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Resumo
Discute-se de que forma se dava o entendimento da atração gravitacional na teoria de Newton e até o advento
da relatividade geral de Einstein. Explica-se como o surgimento do eletromagnetismo levantou questões à física
newtoniana e conduziu até a relatividade especial. Também se discute as dificuldades de se adequar a gravitação
de Newton a uma formulação relativística e as diversas teorias gravitacionais que surgiram antes de Einstein
apresentar sua ideia de interpretar a gravitação como um fenômeno geométrico.
Abstract
It is discussed how the understanding of gravitational attraction was given in Newton’s theory and until the
advent of Einstein’s general relativity. It is explained how the emergence of electromagnetism raised questions
to Newtonian physics and led to the theory of special relativity. It also discussed the difficulties of adapting
Newton’s gravitation to a relativistic formulation and the various gravitational theories that emerged before
Einstein present his idea interpret gravity as a geometrical phenomenum.
DOI: 10.47083/Cad.Astro.v1n1.31666
damente comprovadas por observações astronô- ção Newtoniana começou a encontrar dificuldades
micas. O trabalho de Kepler explicava o compor- em explicar alguns fatos. Em particular, a órbita
tamento cinemático das órbitas celestes e New- de Mercúrio também se mostrou anômala e, su-
ton deu um passo a mais, elucidando que a ori- gestões de que causa poderia ser um outro planeta
gem desses movimentos está na força gravitacio- desconhecido, mais próximo ainda do Sol, se mos-
nal. Mais ainda, muitos acreditavam que a na- traram equivocadas. Mas a confiança na gravita-
tureza dos fenômenos terrestres era distinta da- ção Newtoniana era tão grande que o hipotético
quela que governava os astros celestes, e Newton planeta chegou até a receber um nome, Vulcano.
explicou ambos com uma única formulação teó- Assim, a ideia de que a gravitação de Newton pre-
rica, levando-o a chamá-la de Teoria Universal da cisava ser repensada só emergiu depois que uma
Gravitação. nova revolução reformulou as bases conceituais da
Note que as massas utilizadas na expressão (2) física. Essa transformação começou com o eletro-
são as massas inerciais de cada corpo, as mes- magnetismo de Maxwell (1831 1879) e se con-
mas utilizadas na formulação da segunda lei de solidou com a relatividade especial de Einstein
Newton (1). Isso é importante para explicar um (1879 1955).
fato que já havia sido observado alguns anos antes
de Newton, por Galileu (1564 1642). Todos os
corpos são acelerados igualmente em um campo 3 O Eletromagnetismo e o princípio da
gravitacional uniforme. É o que ocorre nas pro- relatividade
ximidades da superfície da Terra, onde podemos
aproximar M e r pela massa e o raio da Terra, James Clerk Maxwell foi outro cientista que
tornando a força gravitacional uma constante, co- marcou a história da física. Seu mais notável
nhecida como força peso (P ), trabalho foi a formulação da teoria clássica do
eletromagnetismo. Em meados do século XIX,
GMT
P = mg, com g = , (3) conhecia-se bem os fenômenos elétricos e magné-
RT2 ticos. Além disso, Faraday já havia demonstrado
onde MT e RT são a massa e o raio da Terra e empiricamente a famosa lei da indução, onde um
g é a chamada aceleração da gravidade na Terra. campo magnético que oscila no tempo produz um
Substituindo a força peso na segunda lei de New- campo elétrico, é o princípio operacional dos gera-
ton (1), vemos que a aceleração produzida é sem- dores elétricos. Mas, apesar da considerável apli-
pre igual a g, independente da massa do objeto cação tecnológica que já tinha na época (baterias,
atraído para o solo, o que é condizente com os geradores, circuitos...), todo esse conhecimento
experimentos. Em outras palavras, massa iner- era, do ponto de vista teórico, apenas qualitativo
cial (resistência a qualquer movimento) e massa e coube a Maxwell a formulação de uma descrição
gravitacional (responsável por produzir atração matemática desses fenômenos.
