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Economia

Política
As causas do início do
crescimento económico
sustentado (1600-1800)

Adam Smith

Carlos Seixas

IMP.GE.086.2
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CONTEÚDO

I. As causas do início do crescimento económico sustentado


(1600-1800)

1. Crescimento Económico Sustentado

2. Revolução Industrial?
2.1. A Peste Negra
2.2. O Efeito Londrino
2.3. A Indústria do Carvão
2.4. Combinação Única de Preços

3. Revolução Industriosa?

4. Revolução Institucional?

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CONTEÚDO

II. Adam Smith

1. Economia de Mercado

2. Divisão do Trabalho

3. Comercio Livre

4. Implicações Políticas

BIBLIOGRAFIA
▪ Buchholz (cap. II)
▪ Allen (caps 1-5, especialmente o 5)
▪ De Vries, J.

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I.1. CRESCIMENTO ECONOMICO SUSTENTADO

▪ A “Grande Divergência” começou antes de 1820.

▪ No entanto, o crescimento da Europa não foi uniforme

▪ Apenas a Inglaterra apresenta crescimento económico sustentado

▪ Itália e Espanha não são mais ricas em 1800 do que em 1500.

▪ Portugal e Suécia têm momentos de avanços e recuo.

▪ A trajetória da Holanda e especialmente da Inglaterra destacam-se.

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I.1. CRESCIMENTO ECONOMICO SUSTENTADO

▪ No entanto, a da Holanda mostra ainda recuos importantes durante períodos


relativamente longos.

▪ Aliás, a série para a “Holanda” corresponde apenas à parte mais urbanizada


desenvolvida das Províncias Unidas; por isso, representa apenas uma parte de uma
economia.

▪ Já o crescimento da Inglaterra revelou-se especialmente sustentado. Qual a


explicação para este comportamento inglês?

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I.1. CRESCIMENTO ECONOMICO SUSTENTADO - Porquê o


crescimento?

▪ Como é possível explicar o crescimento económico das economias de mercado


antes de 1820?

• Alterações dramáticas nos setores produtivos (“Revolução Industrial”)?

• Uma mudança dos comportamentos dos trabalhadores e consumidores


(“Revolução Industriosa”)?

• Enquadramento institucional que incentivasse a atividade económica


(“Revolução Institucional”)?

▪ Estas explicações têm de ser validadas sobretudo para a Inglaterra.

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I.2. REVOLUÇÃO INDUSTRIAL?

▪ De acordo com Robert Allen, o caminho inglês para a Revolução Industrial começou
com a Peste Negra.

▪ Entre 1346 e 1353, a peste dizimou entre 30 e 60% da população europeia.

▪ É, de longe, a pandemia que causou o maior número de mortos na história da


humanidade, entre 75 e 100 milhões.

• P. ex., a pandemia da gripe espanhola entre 1918 e 1920 terá matado entre
17 e 100 milhões de pessoas. Já a COVID-19 terá vitimado entre 7 e 30
milhões.

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I.2.1 A PESTE NEGRA - Salários

▪ Enquanto a população recuperou relativamente rápido um pouco por toda a Europa,


a população inglesa manteve-se relativamente baixa até meados do século XVI.

▪ Uma consequência relevante observou-se nos salários. No século XV, os salários


reais eram elevados por todo o país.

▪ Depois de 1550, é evidente a queda dos salários reais por toda a Inglaterra. Essa
queda foi, no entanto, muito menos expressiva em Londres.

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I.2.1. A PESTE NEGRA – Efeito Ovino

▪ Uma outra consequência da queda acentuada da população foi a conversão de


terras cultivadas em pastagens.

▪ Por outras palavras, no início do século XVI, não só as pessoas, mas também as
ovelhas gozavam de um consumo real relativamente elevado.

▪ Daqui resultou um aumento grande da quantidade e qualidade da lã de cada ovelha.

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I.2.1. A PESTE NEGRA – Efeito Ovino e o Sucesso Comercial

▪ Esta lã ofereceu uma vantagem competitiva à indústria têxtil inglesa.

▪ No século XVII, as imitações inglesas (e holandesas…) levaram à falência muitos


Produtores do sul da Europa, em especial de Itália.

▪ A integração comercial intra-europeia do século XVII trouxe, assim, consigo uma


alteração nos locais de produção dos têxteis.

