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SPUTNiK

power skills & o poder de


APRENDER
A APRENDER

Como a aprendizagem constante irá mudar


o jeito de sua equipe trabalhar
SUMÁRIO

POR QUE DIVIDIMOS NOSSOS SABERES? 3

A CISÃO E SUAS CONSEQUÊNCIAS 7

POWER SKILLS: UMA NOVA NARRATIVA PARA 14


UNIFICAR HABILIDADES

APRENDER A APRENDER: COMO A APRENDIZAGEM 20


CONSTANTE IRÁ MUDAR O JEITO DE SUA
EQUIPE TRABALHAR

BIBLIOGRAFIA 26
POR QUE
DIVIDIMOS
NOSSOS
SABERES?

Não é nada incomum nos depararmos com os termos Hard


Skills e Soft Skills quando o assunto é a nossa vida profis-
sional. Seja em uma entrevista, no cotidiano da empresa, ou
em qualquer relatório que pretenda nos orientar sobre como
nos preparar para o futuro do trabalho, Hard Skills e Soft
Skills se tornaram mais uma das muitas palavras em inglês
que passaram a povoar o universo corporativo e a criar uma
nova demanda para aqueles que pretendem estar conecta-
dos com o espírito do seu tempo.

MAS POR QUE, AFINAL, PRECISAMOS


SEGMENTAR HABILIDADES?
ANTES, É PRECISO DAR UM PASSO
PARA TRÁS E RELEMBRAR O QUE
SÃO CADA UM DESSES CONCEITOS.

Os termos e a distinção entre eles surgiram


pela primeira vez no Exército dos Estados
Unidos na década de 1970. As soft skills se
referiam às habilidades que não estavam en-
volvidas na operação de maquinários — sur-
gindo assim, em contraposição às hard skills
— e passaram a designar aquilo que o neu-
ropsicólogo de Cambridge Nicholas Hump-
frey, autor do livro Inner Eye: A evolução da
Inteligência social, declarou como sendo
àquilo de específico que nos definia como
seres humanos.

ESTES CONCEITOS PASSARAM


ENTÃO A DISTINGUIR:

competências técnicas competências socioemocionais


hard skills soft skills

que envolvem métodos, que estão sob


processos e podem ser um guarda-chuva de
quantificadas características geralmente
pouco definidas e de difícil
mensuração
JÁ DÁ PARA COMEÇAR A
ENTENDER O PORQUÊ DAS
SOFT SKILLS TEREM
ENFRENTADO UM LONGO
PROCESSO DE VALIDAÇÃO?
Por ter uma natureza distinta da lógica sob a qual
o processo educativo tradicional opera, a
educação corporativa mostrou resistência em
entender a potência das soft skills e a
necessidade de desenvolvê-las entre seus times.
De natureza não objetiva, tais habilidades foram
relegadas à segunda classe — aquela destinada à
skills que até podem ser desenvolvidas, mas que,
no fim do dia, não são tão importantes assim.
Mas frente à Quarta Revolução Industrial e o avanço expo-
nencial das tecnologias, não faz sentido fragmentarmos as
habilidades. Este projeto de mundo que temos construído
clama para que nos desenvolvamos de forma integral.
Para além de hard ou soft, é tempo de questionarmos de
que forma podemos focar em um caminho que integre habi-
lidades e que enxergue a pessoa, o funcionário em totalida-
de. Mais: como aprendemos a aprender para que essas
skills continuem sendo constantemente desenvolvidas?
Um tipo ou outro de skill não irá dar conta de lidar com a
complexidade dos problemas e desafios que se apresen-
tam. E o futuro do trabalho já sabe disso.

TOP 10 SKILLS
PARA 2025
Pensamento analítico e inovação.

Aprendizagem ativa e estratégias de aprendizado.

Resolução de problemas complexos.

Pensamento crítico e analítico.

Criatividade, originalidade e iniciativa.

Liderança e influência social.

