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Carlos Henrique Nascimento

O Game como instrumento de crítica social

Trabalho de conclusão de curso apresentado


como exigência parcial, para a obtenção do
grau no curso de Ciência da Computação, da
Universidade de Franca.

Orientador: Prof. Alysson A. Naves Silva

FRANCA
2012
CARLOS HENRIQUE NASCIMENTO

O GAME COMO INSTRUMENTO DE CRÍTICA SOCIAL

Orientador:
Nome: Prof.
Instituição: Universidade de Franca.

Examinador(a):
Nome: Prof.
Instituição:

Examinador(a):
Nome: Prof.
Instituição:

Franca, _____/ _____ / _____


DEDICO ao meu pai, que sempre trabalhou duro para me ajudar e
sem ele nada disso seria possível.
AGRADEÇO primeiramente ao meu professor orientador Alysson,
que me ajudou e incentivou o tempo todo e acabou possibilitando que
este projeto se tornasse algo muito maior do que eu poderia imaginar;
ao Diego, responsável pela arte do jogo e que se tornou um grande
amigo; a todos os professores que tive durante o curso, que sempre me
ajudaram, mesmo que indiretamente; aos amigos que fiz durante estes
quatro anos, passamos todos pelos mesmos problemas e alegrias,
alguns se tornaram mais próximos do que outros, mas neste ponto
temos o mesmo sentimento, o que dispensa qualquer comentário; ao
Felipe, grande amigo que me ajudou muito durante o desenvolvimento
do jogo; por fim, aos meus pais, que me deram suporte o tempo todo,
inclusive em tempos de stress.
Everything that humans can imagine is a possibility in reality.
Eiichiro Oda
RESUMO

NASCIMENTO, Carlos Henrique. O game como instrumento de crítica social. 2012. 92 f.


Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Ciência da Computação) – Universidade de
Franca, Franca.

Este trabalho foi feito com o objetivo de desenvolver um jogo que realize uma crítica social.
Para isso, foi necessário um estudo sobre o impacto dos games na sociedade, no qual pode se
destacar dois grandes impactos: a game cultura e a indústria. A game cultura é a prova de que
os jogos exercem uma certa influência sobre a população, o que torna viável o uso dos jogos
para estimular um pensamento crítico e talvez até uma mudança social. Estudando estes
aspectos mais a fundo, nota-se que a retórica é uma técnica muito usada na persuasão das
pessoas e, assim como em filmes ou músicas, ela também pode ser usada nos jogos para
transmitir as críticas aos jogadores. Este tipo de retórica é chamada de play rhetoric. Para a
implementação foi usado o framework XNA 4.0, que além de ser fácil, possui uma grande
quantidade de informações e tutoriais pela internet. A play rhetoric foi adaptada ao jogo de
forma a criar uma crítica social à televisão e ao comportamento das pessoas em relação a
mesma. O nome do jogo desenvolvido é Kane, que é um jogo de plataforma 2D com
elementos puzzles no qual o jogador deve desligar o maior número possível de televisões.
Concluiu-se que as técnicas de play rhetoric, quando bem adaptadas ao tema do jogo, podem
ser poderosas ferramentas de persuasão. Através deste tipo de retórica, é bem simples a
inserção de significados “ocultos” dentro de processos. Apesar de tudo, a crítica pode não ser
entendida pelo jogador, dependendo de vários fatores externos.

Palavras-chave: game cultura; jogo; crítica social; retórica; play rhetoric; XNA
ABSTRACT

NASCIMENTO, Carlos Henrique. O game como instrumento de crítica social. 2012. 92 f.


Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Ciência da Computação) – Universidade de
Franca, Franca.

This work was done with the aim of developing a game that performs a social criticism. To
acheive this goal, was necessary make a study on the impact of gaming in society, which we
can name two major impacts: the game culture and the industry. The game culture is the proof
that games exert a certain influence on the population, which makes viable the use of games
to stimulate a critical thinking and perhaps even a social change. Looking at this aspect, can
be noted that rhetoric is a very important technic in the persuasion and, like movies or music,
it can be used in games to transmit criticism messages to the players. This kind of rhetoric is
called play rhetoric. To develope the game was chosen the XNA 4.0 framework because it's
very simple to use and have a great amount of support on the internet. The play rhetoric was
adapted to the game in such way that creates a social critic of the chosen topic, which is: the
television and the way that people behaves toward the tv. The name of the game is Kane: a 2D
platform game that contains puzzles, the goal of the player is turn off all the televisions of the
level. The conclusion was that the play rhetoric can be a powerful tool of persuasion, but the
rhetoric has to be adapted to the game. Through this kind of rhetoric is very simple include
hidden meanings in certain process of the game, nevertheless the meaning of the message may
be, or not, understood by the player dependent on external facts.

Palavras-chave: game culture; game; social criticism; rhetoric; play rhetoric; XNA.
LISTA DE ABREVIATURAS

3D Terceira Dimensão

FPS First Person Shooter

GDD Game Design Document

IA Inteligência Artificial

MMORPG Massively Multiplayer Online Role Playing Game

NPC Non-Playable Character

PC Personal Computer

PVP Player vs Player

RPG Role Playing Game

TPS Third Person Shooter

WOW World Of Warcraft


LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Classes do jogo 53


LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 Faturamento 23
Gráfico 2 Idade dos Jogadores 23
Gráfico 3 Idade dos compradores 23
Gráfico 4 Gênero 23
LISTA DE FIGURAS

Figura 1 Arte e hieroglifos egípcios representando um jogo de 18


tabuleiro

Figura 2 Baffle Ball 20

Figura 3 Produtos do jogo pacman 27

Figura 4 Battlefield 1942 38

Figura 5 Battlefield 2142 38

Figura 6 Tax Invaders 39

Figura 7 O jogador pode contatar lideres de outras civilizações 41

Figura 8 Bordas de uma civilização, cidade atacando navios 42


inimigos

Figura 9 Um dos minigames presentes no jogo 43

Figura 10 Fim de jogo. O trabalhador se torna morador de rua 44

Figura 11 Introdução: pessoa assistindo TV 55

Figura 12 Introdução: pessoas se transformando em zumbis 55

Figura 13 Tela de game over 56

Figura 14 Encerramento: mapa da cidade 57

Figura 15 Encerramento: “Procurado por atentado contra a 57


segurança pública”

Figura 16 Encerramento: as ferramentas foram utilizadas no 58


controle?

Figura 17 Zumbi sendo controlado por uma TV 59

Figura 18 Zumbi sendo controlado por uma TV (2) 60

Figura 19 TV desligada: o zumbi se transforma em uma pessoa 60


normal

Figura 20 TV desligada: o zumbi se transforma em uma pessoa 61


normal (2)
Figura 21 A TV pode diminuir a sua visão do mundo 61

Figura 22 A TV pode diminuir a sua visão do mundo (2) 62

Figura 23 Game1.estado 62

Figura 24 Início da fase 1 63

Figura 25 Principais atributos da classe Fase1 64

Figura 26 Listas da classe Casas 65

Figura 27 Verifica se o objeto caiu 66

Figura 28 Verifica algum zumbi está empurrando um objeto 67

Figura 29 IA zumbi seguidor 68

Figura 30 IA movimento 69
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................13
1 O IMPACTO DOS GAMES NA SOCIEDADE ................................................15
1.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS .............................................................................15
1.2 ANTES DOS JOGOS DIGITAIS .........................................................................16
1.2.1 Por que jogamos? ..................................................................................................16
1.2.2 Jogos do passado....................................................................................................17
1.2.3 Pinball....................................................................................................................19
1.2.4 Primeiros jogos de computador..............................................................................21
1.3 INDÚSTRIA DE GAMES .....................................................................................21
1.3.1 O início ..................................................................................................................22
1.3.2 O mercado..............................................................................................................23
1.4 JOGOS DIGITAIS E CULTURA .........................................................................24
1.4.1 O que é cultura? .....................................................................................................25
1.4.2 Game cultura..........................................................................................................25
1.4.2.1 Jogos revolucionários............................................................................................26
1.4.2.1.1 Pacman..................................................................................................................27
1.4.2.1.2 Donkey Kong..........................................................................................................28
1.4.2.1.3 Ultima....................................................................................................................28
1.4.2.1.4 Doom......................................................................................................................29
1.4.2.1.5 MMORPG..............................................................................................................29
1.4.2.2 A game cultura nos dias atuais............................................................................. 30
1.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...............................................................................32
2 O GAME COMO INSTRUMENTO DE CRÍTICA SOCIAL ........................34
2.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ............................................................................34
2.2 SERIOUS GAMES.................................................................................................35
2.2.1 Retórica ................................................................................................................36
2.2.2 Play Rhetoric ........................................................................................................37
2.2.2.1 Playworld..............................................................................................................37
2.2.2.2 Mechanics..............................................................................................................40
2.2.2.3 Playformance.........................................................................................................44
2.3 A CRÍTICA SOCIAL NOS GAMES ....................................................................45
2.3.1 Crítica Social ........................................................................................................45
2.3.2 O Game Crítico ....................................................................................................46
2.4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...............................................................................49
3 KANE ..................................................................................................................50
3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ............................................................................50
3.2 O JOGO CRÍTICO: KANE ..................................................................................50
3.3 XNA......................................................................................................................51
3.4 DESENVOLVIMENTO ......................................................................................52
3.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................53
4 RESULTADOS ...................................................................................................54
4.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ............................................................................54
4.2 A PLAY RHETORIC EM KANE .........................................................................54
4.3 EXPLICAÇÕES GERAIS SOBRE O CÓDIGO..................................................62
4.3.1 Game1 e a criação do Playworld ..........................................................................62
4.3.2 Física e Inteligência Artificial...............................................................................65
4.4 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................70
CONCLUSÃO......................................................................................................................71
REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 74
ANEXOS...............................................................................................................................78
13

INTRODUÇÃO

Jogos estão presentes na vida do ser humano desde tempos remotos. A própria
antropologia considera o “jogar” uma cultura universal ou seja, é uma característica em comum
entre todas as culturas que existiram (e ainda existem) no mundo.
Com o avanço da tecnologia surgiram os jogos digitais, que invadiram a vida das
pessoas. PC's, tablets, smartphones, consoles e outros dispositivos são usados diariamente para
várias atividades, inclusive jogar. A popularização dos jogos digitais causou um grande impacto
na sociedade, criando uma forte indústria e, até mesmo, sua própria cultura.
Apesar dos jogos já existirem desde os primórdios da humanidade e estes
sempre fizeram parte de culturas antigas, somente no século XX eles se tornaram presentes no
dia a dia de milhões de pessoas¹, criando grupos com características, pensamentos e atitudes
que os distinguem dos demais. É a chamada “game cultura”. É importante deixar claro que o
foco deste trabalho é no jogo digital (jogos de computador, videogame, celular, etc).
Além da game cultura, a popularização dos jogos digitais criou uma poderosa
indústria que, hoje em dia, é uma das mais rentáveis no ramo do entretenimento, com milhões
de jogadores por todo o mundo. Boa parte desses jogadores estão imersos em mundos digitais
e, como será discutido nos capítulos subsequentes, eventualmente o digital extrapola para o
mundo real.
Apesar de serem culturalmente aceitos, os jogos, digitais ou não, muitas vezes
foram considerados “coisa de criança” ou uma simples forma de entretenimento. Porém,
observando a História, nota-se que muitos jogos antigos foram criados e usados para outras
finalidades que não eram a diversão. Os próprios jogos digitais, no seu início, surgiram no meio
acadêmico. Hoje em dia, os jogos, principalmente os digitais, estão ganhando importância e
devem ser levados a sério não só pela indústria, mas também por instituições de ensino
superior, governos e pela população comum. A própria indústria está expandindo os seus
horizontes, criando novas maneiras de interação com o mundo virtual e abordando, com mais
frequência, jogos que visam algo além do entretenimento, os chamados serious games.

¹ Em sua maioria nos países indústrializados.


14

Os serious games são jogos que tem como objetivo algo além da diversão. Um
exemplo são os advergames: jogos com o propósito de fazer propaganda para determinado
produto ou empresa.
Os jogos digitais são uma realidade na vida de muitas pessoas, mas qual o
impacto que esses jogos exercem sobre elas? Esta é uma questão subjetiva. A experiência de
jogo pode causar impactos diferentes nas pessoas, assim como a experiência de escutar uma
música, ler um livro ou assistir um filme. Isto se deve ao fato de que nós somos seres únicos e a
experiência de jogo é determinada por vários fatores como: estado emocional, passado e
personalidade da pessoa, assim como a plataforma, gênero do jogo e o local onde se está
jogando. Enquanto para alguns um jogo pode ser simplesmente uma forma de entretenimento,
para outros é um desafio que merece dedicação e esforço. Outras pessoas podem se sentir
emocionadas com a história e não dar muita atenção aos desafios. E, ainda, outros podem criar
algum tipo de apego emocional aos personagens do jogo.
Os serious games focam exatamente na experiência de jogo e tentam modificá
-la para que o jogador se interesse por algum produto, aprenda alguma coisa e etc.
Seguindo esta linha de raciocínio, torna-se interessante a ideia do jogo como
instrumento de crítica social, ou seja, jogos digitais que estimulem um pensamento crítico sobre
algum assunto. Jogos com este tipo de abordagem não são muito comuns na indústria e, por
esse motivo, é um campo que ainda tem muito a evoluir.
Tendo em vista as possibilidades que os jogos proporcionam, este trabalho tem
como objetivo desenvolver um jogo digital que estimule o pensamento crítico sobre
determinado assunto. Para isto, é necessário entender qual o impacto que os jogos exercem
sobre a sociedade e sobre as pessoas, assim como entender os meios de persuasão que podem
ser utilizados dentro dos jogos.
O primeiro capítulo tem como objetivo mostrar o impacto causado pelos jogos
nas sociedades (do passado e atual).
O segundo capítulo explora técnicas e métodos que podem ser utilizadas em
jogos digitais, a fim de criar algo que vá além do mero entretenimento.
O terceiro capítulo é dedicado ao desenvolvimento do jogo. Neste capítulo são
apresentadas as ferramentas utilizadas, tema, implementação e explicações diversas, assim
como a definição do objetivo secundário deste trabalho: adquirir alguma experiência no
desenvolvimento de jogos e o aperfeiçoamento em técnicas de programação.
O quarto e último capítulo mostra os resultados e conclusões deste trabalho.
15

1. O IMPACTO DOS GAMES NA SOCIEDADE

1.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Para o desenvolvimento de um jogo que visa a crítica social, é necessário


entender qual impacto os jogos digitais causam na sociedade, pois, se os jogos não causam
nenhum impacto na sociedade, eles também não causarão nenhum impacto no indivíduo.
Pode-se citar a própria indústria de jogos e a game cultura como consequências
da introdução dos jogos digitais na sociedade, mas estes são fenômenos cumulativos que
começaram a se formar há centenas de anos com a invenção do primeiro jogo.
É impossível discutir sobre a indústria de games sem falar sobre a game cultura e
vice-versa. Qualquer mudança na indústria afeta diretamente a game cultura, por exemplo, a
criação de um novo gênero de jogo ou um novo console. Quando novos gêneros ou tecnologias
surgem, mais pessoas podem começar a jogar, jovens ou velhos, homens ou mulheres. Estas
pessoas podem criar costumes, crenças e práticas que somente jogadores de determinado
gênero, jogo ou plataforma compartilham, assim como uma movimentação na game cultura
pode afetar o desempenho da indústria. Pode-se citar o recente caso do game Mass Effect, onde
milhares de fãs protestaram contra o final do jogo, fazendo com que a produtora o mudasse. A
indústria e a game cultura serão discutidas mais adiante, neste capítulo.
Mas, antes de qualquer coisa, uma definição do “jogo” deve ser feita para melhor
entendimento do trabalho:
Segundo Costikyan (2002 apud MAYRA, 2008, p.34) “[Jogo é:] uma estrutura
interativa de significado endógeno que requer que o jogador complete um objetivo”.
A autora e game designer Jane McGonigal (2011), fala que um jogo deve
possuir objetivo, regras, um sistema de feedback e a participação do jogador deve ser
voluntária.
Porém, para os propósitos deste trabalho é necessária uma definição
complementar do que são jogos digitais. Jesper Juul em seu livro Half-Real (2005 apud
MAYRA, 2008, p.35) apresentou uma definição interessante:
16

Half-Real se refere ao fato de que os videogames são dois tipos de coisa diferentes ao mesmo
tempo: videogames são reais pelo fato de consistem de regras reais com as quais os jogadores
efetivamente interagem, e no sentido de que perder ou ganhar um jogo é um evento real.
Contudo, ao ganhar um jogo derrotando um dragão, o dragão não é real e sim ficcional. Jogar
videogame é, portanto, interagir com regras reais enquanto se imagina um mundo ficcional, um
videogame é tanto um grupo de regras como um mundo ficcional.