▪ No final do século XVII, cerca de 40% da produção de lanifícios em Inglaterra era


exportada, correspondendo a 69% por cento das exportações de manufaturas desta
economia

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I.2.2. O EFEITO LONDRINO

▪ A exportação de lã foi especialmente significativa para a cidade de Londres.

▪ Entre 1500 e 1700, a população desta cidade aumentou em 1000%. A exportação


têxtil é um fator crucial para explicar este aumento.

▪ Esta indústria correspondia a 74% das exportações de Londres em 1660. No início


do século XVIII, um quarto dos trabalhadores da cidade empregava-se na
navegação, serviços portuários ou atividades relacionadas com a atividade
exportadora.

▪ O impacto do comércio internacional no crescimento da cidade aprofundou-se no


séc. XVIII conforme as trocas além-Europa se expandiram.

▪ O crescimento de Londres foi tão rápido e a mortalidade na cidade tão elevada que o
seu crescimento absorveu metade do aumento natural da população inglesa.

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I.2.2. O EFEITO LONDRINO

▪ Havia uma fortíssima migração rural-urbana com vista a importar força de trabalho
das zonas rurais.

▪ A expansão da cidade aumentou, claramente, a procura por trabalho e permitiu a


subida dos salários.

▪ No final do século XVII, os salários das províncias estavam a aproximar-se dos de


Londres.

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I.2.2. O EFEITO LONDRINO

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I.2.2. O EFEITO LONDRINO

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I.2.2. O EFEITO LONDRINO

▪ Com a urbanização, muitos pequenos agricultores venderam a sua propriedade e


mudaram-se para a cidade.

▪ Outros melhoraram métodos e técnicas para acompanhar os rendimentos elevados


da população urbana e participar na revolução dos padrões de consumo (que
estudaremos no I.3.).

▪ Finalmente, houve muita consolidação de pequenas propriedades em propriedades


maiores, com vista a se lograrem economias de escala, bem como a conversão de
terras cultivadas em pastagens com vista a economizar mão de obra.

▪ Por outras palavras, trocas comerciais levaram a cidades maiores.

▪ Cidades maiores incentivaram o crescimento da propriedade agrícola.

▪ Cidades maiores permitem mais divisão do trabalho, e consequente ganhos de


IMP.GE.086.2 produtividade e de remuneração, como defendia Adam Smith
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I.2.3. A INDÚSTRIA DO CARVÃO

▪ O crescimento de Londres teve, no entanto, uma outra consequência especialmente


relevante.

▪ Gerou uma procura grande por combustível.

▪ Com a escassez de lenha, havia incentivo para se explorar alternativas como o


carvão mineral (menos limpo, mas muito mais barato)

▪ Em 1800, a Grã-Bretanha produzia grande parte do carvão mundial. Essa


abundância tornou a energia relativamente muito barata nesta economia.

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I.2.3. A INDÚSTRIA DO CARVÃO

Fonte: Allen (2012), op cit

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I.2.3. A INDÚSTRIA DO CARVÃO – Efeito Carbónico

Consumo de energia em Inglaterra e País de Gales


100%

90%

80%

70%

60%

50%

40%

30%

20%

10%

0%
1578
1560
1566
1572

1584
1590
1596
1602
1608
1614
1620
1626
1632
1638
1644
1650
1656
1662
1668
1674
1680
1686
1692
1698
1704
1710
1716
1722
1728
1734
1740
1746
1752
1758
1764
1770
1776
1782
1788
1794
Food Feed for draught animals
Fuelwood water wind
Coal
Fonte: Warde (2007)
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I.2.3. A INDÚSTRIA DO CARVÃO – Efeito Carbónico

▪ A energia barata que caracterizava a economia inglesa ajuda-nos a explicar um


potencial puzzle.

▪ Afinal, se nesta economia os salários eram relativamente elevados, como


conseguiam os produtores ingleses manter-se competitivos internacionalmente?

▪ Uma razão é o desenvolvimento de máquinas para economizar fator trabalho mesmo


antes da Revolução Industrial, como explicaremos de seguida.

▪ Mas outra é precisamente a energia barata.

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I.2.4. COMBINAÇÃO ÚNICA DE PREÇOS

▪ Percebemos, assim, que a economia inglesa nos séculos XVII e XVIII era uma
economia com elevados salários e energia barata.