gravitacional) são assumidas serem quantidades Mais do que uma formulação teórica do ele-
equivalentes. Esta igualdade é conhecida tam- tromagnetismo, Maxwell se apoiou em um dos
bém como princípio da equivalência de Galileu. fundamentos primordiais da ciência para intro-
Outro grande sucesso da gravitação Newtoni- duzir em sua teoria um efeito reverso da lei da
ana está relacionado com a descoberta do planeta indução, ou seja, um campo elétrico variável no
Netuno. Comportamentos inesperados na órbita tempo deve produzir um campo magnético. Sem
de Urano podiam ser explicados como consequên- esse fenômeno, a teoria eletromagnética não es-
cia da influência gravitacional de um planeta des- taria de acordo com o princípio da conservação,
conhecido e nunca antes observado. Usando a te- eternizado nas palavras de Lavoisier: “Na natu-
oria de Newton, pôde-se calcular onde encontrar reza nada se cria, tudo se transforma”. Mais es-
este planeta no céu e, em 1846, foi visualizado em pecificamente, a correção de Maxwell garantia a
telescópio o gigante gasoso Netuno. Pela primeira conservação da carga elétrica.
vez na história, uma previsão puramente teórica O efeito recíproco da lei de indução, introdu-
mostrava a existência de algo que escapava aos zido por Maxwell, mostra que, um campo elétrico
nossos olhos (e telescópios). variável no tempo produz um campo magnético
Entretanto, com o passar dos anos e o aumento também variável no tempo que, por sua vez, pro-
na precisão de medidas astronômicas, a gravita- duz um novo campo elétrico, e assim sucessiva-
mente. O efeito é autossustentável e se propaga recebe esse nome devido ao fato de que, para co-
como uma onda. Previa-se, assim, a existência nhecermos o potencial ', num dado instante de
das ondas eletromagnéticas, mais tarde compro- tempo t, é preciso saber a configuração em que se
vadas com os experimentos do físico alemão Hein- encontra a fonte ⇢e num instante anterior t d/c,
rich Hertz (1857 1894). Descobria-se que ele- onde d é a distância entre a fonte e o ponto onde
tricidade e magnetismo eram, na verdade, duas estamos calculando o potencial. Isso ocorre por-
manifestações de um mesmo fenômeno, o eletro- que a informação no campo eletromagnético viaja
magnetismo, sendo separáveis somente em situa- como uma onda, com velocidade constante igual
ções estáticas. Essa talvez seja a maior unificação a c e, por maior que seja essa velocidade (aproxi-
na física desde a gravitação universal de Newton. madamente 300.000 km/s no vácuo), leva-se um
Mas um ponto mais relevante para a história tempo finito para se percorrer qualquer distância,
que queremos contar está na maneira como a teo- de modo que, o potencial ' sempre depende da
ria de Maxwell possui uma estrutura causal muito configuração de cargas num instante anterior.
bem comportada, ao contrário da mecânica de Não é só o potencial elétrico que funciona de
Newton. Vamos ver essa questão à partir de uma forma temporal "retardada". Estamos frequente-
análise qualitativa das equações destas duas te- mente lidando com esse fenômeno no nosso dia a
orias. O eletromagnetismo de Maxwell pode ser dia. Quando olhamos para um objeto, estamos
inteiramente descrito à partir dos chamados po- enxergando como ele era no passado. Isso por-
tencial escalar e potencial vetor, grandezas que que a luz que sai do objeto demora um tempo
dizem qual é o campo eletromagnético produzido para chegar ao nossos olhos e formar a imagem
por uma distribuição de cargas elétricas. Vamos em nosso cérebro. Esse atraso pode ser muito
nos concentrar apenas no potencial escalar ' mas pequeno, quase imperceptível, mas ele existe e é
as conclusões são as mesmas para o potencial ve- consequência do fato de que a luz se propaga com
tor. Dada uma densidade de cargas ⇢e , o poten- velocidade finita. Estamos sempre olhando para
cial escalar satisfaz a equação dinâmica, o passado e nunca para o presente. Quanto mais
distante está o objeto, mais no passado estamos
1 @2' ⇢e olhando.