Portanto, jogos digitais podem ser considerados um conjunto de regras e


variáveis reais e objetivos virtuais. As variáveis são manipuladas pelo jogador a fim de atingir o
objetivo final do jogo. Cada pessoa pode dar um significado diferente para as ações realizadas
durante o jogo.
Nesta monografia o termo “game” será usado para se referir a jogos digitais.
É importante frisar que os jogos sempre estiveram presentes nas diferentes
culturas da humanidade, desde os primeiros jogos inventados nas civilizações antigas. Este
trabalho tem como prioridade os games que surgiram após a criação do computador, mais
especificamente, a partir de 1970. A seção a seguir tem como objetivo contar uma breve
história do passado dos jogos, desde os mais antigos até os primeiros jogos de computador, e
quais as relações que estes jogos tinham com as sociedades antigas.

1.2 ANTES DOS JOGOS DIGITAIS

Os jogos mudam de regras e de forma com o passar do tempo. Os games são


herdeiros de jogos que existiam há milhares de anos e, assim como atualmente, os jogos antigos
também exerciam certa influência nas sociedades do passado.

1.2.1 Por que jogamos?

É um fato que nós jogamos e brincamos desde pequenos. Não só os humanos,


mas podemos observar que até mesmo filhotes de animais brincam: fingem estar nervosos e
mordem levemente uns aos outros.
Além do fato de jogar ser um ato prazeroso, a psicologia e fisiologia tentam
explicar o “brincar” ou o “jogar” e qual a sua importância no desenvolvimento de algumas
17

espécies. Como observado por Johan Huizinga (2004), a origem das brincadeiras está
diretamente relacionada ao gasto da superabundância de energia vital; para outros, é um
“instinto de imitação” e, ainda há quem acredite que é simplesmente a necessidade por
relaxamento, do corpo ou da mente. Outra teoria aponta que, quando brincamos, estamos
treinando e nos preparando para eventos ou atividades na vida real e, outra teoria, fala que
estamos exercitando nossos músculos e coordenação motora.
Estas e outras explicações possuem uma coisa em comum: os jogos e
brincadeiras tem um propósito além do próprio “jogar” ou “brincar”. Ou seja, não é apenas uma
atividade feita no tempo livre, sem nenhum proveito intelectual ou fisiológico.
Sendo assim, pode-se supor que o “jogar” faz parte da natureza de alguns seres
vivos. A própria antropologia sugere que os jogos são uma “cultura universal”, pois estão
presentes em todas as sociedades e culturas do mundo, o que reforça a ideia de que “jogar” seja
uma “natureza humana”.
É importante esclarecer que este é um assunto profundo e complexo que envolve
várias áreas do conhecimento humano, e o seu estudo aprofundado não faz parte do escopo
deste trabalho.

1.2.2 Jogos do passado

Com o surgimento das primeiras civilizações e a aparente necessidade do


homem por jogar, vários jogos foram criados. Um dos mais antigos é o jogo de dados.
Os dados surgiram por volta de 3000 a.C. e eram feitos a partir de ossos de
animais. Os jogos de dados tiveram origem nas adivinhações, pois eram usados para revelar o
destino das pessoas, assim como o desejo dos deuses. Mais tarde, os dados foram usados na
matemática, apostas e jogos de tabuleiro.
As diferentes maneiras com que os dados foram utilizados durante o passar dos
anos são reflexos das culturas, crenças e tecnologias das sociedades. Por exemplo, existem
histórias no Rig Vega (um dos textos sagrados do hinduísmo) sobre uma grande confusão
causada pelos dados. Em Roma, os jogos de dados e cartas eram censurados, enquanto que, em
outras sociedades, os dados foram incorporados em muitos jogos, como os de tabuleiro e cartas.
Jogos de tabuleiro também foram bem populares durante a história da
humanidade. O antigo Egito é um exemplo, como mostra a FIG.:1. Um dos primeiros surgiu no
18

próprio Egito. Conhecido como Senet, os jogadores moviam sete peças no tabuleiro; ao final,
dependendo do lugar em que o jogador estivesse, era sinal de boa sorte ou azar.
Por um lado, alguns jogos se tornaram bastante populares e resistiram ao teste do
tempo; por outro, através de eras e culturas diferentes, eles foram modificados ou até mesmo
deixaram de existir.

Figura 1 – Arte e hieróglifos egípcios representando um jogo de tabuleiro


Fonte: http://www.touregypt.net/images/touregypt/game1.jpg

Vários jogos antigos de tabuleiro possuíam a mesma característica em comum:


controlar “territórios” e “capturar” peças inimigas. Jogos como o Xadrez, Go e seus
antepassados, em sua base, tem esta característica.
Assim como os jogos de dados, as regras dos jogos de tabuleiro e a sua relação
com a sociedade foram fortemente alteradas pelo contexto histórico/cultural no qual estavam
inseridos. Com o passar do tempo, os jogos de tabuleiro começaram a ser utilizados para
simular e treinar estratégias e táticas de guerra, os chamados wargames.
Um dos principais wargames foi desenvolvido em 1798, por George Venturini.
Este jogo foi importante, pois o seu tabuleiro representava uma região do mundo real, no caso,
a fronteira entre França e Bélgica. Era dividido em mais de três mil quadrados. Cada quadrado
possuía um tipo de terreno específico. Os jogadores controlavam peças que representavam
unidades militares como brigadas e artilharias. Nos anos seguintes, os wargames se
aperfeiçoaram e foram amplamente utilizados durantes as guerras que ocorreram pelo mundo.
19

Mais recentemente, outro jogo de tabuleiro se tornou popular, o Monopoly, onde


o jogador move uma peça em um tabuleiro, tentando adquirir todos os terrenos através da
compra dos mesmos. Ao contrário dos exemplos anteriores, o objetivo principal deste jogo era
o entretenimento, porém, alguém pode considerar Monopoly um bom guia sobre as bases da
economia, outros podem considerar como uma crítica social ao sistema capitalista, já que, ao
final do jogo, somente um jogador vai possuir todo o dinheiro e todos os terrenos que
pertenciam aos outros jogadores.
Os esportes também foram muito práticados no passado. Talvez, os mais
conhecidos sejam os Jogos Olímpicos, nascidos na Grécia, e que possuíam um caráter místico e
religioso. Atualmente, é um evento de escala mundial, sendo o objetivo da maioria dos atletas
de todo o mundo e sem nenhum cunho religioso ou místico.

1.2.3 Pinball

Os jogos se adaptam às culturas, tecnologias e crenças de cada sociedade. No


início do conturbado século XX, surge o pinball, uma máquina que permitia entretenimento
barato numa época de guerras e crises financeiras.
O pinball pode ser considerado o “antecessor” dos jogos digitais, pois além de
ser influente na própria jogabilidade de alguns games, o pinball deixou de herança um público
aficionado por jogos e um mercado promissor. Grande parte dos engenheiros, cientistas e até
mesmo empresas que trabalhavam no desenvolvimento de pin games², começaram a
desenvolver jogos digitais.
Segundo Kent (2001) uma das primeiras máquinas de pinball foi criada nos
Estados Unidos, em 1931, por David Gottlieb e podia ser jogada assim que o usuário inserisse
uma moeda. Ao contrário dos pin games atuais, o “Baffle Ball” não utilizava energia elétrica e
só possuía um pistão móvel, que servia para lançar a bola.
Apesar de parecer simples, o jogo foi um grande sucesso, chegando a vender
mais de 50 mil unidades, conforme ilustra a FIG.:2. Não demorou muito para surgirem
imitadores e muitas variações do Baffle Ball.

² Termo utilizado pela indústria para definir máquinas de pinball.


20

Figura 2 – Baffle Ball


Fonte:http://www.folkartisans.com/images10/toop_big.jpg

Algumas dessas variantes foram as chamadas “pay-outs”, uma mistura de


pinball com máquinas caça-níqueis. Nos Estados Unidos, por exemplo, pinball se tornou
sinônimo de jogo de azar e foi banido em vários estados. O governo confiscou e destruiu mais
de 10 mil máquinas por todo o país, “pay-outs” ou não. Durante anos tentou-se provar que o
pinball era um jogo que exigia habilidade do jogador. Porém, com a introdução dos flippers³
nas máquinas, tornou-se obvio que os pin games não eram jogos de azar e as leis começaram a
afrouxar.
Assim como o pinball foi essencial para impulsionar a indústria do
entretenimento, entre as décadas de 1930 e 1960 os jukebox4 e novelty games5 faziam um
grande sucesso no mundo inteiro, mas com o avanço tecnológico e o surgimento de novos
equipamentos, muitas empresas que produziam esses produtos eventualmente migraram para o
desenvolvimento de games e periféricos. Atualmente, a Stern é a única fabricante de pin games
do mundo.

³ barbatanas móveis que os jogadores utilizam para fazer pontos.


4
máquinas semi-automatizadas utilizadas para escutar músicas. Essas máquinas eram essenciais para muitos
estabelecimentos. Não era só necessário ter uma jukebox, mas também atualizá-los com os últimos lançamentos
músicais.
5
jogos mecânicos que funcionam ao inserir moedas. Alguns tipos muito famosos foram os jogos de tiro, onde os
alvos se mexiam em um cenário e o jogador devia acertá-los com uma arma de brinquedo.
21

1.2.4 Primeiros jogos de computador

Com o surgimento dos primeiros computadores na metade do século XX, não


demorou muito para que também surgissem os primeiros jogos para esta tecnologia. Steven L.
Kent (2001), em seu livro The Ultimate History of Video Games, conta um pouco dessa
história.
Um dos primeiros foi uma versão do jogo da velha, criado em 1952 por A. S.
Douglas, na Universidade de Cambridge, Inglaterra. O jogo foi desenvolvido para o
computador EDSAC.
Em 1958, o pesquisador Willy Higginbotham criou, em um osciloscópio, o
Tennis fo Two, alegando ser uma demonstração de física. Higginbotham, que trabalhava no
Brookhaven National Laboratory, procurava criar algo que atraísse a atenção dos visitantes e,
ao mesmo tempo, mostrasse as possibilidades dessa nova tecnologia.
Em 1962 um grupo de estudantes do MIT (Massachusetts Institute of
Technology) desenvolveram o Spacewar!, também motivados pelas possibilidades da nova
tecnologia. O jogo consistia em, basicamente, duas naves controladas pelos jogadores. O
objetivo era atirar na nave inimiga e destruí-la. Embora o jogo tenha sido bem popular entre os
desenvolvedores e estudantes do MIT, uma adaptação comercial chamada Computer Space foi
um fracasso de vendas, demonstrando que é necessário o entendimento das diferenças entres
vários grupos de jogadores para o sucesso de um game.

1.3 INDÚSTRIA DE GAMES

O verdadeiro início da indústria de games começa na década de 1970. Com o


barateamento dos componentes eletrônicos e o avanço tecnológico, os primeiros games
começam a surgir. Essa nova tecnologia se mostra muito popular e, inevitavelmente, os
arcades, consoles e computadores começam a tomar o lugar que eram dos jogos mecânicos e
pin games. Os games herdam a tarefa de entreter a população.
A indústria de games se torna bilionária e, além de gerar milhares de empregos,
é a principal responsável por criar tendências na game cultura.
22

1.3.1 O início

Conforme Kent (2001), Nolan Bushnell foi uma das pessoas mais influentes em
toda a história dos games, principalmente durante os primeiros anos da indústria. Bushnell
estudou no MIT e, como muitos estudantes, era aficionado pelo jogo Spacewar!. Foi ele quem
desenvolveu o Computer Space citado anteriormente. Apesar de ter sido um fracasso de vendas,
o próprio Bushnell relata que a culpa do fracasso foi da empresa parceira (Nutting Associates),
que era responsável pelo marketing do equipamento, alegando que o jogo possuía instruções
muito complexas e ninguém iria perder tempo lendo-as. Justamente por esse fato, Bushnell
funda uma empresa chamada Atari.
Bushnell fundou a Atari nos Estados Unidos, em parceria com Ted Tabney em
1972. No mesmo ano sua empresa lançou o Pong, um game revolucionário que mudaria toda a
história dos jogos digitais. Diferentemente do Computer Space, Pong era um jogo simples e
objetivo, além de ser baseado em algo do mundo real, o ping-pong.
“Evite perder as bolas para aumentar a pontuação” eram as únicas instruções.
Após lê-las, o jogador só precisava inserir uma moeda e começar a jogar.
Pouco antes do lançamento de Pong, uma empresa chamada Magnavox havia
colocado no mercado o primeiro console do mundo, o Magnavox Odyssey. Inicialmente não
obteve sucesso. Porém, quando uma versão de Pong foi lançada para o dispositivo, as vendas
dispararam e, no primeiro ano, o console vendeu mais de 80 mil unidades. Apesar das vendas
do Magnavox Odyssey serem boas, grande parte dos jogadores frequentavam os “fliperamas”,
lugares onde se reuniam vários tipos de jogos arcades, pin games e novelty games. Essa prática
continuou até meados da década de 1990, quando o barateamento do hardware tornou possível
computadores e consoles que suportavam os mesmos games dos arcades. Em poucos anos,
Pong se tornou uma febre nos Estados Unidos. Existiam arcades em quase todos os
estabelecimentos, e fliperamas apareciam em todos os lugares.
Com o sucesso de Pong, várias empresas surgiram para copiar as ideias da Atari,
já que, naquela época, patentes demoravam anos para ficarem prontas. Em 1974, já existiam
arcades espalhados por todo o mundo, chamando a atenção até de empresas de outros países,
que começaram a fabricar jogos parecidos. Nessa época, a politica da Atari era lançar jogos o
mais frequentemente possível, para que os concorrentes não tivessem tempo de copiar todos os
produtos. Com isso, existiam muitos games, mas todos eram copias e variações do Pong,
mesmo os jogos da Atari. A mudança veio quando a Atari lançou o jogo de corrida Track 10 e,
23

logo em seguida, o Gotcha (um jogo de labirinto), mostrando que era possível desenvolver
jogos sobre qualquer tema. Muitas ideias surgiram nesta época e, com a quantidade crescente
de empresas interessadas no desenvolvimento de games, dá-se início a uma indústria que viria a
ser bilionária.

