatol.
efeitos colaterais sistêmicos e exacerbação ou deflagração 2010;11:157---70.
de doenças cutâneas inflamatórias. 3. Magro CM, Crowson AN. The clinical and histomorphological fea-
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Suporte financeiro psoriasis. J Cutan Pathol. 1997;24:416---24.
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6. Heikkinen AK, Susitaival P. Severe systemic reaction to topical
imiquimod. Acta Derm Venereol. 2011;91:594---5.
Oriete Gerin Leite: Aprovação da versão final do manus-
7. Patel U, Mark NM, Machler BC, Levine VJ. Imiquimod 5% cream
crito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e induced psoriasis: a case report, summary of the literature and
redação do manuscrito; participação efetiva na orientação mechanism. Br J Dermatol. 2011;164:670---2.
da pesquisa; revisão crítica da literatura. 8. Yang FC, Jessup C, Dahiya M, Reynolds R. Pityriasis rubra pilaris
Sandra Tagliolatto: Aprovação da versão final do manus- exacerbation with topical use of imiquimod. Int J Dermatol.
crito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e 2008;47:1076---8.
redação do manuscrito; participação efetiva na orientação 9. Gómez-Moyano E, Crespo-Erchiga A, Vera Casaño A, Sanz Trel-
da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêu- les A. Pityriasis rubra pilaris with focal acantholytic dyskeratosis
tica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do during treatment with imiquimod 5% cream. Actas Dermosifili-
ogr. 2010;101:898---900.
manuscrito.
10. Atanaskova Mesinkovska N, Dawes D, Sood A, Bergfeld W.
Elemir Macedo de Souza: Aprovação da versão final do
Acantholytic pityriasis rubra pilaris associated with imiqui-
manuscrito; participação intelectual em conduta propedêu- mod 3.75% application. Case Rep Dermatol Med. 2011;2011:
tica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da 412684.
literatura; revisão crítica do manuscrito.
Maria Letícia Cintra: Aprovação da versão final do manus-
crito; elaboração e redação do manuscrito; participação
intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de
casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica
do manuscrito.

03-fm1.pdf 72 30/03/20 12:57


An Bras Dermatol. 2020;95(1):67---70

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CASO CLÍNICO

Eritrodermia como primeira manifestação de


carcinoma epidermoide do pulmão: relato de caso
raro夽,夽夽
Jorge Arandes-Marcocci ∗ , Maribel Iglesias-Sancho , Núria Setó-Torrent
e María Teresa Fernández-Figueras

Hospital Universitari Sagrat Cor-Grupo Quirónsalud, Barcelona, Espanha

Recebido em 3 de março de 2019; aceito em 19 de maio de 2019


Disponível na Internet em 19 de fevereiro de 2020

Resumo A eritrodermia como primeira manifestação de neoplasias de órgãos sólidos é rara. O


PALAVRAS-CHAVE
diagnóstico de câncer subjacente é desafiador. Alguns casos de eritrodermia em pacientes com
Carcinoma
câncer foram relatados na literatura. Os autores descrevem o caso de um homem de 70 anos
epidermoide;
que apresentou astenia, perda de peso, tosse seca e eritema corporal total com descamação
Dermatite esfoliativa;
no último mês. Uma tomografia computadorizada de tórax indicou uma lesão nodular, final-
Doenças de pele;
mente diagnosticada como carcinoma epidermoide do pulmão. Tanto quanto é do conhecimento
Neoplasias
dos autores, apenas 13 casos com eritrodermia foram relatados na literatura. Este relato de
pulmonares;
caso demonstra a necessidade de se investigarem neoplasias em pacientes que apresentam
Síndromes
eritrodermia, principalmente na presença de sintomas debilitantes associados.
paraneoplásicas
© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um
artigo Open Access sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

Introdução

A eritrodermia é caracterizada por eritema difuso e


descamação da pele que comprometem 90% ou mais da área
DOI referente ao artigo: total da superfície corporal. É uma manifestação cutânea de
https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.05.004 uma variedade de doenças, inclusive tumores sólidos.1 São
夽 Como citar este artigo: Arandes-Marcocci J, Iglesias-Sancho M, necessários critérios adequados (postulados de Curth) para
Setó-Torrent N, Fernández-Figueras MT. Erythroderma as first mani- estabelecer uma relação entre a lesão maligna subjacente
festation of squamous cell lung cancer: rare case report. An Bras e a alteração cutânea, mas nem todos os critérios preci-
Dermatol. 2020;95:67---70. sam estar presentes para caracterizar a associação entre
夽夽 Trabalho realizado no Hospital Universitari Sagrat Cor-Grup
a doença da pele e a neoplasia.2 A síndrome paraneoplá-
Quirón Salut, Barcelona, Espanha.
∗ Autor para correspondência. sica mais frequentemente associada ao câncer de pulmão
E-mail: jorge.arandes@hotmail.com (J. Arandes-Marcocci).
é a osteoartropatia hipertrófica, além de manifestações

2666-2752/© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma licença
CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

03-fm1.pdf 73 30/03/20 12:57


68 Arandes-Marcocci J et al.

Figura 1 Erupção eritematosa com descamação fina na face


na apresentação inicial.

endócrinas e neurológicas.3 Embora a expressão cutânea


das neoplasias pulmonares seja relativamente atípica, a
paquidermatoglifia (‘‘palmas em tripa’’), o eritema gyratum
repens, a hipertricose lanuginosa adquirida e a síndrome
de Bazex são as dermatoses paraneoplásicas mais comuns.4
Tanto quanto é do conhecimento dos autores, a eritroder-
mia como primeira manifestação de câncer de pulmão é
muito rara; apenas 13 casos foram relatados na literatura. A
conscientização da relação entre eritrodermia e neoplasias Figura 2 Erupção eritematosa com descamação fina no tronco
pulmonares é crucial para diminuir os atrasos no diagnóstico na apresentação inicial.
e melhorar os desfechos oncológicos.

Relato do caso

Um homem de 70 anos, fumante atual de 2/3 maços por dia,


apresentou-se ao pronto-socorro com um mês de história de
astenia, perda de peso, febre episódica (39 ◦ C), tosse seca,
instabilidade e eritema pruriginoso generalizado. Ele não
relatou histórico de dermatoses ou de medicação recente. O
exame físico revelou eritema em toda a superfície corporal
com escamas finas (figs. 1 e 2), ceratodermia plantar (fig. 3)
e linfadenopatia axilar esquerda. O restante do exame clí-
nico foi normal. O exame de sangue de rotina, inclusive
hemograma completo, eletrólitos e função hepática, reve-
lou apenas leucocitose (contagem de células brancas de
15.250 ␮L; valores de referência: 3.500 a 1.000) à custa de
neutrófilos (84,7%) e proteína C reativa elevada (9,9 mg/dL;
valor de referência: < 1 mg/dL). A avaliação radiográfica não
apresentou achados significativos.
Foram feitas duas biópsias por punção e um novo exame
de sangue, inclusive níveis séricos de proteína, sorologias
virais, esfregaço de sangue, enzimas musculares, células
de Sézary, citometria de fluxo e marcadores imunológicos
e tumorais. Os demais achados laboratoriais estavam den-
tro dos limites normais (inclusive aldolase sérica), exceto
CPK (1,309 UI/L; valores de referência: 1 a 175 UI/L) e
CK-MB (27,3 UI/L; valores de referência: 0 a 20 UI/L).
Os exames histopatológicos revelaram discretas alterações
espongióticas e psoriasiformes com hiperceratos folicular
discreta, bem como características histopatológicas inespe-
Figura 3 Eritema bilateral da perna e ceratodermia plantar.
cíficas (fig. 4). Foi iniciado um tratamento de suporte com
ênfase em dieta hiperproteica, controle de temperatura e

03-fm1.pdf 74 30/03/20 12:57


Eritrodermia como primeira manifestação de carcinoma epidermoide do pulmão 69

emergência dermatológica; temperatura, hidratação, pro-


teínas séricas diminuídas e insuficiência cardíaca precisam
ser corrigidas e monitoradas. É importante determinar
a etiologia subjacente para estabelecer o tratamento
e medicamentos potencialmente implicados devem ser
interrompidos.7
A eritrodermia paraneoplásica é mais comumente asso-
ciada a distúrbios linfoproliferativos, que não a micose
fungoide e a síndrome de Sézary. No entanto, também pode
ser uma expressão de um câncer sólido, geralmente em um
estágio tardio da doença,8 como no presente caso. As síndro-
mes paraneoplásicas podem ser observadas antes, durante
Figura 4 A biópsia evidenciou discretas alterações espon- ou após o diagnóstico do tumor. Sua fisiopatologia não está
gióticas e psoriasiformes com hiperceratoses folicular discreta bem esclarecida. No entanto, a grande maioria dos acha-
(Hematoxilina & eosina 20 × ). dos cutâneos é inflamatória ou proliferativa, pode também
ocorrer na ausência de doença maligna.
Como evidenciado em outros casos publicados na litera-
tura, a expressão paraneoplásica normalmente se modifica
com a regressão ou progressão do tumor. Apenas 1% das
neoplasias internas apresentam expressão cutânea como pri-
meira pista para o diagnóstico.9 No presente caso, não foi
possível observar alterações na eritrodermia, uma vez que
o câncer de pulmão não pôde ser tratado devido à morte
do paciente. Portanto, seguindo os postulados de Curth, é
possível relacionar, mas não classificar, definitivamente a
eritrodermia como síndrome paraneoplásica.
Dentre todas as dermatoses paraneoplásicas relatadas
na literatura, a eritrodermia é uma das menos menciona-
Figura 5 Achados da tomografia computadorizada: Lesão
das. Além disso, ela não é específica de alguma neoplasia
nodular de 22 × 34 mm, com bordas espiculadas no lobo superior
interna, o que dificulta a orientação para uma etiologia
direito, com linfadenopatias supraclavicular, hilar, pré-caval e
clara. A eritrodermia também pode se apresentar como um
subcarinal no lado direito.
achado cutâneo associado à dermatomiosite.10 No presente
caso, a ausência de achados cutâneos típicos (erupção cutâ-
hidratação, além de administração de esteroides tópicos.
nea tipo heliotrópio nas pálpebras e sinal e/ou pápulas de
Devido à nova perda de peso e à preocupação quanto a uma
Gottron) e a diminuição dos níveis de CPK e CK-MB no acom-
neoplasia maligna subjacente como causa potencial da eri-
panhamento levaram os autores a descartar o diagnóstico
trodermia, foi feita uma avaliação completa para doença
de dermatomiosite.
maligna oculta. A tomografia computadorizada de tórax
Em conclusão, em pacientes com história concomitante
revelou lesão nodular de 22 × 34 mm no lobo superior direito
de desenvolvimento insidioso, descompensação progressiva
com múltiplas linfadenopatias (fig. 5), a histopatologia era
e refratária a terapias-padrão, exames adicionais devem ser
compatível com carcinoma epidermoide. A tomografia com-
feitos. Essa conduta pode resultar na detecção precoce de
putadorizada da cabeça evidenciou duas lesões metastáticas
neoplasias malignas potencialmente tratáveis.
occipitais, foram finalmente classificadas como estágio IV
(T2N3M1). Às seis semanas, a erupção cutânea do paciente
era similar à da apresentação inicial, porém com menos Suporte financeiro
prurido. O paciente faleceu três meses após o diagnóstico
devido à progressão do câncer metastático. Nenhum.

Discussão Contribuição dos autores

Dermatoses preexistentes, particularmente psoríase e Jorge Arandes Marcocci: Aprovação da versão final
eczema, bem como reação a drogas e linfomas de células do manuscrito; concepção e planejamento do estudo;
T, foram identificadas como etiologias comuns de eri- elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e
trodermia. Em alguns pacientes, no entanto, a causa é interpretação dos dados; participação efetiva na orientação
desconhecida. Pacientes com eritrodermia idiopática devem da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêu-
ser acompanhados de perto por períodos prolongados, com tica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da
múltiplas biópsias, pois uma porcentagem significativa des- literatura; revisão crítica do manuscrito.
ses casos progredirá para linfoma cutâneo de células T.5,6 Maribel Iglesias-Sancho: Aprovação da versão final
A histopatologia frequentemente aponta alterações do manuscrito; concepção e planejamento do estudo;
inespecíficas. Mesmo assim, a maioria dos estudos consi- elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e
dera necessária a biópsia, pois em 43% a 66% dos casos interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; revi-
foi útil para definir o diagnóstico.6 A eritrodermia é uma são crítica do manuscrito.

03-fm1.pdf 75 30/03/20 12:57


70 Arandes-Marcocci J et al.

Núria Setó-Torrent: Concepção e planejamento do 4. Chung VQ, Moschella SL, Zembowicz A, Liu V. Clinical and
estudo; participação efetiva na orientação da pesquisa; revi- pathologic findings of paraneoplastic dermatoses. J Am Acad
são crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito. Dermatol. 2006;54:745---62, quiz 763-6.
Núria Setó-Torrent: Concepção e planejamento do 5. César A, Cruz M, Mota A, Azevedo F. Erythroderma. A clinical
and etiological study of 103 patients. J Dermatol Case Rep.
estudo; participação efetiva na orientação da pesquisa; revi-
2016;10:1---9.
são crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
6. Li J, Zheng H-Y. Erythroderma: a clinical and prognostic study.
Dermatology (Basel). 2012;225:154---62.
Conflitos de interesse 7. Mistry N, Gupta A, Alavi A, Sibbald RG. A review of the diagnosis
and management of erythroderma (generalized red skin). Adv
Skin Wound Care. 2015;28:228---36, quiz 237-8.
Nenhum.
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An Bras Dermatol. 2020;95(1):71---74

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CASO CLÍNICO

Nevos de Spitz eruptivos disseminados --- Relato


de caso夽,夽夽
a,∗ b a c
Pablo Vargas , Rodrigo Cárdenas , Roberto Cullen e Andrés Figueroa

a
Departamento de Dermatologia, Faculdade de Medicina, Universidade do Chile, Santiago, Chile
b
Clínica Alemana de Valdivia, Valdivia, Chile
c
Serviço de Dermatologia, Hospital Clínico da Universidade do Chile, Universidade do Chile, Santiago, Chile

Recebido em 26 de junho de 2018; aceito em 14 de janeiro de 2019


Disponível na Internet em 17 de fevereiro de 2020

Resumo O nevo de Spitz é lesão melanocítica benigna que se apresenta de várias maneiras:
PALAVRAS-CHAVE solitária, agminada ou disseminada. A variante disseminada é incomum; pode ter uma evolução
Imuno-histoquímica; rápida (a forma eruptiva) e seu manejo pode ser difícil. Este relato apresenta o caso de um
Nevo de células paciente de 24 anos com múltiplas pápulas nos membros, que apareceram quatro anos antes.
epitelioides e Ao exame físico, foram observadas 120 pápulas rosadas e cor da pele, observadas por derma-
fusiformes; toscopia como lesões vascularizadas rosadas e homogêneas. O estudo histopatológico revelou
Nevos e melanomas células epitelioides dispostas em grupos ou isoladamente na derme e na junção dermoepidér-
mica. Células foram positivas para HMB-45 na derme superficial e Ki-67 < 1%. Diante desses
achados, foi feito o diagnóstico de nevos de Spitz disseminados, forma eruptiva.
© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um
artigo Open Access sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

Introdução mento biológico ao longo do tempo tende a ser incerto. Ele


pode ser classificado em formas solitárias, agminadas e dis-
O nevo de Spitz é lesão melanocítica benigna que apresenta seminadas. O nevo de Spitz disseminado é uma apresentação
várias expressões clínicas e histopatológicas. Seu comporta- rara que pode ter uma evolução rápida (eruptivo) ou pode se
desenvolver ao longo de um período prolongado de tempo,
por vários anos (não eruptivo).1,2
Considerando a natureza incomum dessa variante clínica
DOI referente ao artigo:
e os poucos relatos na literatura, apresentamos o caso de
https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.01.010
夽 Como citar este artigo: Vargas P, Cárdenas R, Cullen R, Figueroa um paciente chileno com nevos de Spitz eruptivos.
A. Eruptive disseminated Spitz nevi --- Case report. An Bras Dermatol.
2020;95:71---4.
夽夽 Trabalho realizado no Departamento de Dermatologia, Facul- Relato do caso
dade de Medicina, Universidade do Chile, Santiago, Chile.
∗ Autor para correspondência. Paciente do sexo masculino, 24 anos, sem história mórbida
E-mail: pablovargas.med@gmail.com (P. Vargas). significativa. Foi encaminhado para nosso hospital devido ao

2666-2752/© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma licença
CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

03-fm1.pdf 77 30/03/20 12:57


72 Vargas P et al.

Figura 1 A-B, pápulas rosadas e cor da pele, com aparência verrucosa e base séssil.

ou isoladamente na derme e na junção dermoepidérmica.


Foram observadas quantidades variáveis de pigmento de
melanina, hialinização e vascularização. Não foram obser-
vadas atipias citológicas significativas nem mitose (fig. 3). O
estudo imuno-histoquímico mostrou SOX10 com um padrão
de coloração nuclear em melanócitos; a proteína S100 foi
positiva e o índice de marcação Ki-67 foi < 1% (fig. 4). Diante
desses achados, foi feito o diagnóstico de nevos de Spitz
eruptivos disseminados; o paciente concordou com a excisão
cirúrgica das principais lesões sob anestesia geral e acom-
panhamento rigoroso.

Discussão

Os nevos de Spitz disseminados e eruptivos foram descri-


tos em 1974 por Wallace et al. como melanoma eruptivo
juvenil.3 É uma doença rara, com apenas 27 relatos na
literatura até o momento.4 O presente caso se correlaci-
ona com os descritos, uma vez que a idade média para o
Figura 2 Dermatoscopia: lesões vascularizadas homogêneas
início dos sintomas clínicos é de 21 anos. Há relatos de
e rosadas, com pequenas escamas na superfície.
pacientes recém-nascidos a adultos de 35 anos. Os paci-
entes são geralmente do sexo feminino e a maioria dos
aparecimento, quatro anos antes, de múltiplas lesões ele- casos não apresenta fatores desencadeantes. Associações
vadas nos braços, cotovelos, coxas e joelhos. Essas lesões isoladas com quimioterapia, drogas intravenosas, cirurgia,
apresentaram uma evolução rápida e progressiva em tama- exposição ao sol e gravidez foram descritas na literatura.5,6
nho e número; não foram relatados dor, prurido, hemorragia As lesões geralmente são observadas no tronco e nos mem-
ou outros sintomas. Algumas lesões, principalmente nos bros proximais. A literatura apresenta quatro casos de
braços, haviam desaparecido espontaneamente após 10 a resolução parcial espontânea, condição observada no pre-
12 meses. Ao exame físico, foram observadas aproximada- sente paciente. É de extrema importância o diagnóstico
mente 120 pápulas rosadas e cor da pele, com aparência diferencial para descartar melanoma metastático, levam-
verrucosa e base séssil. Algumas lesões eram pedicula- -se em consideração também o xantogranuloma múltiplo
das. As lesões tinham diâmetro entre 2 a 9 mm e estavam juvenil, a urticária pigmentosa e a síndrome do nevo dis-
distribuídas simetricamente nos joelhos, coxas, cotovelos plásico.
e braços (fig. 1). A dermatoscopia mostrou lesões vascu- Em adultos, após diagnóstico clínico, nevos de Spitz
larizadas homogêneas e rosadas, com pequenas escamas solitários são geralmente tratados por remoção cirúrgica,
na superfície (fig. 2). Foi feita biópsia excisional de três devido ao seu comportamento biológico incerto. Na prática,
lesões, que apresentavam características essencialmente a adoção dessa abordagem na variante eruptiva é difícil,
semelhantes: proliferação melanocítica composta simétrica considera-se o número de lesões observadas. Várias opções
e bem circunscrita, constituída por células epitelioides terapêuticas foram tentadas, como eletrocoagulação,7
com citoplasma eosinofílico abundante, dispostas em grupos nitrogênio líquido8 e imiquimode,9 sem sucesso. Embora não

03-fm1.pdf 78 30/03/20 12:57


Nevos de Spitz eruptivos disseminados 73

Figura 3 A-B, proliferação melanocítica composta, simétrica e bem circunscrita, organizada em ninhos de células epitelioides (A,
Hematoxilina & eosina, 40×, B, Hematoxilina & eosina, 100×). C, melanócitos epitelioides com citoplasma eosinofílico abundante,
núcleo da vesícula e nucléolo (Hematoxilina & eosina, 400×).

Figura 4 Estudo imuno-histoquímico. A, SOX10 com um padrão de coloração nuclear em melanócitos. B, proteína S100 foi positiva.
C, proteína S100 foi positiva.

tenha sido relatada malignização, os poucos casos relatados Andrés Figueroa: Aprovação da versão final do manus-
e sua evolução errática exigem que se apresente ao paciente crito; obtenção, análise e interpretação dos dados;
várias opções terapêuticas, desde o manejo conservador participação intelectual em conduta propedêutica e/ou
com acompanhamento clínico e dermatoscopia regular até terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manus-
o manejo ativo com terapia tópica ou cirúrgica, como foi o crito.
caso do presente paciente.10

Conflitos de interesse
Suporte financeiro
Nenhum.
Nenhum.

Referências
Contribuição dos autores
1. Levy RM, Ming ME, Shapiro M, Tucker M, Guerry D 4th, Cirillo-
Pablo Vargas: Aprovação da versão final do manuscrito; Hyland VA, et al. Eruptive disseminated Spitz nevi. J Am Acad
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dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; J, Carmichael AJ. Regressing eruptive disseminated Spitz nevi.
revisão crítica da literatura; revisão crítica do manus- Pediatr Dermatol. 2015;32:e181---3.
crito. 3. Wallace HJ. Eruptive juvenile melanomata. Br J Dermatol.
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crito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão diseminated Spitz nevi. Eur J Dermatol. 2017;27:59---62.
crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito. 5. Boone SL, Busam KJ, Marghoob AA, Fang Y, Guitart J, Martini
Roberto Cullen: Aprovação da versão final do manuscrito; M, et al. Two cases of multiple Spitz nevi: correlating clinical,
obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica histologic, and fluorescence in situ hybridization findings. Arch
da literatura. Dermatol. 2011;147:227---31.

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CASO CLÍNICO

Pênfigo familiar ‘‘benigno’’? Eritrodermia e desfecho


fatal夽,夽夽
a,b,∗ c,d d
Paula Baldissera Tansini , Ana Letícia Boff , Magda Blessmann Weber e
e
Renan Rangel Bonamigo

a
Serviço de Dermatologia Sanitária, Secretaria Estadual de Saúde, Porto Alegre, RS, Brasil
b
Instituto de Dermatologia Prof. Rubem David Azulay, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
c
Serviço de Dermatologia, Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, Porto Alegre, RS, Brasil
d
Serviço de Dermatologia, Universidade Federal de Ciências da Saúde, Porto Alegre, RS, Brasil
e
Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil

Recebido em 3 de setembro de 2018; aceito em 19 de fevereiro de 2019


Disponível na Internet em 14 de janeiro de 2020

Resumo Genodermatose bolhosa rara, a doença de Hailey-Hailey ou pênfigo familiar benigno


PALAVRAS-CHAVE
usualmente se apresenta com bolhas flácidas, erosões e maceração limitadas às áreas flexurais,
Dermatite esfoliativa;
representando aumento na morbidade e piora da qualidade de vida dos pacientes acometidos.
Dermatopatias
Este relato descreve um quadro incomum, generalizado, com eritrodermia e desfecho fatal.
vesiculobolhosas;
© 2019 Publicado por Elsevier España, S.L.U. em nome de Sociedade Brasileira de Dermatologia.
Pênfigo familiar
Este é um artigo Open Access sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/
benigno
by/4.0/).

Introdução cia completa e expressividade variável, que afeta a


adesão entre os queratinócitos epidérmicos. Sua patogê-
A doença de Hailey-Hailey (DHH) é uma desordem cutânea nese se dá pela mutação no gene ATP2C1, responsável
rara, de herança autossômica dominante com penetrân- por codificar a bomba de cálcio intracelular, alterando
a homeostasia desse íon. O cálcio está envolvido em
processos como o de diferenciação celular, reparo da
barreira cutânea, adesão celular e motilidade dos que-
DOI referente ao artigo: ratinócitos. Seus níveis citosólicos aumentados levam
https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.02.006 à alteração dos desmossomos e da adesão celular à
夽 Como citar este artigo: Tansini PB, Boff AL, Weber MB, Bonamigo
junção epidérmica, ocasionando a acantólise. Caracteri-
RR. Familial “benign” pemphigus? Erythroderma and fatal outcome. zada pela formação de bolhas flácidas, erosão e maceração,
An Bras Dermatol. 2020;95:75---7. afeta primariamente as áreas flexurais em um padrão
夽夽 Trabalho realizado no Serviço de Dermatologia Sanitária, Secre-
simétrico.1
taria Estadual de Saúde, Porto Alegre, RS, Brasil.
∗ Autor para correspondência.

E-mail: drapaulatansini@gmail.com (P.B. Tansini).

2666-2752/© 2019 Publicado por Elsevier España, S.L.U. em nome de Sociedade Brasileira de Dermatologia. Este é um artigo Open Access
sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

03-fm1.pdf 81 30/03/20 12:57


76 Tansini PB et al.

Figura 1 Acantólise suprabasal extensa, com formação Figura 3 Eritema difuso, vesiculação, erosões e crostas em
bolhosa intraepidérmica e queratinócitos com aspecto típico em membros inferiores, em áreas próximas às dobras inguinais.
‘‘muro desmoronado’’ (Hematoxilina & eosina, 40×).

Discussão

Relato do caso A DHH foi descrita originalmente em 1939 pelos irmãos


Hailey.1 Tem prevalência desconhecida e sua herança
autossômica dominante tem penetrância completa e expres-
Paciente do sexo feminino, 64 anos, apresentava placas eri-
sividade variável. A patogênese decorre da mutação do gene
tematosas com destacamento periférico e múltiplas áreas
ATP2C1, que leva à alteração do transporte de cálcio no com-
erosadas nas regiões inframamárias, axilas, inguinal, dorso,
plexo de Golgi, resultando em disfunção dos desmossomos e
fossas cubitais e poplíteas. As mucosas encontravam-se pou-
acantólise de queratinócitos.2
padas. Relatava história familiar de mãe, irmãos e tias
A evolução da doença caracteriza-se por cronicidade e
maternas com lesões semelhantes. História médica pre-
períodos de exacerbação, com início geralmente entre a
gressa de hipertensão arterial sistêmica, doença arterial
segunda e terceira décadas de vida. Clinicamente, verifica-
coronariana, insuficiência cardíaca congestiva, dislipidemia
-se a presença de vesículas flácidas e erosões, placas
e hipotireoidismo. O exame histopatológico revelou derma-
eritematosas, por vezes maceradas, que envolvem sime-
tite acantolítica de clivagem intraepidérmica que acometia
tricamente as regiões flexurais, axilares, inframamárias,
toda a espessura da epiderme, com ausência de vilosida-
inguinal e cervical. A forma segmentar costuma ser unila-
des na derme e ausência de eosinófilos (fig. 1). Diante do
teral e linear ao longo das linhas de Blaschko.3 A forma
contexto clínico, familiar e histopatológico, fez-se o diag-
generalizada, como no caso relatado, é ainda mais rara
nóstico da DHH. A terapêutica administrada, limitada pelas
e uma complicação frequente é a infecção secundária
múltiplas comorbidades apresentadas pela paciente, incluiu
por fungos e bactérias. Outros fatores associados à piora
tetraciclina, prednisona, dapsona, sulfametoxazol + trime-
incluem calor, suor, atrito e radiação ultravioleta.4 Os prin-
toprim, cefalexina, além de metotrexato, com pouca ou
cipais diagnósticos diferenciais são pênfigo vulgar, doença de
nenhuma resposta. Após um ano em acompanhamento, a
Darier, psoríase invertida, dermatite seborreica, intertrigo
paciente evoluiu com quadro de eritrodermia (figs. 2 e 3) e
e eritrasma.5 O diagnóstico é confirmado pela histopato-
sintomas sistêmicos e foi referenciada à internação hospita-
logia, que evidencia acantólise extensa suprabasal, com
lar. Evoluiu para óbito por complicações infecciosas a partir
aspecto em “muro desmoronando”, podendo haver ceratinó-
do sítio de cateter venoso após um mês de internação.
citos disceratóticos. A imunofluorescência é classicamente
negativa, desnecessária em quadros clínicos e histopato-
lógicos clássicos.3 O tratamento é limitado e depende da
gravidade clínica. O arsenal terapêutico inclui antibióticos
orais e tópicos, inibidores da calcineurina tópicos, cortico-
esteroides orais e tópicos, dapsona, acitretina, metotrexato
e ciclosporina.6 Entre as opções para casos recalcitrantes
estão toxina botulínica, excisão cirúrgica, laser e terapia
fotodinâmica.7,8 Na maioria dos casos o quadro clínico é
limitado a áreas flexurais e intertriginosas; a generalização
é incomum e a eritrodermia com desfecho fatal é extre-
mamente rara. Os poucos casos da literatura descrevem
infecção bacteriana,9 farmacodemia e herpes10 como fato-
res desencadeantes para doença agudamente disseminada,
os quais diferem do atual caso, pois esse se apresentou com
Figura 2 Eritrodermia esfoliativa. Áreas intertriginosas com acometimento generalizado cronicamente, independente-
intenso eritema e tendência à maceração. mente dos diagnósticos de infecções secundárias e terapias

03-fm1.pdf 82 30/03/20 12:57


Pênfigo crônico familiar ‘‘benigno’’? 77

antibióticas, e não foram identificados gatilhos para eritro- Referências


dermia.
Trata-se, portanto, de um caso de DHH de elevada gra- 1. Hailey H, Hailey H. Familial benign chronic pemphigus. Arch
vidade, com significativa resistência aos tratamentos, em Dermatol. 1939;39:679.
paciente com múltiplas comorbidades e com evolução final 2. Xu Z, Zhang L, Xiao Y, Li L, Lin Z, Yang Y, et al. A case of Hailey-
para o óbito. -Hailey disease in an infant with a new ATP2C1 gene mutation.
Pediatr Dermatol. 2011;28:165.
3. Burge SM. Hailey-Hailey disease: the clinical features, response
Suporte financeiro to treatment and prognosis. Br J Dermatol. 1992;126:275.
4. Chave TA, Milligan A. Acute generalized Hailey-Hailey disease.
Nenhum. Clin Exp Dermatol. 2002;27:290---2.
5. Wolf R, Oumeish OU, Parish LC. Intertriginous eruption Clin
Dermatol. 2011; 29 173-96. Chiaravalloti A, Payette M. Hailey-
Contribuição dos autores
-Hailey disease and review of management. J Drugs Dermatol.
2014;13:1254---7.
Paula Baldissera Tansini: Elaboração e redação do manus- 6. Chiaravalloti A, Payette M. Hailey-Hailey disease and review of
crito. management. J Drugs Dermatol. 2014;13:1254---7.
Ana Letícia Boff: Participação intelectual em conduta 7. Farahnik B, Blattner CM, Mortazie MB, Perry BM, Lear W, Elston
propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados. DM. Interventional treatments for Hailey-Hailey disease. J Am
Magda Blessmann Weber: Participação intelectual em Acad Dermatol. 2017;76:551---8.
conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados. 8. Lobato-Berezo A, Imbernón-Moya A, Aguilar-Martínez A.
Enfermedad de Hailey-Hailey recalcitrante con buena respu-
Renan Rangel Bonamigo: Aprovação da versão final do
esta a terapia fotodinámica. Actas Dermosifiliogr. 2015;106:
manuscrito; participação intelectual em conduta propedêu-
852---4.
tica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do 9. Mashiko M, Akiyama M, Tsuji-Abe Y, Shimizu H. Bacterial
manuscrito. infection-induced generalized Hailey-Hailey disease success-
fully treated by etretinate. Clin Exp Dermatol. 2006;31:57---9.
Conflitos de interesse 10. Otsuka F, Niimura M, Harada S, Ishibashi Y, Shishiba T. Gene-
ralized herpes simplex complicating Hailey-Hailey’s disease. J
Dermatol. 1981;8:63---8.
Nenhum.

