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ATENÇÃO AO PACIENTE DE

MEDICINA TRADICIONAL CHINESA


UNIDADE I
A BASE FILOSÓFICA DA MEDICINA
TRADICIONAL CHINESA
Elaboração
André Teves Aquino Gonçalves de Freitas

Produção
Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração
SUMÁRIO

UNIDADE I
A BASE FILOSÓFICA DA MEDICINA TRADICIONAL CHINESA.............................................................................................. 5

CAPÍTULO 1
O TAO.................................................................................................................................................................................................. 5

CAPÍTULO 2
OS 5 ELEMENTOS........................................................................................................................................................................... 9

CAPÍTULO 3
AS SUBSTÂNCIAS FUNDAMENTAIS..................................................................................................................................... 11

CAPÍTULO 4
OS FATORES PATOGÊNICOS.................................................................................................................................................... 14

REFERÊNCIAS................................................................................................................................................18
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A BASE FILOSÓFICA
DA MEDICINA UNIDADE I
TRADICIONAL CHINESA

Capítulo 1
O TAO

1.1. O Taoísmo
O Taoísmo é o verdadeiro alicerce de toda a Medicina Tradicional Chinesa (MTC), sendo
dele todas as suas bases filosóficas e princípios que guiam o diagnóstico e tratamento.
Por esse motivo, a compreensão da filosofia taoísta, das diferentes energias e suas
interpretações, das interações e conexões entre essas energias, a natureza e o nosso
organismo é o ponto de partida fundamental para o estudo da MTC.

Todos os fundamentos da MTC, para serem devidamente aplicados, dependem do


entendimento da filosofia taoísta e seus derivados, estudando a fundo as relações entre
o homem e o meio ambiente.

Desenvolvido por Lao Tsé, o Taoismo foi primeiramente publicado no chamado Livro do
Tao (ou Tao Te King, em chinês), mostrando uma visão muito diferente da habitual, que
mistura antigos conhecimentos a respeito das energias do céu, das poesias antigas, da
meditação e até mesmo da mitologia. Essa visão tão abrangente tem o intuito de gerar
o autoconhecimento, de forma que todo indivíduo se entenda como parte da própria
filosofia e, por fim, parte do universo.

É muito comum que as pessoas tentem definir o Tao por uma necessidade lógica de
raciocínio. Mas a verdade é que Lao Tsé nunca criou essa definição; justamente o contrário,
afirmando por diversas vezes que o Tao não pode ser definido. Uma de suas frases que
gera uma dificuldade de compreensão diz que “o Tao que pode ser definido não é o Tao
Eterno”. Para facilitar esse entendimento, partimos para uma abordagem mais prática.

Podemos dizer que o Tao é a unicidade, o todo. Tao pode ser de diferentes dimensões,
pode ser todo o universo, pode ser todo o planeta, todo o microcosmo. Em cada um, um
Tao, e, em todo o conjunto, outro Tao.

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Outra forma de entendimento do Tao, exemplificada em diversas tentativas de tradução


(como dizer, falar, levar, conduzir, orientar), é a de ser um caminho, um percurso em
direção ao todo, um meio de atingirmos o todo, a evolução espiritual e a imortalidade
no universo, de forma que nossa energia sempre pertence ao conjunto.

O Tao é representado pela imagem abaixo (Figura 1), que, embora muito conhecida,
costuma passar a ideia de divisão, quando, na verdade, é um todo fixo. Nada se separa
do Tao. O correto é que o Tao, indivisível, não é fixo. Do movimento do Tao surgem
duas forças opostas e complementares, Yin e Yang, donas de uma filosofia própria que
veremos em sequência.

Figura 1. O símbolo do TAO.

https://pixabay.com/pt/vectors/yin-yang-yin-yang-tao%C3%ADsmo-34549/.

1.2. Aplicação do TAO na medicina


Partindo do princípio do todo, seja ele universo ou microcosmo, como o nosso corpo,
a harmonia entre as energias e suas relações é fundamental para que haja equilíbrio.
No caso do nosso corpo, equilíbrio é igual a saúde. Portanto, a Medicina Tradicional
Chinesa visa promover uma relação saudável com o ambiente, permitindo o equilíbrio
de nossas emoções, estilo de vida e de nosso fluxo de energia, resultando em saúde. Para
isso, um diagnóstico completo é fundamental, compreendendo o padrão energético do
paciente e seu ambiente, os elementos que prevalecem em seu corpo, regiões de bloqueio
e desequilíbrio energético.