1.3.2 O mercado

Após o sucesso de Pong, a indústria de games teve um crescimento significante.


Isto se deve, em grande parte, à redução da jornada de trabalho, que permitiu com que as
pessoas tivessem mais tempo livre.
O avanço da tecnologia também garantiu com que os jogos se tornassem cada
vez mais realistas, impressionando e conquistando as pessoas. Hoje em dia, existem dezenas de
gêneros de jogos, que agradam a todos os gostos. Novos meios de controlar os games também
surgiram, como o Nintendo Wii e o Kinect. Os smartphones podem ser usados para jogar a
qualquer hora, em qualquer lugar, e a internet possibilita que pessoas do mundo inteiro se
encontrem em mundos virtuais. Pode-se citar dezenas de outros motivos pelo os quais os jogos
se tornaram um fenômeno tão presente na vida das pessoas, mas o fato é que a indústria de
games consegue abranger vários grupos com gostos diferentes.
Segundo a Folha de São Paulo (2003), a indústria de games superou o cinema
em 2003 e, desde então, vem faturando mais a cada ano 6. Uma pesquisa feita pela PwC indica
que, em 2012, a indústria vai faturar, em todo o mundo, 68.3 bilhões de dólares.
No Brasil, o mercado de games está em fase de plena expansão, com um grande
potencial. De acordo com a ACIGAMES, o Brasil possui mais de 35 milhões de jogadores.
Embora cerca de 80% ainda não consuma produtos originais, o faturamento de 2011 foi de 750
milhões de dólares.
Emiliano de Castro, vice presidente de Relações Institucionais da Abragames
(Associação Brasileira das Desenvolvedoras de Jogos Eletrônicos), em um debate 7 sobre o
mercado de games no Brasil, citou alguns números em relação aos jogadores brasileiros, que
podem ser comparados com os dados presentes no site da ESA (Entertainment Software
Association). Os gráficos, a seguir apresentados, foram criados a partir destes dados:

6
Com a crise de 2008/2009 nos EUA e na Europa, o mercado de games diminuiu o crescimento.
7
O debate “O Mercado de Games e Aplicativos no Brasil” Ocorreu na FECOMERCIO no dia 25 de fevereiro de
2011.
24

30000 25000 100


20000
Faturamento 37 Média de
10000 50 34
750 (milhões de idade dos
0 dolares) jogadores
EUA(2010) 0
Brasil(2011) Brasil EUA

Gráfico 1 – Faturamento Gráfico 2 – Idade dos jogadores


Fonte: o autor Fonte: o autor

100 100

Média de 60 58 Porcentagem
50 40 41 idade dos 50 40 42 de homens
compradores Porcentagem
de jogos de mulheres
0 0
Brasil EUA Brasil EUA

Gráfico 3 – Idade dos compradores Gráfico 4 – Gênero


Fonte: o autor Fonte: o autor

Observando os gráficos acima, percebe-se que, embora não haja muita diferença
entre o perfil dos jogadores brasileiros e estadunidenses, o mercado americano fatura muito
mais.
Porém, o cenário brasileiro pode mudar. Com a entrada de empresas estrangeiras
no Brasil, a tendência é que o preço dos produtos diminuam, e consequentemente, a pirataria
também, o que daria um destaque maior para o mercado brasileiro, além de impulsionar a
indústria de desenvolvimento de jogos.
Estima-se que, atualmente, o principal mercado de games no Brasil é o de
mobile e jogos sociais.

1.4 JOGOS DIGITAIS E CULTURA

Jogos fazem parte da humanidade desde as primeiras civilizações. Eles evoluem


e são usados conforme a cultura, crença e tecnologia dominante. Isto explica porquê o uso dos
25

jogos mudou tanto com o passar dos séculos, assim como também explica porque a sociedade
atual utiliza os jogos exclusivamente para entretenimento.
Atualmente, os jogos estão presentes no dia a dia de milhões de pessoas, o que
gerou a game cultura. Isto se deve principalmente a dois fatores: a evolução tecnológica, que
permitiu novos meios de entretenimento, e a redução da jornada de trabalho no século XX, que
possibilitou que as pessoas tivessem mais tempo livre.

1.4.1 O que é cultura?

A palavra cultura carrega muitos significados. Pode ser usada para se referir ao
cultivo de terra, propagação de micro-organismos, pessoas “civilizadas” e outros.
A cultura tratada neste trabalho se refere ao “Sistema de ideias, conhecimentos,
técnicas e artefatos, de padrões de comportamento e atitudes que caracteriza uma determinada
sociedade” (MICHAELIS, 2011). Uma definição parecida é dada pela antropologia (BATES;
FRATKIN, 2002 apud MAYRA, 2008, p. 23):

Um sistema compartilhado de crenças, valores, costumes, comportamentos e artefatos que os


membros da sociedade usam para lidar com o seu mundo e uns com os outros, e que são
transferidos de geração para geração através do aprendizado.

Levando em consideração esta definição de cultura, pode-se definir o que é


game cultura.

1.4.2 Game cultura

Qualquer um que tenha passado uma noite sem sono em frente a uma brilhante tela de
computador, tentando progredir através de um desafio em particular em um jogo imersivo, pode
testemunhar os poderes dos games e a força de motivação que eles são capazes de incitar em seus
jogadores. Mas como nós podemos encontrar uma 'game cultura' por traz de uma experiência tão
individual, e como deveríamos defini-la? Para um não-jogador, jogos podem parecer apenas um
fenômeno isolado às bordas da sociedade moderna, sem qualquer significância cultural.
(MAYRA, 2008, p. 24)
26

Mesmo com a definição de cultura citada anteriormente, é difícil definir a game


cultura. Uma maneira simples de se entendê-la é tratá-la como uma subcultura, como é
proposto por Mayra (2008).
Basicamente, subculturas são culturas em menor escala, ou seja, são grupos
menores que compartilham crenças, valores, costumes, comportamentos e artefatos, porém,
ainda fazem parte da cultura dominante. Por exemplo, no movimento Punk, seus integrantes
possuíam um estilo de vida diferente do resto da população: escutavam músicas diferentes,
usavam roupas diferentes, assistiam filmes diferentes e etc. Mas, ao mesmo tempo, os punks
faziam parte da cultura dominante, pois frequentavam escolas, supermercados e não saiam por
aí nus, entre outras práticas que fazem parte da cultura contemporânea.
Outro exemplo de subcultura são os grupos religiosos, pois apresentam crenças
diferentes de outras pessoas e, muitas vezes, vivem de modo diferente. Em alguns casos, até
mesmo possuem formas de vestimenta específicos.
A game cultura pode ser definida se a classificarmos como subcultura. Apesar de
possuir milhões de integrantes, ainda é uma cultura menor do que a cultura contemporânea.
Porém, assim como os jogos da antiguidade, os games são influênciados pelo meio no qual
estão inseridos. Apesar de compartilharmos uma cultura “globalizada”, os diferentes países do
globo possuem culturas e subculturas próprias, ou seja, alguns jogos podem fazer sentido
somente para alguns, assim como costumes ou práticas relacionadas à game cultura podem
variar de grupo para grupo, e até mesmo de indivíduo para indivíduo. Inclusive, alguns jogos
podem ser alterados para melhor se adaptar à determinadas culturas. Estas características
também estiveram presentes durante a história, onde jogos como os de dados e tabuleiro eram
fortemente influênciados pelos contextos socioculturais.
Portanto, neste trabalho, a game cultura será tratada como subcultura hibrida8.

1.4.2.1 Jogos Revolucionários

Apesar da indústria ter sido marcada por grandes sucessos (e fracassos), alguns
games podem ser considerados “divisores de águas”, por causa da sua importância, seja na
cultura ou na indústria. Alguns desses jogos, como observado por Mayra (2008), criaram
comportamentos e práticas mainstream que são fatores comuns em alguns países

8
O termo foi utilizado por Gustavo Nogueira de Paula (2009) em um artigo publicado no site SBGames. Refere-se
à mistura de culturas locais (subculturas) à game cultura “americanizada” (cultura mainstream).
27

indústrializados do mundo, embora o fator hibrido possa alterar estes costumes de país para
país.

1.4.2.1.1 PacMan

Depois de Pong, o game que talvez tenha tido o maior impacto na sociedade foi
PacMan.
Lançado no começo de 1980, no Japão, PacMan é considerado por alguns o jogo
de maior sucesso da história, rompendo a barreira do mundo digital e trazendo para o mundo
real produtos como bonecos, roupas, brinquedos, livros, desenhos etc.
PacMan possuía dois grandes diferenciais dos demais jogos. O primeiro era que
os seus personagens eram únicos, ou seja, com características próprias, o que conquistou uma
legião de fãs, principalmente no Japão. O segundo diferencial foi o tema do jogo, que era
diferente de todos até então. O objetivo de PacMan era comer. Comer e ao mesmo tempo fugir
de fantasmas dentro de um labirinto.
A partir de PacMan, a indústria percebeu que poderia lucrar com artefatos
(FIG.:3) fora do mundo virtual, como já acontecia em filmes como Star Wars, o que mudou
completamente a indústria e a game cultura pois, a partir de então, começaram a surgir
personagens únicos em práticamente todos os jogos lançados, criando pérolas como Mario,
Sonic, e muitos outros.

Figura 3 – Produtos do jogo pacman


Fonte:http://garotasdepropaganda.files.wordpress.com/2010/05/pacman.jpg
28

1.4.2.1.2 Donkey Kong

Em 1981 surge Donkey Kong, o primeiro grande sucesso da Nintendo. Usando a


fórmula dos personagens carismáticos, o jogo Donkey Kong apresentou Mario, um dos
personagens de maior sucesso do mundo dos games, além do próprio personagem que dá nome
ao jogo. Mas não é por isso que o game se tornou importante.
Donkey Kong foi o primeiro jogo do gênero plataforma que apresentava um
botão exclusivo para pular, o que era uma novidade. Além disso, o jogo possuía uma história
bem elaborada se comparada com os jogos da época. Um dos grandes atrativos na história de
Donkey Kong era a presença de cutscenes9, prática que é usada até hoje pela indústria.
Mario e Donkey Kong mais tarde se tornaram franquias separadas e são lançadas
até hoje.

1.4.2.1.3 Ultima

Um dos gêneros de maior sucesso, atualmente, surgiu na década de 1970, o


RPG. Mas, devido ao poder computacional da época, a interface dos games era através de
textos. Somente uma década depois começaram a surgir os primeiros RPG's com interface
gráfica. Dentre eles destaca-se o game Ultima.
RPG's se caracterizam por possuírem histórias únicas e profundas, com
personagens bem trabalhados e mundos fantasiosos, o que os tornam perfeitos para o mundo
digital. Ultima foi o primeiro RPG de grande sucesso. Foi revolucionário, pois apresentava uma
história profunda e madura com questões éticas e morais. Era um estilo de jogo completamente
diferente do que existia no mercado.
Ultima permitia ao jogador tanto uma abordagem mais emocional e imersiva,
como uma abordagem menos emocional e mais direta, pois alguns jogadores preferiam apenas
os desafios e ação do jogo.
Jogos profundos e maduros como Ultima criam fãs fieis, que participam de
eventos e realizam convenções relacionadas a esses jogos. Práticas que, a partir de então,
começaram a se popularizar.

9
Animações ou pequenos filmes pré-definidos, onde o jogador não tem nenhum controle. Tem como objetivo
contar uma parte da história.
29

1.4.2.1.4 Doom

A década de 1990 trouxe mudanças significativas para os games. Dentre elas


pode-se citar a popularização dos consoles, dispositivos portáteis, internet e outros. Uma das
principais mudanças foi o surgimento dos jogos 3D, onde pode-se citar o jogo Doom.
Doom não foi o primeiro jogo 3D do mercado, porém, foi um dos mais
inovadores. Além de proporcionar ao jogador movimentar-se livremente em um mundo 3D,
inovou no marketing do jogo, usando a recente Internet para disponibilizar uma versão
demonstrativa para download. Estima-se que entre 10 e 20 milhões de pessoas tenham feito o
download da demo.
Outra grande inovação de Doom foi a possibilidade que os jogadores tinham de
gravar as suas partidas, que poderiam ser compartilhadas com amigos. Essa possibilidade criou
o Machinima, que é o ato de criar pequenos filmes (ou não10) utilizando os próprios jogos.
Doom também foi o grande responsável pela popularização do gênero FPS,
principalmente por possibilitar partidas multiplayer em lan, que, mais tarde, se tornariam febres
mundiais, criando o fenômeno das lan houses.
Por fim, uma das maiores contribuições de Doom foi dar a possibilidade para fãs
modificarem o jogo (MOD), uma prática que é muito forte nos dias atuais, dando um fôlego
extra a jogos antigos e criando variações de muito sucesso, como Counter-Strike.

1.4.2.1.5 MMORPG

MMORPG é um gênero de jogo baseado no RPG clássico. Porém, com a


possibilidade de milhares de pessoas jogarem no mesmo mundo virtual.
Os MMO's mudaram, principalmente, a maneira como são criadas as redes
sociais e os contatos das pessoas, além de serem os principais responsáveis pelo surgimento de
palavras e gírias comuns entre jogadores online. Palavras como “instance”, “daily”, “quest”,

10
Alguns machinimas são levados a sério por seus desenvolvedores. Em 2008, Mathieu Weschler criou um filme
completo, com uma hora e meia de duração, chamado The Trashmaster, utilizando somente a engine do jogo GTA
4.
30

“pvp” e “party" acabaram se tornando hábitos que facilitam a comunicação dentro destes jogos.
A compra e venda de itens online também se tornou um ato comum na game
cultura. Jogadores11 vendem, por dinheiro real, itens ou personagens do mundo virtual, o que
pode gerar muito capital, uma vez que jogos como WOW possuem milhões de jogadores.
Alguns jogos possuem sistemas de conversão da moeda virtual para a moeda real, um dos mais
famosos foi o game Second Life.

1.4.2.2 A game cultura nos dias atuais

A game cultura foi moldada durante mais de 40 anos até chegar ao ponto em que
está. Por exemplo, um típico grupo de amigos da década de 1980 provavelmente se reuniria
todos os finais de semana no fliperama da cidade, e passaria a tarde inteira comprando fichas e
jogando. Este mesmo grupo, na década de 1990, iria se reunir na casa de algum dos integrantes
e passaria o dia inteiro jogando (e esperando a sua vez de jogar).
Já na primeira década do seculo XXI, os integrantes deste grupo provavelmente
ficariam em casa ou numa lan house, cada um no seu computador ou console, jogando online
uns com os outros e, ao mesmo tempo, com pessoas do mundo inteiro.
O que podemos observar neste início da segunda década do século XXI, é que a
internet e os dispositivos móveis se tornaram um fenômeno em quase todo o mundo. Consoles
portáteis como o PSP e o Nintendo DS, e dispositivos móveis como celulares e tablets,
possibilitam jogar em qualquer lugar, a qualquer hora. A internet, que antes permitia com que
as pessoas jogassem online em suas casas ou lan houses, hoje permite jogos online nestes
dispositivos.
A internet também é responsável pela recente febre dos jogos de navegador
(flash games) e social games12 que são bem populares entre crianças e os chamados “casual
gamers”.