▪ Com estes preços relativos, há um incentivo forte à adoção e desenvolvimento de


tecnologias de produção que substituam trabalho por capital e energia.

▪ Muitas das inovações que se associam à ‘Revolução Industrial’, como a máquina a


vapor ou a fiação mecânica, logram isto mesmo.

▪ O têxtil, uma das principais manufaturas em todas as economias, foi um dos setores
em que aquela substituição se verificou com maior intensidade.

▪ As restantes economias foram aumentado o uso de capital e energia à medida que


as novas tecnologias se iam tornando mais acessíveis.

▪ Este forte uso da máquina também levou à divisão do trabalho, assunto amplamente
IMP.GE.086.2 debatido pelo primeiro economista da história Adam Smith.
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I.3. REVOLUÇÃO INDUSTRIOSA?

▪ No noroeste da Europa e na América do Norte britânica, aproximadamente entre


1650-1850, um número crescente de famílias realocou os seus recursos (i.e., o
tempo dos seus membros) de maneiras que aumentavam tanto as atividades
voltadas para o mercado quanto a procura por bens oferecidos no mercado.

▪ Estas transformações foram impulsionadas por uma combinação de incentivos


comerciais (mudanças nos preços relativos, custos de transação reduzidos) e
mudanças nas preferências.
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I.3. REVOLUÇÃO INDUSTRIOSA? - Génese

▪ Novas oportunidades de consumo! No século XVII proliferaram novos bens:

• Gadgets (relógios, gravuras, livros, barómetros, etc …)

• Produtos coloniais (muitos deles, aditivos, como o Chá; Tabaco; Cacau;


Café; Bebidas fortificadas)

▪ Muitas famílias do século XVIII com dificuldades às vezes mais do que pontuais
em garantir a subsistência possuíam relógios e relógios de bolso, por ex.

“Essas qualidades, que são a base da preferência e que dão ocasião ao prazer e à
dor, são a causa de muitas exigências insignificantes, das quais de modo algum
necessitamos. Toda a indústria da vida humana é empregada não em suprir as nossas
três humildes necessidades, comida, roupas e moradia, mas em prover as
conveniências de acordo com a sutileza e delicadeza de nosso gosto.” (AS, LoJ, II.2)

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I.3. REVOLUÇÃO INDUSTRIOSA? - Génese

▪ Muitos são bens que não podem ser produzidos por via do trabalho doméstico,
mas apenas adquiridos no mercado.

▪ Incentivam as famílias a se voltarem para o mercado e, assim, se especializarem.

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I.3. REVOLUÇÃO INDUSTRIOSA? - Génese

▪ A família é uma unidade de co-residência e reprodução, de produção e força de


trabalho, de consumo e distribuição entre os seus membros e de transmissão
através das gerações.

▪ O modelo dominante de família tinha-se alterado. Observava-se, nas


economias em questão, o chamado Modelo Matrimonial Europeu (EMP European
Marriage Pattern)

▪ Modelo de família distinto, p. ex., dos padrões orientais:

• Casamento decidido pelos contraentes

• Idade tardia do primeiro casamento

• Reduzida taxa de matrimonialidade (muitos “solteiros/as”)

• Casamento associado a nova residência (como o nome indica!!!)


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I.3. REVOLUÇÃO INDUSTRIOSA? - Génese

▪ Modelo de família com base no agregado familiar nuclear, e não no clã ou


parentesco alargado.

▪ O casamento tardio e não universal limita a fertilidade.

▪ A necessidade de formar famílias independentes torna a nupcialidade sensível às


condições económicas. A família nuclear é uma entidade de planeamento e cálculo
económico.

▪ Os percursos de vida de homens e mulheres assemelharam-se e surgiram


oportunidades para as mulheres assumirem a chefia familiar (devido à fragilidade
da família nuclear).

▪ O casamento tardio e o trabalho antes do casamento deram aos jovens,


especialmente às mulheres, a oportunidade de economizar e trazer recursos para
uma nova casa.
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I.3. REVOLUÇÃO INDUSTRIOSA? - Génese

▪ A família nuclear – pequena, flexível e autónoma – ofereceu um contexto propício


às inovações no comportamento do consumidor.

▪ Domicílios complexos são mais resistentes do que os domicílios nucleares. Mas


isso tem um custo: regras e convenções mais rígidas que regem a alocação de
recursos.