r2 ' = , (4)
c2 @t2 "0 Acontece que, a gravitação Newtoniana, na sua
formulação em termos de um potencial gravitaci-
onde r2 é o operador diferencial Laplaciano, en-
onal , relaciona este com a sua fonte geradora,
volvendo derivadas espaciais de segunda ordem.4
uma densidade de massa ⇢m , à partir de uma
Em coordenadas cartesianas assume a forma,5
equação ligeiramente diferente, a saber,
@2 @2 @2
r2 = + + . (5) r2 = 4⇡G⇢m . (6)
@x2 @y 2 @z 2
A expressão (4) é uma equação de onda, o lado es- Note que não há variações temporais na expres-
querdo contem as variações temporais e espaciais são acima. Consequentemente, a solução dessa
do potencial elétrico e o lado direito traz a fonte equação não é um potencial retardado e a teo-
que o produz, a densidade de cargas do sistema. ria diz que a informação no campo gravitacional
A constante c representa a velocidade da luz no deve viajar a uma velocidade infinita. Newton sa-
vácuo e "0 , também uma constante, é a chamada bia desse problema e também se incomodava com
permissividade elétrica no vácuo. A solução dessa a ação à distância da força gravitacional, mas os
equação é conhecida como potencial retardado e sucessos de sua teoria fez com que deixasse para
os futuros cientistas a resolução desse impasse [2].
4
Para o leitor não familiarizado com o cálculo varia- Um segunda contradição entre o eletromagne-
cional, uma derivada é uma medida taxa de variação de
uma certa quantidade. Por exemplo, a velocidade de um
tismo de Maxwell e a teoria da gravitacional de
carro é uma derivada da posição em relação ao tempo e Newton foi ainda mais importante na evolução do
a aceleração é a derivada temporal de segunda ordem da conhecimento acerca da gravitação. A física new-
posição. Na equação (4), leva-se em conta não só a taxa toniana é inteiramente construída sobre o alicerce
de variação temporal do campo (@ 2 /@t2 ) como também
a maneira como ele varia no espaço tridimensional (r2 ).
do princípio da relatividade de Galileu: as leis da
5
As coordenadas x, y e z descrevem as populares di- física devem ser as mesmas independente do refe-
mensões largura, altura e profundidade. rencial a partir do qual são observadas. Posterior-
mente, Newton refinou esse princípio com a iden- o mesmo valeria para a luz mas, diferente de um
tificação de referenciais inerciais e não-inerciais. meio material, que é possível de se detectar de
Nos referenciais inerciais, toda aceleração detec- várias formas, para o eletromagnetismo deveria
tada pode ser associada a uma força cujo agente haver um meio especial apenas para dar suporte à
causador é devidamente identificado (gravitação, propagação das ondas eletromagnéticas. Apesar
atrito, tração e etc). O segundo tipo, os referen- do teor um tanto quanto artificial desse meio, os
ciais não-inerciais, ocorre quando não é possível cientistas deram-lhe um nome, éter, e se esforça-
determinar a origem de uma força para explicar ram para detectá-lo experimentalmente, mas não
uma aceleração e, consequentemente, as leis de houve resultados positivos. Restava, então, uma
Newton não se aplicam.6 Não é difícil concluir questão fundamental para toda a física: ou a teo-
que os referenciais inerciais são aqueles que se ria de Maxwell estava errada, ou a relatividade de
movimentam com velocidade constante, uma vez Galileu era imprecisa, e, consequentemente, isso
que, sob a influência de um movimento não uni- levaria a inconsistências na teoria newtoniana.