11
Em 2011 um fato ocorreu na China, onde condenados eram forçados a jogar WOW 12 horas por dia, afim de
adquirir itens e gold (a moeda do jogo) para a venda na internet. O caso alcançou a mídia mundial principalmente
porquê os presos não recebiam nenhuma forma de pagamento e, em alguns casos, ainda recebiam punições físicas.
12
Jogos para redes sociais como Facebook e Orkut. O principal atrativo deste tipo de jogo é a interação que ele
permite com os contatos que o jogador possui.
31

As relações entre jogos e jogadores variam de acordo com vários fatores como
estado emocional, personalidade, plataforma de jogo, ambiente, etc. Porém, um fato curioso
que foi produzido pela atual game cultura foi a clara distinção entre dois tipos de jogadores que
se relacionam de formas diferentes com os games, os “casual gamers” e os “hardcore gamers”.
Casual gamers normalmente não são tão ativos na game cultura como os
hardcore gamers, ou seja, alguns criam apego a um game e passam horas jogando (hardcore
gamer), outros, podem simplesmente jogar no tempo livre e não dar tanta importância para os
games (casual gamer). Independentemente do tipo de jogador, enquanto estão jogando, as
pessoas dão aos jogos o seu próprio significado, podendo ou não dar alguma profundidade à
experiência de jogo, e todos eles fazem parte da game cultura.
É importante esclarecer que isto não quer dizer que casual gamers não joguem
games profundos como RPG's, ou que hardcore gamer não joguem social games. A diferença
está na relação entre o jogo e o jogador, ou seja, o significado e importância que cada pessoa dá
ao game. Também, deve-se notar a diferença entre games casuais/hardcore e jogadores
casuais/hardcore. Games casuais são simples, com gráficos menos realistas e histórias não tão
profundas. Games hardcore normalmente possuem os melhores gráficos, histórias profundas e
envolventes e demandam várias horas para completar o jogo. Ou seja, um jogador que dá muita
importância para um game casual, é um jogador hardcore. Assim como se um jogador dá pouca
importância para um game hardcore, é um jogador casual.
Assim como os MMORPGs, social games e RPGs, existem dezenas de outros
gêneros diferentes, como FPS, TPS, ação, plataforma, músical, estratégia, puzzle e muitos
outros. Cada gênero de jogo conquista um público diferente, público este que pode se interessar
ou não por outros gêneros.
Novas tecnologias também podem conquistar o público, como o Nintendo Wii e
o Kinect que trouxeram novas possibilidades de interação com os games, dando a possibilidade
de práticar exercícios físicos ou treinar passos de dança. Outro fator que conquista fãs
fervorosos são personagens carismáticos ou games baseados em filmes ou livros.
Com um público tão grande e variado, a internet se tornou o local de encontro de
gamers do mundo inteiro. Muitas pessoas participam de sites e fóruns para discutir jogos e
tendências da indústria. Os Machinimas podem ser encontrados aos montes em sites como o
YouTube e, os moders13, disponibilizam seus trabalhos na rede. Existem comunidades criadas
por fãs onde as pessoas reúnem informações, dicas e detonados14 sobre determinado game, além

13
Pessoas que criam os MOD's.
14
Ou Walkthrough, são instruções que mostram, passo a passo, como completar algum game.
32

de compartilhar trabalhos como quadrinhos, desenhos, animações e até mesmo histórias


paralelas ou alternativas, entre outros vários tipos de conteúdo “não-oficial”.
Porém, também existem traços da game cultura fora da internet. Hoje em dia
existem programas de TV, revistas e livros dedicados exclusivamente aos games. Muitos deles
falam sobre os bastidores do desenvolvimento de games, tendências, eventos, convenções e
campeonatos. Além disso alguns games fazem tanto sucesso que são adaptados para o cinema,
televisão ou quadrinhos.
Existem muitas outras práticas e costumes que as pessoas realizam, porém elas
variam de região para região, de cultura para cultura e indivíduo para indivíduo. Apesar de
tudo, o fato é que a abrangência dos jogos, ligada ao desenvolvimento tecnológico e à indústria,
permitiu o surgimento da game cultura e, independentemente de qual gênero e tecnologia usada
ou contexto sociocultural, os games influênciam a vida dos gamers.

1.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O jogar é um ato natural, até para outros seres vivos. Talvez, até seja um ato
necessário para a vida; logo, não é estranho que o ser humano crie e cultive jogos ao longo dos
séculos.
Olhando para o passado, observa-se que o modo como cada jogo é incorporado
nas sociedades varia de acordo com o contexto histórico/cultural de cada uma, ou seja, os jogos
evoluem ou desaparecem com o passar do tempo, mudam suas regras e sua relação com a
população. Outro ponto importante é que muitos jogos surgiram visando motivos que não eram
o entretenimento e, mesmo quando o objetivo principal é o entretenimento, os jogos, digitais ou
não, podem servir para outros propósitos.
Os jogos do século XX existiam com o principal propósito de entretenimento,
dadas às tensas circunstâncias em que o mundo se encontrava. Era uma forma barata de aliviar
o stress, atividade esta que se popularizou com a redução da jornada de trabalho da população.
Pong foi o primeiro grande sucesso dos games, herdando um público e mercado que pertencia
aos jogos mecânicos. Dá-se início à era dos videogames.
O avanço tecnológico e o barateamento dos produtos fizeram com que os jogos
se proliferassem pelo mundo inteiro. Uma indústria poderosa surgiu e, junto com ela, a game
cultura.
33

A indústria e a game cultura são resultados do impacto dos jogos na sociedade


contemporânea e uma exerce influência sobre a outra. A indústria se expandiu com o passar dos
anos, criando tanto softwares como hardwares que abrangem os interesses e gostos de
diferentes grupos de pessoas. Aos interesses, costumes, hábitos, crenças e comportamentos
dessas pessoas dá-se o nome de game cultura.
A game cultura pode ser definida como uma subcultura hibrida, pois é um
sistema compartilhado que se adapta à diferentes contextos culturais.
A indústria e, principalmente, a game cultura, são amostras do que os games
podem causar em uma sociedade. Porém, os jogos são capazes de muito mais. Os jogos
possuem um poder de persuasão que nenhuma outra mídia possui, nem mesmo a televisão ou o
cinema.
Agora que já está claro o poder que os games exercem nas pessoas como um
todo, ou seja, na sociedade, pode-se discutir o poder persuasivo dos games e como eles podem
ser usados de forma a criar uma crítica social.
34

2. O GAME COMO INSTRUMENTO DE CRÍTICA SOCIAL

2.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Os dois principais efeitos da popularização dos games na sociedade


contemporânea foram a indústria de jogos e a game cultura.
A indústria diz respeito ao desenvolvimento e mercado de games. A game
cultura é relacionada aos costumes, crenças e características que determinados grupos de
jogadores possuem em comum.
Se a game cultura consegue mudar, ou moldar hábitos de pessoas, isso quer dizer
que, em algum ponto, os jogos possuem um grande poder persuasivo. Sendo assim, nada
melhor do que um game para promover um pensamento crítico por parte do jogador ou até
mesmo promover uma mudança social.
No capítulo anterior foram citados vários jogos da antiguidade que possuíam um
grande poder de persuasão. Os wargames, por exemplo, eram usados para simular táticas de
guerra. Isto quer dizer que, se uma tática não funcionasse no jogo, o general pensaria duas
vezes antes de usá-la numa batalha real.
Wargames conseguiam persuadir o jogador a ponderar sobre o uso de
determinada estratégia no mundo real. Hoje em dia, existem centenas de simulações que
possuem o mesmo propósito. Por exemplo, uma simulação de voo pode dar dicas sobre qual a
melhor rota em uma viagem ou então qual a melhor estratégia para realizar um pouso suave.
É importante notar que, assim como os wargames, as simulações atuais não
ensinam as pessoas a lutarem numa guerra ou a pilotarem um avião, por exemplo. Elas
simplesmente servem para ensinar as regras básicas e possíveis variáveis de algum processo.
Hoje em dia, todos os jogos são (ou deveriam ser) persuasivos, pois a persuasão
é usada para que o jogador continue a jogar. Por exemplo, o “score” é um mecanismo que
estimula o jogador a continuar jogando para se superar. MMORPG's colocam os jogadores num
ambiente de competição (e cooperação) que os estimulam a continuar jogando.
35

Os próprios jogadores hardcore são pessoas que foram “persuadidas”, seja pela
história envolvente, mecânica de jogo ou simplesmente pela diversão, entre outros fatores
citados no capítulo anterior.
Porém o interesse deste trabalho não é em uma persuasão que estimule as
pessoas a continuarem jogando e sim numa persuasão que vá além do circulo mágico¹ proposto
pelo históriador Johan Huizinga (2004), afinal, os games não tratam somente sobre matar
monstros ou salvar princesas, eles também podem tocar em assuntos do mundo real, em
problemas do mundo real.
Jogos podem transmitir ideias ou pontos de vista, podem ser usados como forma
de expressar os sentimentos dos desenvolvedores ou até mesmo podem servir como
instrumento de crítica social. Para isso, torna-se importante a comunicação entre os
desenvolvedores e os jogadores. Esta comunicação é realizada através de uma experiência de
jogo que estimule um pensamento crítico sobre determinado assunto.
Devido a esta natureza, um jogo que visa a crítica social pode ser considerado
um serious game, pois tem como objetivo principal algo que não é a diversão.
Neste capítulo, serão discutidas algumas técnicas utilizadas em serious games, a
fim de descobrir como um jogo pode ser persuasivo e, talvez, gerar um pensamento crítico por
parte do jogador.

2.2 SERIOUS GAMES

O termo “serious games” foi primeiramente apresentado por Abt (1987) em seu
livro Serious Games: “Nós estamos preocupados com serious games no sentido de que estes
jogos possuam um propósito educacional, não tendo intenção de servir unicamente como meio
de entretenimento. Isso não significa que serious games não são, ou não devem ser, divertidos”.
No mesmo livro, Abt (1987) explica: “ Serious Games combinam o ponto de
vista analítico e questionador científico com a liberdade, intuição e imaginação dos atos
artísticos”.

¹ Huizinga propõe que, ao jogar, as pessoas criam um “circulo mágico”, que está separado do mundo real. Ou seja,
as pessoas sabem que estão em uma realidade diferente e podem fazer qualquer coisa, desde que respeitem as
regras do jogo.
36

Desde então, empresas e desenvolvedores independentes surgiram com o intuito


de criar jogos deste tipo. Vários gêneros de serious games foram criados, como os advergames,
jogos educativos, newsgames², docugames,³ jogos políticos, exergames4 e muitos outros.
Os serious games, normalmente, focam numa mudança de comportamento, ou
pensamento, por parte do jogador, no mundo real. Jogos educativos podem ensinar as pessoas
matemática ou história, jogos políticos podem esclarecer dúvidas sobre determinado candidato
ou partido, exergames nos ajudam a melhorar a saúde. Para atingir os seus objetivos, estes
games utilizam técnicas de persuasão, como a retórica, a fim de transmitir alguma informação
para o jogador.

2.2.1 Retórica

A retórica começou como uma arte de persuasão, no sentido de que a verdade não possui valor a
não ser que seja efetivamente comunicada aos outros. Contudo, como existe uma linha tênue
entre persuasão e manipulação, o termo é coloquialmente usado de forma depreciativa, como
para indicar uma“conversa vazia” que não chega a lugar algum. (FRASCA, 2007, p. 79)

O campo da retórica existe há mais de 25 séculos e, assim como os jogos, a


retórica foi moldada com o passar do tempo. Filósofos como Platão e Aristóteles inicialmente
definiram retórica como um meio de se expressar claramente.
Com o passar do tempo, a retórica começou a ser utilizada como meio de
persuasão, principalmente com a introdução de novas tecnologias como a escrita e a televisão,
onde a retórica passou a ser usada para persuadir as pessoas, não só através da oratória, mas
também através de textos e imagens. Muitas vezes essa persuasão é usada para manipular.
Atualmente, a retórica é usada em vários lugares como a televisão, música, cinema, livros,
revistas, discursos políticos, propagandas, na própria internet e, inclusive, nos jogos.
A retórica abordada neste trabalho é a clássica, ou seja, um meio de expressar
um ponto de vista ou ideia claramente. Este trabalho não tem nenhuma intenção de abordar a
retórica como um meio de manipulação.

² Jogos com o intuito de contar alguma notícia de jornal ou revista.


³ Jogos documentários. Normalmente retratam algum acontecimento histórico.
4
Jogos que promovem exercícios físicos.
37

2.2.2 Play Rhetoric

Play Rhetoric é a retórica aplicada no “jogar”, não só em jogos digitais, mas


qualquer tipo de jogo.
Alguns autores discutem sobre este tipo de retórica. Este trabalho usa como base
a abordagem do desenvolvedor e pesquisador uruguaio Frasca (2007), pois o mesmo também
tem como prioridade os jogos digitais, além de sua pesquisa ser relativamente recente.
A abordagem de Frasca será utilizada com o intuito de demonstrar como a play
rhetoric pode ser usada na persuasão dos jogadores, a fim de que os mesmos entendam as
mensagens que os jogos querem passar. É importante ressaltar que a retórica, dentro de um
jogo, é usada para estabelecer uma comunicação clara entre o desenvolvedor e o jogador. Se a
retórica for bem executada, o jogador pode ser persuadido, ou seja, compreender a mensagem.
Em sua abordagem, Frasca sugere5 três diferentes categorias de retórica presente
nos games.: “Playworld”, “Mechanics” e “Playformance”.

2.2.2.1 Playworld

“ O playworld inclui o espaço, tempo e objetos físicos envolvidos no jogo ou na


atividade de jogar.” (FRASCA, 2007, p. 93).
Nos videogames isto é representado por textos, imagens, cutscenes, sons, história
e etc. Todo o tipo de sinal visual, textual ou sonoro faz parte desta categoria. Frasca (2007)
alega que, embora estes sinais possam ser interpretados pelos jogadores, eles não possibilitam
um entendimento completo do jogo.
Para exemplificar como funciona este tipo de retórica, serão analisados alguns
jogos. Os primeiros são da série Battlefield: Battlefield 1942 e Battlefield 2142.
Battlefield é uma série de grande sucesso na indústria. A sua última versão,
Battlefield 3, possui um dos melhores gráficos da geração atual. O primeiro jogo da série foi
Battlefield 1942, lançado em 2002, no qual os jogadores se dividem em dois times e tem como
objetivo capturar os territórios do time adversário. Independente de qual time, o jogador tem a
possibilidade de escolher entre alguns tipos de personagens que variam entre médicos,
soldados, atiradores de elite, mecânicos e infantarias antitanque.
5
Frasca afirma que estas categorias não são definitivas, mas apenas “guias”.
38

Por ser um FPS, Battlefield 1942 (FIG.:4) possui os mesmos padrões presentes
em vários jogos deste estilo. As teclas 'W', 'A', 'S' e 'D' movimentam o personagem e, com o
mouse, o jogador controla a mira da arma e atira. Enfim, o jogo possui várias regras específicas.
Quatro anos mais tarde, é lançado Battlefield 2142 (FIG.:5), com as mesmas
regras básicas e mecânica de Battlefield 1942. A grande diferença entre os dois jogos está nos
elementos que compõe o playworld, como os modelos 3D, sons, contexto histórico em que o
jogo se passa, etc. Ou seja, apesar de possuírem, basicamente, a mesma mecânica, os dois jogos
estão em contextos diferentes: enquanto um representa as batalhas que ocorreram durante a
Segunda Guerra Mundial, o outro representa um possível futuro, com robôs gigantes e carros
voadores.