▪ Os laços de parentesco restringem e inibem o comportamento do consumidor,


dada a complexidade da tomada de decisão e as reivindicações potenciais feitas
por membros distantes da família sobre eventuais excedentes.

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I.3. REVOLUÇÃO INDUSTRIOSA? – Consequências

▪ A realocação de recursos no seio da família potenciou a divisão do trabalho como


a descrita por Adam Smith.

▪ A divisão do trabalho não pode ser entendida simplesmente, ou mesmo


principalmente, como uma questão de organização do trabalho na empresa (ex.,
na fábrica de alfinetes).

▪ Pelo contrário, alcançou-se principalmente ao nível do agregado familiar, com o


aumento simultâneo da produção familiar vendida a outros e do consumo familiar
comprado a outros.

▪ O conceito de Rev. Industriosa não introduz apenas um papel para a procura nos
inícios do crescimento sustentado. Além disto, enfatiza o papel da oferta de
trabalho, das novas aspirações e novas formas de comportamento na esteira das
quais se inseriu a Revolução Industrial.

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I.3. REVOLUÇÃO INDUSTRIOSA? – Consequências

▪ A família torna-se mais permeável ao mercado, com as alianças fora da família a


tornarem-se mais importantes.

▪ O poder de decisão da “esposa” aprofunda-se. A mudança da relativa


autossuficiência para a produção para o mercado por todos ou a maioria dos
membros da família envolve uma redução dos bens produzidos em casa,
tipicamente fornecidos pelas mulheres.

▪ Ao mesmo tempo, a esposa tornou-se mais frequentemente uma trabalhadora


autónoma.

• Em 1787-1815, dois terços das mulheres casadas contribuíam


monetariamente para o rendimento familiar. Essa proporção caiu para
pouco menos da metade das mulheres casadas em meados do século
XIX.

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I.3. REVOLUÇÃO INDUSTRIOSA? – Consequências

▪ A intensificação do trabalho e a supressão do lazer também tiveram


consequências negativas.

▪ A exploração de familiares (esposas e filhos), a negligência da formação de capital


humano, e o maior recurso ao consumo excessivo de álcool ou outros produtos
aditivos são exemplos.

▪ Finalmente, as novas pressões e possibilidades fizeram do namoro e do


casamento um processo com regras menos claras e estabelecidas.

• Alguns autores consideram ter isto estado na origem de uma onda de


ilegitimidade e abandono de crianças no período de 1750 a 1820.

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I.4. REVOLUÇÃO INSTITUCIONAL?

▪ O Regime político inglês no século XVII é diferente do do resto da Europa:

• Ditadura de Cromwell, 1648-59.

• Revolução Gloriosa de 1688 e existência de uma ‘constituição’ (bill of


rights).

• Parlamento passa a ter o poder legislativo e, como tal, a regulação da


economia e a carga fiscal.

• Em 1706, o Parlamento torna-se permanente, deixando de ser


convocado pelo monarca.

• Cria ministros e orçamentos, deixando ao monarca a decisão em política


externa.

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I.4. REVOLUÇÃO INSTITUCIONAL?

▪ O Parlamento torna o processo de tomada de decisão mais desconcentrado do


que nas monarquias absolutas. Melhor?

• Não necessariamente

▪ Assembleias representativas não representam necessariamente interesse público.

• Interesses especiais podem obter representação parlamentar

▪ Parlamento dominado pelos interesses comerciais que preconizam uma marinha


forte, uma expansão imperial e que levam a um aumento da carga fiscal.

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I.4. REVOLUÇÃO INSTITUCIONAL?

▪ Principais ‘revoluções’ institucionais são de datas posteriores a 1650, ou seja,


depois dos alvores do crescimento inglês.

▪ Mas as instituições ajudam a comparar com as economias do Continente.


Permitiam, como Adam Smith defende:

• Mais liberdade

• Mais concorrência

• Maior alcance nas trocas

▪ Ajudam também a compreender a manutenção e aprofundamento do crescimento


económico pós 1700.

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I.4. REVOLUÇÃO INSTITUCIONAL?