03-fm1.pdf 83 30/03/20 12:57


An Bras Dermatol. 2020;95(1):78---81

Anais Brasileiros de
Dermatologia
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DERMATOPATOLOGIA

Dermatoscopia in vivo e ex vivo na implantação


do papilomavírus humano em tatuagens: relato
de dois casos夽,夽夽
a,∗ a b
John Verrinder Veasey , Ana Luisa Nasser Erthal e Rute Facchini Lellis

a
Clínica de Dermatologia, Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
b
Laboratório de Patologia, Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil

Recebido em 6 de novembro de 2018; aceito em 12 de fevereiro de 2019


Disponível na Internet em 13 de fevereiro de 2020

Resumo O número de indivíduos que fazem tatuagem vem crescendo na população mun-
PALAVRAS-CHAVE
dial e, com ele, o de relatos de complicações que variam de reações aos pigmentos injetados
Dermoscopia;
a infecções causadas por agentes inoculados no processo da pigmentação. O diagnóstico de
Histologia
tais eventos indesejados pode ser obtido por meio de métodos complementares não invasivos,
comparada;
preservando ao máximo o desenho da tatuagem. Apresentamos dois casos de pacientes com
Tatuagem;
verrugas sobre tatuagem e correlacionamos seus aspectos clínicos aos dermatoscópicos in vivo
Verrugas
e ex vivo e aos achados no exame histopatológico, para determinar padrões que auxiliem o
diagnóstico dessas lesões sem a biópsia.
© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um
artigo Open Access sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

A prática da ornamentação da pele é um hábito tão antigo tatuagem no corpo2 e 25% na Alemanha.3 No que se refere à
quanto a civilização, e encontrada em múmias do período população brasileira, a prevalência de indivíduos com tatu-
entre 2.000 e 4.000 a.C.1 Atualmente, estima-se que 21% agem varia entre 10% a 26% em homens e 10% a 22% em
da população adulta dos EUA apresentam pelo menos uma mulheres.4
No processo de tatuagem, o indivíduo é exposto a
reações histológicas aos pigmentos (eczematosas, sar-
DOI referente ao artigo: coídeas, granulomatosas, pseudolinfomatosas),4 além de
https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.02.008 infecções provocadas por diferentes patógenos, o que pode
夽 Como citar este artigo: Veasey JV, Erthal ALN, Lellis RF. In vivo
acarretar quadros graves e de difícil tratamento.1,2 Entre
and ex vivo dermoscopy of lesions from implantation of human essas infecções há relatos de aquisição de doenças sistê-
papillomavirus in tattoos: report of two cases. An Bras Dermatol. micas, como hepatite B, hepatite C e infecção pelo HIV,1
2020;95:78---81.
夽夽 Trabalho realizado na Clínica de Dermatologia, Irmandade da e localizadas na pele, como microbacterioses atípicas2,5 e
Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.
verrugas.6
∗ Autor para correspondência. Apresentamos dois casos de pacientes que, após a tatu-
E-mail: johnveasey@uol.com.br (J.V. Veasey). agem, evoluíram com lesões sobre a linha de pigmentação,

2666-2752/© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma licença
CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

03-fm1.pdf 84 30/03/20 12:57


Dermatoscopia in vivo e ex vivo na implantação do papilomavírus humano 79

o diagnóstico clínico, dermatoscópico e histopatológico foi verruciforme papilomatoso na epiderme e presença de pig-
definido como verruga. mento subjacente na derme (fig. 1). O resultado do exame
No primeiro caso, paciente de 39 anos, com tatuagem na histopatológico foi compatível com o de verruga sobre tatu-
face lateral da panturrilha esquerda havia oito anos, referiu agem (fig. 2).
lesões localizadas sobre a tatuagem havia sete anos, um ano No segundo caso, paciente de 33 anos, com tatuagem
após tê-la feito. Negava uso de medicações contínuas, ante- no membro superior esquerdo havia 12 anos, referiu lesões
cedentes pessoais ou uso de tópicos nas lesões. Ao exame, disseminadas havia seis anos sobre o desenho. Apresentava
apresentava numerosas pápulas eritemato-descamativas antecedente pessoal de infecção pelo vírus HIV, em uso de
que variavam entre 3 a 7 mm de diâmetro, dispostas sobre zidovudina, lamivudina, ritonavir e darunavir (carga viral
os contornos da tatuagem, formando trajetos lineares. À indetectável e contagem de células CD4+ 582/mm3 ) e con-
dermatoscopia, foram notadas projeções agrupadas e cur- diloma acuminado genital (múltiplas verrugas de aspecto
tas, de diâmetro e comprimento semelhantes, em padrão papilomatoso) em tratamento. Ao exame físico, apresen-
de ‘‘maçaneta’’, além de capilares glomerulares trom- tava dermatose localizada no membro superior e escapular
bosados, que conferiam aspecto de pontos vermelhos na esquerdo caracterizada por múltiplas pápulas achatadas
superfície da lesão. Feita biópsia incisional com punch e eritemato-descamativas e confluentes, de aspecto diferente
dermatoscopia ex vivo da peça para melhor análise das das lesões genitais, formando placas de limites preci-
estruturas cutâneas e suas alterações, notou-se aspecto sos e bordas irregulares. Algumas lesões acompanhavam o

Figura 1 A, Aspecto clínico da tatuagem com múltiplas pápulas dispostas linearmente. B, Dermatoscopia in vivo (aumento 10×)
evidencia pápulas com projeções digitiformes e pontilhados vermelhos correspondentes a ectasias vasculares. C, Dermatoscopia ex
vivo (aumento 20×) evidencia na porção superior a epiderme com projeções papilomatosas e pontilhados hemorrágicos e presença
de pigmento na derme superficial.

Figura 2 Exame histopatológico do paciente 1, (Hematoxilina & eosina). A, aumento 40×, evidencia epiderme com papilo-
matose, hiperceratose proeminente com paraceratose, hipergranulose, acantose e cristas epidérmicas alongadas e derme com
presença de depósito extracelular de pigmento preto, compatível com pigmento exógeno. B, aumento de 200× evidencia detalhe
de papilomatose. C, aumento de 200× com detalhe do acúmulo do pigmento preto na derme.

03-fm1.pdf 85 30/03/20 12:57


80 Veasey JV et al.

desenho da tatuagem, enquanto outras acometiam pele sã. sanitária dos centros de tatuagem. Outro passo importante
À dermatoscopia apresentou aspecto inespecífico, com pon- foi o de educação dos profissionais da saúde para reconhe-
tos isolados de descamação. Feita biópsia incisional e, assim cimento e tratamento adequado das infecções e reações
como no primeiro caso, foi feita dermatoscopia ex vivo da cutâneas nas tatuagens.2
peça, que evidenciou epiderme levemente espessada com As verrugas são afecções cutâneas frequentes, provo-
discreta papilomatose com presença de pigmento na derme cadas pelo papilomavírus humano (HPV), um DNA vírus de
(fig. 3). O resultado do exame histopatológico foi compatível distribuição universal.7 Disfunções na barreira epitelial por
com o diagnóstico de verruga sobre tatuagem (fig. 4). traumatismos possibilitam a transmissão viral. Nos casos
Relatos de contaminações na pele decorrentes do pro- apresentados, houve quebra da barreira cutânea durante a
cesso de tatuagem têm aumentado nos últimos anos, desde realização das tatuagens com possível inoculação do vírus
doenças infecciosas bacterianas, como microbacterioses durante o processo.3 As verrugas virais na área afetada
atípicas e hanseníase, virais, como verrugas e molusco podem surgir após um período de incubação que geralmente
contagioso, até infecções transmitidas classicamente por varia de três semanas a oito meses.7 Em alguns casos, o
contágio sexual, como a sífilis. Tal aumento estimulou nos período de latência é mais longo, pode chegar a 10 anos, e
Estados Unidos uma ação conjunta da Food and Drug Admi- dificulta a relação entre o surgimento da lesão e a inoculação
nistration (FDA) com o Centers for Disease Control and direta através do procedimento. Nesses casos, propõe-se
Prevention (CDC), a fim de revisar os critérios de vigilância que o desenvolvimento das verrugas dependeria de uma

Figura 3 A, Aspecto clínico da tatuagem com múltiplas pápulas eritematosas discretas e dispostas difusamente, tanto sobre a
tatuagem quanto na pele sã. B, Dermatoscopia in vivo (aumento 10×) evidencia detalhe das pápulas com descamação inespecífica,
sem projeções digitiformes e pontilhados vermelhos. C, Dermatoscopia ex vivo (aumento 20×) evidencia na porção superior a
epiderme pouco espessada e com discretas projeções papilomatosas planas, associadas à presença de pigmento na derme superficial
e média.

Figura 4 Exame histopatológico do paciente 2, (Hematoxilina & eosina). Em A (aumento de 200×) é evidenciada epiderme
hiperceratótica com presença de ceratinócitos balonizados na superfície epidérmica. Na derme há depósito de pigmento preto
exógeno ao redor dos vasos. Em B (aumento de 400×) ficam evidentes o polimorfismo e a hipercromia nuclear, além do citoplasma
amplo e basofílico dos ceratinócitos, caracteriza-se o efeito citopático do HPV. Em C (aumento de 400×) nota-se com detalhe o
pigmento preto da tatuagem depositado ao redor dos vasos.

03-fm1.pdf 86 30/03/20 12:57


Dermatoscopia in vivo e ex vivo na implantação do papilomavírus humano 81

desregulação do sistema imune,8 visto que a imunidade redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação
mediada por células tem papel importante na resposta do dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa;
hospedeiro ao HPV.7 Isso pode ser evidenciado no segundo participação intelectual em conduta propedêutica e/ou
paciente, portador de HIV, que apresentou quadro mais terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura;
extenso e persistente. revisão crítica do manuscrito.
Em uma revisão sobre implantação de verrugas em tatu- Ana Luisa Nasser Erthal: Concepção e planejamento do
agens, foi observado que o risco de se adquirir uma verruga estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, aná-
sobre o pigmento preto é sete vezes maior do que sobre lise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura;
pigmento colorido ou que em pele sem tatuagem.6 Dos revisão crítica do manuscrito.
casos aqui relatados, o primeiro paciente sem comorbidades Rute Facchini Lellis: Obtenção, análise e interpretação
apresentou lesões verrucosas mais restritas à tal coloração, dos dados; participação intelectual em conduta propedêu-
enquanto o segundo apresentou lesões que não respeitavam tica e/ou terapêutica de casos estudados.
a linearidade do pigmento e acometia até pele sã.
A dermatoscopia foi de grande valia nos casos relata- Conflitos de interesse
dos. Aspectos classicamente presentes em verrugas vulgares
e anogenitais são observados nas lesões sobre as tatua- Nenhum.
gens aqui apresentados no primeiro caso,9,10 possibilitaram o
diagnóstico da lesão HPV induzida mesmo sobre o pigmento.
No segundo caso, houve maior dificuldade de identificar Referências
tais aspectos dermatoscópicos, achados também escassos
na apresentação clínica. Um sequenciamento do HPV nesse 1. Lise MLZ, Cataldo Neto A, Gauer JGC, Dias HZJ, Pickering VL.
caso seria muito interessante para caracterizar melhor se Tattooing: profile and discourse of individuals with marks in the
body. An Bras Dermatol. 2010;85:631---8.
a lesão é de um betapapilomavírus e se o HPV do condi-
2. LeBlanc PM, Hollinger KA, Klontz KC. Tattoo ink-related
loma acuminado é o mesmo da tatuagem. Entretanto, não
infections-awareness, diagnosis, reporting, and prevention. N
foi possível fazer tal análise. Engl J Med. 2012;367:985---7.
Outro aspecto ilustrativo deste estudo é a dermatos- 3. Krecké N, Smola S, Vogt T, Müller CSL. HPV-47 Induced and
copia ex vivo, que possibilita a identificação tanto das Tattoo-associated Verrucae Planae: Report of a Case and Review
alterações epidérmicas provocadas pelo HPV quanto das of the Literature. Dermatol Ther (Heidelb). 2017;7:549---54.
dérmicas produzidas pela presença de pigmento da tatua- 4. Bicca JF, Duquia RP, Breunig JA, Souza PRM, Almeida HL Jr.
gem. Tais achados foram compatíveis com os identificados Tattoos on 18 year old male adolescents ? characteristics and
no exame histopatológico. associated factors. An Bras Dermatol. 2013;88:925---8.
A importância do presente estudo consiste em apresentar 5. Sousa PP, Cruz RCS, Schettini APM, Westphal DC. Mycobacterium
abscessus skin infection after tattooing ? case report. An Bras
os aspectos clínicos, dermatoscópicos e histológicos desen-
Dermatol. 2015;90:741---3.
cadeados pela infecção por HPV associado às tatuagens,
6. Ramey K, Ibrahim J, Brodell RT. Verruca localization predomina-
além dos achados da dermatoscopia ex vivo semelhantes tely in black tattoo ink: a retrospective case series. J Eur Acad
aos identificados no exame histopatológico. Enfatizamos a Dermatol Venereol. 2016;30:e34---6.
importância da suspeição clínica da infecção por HPV, mani- 7. Leto MGP, Santos GF Jr, Porro AM, Tomimori J. Human papilloma-
festada pelo surgimento de verrugas após tatuagem, e da virus infection: etiopathogenesis, molecular biology and clinical
necessidade de adoção de medidas de saúde pública que manifestations. An Bras Dermatol. 2011;86:306---17.
tornem esse procedimento mais seguro, com o intuito de 8. Fania L, Sordi D, Pagnanelli G, Mazzanti C, CavanI A. Tattoo
evitar eventos futuros. and warts: efficacy of topical immunotherapy. Eur J Dermatol.
2017;27:322---3.
9. Dong H, Shu D, Campbell TM, Frühauf J, Soyer HP, Hofmann-
Suporte financeiro Wellenhof R. Dermatoscopy of genital warts. J Am Acad
Dermatol. 2011;64:859---64.
Nenhum. 10. Veasey JV, Framil VMS, Nadal SR, Marta AC, Lellis RF. Genital
warts: comparing clinical findings to dermatoscopic aspects,
in vivo reflectance confocal features and histopathologic exam.
Contribuição dos autores An Bras Dermatol. 2014;89:137---40.

John Verrinder Veasey: Aprovação da versão final do manus-


crito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e

03-fm1.pdf 87 30/03/20 12:57


An Bras Dermatol. 2020;95(1):82---90

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REVISÃO

Segurança dos anestésicos locais夽,夽夽



Ana Carolina Figueiredo Pereira Cherobin e Glaysson Tassara Tavares

Serviço de Dermatologia, Hospital das Clínicas, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil

Recebido em 1 de maio de 2019; aceito em 23 de setembro de 2019


Disponível na Internet em 14 de fevereiro de 2020

Resumo Os anestésicos locais são medicamentos essenciais para procedimentos dermatológi-


PALAVRAS-CHAVE cos. Impedem a despolarização das fibras nervosas e são divididos em duas categorias principais:
Anafilaxia; tipo amida e tipo éster. Os efeitos adversos mais temidos são a toxicidade sistêmica, com
Anestésicos locais; repercussões no sistema nervoso central e no sistema cardiovascular, e as reações de hiper-
Efeitos colaterais e sensibilidade, sendo a reação anafilática a mais grave delas. Embora potencialmente fatais,
reações adversas esses eventos são extremamente raros e os anestésicos locais são considerados medicamentos
relacionados a seguros para uso em consultório.
medicamentos © 2020 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um
artigo Open Access sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

Introdução trabalho foi fazer uma revisão sobre a segurança do emprego


dos anestésicos locais com ênfase nos eventos adversos.
Os procedimentos dermatológicos feitos em consultório são
frequentes e abrangem desde biópsias de pequenas lesões a Métodos
procedimentos cosmiátricos e cirurgias complexas e prolon-
gadas. Para torná-los viáveis e bem tolerados, a anestesia
A metodologia usada para a seleção dos artigos foi base-
local é peça fundamental em sua execução. Quando bem
ada na técnica PICO da Medicina Baseada em Evidências,
indicada e usada, é considerada método seguro, que permite
acrônimo para Paciente/População, Intervenção/Indicador,
que a grande maioria dos procedimentos seja executada fora
Comparação/Controle e Outcomes (Desfecho). Neste tra-
do ambiente ambulatorial ou hospitalar.1,2 O objetivo deste
balho, a população são os ‘‘pacientes submetidos a
procedimentos dermatológicos’’, a intervenção são os
‘‘anestésicos locais’’ e o desfecho são os ‘‘eventos adver-
DOI referente ao artigo:
sos’’. Não foi determinado grupo para comparação.
https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.09.025
夽 Como citar este artigo: Cherobin ACFP, Tavares GT. Safety of

local anesthetics. An Bras Dermatol. 2020;95:82---90.


夽夽 Trabalho realizado no Serviço de Dermatologia, Hospital das Resultados e discussão
Clínicas, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG,
Brasil. Os resultados desta revisão foram divididos nos seguin-
∗ Autor para correspondência. tes subtítulos: Mecanismo de ação dos anestésicos
E-mail: anacherobin@yahoo.com.br (A.C. Cherobin). locais, Classificação e farmacocinética, Tipos de anesté-

2666-2752/© 2020 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma licença
CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

03-fm1.pdf 88 30/03/20 12:57


Segurança dos anestésicos locais 83

sicos locais, Efeitos adversos, Técnicas para aplicação, O início de ação acontece de acordo com a proporção de
Segurança dos anestésicos e Situações especiais. moléculas que se transformam na forma terciária ao entrar
em contato com o pH fisiológico (7,4). A constante de
Mecanismo de ação dos anestésicos locais ionização (pKa) do anestésico representa o pH, a metade
das moléculas se encontra no estado terciário e a outra
metade no estado quaternário. A maioria dos anestésicos
A sensação da dor depende da habilidade do sistema nervoso
apresenta pKa semelhante ao pH fisiológico (7,4). Quando
de transmitir os impulsos elétricos através da fibra nervosa.
há inflamação, o ambiente acidificado favorece a forma qua-
Essa propagação ocorre devido a diferentes concentrações
ternária, reduz a proporção de anestésico capaz de penetrar
de eletrólitos entre o meio intracelular, que apresenta maior
nos nervos.5
concentração de potássio (K+ ) e menores concentrações de
A cadeia intermediária pode ser composta por éster ou
sódio (Na+ ), e o meio extracelular, em que as concentrações
por amida, responsável pela classificação dos anestésicos
são invertidas. Esse gradiente iônico é mantido pela bomba
(tabela 1).5,6
de Na+ K+ ATPase (adenosina trifosfatase). Em repouso, a
Os anestésicos tipo-amida são metabolizados pelo fígado
membrana externa do nervo apresenta carga positiva em
e devem ser usados com cautela em pacientes com insufi-
relação ao meio interno, devido à baixa permeabilidade da
ciência hepática. Os anestésicos tipo-éster são degradados
membrana ao Na+ e à ação da bomba, que expulsa três íons
pela pseudocolinesterase plasmática e seus metabólitos
de Na+ para cada dois íons de K+ que são internalizados.3,4
são excretados pela urina. Um de seus metabólitos, ácido
Quando há um estímulo ao nervo, a membrana torna-
para-aminobenzoico (Para-Aminobenzoic Acid --- PABA), é
-se permeável ao Na+ , que se acumula dentro da célula,
responsável pelo risco de reações alérgicas a esse grupo de
culmina em uma despolarização. Essa mudança na perme-
medicamento. Também é conhecido o potencial de reação
abilidade ao Na+ causa uma alteração no potencial elétrico
cruzada entre os anestésicos desse grupo, distintamente do
através da membrana e a propagação desse potencial elé-
que ocorre com os anestésicos do grupo amida.3,5,6
trico é chamada de potencial de ação. O nervo retorna ao seu
A afinidade dos anestésicos às proteínas plasmáticas
estado de repouso ao mudar novamente a permeabilidade da
correlaciona-se à sua afinidade pelas proteínas dos canais
membrana ao Na+ .3---5
de sódio transmembrana. Quanto maior a afinidade, maior
Os anestésicos locais atuam na bomba de Na+ K+ ATPase,
o tempo de ação do anestésico e maior a sua duração
impedem o influxo de sódio e a propagação do estímulo
(tabela 1).5,6
de dor pelas fibras nervosas. Assim, a despolarização não
acontece.2,5
A sensação de dor é propagada pelas fibras não mieliniza- Tipos de anestésicos locais
das (Fibras C), mais sensíveis aos anestésicos locais do que as
mielinizadas (Fibras A e B). Isso permite que sensações como
Existem distintos métodos para se induzir a anestesia local:
vibração e pressão sejam mantidas mesmo após a inibição
tópica, infiltrativa, bloqueio de campo, bloqueio de nervo
completa da dor.2,5
periférico e tumescente. Em todos, há anestesia regional
transitória.3,5
Classificação e farmacocinética A anestesia tópica é aquela em que a substância é
aplicada diretamente na pele ou na mucosa por meio
Os anestésicos locais são compostos por uma estrutura divi- de creme, pomada, gel ou spray. Nesse caso, o agente
dida em três partes: porção aromática (lipofílica), cadeia penetra até a derme papilar e atua nos ramos nervosos
intermediária e grupo amina (hidrofílica). terminais.3,5 Quando o pKa do anestésico se aproxima do
O anel aromático confere a solubilidade lipídica à pH da pele (5,5) e a camada córnea é fina (como em pál-
substância, quanto maior a solubilidade, maior a difu- pebras) ou ausente (mucosas), o composto atravessa a pele
são do anestésico na membrana nervosa. Essa propriedade com maior facilidade.7,8
correlaciona-se à potência do medicamento. A anestesia infiltrativa é obtida através da injeção do
O terminal amina existe na forma terciária (lipossolú- medicamento diretamente na derme ou no subcutâneo,
vel) e na forma quaternária (hidrossolúvel). O anestésico causa inibição direta das terminações nervosas da área
encontra-se na forma quaternária durante sua aplicação. desejada. Quando injetado na derme, o início de ação é

Tabela 1 Características dos anestésicos locais mais empregados na dermatologia

Anestésico Afinidade às Início de ação Tempo de ação Tempo de ação


proteínas sem epinefrina (min) com epinefrina (min)
Tipo amida
Lidocaína 64 2---3 min 30---120 60---400
Mepivacaína 77 3---20 min 30---120 60---400
Bupivacaína 95 5---8 min 120---240 240---480
Tipo éster
Procaína 5,8 5 min 15---30 30---90

Adaptado de Koay et al, 2012 e Park et al, 2017.5,6

03-fm1.pdf 89 30/03/20 12:57


84 Cherobin ACFP, Tavares GT

Tabela 2 Doses preconizadas e categoria na gestação dos anestésicos locais de uso mais comum na dermatologia

Anestésico Dose adulto Dose adulto Dose na criança Dose na criança Categoria
(sem epinefrina) (com epinefrina) (sem epinefrina) (com epinefrina) na gestação
Tipo amida
Lidocaína 4,5 mg/Kg (máx: < 7 mg/Kg 4,5 mg/Kg (300) Até 12 anos: B
300---350) (300---500) 4,5 mg/Kg
(100---150)
> 12 anos:
< 7 mg/Kg
(300---500)
Mepivacaína < 300 mg < 500 mg 4---6 mg/Kg (270) C
Bupivacaína 2 mg/Kg ou 225 mg Segurança e Segurança e C
175 mg (DU) ou eficácia não foram eficácia não foram
400 mg/24h (dose estabelecidos estabelecidos
total)
Ropivacaína 2,9 mg/Kg Segurança e Segurança e B
(200 mg) eficácia não foram eficácia não foram
estabelecidos estabelecidos
Tipo éster
Procaína 350---500 mg 600 mg < 15 mg/Kg C

Adaptado de Koay et al, 2012 e Park et al, 2017.5,6

imediato, porém a aplicação é dolorosa. Se injetado no frina. Em crianças abaixo de 12 anos, a dose máxima é
tecido subcutâneo, a dor tem menor intensidade, porém há de 1,5 a 2,0 mg/Kg/dose (máximo de 150 mg) sem epine-
risco de menor duração do efeito pela reabsorção maior da frina e de 3 a 4,5 mg/Kg/dose (máximo de 150 mg) com
substância.3,5 epinefrina. Para aquelas acima de 12 anos, as doses são
O bloqueio de campo consiste na deposição de solução semelhantes às de adultos. É classificada como categoria B
anestésica em torno do local desejado, de maneira circunfe- na gestação e seu metabolismo hepático ocorre pelo cito-
rencial, para que sejam anestesiados os nervos superficiais cromo P450 (tabelas 1 e 2).1,3,6,9
ou profundos responsáveis pela inervação da região alvo.
Dessa forma, é possível obter-se anestesia com menor Mepivacaína
volume do produto e não há distorção da área a ser A mepivacaína é um anestésico tipo amida com rápido iní-
tratada.3,5 cio de ação e duração de 30 a 120 minutos. A dose máxima
No bloqueio de nervo periférico, o anestésico é inje- permitida é de 300 mg sem epinefrina e de 500 mg com epi-
tado no tronco nervoso principal. Esse método permite nefrina. Em crianças, a dose é de 4---6 mg/Kg/dose (máximo
uma redução expressiva do volume de anestésico necessário de 270 mg) sem epinefrina. Assim como a lidocaína, é meta-
para o procedimento e também preserva o sítio operató- bolizada pelo fígado. Categoria C na gestação (tabelas 1 e
rio de distorção. São amplamente usados em procedimentos 2).3,5,6,10
dermatológicos de face, dáctilo e unhas. Exigem conheci-
mento detalhado da anatomia e experiência do profissional
executante.3,5 Bupivacaína
A anestesia tumescente é semelhante à infiltrativa. A bupivacaína também é anestésica do grupo amida. Seu iní-
No entanto, usam-se doses mais diluídas da substância cio de ação é mais lento em comparação com o da lidocaína
diretamente no local do procedimento. Devido à menor (5 a 8 minutos) e sua duração é prolongada (2 a 4 horas). Sua
concentração do anestésico, é permitido usar-se maior segurança ainda não está bem estabelecida na população
volume com baixo risco de toxicidade. Essa técnica é empre- pediátrica. Em adultos, a dose máxima é de 2 mg/Kg/dose
gada em lipoaspiração, dermoabrasão e implante capilar.5,9 (175 mg em dose única) ou de 400 mg/24 h sem epinefrina.
Com epinefrina, é permitido usarem-se até 225 mg. Para pro-
cedimentos prolongados, seu uso é benéfico. A bupivacaína
tem potencial cardiotóxico e precaução é necessária em
Anestésicos injetáveis
pacientes em uso de betabloqueadores ou digoxina. Cate-
goria C na gestação (tabelas 1 e 2).3,6,10,11
Lidocaína
A lidocaína é um antiarrítmico sistêmico e é, atualmente,
o anestésico injetável mais usado na prática dermatoló- Etidocaína
gica. Seu início de ação é rápido (< 1 minuto) e sua Também pertencente ao grupo amida, seu início se ação
duração é intermediária (30 a 120 minutos). A dose máxima ocorre entre 3 e 5 minutos, com duração de 200 minutos.
permitida para infiltração local em adultos é de 4,5 A dose máxima recomendada é de 4,5 mg/Kg/dose (300 mg)
mg/Kg/dose (máximo: 300---350 mg) sem epinefrina e sem epinefrina e de 6,5 mg/Kg/dose (400 mg) com epine-
de 7 mg/Kg/dose (máximo: 300---500 mg) com epine- frina (tabela 1).1

03-fm1.pdf 90 30/03/20 12:57


Segurança dos anestésicos locais 85

Tabela 3 Dose e área de aplicação máximas recomendadas para o anestésico tópico eutetic mixture of local anesthetics
(EMLA® )

Idade e peso Dose máxima total (g) Área de aplicação Tempo máximo de
recomendados máxima (cm2 ) aplicação (horas)
0---3 meses ou < 5 Kg 1 10 1
3---12 meses e > 5 Kg 2 20 4
1---6 anos e > 10 Kg 10 100 4
7---12 anos e > 20 Kg 20 200 4