Figura 4 - Battlefield 1942


Fonte:http://web-vassets.ea.com/Assets/Richmedia/Image/Screenshots/ f
fffffffffffffffffffffffull_screen_01_656x369.jpg?cb=1316755111

Figura 5 - Battlefield 2142


Fonte:http://web-vassets.ea.com/Assets/Richmedia/Image/Screenshots/
fffffffffffffffffffffbattlefield2142-pc-screenshot3_656x369.jpg?cb=1317082808
39

Não seria estranho alguém considerar os dois jogos completamente diferentes,


mas, na realidade, eles compartilham regras e mecânicas básicas e, se não fosse a diferença de
contexto (playworld), seriam práticamente o mesmo jogo.
Existem casos onde a manipulação do playworld pode causar mudanças ainda
maiores no significado de um jogo. Um exemplo é o game Tax Invaders mostrado na FIG.:6,
um remake do clássico Space Invaders.
Em Tax Invaders, no lugar de naves espaciais e alienígenas, o jogador controla a
cabeça do ex-presidente dos EUA, George W. Bush, que deve atirar em planos de taxa que
aparecem na tela.
Em princípio, pode parecer uma mudança banal, pois a mudança no playworld,
por si só, não modifica o significado que o jogo quer transmitir (atirar em tudo que se move).
Porém, aliada à mecânica de Space Invaders, Tax Invaders consegue mudar
completamente o contexto e sentido do jogo original (uma invasão alienígena para uma
possível crítica sobre um problema político) e que permite várias interpretações diferentes6.
É interessante notar que o fator híbrido, discutido no capítulo passado, é bem
claro neste jogo, uma vez que ele representa um problema que fez parte do cotidiano dos
cidadãos dos EUA durante um certo período. Para eles, este jogo talvez gere interpretações que
nunca passariam pela cabeça de pessoas de outros países.

Figura 6 – Tax Invaders


Fonte: PERSUASIVE GAMES, 2007, Capítulo 3 p. 104

6
O filosofo e game design Ian Bogost (2007) faz uma análise de 6 páginas sobre elementos persuasivos de Tax
Invaders e qual a mensagem o jogo quer transmitir.
40

Nos dois exemplos dados, a retórica funciona da mesma maneira. Em Battlefield,


os novos elementos transformaram um jogo antigo em algo completamente novo. Battlefield
2142 obtêm sucesso em persuadir os jogadores a explorar mundos completamente diferentes ao
mesmo tempo que mantém as regras, mecânicas e objetivos da versão anterior. Tax Invaders
vai além e consegue mudar o próprio sentido do jogo. Porém, esse novo sentido só pode ser
compreendido aliado às mecânicas e regras do jogo original.
No playworld, a retórica é usada da mesma forma que no cinema, literatura e na
música. Através de uma narrativa, textos, sons, objetos do cenário e outros, é possível criar o
ambiente que o desenvolvedor desejar. Porém, somente este tipo de retórica não é o suficiente
para persuadir o jogador usando o total poder de persuasão dos jogos digitais.

2.2.2.2 Mechanics

Mechanics (ou mecânica), segundo Frasca (2007), são as regras, limites e


objetivos do jogo. As regras dizem respeito ao que o jogador pode fazer dentro do jogo. Os
limites são as modificações, nas regras, que os jogadores podem fazer no jogo, como MOD's ou
trapaças. Por último, os objetivos do jogo, são os objetivos que devem ser cumpridos para que o
jogador vença o jogo.
Bogost (2007) dá o nome de Retórica Procedural, às técnicas de retórica que
usam elementos da mechanic, ou seja, a retórica representada através de processos. Em seu
livro, Persuasive Games, Bogost (2007) nota que os jogos e simulações têm uma grande
vantagem sobre qualquer outra mídia: a possibilidade de simular processos através de códigos.
Sendo assim, uma retórica procedural é o ato de representar, convincentemente, um processo
que faça o jogador aprender ou refletir sobre algo.
Além do fato de poder representar processos, os jogos também são interativos. A
união de simulação de processos e interatividade gera uma poderosa ferramenta de persuasão,
onde o jogador consegue vivenciar situações e eventos que não seriam possíveis na vida real.
Este é o tipo de retórica mais abordada por pesquisadores da área, pois ela é o que difere os
jogos e simulações dos livros, filmes, músicas e etc.
A seguir são abordados dois jogos que exemplificam o funcionamento da
mechanics, mais precisamente da retórica procedural, dentro de um jogo.
41

Um dos jogos mais aclamados dos últimos anos é Civilization V: um jogo de


estratégia onde o jogador deve construir uma civilização que resista ao teste do tempo, desde a
invenção da roda até a criação de naves espacias. Existem várias formas de se ganhar o jogo,
como a conquista mundial, corrida espacial, expansão cultural e outros. O jogador deve adaptar
a sua estratégia de acordo com qual condição de vitória deseja cumprir. Por exemplo, para
vencer a corrida espacial, o jogador deve focar no desenvolvimento tecnológico, enquanto na
dominação mundial, o jogador deve focar na indústria bélica e na criação de exércitos.
No jogo, o jogador divide espaço em um mundo fictício com outras civilizações.
Cabe ao jogador se relacionar com cada uma delas (FIG.:7), procurando possíveis inimigos ou
aliados.

Figura 7 - O jogador pode contatar lideres de outras civilizações.


Fonte: http://downloads.2kgames.com/civ5/site13/images/media/screenshots/04_xl.jpg

Porém, não é uma tarefa fácil gerenciar uma civilização. O jogador deve se
preocupar com vários pontos, como expandir o território, pesquisar novas tecnologias, criar um
exercito respeitável, construir infraestrutura nas cidades, manter a economia se desenvolvendo,
deixar a população feliz, entre dezenas de outros processos .
Cada um destes processos geram consequências que influênciam diretamente no
desenvolvimento da civilização. Por exemplo, civilizações muito grandes ou civilizações que
estão em guerra tendem a possuir um grande numero de cidadãos infelizes. Quanto mais
cidadãos infelizes, menor é a produção das cidades. Se uma cidade produz pouco, ela gera
fome, desemprego e pobreza, além da estagnação econômica da mesma. Para acabar com a
infelicidade, o jogador deve criar construções que gerem felicidade como museus, templos e
42

teatros. Porém, como a produção da cidade está abaixo do normal, o tempo de construção é
extremamente demorado. Além disso, quanto maior o numero de construções, maior é o
dinheiro gasto na manutenção dos mesmos. Logo, a civilização pode entrar numa crise
econômica que impossibilita qualquer avanço significativo no jogo.
O processo descrito acima não está completo, as ramificações de cada ato
tomado pelo jogador possuem consequências muito mais profundas e detalhadas, que podem
durar alguns séculos, dentro do jogo.

Figura 8 - Bordas de uma civilização, cidade atacando navios inimigos.


Fonte: http://downloads.2kgames.com/civ5/site13/images/media/screenshots/08_xl.jpg

Cada ação tomada pelo jogador causa uma consequência. Estas ações e
consequências são determinadas pelas regras do jogo. O processo descrito anteriormente
exemplifica isso. Uma população infeliz diminuiu a produção das cidades, mas será que a
produção é importante neste momento do jogo? Vale a pena sacrificar a economia em prol de
uma população mais feliz?
Civilization V coloca o jogador no controle de uma civilização e, através da
retórica procedural, consegue mostrar ao jogador como é difícil e quais os obstáculos em
administrar uma civilização. Além de possuir características de wargames, como mostrado na
FIG.:8.
É um ponto de vista que uma pessoa normal nunca teria na vida real.
O segundo exemplo é um jogo simples, se comparado com Civilization V.
43

Tuboflex foi criado pelo site molleindustria. O jogo critica o modo como as
pessoas são exploradas em seus trabalhos, sofrendo pressão de consumidores, patrões e longas
jornadas de trabalho.
Em Tuboflex, o jogador controla um homem que trabalha para a Tuboflex inc.,
uma empresa que criou um complexo sistema de tubos que é capaz de transportar seus
funcionários para os setores onde o seu trabalho é mais necessário.
O jogador deve “trabalhar” em cinco empregos diferentes, resolvendo
minigames em cada um deles. A FIG.:9 é um exemplo de um minigame.

Figura 9 - Um dos minigames presentes no jogo.


Fonte: http://www.molleindustria.org/en/tuboflex

Com o passar do tempo, a dificuldade de cada minigame vai aumentando.


Quando o jogador faz algum movimento errado, ele é penalizado. Caso cometa muitos erros, o
jogador é despedido e perde o jogo, conforme a FIG.:10. Os empregos se repetem em ciclos e
ao final de cada ciclo o personagem é transportado para casa para descansar. Após um curto
período de tempo o ciclo inicia novamente. O objetivo é tentar permanecer o maior tempo
possível sem cometer erros e ser despedido.
A retórica procedural em Tuboflex é diferente de Civilization. Aqui, as regras são
criadas com o intuito fazer o jogador perder. A dificuldade aumenta numa proporção que,
mesmo o mais habilidoso dos jogadores, não consegue resistir.
44

A retórica funciona de modo a transmitir uma mensagem que pode ser


interpretada de várias maneiras. Alguns podem perceber que, não importa o quanto alguma
pessoa se esforce, no final, ela é apenas um objeto para a empresa. Outros podem até mesmo
entender este jogo como uma crítica ao sistema capitalista.

Figura 10 - Fim de jogo. O trabalhador se torna um morador de rua.


Fonte: http://www.molleindustria.org/en/tuboflex

Assim como o Playworld, a mechanic não funciona completamente sozinha.


Técnicas como a retórica procedural necessitam, também, de elementos do playworld, e vice-
versa.

2.2.2.3 Playformance

O modo como o jogador interage com o jogo é chamado de playformance. Por


exemplo, usando um joystick o jogador pode dar comandos específicos para o personagem,
assim como receber feedbacks do próprio joystick (vibrações).
Playformance é mais usada para aumentar a interação entre o jogador e o jogo,
criando uma persuasão de suporte, que estimula o jogador a continuar jogando. Devido à sua
natureza, este tipo de retórica está fora do escopo deste trabalho, pois, aparentemente, não
possui nenhuma relação com uma persuasão que estimule um pensamento crítico.
45

2.3 A CRÍTICA SOCIAL NOS GAMES

A play rhetoric pode ser usada para persuadir o jogador, seja a continuar
jogando, compreender um ponto de vista ou até mesmo aprender algo.
Em um jogo que visa a crítica social, o playworld e mechanics são dois tipos de
play rhetoric que devem ser controlados pelos desenvolvedores, a fim de adaptar a retórica à
uma crítica social. Porém, antes disso, devemos entender o que é uma crítica social.

2.3.1 Crítica social

Hoje em dia, é comum escutar pessoas falando sobre a “crítica social” de


determinada obra literária, filme ou música. Porém, o que caracteriza uma crítica social?
Segundo o filósofo brasileiro Olavo de Carvalho (2001), a crítica social, tem
como base, uma ideia do melhor e “é só em comparação com essa ideia que a sociedade
existente pode parecer boa, sofrível, má ou insuportável.”
Sendo assim, pode-se definir que a crítica social analisa e expõe estruturas
sociais (problemáticas, sob seu ponto de vista), podendo até visar soluções práticas, através de
medidas específicas, reforma radical ou mesmo mudança revolucionária.
Analisando esta definição, pode-se concluir que a retórica é um instrumento de
suma importância para que uma crítica social funcione adequadamente, ou seja, para que a
mensagem seja claramente transmitida para a população.
Como dito anteriormente, a crítica social é frequentemente encontrada em
filmes, livros e músicas. Nestes meios, a crítica usa os tipos de retórica mais adequados, por
exemplo, em filmes, imagens causam um impacto maior nos espectadores, em músicas, letras
profundas e belas melodias.
A música Ouro de Tolo, do artista Raul Seixas, é um exemplo de crítica social:

Eu devia estar contente


Por ter conseguido
Tudo o que eu quis
Mas confesso abestalhado
46

Que eu estou decepcionado...

Porquê foi tão fácil conseguir


E agora eu me pergunto “e dai?”
Eu tenho uma porção
De coisas grandes pra conquistar
E eu não posso ficar aí parado...

Mesmo que várias interpretações possam ser tiradas do trecho anterior, fica claro
que Raul Seixas fala sobre a condição humana de sempre querer mais e nunca ficar satisfeito.
Uma crítica ao modo de vida capitalista do século XXI, onde o consumismo desenfreado pode
ser considerado um dos grandes males de nossa sociedade, tanto do ponto de vista social quanto
ecológico.
O trecho anterior exemplifica como a crítica social funciona na música. No
cinema e literatura, a crítica funciona de modo parecido, utilizando a retórica em textos,
discursos, imagens e sons.
Nos games, a crítica social deve ser feita utilizando a play rhetoric.

2.3.2 O Game Crítico

Com base em tudo que foi discutido até agora neste trabalho, pode-se definir
como desenvolver um game que visa a crítica social, ou seja, um jogo crítico.
No primeiro capítulo, foram abordadas as duas principais consequências dos
games na sociedade contemporânea: a indústria de games e a game cultura.
A game cultura criou grupos de pessoas que agem de maneira diferente do resto
da população. Isto se deve ao poder de persuasão que os jogos possuem. Um jogo com uma
história épica, provavelmente irá conquistar uma legião de fãs. Um jogo divertido também
poderá obter o mesmo sucesso. Isso quer dizer que a indústria usa meios de persuasão para
cativar e conquistar mais e mais jogadores pelo mundo.
Neste ponto duas perguntas devem ser respondidas:

-Um game crítico conseguiria persuadir o jogador a compreender um ponto de


vista ou até mesmo engajar algum tipo de mudança social?
47

-É possível criar um game AAA7 que tenha como prioridade uma crítica social?

A resposta para a primeira pergunta é sim.