forme, um observador deverá associar a qualquer A teoria de Maxwell também trazia resultados
objeto uma aceleração sem causa aparente. bastante precisos, de modo que cientistas como
O ponto chave aqui é que, embora a física seja Henri Poincaré (1854 1912) e Hendrik Lorentz
a mesma entre referenciais inerciais, cada referen- (1853 1928) seguiram na linha da corrigir a re-
cial deve adotar seu próprio sistema de coordena- latividade galileana e, Albert Einstein foi quem
das para descrever um fenômeno observado. As obteve maior sucesso na descrição de como a te-
relações entre as coordenadas de dois referenciais, oria de Newton deve ser modificada.
A e B, são dadas pelas transformações de Galileu, Assumindo-se correto o eletromagnetismo
maxwelliano, com a impossibilidade de se detec-
tA = tB = t, (7) tar o éter, vinha também a conclusão de que a
xA = xB + uAB t, , (8) velocidade da luz é uma constante, independente
do referencial e da fonte que a emite.7 Portanto,
onde uAB é a velocidade com a qual o referen- o novo princípio da relatividade deveria ser alte-
cial B se move em relação à A. Por simplicidade, rado de forma que mantivesse invariante a teoria
consideramos que uAB possui componente na di- de Maxwell e respeitasse a constância da veloci-
reção x apenas e, portanto, as coordenadas y e z dade das ondas eletromagnéticas. Dessa forma,
permanecem as mesmas em cada referencial. A as transformações de Galileu, (7) e (8), dão lugar
equação (7) traduz a hipótese básica da relati- às transformações de Lorentz,
vidade de Galileu na qual o tempo é considerado
absoluto, ou seja, o mesmo para qualquer referen- tB uAB
xB
c2
cial. Por fim, variando (8) com relação ao tempo tA = q , (9)
u2AB
e, sendo uAB constante, obtém-se que ~aA = ~aB 1 c2
e, segundo (1), as forças em cada sistema são as (xB uAB tB )
xA = q . (10)
mesmas, ou seja, a física Newtoniana não muda. u2AB
Em outras palavras, a mecânica de Newton é in- 1 c2
variante sob as transformações de Galileu.
A primeira grande diferença, em relação à re-
Se aplicarmos o princípio da relatividade de
latividade de Galileu, é que o tempo não é mais
Galileu ao eletromagnetismo de Maxwell, a equa-
absoluto, ele depende do referencial tal como a
ção (4) não mais será uma equação de onda.
coordenada espacial. Como já foi dito anterior-
A princípio, isso não representaria um problema
mente, as Leis de Newton devem se adaptar a
pois o mesmo ocorre na física acústica, teoria que
esse novo conceito de relatividade e, tal reformu-
descreve o comportamento do som. A ondas so-
lação, resulta na teoria da relatividade especial de
noras são influenciadas pelo movimento do meio
Einstein.8
material em que elas se propagam e o som só sa-
tisfaz uma equação de onda no referencial em que 7
A velocidade da luz assume valores distintos de-
este meio está em repouso. Poderia-se pensar que pendendo do meio de propagação (vácuo, ar, água...).
Essa propriedade que dá origem ao fenômeno da refração
6
Ainda pode-se ajustar as Leis de Newton de forma quando a luz muda de meio de propagação. Mas, dentro
a manter sua validade para alguns casos de referenciais de um único meio, sua velocidade é constante.