Adaptado de Sobanko et al, 2012.8

Prilocaína Lidocaína
O anestésico do grupo amida prilocaína tem início de A lidocaína é a substância mais usada em anestésicos, tanto
ação entre 5 e 6 minutos e duração intermediária, que de forma isolada quanto associada a outro componente. É do
varia de 30 a 120 minutos. Sua dose máxima permitida é grupo amida, o que a torna menos alergênica. É classificada
de 5,7 a 8,5 mg/Kg/dose (máximo de 400 mg) sem epinefrina como categoria B na gestação, porém deve-se ficar atento
e de 600 mg com epinefrina. Crianças abaixo de 10 anos não com lactantes, devido à sua excreção no leite materno.8,13
devem usar doses acima de 40 mg/dose sem epinefrina. Seu
metabolismo é hepático e renal. Há risco de metemoglobi- Lidocaína 4% (Dermomax® )
nemia se usadas doses superiores a 8 mg/Kg devido ao seu A lidocaína em creme é o anestésico tópico mais usado no
metabólito ortotoluidina.1,3,6 mundo, isoladamente ou associado a outras substâncias.8
No Brasil, é vendida em creme a 4%. Sua absorção sistêmica
varia de acordo com o local e a extensão da área tratada.
Ropivacaína Após aplicação de 60 g do creme em uma área de 400 cm2 ,
A ropivacaína é anestésico tipo amida com início de ação o pico sérico atinge 0,05 a 0,16 ␮g/mL. Níveis tóxicos da
lento (1 a 15 minutos) e longa duração (2 a 6 horas). substância (> 5 ␮g/mL) provocam alterações do sistema car-
A dose máxima permitida é de 2,9 mg/Kg/dose sem adição diovascular e do sistema nervoso central. Em crianças de
de epinefrina (máximo de 200 mg). Sua segurança não até 10 Kg, a área máxima de aplicação é de 100 cm2 ; naque-
foi confirmada em crianças. Assim como os anestésicos do las que pesam entre 10 e 20 Kg, a área máxima permitida é
grupo, é metabolizada pelo fígado. Apresenta ação vaso- de 200 cm2 . É classificado como categoria B na gestação.8,13
constritora. Categoria B na gestação (tabela 2).6,12
Lidocaína 2,5% + prilocaína 2,5% (EMLA® )
Um dos anestésicos tópicos mais usados, é composto
Articaína pela associação de lidocaína 2,5% e prilocaína 2,5%.
Anestésico do grupo amida, apresenta rápido início de A absorção sistêmica depende da duração da aplicação,
ação (2 a 4 minutos) e duração semelhante à da lidocaína da localização anatômica e da extensão da área tratada.
(30 a 120 minutos). A dose máxima é de 7 mg/Kg/dose Oclusão e aplicação prolongada aumentam a penetração da
(350 mg) sem epinefrina e de 500 mg com epinefrina. Em medicação. A analgesia alcança até 3 mm de profundidade
crianças acima de 4 anos, a dose máxima recomendada é após 60 minutos de aplicação e até 5 mm após 120 minutos.
de 7 mg/Kg/dose. Seu metabolismo é hepático e é conside- O uso de 60 g da medicação em 400 cm2 de superfície corpo-
rado categoria C na gestação.6 ral ocluída oferece baixo risco de toxicidade. Em neonatos, é
permitido usar-se até 1 g do anestésico por, no máximo, uma
hora. É classificada como categoria B na gestação (tabela
Procaína 3).8,13
A procaína é anestésico tipo éster que apresenta início
de ação em 5 minutos e duração curta (30 a 60 minu- Lidocaína 7% + tetracaína 7% (Pliaglis® )
tos). A dose máxima em adultos é de 10 mg/Kg/dose A formulação de lidocaína 7% e tetracaína 7% em creme
(350 a 500 mg) sem epinefrina e de 14 mg/Kg/dose (600 mg) forma uma película na superfície cutânea, que contribui
com epinefrina. Em crianças, usam-se até 15 mg/Kg/dose para sua absorção local. O composto penetra até 6,8 mm de
sem epinefrina. Apresenta, como outros anestésicos profundidade na pele e deve ser aplicado com 30 minutos
dessa categoria, metabolismo plasmático. Categoria C na de antecedência ao procedimento. Reações locais incluem
gestação (tabelas 1 e 2).1,6 eritema, palidez e edema.8

Epinefrina
Anestésicos tópicos A epinefrina (adrenalina) é um vasoconstritor habitualmente
associado aos anestésicos locais (1 a 2:100.000). Permite
Os anestésicos tópicos estão disponíveis em distintas uma reabsorção sistêmica mais lenta do anestésico, pro-
preparações e veículos. As misturas permitem que os com- longa seu efeito, reduz seu pico plasmático e promove
postos se encontrem em estado líquido e em concentrações hemostasia. Deve ser usada com cautela em pacientes trata-
mais elevadas, porém ainda seguras.13 dos com ␤-bloqueadores ou naqueles portadores de doenças

03-fm1.pdf 91 30/03/20 12:57


86 Cherobin ACFP, Tavares GT

cardiovasculares, doença vascular periférica, hipertensão lentificação da fala, gosto metálico, diplopia, alterações
grave, feocromocitoma e hipertireoidismo. Alguns estudos, auditivas e alucinações. Hipertensão arterial e taquicar-
no entanto, demonstraram que é segura quando usada dia podem estar associadas. Com a progressão, há sinais
em pequenas doses em pacientes com doenças cardíacas de depressão do sistema nervoso, culminam com depres-
estáveis.1,6,14 são respiratória (concentração sérica de lidocaína acima
A adição de epinefrina aos anestésicos locais também de 15 ␮g/mL). Os efeitos cardiovasculares surgem mais
se comprovou segura em locais de vascularização terminal, tardiamente e incluem: depressão do miocárdio, prolonga-
como dáctilos, mãos, pés e região genital.1,15 mento do intervalo de condução, bradicardia, hipotensão e
É considerada categoria C na gestação. A propriedade falência cardíaca (concentração sérica de lidocaína acima
alfa-adrenérgica da epinefrina pode causar vasoconstrição de 20 ␮g/mL).1,5,17
no plexo sanguíneo da placenta. No entanto, é conside- Embora potencialmente grave, a toxicidade sistêmica é
rada segura se usada em baixas doses em grávidas, pois extremamente rara. A dose de anestésicos locais necessária
seu efeito vasoconstritor limita a absorção sistêmica e a para a maioria dos procedimentos dermatológicos é muito
sua transferência à placenta. Recomenda-se que seu uso em inferior à recomendada para cada anestésico: a toxicidade
gestantes seja, sempre que possível, adiado para o período sistêmica está associada a doses elevadas da medicação.1
pós-parto.1,16 Vasques et al. publicaram uma revisão da literatura e
As concentrações usadas variam entre 1:50.000 e identificaram 67 casos de toxicidade sistêmica descritos
1:200.000, as de 1:100.000 e 1:200.000 são as mais usadas. em 54 artigos entre 2010, ano da publicação do algoritmo
Nessas concentrações, apresentam efeitos semelhantes na de conduta na LAST pela Sociedade Americana de Anes-
vasoconstrição e prolongam a duração da lidocaína em cerca tesia Regional e Medicina da Dor, e 2014. Do total, oito
de 200%.1 casos surgiram após infusão contínua de anestésico local
e dois ocorreram após aplicação inadvertida do anestésico
em vaso por meio de cânula venosa. A técnica de aplicação
Efeitos adversos
foi adequada em 78% dos 50 pacientes que receberam dose
única do anestésico local. Entre esses, 23% de toxicidade
Os anestésicos locais são considerados muito seguros quando sistêmica surgiram após bloqueio interescaleno, 16% após
usados corretamente. Entretanto, embora raros, alguns bloqueio epidural e 13% após bloqueio peniano. Pacientes
efeitos adversos podem ocorrer, alguns deles com repercus- menores de um ano foram os mais acometidos (22%). Sete
são sistêmica. casos estavam associados a anestésicos tópicos (não inje-
As reações indesejadas podem ser divididas em duas táveis), cinco deles em crianças, quatro tinham idade de
categorias: aquelas associadas à penetração da agulha na até quatro anos. Em apenas dois pacientes a toxicidade
pele e aquelas associadas à solução anestésica. Entre as sistêmica ocorreu com dermatologistas: duas crianças evo-
primeiras, destacam-se dor, edema, equimose, infecção, luíram para quadro de metemoglobinemia após aplicação de
hematoma, hiperalgesia e trismo muscular.5 A reações asso- EMLA® .17
ciada à solução são a toxicidade local ou sistêmica, reações O trabalho prospectivo de Starling et al. demonstrou que
alérgicas e idiossincrásicas.5 procedimentos dermatológicos feitos em consultório apre-
sentam taxas muito baixas de complicações. Em dez anos de
Toxicidade local estudo nos estados da Flórida e do Alabama, Estados Unidos,
não foi notificada complicação relacionada a anestésicos
A toxicidade local é atribuída ao efeito direto do anestésico locais em procedimentos com dermatologistas.2
no local de aplicação e está associada, em muitos casos, à O estudo longitudinal de Alam et al. incluiu uma pes-
técnica incorreta. São exemplos a dor, tanto pela substância quisa com 437 cirurgiões dermatológicos nos Estados Unidos
quanto pela distensão do tecido no local da aplicação, o e também não mostrou casos de intoxicação pela lidocaína
hematoma, a infecção, dilaceração de estruturas nervosas nos procedimentos cirúrgicos feitos por 10 dias consecutivos
e necrose isquêmica.5,6 pelos médicos. A dose máxima do medicamento usada foi
de 6,54 mL em excisões e de 15,85 mL nas reconstruções.
A incidência de eventos adversos relacionados à anestesia
Toxicidade sistêmica local foi de 0,15%, em 0,13% as reações foram moderadas
(tontura, sonolência e taquicardia pela epinefrina).20
A toxicidade sistêmica dos anestésicos locais (LAST --- local Uma série de 20.021 pacientes foi analisada por Barring-
anesthetic systemic toxicity) é considerada o evento ton e Kluger em um estudo multicêntrico da Austrália e
adverso mais grave e com potencial de óbito. Ocorre da Nova Zelândia de janeiro de 2007 a maio de 2012. Os
quando há elevação do nível plasmático do anestésico pacientes foram submetidos a 25.336 bloqueios de nervos
acima das doses recomendadas. Pode surgir abruptamente periféricos, sem e com auxílio da ultrassonografia. Paci-
após aplicação direta do anestésico na circulação san- entes menores de 13 anos foram excluídos do trabalho.
guínea de forma inadvertida, ou de maneira mais lenta, Houve 22 episódios de toxicidade sistêmica, resultaram em
com a elevação dos níveis séricos do anestésico, após uma incidência de 0,87 por 1.000 bloqueios feitos. Apenas
aplicação de doses excessivas ou redução do metabolismo um paciente evoluiu para falência cardíaca após injeção
do medicamento.1,5,17---19 intravascular direta do anestésico em procedimento de blo-
Inicialmente, o paciente apresenta sinais de ativação do queio paravertebral. O sítio de injeção, o tipo de anestésico
sistema nervoso central, que tendem a se apresentar de usado, a dose por peso e o peso do paciente foram fatores
maneira progressiva: parestesia perioral, parestesia facial, preditores para a ocorrência da complicação.21

03-fm1.pdf 92 30/03/20 12:57


Segurança dos anestésicos locais 87

Sites et al. não identificaram caso de falência cardíaca Reação vasovagal


em um trabalho prospectivo com 12.668 pacientes subme- É resultante da ansiedade e da percepção de dor e medo
tidos a anestesia regional periférica de julho de 2003 a pelo paciente à agulha ou ao procedimento. Resulta em
fevereiro de 2011 em hospital dos Estados Unidos. Apenas estimulação do sistema parassimpático e os sintomas que
um caso de toxicidade sistêmica ocorreu (incidência de 0,08 podem se assemelhar à reação alérgica: tontura, sudorese,
por 1.000).22 náuseas, bradicardia e hipotensão. Em casos extremos, há
O tratamento da toxicidade sistêmica consiste em sus- síncope. O tratamento consiste em acalmar o paciente,
pender imediatamente a aplicação do anestésico e solicitar colocá-lo em posição de Trendelenburg e aplicar compressas
assistência médica de urgência. Em seguida, iniciar procedi- frias na fronte.24
mentos de suporte básico ou avançado de vida: preservação
de vias aéreas e do sistema cardiovascular. O tratamento Anestésicos tópicos
específico em casos de falência cardíaca é feito com a tera-
pia de emulsão lipídica a 20%.5,6
As reações locais aos anestésicos tópicos incluem eritema,
palidez e edema. Orienta-se evitar a aplicação dos cremes
anestésicos diretamente em olhos, mucosa oral e conduto
Reações de hipersensibilidade
auditivo interno, devido ao risco de irritação local. Além
disso, a aplicação em mucosa genital exige cautela quanto
Reação tipo I (mediada por IgE) à quantidade de medicamento usado.8
Estima-se que a prevalência da alergia mediada por Reações sistêmicas, embora raras, podem ocorrer, como
IgE aos anestésicos seja menor do que 1%.6 A revisão metemoglobinemia, alterações do sistema nervoso central
de Bhole et al., publicada em 2012, avaliou 23 séries de e cardiotoxicidade.
casos que incluíam 2.978 pacientes, entre 1950 e 2011. A metemoglobinemia é uma preocupação particular-
Apenas 23 apresentaram verdadeira reação de hipersensi- mente especial na população pediátrica, devido ao metabo-
bilidade do tipo I aos anestésicos tópicos.23 lismo ainda imaturo da metemoglobina até os 3 meses.6 Ela
As reações locais são as mais comuns e incluem o surgi- pode ocorrer com o uso do EMLA® : a prilocaína tem o poten-
mento de urticas ou de angioedema sem comprometimento cial de impedir o transporte de oxigênio pela hemoglobina.8
respiratório. O tratamento consiste na administração de Níveis de metemoglobina de 15% a 30% resultam em cia-
anti-histamínicos e observação cautelosa do paciente.24 nose. Níveis de 30% a 50% resultam em dispneia, taquicardia
Os sintomas da reação de hipersensibilidade sistêmica e cefaleia. Acima de 50%, causam letargia e coma.8
imediata (anafilaxia) ocorrem nos primeiros 30 minutos da A revisão de Tran e Koo, publicada em 2014,
exposição ao anestésico e devem ser imediatamente iden- incluiu 12 estudos sobre a segurança do anestésico tópico
tificados pelo médico. Em geral, dois ou mais sistemas são EMLA® . Foram identificados 12 casos de LAST; desses, nove
envolvidos ou há evidências de comprometimento respirató- eram crianças.28
rio ou cardiovascular. Os sintomas incluem dispneia, tosse, A formulação de lidocaína 7% e tetracaína 7% em creme
sibilos, hipotensão e taquicardia. O tratamento deve ser apresenta risco de eritema e palidez moderados e transitó-
imediatamente instituído com a aplicação de vasoconstri- rios no local da aplicação.8
tores (epinefrina) por via intramuscular.24 É importante observar que algumas técnicas podem
Em casos de reação alérgica, pode-se tentar o uso de aumentar a absorção dérmica dos anestésicos tópicos ao
anestésicos do tipo éster, devido à baixa reação cruzada se remover a camada córnea da pele, como o laser
entre eles e os anestésicos do grupo amida. Outras opções ablativo.29 A aplicação do produto em superfícies inflamadas
seriam a aplicação de difenidramina ou solução salina bacte- ou em extensas áreas de superfície corporal também podem
riostática (álcool benzil 0,9% em solução salina) em biópsias aumentar o risco de absorção e toxicidade.8
ou pequenas excisões cutâneas.1 Ao se identificarem sinais de toxicidade pelo anesté-
sico tópico, o medicamento deve ser imediatamente lavado
Reação tipo IV (tardia) da superfície cutânea. O paciente deve ser colocado na
A reação de hipersensibilidade tardia inclui a dermatite posição supina e os sinais vitais devem ser avaliados. O tra-
de contato alérgica. Segundo o estudo retrospectivo de To tamento específico deve ser iniciado de acordo com os sinais
et al., que analisou 1.819 pacientes submetidos a patch e sintomas.8
teste no Canadá, a incidência chega a 2,4%. O alérgeno mais
comum é a benzocaína (45%), seguido pela lidocaína (32%) Técnicas para aplicação
e dibucaína (23%).25 Nos Estados Unidos, estima-se que a
incidência seja de 3,4%.26 A técnica correta de aplicação dos anestésicos permite que
O quadro clínico surge após 24 a 48 horas da exposição ao o procedimento seja seguro e confortável. O médico deve
agente e é caracterizado por eritema, edema, descamação, usar luvas e fazer a antissepsia adequada da pele. Sugere-
infiltração, bolhas e crostas na pele. Os sintomas incluem -se marcar a área a ser tratada previamente à aplicação
ardor e prurido.27 do anestésico, para evitar distorção do local com o volume
Pacientes que apresentam patch teste positivo para lido- injetado da medicação.5
caína devem ser submetidos à injeção intradérmica de Sempre que possível, deve-se optar pelo uso de agulhas
lidocaína 0,1% para confirmação da dermatite de contato finas e curtas, que causam menor desconforto. Infusão lenta,
alérgica à substância. Outros anestésicos locais também vibração da pele, uso de solução morna, resfriamento da
devem ser testados.25 pele e o mínimo de injeções na pele também auxiliam no

03-fm1.pdf 93 30/03/20 12:57


88 Cherobin ACFP, Tavares GT

conforto. A injeção do líquido no plano subcutâneo é menos Em 2012, Walsh et al. demonstraram que o conhecimento
dolorosa do que aquela na derme. Em alguns casos, princi- dos dermatologistas acerca das doses e da toxicidade dos
palmente nas crianças, indica-se a aplicação de anestésico anestésicos locais é satisfatório. No entanto, o tratamento
tópico na pele previamente ao injetável.1,5 da toxicidade sistêmica com a emulsão lipídica foi corre-
Para anestésicos tópicos, recomenda-se a aplicação em tamente acertado por 21,7% dos participantes do trabalho,
pele intacta, livre de erosão ou eczema. Devem-se evitar índice considerado baixo pelos autores.36
o contato da medicação com a mucosa ocular e o uso de O trabalho retrospectivo de Kvisselgaard et al. descar-
anestésicos do grupo amida em pacientes com insuficiência tou reação de hipersensibilidade em todos os 164 pacientes
hepática e do anestésico EMLA® em recém-nascidos.8 incluídos no estudo, previamente encaminhados à clínica de
Alergologia e Imunologia com suspeita de reação do tipo I a
anestésicos locais, de 2010 a 2014. Os autores consideram
Segurança dos anestésicos que esse evento seja raro com essas medicações.37
Embora os efeitos adversos aos anestésicos sejam pouco
Segundo as diretrizes americanas publicadas em 2016, os frequentes, recomenda-se cautela em seu uso. A seleção da
anestésicos locais são considerados medicamentos seguros medicação adequada, a identificação dos sinais de risco e
para uso em procedimentos dermatológicos feitos em con- o manejo das complicações são conhecimentos primordiais
sultório. Os episódios de toxicidade sistêmica e de reação para o médico dermatologista.6
anafilática aos anestésicos locais são eventos raros e mui-
tos autores recomendam procedimentos cirúrgicos fora do
ambiente hospitalar.1,2,30---32 Situações especiais
O estudo prospectivo de Starling et al., publicado em
2012, coletou dados sobre complicações de procedimen- Gestação e lactação
tos ambulatoriais nos estados da Flórida, de 2000 a 2010,
e no Alabama, de 2003 a 2009, ambos nos Estados Uni-
A lidocaína é considerada categoria B na gestação e a
dos. No primeiro estado, foram reportados 46 óbitos e
epinefrina, categoria C.1,16 Recomenda-se cautela no uso
263 complicações de procedimentos, 45% ocorreram com
dos anestésicos nessa categoria de pacientes devido ao
cirurgiões plásticos. Apenas quatro complicações ocorreram
aumento da sensibilidade local e da absorção sistêmica
com dermatologistas, sem óbitos (1,3% dos casos): um epi-
dessas medicações nessa fase. Deve-se evitar a injeção
sódio de reação vasovagal após lipoaspiração em paciente
intravascular devido ao risco de cardiotoxicidade materna
submetido à anestesia geral; um caso de fibrilação atrial
e fetal.38
de curta duração em paciente submetido à excisão cutâ-
nea; uma excisão cirúrgica incorreta em cirurgia de Mohs
e um episódio de queimadura de segundo grau em paciente
acamado e em uso de oxigênio domiciliar sedado para o pro-
População pediátrica e idosos
cedimento dermatológico. No Alabama, foram notificados
três óbitos e 49 complicações de procedimentos ambula- A aplicação de anestésicos locais na população pediátrica
toriais. A cirurgia plástica foi a especialidade médica com exige cautela. É importante diferenciar os sinais de medo e
maior índice de complicações (42,3% dos casos). Apenas dor daqueles efeitos do sistema nervoso central.6 Em neona-
uma complicação ocorreu com dermatologista, não evoluída tos, a absorção mucocutânea é maior e mais rápida do que
para óbito, correspondeu a 1,3% dos casos: um paciente em adultos e há menor ligação dos anestésicos às proteínas
apresentou infecção por Staphylococcus aureus meticilina- plasmáticas, resulta em risco elevado de intoxicação.39
-resistente após exérese de melanoma. Não foi relatada Nos idosos, o clearance (depuração) dos anestésicos
complicação após procedimentos cosméticos com anestesia locais está reduzido devido à disfunção orgânica e circulação
local feitos por dermatologistas.2 comprometida. Além disso, mudanças neuronais deixam
O trabalho de Hanke, Bernstein e Bullock esses pacientes mais sensíveis a essas medicações. Em mui-
incluiu 15.336 pacientes submetidos a lipoaspiração tos casos, doses menores são exigidas para se obter a mesma
com anestesia tumescente feita por cirurgiões dermatoló- analgesia.6,40
gicos e mostrou complicações em apenas 0,38% dos casos.
Dois pacientes tiveram arritmia cardíaca e dois apresenta-
ram taquicardia persistente. Nenhum óbito foi reportado.33 Comorbidades
Klein e Jeske também demonstraram níveis séricos seguros
de lidocaína com o uso de doses elevadas da anestesia A disfunção hepática pode afetar a circulação sistêmica dos
tumescente em pacientes submetidos a lipoaspiração.34 anestésicos locais. A insuficiência renal e uremia podem
O coorte prospectivo de Alam et al. obteve resultados aumentar a absorção local dessas medicações e reduzir o
semelhantes em 19 pacientes submetidos a cirurgia micro- clearance da ropivacaína e da bupivacaína.6,38
gráfica de Mohs. Os autores mediram seis níveis séricos de Circulação sanguínea alterada reduz o metabolismo das
lidocaína aplicada em três tempos durante o procedimento substâncias no fígado e nos rins, leva à redução do clearance
cirúrgico. Não houve elevação dos níveis séricos de lido- do anestésico. A insuficiência cardíaca reduz a absorção
caína a doses tóxicas mesmo naqueles procedimentos que local desses medicamentos devido à baixa perfusão teci-
usaram doses mais elevadas do anestésico: o valor mais dual. Entretanto, há risco de aumento das concentrações
elevado de lidocaína sérica encontrado pelos autores foi do anestésico no sistema nervoso central. A epinefrina deve
de 0,3 ␮g/mL.35 ser usada com cautela ou evitada em alguns casos.6,38

03-fm1.pdf 94 30/03/20 12:57


Segurança dos anestésicos locais 89

Considerações finais 2. Starling J III, Thosani MK, Coldiron BM. Determining the safety
of office-based surgery: what 10 years of Florida data and 6
years of Alabama data reveal. Dermatol Surg. 2012;38:171---7.
Os anestésicos locais podem ser considerados medicamen-
3. Auletta MJ. Local anesthesia for dermatologic surgery. Semin
tos seguros para o uso do médico dermatologista. Embora
Dermatol. 1994;13:35---42.
alguns efeitos adversos sejam considerados graves, como a 4. Skidmore RA, Patterson JD, Tomsick RS. Local anesthetics. Der-
toxicidade sistêmica e a reação anafilática, sua ocorrência matol Surg. 1996;22:511---22.
é rara. O manejo correto da medicação, a técnica adequada 5. Koay J, Orengo I. Application of local anesthetics in dermatolo-
de aplicação e o conhecimento dos eventos adversos e de gic surgery. Dermatol Surg. 2012;38:171---7.
seu tratamento específico reduzem os riscos associados ao 6. Park KK, Sharon VR. A review of local anesthetics: minimi-
anestésico local e torna sua aplicação viável em consultório. zing risk and side effects in cutaneous surgery. Dermatol Surg.
Em 18 de setembro de 2017 entraram em vigor as novas 2017;43:173---87.
regras de funcionamento para consultórios médicos pri- 7. Huang W, Vidimos A. Topical anesthetics in dermatology. J Am
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Foram mantidos como Consultório de Dermatologia do lidocaine doses of 35 mg/kg for liposuction. J Dermatol Surg
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onde se usam apenas anestésicos locais sem sedação. Nesse 11. Wahl MJ, Schmitt MM, Overton DA, Gordon MK. Injection pain
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rent trends in local anesthesia in cosmetic plastic surgery of
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De acordo com as evidências mostradas neste trabalho 2005;115:1723---30.
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a respeito das exigências da atual resolução em vigor. Proce- 14. Figallo MAS, Cayon RTV, Lagares DT, Flores JRC, Portillo GM.
dimentos dermatológicos como exérese de pequenas lesões Use of anesthetics associated to vasoconstrictors for dentistry
cutâneas, que exigem doses seguras de anestésicos locais in patients with cardiopathies Review of the literature published
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15. Häfner HM, Schmid U, Moehrle M, Strölin A, Breuninger H. Chan-
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lidocaine with and without an adrenaline additive: a double-
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obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica anesthetic systemic toxicity: 2012 version. Reg Anesth Pain Med.
da literatura; revisão crítica do manuscrito. 2012;37:16---8.
Glaysson Tassara Tavares: Aprovação da versão final 19. Lirk P, Picardi S, Hollmann MW. Local anaesthetics: 10 essenti-
als. Eur J Anaesthesiol. 2014;31:575---85.
do manuscrito; concepção e planejamento do estudo;
20. Alam M, Schaeffer MR, Geisler A, Poon E, Fosko SW, Srivas-
participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crí-
tava D. Safety of local intracutaneous lidocaine anesthesia
tica do manuscrito. used by dermatologic surgeons for skin cancer excision and
postcancer reconstruction: quantification of standard injec-
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Conflitos de interesse 1320---4.
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90 Cherobin ACFP, Tavares GT

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An Bras Dermatol. 2020;95(1):91---94

Anais Brasileiros de
Dermatologia
www.anaisdedermatologia.org.br

DERMATOLOGIA TROPICAL/INFECTOPARASITÁRIA

Hanseníase na população idosa em estado endêmico do


nordeste brasileiro (2001---2017): cenário
epidemiológico夽,夽夽
Carlos Dornels Freire de Souza a,b,∗ , Tânia Rita Moreno de Oliveira Fernandes c,d
,
Thais Silva Matos e,f e Clódis Maria Tavares g,h

a
Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
b
Curso de Medicina da Universidade Federal de Alagoas, Arapiraca, AL, Brasil
c
Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
d
Curso de Medicina da Universidade Federal do Vale do São Francisco, Petrolina, PE, Brasil
e
Programa de Ciências Biológicas e da Saúde da Universidade Federal do Vale do São Francisco, Petrolina, PE, Brasil
f
Centro de Referência em Hanseníase Dr Altino Lemos Santiago, Juazeiro, BA, Brasil
g
Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
h
Escola de Enfermagem e Farmácia, Universidade Federal de Alagoas, Maceió, AL, Brasil

Recebido em 25 de julho de 2018; aceito em 13 de janeiro de 2019


Disponível na Internet em 17 de fevereiro de 2020

Resumo Objetivou-se analisar a tendência e as características da hanseníase em idosos na


PALAVRAS-CHAVE
Bahia, de 2001 a 2017. Estudo ecológico. A tendência foi analisada com o modelo joinpoint
Envelhecimento;
regression. Variáveis epidemiológicas também foram incluídas no estudo. A taxa de detecção
Hanseníase;
média foi de 38,73/100.000, com prevalência nos homens (45,19/100.000). Tendência de
Mycobacterium
redução ocorreu em ambos os gêneros a partir de 2004, foi maior nas mulheres (APC = -3,4%).
leprae
Os homens apresentaram maiores proporções das formas multibacilares e de incapacidades físi-
cas. O cenário epidemiológico sinaliza a necessidade de implantação de ações que favoreçam
o diagnóstico precoce e o tratamento oportuno da doença na população idosa.
© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um
artigo Open Access sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

DOI referente ao artigo:


https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.01.011
夽 Trabalho realizado na Universidade Federal de Alagoas, Maceió, AL, Brasil.
夽夽 Como citar este artigo: Souza CDF, Fernandes TRMO, Matos TS, Tavares CM. Leprosy in the elderly population in an endemic state in

the Brazilian northeast (2001-2017): epidemiological scenario. An Bras Dermatol. 2020;95:91---4.


∗ Autor para correspondência.

E-mail: carlos.freire@arapiraca.ufal.br (C.D. Souza).