▪ Exemplo: instituições no Setor Agrícola, séc. XVIII

Inglaterra Europa do Sul

Pouca representação dos interesses agrários e Interesses dos latifundários influenciam decisão
não-interferência na regulação da agricultura, política, permitindo que estes tenham regulação
Regime Político
deixando os produtores agrários em favorável (preços protegidos, privilégios para
concorrência perfeita produzir, salários baixos, etc…)
Direitos de Bem definidos, partilhados por contratos Limitados por contratos rígidos que limitavam
Propriedade (na flexíveis livremente transmissíveis e defendidos as escolhas de proprietários como produtores;
terra) pela lei grande quantidade de terras não alienáveis

Sistema Tribunais previsíveis, tornando contratos de


Tribunais morosos e Direito complexo
Judiciário fácil execução

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II. ADAM SMITH

▪ Nasceu em Kircaldy, próximo de Edimburgo, Escócia.

▪ Bom estudante, a sua intenção era estudar teologia e ingressar no clero

▪ Rejeita a censura académica, retorna a Kircaldy, onde começa a ensinar Retórica e


Direito.

▪ Influenciado pelo Tratado da Natureza Humana, de David Hume

▪ Em 1759, Adam Smith torna-se famoso com a publicação de um livro sobre a ética,
A Teoria dos Sentimentos Morais.

▪ Smith nunca ensinou economia, tal como aliás ninguém o havia feito: até ao sec.
XIX a economia era considerada um ramo da filosofia.

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II. ADAM SMITH

▪ Em 1748, Smith regressa à Universidade de Glasgow para ensinar Lógica.

▪ De notar as ideais subjacentes apresentadas nessas aulas (em contraposição com


o “mercantilismo”):
• a produtividade na raiz da riqueza das nações

• a relação entre o trabalho e a criação de valor.

▪ Em 1764 parte para França aceitando um convite para tutor do filho de uma família
nobre e com grande influência e recursos.

▪ Em Paris, frequenta os salons onde circulavam os grandes filósofos do Iluminismo

▪ Em 1766 regressa a Kircaldy. Nos dez anos seguintes, entremeados por algumas
deslocações ao Clube Literário de Londres, haveria de completar a Riqueza das
Nações, cuja escrita iniciara em França.
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II. ADAM SMITH - Contexto

▪ No Sec. XVIII a assistimos a uma viragem na história da humanidade:

• No plano das ideias: o Iluminismo;

• No domínio económico: o dealbar da Revolução Industrial

• Na política: Age of revolutions com a independência da América em


1776 e a Revolução Francesa 1789 (que abrange também a
Revolução Haitiana contra a escravatura, 1791-1804).

▪ Neste século também se dá a emergência da economia de mercado:

• Comércio internacional
• Aumento Populacional
• Primeiras fábricas
• Criação do sistema bancário
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II. ADAM SMITH – Contexto: Iluminismo e


antecedentes

▪ Desde da Idade Média, os teólogos dominavam o pensamento intelectual na


Europa.

▪ Copérnico (astrologia) e depois Galileu (física) desafiam a predomínio da doutrina


religiosa na explicação dos fenómenos naturais.

▪ Descarte, em o Discurso do Método (1637), antecipa o Iluminismo ao argumentar


que através da prática científica os homens poderiam tornar-se “senhores da
natureza”.

▪ Chegados ao Iluminismo, sobressai Isaac Newton (1642 – 1727) na revolução


científica, com as leis da gravidade e o cálculo moderno.

▪ Adam Smith advém deste movimento. Procurava relações de causa-efeito.


Contudo, o foco era nas pessoas
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II. ADAM SMITH - Essencial

▪ Fundador da moderna ciência económica / Autor de “A Riqueza das Nações


(1776)”/ Explica o funcionamento da economia de mercado.

▪ Viveu num período revolucionário:

• O Século das Luzes (o Iluminismo)

• O dealbar da revolução industrial / e da economia de mercado

▪ Os benefícios da economia de mercado assentam em dois pilares:

• Os ganhos de produtividade que advêm da divisão do trabalho

• Os ganhos de eficiência que advêm do comércio livre

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II. ADAM SMITH - Obra

▪ A Riqueza das Nações foi publicada em 1776. Apesar das suas 900 páginas,
conheceu um sucesso imediato: a primeira edição esgotou em seis meses.

▪ Pressupostos fundamentais:

• Os “atores económicos”, i.e., as pessoas, desejam sempre viver


melhor, desfrutar de melhores condições do que aqueles que já
possuem, e agem na prossecução dos interesses próprios com essa
finalidade.