Uso, monitoramento e controle da tecnologia.

Programação e design tecnológico.

Resiliência, tolerância ao stress e flexibilidade.

Racionalizar, resolver problemas e ideação.


Fonte: Future of Jobs Report 2020, Fórum Econômico Mundial.
“Não basta ensinar ao homem uma especialidade.
Porque se tornará assim uma máquina utilizável, mas
não uma personalidade. É necessário que adquira um
sentimento, um senso prático daquilo que vale a pena
ser empreendido, daquilo que é belo, do que é moral-
mente correto. A não ser assim, ele se assemelhará,
com seus conhecimentos profissionais, mais a um
cão ensinado do que a uma criatura harmoniosamen-
te desenvolvida. Deve aprender a compreender as
motivações dos homens, suas quimeras e suas an-
gústias para determinar com exatidão seu lugar exato
em relação a seus próximos e à comunidade.”

ALBERT EINSTEN
Educação em vista de um pensamento livre.
A CISÃO E SUAS
CONSEQUÊNCIAS
RAZÃO X EMOÇÃO

ESPÍRITO X MATÉRIA

SUJEITO X OBJETO

CULTURA X NATUREZA

MENTE X CORPO

O binarismo tem, sim, suas funções. Uma delas, por exemplo, é que, por
meio das ponderações, compreendamos a nós mesmos e ao mundo.
Esse modo de pensar, no entanto, também é limitante quando nos
coloca na berlinda e faz com que tenhamos de escolher entre esse ou
aquele e que tenhamos que, necessariamente, excluir as opções não se-
lecionadas.
VOCÊ PERCEBE COMO RAZÃO X EMOÇÃO ENTRAM NESSE JOGO?
Se a razão e suas habilidades — que envolvem métodos, processos e
podem ser quantificadas — são mais bem quistas no ambiente corpora-
tivo, por exemplo, qual o espaço que sobra para a emoção e suas habili-
dades com características geralmente pouco definidas e de difícil men-
suração?
A RAZÃO
DOMINADORA

Um breve contexto histórico dessa cisão:

As origens desse pensamento nos remetem à Grécia Antiga. Parmênides


de Eleia (530 a.C. — 460 a.C), partindo de um princípio lógico excludente
entre o que o fenômeno do ser é ou não é, lançou as bases para que
Platão (428 a.C.-347 a.C.) desenvolvesse uma filosofia dualista baseada
na divisão do mundo entre o mundo dos sentidos e o das ideias. Sua
teoria das ideias é construída a partir de um modo de pensamento base-
ado em valores específicos e determinados: organizado, sem contradi-
ções, distante das emoções e tendo como alvo alcançar o imutável, a
verdade universal do ser. Nega, para isso, aquilo que se relaciona com a
intuição, as sensações, o corpo e os afetos.

Esta cisão entre razão e emoção originária na filosofia platônica veio a


culminar, no decorrer dos séculos, na criação do método científico por
René Descartes (1596-1650), instituindo o princípio da verdade ao valor
da certeza garantida pelo domínio da razão na aplicação da técnica.

Não mais inteiros, nascemos como sujeitos modernos como seres hu-
manos partidos, aprisionados na intelectualidade que domina a
emoção.

Somos reduzidos assim a um “penso, logo existo”.


OS OUTROS DA RAZÃO

A partir daí, a cultura que se desenvolve é a de valorização ex-


cessiva da racionalidade, levando à desvalorização de outras
funções tão importantes quanto.

VALE DIZER:
Em sua obra “Yurugu: uma crítica abrangente do pensamento e
da cultura européia”, a antropóloga Marimba Ani identifica como
originário do pensamento platônico o asili da cultura europeia,
dominado não só pelo conceito de separação, mas também pelo
de controle.

TECLA SAP: asili é uma ferramenta de análise que se refere ao princípio


explicativo de uma cultura. Simplificando: é sua essência, o modelo que
carrega dentro de si o padrão arquetípico para seu desenvolvimento.