2666-2752/© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma licença
CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

03-fm1.pdf 97 30/03/20 12:57


92 Souza CDF et al.

O Brasil contribui com 92,3% de todos os casos novos Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com
de hanseníase registrados nas Américas. Apenas três países acesso em março de 2018.
(Brasil, Índia e Indonésia) somaram 80,2% de todos os casos A primeira etapa consistiu na análise da tendência da
do mundo em 2017.1 Nesse mesmo ano, o Brasil registrou taxa de detecção de novos casos, estratificada segundo
26.875 novos casos da doença, dos quais 2.225 (8,28%) em gênero. Foi usado o modelo de regressão segmentada
residentes na Bahia.2 (joinpoint regression).4 A tendência foi classificada em cres-
O envelhecimento caracteriza-se por importantes cente, decrescente ou estacionária. Além disso, calculou-se
transformações físicas, funcionais, biológicas e psicossociais o percentual de variação anual (annual percent change -
que ampliam o risco de desenvolvimento de determinadas APC) e a média de variação do período (average annual per-
doenças.3 Desse modo, o processo de envelhecimento da cent change - AAPC), com intervalo de confiança de 95%
população brasileira, produto da transição demográfica, (95% IC). Por usar dados secundários de domínio público,
justifica a necessidade de entender como a hanseníase dispensou-se a autorização do Comitê de Ética em Pesquisa.
tem afetado essa faixa etária. Além disso, as análises A segunda etapa caracterizou-se pela análise epidemioló-
estratificadas segundo gênero, conforme recomendação gica das seguintes variáveis: gênero, faixa etária, etnia/cor,
da Organização Mundial de Saúde (OMS), têm especial escolaridade, forma clínica, classificação operacional, modo
relevância, uma vez que permitem captar nuances do de detecção e grau de incapacidade física no momento do
processo de adoecimento em cada subgrupo populacional.1 diagnóstico.
Nesse sentido, objetivou-se analisar a tendência e as Foram diagnosticados 8.843 novos casos de hanseníase na
características epidemiológicas da hanseníase na população população baiana com 60 anos ou mais. A taxa de detecção
idosa da Bahia de 2001 a 2017. média foi de 38,73/100.000, com prevalência nos homens
Foi conduzido um estudo ecológico. Os dados referen- (45,19/100.000) em relação às mulheres (33,54/100.000).
tes aos novos casos foram obtidos do Sistema Nacional de Considerando que o número de casos de hanseníase no
Agravos de Notificação (Sinan) e os dados populacionais do Brasil tem sido questionado por pesquisadores,5 o cenário

Taxa de detecção de hanseníase Taxa de detecção de hanseníase


em idosos (ambos os gêneros) em idosos (Homens)
Casos novos por 100,000 habitantes

Casos novos por 100,00 habitantes

60 65

55 60
55
50
50
45
45
40
40
35 35
30 30

25 25
2000 2002 2004 2006 2008 2010 2012 2014 2016 2018 2000 2002 2004 2006 2008 2010 2012 2014 2016 2018
Ano Ano
Taxa observada Taxa observada
APC = 13,9% CI 95%: 4,7 a 23,9 (p<0,001) APC = 14,5% CI 95%: 0,5 to 30,5 (p<0,001)
APC = -2,8% CI 95%: -3,6 a -1,9 (p<0,001) APC = -2,2% CI 95%: -3,5 to -0,8 (p<0,001)

Taxa de detecção de hanseníase


em idosos (Mulheres)
Casos novos por 100,00 habitantes

55

50 Tendência 2001-2017

45 Ambos os gêneros:
40
AAPC = 0,2 CI 95%: -1,4 a 1,7 (p=0,8)
35
Homens:
30
AAPC = 0.7 CI 95% : -1,7 a 3,2 (p=0,6)
25
Mulheres:
20
2000 2002 2004 2006 2008 2010 2012 2014 2016 2018 AAPC = -0,4 CI 95% : -1,8 a 0,9 (p=0,5)

Ano
Taxa observada
APC = 13,5% CI 95%: 5,1 to 22,2 (p<0,001)
APC = -3,4% CI 95%: -4,1 to -2,6 (p<0,001)

Figura 1 Tendência da taxa de detecção de casos novos de hanseníase na população idosa, segundo gênero. Bahia, Brasil,
2001---2017. AAPC, average annual percent change (média da variação percentual anual); APC, annual percent change (percentual
de variação anual); IC, intervalo de confiança.

03-fm1.pdf 98 30/03/20 12:57


Hanseníase na população idosa em um estado endêmico do nordeste brasileiro 93

Tabela 1 Caracterização sociodemográfica e clínica dos casos de hanseníase diagnosticados na população idosa --- Bahia, Brasil,
2001---2017

Variável Homens Mulheres Total


n (%) n (%) n (%)
4.610 (52,13%) 4.233 (47,87%) 8.843 (100%)
Faixa etária
60---69 2.691 (58,37%) 2.426 (57,31%) 5.117 (57,86%)
70---79 1.423 (30,87%) 1.263 (29,84%) 2.686 (30,38%)
80 ou + 496 (10,76%) 544 (12,85%) 1.040 (11,76%)
Etnia
Branca 965 (20,93%) 897 (21,19%) 1.862 (21,06%)
Preta 754 (16,36%) 646 (15,26%) 1.400 (15,83%)
Amarela 25 (0,54%) 29 (0,68%) 54 (0,61%)
Parda 2.356 (51,11%) 2.103 (49,68%) 4.459 (50,42%)
Indígena 20 (0,43%) 13 (0,31%) 33 (0,37%)
Ignorado/em branco 490 (10,63%) 545 (12,88%) 1.035 (11,70%)
Escolaridade
Analfabeto 1.220 (26,46%) 1.236 (29,20%) 2.456 (27,77%)
Ensino fundamental 2.073 (44,97%) 1.777 (41,98%) 3.850 (43,54%)
Ensino médio 258 (5,60%) 236 (5,57%) 494 (5,59%)
Ensino superior 81 (1,76%) 63 (1,49%) 144 (1,63%)
Ignorado/em branco 978 (21,21%) 921 (21,76%) 1.899 (21,43%)
Forma clínica
Indeterminada 404 (8,76%) 545 / 12,88% 949 (10,73%)
Tuberculoide 676 (14,67%) 1.085 / 25,63% 1.761 (19,91%)
Dimorfa 1.536 (33,32%) 1.290 / 30,47% 2.826 (31,96%)
Virchowiana 1.047 (22,71%) 502 / 11,86% 1.549 (17,52%)
Ignorado/em branco 947 (20,54%) 811/ 19,16% 1.758 (19,88%)
Classificação operacional
Paucibacilar 1.087 (23,58%) 1.859 (43,92%) 2.946 (33,31%)
Multibacilar 3.509 (76,12%) 2.352 (55,56%) 5.861(66,28%)
Ignorado/em branco 14 (0,30%) 22 (0,52%) 36 (0,41%)
Modo de detecção
Encaminhamento 2.431 (52,73%) 2.190 (51,74%) 4.621 (52,26%)
Demanda espontânea 1.652 (35,84%) 1.466 (34,63%) 3.118 (35,26%)
Exame de coletividade 127 (2,75%) 121 (2,86%) 248 (2,80%)
Exame de contato 235 (5,10%) 321 (7,58%) 556 (6,29%)
Outros 117 (2,54%) 102 (2,41%) 219 (2,48%)
Ignorado/em branco 48 (1,04%) 33 (0,78%) 81 (0,92%)
Grau de incapacidade física
Grau 0 2.299 (49,87%) 2.491 (58,85%) 4.790 (54,17%)
Grau I 1.050 (22,78%) 881 (20,81%) 1.931 (21,84%)
Grau II 507 (11,00%) 228 (5,39%) 735 (8,31%)
Ignorado/em branco 754 (16,35%) 633 (14,95%) 1.387 (15,68%)

epidemiológico real da hanseníase em idosos pode ser ainda No que diz respeito às características epidemiológicas,
mais preocupante. verificou-se discreto predomínio de casos na população
O modelo joinpoint mostrou dois comportamentos tem- masculina (52,13%; n = 4.610), faixa entre 60 e 69 anos
porais distintos, de crescimento (2001---2004) e de redução (57,86%; n = 5.117), etnia parda (50,42%; n = 4.459) e
(2004---2017), com maior destaque para as mulheres, cuja baixa escolaridade, com 27,77% (n = 2.456) analfabetos. Dos
redução foi maior do que aquela observada na população novos casos, 52,26% (4.621) foram detectados por meio de
masculina (APC = -3,4% e -2,2%, respectivamente), o que encaminhamento (tabela 1). Resultados semelhantes foram
corroborou outros estudos.3,6,7 Ao considerar a tendência do evidenciados em outras investigações.3,8,9
período total (2001-2017), o comportamento observado foi Na análise estratificada segundo gênero, as proporções
estacionário (fig. 1). das formas multibacilares em homens foram superiores

03-fm1.pdf 99 30/03/20 12:57


94 Souza CDF et al.

às observadas na população feminina (3.509/76,12% e Thais Silva Matos: Análise estatística; aprovação da ver-
2.352/55,56%, respectivamente). A forma clínica Virchowi- são final do manuscrito; concepção e planejamento do
ana correspondeu a 22,71% (n = 1.047) dos casos registrados estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção,
na população masculina e apenas 11,86% (n = 502) dos casos análise e interpretação dos dados; participação efetiva na
registrados no gênero feminino (tabela 1). Esses achados orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta
sugerem que o diagnóstico é mais tardio nos homens,10 pos- propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão
sivelmente em razão de dois fatores: o menor acesso aos crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
serviços de saúde e o próprio processo de negligenciamento Clódis Maria Tavares: Aprovação da versão final do manus-
dos sinais/sintomas da doença.3,8,9 crito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e
A presença de incapacidades físicas foi outro elemento redação do manuscrito; participação efetiva na orientação
que se destacou nas análises. Do total dos novos casos, da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêu-
30,15% (n = 2.666) já apresentavam alguma incapacidade no tica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da
momento do diagnóstico e em 8,31% (n = 735) essas incapa- literatura; revisão crítica do manuscrito.
cidades eram permanentes (Grau II). A proporção de homens
com Grau II de incapacidade física permanente foi 2,04 vezes Conflitos de interesse
maior do que a de mulheres (11,00%; n = 507 e 5,39%; n
= 228, respectivamente) (tabela 1). Esse cenário reforça o Nenhum.
que já foi exposto, sinaliza para as graves consequências da
doença na população idosa,3,9 sobretudo a masculina, e para Referências
a manutenção da cadeia de transmissão na comunidade.5
Embora os resultados apresentados já sejam capazes de
1. Word Health Organization (WHO). Weekly epidemiological
justificar nossa preocupação com a hanseníase na terceira Record. Global leprosy update, 2017: reducing the disease bur-
idade, as elevadas proporções de campos não preenchi- den due to leprosy. 2018;35:445-56. [Acessado em 10 jan 2019].
dos e/ou ignorados na avaliação do grau de incapacidade Disponível em: <https://zeroleprosy.org/who wer/.
física no momento do diagnóstico, ao mesmo tempo em que 2. Portalarquivos.saude.gov.br [Internet]. Brasil. Ministério da
refletem problemas operacionais na vigilância da doença no Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Registro ativo:
estado,3,6,9 indicam que o número de incapacitados pode ser número e percentual, Casos novos de hanseníase: número, coe-
ainda maior do que o apresentado. ficiente e percentual, faixa etária, classificação operacional,
A hanseníase em idosos deve ser vista com preocupação, sexo, grau de incapacidade, contatos examinados, por estados
uma vez que essa população é mais atingida pelas formas e regiões, Brasil, 2017 [Atualização 30 maio 2018; acesso 01
dez 2018]. Disponível em: <http://portalarquivos2.saude.
multibacilares da doença e têm maior risco de desenvolver
gov.br/images/pdf/2018/julho/13/Registro-ativo-numero-e-
incapacidades físicas. Além disso, o frágil acesso aos serviços -percentual-por-estados-e-regioes-Brasil-2017.pdf>.
de saúde, que coloca esses sujeitos na invisibilidade, é capaz 3. Souza CDF, Fernandes TRMO, Matos TS, Filho JMR, Almeida GKA,
de manter ativa a cadeia de transmissão da doença e torna- Lima JCB, et al. Grau de incapacidade física na população idosa
-la persistente na comunidade. afetada pela hanseníase no estado da Bahia. Brasil. Acta Fisiátr.
2017;24:27---32.
Suporte financeiro 4. Kim HJ, Fay MP, Feuer EJ, Midthune DN. Permutation tests for
joinpoint regression with applications to cancer rates. Stat Med.
2000;19:335---51.
Nenhum. 5. Salgado CG, Barreto JG, da Silva MB, Goulart IMB, Barreto JA,
de Medeiros Junior NF, et al. Are leprosy case numbers reliable?
Contribuição dos autores Lancet Infect Dis. 2018;18:135---7.
6. Souza EA, Ferreira AF, Boigny RN, Alencar CH, Heukelbach J,
Martins-Melo FR, et al. Hanseníase e gênero no Brasil: ten-
Carlos Dornels Freire de Souza: Análise estatística; dências em área endêmica da região Nordeste, 2001-2014. Rev
aprovação da versão final do manuscrito; concepção e pla- Saude Publica. 2018;52:20.
nejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; 7. Brito AL, Monteiro LD, Ramos Junior AN, Heukelbach J, Alencar
obtenção, análise e interpretação dos dados; participação CH. Temporal trends of leprosy in a Brazilian state capital in
efetiva na orientação da pesquisa; participação intelec- Northeast Brazil: epidemiology and analysis by joinpoints, 2001
tual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos to 2012. Rev Bras Epidemiol. 2016;19:194---204.
estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do 8. Viana LDS, Aguiar MIFD, Aquino DMC. Perfil socioepidemiológico
manuscrito. e clínico de idosos afetados por hanseníase: contribuições para
a enfermagem. Rev Pesqui Cuid Fundam. 2016;2:4435---46.
Tânia Rita Moreno de Oliveira Fernandes: Aprovação da
9. Diniz LM, Maciel LB. Leprosy: clinical and epidemiological study
versão final do manuscrito; concepção e planejamento do
in patients above 60 years in Espírito Santo State ? Brazil. An
estudo; elaboração e redação do manuscrito; participação Bras Dermatol. 2018;93:824---8.
efetiva na orientação da pesquisa; participação intelec- 10. Monteiro LD, Martins-Melo FR, Brito AL, Alencar CH, Heukelbach
tual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos J. Physical disabilities at diagnosis of leprosy in a hyperende-
estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do mic area of Brazil: trends and associated factors. Lepr Rev.
manuscrito. 2015;86:240---50.

03-fm1.pdf 100 30/03/20 12:57


An Bras Dermatol. 2020;95(1):95---97

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Dermatologia
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IMAGENS EM DERMATOLOGIA

Dermatoscopia do fenômeno de Borst-Jadassohn no


hidroacantoma simples夽,夽夽
Bruno de Castro e Souza a,∗ , Maria Cláudia Alves Luce b ,
Thais do Amaral Carneiro Cunha b,c e Neusa Yuriko Sakai Valente b

a
Departamento de Dermatologia do Hospital do Servidor Público Estadual, São Paulo, SP, Brasil
b
Departamento de Dermatologia do Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual, São Paulo, SP, Brasil
c
Programa de Residência em Dermatologia do Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual, São Paulo, SP, Brasil

Recebido em 30 de outubro de 2018; aceito em 13 de março de 2019


Disponível na Internet em 15 de fevereiro de 2020

Resumo O fenômeno de Borst-Jadassohn é um achado morfológico que consiste na presença de


PALAVRAS-CHAVE ninhos bem definidos de células localizados no estrato espinhoso de uma epiderme acantótica.
Dermatologia; Uma das neoplasias em que se encontra o fenômeno de Borst-Jadassohn é o hidroacantoma
Dermoscopia; simples. Essa neoplasia é considerada a forma intraepidérmica do poroma écrino. Apesar de
Poroma sua natureza benigna, transformações malignas são relatadas. No presente artigo relata-se um
caso de hidroacantoma simples e faz-se uma discussão sobre a dermatoscopia desse fenômeno
pouco descrito e discutido.
© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um
artigo Open Access sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

Introdução doença de Bowen (DB) clonal, a doença de Paget, o poro-


carcinoma ou o hidroacantoma simples (HS).
O fenômeno de Borst-Jadassohn (FBJ) é achado morfológico A distinção entre essas entidades, tanto do ponto de vista
que consiste na presença de ninhos bem definidos de células clínico quanto histopatológico, por vezes é um desafio. Tal
localizadas no estrato espinhoso de uma epiderme acan- fato pode trazer consequências, já que o manejo delas é
tótica. Algumas neoplasias, malignas ou benignas, podem diferente. A dermatoscopia do FBJ foi pouco relatada. Desse
apresentá-lo, como a queratose seborreica (QS) clonal, a modo, achamos interessante fazer sua descrição no HS.

Relato do caso
DOI referente ao artigo:
https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.03.004 Homem, 88 anos, procurou o serviço de Dermatologia com
夽 Como citar este artigo: Souza BC, Luce MAC, Cunha TAC, Valente
queixa de lesão assintomática na região glútea direita, com
NYS. Dermatoscopy of the Borst-Jadassohn phenomenon in the
hidroacanthoma simplex. An Bras Dermatol. 2020;95:95---7.
tempo de evolução desconhecido.
夽夽 Trabalho realizado no Hospital do Servidor Público Estadual de Ao exame dermatológico, observou-se uma placa rósea
São Paulo, São Paulo, SP, Brasil. levemente elevada com limites irregulares, porém evidentes
∗ Autor para correspondência. e com pequena área de exulceração (fig. 1). À dermatos-
E-mail: brunocastro1990@hotmail.com (B.C. Souza). copia era possível observar, além da exulceração, várias

2666-2752/© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma licença
CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

03-fm1.pdf 101 30/03/20 12:57


96 Souza BC et al.

Figura 1 Placa rósea levemente elevada com limites irregu- Figura 3 Detalhe das mesmas estruturas na dermatoscopia.
lares, porém evidentes e com pequena área de exulceração
localizada na região glútea.

Figura 4 Proliferação intraepitelial bem circunscrita de célu-


las arredondadas e basofílicas (Hematoxilina & eosina 200×).

estruturas ductais presentes em meio a essas células, no


exame imuno-histoquímico, permitiu o diagnóstico de HS.

Discussão

No início do século XX, Borst e Jadassohn descreveram, de


maneira independente, neoplasias que se caracterizavam
por apresentar ninhos celulares bem demarcados localiza-
dos na epiderme. Acreditou-se tratar de um tipo específico
de tumor e cunhou-se o nome de epitelioma intraepitelial de
Figura 2 Imagem panorâmica da dermatoscopia mostra várias
Borst-Jadassohn. A partir de estudos morfológicos e imuno-
estruturas arredondadas, marrons e bem delimitadas, circunda-
-histoquímicos, a maioria dos autores, atualmente, acredita
das por vasos em ponto. Área exulcerada pode ser vista.
que essa entidade representa um fenômeno morfológico,
não é específico de determinada neoplasia. Por isso, prefere-
estruturas arredondadas marrons e bem delimitadas, circun- -se designá-lo como FBJ. Conceitua-se esse fenômeno como
dadas por vasos em ponto (figs. 2 e 3). a presença de ilhas bem definidas de células epiteliais, típi-
Fez-se biópsia incisional da lesão com hipóteses diagnós- cas ou atípicas, dentro de uma epiderme acantótica que
ticas de QS e DB. A histopatologia mostrou clones de células pode ser evidenciada em algumas condições benignas ou
basaloides sem atipias em meio às células espinhosas (fig. 4). malignas.1
Foram consideradas as possibilidades de HS e QS clonal. A Uma das neoplasias em que se encontra o FBJ é o HS. Essa
expressão de antígeno carcinoembrionário (CEA) e antígeno neoplasia é considerada a forma intraepidérmica do poroma
da membrana epitelial (EMA) nas células basaloides e em écrino.2 Apesar de sua natureza benigna, transformações

03-fm1.pdf 102 30/03/20 12:57


Dermatoscopia do fenômeno de Borst-Jadassohn no hidroacantoma simples 97

de tal fenômeno no HS, um dos principais tumores que o


desenvolvem.

Suporte financeiro

Nenhum.

Contribuição dos autores

Bruno de Castro e Souza: Concepção e planejamento do


estudo; elaboração e redação do manuscrito; participação
intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de
Figura 5 Ninho de células basaloides com quantidade casos estudados; revisão crítica da literatura.
considerável de melanina. Esse fenômeno é observado na der- Maria Cláudia Alves Luce: Elaboração e redação do
matoscopia como as áreas marrons (Fontana Masson 200×). manuscrito; revisão crítica da literatura.
Thais do Amaral Carneiro Cunha: Aprovação da versão
final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo;
malignas são relatadas em alguns casos, o que leva à dis-
participação intelectual em conduta propedêutica e/ou
cussão se sua excisão precoce seria obrigatória.3
terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manus-
Clinicamente, é frequentemente confundido com QS.
crito.
Essa confusão pode persistir na histopatologia e não é infre-
Neusa Yuriko Sakai Valente: Participação efetiva na
quente o diagnóstico inicial de QS clonal. Observa-se uma
orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta
proliferação intraepitelial bem circunscrita de células arre-
propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão
dondadas e basofílicas muito semelhante ao que acontece
crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
nas QS clonal, que apresenta FBJ. À imuno-histoquímica,
a positividade para CEA e EMA nos casos de HS auxilia na
diferenciação.4 Conflitos de interesse
Shiiya et al. descreveram quatro casos de HS e discutiram
as principais alterações dermatoscópicas, com o objetivo Nenhum.
central de distingui-lo da DB e da QS.5 Os autores concluí-
ram que os achados de pequenos glóbulos pretos (75% dos Referências
casos) e finas escamas distribuídas de forma anular (100%)
eram característicos. Além disso, a ausência de vasos glome- 1. Lora V, Chouvet B, Kanitakis J. The ‘‘Intraepidermal Epithe-
rulares no HS ajudaria na distinção da DB, já que tais vasos lioma’’ Revisited: Immunohistochemical Study of the Borst-
encontrados de maneira agrupada são altamente sugestivos -Jadassohn Phenomenon. Am J Dermatopathol. 2011;33:492---7.
2. Battistella M, Langbein L, Peltre B, Cribier B. From Hidro-
dessa última.
acanthoma Simplex to Poroid Hidradenoma: Clinicopathologic
No caso relatado encontramos a presença de vasos em and Immunohistochemic Study of Poroid Neoplasms and Reap-
ponto distribuídos em círculo ao redor de estruturas arre- praisal of Their Histogenesis. Am J Dermatopathol. 2010;32:
dondadas e amarronzadas. Representa, na correlação da 459---68.
dermatoscopia com a histopatologia, proliferação de vênu- 3. Lee JB, Oh CK, Jang HS, Kim MB, Jang BS, Kwon KS. A case of
las próximo aos blocos de células clonais. Vasos em ponto, porocarcinoma from pre-existing hidroacanthoma simplex: need
quando em lesões que não sejam melanocíticas, são inespe- of early excision for hidroacanthoma simplex? Dermatol Surg.
cíficos, porém o padrão encontrado na lesão descrita pode 2003;29:772---4.
ser peculiar.6 Já as estruturas arredondadas representam 4. Furlan KC, Kakizaki P, Chartuni JCN, Sittart JA, Valente NYS.
os ninhos de células clonais intraepidérmicos melanizadas, Hidroacantoma simples: Dermatoscopia e Criocirurgia. An Bras
Dermatol. 2017;92:256---8.
correspondem ao FBJ. Embora na coloração de hematoxi-
5. Shiiya C, Hata H, Inamura Y, Imafuku K, Kitamura S, Fujita H,
lina e eosina não pudesse ser vista a presença do pigmento, et al. Dermoscopic features of hidroacanthoma simplex: Use-
quando feita a coloração de Fontana-Masson observou-se fulness in distinguishing it from Bowen’s disease and seborrheic
grande quantidade de melanina nos blocos (fig. 5). keratosis. J Dermatol. 2015;42:1002---5.
O presente estudo vem contribuir para, além de revisar 6. Ayhan E, Ucmak D, Akkurt Z. Vascular structures in dermoscopy.
conceitos do FBJ, descrever as alterações dermatoscópicas An Bras Dermatol. 2015;90:545---53.

03-fm1.pdf 103 30/03/20 12:57


An Bras Dermatol. 2020;95(1):98---101

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IMAGENS EM DERMATOLOGIA

Forma completa da paquidermoperiostose夽,夽夽



Mônica Larissa Padilha Honório , Guilherme Holanda Bezerra
e Vivianne Lira da Câmara Costa

Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN, Brasil

Recebido em 24 de dezembro de 2018; aceito em 26 de abril de 2019


Disponível na Internet em 10 de fevereiro de 2020

Resumo A paquidermoperiostose ou osteoartropatia hipertrófica primária é uma doença


PALAVRAS-CHAVE
hereditária rara, caracterizada por baqueteamento digital, paquidermia e periostose. Sua pato-
Adolescente;
gênese é incerta e o diagnóstico é firmado com base em dados clínicos e radiológicos. Relata-se
Hereditariedade;
uma forma completa da síndrome em paciente do sexo masculino com quadro iniciado na ado-
Osteoartropatia
lescência, com achados clínicos e radiológicos compatíveis. Apresentam-se os os três achados
hipertrófica primária
cardinais, além de outras manifestações associadas, como hiperidrose e acne.
© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um
artigo Open Access sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

Introdução sável por 3%-5% de todos os casos de OAH. A OAH secundária,


também chamada de OAH pulmonar, está associada a
Paquidermoperiostose (PDP) ou osteoartropatia hipertrófica doenças cardiopulmonares subjacentes e malignidades. O
primária (OHP) é uma doença hereditária rara descrita pela diagnóstico de PDP é firmado com base em dados clínicos
primeira vez em 1868.1 Sua real incidência é desconhecida,2 e radiológicos.1,2
mas foram relatados 286 casos em pesquisa no Medline. Relata-se um caso de PDP em paciente jovem do sexo
Predomina em adolescentes do sexo masculino, com uma masculino.
relação homem:mulher de aproximadamente 7:1.3
A osteoartropatia hipertrófica (OAH) é dividida em formas
primárias e secundárias. A PDP é a forma primária, respon- Relato do caso

Paciente do sexo masculino, 24 anos, relatou espessamento


cutâneo na face e no couro cabeludo, desde a adoles-
DOI referente ao artigo: cência, além de aumento de volume das mãos e dos pés.
https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.04.009 Referiu também acne desde a adolescência. Negou história
夽 Como citar este artigo: Honório MLP, Bezerra GH, Costa
familiar de caso semelhante. Ao exame físico identificaram-
VLC. Complete form of pachydermoperiostosis. An Bras Dermatol.
2020;95:98---101.
-se pápulas foliculares eritematosas e pústulas na face,
夽夽 Trabalho realizado no Serviço de Dermatologia, Hospital Uni- espessamento cutâneo, acentuação dos sulcos faciais com
versitário Onofre Lopes, Natal, RN, Brasil. circunvoluções cutâneas (cutis verticis gyrata) na fronte
∗ Autor para correspondência. (fig. 1) e couro cabeludo, onde também havia nódulos de
E-mail: monicalarissa14@gmail.com (M.L. Honório). consistência amolecida com alopecia sobre suas superfícies,

2666-2752/© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma licença
CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

03-fm1.pdf 104 30/03/20 12:57


Forma completa da paquidermoperiostose 99

densificação e aumento da espessura de partes moles adja-


centes (fig. 4). Os níveis de fator de crescimento semelhante
à insulina-1 (IGF-1) apresentavam-se normais. Com base nas
características clínicas (paquidermia, hipocratismo digital e
periostose), a forma completa de PDP foi diagnosticada.

Discussão

A PDP é uma síndrome genética caracterizada por três


sintomas principais: baqueteamento digital, paquidermia
(espessamento e enrugamento da pele facial e/ou couro
cabeludo), periostose (aumento do tecido periarticular e
neoformação óssea subperiosteal). Outras manifestações
são: características faciais grosseiras, poliartrite, cutis ver-
ticis gyrata (24%), seborreia, ptose palpebral, hiperidrose,
acne, artropatia e acro-osteólise de ossos longos.1,2
As apresentações clínicas geralmente reconhecidas são a
forma completa, que envolve os três principais sintomas,
a forma incompleta, com periostose sem paquidermia, e
a forma frustra, com paquidermia e mínima ou nenhuma
anomalia esquelética. Ambas as formas são autossômicas
dominantes com penetrância incompleta e herança reces-
siva tem sido sugerida.1---4 Geralmente o quadro inicia-se
Figura 1 Pápulas eritematosas e pústulas na face, espes- na infância ou adolescência e progride gradualmente por 5-
samento cutâneo, acentuação dos sulcos faciais com 20 anos, até estabilização.3
circunvoluções cutâneas (cutis verticis gyrata) na fronte. A patogênese da PDP ainda não está claramente enten-
dida. A doença foi mapeada para a banda 4q33-q34 e foram
identificadas mutações no gene HPGD, que codifica a 15-
hidroxiprostaglandina desidrogenase, a principal enzima de
degradação de prostaglandinas.5,6
Níveis aumentados de prostaglandina E2 (PGE2), resul-
tante de degradação defeituosa devido a mutações nos
genes HPGD e SLCO2A1, parecem contribuir para a pato-
gênese da PDP. A gravidade da paquidermia e alterações
histológicas associadas foram correlacionadas com níveis
séricos de PGE2 e genótipos SLCO2A1. A PGE2 pode mime-
tizar a atividade de osteoblastos e osteoclastos, que podem
ser responsáveis pela acro-osteólise e formação óssea
periosteal. Além disso, os efeitos vasodilatadores locais
prolongados da PGE2 podem explicar o baqueteamento
digital.7,8
O caso relatado mostra uma forma completa da sín-
drome em paciente do sexo masculino com quadro iniciado
na adolescência (epidemiologia típica), com achados clíni-
cos e radiológicos compatíveis. Apresentava os três achados
cardinais, além de outras manifestações associadas, como
hiperidrose e acne. Apesar de haver história familiar em
um terço dos pacientes com PDP,3 nosso paciente não tinha
parentes com características suspeitas desse diagnóstico.
Os níveis de IGF-1 foram normais, contribuíram para des-
Figura 2 Couro cabeludo com circunvoluções cutâneas e cartar hipótese de acromegalia, um importante diagnóstico
nódulos de consistência amolecida com alopecia sobre suas diferencial.3
superfícies. Não foi estabelecido um tratamento definitivo para a
doença. Os sintomas são manejados com anti-inflamatórios
compatível com foliculite abcedante (fig. 2). Mãos e pés com não esteroidais (AINEs), analgésicos simples e endovenosos,
aumento do volume e baqueteamento digital, com unhas bem como bisfosfonatos. Além disso, o tamoxifeno tem sido
em vidro de relógio (fig. 3), além de sudorese aumentada relatado como eficaz para artralgia refratária aos AINEs.3
nas mãos e nos pés (hiperidrose). As radiografias de mãos, O relato em questão relembra a importância de se con-
punhos e joelhos mostraram reação periosteal hipertrófica siderar PDP como diagnóstico possível na dermatologia e
benigna com alargamento de ossos por hiperostose, além de mostra que firmar um diagnóstico de PDP pode ser extre-

03-fm1.pdf 105 30/03/20 12:57


100 Honório MLP et al.

Figura 3 Quirodáctilos e pododáctilos apresentam aumento do volume e baqueteamento digital, com unhas em vidro de relógio.