• Justamente daí decorre o impulso para a criação da riqueza:

“Não é da bondade do homem do talho, do cervejeiro ou do padeiro que


podemos esperar o nosso jantar, mas da consideração em que eles têm
o seu próprio interesse”.

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II.1. ECONOMIA DE MERCADO

▪ A Economia de Mercado é definida por um dado conjunto de condições e


instituições.

• Instituições: As leis e normas sociais que governam a produção e


distribuição de bens e serviços.

▪ No caso as instituições enquadram:

▪ A propriedade privada

▪ Os mercados

▪ As empresas (sendo estas as instituições que combinam e articulam o capital


e o trabalho)

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II.1. ECONOMIA DE MERCADO - Mercados

▪ Os mercados são guiados por uma mão invisível:

• A coordenação dos atores económicos – consumidores e produtores


é feita através de um sistema descentralizado, v.g. os preços
formados em mercados concorrenciais, que harmonizam os bens que
uns desejam comprar e outros planeiam produzir.

• É através dos preços que se dispõem a pagar por um dado bem que
os consumidores sinalizam o seu interesse (procura).

• Tal como as empresas veiculam o seu interesse em vender certa


quantidade de um dado bem mediante o preço oferecido (oferta).

• O equilíbrio de mercado forma-se mediante o jogo da oferta e da


procura.

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II.1. ECONOMIA DE MERCADO - Mercados

▪ Mais especificamente, as empresas são orientados pelas seguintes informações


livremente transmitidas pelos mercados:

• O preço dos fatores produtivos (matérias-primas, trabalho) que


podem utilizar e assim como o da venda dos bens ou serviços a
produzir;

• O lucro resultante da sua atividade.

▪ No conjunto da economia a produção é determinada da seguinte forma:

• Se a produção de um bem é insuficiente, o seu preço sobe,


gerando-se lucros supranormais. Estes atraem novos
empresários, aumentando a quantidade oferecida, fazendo
retornar os empresários aos lucros normais. Se a produção é
IMP.GE.086.2 excessiva, o movimento ocorre em sentido contrário.
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II.2. DIVISÃO DO TRABALHO

▪ Adam Smith exemplificou com uma fábrica de alfinetes o impacto da divisão do


trabalho no “acréscimo dos poderes produtivos”, ou seja, o progresso técnico (na
linguagem atual):

“Um operário não treinado nesta atividade…mal poderia, talvez, …, produzir um


alfinete num dia e não seria, com certeza, capaz de produzir 20. Mas, da forma como
esta atividade é atualmente levada a cabo, não só o conjunto do trabalho constitui
uma arte específica [distinta da tecelagem, por ex.], como a maior parte das fases em
que está dividido constituem de igual modo trabalhos especializados. Um homem
puxa o arame, outro endireita-o, um terceiro corta-o, …; e a importante tarefa de
produzir um alfinete é, deste modo, dividida em cerca de 18 operações distintas…. Eu
próprio vi uma pequena fábrica deste tipo, …[na qual] cada homem produziria [à
razão] de 4.800 alfinetes num dia”.

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II.2. DIVISÃO DO TRABALHO - O Progresso Técnico

▪ Smith apontou três vias que levavam a um aumento da produção por efeito da
divisão do trabalho e, por essa via, da especialização:

• Cada trabalhador desenvolve capacidades especificas e destreza na


sua atividade particular;

• Perdem menos tempo a mudar de uma para outra atividade;

• Trabalhadores especializados serão provavelmente mais aptos a


inventarem novas máquinas e ferramentas.

▪ Por conseguinte, a divisão do trabalho incrementava a produtividade e contribuía


decisivamente para o avanço tecnológico.

▪ E na produtividade assenta a riqueza das nações e no avanço tecnológico o


crescimento da mesma [independentemente de ser proveniente da divisão do
trabalho, do avanço do conhecimento tácito, ou da investigação aplicada,
poderíamos hoje acrescentar].
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II.2. DIVISÃO DO TRABALHO - O Progresso Técnico

▪ “É a divisão do trabalho que aumenta a opulência de um país.”

▪ A divisão do trabalho resulta das trocas. Quanto maior o alcance das trocas mais
profunda a divisão do trabalho.

• “Podemos observar que a divisão do trabalho deve ser sempre


proporcional à extensão do comércio. Se dez pessoas quiserem apenas
uma determinada mercadoria, a fabricação dela nunca será tão dividida
como se mil a quisessem..”