Voltemos. Ao estabelecer essas dicotomias, essas cisões,


criamos uma segmentação hierárquica que justifica uma
dominação do que é considerado positivo e do que é
considerado negativo. Fica bem evidente, agora, o porquê as
habilidades socioemocionais foram relegadas a um patamar
inferior, certo? Na lógica dual em que a racionalidade e a técnica
estão no topo da cadeia, skills que ultrapassam a dimensão
cognitiva e que envolvem de forma mais profunda o lado
emocional e psicológico são imediatamente desvalorizadas.
E O QUE A EDUCAÇÃO TEM A VER COM ISSO?

Instituída no século XIX com a formação das universidades


modernas e desenvolvida no século XX com o impulso dado
à pesquisa científica, a organização disciplinar dos saberes
se estabelece na tradição cartesiana descontextualizando o
estudo dos objetos, fragmentando o conhecimento, sepa-
rando os problemas e reduzindo o complexo em simples
busca de uma objetividade.

E se você pensa que esse modelo é retrógrado e ficou no


passado, engana-se. Ainda hoje, tal sistema de ensino
mantém sua hegemonia nas instituições escolares e segue
espalhando sua estrutura para graduações e formações
posteriores. A educação corporativa, inclusive, não foge à
regra.

“Mas, ok, qual o grande problema disso?”, você pode estar


se perguntando.

Essa organização costuma priorizar a intelectualidade abs-


trata e distante da vida e atua de modo a controlar os sabe-
res considerados mais úteis à produtividade. Mas muito
diferente do que se pensou por anos, uma pesquisa realiza-
da pela Universidade da Califórnia descobriu que funcioná-
rios felizes são até 31% mais produtivos, três vezes mais
criativos e vendem 37% a mais em comparação com outros.

E o que os deixa felizes?

De acordo com levantamento da MindTools for Business, a


oportunidade de aprender e se desenvolver é o fator mais
importante na felicidade do funcionário, atrás apenas da
própria natureza do trabalho realizado.
Segundo pesquisas de Roger Sperry no Instituto de Tecnologia da
Califórnia sobre a natureza bimodal do cérebro, os hemisférios direito e
esquerdo se conectam através de um corpo caloso que unifica o ser
pensante e o ser sensível. As funções opostas são complementares e
atuam em cooperação para o bom funcionamento do todo. Foi a nossa
crença cega na ideia de verdade que nos fez aceitar o domínio de
apenas uma parte do cérebro sobre a outra.

Ao não incentivarmos as funções associadas ao hemisfério direito do


cérebro — pensamento não verbal, global, espacial, complexo e intuitivo
—, perdemos a oportunidade de fazer com que nos desenvolvamos
plenamente.

E A HISTÓRIA COMEÇA LÁ E CONTINUA DURANTE A


ATRÁS, NAS CARTEIRAS VIDA TODA. EM OUTROS
ESCOLARES ESPAÇOS DE
APRENDIZAGEM PARA A
Nossos sistemas de ensino VIDA ADULTA
tradicionalmente se sustentam
assim em uma transmissão passiva, Mas o tradicional modelo de
de professor para o aluno, de um treinamento corporativo já não
conhecimento que se proclama supre mais as necessidades
autônomo, gerado no das empresas. Se antes investir
distanciamento da vida. O saber não em desenvolver qualificações
surge como uma construção isoladas parecia fazer sentido,
humana surgida no encontro com o hoje é preciso apostar na
outro. Sob a hegemonia da razão, educação, com ações
deixamos parte essencial da estratégicas para que o
formação de um ser humano de fora conhecimento seja adquirido de
da escola, uma das nossas maneira ininterrupta pelas
principais instituições socializadoras pessoas — funcionários,
e responsáveis pela formação dos clientes, fornecedores,
cidadãos. As inteligências outras comunidade —, em um
que não a analítica, linear e técnica processo contínuo.
não encontram assim na escola
tradicional um incentivo constante,
sistemático e institucional para o seu
desenvolvimento.
SOCIEDADE
TECNOCIENTÍFICA
X
LIFELONG
LEARNING

