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Marilena Chauí*
Racionalismo determinista
Esse conjunto de aspectos aponta para o núcleo da teoria da história de Marx como um
determinismo econômico no qual, apesar das declarações do próprio Marx, a luta de
classes não é o motor da história, mas um anel numa cadeia causal estabelecida na infra-
estrutura técnico-econômica, visto que as classes são instrumentos nos quais se encarna
a ação das forças produtivas. As classes são atores no sentido teatral do termo; são
agentes inconscientes do processo histórico, mesmo quando têm consciência de classe,
pois, “não é a consciência dos homens que determina seu ser social, mas seu ser social
que determina sua consciência”. O conservadorismo da classe no poder e o
revolucionarismo da classe ascendente estão predeterminados por sua situação na
produção, de maneira que não há lugar para a ação autônoma das massas.
Ora, do ponto de vista da causalidade, essa significação é, de alguma maneira, como que
dada de antemão, predetermiando e sobredeterminando os encadeamentos causais, a
serviço de uma intenção que não é de ninguém. Assim, todo o problema da história está
nessa significação, diversa daquela que é vivida pelos atos determinados dos indivíduos,
irredutível à causação, mas também construindo uma ordem de encadeamentos que,
embora diversa da causal, está inextrincavelmente ligada aos encadeamentos de
causação. Em outras palavras, todo o problema está na diferença e na relação entre a
significação vivida pelos agentes históricos e a significação posta por processos de
causação desprovidos daquela significação. Esse problema está na origem dos mitos, da
tragédia e da crença na Providência. E o marxismo não dá conta dele porque procura
reduzir integralmente o nível das significações ao nível das causações, embora, mais do
que qualquer outra teoria, mantenha a idéia de significação dos acontecimentos e das
fases históricas, afirme a lógica interna do processo e totalize as significações numa
significação do conjunto da história (a produção necessária do comunismo). Assim,
conclui Castoriadis, ao afirmar que tudo deve ser apreendido em termos de causação, ao
mesmo tempo em que deve ser pensado em termos de significação, de sorte que o
imenso encadeamento causal é também um encadeamento de sentido, Marx exacerba de
tal modo os dois pólos que torna impossível pensar racionalmente o enigma da história.