8
não-inerciais através do formalismo de forças fictícias. Neste mesmo número dos Cadernos de Astronomia
Mas se a mecânica clássica estava errada, como o tempo não é mais absoluto, a quantidade que
explicar os sucessos da física Newtoniana? Ocorre permanece invariante sob a transformação de re-
que, até antes da compreensão do eletromagne- ferenciais é dada por,
tismo, a ciência lidava com fenômenos que envol-
viam velocidades muito menores do que a veloci- ds2 = dx2 + dy 2 + dz 2 c2 dt2 . (14)
dade da luz. Nesse limite (uAB ⌧ c), as transfor-
mações de Lorentz se reduzem às transformações Em analogia com o que discutimos no parágrafo
de Galileu, mostrando que a teoria de Newton, na anterior, a invariância de ds sugere que a repre-
verdade, possui um limite de aplicabilidade e, a sentação geométrica natural da relatividade es-
baixas velocidades, ela funciona adequadamente. pecial é um espaço quadridimensional, onde o
tempo faz o papel da quarta coordenada. Devido
a isso, nomeamos essa estrutura de espaço-tempo.
4 O conceito de espaço-tempo Em notação tensorial, escrevemos,
muito importante na construção de grandezas ci- a constância da velocidade da luz implica na con-
nemáticas, como a velocidade. dição de normalização da quadrivelocidade,
A teoria da relatividade especial revolucionou a
dxµ dx⌫
física no início do século XX, evidenciando a natu- ⌘µ⌫ = c2 . (18)
d⌧ d⌧
reza como nunca havíamos pensado e mostrando
que a física Newtoniana é apenas uma aproxima- Na expressão acima, estamos fazendo uso da no-
ção de uma formulação mais complexa. Entre- tação de Einstein e índices repetidos implicam
tanto, o termo “especial” atenta para o fato de que os mesmos estão sendo somados sobre todos
que a teoria possui aplicação restrita,9 válida so- os valores que possam assumir. Há, portanto,
mente para os casos de movimentos uniformes. A uma soma dupla em µ e ⌫, tal como na expres-
generalização da relatividade especial só foi possí- são (15). Na verdade, a condição acima é obtida
vel após uma extensa discussão acerca do princí- dividindo (15) por d⌧ 2 .
pio da equivalência e engloba a natureza da gra- Além disso, a constância da massa m, implica
vidade. Vamos discutir a seguir como se deu a
dx⌫
evolução dessas ideias até a formulação da teoria ⌘µ⌫ F µ = 0. (19)
d⌧
relatividade geral.
No caso gravitacional, podemos definir uma qua-
driforça Fgµ , nos moldes como define-se a força
gravitacional Newtoniana, a partir do gradiente
5 Generalização da gravitação newtoniana do potencial gravitacional ,
Nos anos que se seguiram a apresentação da F~g = mr
~ . (20)
teoria da relatividade especial, não se imaginava
encontrar uma maior dificuldade para adaptar a No domínio da relatividade restrita generalizamos
gravitação newtoniana aos conceitos revolucioná- essa definição como
rios que a teoria de Einstein trazia. Uma das
questões chaves estava na equação satisfeita pelo @
Fgµ = mc2 ⌘ µ⌫ . (21)
campo gravitacional Newtoniano, equação (6), e @x⌫
a ação à distância instantânea que ela implica, O termo c2 é inserido para que passe a ser adi-
violando o postulado da relatividade especial de mensional. No entanto, o campo gravitacional
que nada se propaga mais rápido que a veloci- deve satisfazer uma equação dinâmica que seja
dade da luz. A solução desta incompatibilidade invariante segundo as transformações de Lorentz.