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II.3. COMÉRCIO LIVRE

▪ O comércio livre entre produtores, fornecedores, cidades e [países] são


também necessários:

• “De que serviria produzir 10.000 alfinetes se não pudessem ser


comercializados?”

• Portanto, o comércio livre (a expansão dos mercados) é uma


condição necessária da prosperidade.

▪ A lógica de uma troca, para Adam Smith, descreve-se por: “dá-me o que eu quero
e terás o que tu queres”.

• “O homem... trabalha no amor-próprio dos seus semelhantes, colocando


diante deles uma tentação suficiente para conseguir o que deseja; a
linguagem dessa disposição é, dá-me o que eu quero e terás o que tu
queres.”

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II.3. COMÉRCIO LIVRE

▪ Para Smith, cada um está especialmente bem posicionado para ajuizar qual o uso
mais razoável das suas coisas.

▪ “É evidente que, cada indivíduo, pode, na sua situação local, julgar muito
melhor qual é o tipo de indústria doméstica onde pode empregar o seu
capital e cujo produto provavelmente será de maior valor do que qualquer
estadista ou legislador pode fazer por ele.”

▪ Notar que a divisão do trabalho realizada entre diferentes regiões e países


contribui para o aumento da produtividade, tal como a que observamos entre
diferentes unidades produtivas na mesma cidade. E daí a importância do comércio
internacional.

▪ Para Smith, “os países deveriam importar os bens daquele país no qual se
verificasse uma vantagem absoluta na sua produção [um custo mais baixo]”

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II.3. COMÉRCIO LIVRE - Saldo da Balança Comercial

▪ Smith qualificou de “absurda” a política aduaneira britânica da época, que


restringia as importações de França para “equilibrar” a respetiva balança
comercial. Explicação:

“Embora fosse um facto que no caso de um comércio livre entre a França e a


Inglaterra, por exemplo, a balança viesse a ser favorável à França, de modo
algum isso significaria que esse comércio fosse desvantajoso para a
Inglaterra,… Se os vinhos de França são melhores e mais baratos que os de
Portugal, ou seus linhos melhores que os da Alemanha, seria mais vantajoso para a
Grã-Bretanha adquirir tanto o vinho como o linho de que necessita à França, do que a
Portugal e à Alemanha. Embora o valor das importações anuais da França fosse
assim grandemente aumentado, o valor da totalidade das importações anuais seria
diminuído.”

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II.4. IMPLICAÇÕES POLÍTICAS

▪ Da perspetiva de Smith decorre que um enquadramento institucional que

▪ Proteja e incentive a livre iniciativa (ex. liberdade na definição de preços,


leis claras, impostos baixos e previsíveis)

▪ Promova o mercado concorrencial (ex. ausência de privilégios, de


“rendas”)

▪ Facilite as trocas (ex. liberdade de circulação)

▪ Para Smith, Governo não deve imiscuir-se no funcionamento dos mercados,


fixando preços ou salários, regulando o trabalho, ou protegendo industrias.

IMP.GE.086.2
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II.4. IMPLICAÇÕES POLÍTICAS

▪ Ao Estado compete:

• Assegurar a defesa nacional

• Administrar a justiça através de tribunais independentes

• Manter as instituições públicas, assegurar as infraestruturas básicas:


“o dever de erguer e manter certas obras públicas e certas
instituições públicas que nunca poderá ser do interesse de qualquer
indivíduo, ou de um pequeno número de indivíduos, erguer e manter”

“Pouco mais é necessário para elevar um estado, da mais primitiva barbárie, ao mais
elevado grau da riqueza do que a paz, impostos moderados e uma razoável
administração da justiça: tudo o resto acontece pelo curso natural das coisas” . (Adam
Smith, 1755)

IMP.GE.086.2
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II.4. IMPLICAÇÕES POLÍTICAS

▪ Smith também alertava para os obstáculos ao livre funcionamento dos mercados,


nomeadamente as práticas limitadoras da concorrência impostas por “interesse
especiais” [lobbies], quer sobre o mercado externo, como no mercado doméstico.

“É raro que pessoas que exercem a mesma atividade se encontrem, mesmo numa
festa ou diversão, sem que a conversa acabe numa conspiração contra o público, ou
numa maquinação para elevar os preços.”

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IMP.GE.086.2

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