Como visto neste capítulo, os games, assim como as simulações, podem
representar processos, através de códigos de computador. Estes processos são modificados e
moldados pelos jogadores através da interação entre computador e ser humano. Sendo assim,
qualquer processo da vida real, pode ser simulado em um game, onde o jogador poderá ver, em
tempo real, todas as consequências de suas ações.
Com isto, também podemos concluir que a resposta da segunda pergunta
também é sim. Para exemplificar, será proposto um jogo hipotético. Um MMORPG, onde, no
lugar de monstros, espadas e poderes mágicos, os jogadores deveriam estabelecer e desenvolver
uma sociedade sustentável. Construir casas, transporte, alimentos, eletricidade, enfim, tudo o
que é necessário para a vida moderna. Em um jogo deste tipo, os jogadores deveriam cooperar
uns com os outros, a fim de conseguir atingir seus objetivos.
Neste jogo hipotético, as pessoas poderiam aprender, em tempo real, soluções e
modos de vida diferentes do mundo real. A crítica social em um jogo deste tipo poderia ir muito
além da mera reflexão por parte do jogador, uma vez que o jogo mostraria formas concretas de
melhorar o mundo, os jogadores poderiam aplicar conhecimentos adquiridos no jogo no mundo
real.
Obviamente um jogo deste tipo seria muito complexo de se desenvolver,
provavelmente exigiria uma enorme equipe e muito investimento, mas é apenas um exemplo de
como jogos AAA podem ser usados para a crítica social.
Jogos deste tipo são abordados pela game design Jane McGonigal (2011), que
acredita que aventuras épicas podem persuadir as pessoas a realizarem boas ações na vida real,
como melhorar a saúde, ajudar o próximo, resolver problemas em escala global e etc. Mas os
games podem estabelecer uma crítica social mesmo em jogos mais simples, sem uma simulação
de processo tão complexa como a do jogo hipotético.
Utilizando as técnicas de retórica procedural, o game pode persuadir o jogador,
como o jogo analisado anteriormente, Tuboflex, onde os desenvolvedores utilizam uma retórica
procedural a fim de passar uma mensagem ao jogador.
Uma aventura épica que conquista milhares de fãs ou um simples jogo de
navegador, o game crítico proposto neste trabalho é aquele que tem como objetivo principal a

7
padrão usado na indústria de games para indicar jogos com “alto nível de qualidade”. Normalmente jogos AAA
custam algumas dezenas (ou centenas) de milhões de dólares.
48

transmissão de uma crítica social, a fim de que o jogador reflita ou até mesmo mude de
comportamento. Esta característica coloca o game crítico na categoria de serious game, pois,
como visto anteriormente, serious games tem como objetivo algo além do entretenimento.
Mas é importante notar que a crítica social pode ser usada em qualquer gênero de
jogo, mesmo que o foco principal do jogo seja apenas o entretenimento e a diversão. Um
exemplo é o jogo Mass Effect, onde o jogador se depara com problemas como preconceito
social e racial, além de vários momentos em que questões profundas como o sentido da vida
são apresentadas ao jogador.
Assim como qualquer jogo, os desenvolvedores de um game crítico devem
trabalhar em um game que se adeque à crítica (tema do jogo). Cabe ao desenvolvedor decidir
como abordar a crítica, por exemplo, o game crítico pode ser longo, com várias horas de jogo,
possuir uma grande imersão e criar um elo emocional com o jogador, ou então pode ser um
jogo simples, que não foque tanto na imersão, mas que seja curto e direto na transmissão da
mensagem.
Um game crítico pode ser um FPS, um RPG, um jogo de ação, plataforma,
enfim, qualquer gênero de jogo pode ser adaptado a fim de realizar uma crítica social.
Obviamente, jogos que não se classificam em nenhuma categoria existente também podem ser
usados. Mais uma vez, cabe ao desenvolvedor (ou desenvolvedores) decidir a melhor maneira
de equilibrar a diversão com a crítica social e controlar a play rhetoric.
Por último, mas não menos importante, deve-se ressaltar a escolha do público
alvo. Muitas pessoas ainda usam os games como meio de aliviar o stress e garantir boas horas
de diversão (casual gamer), enquanto outros procuram grandes desafios, histórias envolventes
ou simplesmente algo para se dedicar totalmente (hardcore gamer). É importante ter em mente
que um game não vai agradar a todas as pessoas, logo, focar-se em um tipo de público
específico é essencial para o projeto. Por exemplo, um jogo como Tuboflex obtém sucesso em
transmitir sua mensagem para pessoas que procuram diversão rápida, porém, este jogo não
agradaria um jogador que procura algo mais complexo.
49

2.4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os jogos possuem um grande poder de persuasão. A própria game cultura é


resultado do poder de persuasão dos jogos. Mas esse poder vai muito além da game cultura, os
jogos podem ser usados para transmitir ideias, pontos de vista ou até mesmo um ensinamento.
Existem técnicas de persuasão que são usadas, não só em jogos, mas também no
cinema, TV, livros e músicas. A retórica é a principal delas. Através da retórica é possível
estabelecer uma comunicação clara com as pessoas, que podem, ou não, ser persuadidas.
Nos games, existe a play rhetoric, que nada mais é do que a retórica aplicada ao
“jogar”. Os jogos atualmente utilizam a play rhetoric para persuadir os jogadores a continuarem
a jogar. Porém, essa mesma retórica pode ser utilizada para estabelecer uma comunicação entre
os desenvolvedores e os jogadores, a fim de que uma ideia, ponto de vista ou crítica social seja
transmitida ao jogador. O bom controle da play rhetoric é fundamental para uma boa
comunicação com o jogador.
Dentro da play rhetoric existem alguns tipos de retórica que merecem a atenção
dos desenvolvedores, como o playworld e a mechanics. Estes dois tipos de retórica
representam, respectivamente, o contexto (arte, história, efeitos sonoros etc) e a mecânica de
jogo (regras, objetivos e limitações do jogador). A mecânica de jogo é o que diferencia os
games das demais mídias. Além da representação de processos, os jogos são interativos, ou
seja, os jogadores podem vivenciar experiências dentro do jogo, que nunca poderiam na vida
real.
Para o desenvolvimento de um jogo que vise a crítica social, é necessário o
controle da play rhetoric, a fim de que a crítica seja transmitida claramente para o jogador.
50

3. KANE

3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

O capítulo anterior mostrou que a retórica pode ser usada de diferentes formas
dentro dos jogos para persuadir o jogador. Este capítulo irá abordar como será o jogo e como
desenvolvê-lo.

3.2 O JOGO CRÍTICO: KANE

A crítica social, como visto no capítulo anterior, analisa estruturas da sociedade e


as expõe de forma clara através da retórica. Cabe à população decidir se a crítica é algo válido
ou não.
Para este trabalho, o tema a ser criticado é a manipulação das mídias de massa,
em especial, a televisão. A escolha deste tema específico se deve ao fato de que, com o
surgimento de mídias alternativas, é possível identificar facilmente como vários canais de
televisão manipulam e omitem fatos que ocorrem por todo o mundo.
Devido ao tema, foram assistidos um filme e um documentário relacionados à
manipulação midiática: Cidadão Kane (1941) e Muito Além do Cidadão Kane (1993). O
primeiro, conta a história de Charles Foster Kane, um menino pobre que acaba se tornando um
magnata do jornalismo e um dos homens mais ricos do mundo. Neste filme surgiu uma das
frases mais famosas do cinema: “As pessoas vão pensar o que eu disser para elas pensarem”.
O segundo filme, um documentário sobre a história de uma emissora de TV
brasileira, mostra como a mesma manipulou e enganou a população ao longo dos anos. O
documentário foi banido no Brasil.
Com base nestes filmes foi decidido o nome do jogo: Kane.
51

Kane usará a play rhetoric para tentar transmitir a crítica social aos jogadores. É
importante notar que a retórica será utilizada tanto para transmitir a mensagem, quanto para
estimular o jogador a continuar jogando. A mistura destas duas abordagens pode gerar conflitos
em alguns momentos, onde a transmissão da crítica deverá ser “ocultada” ou “diminuída”, a fim
de estimular ou manter o jogador atento e curioso sobre o jogo.
Para este trabalho será desenvolvida uma versão demonstrativa do jogo, com
algumas das funcionalidades da versão final.
Mais detalhes sobre a história, jogabilidade, regras, requisitos e etc estão
presentes no documento (GDD) no anexo A ao final deste trabalho.

3.3 XNA

O framework escolhido para o desenvolvimento foi o Microsoft XNA 4.0.


O XNA é um framework para desenvolvimento de jogos. Atualmente, está na
versão 4.0 e possibilita o desenvolvimento de jogos para as plataformas PC, Xbox 360 e
Windows Phone 7.
Outros programas poderiam ser utilizados no desenvolvimento de Kane, como o
Unity 3D, Construct 2 e diversos outros softwares disponíveis na internet. Porém, alguns
fatores favoreceram para a escolha do XNA: além de ser um software gratuito, o autor deste
trabalho possui um conhecimento prévio da ferramenta. Isto significa que o tempo que seria
gasto para aprender outra ferramenta será gasto no desenvolvimento do jogo.
Este trabalho também possui o objetivo de aprimorar os conhecimentos do autor,
para isto, o jogo será construído do zero, ou seja, nenhuma biblioteca externa será utilizada.
Toda a física, inteligencia artificial, sistema de menus, troca de telas e etc serão desenvolvidas
especialmente para o aprendizado. É importante notar que o XNA possui dezenas de bibliotecas
que facilitam muito o desenvolvimento de um jogo, porém as técnicas e algoritmos existentes
nestas bibliotecas acabam sendo ignorados pelos desenvolvedores, que simplesmente as
utilizam sem entender o seu funcionamento, o que fugiria do propósito do aprendizado.
XNA utiliza a linguagem de programação orientada a objeto C#. Duas classes
são criadas ao iniciar um novo projeto: Program.cs e Game1.cs. A classe Program é
responsável por iniciar a execução do jogo, esta classe só é executada uma vez durante o
processo de um game.
52

A classe Game1 é responsável pelo game loop, ou seja, é aqui onde a lógica do
jogo deve ser inserida (IA, métodos para desenhar, etc). Kane será desenvolvido a partir destas
duas classes.
3.4 Desenvolvimento

Após o desenvolvimento conceitual do jogo (GDD), deve-se definir como será o


desenvolvimento na ferramenta escolhida.
Estima-se que o jogo necessite de 10 classes. Também foi definido que cada fase
do jogo será representada por uma classe. Logo, existirão, aproximadamente, 16 classes no
projeto (10 classes normais + 4 “classes-fase” + 2 classes standard: Program e Game1).
A seguir, uma tabela com as classes que terão de ser criadas para o projeto,
assim como as suas funções(com exceção das classes que representam fases).

Nome Descrição
Camera.cs Controla a câmera do jogo, será mostrado na
tela o ponto em que a câmera estiver
“olhando”. A posição da câmera está
relacionada com a posição do jogador, logo,
ao se mover para alguma direção, a câmera irá
acompanhá-lo. É nessa classe que é calculado
o parallax scrolling.
Casas.cs Representa qualquer estrutura que o jogador
possa entrar, tanto a parte interna quanto a
externa.
Controle.cs Representa o controle remoto. Esta classe
posiciona e verifica quais botões foram
selecionados. Também armazena a bateria.
HUD.cs É a interface mostrada na tela durante o jogo.
Esta classe é responsável por manter alguns
elementos sempre visíveis na tela,
independente da posição da câmera, tais como
o controle remoto e a barra de energia.
Item.cs Representa os dois tipos de itens presentes no
jogo: bateria e lâmpada.
NPC.cs Representa os NPC's presentes no jogo. Esta
classe também é responsável pela inteligência
artificial dos NPC's.
TV.cs Representa as TV's presentes no jogo. Esta
classe recebe informações da classe Controle.
53

Por exemplo, se o botão “power” do controle


for pressionado a TV deve ligar ou desligar.
Personagem.cs Representa o personagem do jogo: Kane.
Movimentação, visão, score e outros são
tratados e armazenados nesta classe.
Objetos.cs Representa os objetos existentes no jogo,
estáticos ou não. Um objeto estático pode ser
usado como uma barreira ou parede,
impedindo a movimentação do personagem.
Um objeto não estático representa algo que
pode ser movido pelos zumbis.
Sprites.cs Uma das mais importantes classes do jogo.
Esta classe é “pai” de todas as classes
anteriores, com exceção das classes HUD,
Controle e Camera.
É aqui que estão presentes os métodos de
detecção de colisão e métodos para desenhar
os sprites na tela. Esta classe também é usada
para representar elementos do cenário que não
possuem nenhum tipo de interação com o
jogador.
Quadro 1: Classes do jogo

3.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Kane é um jogo de plataforma 2D que tentará criar uma crítica social utilizando
a play rhetoric. Este capítulo mostrou o conceito do jogo e quais ferramentas serão usadas no
desenvolvimento do mesmo.
Mais uma vez, é importante lembrar que todas as informações contidas neste
capítulo são referentes à versão demonstrativa do jogo, podendo haver alterações na versão
final.
54

4 RESULTADOS

4.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Este capítulo tem como objetivo mostrar como a play rhetoric foi aplicada ao
jogo desenvolvido e discutir os resultados obtidos.

4.2 A Play Rhetoric em Kane

A play rhetoric envolve desde elementos visuais e sonoros até a representação de


processos. Em Kane, a retórica foi utilizada em várias formas, a fim de criar a crítica.
O primeiro elemento da play rhetoric a ser utilizado em Kane é o playworld. Ao
iniciar um novo jogo, é exibida uma cutscene com imagens e textos que sugerem como somos
manipulados pelas emissoras de televisão. A cutscene inicial é responsável tanto por situar o
jogador no contexto do jogo, como criar uma forma de crítica social. FIG.:11 e FIG.:12 são
imagens retiradas da cutscene de abertura.
A seguir o texto da cutscene de abertura:

“A sociedade contemporânea.
A sociedade do espetáculo.
Onde tudo é televisionado,
tudo o que dá audiência.
E se você bobear, eles vão te dizer o que pensar,
o que fazer, o que comer e o que falar.
Mas isso não importa...
desde que 'tenhamos a nossa dose diária de entretenimento barato'.
Uma realidade falsa.
E quando eu os vejo... são todos zumbis!”
55

Figura 11 – Introdução: pessoa assistindo TV


Fonte: o autor

Figura 12 – Introdução: pessoas se transformando em zumbis


Fonte: o autor

Outro elemento do playworld é a tela de game over (FIG.:13). O jogador perde o


jogo quando a sua visão ficar completamente escura, virando um zumbi.
56

Figura 13 – Tela de game over


Fonte: o autor

Existe mais um elemento no playworld que merece uma atenção especial: o


encerramento da primeira fase; ela é iniciada assim que o jogador alcança a última casa da
primeira fase, a delegacia.
A cutscene de encerramento é muito importante, pois ela apresenta elementos
novos ao jogo: um misterioso “amigo” que parece estar ajudando Kane e a revelação que o
jogador agora é procurado pelas autoridades, considerado um criminoso. FIG.:14, FIG.:15 e
FIG.:16 são imagens retiradas da cutscene de encerramento.
A seguir o texto da cutscene de encerramento:

“A delegacia:
completamente deserta...
Apenas rastros de uma fuga aparentemente desesperada...
Talvez algo tenha saído dos trilhos.
E quando algumas coisas saem do rumo é exatamente quando outras se acertam.
Na fuga, alguém deixou para trás alguns pertences, inclusive um mapa.
Havia uma marcação em um local específico, no centro da cidade.
Mas algo me dizia que aquilo não era um pertence qualquer, muito menos da polícia...
Com a distração olhando para o mapa, mal pude perceber uma outra coisa intrigante:
Eu me tornei uma ameaça para a sociedade...
Mas naquela situação até que isso não era tão mal.
57

Aquela delegacia parecia uma caixinha de surpresas


e pra falar a verdade, isso foi o que mais me surpreendeu:
pilhas, parafusos, ferramentas, fios...
Parecia intencional... a ironia pairava no ar daquele lugar.
Mas toda aquela bagunça teve um bom resultado...”