Encorajados por uma visão de mundo — e de aprendizagem — baseada


nessa cisão e em uma visão racionalista do humano, acabamos por nos
conduzir à máquina e à ordem tecnológica e seus imperativos de
objetividade. A ciência moderna, com sua vontade de saber e seu poder
de atuar de acordo com seus princípios de verdade, mescla-se com a
técnica de modo a instrumentalizá-la para pôr em prática a capacidade
superior da razão humana de controlar e dominar a natureza.

O saber técnico passa a ser subordinado a uma racionalidade de visão


generalizada que busca a eficiência da ação humana, dando origem a
uma ciência caracterizada por ser uma tecnociência, como propõe o
filósofo Umberto Galimberti. Tal modo de conhecer e atuar no mundo
transformou nossa organização social, vindo a configurar a nossa
própria sociedade como tecnocientífica, onde a pretensa objetividade do
conhecimento científico é efetivado em uma tecnologia que se torna
autônoma e pode abdicar do ser humano para se autogovernar.
Vemos essa perspectiva se consolidando de modo significativo na
Quarta Revolução que vivenciamos, em que a combinação de
tecnologias está se fundindo com nossas vidas físicas, mudando a
maneira como funcionamos e interagimos em todos os âmbitos da
existência.

Afinal, data never sleeps!

Mas dados, como qualquer produto de técnicas racionais, tendem a


incorporar, ocultar e amplificar vieses culturais, raciais e étnicos,
explicitando a fraqueza destes sistemas aparentemente objetivos
baseados em uma perspectiva de mundo parcial. Ao depositar nossa
confiança em pontos de vista meramente técnicos, sem considerar
todos os aspectos de questões complexas, vamos abrindo pontos
cegos em nossa percepção.

Com a interligação crescente das atividades humanas com sistemas de


inteligência artificial, um dos grandes desafios da nossa era é fazer a
informação servir de matéria-prima, ser integrada, transformada em
conhecimento, sempre revisada e revisitada pelo pensamento crítico
humano em um processo perene de lifelong learning.
POWER SKILLS:
UMA NOVA NARRATIVA PARA
UNIFICAR HABILIDADES
Já sabemos, portanto: o paradigma sob o qual se
erigiu a sociedade tecnocientífica contemporânea
deu origem a um ser fragmentado, cujos atributos
ligados à razão, ao intelecto, à objetividade e à ideia
de verdade se sobrepuseram de maneira dominado-
ra sobre os demais âmbitos da vida que não se en-
quadram na lógica cartesiana.

Mas em um mundo frágil, ansioso, não linear e


incompreensível (do inglês BANI: Brittle, Anxious,
Nonlinear, Incomprehensible), só a racionalidade
não dará conta.

Torna-se assim imprescindível buscarmos alternati-


vas de ser que nos permitam usufruir de modo pleno
de toda nossa potencialidade como humanos.
PARA ALÉM DA RAZÃO
FRAGMENTÁRIA

Segundo o filósofo britânico David Hume, a ideia não existiria como uma rea-
lidade independente que preside a tudo, mas é algo que surge tendo por
base a experiência. E como a realidade do mundo é plural, diversa, e ao
mesmo tempo particular, individual, a base universal da racionalidade é por si
só um equívoco.

Na crítica da razão de Immanuel Kant, a própria unidade entre a realidade e a


razão é desfeita.

A razão seria uma estrutura complexa originária da relação do ser humano


com o mundo a partir de três dimensões:

conhecer
querer
e sentir.

Seria assim a razão fruto de diversas habilidades e potências do ser humano,


não se restringindo meramente ao intelectual. Partindo de Kant, um outro filó-
sofo, dessa vez o alemão Friedrich Schiller, defendia um conceito ainda mais
ampliado de razão baseado na concepção de outras três esferas distintas e
autônomas:

a teórica
a moral
e a estética.