1.3. Yin e Yang


Como mencionamos, o Tao se movimenta constantemente. Aplicando esses movimentos a
todos os fenômenos da natureza, foi realizada uma grande classificação em polos opostos,
chamados de Yin e Yang. O polo Yin contempla as energias mais lentas, menos intensas,
como o frio, a noite, o cuidado, o que é imóvel, pequeno, leve. Por outro lado, a energia
Yang é da força, da luz, do dia, do movimento, da proteção, da ação. Na antiguidade,
o homem sempre foi associado ao Yang e a mulher ao Yin, por suas características

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de luta, caça e força ou de proteção, cuidados familiares e gestação, respectivamente.


Energeticamente e constitucionalmente, essas características ainda prevalescem em alguns
aspectos (como força e gestação), mas se misturaram muito com a nossa evolução. Dessa
forma, assim como tudo é relativo, homens e mulheres também podem ser prevalentes
em Yin ou Yang. Cada caso deve ser observado individualmente.

Essa mesma classificação é aplicada aos Zang Fu, nossos órgãos e vísceras na visão
tradicional chinesa. Os denominados órgãos são os de característica Yin, aqueles com
aspecto maciço, mais frágeis, que precisam de proteção direta das costelas e vértébras:
rins, fígado, coração, baço-pâncreas (que aparecem na MTC como um único órgão
por sua ação energética conjunta) e pulmão. Já as vísceras, Yang, têm aspecto oco,
caracterizadas pelo movimento e resistência: bexiga urinária, vesícula biliar, intestino
delgado, estômago e intestino grosso. Nessa classificação, enquadra-se também o útero,
que é considerado uma víscera especial, pois não tem canal próprido de energia, assim
como a medula e o cérebro, que são Yin.

Para nos auxiliar a compreender as relações e movimentos entre Yin e Yang, existem
três princíos fundamentais: o equlíbrio, a transformação e dependência mútua.

Em um quadro de saúde, Yin e Yang estão equlibrados. Essa harmonia é fundamental para
todo o fluxo energético, e qualquer desequílibrio gera doença. Para que esse equílibrio
se mantenha, Yin e Yang se transformam constantemente um no outro, de forma que,
se um deles se encontra em excesso, essa parte imediatamente se transforma no outro
e restaura o equilíbrio. Para tanto, um sempre depende do outro para se manter. Só
existe o frio porque temos o calor, o dia depende da noite, o movimento, do repouso.

O que determina a natureza Yin ou Yang é sempre a relação. Temos que ter em mente
que essa teoria deriva do Tao, e os polos só existem porque existe o todo. Dessa forma,
Yin e Yang serão sempre comparações e só fazem sentido juntos (por exemplo, o dia só
existe porque existe a noite). Por esse aspecto comparativo, esses polos podem sempre
mudar. Alterando a localização, a função ou a comparação, o que era Yin pode ser tornar
Yang e vice-versa.

Agora vamos olhar para o nosso corpo. Pela teoria, podemos dizer que tudo que está
para fora, pele, membros, cabeça, é Yang, e tudo que não vemos, protegido, é Yin. Agora,
se focarmos na parte externa, comparando membros e tronco, os membros são Yang, e
o tronco passa a ser Yin em relação a eles. Sendo ainda mais específicos, em um único
membro temos a parte lateral, externa, Yang, e a parte medial, interna, Yin.

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O mesmo ocorre no interior. Falamos anteriormente da divisão entre órgãos, yin, e


vísceras, yang. Mas um mesmo órgão sempre terá parte yin e parte yang, como a parte
medular e cortical dos nossos rins.

Dito isso, podemos afirmar que toda estrutura, seja qual for seu tamanho ou complexidade,
sempre poderá ser dividia em Yin e Yang e sempre exercerá essa relação interna e com
tudo que a envolve.