Figura 4 Reação periosteal hipertrófica benigna nas metáfises e epífises do fêmur, tíbia e fíbula bilateralmente, com alargamento
de ossos por hiperostose. Densificação e aumento da espessura de partes moles adjacentes ao joelho, notadamente nas faces
anterior e lateral.

mamente desafiador mesmo para médicos mais experientes, Referências


sobretudo devido à raridade da doença.
1. Sandoval AR, Flores-Robles BJ, Llanos JC, Porres S, Dardón JD,
Suporte financeiro Harrison RM. Cutis verticis gyrata as a clinical manifestation of
Touraine-Solente-Gole’ syndrome (pachydermoperiostosis). BMJ
Nenhum. Case Rep. 2013:2013.
2. Lee S, Park SY, Kwon HJ, Lee CH, Kim OH, Rhee Y. Iden-
tification of the Mutations in the Prostaglandin Transporter
Contribuição dos autores Gene SLCO2A1 and Clinical Characterization in Korean Pati-
ents with Pachydermoperiostosis. J Korean Med Sci. 2016;31:
Mônica Larissa Padilha Honório: Elaboração e redação do 735---42.
manuscrito; participação intelectual em conduta propedêu- 3. Abdullah NRA, Jason WLC, Nasruddin AB. Pachydermoperiostosis:
tica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da a rare mimicker of acromegaly. Endocrinol Diabetes Metab Case
literatura; revisão crítica do manuscrito. Rep. 2017:2017.
Guilherme Holanda Bezerra: Elaboração e redação do 4. Karimova MM, Halimova ZY, Urmanova YM, Korbonits M, Cranston
manuscrito; revisão crítica da literatura. T, Grossman AB. Pachydermoperiostosis Masquerading as Acro-
megaly. J Endocr Soc. 2017;1:109---12.
Vivianne Lira da Câmara Costa: Aprovação da versão final
5. Uppal S, Diggle CP, Carr IM, Fishwick CW, Ahmed M, Ibrahim
do manuscrito; participação efetiva na orientação da pes-
GH, et al. Mutations in 15-hydroxyprostaglandin dehydroge-
quisa; revisão crítica do manuscrito. nase cause primary hypertrophic osteoarthropathy. Nat Genet.
2008;40:789---93.
Conflitos de interesse 6. Nakazawa S, Niizeki H, Matsuda M, Nakabayashi K, Seki
A, Mori T, et al. Involvement of prostaglandin E2 in the
Nenhum. first Japanese case of pachydermoperiostosis with HPGD

03-fm1.pdf 106 30/03/20 12:57


Forma completa da paquidermoperiostose 101

mutation and recalcitrant leg ulcer. J Dermatol Sci. 2015;78: 8. Coggins KG, Coffman TM, Koller BH. The Hippocratic finger points
153---5. the blame at PGE2. Nat Genet. 2008;40:691---2.
7. Kim HJ, Koo KY, Shin DY, Kim DY, Lee JS, Lee MG. Complete form of
pachydermoperiostosis with SLCO2A1 gene mutation in a Korean
family. J Dermatol. 2015;42:655---7.

03-fm1.pdf 107 30/03/20 12:57


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Relato do caso

Uma mulher de 77 anos, saudável, apresentou-se com da na derme reticular superficial e média, caracterizada por
múltiplas pápulas milimétricas branco-amareladas mono- discreto espessamento das fibras colágenas e por fibras elás-
mórficas e não foliculares na região cervical posterior (figs. ticas focalmente aumentadas (fig. 3). Esses achados foram
1 e 2). As lesões teriam anos de evolução e, afora um prurido destacados na coloração de Verhoeff-van Gieson, que mos-
discreto, eram assintomáticas. O exame objetivo, que incluiu trou ainda ausência de fibras elásticas na derme papilar (fig.
a avaliação cardiovascular e dos pulsos periféricos, foi nor- 4). Não foi observada calcificação de tecido elástico.
mal. A biópsia cutânea revelou uma área nodular mal defini-

Qual seu Diagnostico-ABDv95n1.indd 1 30/03/20 13:42


A PFBP foi descrita pela primeira vez por Shimizu et
al. em 1985. Alguns anos depois, os mesmos autores relataram
essa entidade em um grupo de 32 pacientes japoneses.1 Em-
bora inicialmente descrita sobretudo em homens japo- neses,
também afeta mulheres brancas, da quinta à nona décadas de
vida.2 A PFBP é um distúrbio fibroelastolítico adquirido, raro,
que se apresenta clinicamente na forma de pápulas redondas
ou ovaladas, de cor branca a amarelada, que ocorrem mais
frequentemente na região posterior do pescoço, mas tam-
bém no dorso, sem manifestações sistêmicas associadas.
Sua etiopatogenia, ainda não completamente esclarecida,
parece estar relacionada com o fotoenvelhecimento cutâneo
intrínseco, mas é provavelmente multifatorial.3,4 A relevân-
cia clínica dessa entidade reside em seu amplo diagnóstico
diferencial, principal- mente com o pseudoxantoma elástico
(PXE), uma doença genética causada por uma muta¸cão no
gene ABCC6 (ATP-
-Binding Cassette sub-family C member 6) e que se as-
socia à mineraliza¸cão ectópica cutânea, ocular e vascular.5,6
No entanto, ao contrário do PXE, a PFBP surge mais tardia-
mente, não está associada a complicações sistêmicas e não
requer investiga¸cão adicional.3 O exame histológico revela
fibrose dérmica composta por áreas circunscritas de feixes
de colágeno espessados na derme papilar e reticular média,
bem como perda variável de tecido elástico dérmico.3,6 Ape-
sar de sua natureza inteiramente benigna, a PFBP pode ser
cosmeticamente desagradável e acompanhar-se de prurido.
Até ao momento de escrita deste artigo, nenhum tratamento
revelou eficácia sustentada.2 Alguns agentes tópicos, como
a tretinoína e antioxidantes, têm sido tentados, mas sem
melhora evidente.2,7 A excisão cirúrgica pode ser uma opção
em casos particularmente severos com lesões circunscritas.2
Além disso, uma vez que a PFBP parece ser uma característica
do fotoenvelhecimento ou do envelhecimento cutâneo intrín-
Discussão seco, o laser fracionado não ablativo foi recentemente usado
com bons resultados.2 No entanto, nenhum dos tratamentos
A correlação clínico-patológica favoreceu a hipó- apresenta evidência suficiente na literatura.
tese de papulose fibrosa branca do pescoço (PFBP). Nesse
contexto, decidiu-se manter apenas vigilância das lesões, que
perma- neceram estáveis até a data.

Qual seu Diagnostico-ABDv95n1.indd 2 30/03/20 13:42


PALAVRAS-CHAVE Resumo A papulose fibrosa branca do pescoço é uma entidade rara, com menos de 50 casos descritos. É
Pescoço; uma enfermidade benigna cujo principal interesse reside em seu diagnóstico diferencial amplo, especial-
Pseudoxantoma mente com o pseudoxantoma elástico. Relata-se o caso de uma mulher de 77 anos com múltiplas pápulas
elástico; monomórficas branco-amareladas na região cervical posterior, com anos de evolução. A biópsia cutânea
Tecido elástico revelou uma área nodular na derme reticular superficial e média, com ligeiro espessamento das fibras co-
lágenas e fibras elásticas focalmente aumentadas, aspectos esses realc¸ados na coloração pelo Verhoeff,
que mostrou adicionalmente ausência de fibras elásticas na derme papilar.
© 2020 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier Espa˜na, S.L.U. Este ´e um artigo
Open Access sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

Qual seu Diagnostico-ABDv95n1.indd 3 30/03/20 13:42


An Bras Dermatol. 2020;95(1):105---111

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CARTA - INVESTIGAÇÃO

Adalimumabe para psoríase Tabela 1 Índice de Gravidade da Psoríase por Área (PASI)
grave em pacientes pediátricos Início Semana 16 Semana 40
chilenos夽,夽夽 Paciente 1 18,3 3,1 1,7
Paciente 2 12 3,1 1,8
Prezado Editor,
Paciente 3 40 0 2,1
Paciente 4 12 1 0
A psoríase juvenil é uma doença inflamatória crônica da
pele que afeta 0,6% a 1,4% dos pacientes pediátricos.1 Está
associada a várias comorbidades, entre as quais artrite Tabela 2 Avaliação Global do Médico (PGA)
psoriática, doenças psiquiátricas, diabetes melito 1 e
2, hipertensão, obesidade, hiperlipidemia e doença de Início Semana 16 Semana 40
Crohn;2---4 portanto, é essencial instituir um tratamento
Paciente 1 3 2 1
precoce e adequado. Devido aos efeitos adversos, as opções
Paciente 2 3 2 1
terapêuticas sistêmicas em crianças são limitadas. Até o
Paciente 3 5 0 1
momento, poucas terapias biológicas foram aprovadas para
Paciente 4 3 0 0
tratamento da psoríase grave. O adalimumabe foi apro-
vado pela Agência Europeia de Medicamentos (European
Medicines Agency [EMA]) para o tratamento da psoríase de adalimumabe foi de 4,2 anos. Dois pacientes apre-
em placas grave em pacientes a partir dos 4 anos e, sentavam histórico familiar positivo para psoríase, mas
recentemente, um ensaio clínico randomizado e duplo-cego não em parentes de primeiro grau. Todos os pacientes
demonstrou sua segurança e superioridade em comparação apresentavam psoríase em placas grave. O paciente 4
ao metotrexato.5 No Chile, não há reembolso econômico apresentou psoríase genital grave e artrite psoriática HLA
para terapias biológicas, que devem ser pagas integral- B27+, com comprometimento das articulações sacroilíacas,
mente pelo paciente; portanto, o acesso a essas terapias que não responderam ao tratamento com metotrexato. O
é limitado devido aos custos. O objetivo do presente artigo paciente 2 tinha sobrepeso. Não foram identificadas outras
é apresentar a experiência dos autores com o uso de comorbidades metabólicas, articulares ou psiquiátricas. No
adalimumabe em pacientes pediátricos com psoríase grave. início do estudo, os seguintes escores foram observados:
Pacientes < 18 anos com psoríase grave que não respon- PASI mediano 21,3, PGA mediano 4 e superfície corporal
deram às terapias tópicas e/ou sistêmicas não biológicas mediana 29%. Na semana 16, o escore PASI de três dos qua-
foram selecionados para receber adalimumabe 0,8 mg/kg tros pacientes foi 75 e a pontuação mediana na PGA foi 2.
por via subcutânea na semana 0 e depois em semanas alter- Na semana 40, o PASI mediano foi de 1,7; todos os pacientes
nadas a partir da semana 1. Eles foram acompanhados por atingiram apresentaram PASI 75 e dois, PASI 90. Todos os
pelo menos 40 semanas, com avaliações clínicas mensais. pacientes atingiram uma pontuação PGA de 1-0 (tabelas 1 e
O Índice de Área e Gravidade da Psoríase (PASI, do inglês 2). Apenas eventos adversos leves foram relatados: infecção
Psoriasis Area and Severity Index) e a escala de 6 pontos do trato respiratório superior (3 casos), infecção do trato
da Avaliação Médica Global (Physician Global Assessment respiratório inferior (3 casos) e dor de cabeça (1 caso).
[PGA]) foram avaliados em todas as visitas. Não foram encontrados relatos anteriores em paci-
Quatro pacientes foram selecionados, três do sexo entes pediátricos chilenos com psoríase grave tratados
feminino. A idade mediana ao diagnóstico da psoríase foi com adalimumabe. Na presente série, o tratamento com
de 11 anos e a duração média da doença antes do uso adalimumabe 0,8 mg/kg em pacientes pediátricos que não
responderam ao tratamento não biológico resultou em
melhorias significativas no PASI (escore 75 na semana 16,
que foram mantidos até a semana 40).
DOI referente ao artigo:
A psoríase juvenil tem sido associada a comorbidades
https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.04.012
夽 Como citar este artigo: Armijo D, Valenzuela F, Saint-Pierre G, importantes; a taxa geral estimada foi relatada como duas
Cortés A. Adalimumab for severe psoriasis in Chilean paediatric vezes mais alta do que em pacientes sem psoríase.1 Apenas
patients. An Bras Dermatol. 2020;95:105---6. um dos pacientes apresentou artrite psoriática, com boa
夽夽 Trabalho realizado no Hospital Clinico Universidad de Chile, taxa de resposta, com melhoria dos sintomas e da qualidade
Santiago, Chile. de vida. Considerando as comorbidades da psoríase juvenil,

03-fm1.pdf 111 30/03/20 12:57


106 CARTA - INVESTIGAÇÃO

o importante prejuízo na qualidade de vida e a literatura


Conflitos de interesse
recentemente publicada, o adalimumabe parece ser uma
opção eficaz e segura para pacientes pediátricos com pso- Nenhum.
ríase grave. No entanto, como não há reembolso econômico
para essas terapias no Chile, o tratamento da psoríase grave Referências
que não respondeu ao tratamento convencional se torna
desafiador. 1. Augustin M, Glaeske G, Radtke MA, Christophers E, Reich K, Schä-
fer I. Epidemiology and comorbidity of psoriasis in children. Br J
Suporte financeiro Dermatol. 2010;162:633---6.
2. Todberg T, Egeberg A, Jensen P, Gislason G, Skov L. Psychia-
tric comorbidities in children and adolescents with psoriasis: a
Nenhum. population-based cohort study. Br J Dermatol. 2017;177:551---3.
3. Bronckers IMGJ, Paller AS, van Geel MJ, van de Kerkhof PCM,
Contribuição dos autores Seyger MMB. Psoriasis in Children and Adolescents: Diagnosis,
Management and Comorbidities. Pediatr Drugs. 2015;17:373---84.
4. Boccardi D, Menni S, Vecchia CLa, Nobile M, Decarli A, Volpi
Daniela Armijo Fernandez: Aprovação da versão final do G, et al. Overweight and childhood psoriasis. Br J Dermatol.
manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, 2009;161:484---6.
análise e interpretação dos dados; participação efetiva na 5. Papp K, Thaçi D, Marcoux D, Weibel L, Philipp S, Ghislain PD,
orientação da pesquisa; revisão crítica da literatura; revisão et al. Efficacy and safety of adalimumab every other week ver-
crítica do manuscrito. sus methotrexate once weekly in children and adolescents with
Fernando Valenzuela: Aprovação da versão final severe chronic plaque psoriasis: a randomised, double-blind,
do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; phase 3 trial. Lancet. 2017;390:40---9.
obtenção, análise e interpretação dos dados; participação
a,∗ a
efetiva na orientação da pesquisa; participação intelec- Daniela Armijo Fernandez , Fernando Valenzuela ,
b
tual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos Gustavo Saint-Pierre Contreras
a
estudados; revisão crítica do manuscrito. e Andrea Cortés González
Gustavo Saint-Pierre Contreras: Aprovação da versão a
Departamento de Dermatologia, Hospital Clinico
final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; Universidad de Chile, Santiago, Chile
obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica b
Hospital San José de la Mariquina, Valdivia, Chile
da literatura.
Andrea Cortés González: Aprovação da versão final ∗
Autor para correspondência.
do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos E-mail: danielaarmijof@gmail.com (D. Armijo Fernandez).
dados; participação intelectual em conduta propedêutica
Recebido em 10 de setembro de 2018; aceito em 1 de abril
e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do
de 2019
manuscrito.
Disponível na Internet em 19 de fevereiro de 2020
2666-2752/
© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por
Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma
licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

Exames de imagem no saúde, requer-se que o manejo desses pacientes promova


bons resultados clínicos e relação custo-benefício.2,3
estadiamento do melanoma O presente estudo avaliou a frequência de solicitação de
cutâneo: uma coorte exames de imagem no estadiamento do melanoma cutâneo,
retrospectiva夽,夽夽 as taxas de positividade verdadeira e falsa, o impacto da
feitura do exame no prognóstico do paciente e as caracte-
Prezado Editor,
rísticas demográficas e clínicas associadas.
Não há consenso no processo de estadiamento do melanoma, Trata-se de um estudo tipo coorte retrospectiva que ana-
existindo uma diversidade de protocolos entre países e dife- lisa prontuários médicos de casos de melanoma tratados e
rentes instituições.1 acompanhados na instituição entre 1999 e 2016, tendo sido
Levando-se em conta o contínuo incremento na incidên- excluídos os tumores in situ.
cia do melanoma e na demanda financeira dos sistemas de Foram desprezados os prontuários nos quais o exame
anatomopatológico não possibilitou o adequado estadia-
mento do tumor inicial. Foram considerados como exames
de estadiamento aqueles feitos em até três meses do
diagnóstico inicial.
DOI referente ao artigo:
Foram avaliados os resultados de radiografias de tórax
https://doi.org/10.1016/j.abd.2018.12.002
夽 Como citar este artigo: Souza LB, Peres G, Schmitt JV. Imaging (RT) e tomografias de cabeça, pescoço, tórax, abdômen e
tests in cutaneous malignant melanoma staging: a retrospective pelve (TC) segundo os laudos radiológicos. A positividade
cohort. An Bras Dermatol. 2020;95:106---8. foi considerada verdadeira quando obtida evidência histoló-
夽夽 Trabalho realizado na Faculdade de Medicina de Botucatu, Uni- gica da lesão ou quando a evolução do paciente manifestou
versidade Estadual Paulista, Botucatu, SP, Brasil. recidiva clinicamente evidente.

03-fm1.pdf 112 30/03/20 12:57


CARTA - INVESTIGAÇÃO 107

Tabela 1 Características dos pacientes incluídos no estudo Tabela 2 Comparação entre pacientes de acordo com a
(n = 93) realização de radiografias de tórax

Características basais n (%) Variável Fez (n = 51) Não fez (n = 42) p


Sexo Sexo 0,72
Feminino 44 (47,3) Feminino 25 (49%) 19 (45,2%)
Masculino 49 (52,7) Masculino 26 (51%) 23 (54,8%)
Idade ao 57,4 (17,9) 63,4 (15,6) 0,09
Idade ao diagnóstico (anos) 62 (49-75)a
diagnósticoa
Tempo seguimento (meses) 55 (22-88)a
Espessura de 1,4 (0,6-4) 1 (0,5-3,5) 0,46
Óbito no seguimento 30 (32,3)
Breslow (mm)b
Óbito por melanoma 16 (17,2)
Ulceração 14 (27,5%) 13 (31%) 0,71
Tipo clínico presente
Extensivo superficial 44 (47,3)
a Média (desvio-padrão).
Nodular 15 (16,1)
b Mediana (p25-p75).
Acral lentiginoso 16 (17,2)
Lentigo maligno melanoma 18 (19,4) tase sistêmica de melanoma (por meio de TC). Todas as
lesões eram ulceradas, com um Breslow mediano de 9,8mm
Localização (1,5-15mm), dos quais 1/4 apresentava linfonodomegalia
Cabeça e pescoço 26 (28) regional, 1/4 apresentava invasão óssea no tumor primário
Tronco 31 (33,3) e 1/4 apresentava microsatelitose.
Membros 36 (38,7) Os pacientes que fizeram ou não fizeram RT iniciais não
Presença de ulceração 27 (29) diferiram quanto a características demográficas e de estadi-
Espessura de Breslow (mm) 1,3 (0,6-4)a amento tumoral (tabela 2). Além disso, mortalidade geral e
Exames de imagem de estadiamento específica ajustadas por idade, sexo, espessura de Breslow e
Exames alterados/exames 13/57 (22,8) ulceração não foram diferentes entre esses grupos (p = 0,63
realizados e p = 0,81 --- regressão de Cox).
Achados falso-positivos/exames 9/57 (15,8) Dos pacientes com exames iniciais negativos, 24,5%
realizados (13/53) evoluíram para doença metastática identificada em
Achados verdadeiro-positivos em 0/51 (0) exames de imagem no seguimento --- 61,5% (8/13) após
radiografias de tórax manifestação clínica da recidiva. Cinco dos 13 casos de reci-
Achados falso-positivos em 3/51 (5,9) diva (38,5%) apresentaram doença metastática em RTs no
radiografias de tórax seguimento.
Achados verdadeiro-positivos em 3/11 (27,3) Dos cinco pacientes que apresentaram achados de metás-
TCs tase assintomática em exames de imagem, três haviam
Pré-clínicos 2/11 (18,2) evoluído previamente para estágio III. O tempo mediano
Achados falso-positivos em TCs 6/11 (54,5) de seguimento para a identificação pré-clínica de doença
metastática à distância nos exames de imagem foi de 24
a Mediana (p25-p75). (9-29) meses.
A figura 1 ilustra as curvas de sobrevida geral dos pacien-
Variáveis contínuas foram analisadas bivariadamente
tes, desde o diagnóstico inicial, de acordo com a feitura e
pelos testes t de Student e Mann-Whitney, dependendo
da normalidade das distribuições, avaliada pelo teste de
Shapiro-Wilk. As variáveis categóricas foram comparadas 1,0
pelos testes de qui-quadrado. Exames de seguimento
Não realizado

O impacto do exame radiológico na sobrevida a partir do Normais


Alterção pré-clínica

diagnóstico inicial foi avaliado pela regressão de Cox. Foram 0,8 Alteração pós-clínica
Sobrevivência cumulativa

considerados significativos valores bicaudais de p < 0,05.


Foram identificados 93 casos incluídos no estudo, dos
0,6
quais 57 fizeram exames de imagem iniciais. A tabela 1
ilustra as características basais dos pacientes incluídos e os
exames de imagem no estadiamento. 0,4
Obteve-se uma amostra equilibrada entre os sexos com
lesões tratadas entre a sexta e oitava décadas de vida, segui-
0,2
dos por um período mediano de 4,6 anos, e tumores iniciais
de espessura intermediária, com 32% de fatalidade durante
o seguimento. 0,0
Verificaram-se frequentes achados incidentais nos exa- ,00 50,00 100,00 150,00 200,00
mes de imagem iniciais, sem achados verdadeiramente Sobrevida geral (meses)
positivos em RT iniciais. Por outro lado, os exames de ima-
gem foram feitos seletivamente, havendo uma regularidade Figura 1 Sobrevida geral de acordo com a feitura e alteração
maior para as RT. dos exames de imagem no seguimento do melanoma, incluindo
Com relação aos exames iniciais de estadiamento, apenas radiografias de tórax e tomografias axiais. Os exames eram fei-
4/57 pacientes apresentaram achados que indicaram metás- tos seletivamente.

03-fm1.pdf 113 30/03/20 12:57


108 CARTA - INVESTIGAÇÃO

alteração dos exames de imagem do seguimento, ajustados orientação da pesquisa; revisão crítica da literatura; revisão
por idade, sexo, espessura de Breslow e ulceração, em que crítica do manuscrito.
se verifica o comportamento mais agressivo de tumores com
doença metastática identificada clinicamente (p < 0,01 --- Conflitos de interesse
regressão de Cox).
Os presentes achados, que corroboram outros estudos, Nenhum.
sugerem que a feitura de exames de imagem no estadi-
amento de pacientes assintomáticos é pouco produtiva, Referências
devem ser considerados apenas para casos localmente
avançados, com tumores espessos e ulcerados. Os estudos de 1. Trotter SC, Sroa N, Winkelmann RR, Olencki T, Bechtel M. A Glo-
Gjørup et al. (2016) e Ferrándiz et al. (2016), juntos, iden- bal Review of Melanoma Follow-up Guidelines. J Clin Aesthet
tificaram apenas três casos positivos entre RT e TC no esta- Dermatol. 2013;6:18---26.
diamento de 913 pacientes assintomáticos até estágio IIC.4,5 2. Naser N. Cutaneous melanoma: a 30-year-long epidemiological
No seguimento, a frequência de achados positivos em study conducted in a city in southern Brazil, from 1980-2009. An
pacientes assintomáticos aumentou, porém frequentemente Bras Dermatol. 2011;86:932---41.
3. Hollingsworth B. Cost, production, efficiency, or effectiveness:
foi precedida de disseminação regional do tumor. De qual-
where should we focus? Lancet Glob Health. 2013;1:e249---50.
quer modo, metástase à distância clinicamente manifesta 4. Gjørup CA, Hendel HW, Pilegaard RK, Willert CB, Hölmich LR.
indicou doença de evolução agressiva. Routine X-Ray of the chest is not justified in staging of cutaneous
Apesar das limitações inerentes a estudos retrospecti- melanoma patients. Dan Med J. 2016:63, pii: A5317.
vos, os resultados desfavorecem as RT no estadiamento 5. Ferrándiz L, Silla-Prósper M, García-de-la-Oliva A, Mendonça
de pacientes assintomáticos, exceto para casos local- FM, Ojeda-Vila T, Moreno-Ramírez D. Yield of Computed Tomo-
mente avançados. Já durante o seguimento, a positividade graphy at Baseline Staging of Melanoma. Actas Dermosifiliogr.
aumenta, porém geralmente ocorrem precedidas de reci- 2016;107:55---61.
diva locorregional e de sintomas da doença metastática à
a b
distância, dentro dos três primeiros anos de seguimento. Luiza Boava Souza , Gabriel Peres
b,∗
e Juliano Vilaverde Schmitt
Suporte financeiro a
Faculdade de Medicina de Botucatu, Universidade
Estadual Paulista, Botucatu, SP, Brasil
Nenhum. b
Departamento de Dermatologia e Radioterapia, Hospital
das Clínicas, Faculdade de Medicina de Botucatu,
Contribuição dos autores Universidade Estadual Paulista, Botucatu, SP, Brasil

Luiza Boava Souza: Aprovação da versão final do manuscrito; Autor para correspondência.
concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação E-mail: julivs@gmail.com (J.V. Schmitt).
do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; Recebido em 24 de agosto de 2018; aceito em 10 de dezem-
revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito. bro de 2018
Gabriel Peres: Aprovação da versão final do manuscrito; Disponível na Internet em 24 de dezembro de 2019
elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica do
manuscrito. 2666-2752/
© 2019 Publicado por Elsevier España, S.L.U. em nome de
Juliano Vilaverde Schmitt: Análise estatística; aprovação
Sociedade Brasileira de Dermatologia. Este é um artigo Open
da versão final do manuscrito; concepção e planejamento Access sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/
do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, licenses/by/4.0/).
análise e interpretação dos dados; participação efetiva na

Transmitância do UVB, UVA e


luz visível (azul-violeta) dos e geográficos devem ser ponderados na indicação da
principais filtros solares opacos estratégia de fotoproteção, como filtros solares (FS),
vendidos no Brasil夽,夽夽 fotoproteção mecânica (coberturas, vidros, vestuário) e
aspectos comportamentais.1
Prezado Editor, Os FS usam compostos que interferem na penetração da
radiação solar na pele e minimizam seus efeitos biológicos
A fotoproteção é essencial na prevenção e no trata-
teciduais. Tais substâncias podem ser orgânicas e inorgâni-
mento das dermatoses fotoinduzidas. Fatores ambientais
cas, além de pigmentos usados para potencializar o bloqueio
da luz visível (LV).1,2
Como diferentes tipos de radiações desencadeiam pro-
DOI referente ao artigo:
cessos patológicos característicos, o conhecimento dos
https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.01.004
夽 Como citar este artigo: Peres G, Miot HA. Transmittance of UVB, padrões de fotoproteção dos FS é essencial para sua
UVA and visible light (blue-violet) of the main Brazilian commercial indicação. A prevenção de queimaduras solares se associa ao
opaque sunscreens. An Bras Dermatol. 2020;95:108---11. fator de proteção solar (FPS), a prevenção da pigmentação
夽夽 Trabalho realizado no Departamento de Dermatologia e Radi- persistente se associa à medida do PPD (persistent pigment
oterapia, Faculdade de Medicina, Universidade Estadual Paulista, darkening) e a manutenção da vigilância imunológica da
Botucatu, SP, Brasil. pele, pelo fator de proteção imune.1,3

03-fm1.pdf 114 30/03/20 12:57


CARTA - INVESTIGAÇÃO 109

Tabela 1 Principais características dos 44 filtros solares comerciais testados

Produto / Marca Fabricante Lote FPS UVA


Actsun Color FPS 60 FQM 171099 50 MAP
Anthelios Airlicium FPS 70 --- clara La Roche Posay 58R17M 70 MAP
Anthelios Airlicium FPS 70 --- com cor La Roche Posay 60p2e 70 MAP
Anthelios Airlicium FPS 70 --- morena La Roche Posay 58R17M 70 MAP
Anthelios Airlicium FPS 70 --- morena mais La Roche Posay 58R1EM 70 MAP
Anthelios Alta cobertura FPS 60 La Roche Posay 6ON3F 60 MAP
Anthelios BB cream FPS 50 La Roche Posay 3605054 50 AP/28
≤ 2,5a
Blocskin FPS 40 Color Vitalife 12004171 40 +
Cetaphil Sun FPS 70 --- Com Cor Galderma 14190118 70 MAP
Emulsão Color FPS 70 Avène 1700181 70 MAP
Emulsão Color FPS 50+ Avène av196 50 MAP
Ensoleil Extreme FPS 90+ Ache Profuse L1513664 90 MAP/31b
Episol color FPS 70 --- pele clara Mantecorp b17b2203 70 MAP
Episol color FPS 70 --- pele extra clara Mantecorp B18E1465 70 MAP
Episol color FPS 70 --- pele morena Mantecorp B16M1847 70 MAP
Episol color FPS 70 --- pele morena mais Mantecorp B18F1906 70 MAP
Episol color FPS 70 --- pele negra Mantecorp B18E1464 70 MAP
Eucerin Sun creme tinted FPS 60 Eucerin L6226034 60 MAP
Filtrum Color FPS 50 Libbs 1701001a 50 19a
Foto Ultra Active Unify Fusion Fluid color FPS Isdin 50901 99 MAP/49a
99
Fotoprotector Gel Cream Dry Touch Color FPS Isdin 3296100 60 MAP
50+
FQM-Melora Heliocare® Gel Color Nude Bronze FQM 16L245 50 +
FPS 50
Idéal Capital Soleil FPS 50 --- com cor Vichy 60p2b 50 AP
Idéal Soleil Clarify FPS 60 --- clara Vichy 58R77M 60 MAP
Idéal Soleil Clarify FPS 60 --- média Vichy 58R79M 60 MAP
Idéal Soleil Clarify FPS 60 --- morena Vichy 58R79M 60 MAP
Idéal Soleil Clarify FPS 60 --- com cor Vichy 60P801 60 MAP
Minesol Actif Unify FPS 60 --- light ROC 1957B01 60 MAP
Minesol Actif Unify FPS 60 --- medium ROC 3486B01 60 MAP
Minesol Oil Control FPS 60 --- tinted gel creme ROC 2566k 60 MAP
universal
Moderm Protetor Solar com base FPS 35 --- bege Galderma 1651 35 MAP
claro
Moderm Protetor Solar com base FPS 35 --- bege Galderma 1651 35 MAP
médio
Photoderm M FPS 50+ Bioderma 11761 70 MAP/36c
Photoderm Max Nude Touch FPS 50+ --- claro Bioderma N1X85881Q607V 50 MAP/25c
Photoderm Max Nude Touch FPS 50+ --- dourado Bioderma N1X85891Q607V 50 MAP/25c
Photoderm Max Nude Touch FPS 50+ --- muito Bioderma N1X85871Q607V 50 MAP/25c
claro
Photoderm Max Toque Seco FPS 60 --- Tinto Bioderma 33651 60 MAP/37b
Photoderm Max Toque Seco FPS 90 --- Tinto Bioderma 2961 90 MAP/38b
Photoprot FPS 99 Color Biolab 1009319 99 MAP/62a
Physical Matte UV defense FPS 50 SkinCeuticals jcp33w 50 AP
Sunfresh facial com cor FPS 60 Neutrogena 1377B01 60 +
Controles negativos
Anthelios XL Protect FPS 70 La Roche Posay 60n7tc3 70 MAP
Eryfotona AK-NMSC Fluid Isdin 53461 99 NA
FotoUltra --- Spot Prevent --- Fusion Fluid 99 Isdin 5057a 99 MAP/61a

+, Apenas menciona ‘‘UVA’’; AP, alta proteção; FPS, fator de proteção solar; MAP, muito alta proteção; NA, não disponível no rótulo.
a Fator de proteção UVA.
b PPD.
c Método de UVA não citado.