Para ele, somente o senso estético, com o desenvolvimento da sensibilidade,


pode fazer a ponte entre a natureza e o ser humano, desfazendo a polaridade
entre ambos ao aproximar o que a racionalidade separou.

Propõe, assim, um pensamento que seja capaz de dar conta de nossa ne-
cessidade de conhecer, mas que também considera nossa necessidade de
querer e nossa liberdade de sentir — sem nos colocar em oposição a nós
mesmos.
AS POWER SKILLS
E COMO ELAS
PODEM MUDAR
ESSA HISTÓRIA.

Se o padrão antigo firma que aptidões e habilidades técni-


cas comandam os corredores das empresas, as powers
skills surgem como uma força importante para romper com
a lógica tradicional e reequilibrar a balança de uma narrativa
corporativa mais integral e benéfica para todos.

Em seu “Workplace learning report” de 2022, a Udemy Busi-


ness cunha o termo power skills para descrever característi-
cas anteriormente conhecidas como soft e elevando-as à
categoria de habilidades necessárias para ter sucesso em
qualquer nível dentro de uma organização.
As habilidades mais requisitadas não são sobre
ficar apenas à frente da curva técnica. Habilida-
des relacionadas à liderança, trabalho em
equipe, comunicação, produtividade e bem-estar
são fundamentais para o desempenho de cada
funcionário. É por isso que não faz mais sentido
chamá-los de ‘soft skills’, como se representas-
sem um conjunto de habilidades menos impor-
tante no local de trabalho. Não só é bom ter
essas habilidades como elas são essenciais para
mudar o local de trabalho.

E por que ‘power skills’?

Os líderes de Aprendizagem e Desenvolvimento


(T&D) e de RH concordam que essas habilidades
são o que dão poder aos funcionários no traba-
lho. Poder para colaborar, poder para comunicar
efetivamente, poder de liderar. Nós acreditamos
que essas habilidades devem ser prioridade ao
construir um programa de desenvolvimento cor-
porativo robusto. Afinal, essas são competências
essenciais que todos os funcionários precisam —
estejam eles em uma função financeira, técnica,
administrativa, de vendas ou de marketing.

Então adeus, soft skills. Bem-vindo à nova era das


habilidades de poder.

— Workplace Learning Trends Report 2022,


Udemy Business
DESENVOLVIMENTO
CORPORATIVO

Sentimos antes de pensar. E existe — é claro —


uma explicação científica para isso. Quando
uma mensagem chega até nós, ela pousa na
amígdala, uma pequena parte do nosso cére-
bro classificada como a parte "emocional",
levando vários segundos até que a mensagem
chegue ao nosso cérebro "pensante”, o neo-
cortex frontal. Quando a mensagem chega ao
nosso neocortex, já sofreu a influência da men-
sagem captada por nosso cérebro emocional.
As emoções são fenômenos próprios do reino
animal. E, segundo o neurobiólogo chileno
Humberto Maturana, são elas, e não a razão, as
responsáveis pela ação humana. Fundador da
sociobiologia do amor, o autor conceitua as
emoções como disposições corporais dinâmi-
cas que definem os diferentes domínios de
ação em que nos movemos, e encontra particu-
larmente na emoção do amor a estrutura fun-
dante do social. Isso porque o amor é a
emoção que constitui um domínio de ações
que fazem do outro um outro legítimo para a
convivência, permitindo-nos manter interações
recorrentes sem as quais não há fenômeno
social.
Em “Emoções e linguagem na educação e na política”, Maturana expõe a
competição, geralmente tão associada ao processo evolutivo, como uma
emoção que não é constitutiva do nosso processo biológico, mas sim um
fenômeno cultural. É somente na justificativa racional dos modos de convi-
vência que inventamos discursos ou desenvolvemos argumentos que justifi-
cam a negação do outro.

