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"Fostes resgatados...

com o precioso sangue de Cristo" - Sermão pregado


dia 03.07.2011

"Fostes resgatados... com o precioso sangue de Cristo,


como de um cordeiro imaculado e incontaminado" -
Sermão pregado dia 03.07.2011

Nosso texto: "Sabendo que não foi com coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que
fostes resgatados da vossa vã maneira de viver que por tradição recebestes dos vossos
pais, mas com o precioso sangue de Cristo, como de um cordeiro imaculado e
incontaminado" (1Pe 1.18,19).

O apóstolo Pedro inicia sua carta aos irmãos "estrangeiros dispersos no Ponto, Galácia,
Capadócia, Ásia e Bitínia" (v.1) dizendo-lhes que suas entradas e estadias no reino do
Senhor se davam única e exclusivamente por causa da eleição em Deus Pai, sendo
santificados no Espírito Santo e destinados à obediência à Jesus Cristo (v.2). Deste
ponto em diante, Pedro passa a expor os motivos pelos quais aqueles irmãos deveriam
ter sua salvação - em Jesus Cristo - na mais alta estima possível. Ele insta-lhes dizendo
que o Deus Pai os gerou "para uma herança incorruptível, incontaminável, e que não se
pode murchar, guardada nos céus para vós" (v.4), ensinando-os sobre a imutabilidade do
sacrifício vicário de Jesus por eles.

Pedro também lhes escreve dizendo sobre o quão privilegiados eram por poderem
desfrutar de tão grande benção - esperada e profetizada durante tanto tempo pelos
antepassados e profetas do Senhor (v.12) - e a grandiosa importância de aguardarem no
Senhor sendo santos como aquele os havia chamado (v.15).

Pedro tem como propósito em seu escrito o encorajar os cristãos perseguidos e confusos
a permanecerem unidos e firmes na fé (5.12). Por esse propósito, ele repetidas vezes
volta os pensamentos dos cristãos para a alegria e glória de sua eterna herança (1.3-13;
3.7; 4.13-14; 5.1,4,6,10) e os intrui sobre como comportar-se corretamente em meio ao
sofrimento não merecido (4.12-19). A presente epístola pode ser resumida na fórmula
"confiar e receber" (4.19; cf. 2.23). [1]

Os versículos de hoje nos levam à reflexão sobre a importância e essencialidade do


sacrifício de nosso Senhor Jesus Cristo.
Antes de Pedro escrever as palavras de nosso texto, ele diz: "E, se invocais por Pai
aquele que, sem acepção de pessoas, julga segundo a obra de cada um, andai em temor,
durante o tempo da vossa peregrinação" (v.17). Pedro era desejoso de que aqueles
irmãos entendessem a necessidade de andar "em temor durante o tempo da vossa
peregrinação", pois o Senhor julga segundo a obra de cada um, devendo todos buscarem
a conformidade com sua Lei. Vemos então que tal expressão está diretamente ligada ao
próximo versículo que diz: "Sabendo que não foi com coisas corruptíveis, como prata
ou ouro, que fostes resgatados" (v.18).

Comenta a Bíblia de Estudo de Genebra que a palavra peregrinação aqui usada é uma
palavra grega diferente daquela utilizada no v.1 (traduzida como "forasteiros" - ou
estrangeiros, conforme a ACF - nota minha). A palavra "peregrinos" indica aqueles que
vivem num lugar do qual não são cidadãos, realçando a condição de peregrinos dos
cristãos neste mundo. A única maneira de permanecer fiel a Cristo é se desprender do
amor natural pelas coisas deste mundo (1Jo 2.15).

Atentemos para que Pedro insta aqueles irmãos a não fazerem pouco caso da sua busca
e de quem eles buscavam a face. Quando ele lhes escreve dizendo que não foram
comprados com coisas corruptíveis, é necessário notarmos que Pedro dá como exemplo
de coisas corruptíveis o que praticamente há de melhor e mais valioso na terra! Ele lhes
diz que a prata e o ouro - quando comparados a Cristo, nada são! Ele também lhes
escreve como que querendo dizer que por mais alta valoração que possa ter algum
objeto ou benfeitoria terrena, nada é capaz de os comprar e os resgatar do pecado e da
ira de Deus.

Pedro também lhes diz que eles haviam sido "resgatados da vossa vã maneira de viver
que por tradição recebestes dos vossos pais". Há ainda alguma dúvida entre os
estudiosos sobre para que tipo de cristãos que foi escrita a presente epístola: se aos
judeus ou aos gentios convertidos. Independente deste ponto, é notório atentarmos para
que por mais ortodoxa - aos olhos humanos - que possa ser a profissão de fé de alguma
família, ela nada representa se não for ortodoxa aos olhos de Deus. O próprio Jesus já
havia condenado os fariseus e escribas por colocarem as suas tradições acima dos
mandamentos de Deus: "Bem invalidais o mandamento de Deus para guardardes a
vossa tradição" (Mc 7.9).