mostrou-se mais complexa do que se esperava. Para isso, o mais simples seria o potencial gravi-
Em 1907, Einstein registrou as suas primeiras tacional satisfazer uma equação de onda como o
especulações acerca da possibilidade de estender potencial escalar do eletromagnetismo, ou seja
sua teoria da relatividade especial a movimen-
tos acelerados [3]. Sua descrição é simples e suas 1 @2 4⇡G
r2 = ⇢m , (22)
ideias sobre o tema podem ser reconstruídas fa- c2 @t2 c2
cilmente [4]. A proposta naturalmente surge com Mas a condição (19), juntamente com a força
uma generalização da força Newtoniana ao forma- gravitacional definida em (21), implicam que,
lismo quadridimensional da relatividade restrita,
✓ ◆ d
= 0. (23)
µ d dxµ d⌧
F = m , (17)
d⌧ d⌧ Em outras palavras, o potencial gravitacional
deve permanecer constante ao longo da trajetó-
onde m é a massa do objeto que sofre ação da
ria de uma partícula, ou seja, a força gravita-
força F µ , e xµ indica a sua posição no espaço-
cional deve ser nula na partícula. Uma análise
tempo. Note que as variações temporais são to-
um pouco mais detalhada mostra que, uma te-
madas em relação ao tempo próprio. Esta defini-
oria como a proposta acima, falha em cumprir
ção é feita no espaço-tempo de Minkowski, onde
o princípio de equivalência de Galileu, que deve
9
Relatividade restrita é também um sinônimo pra re- permanecer inalterado. Essa inconsistência física
latividade especial. levou Einstein a abandonar a formulação de uma
teoria da gravitação invariante de Lorentz e o fez com M0 sendo uma constante de integração.
repensar o princípio de equivalência para estabe- Usando este resultado na equação (24), obtém-
lecer as relações entre um campo gravitacional e se a equação de movimento para uma partícula
uma aceleração correspondente [5]. A afirmação teste,
Galileana de que, na ausência de forças externas, @ dvµ d
c2 µ = + vµ . (26)
todos os corpos caem com a mesma aceleração @x d⌧ d⌧
(igualdade entre as massas inercial e gravitaci- Nordström afirmava que a equação dinâmica
onal), foi então reformulada por Einstein no que de sua teoria, sendo independente da massa, era
hoje conhecemos como o princípio de equivalência um reflexo da igualdade entre as massas gravita-
forte, tornando-se uma hipótese heurística neces- cional e inercial. A aceleração de diferentes par-
sária para a elaboração do que viria a ser a teoria tículas em um campo gravitacional não depende
relatividade geral. de suas respectivas massas, implicando que a teo-
O princípio de equivalência forte assegura que ria contém o princípio de equivalência de Galileu.
não é possível distinguirmos entre um referencial Porém, essa teoria possui problemas ao descrever
acelerado uniformemente e um outro sob a in- o movimento de uma partícula teste em queda
fluência de um campo gravitacional homogêneo livre, por exemplo. Considere um campo gravi-
e estático. É a essência do famoso experimento tacional estático, @ /@t = 0 , e assuma que este
mental do foguete parado na superfície da Terra campo atue somente no sentido da queda da par-
ou sendo acelerado com intensidade g. Uma pes- tícula, por exemplo = (z) . As equações (26)
soa no interior desse foguete, sem contato visual são escritas como
com o exterior, não poderia distinguir entre uma
dvµ d
situação ou outra. = vµ , µ 6= 3 , (27)
d⌧ d⌧
Mas antes que ele voltasse a publicar sobre
o assunto, o físico finlandês Gunnar Nordström d dv3 d
c2 = + v3 . (28)
(1881 1923) propôs algumas variações nessa for- dz d⌧ d⌧
mulação para escapar dos problemas acima cita- Escrevendo as velocidades da partícula em termos
dos. do tempo local t, teremos
dt v0 dxi
v0 = c , vi = Vi , com Vi ⌘ . (29)
d⌧ c dt
6 As teorias gravitacionais de Nordström
Substituindo isso nas equações de movimento,
Buscando contornar o problema da adaptação verifica-se que
da gravitação newtoniana à relatividade restrita, ✓ ◆
Nordström primeiramente manteve a generaliza- dVz 2 V2 d
= c 1 , (30)
ção da equação dinâmica do campo gravitacio- dt c2 dz
nal (22), como proposta por Einstein. Todavia, dVx dVy
= 0, = 0. (31)
sua contribuição relevante veio no tratamento da dt dt
quadriforça. Propôs que a massa de um corpo
dependesse do campo gravitacional. As equações onde definimos V 2 = Vx2 + Vy2 + Vz2 . Esse re-
(17) e (21) dão origem à expressão sultado diz que corpos que possuam velocida-
des horizontais caem mais lentamente que aqueles
dvµ dm @ que não as possuam, ou seja, corpos girantes em
m + vµ = mc2 µ , (24) queda livre serão acelerados mais lentamente que
d⌧ d⌧ @x
os não girantes [6].