03-fm1.pdf 115 30/03/20 12:57


110 CARTA - INVESTIGAÇÃO

Tabela 2 Percentual de transmitância de UVA e luz visível dos diferentes filtros testados (n = 44)

Produto UVA LV
Actsun Color FPS 60 0,0% 6,0%
Anthelios Airlicium FPS 70 --- clara 0,0% 0,0%
Anthelios Airlicium FPS 70 --- com cor 0,0% 0,0%
Anthelios Airlicium FPS 70 --- morena 0,0% 0,0%
Anthelios Airlicium FPS 70 --- morena mais 0,0% 0,0%
Anthelios Alta cobertura FPS 60 0,0% 0,0%
Anthelios BB cream FPS 50 0,4% 7,4%
BLOCSKiN FPS 40 color 0,0% 6,8%
Cetaphil Sun FPS 70 --- com cor 0,1% 0,0%
Emulsão Color FPS 70 0,1% 16,7%
Emulsão Color FPS 50+ 0,2% 6,8%
Ensolei Extreme FPS 90+ 0,1% 4,7%
Episol color FPS 70 --- pele clara 0,0% 0,0%
Episol color FPS 70 --- pele extra clara 0,0% 0,0%
Episol color FPS 70 --- pele morena 0,0% 0,0%
Episol color FPS 70 --- pele morena mais 0,0% 0,0%
Episol color FPS 70 --- pele negra 0,0% 0,0%
Eucerin Sun Creme tinted FPS 60 0,0% 11,4%
Filtrum Color FPS 50 0,0% 0,0%
Foto Ultra Age Active Unify Fusion Fluid color FPS 99 0,0% 0,0%
Fotoprotector Gel Cream Dry Touch color FPS 50+ 0,0% 3,2%
FQM-Melora Heliocare® gel color nude bronze FPS 50 0,1% 3,1%
Idéal Capital Soleil FPS 50 0,0% 0,0%
Idéal Soleil Clarify FPS 60 --- clara 0,0% 0,0%
Idéal Soleil Clarify FPS 60 --- média 0,0% 0,0%
Idéal Soleil Clarify FPS 60 --- morena 0,0% 0,0%
Idéal Soleil Clarify FPS 60 --- com cor 0,0% 0,0%
Minesol Actif Unify FPS 60 --- light 0,1% 0,0%
Minesol Actif Unify FPS 60 --- medium 0,4% 0,0%
Minesol Oil Control FPS 60 tinted 0,0% 17,7%
Moderm Protetor Solar com base FPS 35 --- bege claro 0,1% 0,0%
Moderm Protetor Solar com base FPS 35 --- bege médio 0,1% 0,0%
Photoderm M FPS 50+ 0,0% 7,1%
Photoderm MAX Nude Touch FPS 50+ --- claro 0,5% 0,0%
Photoderm MAX Nude Touch FPS 50+ --- dourado 0,8% 0,0%
Photoderm MAX Nude Touch FPS 50+ --- muito claro 1,2% 0,0%
Photoderm MAX Toque Seco FPS 60 Tinto 0,0% 3,9%
Photoderm MAX Toque Seco FPS 90 Tinto 0,0% 0,0%
Photoprot FPS 99 Color 0,1% 3,9%
Physical Matte UV defense FPS 50 0,9% 6,8%
Sunfresh facial com cor FPS 60 0,0% 26,2%
Controles negativos
Anthelios XL Protect FPS 70 0,0% 75,4%
Eryfotona AK-NMSC FLUID FPS 99 0,0% 59,5%
FotoUltra - Spot Prevent - Fusion Fluid 99 0,0% 63,4%

Obs.: Transmitância a UVB < 0,1% para todos os produtos testados.

O espectro da LV (400---780 nm) é subsequente à faixa do prevenção do envelhecimento e de discromias, como o


UVA e representa 40% da energia solar incidente no solo, melasma, assim como UVA. Todavia, ainda não há um método
podendo promover pigmentação persistente em fototipos universalmente aceito para avaliar a proteção fotobiológica
mais elevados e formação de radicais livres no estrato cór- contra LV, tampouco qualquer referência a essa proteção nos
neo. Entretanto, a LV promove menor interação tecidual e rótulos dos FS.5
seus efeitos são dezenas de vezes menos intensos do que os A proteção tópica contra LV é promovida por FS opacos.
promovidos pelo UVA e milhares de vezes menores do que os No Brasil, há FS vendidos com proposta de bloqueio da LV;
induzidos por UVB.1,4 contudo, não há um panorama claro das proteções simul-
A fração mais biologicamente ativa da LV compreende tâneas contra as demais faixas de radiação oferecidas por
a faixa azul-violeta (400---500 nm) e pode ser relevante na esses produtos.

03-fm1.pdf 116 30/03/20 12:57


CARTA - INVESTIGAÇÃO 111

Conduziu-se um estudo transversal que propôs avaliar Suporte financeiro


a transmitância in vitro ao UVB, UVA e luz azul-violeta
(400---500 nm) dos principais FS comerciais brasileiros. Foram Nenhum.
avaliados 41 FS opacos com FPS > 30, entre setembro 2017
e setembro 2018. As características dos FS testados estão
dispostas na tabela 1.
Contribuição dos autores
Amostras de 500 mg de cada produto foram espa-
lhadas em 250 cm2 de papel filme transparente, a Gabriel Peres: Aprovação da versão final do manuscrito;
fim de atingir 2 mg/cm2 , e submetidos a fontes artificiais elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e
de UVB (230 ␮W/cm2 ), UVA (1270 ␮W/cm2 ) e LV azul-violeta interpretação dos dados; revisão crítica da literatura.
(400---520 nm --- 729 mW/cm2 ). Os valores de transmitân- Hélio Amante Miot: Aprovação da versão final do manus-
cia foram avaliados pelos aparelhos UVB Digital Ultraviolet crito; concepção e planejamento do estudo; participação
Radiometer (ZooMed, San Luis Ubispo, CA, EUA), Digital efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica da litera-
Ultraviolet Radiometer 4.2 UVA (Solarmeter, Glenside, PA, tura; revisão crítica do manuscrito.
EUA) e Radiômetro RD-7 (Ecel, Ribeirão Preto, SP, Brasil).
Além disso, foram avaliados três FS sem pigmento, como Conflitos de interesse
controles do experimento (tabela 1).
A transmitância calculada foi a porcentagem de radiação Nenhum.
que atravessa cada FS e é complementar ao valor da soma da
absorbância. Para seu cálculo, foram consideradas múltiplas Referências
medidas na superfície coberta com o FS e o valor médio foi
dividido pela irradiação de cada fonte por meio do filme
1. Schalka S, Steiner D, Ravelli FN, Steiner T, Terena AC, Marçon CR,
transparente, sem o FS.
et al. Brazilian consensus on photoprotection. An Bras Dermatol.
Todos os FS testados apresentaram transmitância UVB 2014;89 Suppl 1:S6---73.
< 0,1%. As transmitâncias de UVA e LV estão dispostas na 2. Kaye ET, Levin JA, Blank IH, Arndt KA, Anderson RR. Efficiency
tabela 2. Em geral, os filtros opacos apresentaram cobertura of opaque photoprotective agents in the visible light range. Arch
UVA superior aos controles. Destaca-se que, dos FS opa- Dermatol. 1991;127:351---5.
cos, 63% (26/41) bloquearam > 99,9% de UVA e 63% (26/41) 3. Fourtanier A, Moyal D, Maccario J, Compan D, Wolf P, Quehen-
bloquearem > 99,9% da luz azul-violeta. Entretanto, tal blo- berger F, et al. Measurement of sunscreen immune protection
queio não foi coincidente, já que 31% (8/26) dos FS opacos factors in humans: a consensus paper. J Invest Dermatol.
que bloquearam > 99,9% da LV não tiveram a mesma perfor- 2005;125:403---9.
4. Ramasubramaniam R, Roy A, Sharma B, Nagalakshmi S. Are
mance quanto ao UVA.
there mechanistic differences between ultraviolet and visible
FS opacos vendidos no Brasil apresentaram grande varia-
radiation induced skin pigmentation? Photochem Photobiol Sci.
bilidade na transmitância de UVA e LV, apesar de excelente 2011;10:1887---93.
desempenho contra UVB. Curiosamente, FS opacos da 5. Duteil L, Esdaile J, Maubert Y, Cathelineau AC, Bouloc
mesma linha comercial, mas de diferentes tonalidades, não A, Queille-Roussel C, et al. A method to assess the pro-
infligiram diferença na transmitância para LV. tective efficacy of sunscreens against visible light-induced
Observou-se que 73% (30/41) dos filtros opacos não apre- pigmentation. Photodermatol Photoimmunol Photomed. 2017;33:
sentavam valores relacionados ao UVA no rótulo; 7,3% (3/41) 260---6.
usavam FPUVA e apenas 7,3% (3/41), PPD. a
A transmitância dos FS não é perfeitamente paralela ao Gabriel Peres
b,∗
efeito biológico das radiações; entretanto, é uma forma e Hélio Amante Miot
razoável de comparar o desempenho dos FS in vitro. O a
Programa de Pós-Graduação em Bases Gerais da Cirurgia,
comprimento de onda crítico, um indicador de proteção Faculdade de Medicina, Universidade Estadual Paulista,
UVA, até se baseia na curva de transmitância dentro do Botucatu, SP, Brasil
espectro UVA.1 b
Departamento de Dermatologia e Radioterapia,
Ainda, o efeito biológico do UVA e da LV pode ser reduzido Faculdade de Medicina, Universidade Estadual Paulista,
pelo uso de ativos como antioxidantes, presentes em vários Botucatu, SP, Brasil
FS testados.
Nossos resultados não desabonam os FS estudados, ∗
Autor para correspondência.
mas salientam suas diferenças intrínsecas. Esses resultados E-mail: heliomiot@gmail.com (H.A. Miot).
devem ser confirmados com metodologias in vivo. Recebido em 13 de outubro de 2018; aceito em 21 de janeiro
Desse modo, rótulos de FS deveriam trazer informações de 2019
detalhadas do FPS e PPD (ou outro padrão UVA) para favo- Disponível na Internet em 13 dezembro 2019
recer a indicação de FS em diferentes contextos clínicos --- 2666-2752/
especialmente em dermatoses pigmentares, mais sensíveis © 2019 Publicado por Elsevier España, S.L.U. em nome de
ao UVA, porque diferentes filtros opacos com boa perfor- Sociedade Brasileira de Dermatologia. Este é um artigo Open
mance contra LV permitem significativa passagem de UVA, Access sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/
ainda que inferior aos filtros transparentes testados. licenses/by/4.0/).

03-fm1.pdf 117 30/03/20 12:57


An Bras Dermatol. 2020;95(1):112---128

Anais Brasileiros de
Dermatologia
www.anaisdedermatologia.org.br

CARTA - CASO CLÍNICO

Siringocistoadenoma papilífero
em localização incomum夽,夽夽
Prezado Editor,

O siringocistoadenoma papilífero (SCAP) é rara neoplasia de


glândulas sudoríparas presente ao nascimento em 50% dos
casos.1 Tem diferenciação predominantemente apócrina,
ainda que a origem écrina tenha sido descrita em alguns
relatos.2,3
Costuma apresentar-se como pápula ou placa com super-
fície crostosa que ocorre quase que exclusivamente na
cabeça e região cervical.4
Relatamos a clínica, assim como os achados derma-
toscópicos e histopatológicos, de um caso em localização
incomum.
Paciente de 6 anos, sexo masculino, apresentava lesão
de crescimento progressivo havia cinco anos no flanco Figura 2 Exame dermatoscópico evidencia estruturas arre-
esquerdo. Ao exame dermatológico, observava-se pápula de dondadas de coloração amarelo-esbranquiçada separadas por
coloração róseo-eritematosa, superfície lisa e consistência estruturas lineares esbranquiçadas em um fundo eritematoso.
fibroelástica de 5 × 3 mm (fig. 1). O exame dermatos-

Figura 1 Pápula de coloração rósea em flanco esquerdo.

cópico demonstrou estruturas arredondadas de coloração


amarelo-esbranquiçada separadas por estruturas lineares
esbranquiçadas em um fundo eritematoso (fig. 2). O
paciente foi encaminhado para a exérese de lesão. Ao
Figura 3 Exame histopatológico: cavidade cística revestida
exame histopatológico, observaram-se: invaginações císti-
por células basais cuboidais e células apócrinas colunares
cas revestidas por células ora escamosas, ora colunares, com
(Hematoxicilina & eosina, 400 × ).

DOI referente ao artigo:


projeções papilíferas para a luz; glândulas tubulares com
https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.02.011
夽 Como citar este artigo: Horcel GA, Milhomem J, Mandelbaum grandes luzes revestidas por células apócrinas (fig. 3).
SH, Ieiri R. Papillary syringocystadenoma in an uncommon location. O SCAP é raro tumor de anexo derivado mais frequen-
An Bras Dermatol. 2020;95:112---3. temente de células apócrinas3,4 . Predomina em crianças
夽夽 Trabalho realizado no Serviço de Dermatologia, Santa Casa de e adolescentes e é observado ao nascimento em 50% dos
São José dos Campos, São José dos Campos, SP, Brasil. casos,1 o que difere do caso relatado.

03-fm1.pdf 118 30/03/20 12:57


CARTA - CASO CLÍNICO 113

Em 75% dos casos, localiza-se na cabeça ou região Conflitos de interesse


cervical. Alguns casos já descreveram em outras topogra-
fias (região escrotal, vulva, dorso, abdome e axila). Essas Nenhum.
localizações, assim como a do caso descrito, são ainda mais
raras. Quando localizado em couro cabeludo, pode estar
Referências
associado ao nevo sebáceo de Jadassohn.4
Apesar de apresentação clínica variável, placa papulosa 1. Karg E, Korom I, Varga E, Ban G, Turi S. Congenital syringocysta-
é a lesão elementar mais encontrada. Em sua maioria, é denoma papilliferum. Pediatr Dermatol. 2008;25:132---3.
assintomática, porém pode apresentar prurido, dor e/ou 2. Townsend TC, Bowen AR, Nobuhara KK. Syringocystadenoma
sangramento; geralmente apresenta crescimento progres- papilliferum: an unusual cutaneous lesion in a pediatric patient.
sivo, assim como no caso descrito.1,4 J Pediatr. 2004;145:131---3.
Até o momento, artigos sobre os achados dermatoscó- 3. Bruno CB, Cordeiro FN, Soares FES, Takano GHS, Mendes LST.
picos do SCAP são escassos. Há a descrição de um padrão Aspectos dermatoscópicos do siringocistoadenoma papilífero
vascular em ferradura, que não foi visualizado em nosso associado a nevo sebáceo. An Bras Dermatol. 2011;86:1213---6.
4. Jalkh AP, Menezes AC, Gadelha A. Siringocistoadenoma papilífero
caso.3,5
localizado na coxa. Surg Cosmet Dermatol. 2013;5:273---5.
O SCAP pode infectar, sangrar, ulcerar e, em raros casos, 5. Einecke YS, Pinto EB, Silveira SO, Santos MA, Mendes AM,
evoluir para carcinoma basocelular (9%) ou até siringocisto- Carneiro FR. Siringocistoadenoma papílifero congênito. Revista
adenocarcinoma papilífero. Por essas razões, optamos por SPDV. 2018;76:79---82.
fazer a exérese da lesão.5

Giovanna de Araujo Horcel , Juliana Milhomem ,
Suporte financeiro Samuel Henrique Mandelbaum e Rodrigo Ieiri
Serviço de Dermatologia, Santa Casa de São José dos
Nenhum. Campos, São José dos Campos, SP, Brasil

Contribuição dos autores Autor para correspondência.
E-mail: giohorcel@hotmail.com (G.A. Horcel).
Giovanna de Araujo Horcel: Concepção e planejamento do Recebido em 30 de agosto de 2018; aceito em 11 de fevereiro
estudo; elaboração e redação do manuscrito. de 2019
Juliana Milhomem: Concepção e planejamento do Disponível na Internet em 15 de fevereiro de 2020
estudo. 2666-2752/
Samuel Henrique Mandelbaum: Revisão crítica da litera- © 2020 Publicado por Elsevier España, S.L.U. em nome de
tura; revisão crítica do manuscrito. Sociedade Brasileira de Dermatologia. Este é um artigo Open
Rodrigo Ieiri: Participação efetiva na orientação da pes- Access sob uma licença CC BY (http://creativecommons.org/
quisa. licenses/by/4.0/).

Xantogranuloma múltiplo Mulher de 38 anos, de antecedentes familiares e pessoais


do adulto夽,夽夽 irrelevantes, observada em outubro de 2016 por múltiplas
lesões papulares na face, com um ano e meio de evolução.
Prezado Editor, Ao exame dermatológico observava-se mais de uma cen-
tena de pápulas de coloração amarelada/acastanhada, de
O xantogranuloma (XG) é uma histiocitose não Langerhans consistência firme, de 1-3 mm de diâmetro na face, região
(HNL) normolipêmica observada habitualmente na criança e cervical, tórax, axilas e abdome (fig. 1), destacando-se
por isso geralmente designado como xantogranuloma juve- dois elementos, de maiores dimensões, no canto externo
nil (XGJ). O XG raramente é observado no adulto. Tanto em do olho direito e no sulco nasogeniano homolateral. As
adultos quanto em crianças, o XG geralmente se apresenta lesões eram assintomáticas e o exame físico geral (inclu-
como lesão solitária. A ocorrência de múltiplas lesões é rara sive oftalmológico, cardiopulmonar e neurológico) resultou
no XGJ e excepcional no adulto. Relata-se um caso de xan- sem alterações.
togranuloma múltiplo do adulto (XGMA) com acometimento Foram consideradas as hipóteses diagnósticas de sirin-
da face e do tronco, sem envolvimento extracutâneo nem gomas, sarcoidose, xantomas e histiocitose e efetuou-se a
associação com doença hematológica. excisão de dois elementos para estudo histopatológico, que
revelou, nas duas lesões, um denso infiltrado celular na
derme, constituído por grandes histiócitos, em sua maioria
xantomizados, acompanhados por células gigantes multinu-
cleadas, algumas das quais de Touton. Coexistiam células
DOI referente ao artigo:
inflamatórias dispersas, predominantemente pequenos
https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.02.010
夽 Como citar este artigo: Almeida RC, Tellechea O, Pereira MP, Mas- linfócitos e ocasionais eosinófilos e neutrófilos (figs. 2 e 3).
carenhas RCC. Multiple adult xanthogranuloma. An Bras Dermatol. O estudo imuno-histoquímico demonstrou ausência da
2020;95:113---5. proteína S100 e imunorreatividade a CD1a e positividade
夽夽 Trabalho realizado no Hospital Distrital da Figueira da Foz, difusa para CD68, reiterando o diagnóstico de XG.
Figueira da Foz, Portugal.

03-fm1.pdf 119 30/03/20 12:57


114 CARTA - CASO CLÍNICO

boa resposta terapêutica. Durante o período de acompa-


nhamento de quase dois anos, os elementos cutâneos não
tratados persistiram, sem desenvolvimento de lesões extra-
cutâneas ou alterações hematológicas.
O XG é a mais comum das HNL.1 O início na idade adulta
é raro, ocorre geralmente na terceira e quarta décadas de
vida, sem predomínio de gênero.2 Tal como no XGJ, a grande
maioria (70%-80%) dos casos de XGMA manifesta-se como
pápula ou nódulo solitário da face.3 A ocorrência de lesões
múltiplas de XG no adulto é muito rara. O XGMA é definido
pela presença de mais de cinco xantogranulomas em paci-
ente com idade superior a 14 anos.2 De 1969 a 2004 foram
reportados, sob esse critério, 118 casos.3 A etiopatogenia do
XGMA é desconhecida.3
Figura 1 Xantogranulomas múltiplos. Detalhe de pápulas de As lesões de XGJ e XGMA mostram achados histopatoló-
coloração amarelo-acastanhada, de consistência firme, de 1- gicos e imuno-histoquímicos idênticos.1 Em lesões evoluídas
3 mm de diâmetro, dispersas na face. observa-se, como em nosso caso, proliferação nodular dér-
mica circunscrita constituída por células xantomizadas,
caracteristicamente acompanhadas por células de Touton.1,4
O caráter histiocítico das células lesionais é confirmado pela
positividade ao CD68 e pela ausência de imunorreatividade
à proteína S100 e CD1a, com variabilidade de expressão de
fator XIIIa.4,5 Essas características microscópicas e imuno-
-histoquímicas não são, contudo, patognomônicas de XG e,
face aos achados clínicos em nossa paciente, deve excluir-
-se a possibilidade de outras HNL a elementos múltiplos do
adulto, nomeadamente doença de Erdheim-Chester (DEC),
assim como histiocitoma eruptivo generalizado (HEG) e,
mais remotamente, xantoma disseminado (XD) e retículo-
-histiocitose multicêntrica (RM).4,5
A ausência de alterações esqueléticas permitiu excluir o
Figura 2 Infiltração circunscrita da derme por histiócitos diagnóstico de DEC. Por outro lado, no HEG as lesões não
xantomizados e células gigantes multinucleadas de Touton apresentam células de Touton. Essas podem identificar-se
(Hematoxilina & eosina, 400×). nas lesões de XD, mas em nossa paciente não se observavam
lesões lineares com distribuição periflexural, que caracte-
rizam XD. Na RM, as lesões são acrais, acompanhadas por
artropatia e caracterizadas por grandes células multinuclea-
das com citoplasma em vidro fosco, aspectos ausentes neste
caso.4,5
Clinicamente, o XGMA apresenta-se como pápulo-nódulos
amarelo-alaranjados ou acastanhados, afetando tronco,
face e pescoço. Em apenas 6% dos casos, como no nosso,
estão presentes mais de 10 elementos.
Em contraste com o XGJ, em que está descrito o envolvi-
mento ocular e, mais raramente, de outros órgãos, o XGMA
parece não cursar com infiltração histiocitária extracutânea.
Assim, não é recomendada a avaliação sistêmica exaus-
tiva em todos os pacientes. Todavia, tal como no XGJ, o
XGMA pode ser um marcador cutâneo de doença hemato-
Figura 3 Proliferação histiocitária difusa na derme superficial lógica maligna, que eventualmente deve ser investigada,
e profunda associada com infiltrado linfocitário e com célu- sobretudo na presença de sintomas B e/ou de alterações do
las gigantes multinucleadas de Touton (Hematoxilina & eosina, proteinograma eletroforético.3---5 Esses, bem como os exa-
100×). mes de sangue total, resultaram ausentes em nossa paciente
ao longo dos quase dois anos de acompanhamento.
Procedeu-se à avaliação complementar com hemograma Como a regressão espontânea das lesões no XGMA é
e bioquímica (inclusive ␤2 microglobulina e eletroforese menos provável do que no XGJ, excisão cirúrgica, eletroci-
das proteínas), raios-X do esqueleto e tórax e ecografia rurgia, laser de CO2 e retinoides sistêmicos, particularmente
abdominal e pélvica, que resultaram normais. O conjunto a isotretinoína, têm sido recomendados como tratamentos
dos achados clínico-laboratoriais permitiu a confirmação do sempre que as lesões são numerosas, causam desconforto
diagnóstico de XGMA. Optou-se pela ablação das lesões mais ou são inestéticas. Em nossa paciente, uma mulher em
salientes por laser de CO2 ou eletrocirurgia, observando-se idade fértil, optou-se pela ablação por laser de CO2 e

03-fm1.pdf 120 30/03/20 12:57


CARTA - CASO CLÍNICO 115

eletrocoagulação repetida das lesões de maiores dimensões, Referências


com bom resultado cosmético.
Em conclusão, o XGMA é um tipo raro de HNL do adulto, 1. Navajas B, Eguino P, Trébol I, Lasa O, Gardeazábal J,
de significado insuficientemente conhecido, ocasionalmente Díaz-Pérez JL. Multiple adult xanthogranuloma. Dermatology.
associado à malignidade hematológica e que pode ser conco- 2006;212:73---6.
mitante, preceder ou suceder o diagnóstico da histiocitose,3 2. Achar A, Naskar B, Mondal PC, Pal M. Multiple generalized
impondo um acompanhamento a longo termo dos pacientes. xanthogranuloma in adult: case report and treatment. Indian J
Dermatol. 2011;56:197---9.
3. Larson MJ, Bandel C, Eichhorn PJ, Cruz PD Jr. Concurrent
Suporte financeiro
development of eruptive xanthogranulomas and hematolo-
gic malignancy: two case reports. J Am Acad Dermatol.
Nenhum. 2004;50(6):976---8.
4. Patterson J. Cutaneous infiltrates-non lymphoid. In: Ronald B,
Contribuição dos autores Johnston MD, editors. Weedons’s Skin Pathology. London: Chur-
chill Livingstone; 2009. p. 951---60.
5. Paller A, Mancini AJ. Histiocytoses and Malignant Skin Diseases.
Renata da Costa Almeida: Aprovação da versão final
In: Amy S, Paller A, Anthony J, editors. Hurwitz Clinical Pedia-
do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; tric Dermatology: A textbook of Skin Disorders of childhood and
participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crí- adolescence. New York: Elsevier; 2011. p. 219---26.
tica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Óscar Tellechea: Aprovação da versão final do manus- Renata da Costa Almeida a,∗
, Óscar Tellechea b
,
crito; elaboração e redação do manuscrito; participação Mariana Pinho Pereira a
efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica da lite- e Rosa Cristina Correia Mascarenhas c
ratura; revisão crítica do manuscrito.
a
Mariana Pinho Pereira: Aprovação da versão final Medicina Geral e Familiar, Centro de Saúde de Buarcos,
do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; Buarcos, Portugal
b
participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crí- Serviço de Dermatologia, Centro Hospitalar Universitário
tica da literatura; revisão crítica do manuscrito. de Coimbra, Coimbra, Portugal
c
Rosa Cristina Correia Mascarenhas: Aprovação da versão Serviço de Dermatologia, Hospital Distrital da Figueira
final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; da Foz, Figueira da Foz, Portugal
obtenção, análise e interpretação dos dados; participação

efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica da litera- Autor para correspondência.
tura; revisão crítica do manuscrito. E-mail: renatadacostaalmeida@gmail.com (R.C. Almeida).
Recebido em 11 de janeiro de 2019; aceito em 12 de feve-
Conflitos de interesse reiro de 2019
Disponível na Internet em 14 de fevereiro de 2020
Nenhum.
2666-2752/
© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por
Agradecimentos Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma
licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).
À minha orientadora de formação, Dra Ana Sofia Bento, pelo
incentivo e ajuda na feitura deste artigo.