Se faz essencial atentar para o perigo de propagarmos a fidelidade a determinada crença


e/ou instituição pelo simples fato de termos um histórico familiar enraizado nisto. Por
mais piedosa que possa ser a tradição - novamente, aos olhos dos homens - elas nada
são para Deus se não estiverem em conformidade com sua verdade.

Também precisamos entender que muitas vezes o cristão pouco piedoso - aos olhos do
homem pecador - é de fato o cristão verdadeiro. "O SENHOR disse a Samuel: Não
atentes para a sua aparência, nem para a grandeza da sua estatura, porque o tenho
rejeitado; porque o SENHOR não vê como vê o homem, pois o homem vê o que está
diante dos olhos, porém o SENHOR olha para o coração" (1Sm 16.7). Com isso não
devemos advogar que se pode ser piedoso e não exteriorizar tal piedade, mas é notório
que muitos cristãos piedosos são satirizados e tratados como fundamentalistas, rígidos,
retrógados, ultrapassados ou ainda "presos nos tempos bíblicos", quando na verdade
vivem de maneira digna da sua vocação - conforme Paulo expressa em Ef. 4.1.
Logo em seguida ao que vimos, Pedro complementa sua sentença dizendo que eles não
somente haviam sido comprados por algo muito mais valioso que a prata ou ouro -
lembremos das palavras de Jesus: "Não ajunteis tesouros na terra, onde a traça e a
ferrugem tudo consomem, e onde os ladrões minam e roubam; mas ajuntai tesouros no
céu, onde nem a traça nem a ferrugem consomem, e onde os ladrões não minam nem
roubam. Porque onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração" (Mt
6.19-21) - mas que esse algo mais valioso era "o precioso sangue de Cristo, como de um
cordeiro imaculado e incontaminado"!

Talvez algumas dúvidas podem surgir a partir desse texto, pois desde quando um
homem pode dar sua vida em favor de pecadores destinados à ira de Deus? É possível
que o sangue de Cristo seja assim tão precioso? Como pode ser possível um homem
expiar todos os pecados de um povo? Por que é que precisávamos de que alguém que
morresse em nosso lugar? Pretendo de maneira breve responder a essas objeções.

Desde quando um homem pode dar sua vida em favor de pecadores destinados à
ira de Deus?

A bíblia é enfática ao nos dizer que "todos pecaram e carecem da gloria de Deus" (Rm
3.23). Ela também nos ensina que "viu o SENHOR que a maldade do homem se
multiplicara sobre a terra e que toda a imaginação dos pensamentos de seu coração era
só má continuamente" (Gn 6.5). Lemos ainda que "é impossível que o sangue dos touros
e dos bodes tire os pecados" (Hb 10.4).

Mister é reconhecermos que somente um sacrifício perfeito - a saber, Cristo - poderia


aplacar a ira de Deus contra os pecadores. Embora os pecados do povo de Israel fossem
constantemente expiados pelo sangue de animais, não era possível que aqueles
sacrifícios eliminassem de uma vez por todas a culpa que recaia-lhes, pois por mais
puro que pudesse ser o animal, ainda assim era corrompido pelo pecado e oferecido por
homens pecadores, ainda que fossem sacerdotes - sendo tais sacrifícios apenas uma
sombra do verdadeiro sacrifício que viria: a morte eficaz e redentora de Cristo por seus
filhos.

Como bem salienta J. C. Ryle em seu livro "Santidade", jamais entenderemos o que é
santidade se não compreendermos o que é o pecado. Portanto, se faz necessário que
todo crente compreenda o quão pecaminoso é e volte-se diariamente à cruz de Cristo - a
única fonte de todo perdão.

É possível que o sangue de Cristo seja assim tão precioso?

As doutrinas da bíblia que não podem e nem devem ser colocadas sobre o crivo da
cientificidade humana - como que se pudesse provar cientificamente que o sangue
natural de Cristo era precioso - pois a bíblia muitas vezes nos fala por figuras de
linguagens, devendo todo homem buscar com diligência o correto entendimento das
escrituras. Ademais, a tal cientificidade muitas vezes é errônea e passageira, pois o que
era ontem, hoje já não é mais e amanhã deixará de existir.

Quando a bíblia nos diz que "é impossível que o sangue dos touros e dos bodes tire os
pecados" (Hb 10.4), não devemos duvidar de tal sentença, mas unicamente nos
apegarmos a maravilhosa misericórdia que recebemos em Cristo Jesus, pois "o mesmo
Espírito testifica com o nosso espírito que somos filhos de Deus" (Rm 8.16).

