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RESUMO
Estudos do fenômeno videogame prosseguem concedendo valor especial a ascensão de
um patamar tecnológico, conceitos como resolução gráfica são tidos como sofisticação de
sua forma. No entanto o que se faz muitas vezes é confundir a qualidade do pincel com a
habilidade do artista. Defendo superar as concepções vigentes que atribuem a leitura da
importância histórica de um videogame por enaltecer suas conquistas tecnológicas. Recorro
então a teoria dos jogos para fundamentar uma estética analítica, que possa ser atemporal
a todos os títulos vigentes. Esse estudo pode auxiliar na compreensão da experiência do
videogame e na determinação da importância histórica de um determinado título,
contemplando não somente potencialidades estéticas únicas da mídia, como também
peculiaridades de sua forma.
Palavras-Chave
Videogame, Estética, Fenomenologia
INTRODUÇÃO
Os crescentes números do mercado de videogames tem servido de espelho para
expressar que gráficos fotorrealistas e alta performance computacional não são mais
suficientes para definir a qualidade, ou importância histórica de um título. Apesar disso,
ainda hoje existe a persistente perspectiva, generalizada por parte de alguns pesquisadores
(TAVINOR, 2009) veículos de informação (GRAHAM, 2011), e desenvolvedores (CAGE,
2106) de que o fenômeno dos videogames é composto apenas por títulos “AAA” e que o
apelo pela experiência proporciona pela mídia estaria contida nesse grupo. Esses títulos
são geralmente produções multimilionárias, seu desenvolvimento pode envolver centenas
de pessoas e utilização de engines avançadas para a criação, como a Unreal Engine 4
(EPIC GAMES, 2012), direcionada para o desenvolvimento de videogames para consoles
de última geração e PCs de ponta. Geralmente procuram impressionar através de
representações fotorrealistas, grande competência computacional, gráficos de ponta e
narrativa cinematográfica.
Muitos pesquisadores, ao justificar o sucesso de determinados títulos ou ao se
retratarem da arte ou estética dos videogames, falam de uma sofisticação artística permitida
por uma evolução tecnológica (TAVINOR, 2009). Geralmente remetendo à sua capacidade
de reprodução gráfica, amparada pelo processamento computacional como motivo principal
da experiência estética do jogador, como se anteriormente a capacidade de representações
espaciais mais realistas, videogames não tivessem qualidades estéticas inerentes a seu
formato. Títulos como GTA V (ROCKSTAR, 2013), The Last of Us (NAUGHTY DOG, 2013]),
Metal Gear Solid V: Phantom Pain (KONAMI, 2015), The Witcher 3 (CD PROJEKT RED,
2015) e Uncharted 4 (NAUGHTY DOG, 2016) são comumente enaltecidos sob esta mesma
perspectiva, como se, de alguma forma, suas qualidades pudessem ser justificado primeiro
por seus aspectos tecnológicos aferidas pelo grau de realismo cinematográfico, para só
depois discutir suas outras qualidades que os definem como um videogame, como a
jogabilidade.
Hoje, no entanto, com a ascensão das plataformas de distribuição digital online de
videogames, como a Steam (VALVE, 2003), e o fácil acesso às plataformas de
desenvolvimentos mais acessíveis como Game Maker e Unity [UNITY TECHNOLOGIES,
2005], o mercado dos videogames encontra-se mais variado do que nunca. Existe espaço
para além das produções multimilionárias: videogames com capacidade computacional
relativamente limitada vêm conquistando uma grande fatia do mercado (MORRIS, 2016).
Intitulados comumente como “Indie games”, esses títulos muito comumente evocam
nostalgia através de gráficos e temáticas que remetem a gerações passadas, quase sempre
com gráficos de"8-bits" ou "16-bits". São produzidos, em geral, por um pequeno grupo de
pessoas, eventualmente uma, que fazem todo o trabalho. Desse grupo surgiram grandes
sucessos como Minecraft (MOJANG, 2009), Super Meat Boy (TEAM MEAT, 2010), Fez
(POLYTRON, 2012), Gunpoint (SUSPICIOUS DEVELOPMENT, 2013) e Undertale (TOBY
FOX, 2015) . Possuem em comum gráficos simplórios e nostálgicos, e utilizam de sua
jogabilidade e mecânicas como atributos principais da experiência e construção de sua
narrativa, emocionando e cativando sem contar com representações realistas.