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Capítulo 2
OS 5 ELEMENTOS

2.1. A teoria dos 5 elementos


Outra teoria muito importante, derivada do Tao e diretamente correlacionada ao
movimento e ao Yin e Yang é a teoria dos 5 elementos, que relaciona diretamente
a natureza com o nosso organismo. Nessa filosofia, temos 5 elementos básicos que
compõem tudo que existe, toda a natureza e nosso corpo, sendo eles a água, madeira,
fogo, terra e metal.

Assim como Yin e Yang, os 5 elementos mantém relações diretas entre si, de passagem
e controle energético, sendo fundamental seu equilíbrio para a manutenção de tudo o
que existe. Além disso, cada elemento se associa a um par de órgão e víscera, compõe
um grupo de emoções, manifestações e estrutura do nosso corpo.

Figura 2. Os 5 elementos: Metal, Fogo, Terra, Madeira e Água.

Fonte: Pixabay. https://pixabay.com/pt/photos/cinco-elementos-madeira-fogo-terra-379106/.

2.1.1. Elemento água

Ao elemento água se associam os rins e a bexiga urinária, toda a nossa formação


embrionária, nossa estrutura óssea (e, por consequência, nossa medula e nosso cérebro),
nossa memória. Temos reflexo direto desse elemento, que chamamos de pontos de
abertura, nos cabelos e ouvidos. A emoção relacionada é o medo, e o sabor é o salgado.

2.1.2. Elemento madeira

Ao elemento madeira se associam o fígado e vesícula biliar, nossos músculos e sangue,


tendo abertura nas unhas e nos olhos. A emoção prevalente é a raiva, a explosão, e o
sabor associado é o sabor azedo, cítrico.

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2.1.3. Elemento fogo

O elemento fogo apresenta uma peculiaridade: dois pares de órgãos e vísceras. Em


conjunto com o coração e o intestino delgado, temos outro par de zang fu com atuação
complementar, composto pelo pericárdio e o triplo aquecedor (víscera de característica
totalmente energética, sem correspondência direta com uma estrutura física, disposta
na região torácica, onde se divide em aquecedor inferior, médio e superior). A esse
elemento associamos a mágoa e a euforia, sua abertura é na fala, e seu sabor é amargo.

2.1.4. Elemento terra

No elemento terra temos o par formado por baço-pâncreas e estômago, relacionados ao


sentimento de preocupação. Sua abertura é na boca, e também observamos seus reflexos
no estado de retenção de líquido e ganho ou perda de peso. O sabor associado é o doce.

2.1.5. Elemento metal

Por fim, ao elemento metal correspondem o pulmão e o instestino grosso, controlando


toda a nossa imunidade e se abrindo no nariz e na pele. A eles associamos a tristeza e
o sabor picante.

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Capítulo 3
AS SUBSTÂNCIAS FUNDAMENTAIS

3.1. A teoria das Substâncias Fundamentais


Falamos muito em energia, no seu fluxo e como as diferentes teorias abordam sua
distribuição e movimento. Precisamos agora falar de outra teoria, que classifica essa
energia em diferentes formas e funções: a teoria das substâncias fundamentais.

Embora tudo seja energia da mesma fonte, que chamos de Qi (ou Ki, em algumas
literaturas), essa classificação tem uma função mais didática para entender o que a
energia faz, em cada local, em cada momento e de acordo com a fonte de que provém.

3.1.1. O Qi

Denominamos Qi, nessa classificação, como a verdadeira energia que circula no nosso
corpo e fora dele de maneira invisível; a energia que não conseguimos quantificar,
descrever, mas sentimos. É a energia responsável por todo o movimento, por toda a
nutrição.

Temos o Qi originário da energia celeste, a energia que recebemos do cosmos, do sol, da


respiração, e o Qi que vem da energia terrestre, da força da gravidade, dos nossos alimentos.
Essas energias se assimilam dentro do nosso corpo, são processadas e distribuídas para
todos os nossos órgãos e vísceras, e são fundamentais para o funcionamento de toda
essa engrenagem que é o nosso organismo.