Tratamento da doença de
relatada em homens asiáticos entre 20 e 30 anos.2 As moda-
Kimura com corticosteroide oral lidades terapêuticas para DK incluem excisão cirúrgica,
e metotrexato夽,夽夽 radioterapia e vários agentes imunomoduladores, como
corticosteroides orais, ciclosporina, leflunomida e micofe-
Prezado Editor,
nolato de mofetil.3
A doença de Kimura (DK) foi inicialmente descrita por Kim Relata-se um caso de DK com uma resposta excelente
e Szeto em 1937, mas tornou-se mais conhecida após a e sustentada ao corticosteroide oral e metotrexato intra-
descrição sistemática de Kimura, que a classificou como venoso. Um homem de 51 anos apresentou história de
uma doença inflamatória crônica.1 A maioria dos casos foi tumefação das pálpebras superiores bilateralmente e edema
similar nas regiões das parótidas bilateralmente ao longo
de sete anos (fig. 1), sem prurido ou dor. O exame físico
evidenciou lesões pendulares, macias e não dolorosas em
DOI referente ao artigo: ambas as pálpebras superiores no terço lateral, resultando
https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.03.006 em ptose mecânica. O restante do exame ocular estava den-
夽 Como citar este artigo: Ma H. Treatment of Kimura’s dise- tro dos limites normais. Seu histórico médico não indicou
ase with oral corticosteroid and methotrexate. An Bras Dermatol. alterações. Foi feito um estudo reumatológico e imunológico
2020;95:115---7. completo. No hemograma completo, a contagem de leucóci-
夽夽 Trabalho realizado no Departamento de Dermatologia, Fifth
tos foi de 8,3 × 109 /L, neutrófilos 4,35 × 109 /L (representou
Affiliated Hospital, Sun Yat-sen University, Zhuhai, Guangdong Pro- 52,4%), linfócitos 2,50 × 109 /L (representou 30,1%) e eosi-
vince, China.

03-fm1.pdf 121 30/03/20 12:57


116 CARTA - CASO CLÍNICO

Figura 3 Infiltrado linfocítico nodular com centros germina-


tivos na derme e tecido subcutâneo e centros germinativos
reacionais circundados por pequenos linfócitos maduros e eosi-
nófilos (seta) (Hematoxilina & eosina, 100×).

40 mg/d) e metotrexato intravenoso a 15 mg/semana por


dois meses. O paciente apresentou resolução completa após
o tratamento, não sendo observada recidiva nos dois anos
de acompanhamento.
Figura 1 Tumefação das pálpebras superiores bilateralmente
A DK é uma doença inflamatória crônica que se mani-
e edema nas regiões das parótidas.
festa como uma tríade de nódulos subcutâneos na região
da cabeça e pescoço, eosinofilia do sangue periférico
e elevação da IgE sérica.3 Também pode comprometer
localizações extracutâneas, como linfonodos regionais, as
glândulas salivares maiores e os rins. No entanto, o compro-
metimento renal não é incomum, quase sempre resultando
em síndrome nefrítica.4 O paciente apresentou todos os
três elementos típicos para o diagnóstico e comprometi-
mento bilateral das glândulas salivares. Assim, DK foi o
primeiro diagnóstico suspeitado. Essa doença deve ser dife-
renciada da hiperplasia angiolinfoide com eosinofilia (HALE),
que apresenta várias características clínicas e histológi-
cas sobrepostas. A DK ocorre principalmente em homens
jovens de ascendência asiática com uma ou várias mas-
sas assintomáticas que comprometem o tecido subcutâneo
e as glândulas salivares. É frequentemente acompanhada
de comprometimento de linfonodos regionais, eosinofi-
lia no sangue periférico e IgE elevada. Por sua vez, a
HALE ocorre predominantemente em mulheres de meia-
-idade e se apresenta com múltiplas pápulas pequenas
ou nódulos eritematosos associados a prurido.1 Quanto
Figura 2 Lesões de partes moles envolvem as regiões da pál- às características histopatológicas, a DK exibe numerosos
pebra superior e da parótida. folículos linfoides e ausência de vasos sanguíneos irregu-
lares e dilatados,2 exatamente como foi observado neste
caso. A patogênese da DK permanece desconhecida, mas
nófilos 1,01 × 109 /L (representou 12,2%). A IgE sérica foi alergia, atopia, autoimunidade e infestação por parasi-
de 205 UI/mL (valor de referência: < 100). Os demais tas são considerados possíveis fatores de risco.3 Estudos
resultados laboratoriais foram normais. A tomografia com- anteriores relataram níveis aumentados de interleucina-4,
putadorizada revelou comprometimento de partes moles nas interleucina-5 e interleucina-13 no sangue periférico dos
regiões da pálpebra superior e da parótida. Um estudo pós- indivíduos afetados, sugerindo um papel para as citocinas
-contraste evidenciou nítida acentuação no mapeamento de células T auxiliares tipo 2.5 Os métodos terapêuticos
tardio (fig. 2). A histopatologia da lesão excisada da pálpebra relatados na literatura são heterogêneos, mas a excisão
superior esquerda mostrou hiperplasia do tecido linfoide, cirúrgica e os corticosteroides orais são as estratégias mais
com nódulos linfoides contendo centros germinativos espar- usadas.3 Para evitar a recorrência durante a redução gradual
sos na derme e tecido subcutâneo, e infiltração dispersa de de esteroides, vários agentes imunomoduladores devem ser
eosinófilos (fig. 3). Com base nas manifestações clínicas e adicionados ao plano de tratamento. A leflunomida e o mico-
características histopatológicas, foi feito o diagnóstico de fenolato de mofetil se mostraram promissores em alguns
DK. O regime terapêutico compreendeu uma dose gradu- casos relatados.3 Entretanto, os dois medicamentos ainda
almente decrescente de prednisona oral (dose inicial de são caros, por isso o metotrexato foi escolhido como o medi-

03-fm1.pdf 122 30/03/20 12:57


CARTA - CASO CLÍNICO 117

camento a ser combinado, uma vez que ele apresenta efeitos 2. Buder K, Ruppert S, Trautmann A, Bröcker EB, Goebeler M, Kers-
imunomodulatórios semelhantes ao inibir a síntese de novo tan A. Angiolymphoid hyperplasia with eosinophilia and Kimura’s
de purina via inosina monofosfato desidrogenase. Embora a disease ? a clinical and histopathological comparison. J Dtsch
recorrência seja muito comum, não foi observada após dois Dermatol Ges. 2014;12:224---8.
anos de acompanhamento deste caso. O autor acredita que 3. Shah K, Tran AN, Magro CM, Zang JB. Treatment of Kimura dise-
ase with mycophenolate mofetil monotherapy. JAAD Case Rep.
o metotrexato pode ser um tratamento promissor para a DK.
2017;3:416---9.
4. Chen Y, Wang J, Xu F, Zeng C, Liu Z. Clinicopathological featu-
Suporte financeiro res and prognosis of Kimura’s disease with renal involvement in
Chinese patients. Clin Nephrol. 2016;85:332---9.
Nenhum. 5. Katagiri K, Itami S, Hatano Y, Yamaguchi T, Takayasu S. In vivo
expression of IL-4, IL-5, IL-13 and IFN-gamma mRNAs in peripheral
Contribuição do autor blood mononuclear cells and effect of cyclosporine A in a patient
with Kimura’s disease. Br J Dermatol. 1997;137:972---7.
Han MA: Aprovação da versão final do manuscrito;
elaboração e redação do manuscrito. Han Ma
Departamento de Dermatologia, Fifth Affiliated Hospital,
Conflitos de interesse Sun Yat-sen University, Zhuhai, Guangdong Province, China
E-mail: drmahan@sina.com
Nenhum.
Recebido em 25 de fevereiro de 2018; aceito em 1 de março
de 2019
Referências
Disponível na Internet em 13 de fevereiro de 2020
1. Bastos JT, Rocha CRMD, Silva PMCE, Freitas BMP, Cassia FF, Avel- 2666-2752/
leira JCR. Angiolymphoid hyperplasia with eosinophilia versus © 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por
Kimura’s disease: a case report and a clinical and histopatho- Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma
logical comparison. An Bras Dermatol. 2017;92:392---4. licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

Xantogranuloma necrobiótico topatologia revelou comprometimento total da derme por


processo crônico granulomatoso com numerosas células de
com lesões anulares Touton, algumas bizarras, áreas de necrobiose com restos
disseminadas夽,夽夽 nucleares e de esclerose do colágeno. Os achados favo-
receram o XN. Frente a esse diagnóstico, foi pesquisada
Prezado Editor, gamopatia monoclonal e a imunofixação urinária revelou
banda monoclonal correspondente à cadeia leve kappa
O xantogranuloma necrobiótico (XN) é uma histiocitose não (Bence Jones); na imunofixação sérica foi detectada banda
Langerhans, descrita inicialmente em 1980,1 que se carac- monoclonal IGG kappa. O paciente foi encaminhado para o
teriza por placas e nódulos amarelados com tendência a serviço de hematologia, no qual fez biópsia de medula óssea,
ulceração, podem infiltrar principalmente a região perior- sem critérios para doenças hematológicas no momento do
bitária, a superfície flexora das extremidades e o tronco. inquérito. O paciente atualmente está em uso de dapsona,
Não há predileção por gênero e acomete pacientes de meia- apresenta melhoria parcial das lesões. Segue em observação
-idade. em conjunto com a hematologia.
Relatamos o caso de um homem de 73 anos atendido no O XN apresenta achados cutâneos, predominantemente
ambulatório de dermatologia. Referia surgimento de lesões placas amareladas em área periorbital, tronco e extremi-
amareladas no tronco havia dois anos. Ao exame físico, dades, associadas na maioria das vezes à paraproteinemia;
foram evidenciadas placas anulares infiltradas com centro além disso, pode coexistir com envolvimento sistêmico de
claro e bordas eritematosas no tórax, abdome e membros múltiplos órgãos, como coração, trato respiratório, baço,
inferiores assintomáticas (figs. 1 e 2). Uma das lesões do rins, ovários, fígado, músculo esquelético e sistema ner-
abdome estava ulcerada. Referia diagnóstico prévio, havia voso central.2 Até 80% dos pacientes com diagnóstico de XN
cerca de 20 anos, de granuloma anular. Foi feita biópsia da apresentam ou apresentarão paraproteinemia monoclonal,
lesão do abdome (fig. 3) com hipóteses diagnósticas de XN, predominantemente do tipo gamopatia monoclonal IgG
necrobiose lipóidica, granuloma anular e xantoma. A his- kappa ou Lambda.1
A associação entre o XN e distúrbios hematológicos está
bem documentada, com aumento do risco de doenças hema-
tológicas, malignidades e doenças linfoproliferativas.3 Os
distúrbios hematológicos podem surgir até oito anos antes ou
DOI referente ao artigo:
11 anos após o aparecimento de lesões cutâneas.4 Por essa
https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.03.007
夽 Como citar este artigo: Fasciani IA, Valente NYS, Luce MCA, razão, pacientes diagnosticados com XN requerem cuidados
Kakizaki P. Necrotic Xanthogranuloma with disseminated annular continuados ao longo da vida.
lesions. An Bras Dermatol. 2020;95:117---9. Outras alterações que podem acompanhar o XN
夽夽 Trabalho realizado no Hospital do Servidor Público Estadual, são neutropenia, hipocomplementemia, crioglobulinemia
São Paulo, SP, Brasil.

03-fm1.pdf 123 30/03/20 12:57


118 CARTA - CASO CLÍNICO

Figura 3 Biópsia de pele. Xantogranuloma necrobiótico.


Presença de célula gigante e necrobiose do colágeno.

multinucleadas do tipo corpo estranho, além de linfócitos,


comprometem toda a derme.
Na patogênese do XN, sugere-se que as imunoglobuli-
nas séricas se ligam a lipídios, depositam-se na pele, o que
provocaria uma reação de corpo estranho. Outra hipótese
é que a paraproteína se ligaria à porção Fc da IgG e ati-
varia uma proliferação secundária de macrófagos. Também
foi proposto que a paraproteína no XN tem características
funcionais de uma lipoproteína que pode se ligar a recep-
tores de lipoproteínas de histiócitos e induzir formação do
granuloma.1 A etiologia desse distúrbio permanece obscura,
apesar das teorias que tentam esclarecer sua patogênese.
Consequentemente, o tratamento é difícil, sem terapia de
primeira linha recomendada e tendência a lesões cutâneas
Figura 1 Lesões em dorso. Placas amareladas, infiltradas anu- recorrentes.
lares com centro claro e bordas eritematosas. Entre as opções de tratamento encontram-se drogas
imunomoduladoras, agentes imunossupressivos, corticoste-
roides, agentes alquilantes, plasmaférese e radioterapia.5
No entanto, constatou-se que mesmo com o tratamento
as lesões tendiam a ser progressivas, com recorrência de
novas lesões. Devido à raridade, não há tratamento de pri-
meira linha recomendado. Desse modo, a opção terapêutica
deve ser escolhida baseada nas condições hematológi-
cas associadas ao distúrbio, bem como na localização,
extensão e grau de comprometimento da vida do paci-
ente.

Suporte financeiro
Figura 2 Detalhe da lesão em abdome. Placa amarelada no
abdome. Nenhum.

ou hiperlipidemia. Doenças associadas incluem mie- Contribuição dos autores


loma múltiplo, leucemia linfocítica crônica, doença de
Hodgkin, linfoma não Hodgkin, asma e edema de Isaura Azevedo Fasciani: Elaboração e redação do manus-
Quincke. crito.
O diagnóstico diferencial de XN é feito com a necro- Neusa Yuriko Sakai Valente: Análise estatística,
biose lipoídica, xantogranuloma juvenil, granuloma anular, aprovação da versão final do manuscrito, participação
granuloma de corpo estranho, nódulos reumatoides sub- efetiva na orientação da pesquisa, revisão crítica da
cutâneos, xantomas (disseminado, normolipêmico plano, literatura.
primário e secundário), amiloidose e doença de Erdheim- Maria Claudia Alves Luce: Concepção e planejamento do
-Chester. estudo.
Na histopatologia, o XN mostra áreas típicas de necro- Priscila Kakizaki: Aprovação da versão final do manus-
biose circundadas por granulomas compostos por células crito, participação efetiva na orientação da pesquisa,
gigantes de Touton, histiócitos espumosos e células gigantes revisão crítica do manuscrito.

03-fm1.pdf 124 30/03/20 12:57


CARTA - CASO CLÍNICO 119

a,∗
Conflitos de interesse Isaura Azevedo Fasciani ,
a
Neusa Yuriko Sakai Valente ,
b
Nenhum. Maria Claudia Alves Luce
b
e Priscila Kakizaki
Referências a
Departamento de Dermatologia, Hospital do Servidor
Público Estadual, São Paulo, SP, Brasil
b
1. Ugurlu S, Bartley GB, Gibson LE. Necrobiotic xanthogranuloma: Departamento de Dermatopatologia, Hospital do Servidor
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Recebido em 21 de novembro de 2018; aceito em 13 de
4. Wood AJ, Wagner MV, Abbott JJ, Gibson LE. Necrobiotic xantho- março de 2019
granuloma: a review of 17 cases with emphasis on clinical and Disponível na Internet em 14 de fevereiro de 2020
pathologic correlation. Arch Dermatol. 2009;145:279---84. 2666-2752/
5. Miguel D, Lukacs J, Illing T, Elsner P. Treatment of necrobiotic © 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por
xanthogranuloma - a systematic review. J Eur Acad Dermatol Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma
Venereol. 2017;31:221---35. licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

Um caso de atrofodermia linear recebe o nome do pesquisador que, em 1992, relatou o


caso de cinco pacientes com faixas pigmentadas mais ou
de Moulin夽,夽夽 menos atróficas ao longo das linhas de Blaschko.1 A ALM
geralmente evolui como lesão atrófica linear nos primeiros
Prezado Editor,
meses, deixa então de progredir e persiste. Sua etiologia
permanece incerta. Todos os casos relatados até o momento
Uma menina chinesa de 15 anos apresentou história de 10
foram esporádicos. Ela pode estar ligada a um mosaicismo
anos de máculas marrom-claras assintomáticas e unilaterais
genético ou autoimunidade. Um estudo do componente atró-
que afetavam o braço direito e o lado direito do tronco.
fico da ALM por ultrassonografia revelou que a redução
Não havia histórico de lesões cutâneas ou inflamação. O
do volume subcutâneo, não a diminuição da derme, foi
histórico médico e familiar não foi significativo. No exame
a causa da aparência atrófica.2 Embora sua manifestação
físico, foram observadas máculas atróficas lineares hiperpig-
clínica seja singular, a histopatologia da ALM é bastante dis-
mentadas no braço e tronco direitos que seguiam as linhas
creta. A coloração com hematoxilina & eosina geralmente
de Blaschko e acometiam os aspectos anterior e posterior.
evidencia hiperpigmentação apenas na camada basal da
A pele estava levemente atrófica à palpação. Não foram
epiderme, ausência de colágeno anormal ou fibras elásti-
observados sinais de enrijecimento ou inflamação (fig. 1A-
cas alteradas na derme ou de qualquer inflamação óbvia.1
-B). Os exames laboratoriais --- inclusive hemograma, taxa
Pode haver certo grau de infiltrado linfocitário perivascu-
de sedimentação de eritrócitos, teste da função hepática,
lar, acantose, adelgaçamento da epiderme, alterações no
perfil renal e anticorpos antinucleares --- foram todos negati-
colágeno dérmico e redução ou fragmentação do tecido
vos ou dentro da faixa normal. A biópsia de lesão evidenciou
elástico.2
epiderme normal com pigmentação aumentada na camada
López et al.3 propuseram os seguintes critérios diagnósti-
basal, colágeno dérmico mais compacto e infiltração lin-
cos para a ALM: 1) Início durante a infância ou adolescência;
focitária perivascular de pequeno grau na derme superior
2) Desenvolvimento de lesões unilaterais hiperpigmentadas,
(fig. 2). A dermatoscopia evidenciou rede marrom-clara com
levemente atróficas, que seguem as linhas de Blaschko no
margens pouco demarcadas. Foi estabelecido o diagnóstico
tronco ou nos membros; 3) Ausência de inflamação prévia
de atrofodermia linear de Moulin (ALM) e iniciou-se o trata-
ou de esclerodermia subsequente; 4) Curso clínico estável,
mento tópico com creme de halometasona a 0,5% e creme
não progressivo, sem padrão de remissão; 5) Achados histo-
de hidroquinona a 2% por dois meses, sem melhora.
lógicos de hiperpigmentação da camada basal da epiderme e
A ALM é entidade clínica rara e distinta, caracteri-
derme normal com tecido conjuntivo e fibras elásticas inal-
zada por lesões cutâneas unilaterais, hiperpigmentadas e
terados. Até o momento, mais de 30 casos de ALM foram
atróficas em faixa, que seguem as linhas de Blaschko,
relatados na literatura. No entanto, esse diagnóstico pode
sem inflamação prévia ou aparência esclerótica. A doença
ter sido superestimado. Se os critérios diagnósticos forem
rigorosamente seguidos, alguns casos não podem ser clas-
sificados como ALM, pois esses autores relataram achados
histológicos compatíveis com outras entidades clínicas.3
DOI referente ao artigo: A ALM deve ser diferenciada da atrofodermia de Pasini
https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.03.005
夽 Como citar este artigo: Zhang L-W, Ma M-S, Chen T, Fu L- e Pierini (APP), que apresenta configuração, atrofia e
hiperpigmentação semelhantes, mas não segue as linhas
-X. A case of linear atrophoderma of Moulin. An Bras Dermatol.
2020;95:119---21. de Blaschko. Além disso, a ALM é diferente da morfeia
夽夽 Trabalho realizado no Chengdu Second People’s Hospital, linear, que geralmente apresenta inflamação, enrijecimento
Sichuan, China. ou esclerodermia anteriores.

03-fm1.pdf 125 30/03/20 12:57


120 CARTA - CASO CLÍNICO

Figura 2 Epiderme normal com pigmentação aumentada


da camada basal, com colágeno dérmico mais compacto e
infiltração linfocitária perivascular de pequeno grau na derme
superior (Hematoxilina & eosina, 40×).

Não existe tratamento eficaz para a ALM. Corticosteroi-


des tópicos e heparina não foram bem-sucedidos. Alguns
tratamentos experimentais levaram a uma resposta parcial:
calcipotriol tópico, metotrexato sistêmico ou aminobenzo-
ato e terapia intralesional com plasma rico em plaquetas.5
O presente relato apresenta um caso de ALM com caracte-
rísticas clínicas e histopatológicas clássicas.

Suporte financeiro
Nenhum.

Contribuição dos autores


Li-wen Zhang: Aprovação da versão final do manuscrito;
concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação
do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica
do manuscrito.
Meng-sha Ma: Obtenção, análise e interpretação dos
dados; revisão crítica do manuscrito.
Tao Chen: Aprovação da versão final do manuscrito;
concepção e planejamento do estudo.
Li-xin Fu: Revisão crítica da literatura.
Figura 1 A, Máculas lineares hiperpigmentadas no braço
direito e tronco direito que seguem as linhas de Blaschko. B,
Máculas lineares hiperpigmentadas no braço direito e tronco Conflitos de interesse
direito seguindo as linhas de Blaschko.
Nenhum.

Histopatologicamente, a morfeia apresenta feixes de Referências


colágeno compactados e orientados horizontalmente, com
perda progressiva dos anexos cutâneos e da gordura sub- 1. Moulin G, Hill MP, Guillaud V, Barrut D, Chevallier J, Thomas
cutânea. No entanto, ainda não existe um consenso se a L. Acquired atrophic pigmented band-like lesions following Blas-
ALM é uma entidade distinta. Existem muitas semelhanças chko’s lines. Ann Dermatol Venereol. 1992;119:729---36.
2. Norisugi O, Makino T, Hara H, Matsui K, Furuichi M, Shimizu
clínicas e histológicas entre ALM, APP e morfeia; portanto,
T. Evaluation of skin atrophy associated with linear atropho-
alguns autores sugerem que essas doenças são parte de um derma of Moulin by ultrasound imaging. J Am Acad Dermatol.
espectro e que a ALM pode não ser uma entidade distinta.4 2011;65:232---3.
A ALM pode ser uma variante Blaschko-linear da APP, que 3. Lopez N, Gallardo MA, Mendiola M, Bosch R, Herrera E. A
por sua vez pode ser considerada uma forma abortiva de case of linear atrophoderma of Moulin. Actas Dermosifiliogr.
morfeia.4 2008;99:165---7.

03-fm1.pdf 126 30/03/20 12:57


CARTA - CASO CLÍNICO 121


4. de Golian E, Echols K, Pearl H, Davis L. Linear atrophoderma of Autor para correspondência.
Moulin: a distinct entity? Pediatr Dermatol. 2014;31:373---7. E-mail: 13980427003@163.com (T. Chen).
5. Kharkar VD, Abak BA, Mahajan SA. Linear atrophoderma of
Recebido em 18 de janeiro de 2019; aceito em 18 de março
Moulin: a rare entity. Indian J Dermatol Venereol Leprol.
2018;84:591---4. de 2019
Disponível na Internet em 15 de fevereiro de 2020

Li-Wen Zhang , Meng-Sha Ma , Tao Chen 2666-2752/
e Li-Xin Fu © 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por
Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma
Departamento de Dermatovenereologia, Chengdu Second licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).
People’s Hospital, Sichuan, China

Micose fungoide folicular com comprometimento sistêmico foi detectado no exame de ima-
gem corporal. Foi estabelecido o diagnóstico de MFF. O
espículas e lesões similares a paciente foi tratado com interferon alfa (3.000.000 unida-
hidradenite supurativa em um des, três vezes por semana) e clobetasol tópico, alcançando
paciente --- Remissão completa remissão completa um ano depois, sem recidivas após três
com interferon alfa夽,夽夽 anos de acompanhamento (fig. 3).
A MFF é observada em menos de 10% dos pacientes com
Prezado Editor, MF. Essa variante é mais comum em homens, com uma

A micose fungoide folicular (MFF) é variante da micose


fungoide (MF) com características clínico-patológicas distin-
tas, nas quais os linfócitos T neoplásicos exibem tropismo
para o epitélio folicular.1 O espectro das manifestações
clínicas é heterogêneo.1,2 Entre elas, lesões acneiformes
são comuns, mas lesões similares à hidradenite supurativa
(LSHS) foram pouco descritas na literatura. Além disso, a
MFF com espículas é uma apresentação clínico-patológica
incomum, caracterizada por múltiplas pápulas foliculares
hiperqueratóticas.
Um homem saudável de 65 anos apresentou história de
seis meses de lesões cutâneas generalizadas, alopecia e
prurido intenso. No exame dermatológico, foram observa-
das inúmeras pápulas foliculares pontiagudas e alopecia do
couro cabeludo (fig. 1), com lesões queratóticas folicula-
res na tricoscopia. Alopecia irregular dos pelos do corpo e
múltiplas espículas hiperqueratóticas milimétricas no tronco
e membros estavam presentes, dando a sensação de pele
áspera à palpação. Além disso, observou-se LSHS na área
axilar. Não foi observada linfadenopatia palpável ou viscero-
Figura 1 Comprometimento extenso do couro cabe-
megalia. A biópsia do couro cabeludo evidenciou infiltrado
ludo, com numerosas pápulas foliculares hiperqueratóticas
de linfócitos atípicos no epitélio folicular, com epidermo-
esbranquiçadas e pontiagudas, além de alopecia.
tropismo (fig. 2). Imuno-histoquimicamente, os linfócitos
foliculares apresentaram positividade para CD3 e CD4, com
perda parcial de CD7; CD30 foi negativo. A análise molecular
do TCR demonstrou uma população monoclonal de linfó-
citos. Os exames laboratoriais estavam dentro dos limites
normais (hemograma, células de Sézary, bioquímica, ele-
troforese, imunoglobulinas, ␤-2 microglobulina) e nenhum

DOI referente ao artigo:


https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.04.011
夽 Como citar este artigo: Garcia-Arpa M, Flores-Terry MA, Franco-

-Muñoz M, de Lara-Simón IM. Spiky follicular mycosis fungoides and


hidradenits suppurativa-like lesions in a patient --- complete remis- Figura 2 Biópsia do couro cabeludo: infiltrado de linfócitos
sion with interferon alpha. An Bras Dermatol. 2020;95:121---3. de pequeno a médio porte com atipia de pequeno grau, ao
夽夽 Trabalho realizado no Departamento de Dermatologia, Hospital redor e dentro do epitélio folicular. Não foi observada mucinose
Geral Universitário de Ciudad Real, Ciudad Real, Espanha. folicular (Hematoxilina & eosina, 20 × ).

03-fm1.pdf 127 30/03/20 12:57


122 CARTA - CASO CLÍNICO

ciadas e mucinose folicular.3 Os linfócitos foliculotrópicos


são geralmente CD4 + (e frequentemente CD7 − ) e menos
comumente CD8 + , com ocasional rearranjo de genes gama
de receptores de células T.
Embora o curso da MFF seja comparável ao estágio tumo-
ral da MF clássica, estudos recentes indicam um melhor
prognóstico para certos pacientes. Assim, a MFF pode
ser dividida em três subgrupos, considerando os critérios
clínico-patológicos, com sobrevida significativamente dife-
rente: 1) pacientes que apresentam manchas foliculares
e/ou pápulas foliculares frequentemente associadas à alo-
pecia, lesões acneiformes, LSQP ou placas com infiltrados
perifoliculares histologicamente esparsos, como no presente
caso, apresentam a melhor sobrevida e um excelente prog-
nóstico (sobrevida global [SG] em cinco e 10 anos: 92% e
72%, respectivamente); 2) pacientes que apresentam pla-
cas infiltradas, caracterizadas histologicamente por densos
infiltrados perifoliculares com muitas células T de tamanho
médio a grande, tumores e eritrodermia (doença avançada
Figura 3 Repovoamento capilar após um ano de tratamento e limitada à pele; SG em cinco e 10 anos: 55% e 28%); 3)
com interferon alfa. MFF com doença extracutânea e mau prognóstico. Embora
o tratamento ideal para esses subgrupos ainda não esteja
estabelecido, pacientes do primeiro subgrupo podem se
idade de apresentação semelhante às formas clássicas (de beneficiar de terapias direcionadas à pele.2,5
55 a 60 anos). Ela se apresenta tipicamente como pla- Em conclusão, este relato descreveu o caso de um
cas e tumores endurecidos sem pelos, principalmente na paciente com duas manifestações incomuns da MFF, com
cabeça e no pescoço, com prurido. No entanto, a MFF é excelente evolução.
caracterizada por um amplo espectro clínico que compre-
ende uma combinação variável de lesões foliculares que Suporte financeiro
podem coexistir.1,2 Entre elas, a MFF com espículas foi
bem descrita em uma série recente de oito casos.3 Essa
Nenhum.
apresentação clínica peculiar não foi muito relatada na
literatura, visto se tratar de uma apresentação clínico-
-patológica incomum da MFF (prevalência de 7,8%).3 Essa Contribuição dos autores
apresentação se caracteriza por uma manifestação precoce
com um curso relativamente favorável, principalmente na Mónica García Arpa: Conceito; definição do conteúdo inte-
ausência de lesões mais típicas. Clinicamente, é caracte- lectual; busca na literatura; preparação do manuscrito;
rizada por pequenas pápulas foliculares disseminadas ou edição do manuscrito; revisão do manuscrito.
localizadas, hiperqueratóticas, pontiagudas e/ou cônicas, Miguel A. Flores-Terry: Aprovação da versão final do
dão uma sensação áspera à palpação. Os achados tricoscópi- manuscrito; revisão crítica do manuscrito.
cos incluem espessas camadas de fragmentos de queratina Monserrat Franco-Muñoz: Aprovação da versão final do
ao redor de aberturas foliculares dilatadas, além de múl- manuscrito; revisão crítica do manuscrito.
tiplas espículas ceratóticas cônicas ao redor das aberturas Isabel María de Lara Simón: Aprovação da versão final do
foliculares na dermatoscopia.4 Além disso, o presente caso manuscrito; revisão crítica do manuscrito.
apresentou LSHS axilar no início, com nódulos e cistos clas-
sificados no espectro de lesões acneiformes, comuns na MFF. Conflitos de interesse
No entanto, as LSHS são pouco mencionadas na literatura.
A formação de diferentes lesões foliculares na MFF pro-
Nenhum.
vavelmente é resultado da extensão e do grau de infiltração
do folículo piloso pelo infiltrado neoplásico. A presença de
linfócitos atípicos, especialmente quando formam coleções Agradecimentos
no epitélio folicular, é a principal característica para o diag-
nóstico. No entanto, o infiltrado pode conter outras células Ao Dr. Juan Luis Santiago Sánchez-Mateos por sua
inflamatórias e a atipia nuclear pode ser de pequeno grau, colaboração neste trabalho.
dificulta o diagnóstico. Além disso, as características histo-
patológicas das lesões foliculares hiperqueratóticas, como Referências
lesões similares à queratose pilar (LSQP) e MFF com espícu-
las, podem ser sutis, com infiltrado foliculotrópico de baixa 1. Willemze R, Jaffe ES, Burg G, Cerroni L, Berti E, Swerdlow
densidade, sugestivo de MFF precoce. Além disso, na MFF SH, et al. WHO-EORTC classification for cutaneous lymphomas.
com espículas pode ser observada uma coluna ortoquerató- Blood. 2005;105:3768---85.
tica ou paraqueratótica que sobressai da obstrução folicular; 2. van Santen S, Roach RE, van Doorn R, Horváth B, Bruijn
também é notável a ausência de células inflamatórias asso- MS, Sanders CJ, et al. Clinical staging and prognostic fac-

03-fm1.pdf 128 30/03/20 12:57


CARTA - CASO CLÍNICO 123
a
tors in folliculotropic mycosis fungoides. JAMA Dermatol. Departamento de Dermatologia, Hospital Geral
2016;152:992---1000. Universitário de Ciudad Real, Ciudad Real, Espanha
3. Tomasini C, Kempf W, Novelli M, Fava P, Annessi G, Rongioletti b
Departamento de Patologia, Hospital Geral Universitário
F, et al. Spiky follicular mycosis fungoides: a clinicopathologic de Ciudad Real, Ciudad Real, Espanha
study of 8 cases. J Cutan Pathol. 2015;42:164---72.