e o termo de derivada da massa impede o surgi- Outra questão problemática está relacionada
mento da condição (23). Contrariamente, a con- com a determinação da fonte do campo gravita-
tração dessa última expressão com v µ nos leva cional. A densidade de massa, como se sabe, é
a uma equação diferencial facilmente integrável dada em termos da projeção do tensor de energia
que indica a dependência da massa com o campo e momento Tµ⌫ , na direção do observador que se
gravitacional, a saber move com velocidade v µ ,
O tensor de energia e momento descreve a densi- Para analisarmos a conservação da energia, fica
dade e o fluxo de energia e momento no espaço- mais fácil utilizarmos a maneira pelo qual Eins-
tempo. É uma generalização relativística do ten- tein apresentou esta teoria de Nordström em 1913
sor de tensões da física Newtoniana. Utilizar este [7]. O tensor de energia-momento da matéria em
parâmetro ⇢m como a fonte do campo gravitacio- um sistema fechado é tal que,
nal resulta em uma dinâmica do campo que impli-
citamente depende do sistema de referência ado- T µ⌫ = ⇢ vµv⌫ . (38)
tado. Einstein, então, sugeriu que a única quan-
Já a contribuição do próprio campo gravitacional
tidade escalar que poderia ser fonte do campo
será dado por,
gravitacional era o traço do tensor de energia-
✓ ◆
momento da matéria, µ⌫ c4 µ↵ ⌫ @ @ w
t = ⌘ ⌘ ⌘↵ , (39)
4⇡G @x↵ @x 2
T = Tµ⌫ ⌘ µ⌫ . (33)
com,
Isso levou Nordström à formulação de uma se- @ @
w ⌘ ⌘ µ⌫ . (40)
gunda teoria gravitacional, no qual acatava as crí- @xµ @x⌫
ticas de Einstein. Sob essas definições, o tensor de energia-momento
total, T µ⌫ + tµ⌫ , se conservará. Basta ver que,
6.1 Segunda teoria de Nordström @tµ⌫ T @
= ⌘ µ⌫ , (41)
Como dito na seção anterior, em sua segunda @x⌫ @x⌫
teoria gravitacional, Nordström modifica a fonte onde utilizamos a equação (34) e,
do campo escalar da densidade de energia ⇢ para
o traço do tensor de energia-momento, T . Isso @T µ⌫ T µ⌫ @
⌫
= ⌘ , (42)
implica em considerar que, assim como o campo @x @x⌫
eletromagnético, o campo gravitacional deve car- considerando-se a conservação da massa, expressa
regar uma certa energia, o que leva a uma não como,
linearidade na teoria (já que a relatividade es- @
(⇢ v µ ) = 0. (43)
pecial afirma que qualquer forma de energia é @xµ
equivalente à uma massa e, portanto, deve ge- Portanto, a divergência do tensor de energia-
rar um campo gravitacional). Nordström incluiu momento total é nula, garantindo a conservação
essa não linearidade através da adição de um fa- da energia.
tor gravitacional na fonte do campo, Essa teoria chamou a atenção de Einstein, que
a qualificou como a única teoria gravitacional sa-
1 @2 4⇡G T tisfatória até aquele momento. Tanto que pouco
r2 = , (34)
c2 @t2 c4 tempo depois, publicou uma reformulação geomé-
e também na força gravitacional (21), trica para ela como veremos a seguir.
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