3.1.2. O Xue

O Xue é o nosso sangue, com atividade muito similar ao que estamos habituados na
fisiologia: nutrição de todo o corpo a partir do aporte sanguíneo, das trocas gasosas
e transporte de substâncias. Vale ressaltar que seu movimento depende diretamente
da impulsão dos vasos sanguíneos, cuja energia provém do Qi. Por esse motivo, uma
estagnação de Qi acaba resultando na estagnação de Xue.

O Xue é fundamental para todo o nosso metabolismo, nosso raciocínio, atividade sensorial
e movimento, tendo forte característica Yang. Suas alterações podem relfetir diretamente
na memória e na concentração, causando distúrbios emocionais como a ansiedade, a
insônia e a concetração, além dos aspectos sensoriais como a visão e alterações na pele.
Sua formação depende da energia obtida dos alimentos e do Jing, que veremos adiante.

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Também relacionado intimamente com os órgãos, o Xue tem sua formação dependente
do baço-pâncreas, bem como sua manutenção dentro dos vasos. Seu fluxo depende do
coração (assim como na Medicina Ocidental), e seu armazenamento, do fígado.

3.1.3. O Jin-Ye

A forma mais simples de compreender o Jin-Ye é correlacionando a todo o conjunto de


líquidos corpóreos, com excessão do sangue. Fazem parte desse conjunto o suor, saliva,
secreções, lágrimas, todos os líquidos dentro e fora das nossas células. Sua formação
também é de responsabilidade do baço-pâncreas e do estômago, diretamente relacionados
aos produtos diretos do processo digestivo. Também se associam os intestinos e bexiga
urinária, que, assim como na fisiologia ociental, são responsáveis pela eliminação e
reabsorção de líquidos.

3.1.4. O Shen

A visão e o entedimento do Shen é uma das maiores diferenças entre a Medicina


Tradicional Chinesa e a Medicina Ocidental. Enquanto o Ocidente separa as emoções
das funções metabólicas, a visão oriental integra diretamente essas funções, atrelando
nossas emoções aos nossos órgãos, como vimos na teoria dos 5 elementos.

O shen corresponde a todas as nossas emoções, nossa personalidade, refletindo diretamente


em nossa consciência. É essa energia que nos fornece vitalidade, força de vontade, o
brilho nos olhos, na pele, a alegria natural.

Diretamente associado ao coração, o shen repousa sobre ele à noite, permitindo um


sono tranquilo por meio da pausa da mente.

3.1.5. O Jing

A última das substâncias fundamentais é chamada de Jing ou essência. É a nossa energia


ancestral, herdada dos nossos pais no momento da concepção, como uma herança
energética que fica armezanada nos rins.

O jing é fundamental para a purificação de todas as outras formas de Qi, servindo como
uma reserva que utilizamos sempre que falta energia em algum lugar. Se nos alimentamos
mal, por exemplo, utilizamos o Jing para repor a energia que nos falta.

Essa energia é responsável por toda a nossa formação e crescimento, pelo nosso
desenvolvimento físico e cognitivo e nossa reprodução.

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Por ser herdado, o Jing não pode ser reposto nem modificado. Podemos dizer que
cada indivíduo nasce com uma cota de Jing, que será gasta ao longo da vida, e seu fim
culmina com a morte. Cabe-nos apenas a administração dessa cota por meio de novos
hábitos de vida, controlando nossa alimentação, respiração, quantidade de trabalho,
atividades físicas e repouso. Quanto mais energia adquirimos do ambiente e mais nos
preservamos, menos Jing utilizamos.

Existe ainda uma fração de Jing pós-natal, uma energia que provém dos alimentos e da
respiração e se une ao Jing pré-natal para purificar o Qi do nosso organismo.

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Capítulo 4
OS FATORES PATOGÊNICOS

4.1. Os fatores patogênicos


Pensando na importância da manutenção do nosso equilíbrio energético para o quadro
de saúde, tudo aquilo que é capaz de nos desequilibrar, gerando doença, é classificado
como um fator patogênico. Há critério de classificação: dividimos esses fatores em
externos, internos e variados.