4. Souissi A, Ben Lagha I, Jendoubi F, Drissi H, Chelly I, Mokni M. Autor para correspondência.
Spiky follicular mycosis fungoides: a trichoscopic feature. J Eur E-mail: mgarciaa73@yahoo.es (M. Garcia-Arpa).
Acad Dermatol Venereol. 2019;33:e252---3.
Recebido em 17 de janeiro de 2019; aceito em 1 de abril de
5. van Santen S, van Doorn R, Neelis KJ, Daniëls LA, Horváth B,
Bruijn MS, et al. Recommendations for treatment in folliculotro- 2019
pic mycosis fungoides: report of the Dutch Cutaneous Lymphoma Disponível na Internet em 16 de fevereiro de 2020
Group. Br J Dermatol. 2017;177:223---8. 2666-2752/
© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por
a,∗ a
Mónica Garcia-Arpa , Miguel A. Flores-Terry , Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma
a
Monserrat Franco-Muñoz licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).
b
e Isabel María de Lara-Simón

Anetodermia: um alerta para a desordens trombóticas, com presença de três anticorpos


antifosfolípides reagentes (anticardiolipina, anticoagulante
síndrome do anticorpo lúpico e anti-␤2-glicoproteína-I), e, portanto, foram preen-
antifosfolípide夽,夽夽 chidos os critérios diagnósticos de SAAF. Por fim, velocidade

Prezado Editor,

Transtorno raro, a anetodermia descreve uma desordem das


fibras elásticas da pele, caracterizada por áreas circuns-
critas de atrofia e hipopigmentação. Tem etiologia ainda
desconhecida e pode estar associada a causas genéticas,
mecanismos autoimunes, infecciosos ou elastofagocitose.
Além disso, fenômenos pró-trombóticos e presença de
anticorpos antifosfolípides têm sido observados nesses paci-
entes.
Descrevemos a seguir um caso de paciente portador de
anetodermia primária e síndrome do anticorpo antifosfolí-
pide (SAAF). Em muitos casos da SAAF, a anetodermia pode
ser a primeira ou mais evidente manifestação da doença.
Essa associação, entretanto, é muitas vezes esquecida e o
que poderia precaver um episódio de trombose não ocorre.
Paciente de 43 anos, sexo masculino, procedente de
Taciba, São Paulo, com lesões cutâneas em braços e tronco
havia três anos. Previamente epiléptico e história de trom-
bose venosa profunda havia um ano. Fazia uso contínuo
de fenobarbital e carbamazepina. No exame dermatoló-
gico notavam-se placas arredondadas, hipocrômicas, com Figura 1 Múltiplas pápulas hipopigmentadas com atrofia cen-
aspecto atrófico e flacidez central, distribuídas por toda tral em braço esquerdo.
região dorsal e braços bilateralmente (figs. 1 e 2). Foi
aventada a hipótese de anetodermia e feita biópsia que
exibiu fibras colágenas desorganizadas e fibras elásticas
rotas em derme superficial e média, além de um infil-
trado linfomononuclear perivascular leve superficial em
derme (fig. 3). Hemograma, eletrólitos, função hepática e
renal eram normais. Feita investigação laboratorial para

DOI referente ao artigo:


https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.04.010
夽 Como citar este artigo: Genta MP, Abreu MAMM, Nai GA. Ane-

toderma: an alert for antiphospholipid antibody syndrome. An


BrasDermatol. 2020;95:123---5.
夽夽 Trabalho realizado no Hospital Regional de Presidente Pru- Figura 2 Múltiplas pápulas hipopigmentadas com atrofia cen-
dente, Presidente Prudente, SP, Brasil. tral em dorso e membros superiores.

03-fm1.pdf 129 30/03/20 12:57


124 CARTA - CASO CLÍNICO

em membro inferior, foi aventada a possibilidade de SAAF


e feita investigação laboratorial, que evidenciou anticor-
pos antifosfolípides presentes e fechou assim o diagnóstico
proposto.
Recentemente, um estudo com pacientes portadores
de anetodermia mostrou que de nove pacientes acometi-
dos, nove apresentavam anticorpos antifosfolípides e quatro
fechavam os critérios para a síndrome. Além disso, todos
apresentavam anormalidades protrombóticas. Assim, um
processo isquêmico seguido de degeneração das fibras elás-
ticas foi sugerido como etiopatogenia da anetodermia nesses
casos.3
Outras possíveis explicações descritas foram o aumento
de gelatinases na pele dos pacientes com anetodermia ou,
ainda, a presença de um epítopo comum entre fibras elásti-
cas e fosfolipídios (␤2-glicoproteína1).4
Não há tratamento efetivo para a anetodermia. Embora
muitas modalidades já tenham sido usadas --- injeção intra-
lesional de corticoide, penicilina G, salicilatos, fenitoína,
dapsona e vitamina E ---, nenhuma delas foi comprovada-
mente satisfatória. No paciente descrito, tentou-se injeção
intralesional de corticoide, sem resposta terapêutica.5
Figura 3 Fibras elásticas encurtadas e fragmentadas na Por fim, nosso caso ressalta a importância da investigação
derme papilar (Verhoeff-Van Gieson, 400×). clínica de transtornos de coagulação em pacientes com ane-
todermia, para que se possam prever eventos trombóticos
com desfechos infortúnios nesses pacientes.
de hemossedimentação, proteína C-reativa e fator reuma-
toide eram normais e sorologias para HIV, hepatites e VDRL,
negativas. O paciente foi encaminhado para o serviço de reu- Suporte financeiro
matologia e hematologia, onde permanece em seguimento.
A anetodermia é um transtorno no qual ocorre perda das Nenhum.
fibras elásticas na derme papilar ou reticular. Apresenta-
-se como pápulas ou placas arredondadas hipopigmentadas
Contribuição dos autores
com sensação de hérnia do subcutâneo. Sua etiopatogê-
nese permanece incerta e pode ser classificada, conforme as
condições desencadeadoras, como primária ou secundária. Mariana Piraja Genta: Concepção e planejamento do estudo;
A anetodermia primária acomete áreas de pele previamente elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da lite-
saudáveis; já a anetodermia secundária ocorre em regiões ratura.
acometidas por patologias prévias, como acne ou varicela. Marilda Aparecida Milanez Morgado de Abreu: Aprovação
Associação com processos infecciosos, medicamentos e dis- da versão final do manuscrito; concepção e planejamento
túrbios autoimunes, entre esses a SAAF, tem sido relatada do estudo; participação efetiva na orientação da pesquisa;
como causa de anetodermia primária.1 participação intelectual em conduta propedêutica e/ou
A SAAF é uma trombofilia adquirida, caracterizada pela terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manus-
presença de anticorpos antifosfolípides, desordens trom- crito.
bóticas e/ou perdas fetais recorrentes. Complicações com Gisele Alborghetti Nai: Obtenção, análise e interpretação
acidentes cerebrovasculares são frequentes e o envol- dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa.
vimento cutâneo também é comum. As manifestações
cutâneas incluem: anetodermia, úlceras necróticas tipo Conflitos de interesse
vasculopatia livedoide, úlceras necróticas extensas tipo
pioderma gangrenoso, ulcerações periungueais, púrpura
Nenhum.
necrotizante, gangrenata digital, hemorragias subungueais
lineares múltiplas, necrose cutânea superficial disseminada,
livedo reticular, livedo racemoso, acrocianose, síndrome dos Agradecimentos
dedos azuis, púrpura pigmentosa crônica e urticária crô-
nica. Desse modo, a anetodermia pode ser considerada uma Ao Professor Arno Tempelaars, pela criteriosa revisão do
manifestação cutânea da SAAF.2 texto.
No caso relatado, o paciente apresentava lesões cutâ-
neas compatíveis com anetodermia, que foi confirmada pela
biópsia. O histopatológico exibia fibras colágenas desorgani- Referências
zadas e fibras elásticas rotas em derme superficial e média e
infiltrado linfomononuclear perivascular leve superficial em 1. Thornsberry LA, LoSicco KI, English JC 3rd. The skyn and hiper-
derme. Com a história prévia de trombose venosa profunda coagulable states. J Am Dermatol. 2013;69:450---62.

03-fm1.pdf 130 30/03/20 12:57


CARTA - CASO CLÍNICO 125
a
2. Criado PR, Rivitti EA, Vasconcellos C, Valente NYS, Martins Departamento de Dermatologia, Hospital Regional de
JEC. Manifestações cutâneas das trombofilias. An Bras Dermatol. Presidente Prudente, Presidente Prudente, SP, Brasil
2008;83:491---506. b
Departamento de Patologia, Universidade do Oeste
3. Sparsa A, Piette JC, Wechsler B, Amoura Z, Francès C. Aneto- Paulista, Presidente Prudente, SP, Brasil
derma and its prothrombotic abnormalities. J Am Acad Dermatol.

2003;49:1008---12. Autor para correspondência.
4. Romaní J, Pérez F, Llobet M, Planagumá M, Pujol RM. Aneto- E-mail: maripgenta@hotmail.com (M.P. Genta).
derma associated with antiphospholipid antibodies: case report
Recebido em 28 de fevereiro de 2019; aceito em 18 de abril
and review of the literature. J Eur Acad Dermatol Venereol.
2001;15:175---8. de 2019
5. Bilen N, Bayramgürler D, Sikar A, Erçin C, Yilmaz A. Anetoderma Disponível na Internet em 15 de fevereiro de 2020
associated with antiphospholipid syndrome and systemic lupus
2666-2752/
erythematosus. Lupus. 2003;12:714---6.
© 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por
a,∗
Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma
Mariana Piraja Genta , licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).
a
Marilda Aparecida Milanez Morgado de Abreu
b
e Gisele Alborghetti Nai

Alopecia frontal fibrosante Os padrões clínicos de AFF têm sido descritos com base na
familiar em seis irmãs夽,夽夽 recessão frontal do cabelo como padrão I (linear), padrão II
(difuso), padrão III (pseudo-‘‘sinal da franja’’)4 e padrão
Prezado Editor, irregular.5 Em nossa série, o padrão II é encontrado em todas
as pacientes e em uma, o padrão irregular.
A alopecia frontal fibrosante (AFF) é uma alopecia cica- A genética da AFF ainda é desconhecida. Estudos mos-
tricial progressiva descrita pela primeira vez por Kossard tram que o HLA-DR1 foi implicado no líquen plano e na
em 1994 e que tem se tornado mundialmente epidêmica na síndrome de Graham-Little-Piccardi-Lassueur, mas não foi
última década. Casos familiares de AFF vêm sendo descri- encontrado em AFF.1 Casos familiares podem indicar um
tos desde 2008,1 mas as séries incluem até três parentes na mecanismo genético.
mesma geração ou cinco em duas gerações.2,3 Encontramos Além disso, a epidemia de AFF observada atualmente
um grupo de seis irmãs que apresentavam diagnóstico clínico sugere fortemente que um gatilho ambiental também pode
e histológico de AFF no Brasil. estar envolvido. Nesta série, não pudemos definir qualquer
Essa família é composta por oito irmãos, dois homens (não substância que pudesse ser apontada como esse fator, ape-
examinados) e seis mulheres, todas afetadas pela doença sar de todas terem usado protetor solar em algum momento
(fig. 1). Os pais não eram consanguíneos e não foram exami- de suas vidas.
nados, pois já faleceram. As irmãs moram na mesma cidade Até onde sabemos, esta é a maior série com AFF na
e não vivem juntas. Todas são menopausadas e nenhuma mesma família já descrita. Estudar essas famílias pode aju-
recebeu terapia de reposição hormonal (TRH). A idade de dar a entender a genética e a patogênese dessa intrigante
início da AFF variou de 31 a 62 anos e a idade média foi doença.
de 50,7 anos. Cinco têm alopecia de sobrancelhas e cílios e
quatro têm perda de pelos no corpo. O líquen plano pigmen- Suporte financeiro
toso (LPPig) é observado em duas irmãs e pápulas faciais em
três. O diagnóstico foi feito pelas características clínicas e
Nenhum.
tricoscópicas (fig. 2), pois elas se recusaram a se submeter
à biópsia. Como diagnóstico diferencial, poder-se-ia pensar
em ceratose pilar atrófica, mas nenhuma delas apresentava Contribuição dos autores
ceratose pilar.
De comorbidades encontramos hipertensão arterial sis- Vanessa Barreto Rocha: Aprovação da versão final do manus-
têmica (HAS) e diabetes mellitus (DM) em uma paciente, crito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e
trombose venosa profunda (TVP) e rinite alérgica em outras redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação
duas. Não há casos de disfunção tireoidiana. Os dados clíni- dos dados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do
cos e demográficos estão resumidos na tabela 1. manuscrito.
Mario Cezar Pires: Aprovação da versão final do manus-
crito; participação efetiva na orientação da pesquisa;
revisão crítica do manuscrito.
Leticia Arsie Contin: Aprovação da versão final do manus-
DOI referente ao artigo:
crito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e
https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.02.009
夽 Como citar este artigo: Rocha VB, Pires MC, Contin LA. Fami- redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação
lial fibrosing frontal alopecia in six sisters. An Bras Dermatol. dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa;
2020;95:125---8. participação intelectual em conduta propedêutica e/ou
夽夽 Trabalho realizado no Hospital do Servidor Público Municipal terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manus-
de São Paulo, Vila Clementino, SP, Brasil. crito.

03-fm1.pdf 131 30/03/20 12:57


Rev ABDP-Vol95n1.pdf 133 30/03/20 13:55
128 CARTA - CASO CLÍNICO

Figura 2 Tricoscopia da região de implantação frontal das pacientes a, b, e, f, mostra ausência de velos e eritema e descamação
perifoliculares em todos os casos e descamação interfolicular em c,d.

Conflitos de interesse an Incomplete Clinical Presentation. Skin Appendage Disord.


2017;3:190---2.

Nenhum. ∗
Vanessa Barreto Rocha , Mario Cezar Pires
e Leticia Arsie Contin
Referências
Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público
1. Roche M, Walsh M, Armstrong D. Frontal fibrosing alopecia - Estadual, Vila Clementino, SP, Brasil
- ocurrence in male and female siblings. J Am Acad Dermatol. ∗
2008;58(2 S2). AB 81.
Autor para correspondência.
2. Tziotzios C, Fenton DA, Stefanato CM, McGrath JA. Familial fron- E-mail: vanessabarreto@oi.com.br (V.B. Rocha).
tal fibrosing alopecia. J Am Acad Dermatol. 2015;73:e37. Recebido em 10 de setembro de 2018; aceito em 6 de feve-
3. Dlova N, Goh CL, Tosti A. Familial frontal fibrosing alopecia. Br J reiro de 2019
Dermatol. 2013;168:220---2. Disponível na Internet em 15 de fevereiro de 2020
4. Moreno-Arrones OM, Saceda-Corralo D, Fonda-Pascual P,
Rodrigues-Barata AR, Buendía-Castaño D, Alegre-Sánchez 2666-2752/
A, et al. Frontal fibrosing alopecia: clinical and prognostic © 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por
classification. J Eur Acad Dermatol Venereol. 2017;31:1739---45. Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma
5. Contin LA, de Almeida Ledá YL, Caldeira Nassif K, Suárez Res- licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).
trepo MV. Patchy Frontal Fibrosing Alopecia: Description of

03-fm1.pdf 134 30/03/20 12:57


An Bras Dermatol. 2020;95(1):129---132

Anais Brasileiros de
Dermatologia
www.anaisdedermatologia.org.br

CORRESPONDÊNCIA

Cuidado com artefatos na


microscopia confocal de
reflectância ao pesquisar hifas
na pele acral夽,夽夽
Prezado Editor,

Lemos com interesse o artigo de Veasey et al.1 , no qual


os autores relatam um caso de tinha negra palmar em
que a microscopia confocal de reflectância (MCR) foi usada
para confirmar o diagnóstico clínico. Tinha negra é uma
micose superficial cutânea pigmentada causada principal-
mente por Hortaea werneckii. A manifestação clínica típica
desse fungo é uma mácula isolada, com coloração marrom
a preta, assintomática, com bordas irregulares, localizada
principalmente nas palmas das mãos ou nas plantas dos
pés, pois se acredita que a infecção ocorra como resul-
tado da inoculação de uma fonte de contaminação (como
solo, esgoto, madeira ou adubo composto) após trauma nas
áreas afetadas. Embora geralmente sejam maiores e mais
Figura 1 Imagem de microscopia confocal de reflectância de
claras, essas lesões tendem a se assemelhar a nevos acrais
um caso de tinha negra revela estruturas lineares e hiperrefle-
ou melanoma, o que leva a muitas biópsias desnecessárias.
xivas finas na parte superior da epiderme (setas vermelhas; o
A MCR é uma técnica de imagem emergente e não inva-
asterisco indica um acrossiríngeo).
siva que pode mostrar as hifas como estruturas lineares e
hiperrefletivas finas no estrato córneo em micoses cutâ-
neas superficiais,2,3 inclusive tinha negra,1,4 o que permite
confirmar o diagnóstico clínico e evitar exames micológicos
convencionais e biópsias de pele1 (fig. 1). No entanto, as
hifas devem ser diferenciadas dos contornos dos queratinó-
citos normais, que podem formar linhas finas, e de artefatos.
Curiosamente, corpúsculos hiperreflexivos estrelados são
frequentemente visíveis na pele acral à MCR, possivelmente
correspondendo às membranas de queratinócitos em um
plano não paralelo ao cabeçote do microscópio.5 A figura 2
mostra a pele acral normal de uma pessoa saudável, na qual
esses artefatos são bem visíveis e são idênticos às imagens
apresentadas por Veasey et al.1 como hifas de tinha negra.
Os autores afirmaram que as hifas identificadas pela MCR na

DOIs se referem aos artigos:


https://doi.org/10.1016/j.abdp.2019.04.011,
https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.04.013
夽 Como citar este artigo: Cinotti E, Perrot JL, Rubegni P. Beware

of reflectance confocal microscopy artifacts when searching hyphae


Figura 2 Imagem de microscopia confocal de reflectância da
in acral skin. An Bras Dermatol. 2020;95:129---30.
夽夽 Trabalho realizado no Departamento de Ciências Médicas, pele acral normal de uma pessoa saudável mostra artefatos que
Cirúrgicas e Neurológicas, Seção de Dermatologia, Universidade de se apresentam como corpúsculos hiperreflexivos estrelados na
Siena, Hospital S. Maria alle Scotte, Siena, Itália. epiderme (setas amarelas; asteriscos indicam acrossiríngeos).

03-fm1.pdf 135 30/03/20 12:57


130 CORRESPONDÊNCIA

tinha negra eram tortuosas, irregulares e curtas, diferentes Referências


da morfologia das hifas delgadas e alongadas dos derma-
tófitos. No entanto, em nossa experiência e no outro caso 1. Veasey JV, Avila RB, de, Ferreira MAM, de O, Lazzarini R. Reflec-
de tinha negra relatado na literatura, as hifas de H. wer- tance confocal microscopy of tinea nigra: comparing images with
neckii se apresentam alongadas e delgadas à MCR. Além dermoscopy and mycological examination results. An Bras Derma-
disso, também é possível observar que elas são septadas. tol. 2017;92:568---9.
O caso de Veasey et al.1 destaca a dificuldade de identificar 2. Cinotti E, Perrot JL, Labeille B, Cambazard F. Reflectance con-
e descrever pela primeira vez o que não se conhece com as focal microscopy for cutaneous infections and infestations. J Eur
novas técnicas de imagem e sugere cautela ao se fazerem Acad Dermatol Venereol. 2016;30:754---63.
3. Cinotti E, Labeille B, Cambazard F, Perrot JL. Reflectance confo-
as primeiras descrições no campo da medicina.
cal microscopy in infectious diseases. G Ital Dermatol E Venereol.
Em conclusão, a MCR pode ajudar a identificar as hifas da
2015;150:575---83.
tinha negra, assim como de outras micoses cutâneas super- 4. Uva L, Leal-Filipe P, Soares-de-Almeida L, Ferreira J, Oliveira A.
ficiais, mas a presença de possíveis artefatos que imitam Reflectance confocal microscopy for the diagnosis of tinea nigra.
estruturas fúngicas na pele acral deve ser considerada nessa Clin Exp Dermatol. 2018;43:332---4.
micose que afeta principalmente as palmas das mãos e as 5. Cinotti E, Perrot JL. Topographic and Skin Phototype Variations of
plantas dos pés. Skin with special emphasis on facial and acral skin. In: Gonzalez
S, editor. Reflectance Confocal Microscopy of Cutaneous Tumors.
Suporte financeiro India: CRC Press; 2017. p. 120.

a,∗ b
Nenhum. Elisa Cinotti , Jean Luc Perrot
a
e Pietro Rubegni
Contribuição dos autores a
Departamento de Ciências Médicas, Cirúrgicas e
Neurológicas, Universidade de Siena, Hospital de S. Maria
Elisa Cinotti: Aprovação da versão final do manuscrito;
alle Scotte, Siena, Itália
concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação b
Departamento de Dermatologia, Hospital Universitário
do manuscrito; revisão crítica do manuscrito.
de Saint-Etienne, Saint-Etienne, França
Jean Luc Perrot: Aprovação da versão final do manuscrito;
concepção e planejamento do estudo; obtenção, análise e ∗
Autor para correspondência.
interpretação dos dados; participação efetiva na orientação E-mail: elisacinotti@gmail.com (E. Cinotti).
da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêu-
tica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da Recebido em 28 de janeiro de 2019; aceito em 24 de abril
literatura; revisão crítica do manuscrito. de 2019
Pietro Rubegni: Aprovação da versão final do manuscrito; Disponível na Internet em 15 de fevereiro de 2020
obtenção, análise e interpretação dos dados; participação 2666-2752/
efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual © 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por
em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estu- Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma
dados; revisão crítica do manuscrito. licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

Conflitos de interesse
Nenhum.

Cuidado com artefatos à


microscopia confocal de pelos editores desta revista de responder os pontos levanta-
reflectância ao pesquisar hifas dos pelos autores no artigo ‘‘Beware of reflectance confocal
na pele acral --- Resposta夽,夽夽 microscopy artifacts when searching hyphae in acral skin’’.
Sabe-se que o agente etiológico da tinha negra, a Hortaea
Prezado Editor, wernekii, é um fungo geofílico demáceo. Os padrões der-
matoscópicos da tinha negra se apresentam em um aspecto
Agradecemos o interesse de Cinotti et al. em nossa fibrilar hipercrômico e ao exame micológico direto (EMD)
publicação sobre achados da tinha negra pelo exame de visualizam-se hifas septadas demáceas curtas e grossas,
microscopia confocal, bem como a oportunidade oferecida que correspondem ao achado dermatoscópico descrito.1,2 Os
demais casos atendidos em nosso serviço com isolamento de
H. wernekii pela cultura são compatíveis com esses achados
(fig. 1).
Tais fatos nos levaram a crer que as imagens identifi-
DOIs referente aos artigos:
https://doi.org/10.1016/j.abd.2019.04.014, cadas pela microscopia confocal de reflectância (MCR) em
https://doi.org/10.1016/j.abdp.2019.04.010 nosso artigo seriam compatíveis às hifas de H. wernekii
夽 Como citar este artigo: Veasey JV. Beware of reflectance con- que parasitam a epiderme. Vale ressaltar que as morfolo-
focal microscopy artifacts when searching hyphae in acral skin --- gias de estruturas curtas e espessas evidenciadas no exame
Reply. An Bras Dermatol. 2020;95:130---2. dermatoscópico e no EMD foram compatíveis com as visua-
夽夽 Trabalho realizado na Clínica de Dermatologia, Hospital da
lizadas pela MCR.3
Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.

03-fm1.pdf 136 30/03/20 12:57


CORRESPONDÊNCIA 131

Figura 1 Dois casos de tinha negra apresentam aspecto clínico clássico (A1, B1). Dermatoscopia de ambos os casos, com estruturas
lineares hipercrômicas curtas na epiderme (A2, B2). Exame micológico direto (KOH 20%), com hifas septadas demáceas curtas (A3
200 × , B3 400 × ).

Figura 2 A1, B1, C1: Aspecto clínico de micoses superficiais. A2, B2, C2: Exames micológicos diretos (KOH 20%) correspon-
dente aos quadros clínicos apresentados, apresenta em todos os casos hifas septadas hialinas finas e longas (100 × , 400 × , 200 × ,
respectivamente).

A imagem apresentada na correspondência, composta devam ser levados em consideração ao se encontrarem


de poucas hifas septadas finas e alongadas na superfície hifas finas e longas na análise de imagens de tinha negra,
da epiderme, poderia corresponder a fungos filamentosos visto que nos demais exames feitos para seu diagnóstico
que compõem a microbiota humana, conforme descrito em não é evidenciada essa morfologia delgada. Infelizmente
estudos do microbioma humano.4,5 Tais agentes, ao provo- não é possível avaliar pela MCR se as hifas apresentadas
car micoses superficiais, apresentam ao EMD hifas finas e nos casos são hialinas ou demáceas, uma vez que tanto a
longas (fig. 2), morfologia também já descrita em análises melanina quanto a parede celular dos fungos apresentam
de MCR.6---9 Outro fato importante no artigo de Cinotti et al. coloração branca pelo exame de MCR.
foi a falta de isolamento em cultura do fungo evidenciado Por fim, não se pode negar que a MCR para análise de
pelas imagens de MCR, impossibilitando a confirmação de se casos de tinha negra pode trazer armadilhas em seu diag-
tratar de hifas de H. wernekii. Acreditamos que esses fatos nóstico, quer seja pela presença de estruturas fúngicas

03-fm1.pdf 137 30/03/20 12:57


132 CORRESPONDÊNCIA

filamentosas nos exames que poderiam erroneamente ser 4. Jo JH, Deming C, Kennedy EA, Conlan S, Polley EC, Ng WI, et al.
consideradas como compatíveis à H. wernekii, quer pela Diverse Human Skin Fungal Communities in Children Converge in
presença de artefatos epidérmicos que poderiam ser consi- Adulthood. J Invest Dermatol. 2016;136:2356---63.
derados estruturas fúngicas. Esperamos que estudos futuros 5. Zaror L, Aliaga X. Dermatophytes in healthy Chilians. Mycoses.
ajudarão a elucidar com maior propriedade as estruturas 1990;33:95---8.
6. Friedman D, Friedman PC, Gill M. Reflectance confocal micros-
dessa dermatose.
copy: an effective diagnostic tool for dermatophytic infections.
Cutis. 2015;95:93---7.
Suporte financeiro 7. Liansheng Z, Xin J, Cheng Q, Zhiping W, Yanqun L. Diagnostic
applicability of confocal laser scanning microscopy in tinea cor-
Nenhum. poris. Int J Dermatol. 2013;52:1281---2.
8. Veasey JV, Meneses OMS, da Silva FO. Reflectance con-
focal microscopy of tinea capitis: comparing images with
Contribuição do autor results of dermoscopy and mycological exams. Int J Dermatol.
2018;58:849---51.
John Verrinder Veasey: Aprovação da versão final do manus- 9. Cinotti E, Perrot JL, Labeille B, Cambazard F. Reflec-
crito; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, tance confocal microscopy for cutaneous infections and
análise e interpretação dos dados; participação intelec- infestations. J Eur Acad Dermatol Venereol. 2016;30:
tual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos 754---63.
estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do ∗
manuscrito. John Verrinder Veasey
Setor de Dermatoses Infecciosas, Clínica de Dermatologia,
Conflitos de interesse Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, São Paulo, SP,
Brasil
Nenhum. ∗
Autor para correspondência.
E-mail: johnveasey@uol.com.br
Referências Recebido em 10 de março de 2019; aceito em 29 de abril de
2019
1. Delgado L, Criado PR, Alonso G. Dermoscopy revealing a case of Disponível na Internet em 13 de fevereiro de 2020
Tinea Nigra. An Bras Dermatol. 2013;88:128---9.
2. Veasey JV, Avila RB, Miguel BAF, Muramatu LH. White pie- 2666-2752/
dra, black piedra, tinea versicolor and tinea nigra: contribution © 2019 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por
to the diagnosis of superficial mycosis. An Bras Dermatol. Elsevier España, S.L.U. Este é um artigo Open Access sob uma
2017;92:413---6. licença CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).
3. Veasey JV, Avila RB, Ferreira MAMO, Lazzarini R. Reflectance
confocal microscopy of tinea nigra: comparing images with der-
moscopy and mycological examination results. An Bras Dermatol.
2017;92:568---9.

03-fm1.pdf 138 30/03/20 12:57


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