Um modo de vida no qual há a aceitação do outro como um legítimo outro na


convivência é, portanto, uma condição necessária para o desenvolvimento
físico, comportamental, psíquico, social e espiritual normal dos seres huma-
nos.

As concepções de Maturana vão ao encontro das concepções de muitos


pensadores do desenvolvimento humano e da educação. Henri Wallon, de-
fensor da afetividade como um dos aspectos centrais ao desenvolvimento
humano, ressalta também a importância do aspecto social deste processo.
Segundo ele, a parte cognitiva social do nosso cérebro é muito flexível e seu
desenvolvimento não é linear, sofrendo crises, rupturas, conflitos, retroces-
sos, como um movimento que tende à sofisticação a partir dos elementos for-
necidos pela cultura e a linguagem.

Também para Lev Vygotsky, o homem se produz na e pela lingua-


gem, sendo na interação com outros sujeitos que formas de
pensar são construídas por meio da apropriação do saber da co-
munidade em que o sujeito está inserido. Seu conceito de zona do
desenvolvimento proximal ressalta a importância da coletividade e
do aprendizado cooperativo, desenvolvido por meio das intera-
ções com outros membros da sociedade.

A hegemonia tradicional do processo educativo disciplinar, mar-


cado pela racionalidade, pela individualidade e pela competitivi-
dade acabam por promover um ambiente de exclusão e desprepa-
ro para uma vida harmônica, coesa e solidária na sociedade con-
temporânea.

Tais perspectivas, nos demonstram a importância de resgatar


nossas emoções e a capacidade de convívio com o outro como
importantes ingredientes também nos processos de aprendiza-
gem e conexão.

E isso só será possível se fomentarmos comunidades de aprendi-


zagem e incentivarmos uma aprendizagem constante, intencional,
autodirigida.
APRENDER A APRENDER:
COMO A APRENDIZAGEM
CONSTANTE IRÁ MUDAR
O JEITO DE SUA EQUIPE
TRABALHAR
A aprendizagem no local de trabalho — em inglês o Workplace
learning — ajuda as pessoas a desenvolverem as habilidades e
o conhecimento de que precisam para realizar suas tarefas,
mas não só. Quando elas aprendem com intenção de apren-
der, quando estão interessadas no que aprendem, quando
veem valor no que está sendo transmitido, elas também se mo-
tivam, inspiram, engajam, Fazer melhor seus trabalhos é só
mais uma das consequências disso ;-)
Em “Os sete saberes necessários à educação no futuro”, Edgard Morin
argumenta em defesa de uma reforma paradigmática no ensino. Para ele,
devemos alimentar um novo espírito científico como um movimento de
recomposição baseado na transdisciplinariedade e na multidimensiona-
lidade, que favorece a junção da cultura científica com a cultura das hu-
manidades — o que o antropólogo, sociólogo e filósofo francês entende
por uma escola de qualidade poética da vida, de descoberta de si, da
compreensão humana, considerando não só a dimensão objetiva dos
seres humanos, mas, ao mesmo tempo, a dimensão subjetiva para assim
"aprender a viver".

E para extrair o melhor do que está posto e disposto ao aprendizado, é


preciso que aprendamos a aprender.

De modo geral, o termo “aprender a aprender'' está ligado à linha cons-


trutivista, que teve como um de seus iniciantes Jean Piaget, e parte do
pressuposto de que a aprendizagem só acontece, de fato, quando há
interação do indivíduo com o conteúdo. O que se aprende, portanto, é
uma construção pessoal.

“Numa perspectiva construtivista, a finalidade última da intervenção peda-


gógica é contribuir para que o aluno desenvolva a capacidade de realizar
aprendizagens significativas por si mesmo numa ampla gama de situa-
ções e circunstâncias, que o aluno “aprenda a aprender”.