Figura 14 – Encerramento: mapa da cidade


Fonte: o autor

Figura 15 – Encerramento: “Procurado por atentado contra a segurança pública”


Fonte: o autor
58

Figura 16 – Encerramento: as ferramentas foram utilizadas no controle?


Fonte: o autor

O encerramento cria um certo mistério a respeito dos acontecimentos do jogo, a


história se mostra mais profunda do que o jogador imaginou. A cutscene de encerramento
também usa a retórica de modo convencional, ou seja, é utilizada a fim de manter o jogador
atento ao jogo para que ele continue jogando.
Apesar do playword ser utilizado em Kane, a principal forma de retórica
presente no jogo é por meio de processos: procedural rhetoric.
Existem três processos principais em Kane que criam algum tipo de retórica. O
primeiro é um processo bem comum no jogo: a transformação das pessoas em zumbis. Este
processo é simples e só necessita de dois elementos: uma TV ligada e um NPC qualquer. Ao se
aproximar de uma TV ligada, o NPC automaticamente se transforma em um zumbi (FIG.:19 e
FIG.:20).
O segundo processo está diretamente ligado ao anterior: utilizar o controle
remoto (FIG.:17 e FIG.:18).
Ao utilizar o controle remoto, o jogador consegue controlar os zumbis, ou seja,
se o jogador pressionar o botão de pause, os zumbis também irão parar e assim por diante.
Nota-se que, para pode utilizar o controle remoto, o jogador deve estar próximo a uma
televisão.
59

O terceiro e último processo representa a derrota do jogador (FIG.:21 e


FIG.:22). Se o jogador ficar próximo ao raio de alcance de uma televisão ligada, sua visão
começará a escurecer.
Por trás dos três processos descritos, existe uma mensagem (crítica) sendo
transmitida ao jogador: se uma pessoa assistir televisão, ela se transformará em um “zumbi” e
poderá ser manipulada. E mesmo que você seja “imune” à televisão, com o tempo, também
poderá ser afetado de alguma forma.

Figura 17 – Zumbi sendo controlado por uma TV


Fonte: o autor
60

Figura 18 – Zumbi sendo controlado por uma TV (2)


Fonte: o autor

Figura 19 – TV desligada: o zumbi se transforma em uma pessoa normal


Fonte: o autor
61

Figura 20 – TV desligada: o zumbi se transforma em uma pessoa normal (2)


Fonte: o autor

Figura 21 – A TV pode diminuir a sua visão do mundo


Fonte: o autor
62

Figura 22 – A TV pode diminuir a sua visão do mundo (2)


Fonte: o autor

A versão demo possuirá apenas os elementos citados anteriormente. Uma versão


completa do jogo terá outros elementos de play rhetoric que realizarão, também, algum tipo de
crítica à televisão ou ao comportamento das pessoas em relação à mesma.

4.3 EXPLICAÇÕES GERAIS SOBRE O CÓDIGO

4.3.1 Game1 e a criação do playworld

A versão demonstrativa desenvolvida para este trabalho possui cerca de 3545


linhas de código divididas em 16 classes. O grande número de linhas se deve, em partes, aos
vários atributos declarados em algumas classes.
A principal classe do jogo é a Game1. Esta classe é responsável pelo sistema de
troca de telas, menu inicial, escolha de idioma, mudança de fases, fim de jogo e outras. O seu
funcionamento é baseado na variável inteira “estado” conforme FIG.:23.

Figura 23 – Game1.estado
Fonte: o autor
63

O estado do jogo mudará de acordo com a variável “estado”. Por exemplo, se o


estado for 2, quer dizer que o jogador está jogando a primeira fase, se for 41, o jogador está
assistindo ao encerramento da terceira fase e assim por diante.
Um switch é responsável por verificar o valor de “estado” e selecionar a ação
correta. A FIG.:24 demonstra como é iniciada a primeira fase, ou seja, estado igual a 2:

Figura 24 – Inicio da fase 1


Fonte: o autor

No código acima, “fase1” é um objeto que representa a primeira fase, ele é


instanciado no método construtor da classe Game1.
64

É importante notar que “fase1” é instanciado assim que o jogo é compilado,


porém ele só é acionado quando “estado” for igual a 2.
Como dito anteriormente, as fases são representadas por classes. Ao instanciar
um objeto da classe Fase1, o cenário é automaticamente gerado: todas as casas, itens, sprites,
personagem e etc são posicionados em seus devidos lugares. Para gerenciar estes elementos,
foram criadas listas dos objetos necessários. Também é criado um objeto HUD e uma Camera
para definir a câmera e os elementos do HUD.

Figura 25 – Principais atributos da classe Fase1


Fonte: o autor

Na FIG.:25, é possível ver a definição dos objetos “camera”, “kane” e “Hud”.


Todos eles devem ser instanciados sempre que uma fase se iniciar.
Também nota-se cinco listas. A criação das listas foi uma solução encontrada
para um problema que o próprio XNA possui: a falta de uma interface gráfica. Devido ao
tempo, não foi possível implementar uma interface gráfica para auxiliar no desenvolvimento, o
que obrigou a criação de listas manualmente. Para exemplificar melhor: caso uma interface
gráfica existisse, ao arrastar um sprite para a tela, todas as suas características (coordenadas,
sprite, tamanho, rotação, etc) seriam automaticamente inseridas na lista, não havendo a
necessidade de, manualmente, inserir todos os valores no momento de instanciar o objeto. Isto
é, no método construtor da classe Fase1, deve-se instanciar todos objetos presentes no jogo com
suas respectivas coordenadas. Por exemplo, se a fase possuir quatro casas, no construtor
deverão ser instanciados os objetos casas[0], casas[1], casas[2] e casas[3], cada um com a suas
respectivas características.
A classe Casas também merece uma atenção especial, pois é nela que estão
armazenados os puzzles. Assim como é feita a instanciação das listas na classe Fase1, cada
instância de Casas também possui listas de objetos que devem ser instanciados com valores
específicos, conforme a FIG.:26.
65

Figura 26 – Listas da classe Casas


Fonte: o autor

É de grande importância que todas as coordenadas dos objetos estejam corretas


para que os puzzles funcionem corretamente. Muitos puzzles são baseados nas distancias de
alguns objetos. Outro ponto é que cada casa possui uma arte única que se adapta ao respectivo
puzzle.
Com isso, o playworld está parcialmente definido, ou seja, as imagens, sons,
cutscenes, textos foram todos definidos e estão prontos para a interação com o jogador.

4.3.2 Física e Inteligência Artificial

Tanto a física quanto a inteligencia artificial presentes no jogo são bem simples.
Isto se deve, um pouco, ao fato de que não foi utilizada nenhuma biblioteca externa para
auxiliar nestes pontos. Apesar da simplicidade, os dois elementos funcionam bem e cumprem o
seu propósito.
Começando pela física presente em Kane.
Existem três classes que interagem entre si e possuem algum tipo de física:
Objetos, NPC e Personagem. Todas estas classes possuem a sua própria força de gravidade
independente, que atua quando o objeto não está colidindo com o chão (que é representado por
uma ou mais, instancias de Objetos).
É importante notar que a classe Objetos possui dois estados: estático e não-
estático. Objetos estáticos são imóveis e não são afetados por nenhuma força, o oposto dos
objetos não-estáticos.
Em cada uma das três classes a verificação é feita de uma forma diferente, mas o
conceito básico é: percorrer a lista onde estão armazenados os objetos que representam as
partes “andáveis” (chão, plataformas, etc) e verificar uma colisão com o objeto que está caindo.
66

A FIG.:27 é um trecho da classe Objetos que verifica se o objeto está caindo ou


se colidiu com alguma parte andável.

Figura 27 – Verifica se o objeto caiu


Fonte: o autor

A colisão é verificada através do método “corpo()” que retorna a área de colisão


da respectiva sprite.
Além de cair, objetos também podem ser empurrados por zumbis. Esta é uma
regra do jogo: o personagem não consegue arrastar os objetos móveis, só os zumbis conseguem.
Ao colidir com algum objeto móvel, o jogador será barrado e não conseguirá
prosseguir naquela direção. Se um zumbi se colidir com um objeto móvel, ele irá empurrar o
mesmo.
A FIG.:28 mostra o código que está incluído na classe Objetos e é responsável
por mover um objeto não estático quando um zumbi entrar em contato.
67

Figura 28 – Verifica algum zumbi está empurrando um objeto


Fonte: o autor

Sobre a inteligência artificial, somente a classe NPC possui algum tipo de


comportamento “inteligente”, isso se traduz em alguns comportamentos apresentados pelos
npc’s.
Como definido no GDD, existem dois tipos de zumbis na primeira fase: walkers
e seguidores. Os seguidores vão na direção da TV e param de se movimentar assim que chegam
o mais próximo possível, enquanto os walkers continuam andando independente da
proximidade da TV. A movimentação dos zumbis seguidores é controlada por uma estrutura IF
que compara a posição do zumbi com a posição da TV conforme demonstra a FIG.:29.
68

Figura 29 – IA zumbi seguidor


Fonte: o autor

Os npc's também conseguem detectar beiradas, evitando assim que caiam das
bordas das plataformas. Existe um algoritmo para esta verificação que é um pouco mais
complexo do que os anteriores.
O npc verifica, a cada loop, se a plataforma em que esta andando acabou, ou
seja, quando encontrar uma beirada. Neste ponto, ele também deve verificar se existe outra
plataforma que a continuação do movimento naquela direção, caso não exista nada, o npc volta
pelo caminho de onde veio. O código pode ser visto na FIG.:30.
69

Figura 30 – IA movimento
Fonte: o autor
70

4.4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este capítulo mostrou como foi desenvolvido o jogo. Algumas telas foram
mostradas, assim como códigos.
Devido ao grande número de processos e linhas de código presentes no projeto,
somente os elementos mais importantes foram apresentados neste capítulo. Trechos de código
básicos foram ignorados, como por exemplo códigos para desenhar sprites na tela,
instanciamento de objetos, carregamento de sprites e sons. Processos básicos como navegação
em menus, movimentar o personagem e outros também não foram abordados.
Link para download da versão demonstrativa:

• https://www.dropbox.com/s/7g0mg6ppqyyr1tp/Kane.zip
71

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Alguém pode considerar uma ideia maluca, ou até mesmo estranha, usar jogos
como instrumento de crítica social. Mas quem diria que, no início do século passado, aqueles
filmes de comédia muda, em preto e branco, poderiam se tornar meios tão populares de crítica
social? Filmes como Network (1976), 1984 (1984), The Truman Show (1998), The Matrix
(1999), Hotel Rwanda (2004), Idiocracy (2006) e muitos outros, são aclamados e discutidos até
hoje, em rodas de amigos e trabalhos acadêmicos.
Pensar em games como instrumento de crítica social, não é nada mais do que
uma evolução natural, que ocorre com o amadurecimento de todo tipo de mídia.
O objetivo principal deste trabalho foi desenvolver um jogo que realize uma
crítica social utilizando os conceitos e recursos estudados nos capítulos iniciais.
O primeiro capítulo é uma introdução ao mundo dos games com uma abordagem
diferenciada, que visa mostrar como os jogos foram usados no passado de diferentes maneiras e
como eles podem fazer (e fazem) a diferença na vida de algumas pessoas.
O segundo capítulo abordou a crítica social nos games, que só é possível graças
ao grande poder de influência que os jogos possuem, como discutido no capítulo um. Com
isso, a play rhetoric surge como um meio de realizar a crítica social.
A play rhetoric foi aplicada com sucesso em Kane, existem processos que
adaptam a sua mecânica à critica social, assim como textos e imagens que à fazem.
Apesar da play rhetoric ter sido amplamente utilizada ao longo do
desenvolvimento do projeto, não existe nenhuma garantia de que todos os jogadores irão
compreender as mensagens que o jogo tenta transmitir. Como discutido nos capítulos passados,
a experiência de jogo pode variar de jogador para jogador, elementos como o tipo de jogador,
fator híbrido, estado de espírito, local, personalidade e outros, influênciam no entendimento do
jogo. Mas este é um problema previsto desde o início do projeto. Sendo assim, Kane é um jogo
que muitas pessoas podem jogar sem ao menos perceber a crítica social.
Também é importante notar que nem toda a crítica foi transmitida explicitamente
para o jogador, em alguns casos ela é mais sutil e pode até mesmo gerar diferentes
interpretações.
72

Este trabalho também apresentou tanto a história dos jogo como a game cultura.
Além de ser uma referência para a play rhetoric.
Com isso é possível concluir que o jogo desenvolvido atinge o seu objetivo ao
criar uma crítica social utilizando a play rhetoric.
Quanto ao desenvolvimento do jogo, foram encontrados alguns obstáculos, mas
nenhum deles prejudicou o andamento do projeto:

• Limitações do XNA: a falta de um editor gráfico foi o principal problema enfrentado


durante o desenvolvimento. O grande tempo perdido testando posições para os objetos
poderia ter sido usado para outras finalidades; pouca compatibilidade com vídeos e
arquivos de som; travamentos sempre que um vídeo entra em looping.
• Criar tudo do zero: existem dezenas de bibliotecas na internet que poderiam ter
auxiliado muito no desenvolvimento do jogo. A principal dificuldade encontrada foi na
simulação física, e o XNA possui ótimas bibliotecas de física na internet. O jogo
poderia ter ficado muito mais interativo e visualmente bonito com uma física melhor.
• Músicas e efeitos sonoros: todas as músicas e efeitos sonoros tiveram que ser
encontrados na internet. Um dos grandes problemas foi procurar músicas e efeitos
sonoros que se adaptassem ao jogo e possuíssem licença livre para uso. Mostrando
como é importante um Sound Designer no time de desenvolvimento.
• Complexidade do código: apesar de não possuir nenhum algoritmo complexo, o projeto
está razoavelmente grande, o que gerou uma certa confusão, principalmente no
momento de corrigir bugs.

Apesar destes obstáculos, o uso do XNA se mostrou bem efetivo, uma vez que
todo o código foi feito sem grandes dificuldades. A predefinição das classes e a criação do
GDD ajudaram muito durante o desenvolvimento do jogo. Testes de mesa também foram feitos
exaustivamente para a criação dos puzzles.
O primeiro protótipo de Kane foi desenvolvido em um mês juntamente com
todas as funcionalidades e mecânica de jogo. A partir daí, as fases foram montadas e a arte
provisória substituída pela arte original, criada especialmente para o jogo.
Durante o desenvolvimento de Kane muito conhecimento foi adquirido
principalmente em algumas áreas:
73

• Programação;
• Organização e documentação de projeto, especialmente jogos;
• Game Design;
• Level Design.