Torna-se cada vez mais evidente que a busca do jogador pela experiência do
videogame não pode ser justificada somente pela expectativa de uma suposta imersão
teoricamente favorecida por estas representações. Se a qualidade de um videogame
pudesse ser julgada por sua capacidade de processamento tecnológico, como explicar
tamanho sucesso de títulos tecnologicamente tão simples para sua geração? Um exemplo é
o videogame Undertale: desenvolvido do início ao fim por uma pessoa só com a plataforma
de desenvolvimento Game Maker (YOYO GAMES, 2003), vendeu aproximadamente dois
milhões de cópias na Steam ao longo dos últimos 12 meses superando muitos títulos “AAA”
na mesma plataforma (STEAM SPY, 2016).
Figuras 1 e 2: Undertale(2015) e T
he Witcher 3 (2015)
Undertale possui aspectos do gênero de videogame RPG (Role Playing Game), foco
em narrativa e mecânicas inovadoras, e gráficos que remetem à era dos "16-bits",
procurando evocar uma estética envolvente de títulos inerentes ao Super Nintendo
(NINTENDO, 1990). O mundo de Undertale e seus habitantes comoveram jogadores de
todo o mundo, resultando no surgimento de uma das maiores comunidades (ou fanbase)
instalada em torno de um videogame dos últimos tempos (ERIC, 2016).
O exemplo dos “Indie games” possa auxiliar a construir uma perspectiva sobre os
elementos que constituam um “bom” videogame e que seja comum a todos os grupos,
desde os "indies" até os "AAA". Esse embasamento teórico poderá amparar o pesquisador
no campo a compreender as relações entre videogame e jogador para além dos aspectos
técnicos, de argumentos restritos à contraparte tecnológica da experiência de jogar.
Figuras 3 e 4: Gunpoint (2013)e Metal Gear Solid V: The Phantom Pain (2015)
CONCLUSÃO
Quando o pesquisador possui o embasamento teórico para analisar os títulos que
compõem a história dos videogames através de um ponto de vista estético, tem a
possibilidade compreender o sucesso de determinados títulos, independentemente de sua
capacidade de processamento ou gráficos. O pesquisador torna-se mais seguro ao
compreender as diversas facetas da experiência e da estética do videogame.
De Pitfall a Uncharted 4, de Fez a Undertale, ao responder a essas questões de base
estética a meu ver, o pesquisador se vê em condições de utilizar esses conhecimentos para
uma análise aprimorada dos títulos que compõem a história do fenômeno do videogame.
Vejo que, para compreender o estilo estético de um videogame, não podemos cair na
armadilha das representações complexas, ou mesmo das narrativas complexas, pois
acabamos perdendo o seu contexto de jogo, axial para a experiência. Precisamos
compreender o envolvimento do jogador a partir de forma e estilo concisos na composição
do game e com suas expectativas de atividade em jogo. O pesquisador ao compreender
que a apresentação estética de um videogame gera uma expectativa no jogador que deve
ser suprida ou superada por uma jogabilidade concisa e coerente com suas representações
audiovisuais e narrativas, obtém melhor propriedade sobre o complexo fenômeno que é a
relação jogador-videogame, e maior capacidade de compreender a extensão de seu
fenômeno, seja através do estudo de títulos isolados ou de toda a mídia.
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FIGURAS:
1-http://vignette1.wikia.nocookie.net/undertale/images/c/c3/Librarby2.PNG
2- http://rubberchickengames.com/wp-content/uploads/2016/01/everest.png
3-http://vignette3.wikia.nocookie.net/steamtradingcards/images/b/b2/Gunpoint_-_The_Suppli
er.jpg
4-http://crohasit.com/wp-content/uploads/2016/05/metal-gear-solid-v-the-phantom-pain-003-
1500x844.jpg
5- https://upload.wikimedia.org/wikipedia/pt/7/77/Pitfall!_no_Atari_2600.png
6- http://www.shindig.nz/wp-content/uploads/2016/05/UC4_rope-1024x576.jpg