— Cesar Coll, construtivista espanhol


OS QUATRO PRINCÍPIOS DO
APRENDER A APRENDER
segundo a filosofia construtivista
e com alguns pitacos nossos.

Desenvolvimento da autonomia do aprendiz


O aluno aprende a construir o conhecimento por si
1 mesmo, fazendo com que o aprendizado seja de um
nível mais significativo do que aquele que ocorre
pela mera transmissão do conteúdo.

Apropriação do método científico


É a ideia de que o conhecimento e suas regras são
2 construídas pela criança (e por que não pelo
adulto?) em interação com o meio.

Para a aprendizagem ser verdadeiramente educativa,


ela deve ser movida por interesses e necessidades
da própria criança pessoa
3 É o famoso learning by doing: o ensino deve se dar
pela ação, e não pela instrução. A educação seria,
portanto, processo e não produto.

Sociedade do Conhecimento
Considerando a visão cindida, com valorização
progressiva do trabalho intelectual, é
4 imprescindível que habilidades
habilidades de poder se integrem a um
manuais

aprendizado contínuo como forma de


sobrevivência.
RHs e departamentos de T&D terão um grande desafio pela
frente. Mais do que oferecer cursos avulsos tecnicistas, preci-
sarão criar culturas de aprendizagem. Terão de encarar a edu-
cação como um pilar estrutural e estratégico das organiza-
ções. Se quiserem profissionais inovadores, criativos e engaja-
dos, que queiram permanecer na empresa, a aposta deverá
ser no desenvolvimento constante de habilidades que não
podem ser substituídas por máquinas.

Independente da habilidade que seu time precisa desenvolver


para performar melhor no trabalho, essa é a chave: criar uma
cultura interna de aprendizado. Ao oferecer esse fluxo contí-
nuo, funcionários podem se tornar mais autônomos dos seus
próprios processos, mapeando o que gostariam e precisam
aprender e se envolvendo ainda mais com o processo de de-
senvolvimento profissional.

Uma pesquisa do MindTools for Business descobriu que em-


presas que performavam bem nesse lugar tinham algumas ca-
racterísticas em comum. Entre elas, tornavam os recursos edu-
cacionais fáceis de encontrar (com bancos de conteúdo de
aprendizado online, por exemplo), incentivavam diretamente a
aprendizagem (com lembretes via e-mail ou outros tipos de
atualização) e focavam em capacitar gestores — considerando
que estes eram mais propensos a inspirar as pessoas a apren-
der.
Mais do que escola, mais do que empresa, o
Workplace learning, como conceito, dá as bases
para que suas pessoas consigam, também, traçar
seus próprios mapas de meta-aprendizado. Per-
mite, assim, que se perguntem com mais frequên-
cia por que querem aprender algo, o que exata-
mente desejam aprender e como querem adquirir
tal aprendizado. Mais conscientes e protagonis-
tas da forma que suas aprendizagens acontecem,
estarão mais envolvidos com as possibilidades
oferecidas pela empresa — ou serão mais asserti-
vos na proposta de mudanças — e mais efetiva, a
partir daí, será a apreensão do conhecimento ne-
cessário para se adaptarem com resiliência às
mudanças do mercado e oferecerem soluções
criativas e inovadoras para os desafios que se
apresentam.
“Os analfabetos do século 21 não
serão aqueles que não sabem ler
e escrever, mas aqueles que não
sabem aprender, desaprender
e aprender de novo.”
– Alvin Toffler
Este e-book tem como base a pesquisa “Além da fragmentação:
caminhos para a totalidade”, um documento profundo de investigação
encomendada pela SPUTNiK e executado pela cientista social e
pesquisadora Andreia de Matos Rocha.

BIBLIOGRAFIA:

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FOUCAULT, M. A História da Loucura. São Paulo: Perspectiva, 1978.

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SILVA CARVALHO, E. S.; MOUJÁN, I. F.; RAMOS JÚNIOR, D. V. Pedagogias


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SPUTNiK

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