Sendo assim, este trabalho também cumpriu o seu objetivo em aumentar os


conhecimentos técnicos sobre desenvolvimento de jogos.
Para trabalhos futuros pretende-se terminar o jogo Kane completamente e
publicá-lo em algumas plataformas a serem decididas. Também pretende-se adicionar algumas
bibliotecas para melhorar a física e a interação do jogo, assim como aplicar algumas técnicas
como o uso de threads para melhorar o desempenho do jogo. Por último, mas não menos
importante, pretende-se reduzir o tamanho dos arquivos de vídeo, que representam grande parte
do tamanho do jogo.
Durante o desenvolvimento deste trabalho alguns assuntos abordados se
mostraram muito interessantes, assim como ideias que merecem um estudo mais aprofundado.
A seguir uma lista de possíveis trabalhos futuros que podem ser desenvolvidos a partir deste:

• Criar emoções através de códigos de computador: Como um filme ou música, um jogo


também pode criar uma emoção. Infelizmente, a indústria atual não dá muita
importância para este grande potencial que os jogos possuem. É possível criar jogos que
façam as pessoas se sentirem bem. Atualmente a empresa Thatgamecompany produz
jogos deste tipo, onde a sua principal filosofia é criar bons sentimentos nos jogadores.
Mas as emoções não precisam ser geradas necessariamente a partir de jogos, existe um
mundo de possibilidades a ser explorado!
• Estudo da game cultura mais aprofundado: justamente por ser tão ampla, a game cultura
se mostra um campo de estudo muito vasto e bem diversificado. Psicólogos,
antropólogos e historiadores podem se envolver em diversos assuntos.
• Desenvolvimento de outros jogos críticos: com temas diferentes, estilos diferentes, para
públicos diferentes. Também seria importante ver a reação da comunidade gamer frente
a este tipo de jogo.
74

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TUBOFLEX. Disponível em: <http://www.molleindustria.org/en/tuboflex/>. Acesso em: 20


jun. 2012.
78

ANEXOS

ANEXO A

Game Design Document


V1.0

Alisson Diego Carneiro


Carlos Henrique Nascimento
79

1. VISÃO GERAL

1.1 Conceito

Salvar as pessoas controladas pelas TV's.

1.2 Sinopse

Em uma cidade onde as pessoas são controladas por suas televisões e transformadas em
zumbis, algumas pessoas, por algum motivo, são menos afetadas pelas TV's. Kane, um jovem
rapaz, é uma delas. Ele deve usar o seu controle remoto para desligar o máximo de TV's
possíveis enquanto segue misteriosas pistas deixadas por alguém. Ao seguir as pistas, Kane
chega na torre de transmissão de sinal da cidade e percebe que deve desativá-la para salvar as
pessoas da cidade.

O nome Kane foi inspirado em dois filmes: Cidadão Kane e Além do Cidadão Kane. O
primeiro conta a história de um magnata que controla um jornal de muito sucesso. O segundo, é
um documentário a respeito da emissora de televisão Rede Globo.

2. PRODUTO

2.1 Público

Kane é um jogo de plataforma 2D com elementos de puzzle e possui uma história um pouco
mais elaborada do que outros jogos do mesmo estilo. O jogo também tem como objetivo
realizar uma crítica social. Levando estes fatos em consideração, o público alvo de Kane pode
variar desde pessoas que procurem puzzles desafiadores até aqueles que prezam por uma
história madura e envolvente. Por ser uma crítica social, é recomendado apenas que pessoas
acima de 16 anos joguem, pois estes já possuem um nível de maturidade suficiente para
interpretar e entender a mensagem do jogo, mas isto não impossibilita que crianças e
adolescentes se divirtam com os puzzles presentes no jogo.
80

2.2 Plataforma

A versão de demonstração do jogo será lançada para a plataforma PC com sistema operacional
Windows. Posteriormente, a versão completa do jogo será lançada também para Android, IOS,
Windows Phone 7 e WEB.

2.3 Requisitos do Sistema

Requisito Mínimo Recomendado


Sistema Operacional Windows Vista Windows 7
Processador 2.0ghz Single core 2.0 Dual core
Memória RAM 1GB 2GB
Espaço em disco 1GB 1GB
Placa de Vídeo 64MB com Pixel Shader 2.0 64MB com Pixel Shader 2.0
Software .Net Framework 4.0 .Net Framework 4.0
DirectX 9.0c DirectX 9.0c
Hardware Teclado/Mouse Teclado/Mouse
Xbox 360 Controller
Opcionais - -
Quadro 1: Requisitos do sistema

2.4 Diferenciais

O estilo plataforma 2D é bem comum no mercado de games, assim como jogos que misturam
elementos puzzles em suas fases. Porém, o grande diferencial de Kane é o seu objetivo como
um jogo. Kane é um jogo que visa a crítica social, sendo assim, é um jogo que tenta estabelecer
um equilíbrio entre a diversão e um assunto sério como a manipulação midiática.
O jogo usa técnicas de retórica(procedural, visual, textual, sonora) a fim de criar um ambiente
que estimule o pensamento crítico por parte do jogador. Vários processos presentes no jogo
possuem significados "ocultos" que auxiliam na crítica.
81

3. GAME DESIGN

3.1 Regras

O jogo se passa em uma cidade e é dividido em quatro fases: o subúrbio, o centro, o prédio e a
torre. O objetivo principal do jogador é seguir as pistas e ir em direção à torre, onde deve
desativá-la.
O personagem será controlado pelo jogador em cada uma das quatro fases. Em cada fase,
existirão casas, predios, estabelecimentos ou salas nos quais Kane poderá entrar. Ao entrar,
Kane deverá resolver puzzles para desligar todas as televisões do local, a fim de libertar as
pessoas. Para desligar as TV's, o jogador deverá usar um controle remoto que Kane possui.
Quanto mais TV's o jogador desligar, maior será o seu score final.

Existem três elementos principais no jogo: as TV's, as pessoas e o controle remoto que o
personagem possui.
Toda TV, quando ligada, possui um raio de alcance, se uma pessoa entrar neste raio de alcance,
ela é transformada em um zumbi. O jogador deve desligar estas TV's a fim de transformar os
zumbis em pessoas normais. Para desligar as TV's, o jogador deverá usar o controle remoto que
Kane possui, este controle também tem um raio de alcance, logo, somente as TV's que
estiverem dentro deste raio de alcance podem ser manipuladas.

Além de ligar e desligar as TV's, o controle possui outras funcionalidades como:

– Pause e Play: se o jogador pressionar o botão de Pause, todos os zumbis que estiverem
no raio de alcance da TV irão parar. Se jogador pressionar Play, eles irão continuar o
seu movimento.
– Aumentar e diminuir volume: aumentar o volume irá aumentar o raio de alcance da TV,
diminuir o volume irá diminuir o raio de alcance da TV.
– Avançar e retroceder: o botão avançar irá fazer com que os zumbis andem para a direita,
o botão retroceder fará com que os zumbis andem para a esquerda.
– Mudar de canal: ao mudar de canal, os zumbis mudam a cor de suas roupas.
82

O controle remoto também possui uma barra de energia, sempre que uma funcionalidade do
controle for utilizada, a energia irá diminuir. Se a energia chegar a zero, o controle não poderá
ser utilizado. Para evitar que isto ocorra, o jogador deverá usar o controle com sabedoria e
coletar itens, espalhados pelas fases, que recuperam a carga do controle.

Alguns objetos podem ser movidos somente por zumbis, então, o jogador deverá utilizar as
funcionalidades do controle remoto, para controlar as ações dos zumbis, a fim de resolver
puzzles. Para descobrir qual objeto é móvel o jogador deve procurar por objetos que bloqueiam
o seu caminho. Estes objetos podem, ou não, ser movidos pelos zumbis. O único modo de
descobrir é tentando.

Em alguns casos, os zumbis podem entrar no raio de duas TV's ao mesmo tempo, quando isto
ocorrer, a segunda TV será ignorada pelo zumbi.

Quando o personagem estiver no raio de alcance da TV, o campo de visão do jogador começará
a diminuir. Se o campo de visão for nulo e o jogador não conseguir enxergar mais nada, ele vira
um zumbi e perde o jogo.

Ao entrar em contato com zumbis, o jogador perde velocidade, dificultando a movimentação do


mesmo.

Por fim, existe um menu de pause que pode ser acionado a qualquer momento do jogo. Neste
menu, há uma opção que só é liberada quando o jogador está dentro de uma casa: Restart
Puzzle. Esta opção irá recomeçar o puzzle atual, permitindo que o jogador refaça o puzzle caso
tenha feito algum movimento errado. A resolução dos puzzles será baseada neste item, uma vez
que cada puzzle terá que ser jogado algumas vezes para que o jogador entenda o que deve ser
feito, sendo assim, o botão Restat Puzzle é uma feature fundamental para o jogo e deve ser
usado sempre que necessário.

3.2 Controles

Na versão para PC o jogador poderá usar o teclado e mouse, ao mesmo tempo, para jogar.
O mouse é responsável pelos movimentos do cursor.
A tabela abaixo exemplifica os comandos do teclado
83

Teclado Ação no Jogo


A Andar para esquerda
D Andar para direita
W Entrar e sair das casas
S Olhar para baixo
ESC Menu de Pausa
Quadro 2: Controles

3.3 Interface e HUD

Figura 1: Fluxograma da interface


84

O fluxograma acima demonstra o funcionamento do sistema de menu do jogo. Durante o jogo,


o jogador pode acessar apenas o Menu de Pausa e, se desejar, voltar para o menu principal.
Fazendo isto todo o progresso do jogo atual será perdido.

Figura 2: Menu Inicial

No HUD o jogador terá acesso a algumas informações necessárias durante o jogo.


85

Figura 3: Tela do jogo, demonstração do HUD

Área Descrição
Superior esquerda Barra de energia do controle
Inferior Controle Remoto
Quadro 3: Elementos do HUD

3.4 Habilidades do Personagem

As habilidades do personagem são baseadas no controle remoto. No início do jogo, somente o


botão de ligar e desligar estará disponível. Ao final de cada fase outros botões são liberados e o
controle é aprimorado.

Figura 4: Controle Remoto da primeira fase.


86

Figura 5: Controle Remoto completo.

Para que o personagem possa utilizar qualquer uma das habilidades, deve existir alguma TV no
raio de alcance do controle remoto. Caso mais de uma TV esteja no raio do controle, todas elas
serão afetadas.
Ao se aproximar de uma TV, a luz do controle irá piscar e como um "bip" alertará o jogador.

Sempre que uma habilidade é usada, a energia total do controle remoto diminui uma unidade,
se a energia chegar a zero, o jogador não poderá usar nenhuma habilidade.
Abaixo uma tabela com a descrição das habilidades:

Botão Fase Efeito


Power Primeira Liga ou desliga a TV
Aumenta volume Segunda Aumenta o raio de alcance da TV
Diminui volume Segunda Diminui o raio de alcance da TV
Pause/Play Terceira Pausa ou “Despausa” a TV. Consequentemente, paralisa
ou “desparalisa” os zumbis.
Avançar canal Final Avança para o próximo canal. Consequentemente a
roupa do zumbi muda de cor.
Retroceder canal Final Retrocede para o canal anterior. Consequentemente a
roupa do zumbi muda de cor.
Quadro 4: Botões do Controle e feitos.
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3.5 Itens

Existem dois itens no jogo: a bateria e a lâmpada.

• Bateria: A bateria carrega a energia do controle remoto

Figura 6: Bateria.

• Lâmpada: A lâmpada faz com que a visão do jogador volte ao normal, quando estiver
obscurecida.

Figura 7: Lâmpada.

4. PERSONAGENS

4.1 Kane

Kane é um homem comum, mas é desconfiado com as coisas e acredita que tudo é uma
possível teoria da conspiração. Com os eventos decorrentes da chegada da emissora de TV na
cidade, ele decide investigar o que está acontecendo e descobre que sua intuição estava correta.
Kane utiliza um controle remoto universal para controlar as TV's que encontra pelo caminho.

Figura 8: Kane correndo.


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Figura 9: Kane parado.

Figura 10: Kane pulando.

4.2 NPC's

Todos os NPC's possuem dois estados: Zumbi ou Normal.


Quando um NPC entra no raio de uma TV ligada, ele se transforma em um zumbi. Se o NPC
sair do raio da TV, ele volta a ser uma pessoa normal.

Na forma de zumbis, NPC's se comportam de formas diferentes. Zumbis que vão na direção das
TV's são chamados Seguidores. Zumbis que andam de um lado para o outro são chamados de
Walkers.
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Figura 11: NPC seguidor normal.

Figura 12: NPC seguidor zumbi.

Figura 13: NPC walker normal.

Figura 14: NPC walker zumbi.

Outros npc's e inimigos existirão na versão final do jogo.


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5. LEVEL DESIGN

5.1 Descrição

Figura 15: Fluxograma da estrutura de uma fase.

O fluxograma acima representa o processo de jogar e concluir uma fase. Note que, ao entrar em
uma casa, o jogador pode recomeçar o puzzle a qualquer momento, pelo menu de pausa.

5.2 Fases

Nome Qtd. de casas Qtd. de TV's Qtd. de baterias Qtd. Lâmpadas


Subúrbio 7 9 2 1
Quadro 5: Estrutura da fase 1.

Tipo de NPC Quantidade


Walker 6
Seguidor 4
Quadro 6: Tabela de inimigos.
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A fase do subúrbio irá apresentar a mecânica básica, assim como introduzir a história e o
contexto ao jogador.

Fase 2 e Fase 3 ainda não foram definidas.

6. HISTÓRIA

Em uma pacata cidade do interior as pessoas vivem suas vidas tranquilamente. Porém tudo está
prestes a mudar: uma nova emissora de TV está para inaugurar uma gigantesca torre de
transmissão no centro da cidade, prometendo entretenimento, diversão e informação como
nunca antes visto pela população da pequena cidade. Mas nem todos os moradores estão
excitados com a novidade. Kane, um jovem rapaz, é uma dessas pessoas.

No esperado dia da inauguração da torre, algo estranho acontece e, assim que a torre é ativada,
todas as pessoas que estão em frente à alguma TV são transformadas em zumbis!
Por alguma razão Kane é menos afetado pelas TV's.

Assim, começa a sua jornada para resolver esse mistério, que fica mais confuso quando Kane
encontra um estranho controle capaz de controlar qualquer TV.
Kane deve seguir as misteriosas pistas e tentar descobrir o que está acontecendo em sua cidade
e quem é o dono do controle.

7. ESPECIFICAÇÕES TÉCNICAS

O jogo será desenvolvido utilizando o seguinte ambiente de programação:

• PC com Windows (7 ou 8)
• Visual Studio 2010
• .NET Framework 4.0
• XNA Framework 4.0
• Paint .NET(edição de imagem)
• RealWorld Paint(edição de imagem)
• Pencil(edição de imagem)
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• Free Audio Editor(edição de áudio)


• Anvil Studio(edição de áudio)

8. VERSÃO DEMO

A versão de demonstração deste jogo possuirá os seguintes conteúdos:


• A primeira fase do jogo
• Interface e HUD da versão final
• Todos os controles para movimentação do personagem (Teclado/mouse)
• Animações de personagens e inimigos
• Dois tipos diferentes de inimigos (todos com I.A da versão final)
• Sistema de menu
• Sistema para pausar o jogo e opção de reiniciar o puzzle
• Musicas e efeitos sonoros(adaptados para a versão demo)
• Cutscenes de abertura e encerramento da primeira fase(adaptados para a versão demo)
• História adaptada para a versão demo
• Idioma: português.
• Créditos

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