O próprio apóstolo Pedro instou seus destinatários para que purificassem "vossas almas
pelo Espírito na obediência à verdade" (1.22 - já vimos esse texto, clique aqui para ler).
Devemos então nos submeter humildemente às sagradas escrituras, que nos são tão úteis
para nos aperfeiçoar na fé "e proveitosa para ensinar, para redargüir, para corrigir, para
instruir em justiça; para que o homem de Deus seja perfeito, e perfeitamente instruído
para toda a boa obra" (2Tm 3.16,17).

Se toda a bíblia fala, exemplifica, mostra e aponta para Cristo, deve-se compreender que
não deve haver nada mais precioso do que o sangue do "cordeiro imaculado e
incontaminado" para o cristão.

Como pode ser possível um homem expiar todos os pecados de um povo?

Para entendermos tal fato, é necessário que entendamos que Cristo não foi um mero
homem, apenas um profeta (como objetam alguns) ou ainda um grande servo do
Senhor, mas sim - pois é ponto fático da academia cristã - que Cristo é o Filho de Deus.
O fato de Cristo expiar - reparar ou remir um crime - os pecados de todo o seu povo, é
claramente notório quando Paulo escreve aos romanos dizendo que: "Assim, pois, isto
não depende do que quer, nem do que corre, mas de Deus, que se compadece" (Rm
9.16).

Vemos que é indispensável à fé cristã - e ao plano de Deus - o fato de a morte de Cristo


necessariamente precisar ser eficaz nos seus filhos. Somente Cristo poderia expiar todos
os pecados do seu povo, pois somente ele era - e é - o único capaz de nos gerar "não de
semente corruptível, mas da incorruptível, pela palavra de Deus, viva, e que permanece
para sempre" (1Pe 1.23).

Devemos alertar e refutar aqueles que se opõem a sã doutrina (Tt 1.9) - "ensinando
doutrinas que são preceitos dos homens" (Mt 15.9) - e dizem que a morte de Cristo não
foi eficaz para nos perdoar de todos os pecados, como se dependesse do homem o
cooperar com Deus em sua salvação. Escrevendo sobre Rm 9.16, Calvino disse: "Dizer
que queremos ou corremos para alcançar a eleição é pura cavilação, visto que Paulo
nega que o homem que quer e corre seja capaz de concretizar a eleição. O que ele tem
em mente é simplesmente que nem o querer nem o correr podem efetuar algo". [2] Ao
discorrer sobre o livre-arbítrio do homem, Lutero escreveu: "Se algum homem, de
alguma maneira, atribuir a salvação ao livre-arbítrio do homem, mesmo que a ínfima
parte, nada sabe sobre a graça e não conheceu Jesus Cristo corretamente". [3]

Portanto, a morte de nosso Senhor Jesus Cristo - dado à inferência lógica que da bíblia
retiramos - é sim eficaz para perdoar todos os pecado de seu povo, a saber, de seus
filhos.

Por que é que precisávamos de que alguém que morresse em nosso lugar?

Novamente, haja vista que "é impossível que o sangue dos touros e dos bodes tire os
pecados" (Hb 10.4), somente Cristo poderia nos livrar dos enlaces do pecado que
produzem morte e destruição eterna na vida de todo ser vivo. Era necessário que Cristo
morresse em nosso lugar, "como está escrito: Não há um justo, nem um sequer" (Rm
3.10). Logo - novamente pela inferência lógica - fazia-se necessário que algum justo
viesse a morrer pelos injustos. O próprio Pedro escreve mais adiante dizendo: "Porque
também Cristo padeceu uma vez pelos pecados, o justo pelos injustos, para levar-nos a
Deus; mortificado, na verdade, na carne, mas vivificado pelo Espírito" (1Pe 3.18).

Portanto, se não somos justos e houve um justo - Jesus - que morreu para levar os
injustos a Deus, deduz-me clara e biblicamente que os injustos de outrora agora são
considerados justos - não pela sua própria justiça, mas por aquela imputada pelo sangue
de nosso Senhor Jesus Cristo.

Que possamos buscar o entendimento correto da morte de Cristo a cada dia, para nos
tornarmos piedosos e com os corações extremamente gratos por tudo que ele nos tem
feito. Que conceda-nos Deus um coração jamais impenitente e desvairado, mas guie-nos
na sua santa e perfeita palavra, a fim de que possamos por em prática nossa salvação
com "temor e tremor; [pois dado ao fato de que é] Deus... que opera em [nós] tanto o
querer como o efetuar, segundo a sua boa vontade" (Fp 2.12,13), devemos ser
eternamente gratos a Ele e Lhe rendermos o louvor que é devido.

Amém.

Notas:
[1] Bíblia de Estudo de Genebra.
[2] Blog: O Calvinista
[3] Não encontrei a fonte onde Lutero escreveu ou proferiu tais palavras.

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