4.2. Os fatores patogênicos externos


Os fatores externos correspondem aos fenômenos da natureza, energias climáticas que
só se tornam patogências quando o nosso organismo está debilitado e não consegue
lidar com a presença delas. Sempre que somos expostos a uma alteração climática, nossa
energia de defesa, chamada Wei Qi, que circula pela pele, entra em ação, impedindo
que esses fatores penetrem no organismo. Quando não estamos em equlíbrio, nosso
Wei Qi enfraquece, e o fator externo se torna mais forte que nossa barreira, adentrando
nosso corpo.

Figura 3. Fenômenos da Natureza: alterações climáticas que influenciam nosso corpo.

Fonte:https://pixabay.com/pt/vectors/previs%C3%A3o-do-tempo-condi%C3%A7%C3%B5es-sol-146472/.

Esses fatores, que são o calor, o frio, o vento, a umidade e a secura, além de desencadear
doenças, geram padrões característicos dentro do organismo, o que auxilia muito
o diagnóstico e a abordagem terapêutica. Essas manifestações dependem tanto das

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caracteristicas do fator invasor quando das condições do organismo invadido, o que


altera muito sua intensidade. Por exemplo, uma pessoa que tem uma debilidade em sua
energia Yin está mais propensa a desencadear padrões da invasão de frio.

Embora esses fatores sejam naturais, a medicina moderna deve se atentar a suas versões
industriais, tão agressivas ou até piores do que as naturais: aparelhos de ar-condicionado,
aquecedores, ventiladores e umidificadores. Em geral, estamos muito mais expostos
aos fatores artificiais, que são causas frequentes de quadros clínicos. Mais uma vez,
entender o seu paciente e todo o ambiente com o qual ele interage é fundamental para
diagnóstico, prognóstico e orientação adequada.

Esses fatores adentram o organismo por diferentes vias, como boca, nariz e pele, de
onde podem seguir até as camadas mais internas do nosso organismo, até atingir os
órgãos e vísceras. Esse percurso depende diretamente da qualidade do nosso Wei Qi. Em
niveis mais superficiais, os desequlibrios são leves, como um resfriado, por exemplo, e
se agravam à medida que penetram camadas mais profundas, como uma gripe.

4.3. Os fatores patogênicos internos


Internamente, também produzimos fatores patogênicos, o que parece bem controverso.
Acontece que nossas emoções, como vimos na teoria dos 5 elementos, estão diretamente
associadas aos nossos órgãos e vísceras, de forma que um desequilíbrio emocional agride
diretamente o zang fu associado.

4.3.1. O medo

O medo é a emoção que afeta o Qi dos nossos rins, fazendo com que todo o Qi do
organismo desça. Às vezes, é dificil o paciente compreender, ou assumir, que sente
medo. O medo pode ser uma fobia, geralmente mais fácil de identificar, mas também
pode ser o medo de uma demissão, de um relacionamento, de perdas. Pode ainda, num
quadro mais difciil de identificar, ser uma manifestação de um medo da infância que
não foi completamente superado. A presença do medo leva a desequilíbrios como a
incontinência urinária, a diarreia e enurese noturna. Pode também afetar o coração e
causar insônia, calor na face, agitação, palpitação, secura na boca e sudorese noturna.

4.3.2. A raiva

A raiva afeta o fígado, fazendo com que o Qi deixe de fluir ou suba para a cabeça, causando
enxaquecas. Está associada também a outras emoções, como fúria, estresse, irritação
constante, frustração, explosividade ou ressentimento crônico. Além de enxaqueca e

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cefaleias mais leves, pode causar zumbido, vertigem, tensões musculares e até se refletir
nas funções digestivas e do coração.

4.3.3. A euforia

A euforia é a emoção que afeta o coração. Muitas vezes ela é traduzida na literatura
como alegria, o que é um grande equívoco: alegria é um estado de felicidade, leveza e
tranquilidade, faz o Qi circular livremente e melhora seu potencial de defesa e nutrição.
A euforia é um padrão de extremo yang mental, agitação excessiva e estímulo mental
contínuo, sem descanso. A euforia desacelera o fluxo do Qi, pois direciona o Yang para
a mente e o coração, causando palpitações, taquicardia, insônia e agitação.

4.3.4. A preocupação

Preocupação afeta o baço-pâncreas e também o pulmão, estagnando o Qi. Muito similar


ao medo e beirando à ansiedade, a preocupação ocupa demais a mente, não permite o
repouso do shen e domina a energia Yang, suprimindo o Yin. O reflexo desse execesso
está na falta de apetite, nas disfunções alimentares e de percepção como a anorexia,
bulimia e vigorexia, nos desconfortos digestivos e epigástricos, diarreia, palidez e flacidez.
Associado ao pulmão, temos falta de ar e tosse seca.

4.3.5. A tristeza

Por fim, temos o sentimento de tristeza, que afeta o pulmão e o coração, fazendo com
que o Qi desça. Como consequência, temos falta de ar e cansaço extremo, desconforto
na região torácica e alterações emocionais severas, como depressão e quadros de choro
descontrolado sem motivo aparente. Nas mulheres, o ciclo menstrual pode ser afetado,
causando amenorreia e agravando o período pré-menstrual.

4.4. Os fatores patogênicos variados


Além dos fatores climáticos e das nossas emoções, outros fatores contribuem diretamente
para desestabilizar nosso equilíbrio e favorecer as patologias. Entre eles, destacamos
a constituição, excesso de trabalho, atividade física e sexual, alimentação inadequada,
traumas físicos, parasitas, venenos e drogas.

Uma constituição debilitada é uma característica herdada dos pais, diretamente associada
ao Jing e ao Shen. Dentro desse quadro, também é importante considerar o quadro
de saúde da mãe durante todo o período gestacional e lactacional, pois essas energias
aumentam a essência pré-celestial do feto e do recém-nascido.

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A falta ou exagero de atividades físicas também preocupa, pois o equilibrio entre atividade
e repouso é fundamental para a transformação de Yin e Yang. O mais comum é vermos
pessoas em excesso ou sedentárias, em uma sociedade com muitas pressões estéticas
e pouca preocupaçao real com a saúde. O desequilibrio entre atividade e repouso afeta
diretamente o Qi, de forma que o excesso gasta energia, e a falta de repouso não permite
a reposição, enquanto o sedentarismo acumula energia e leva ao excesso dela.

De forma semelhante, a falta ou o excesso de trabalho ou de atividade sexual são questões


patogências, pois trabalham a falta ou o acúmulo de energia, seja a nivel físico ou mental.
Sempre que não damos tempo para que o nosso organismo reponha a energia perdida,
acionamos o nosso Jing.

A alimentação irregular é hoje uma das maiores causas de patologias. Embora seja um
dos conhecimentos mais básicos e disseminados, uma boa alimentação é rara em nossa
sociedade. A correria do dia a dia e a praticidade dos alimentos industrializados, sem
contar com a grande quantidade de agrotóxicos que assombra aqueles que ainda buscam
uma alimentação mais natural, agravam muito nossa obtenção de Qi. Uma dieta pode ser
irregular também em quantidade, não apenas na qualidade. Tanto a subnutrição quanto a
obesidade são quadros patológicos, sendo que a malnutrição reflete em deficiência de Qi
e Xue, debilitando o baço-pâncreas, e a alimentação em excesso acaba sobrecarregando
o baço-pâncreas e o estômago.

Os traumas físicos (batidas, cortes, queimaduras) geram uma estagnação local de Qi


e/ou de Xue, variando de acordo com sua intensidade. Se for rapidamente solucionado, um
trauma físico não se agrava, mas, se demorar para se curar, pode levar ao enfraquecimento
da região, tornando-a suscetível a novos traumas, desequilibrios e invasão de fatores
externos.

Mais associados à medicina ocidental, os parasitas, venenos e drogas podem ter seus
efeitos potencializados por deficiências energéticas, como debilidade do Wei Qi, por uma
constituição mais fraca ou presença anterior de outro fator patogênico. Por exemplo, a
presença de umidade no organismo torna o ambiente mais propício para a sobrevivência de
parasitas. O uso indevido de medicamentos ou uso prolongado (medicamentos contínuos)
também leva a alterações severas nas substâncias fundamentais, com graves efeitos
adversos. Muitas vezes, essa é a causa da busca do paciente por métodos alternativos
de tratamento.

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REFERÊNCIAS

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