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UNISOCIESC

A incidência de condenações proferidas com base exclusivamente


na palavra da vítima maior de 14 anos, em casos de crimes sexuais
no estado de Santa Catarina.

GUILHERME SANTOS GALLE


JENNIFER PEREIRA DEFINO

Blumenau – SC

2022
GUILHERME SANTOS GALLE
JENNIFER PEREIRA DEFINO

A incidência de condenações proferidas com base exclusivamente na


palavra da vítima maiores de 14 anos em casos de crimes sexuais no
estado de Santa Catarina.

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado na


Faculdade de Direito da Sociedade Educacional de Santa
Catarina como requisito básico para a conclusão do Curso
de Direito.

Orientador (a): Daisy Neitzke

Blumenau –SC

2022
GUILHERME SANTOS GALLE
JENNIFER PEREIRA DEFINO

A incidência de condenações proferidas com base exclusivamente na


palavra da vítima maiores de 14 anos em casos de crimes sexuais no
estado de Santa Catarina.

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado


adequado à obtenção do título Bacharel em Direito e
aprovado em sua forma final pelo Curso de Graduação em
Direito, da Sociedade Educacional de Santa Catarina.

Orientador (a): Daisy Neitzke

Blumenau, _______________

__________________________________________
Presidente: Prof., Grau
Sociedade Educacional de Santa Catarina.

__________________________________________
Prof., Grau
Sociedade Educacional de Santa Catarina.

__________________________________________
Prof., Grau -
Sociedade Educacional de Santa Catarina.
AGRADECIMENTOS
“Na realidade quem está desejando punir demais, no
fundo, no fundo, está querendo fazer o mal, se
equipara um pouco ao próprio delinquente”
(EVANDRO LINS E SILVA)
RESUMO

É de conhecimento notório que, em caso de incerteza, o juízo deve lastrear-se no in


dubio pro reo – princípio que norteia (em tese) o direito brasileiro e dispõe que na
dúvida, decide-se em favor do réu -, isto se dá na busca de dirimir casos (não tão
raros) de injustiças. Na contramão do senso popular, o presente trabalho tende a
questionar a veracidade da narrativa aposta por vítimas de estupro maiores de 14
(quatorze) anos. Os crimes sexuais, em especial o estupro, em raros casos se
consumam de forma explicita aos olhos de terceiro, sendo a palavra dos envolvidos o
único meio de prova a ser explorado. Dessa forma, pretende-se demonstrar diante da
análise de julgados colhidos entre os anos de 2017 e 2019 no Tribunal de Justiça de
Santa Catarina, a importância da análise psíquica das partes, bem como a análise dos
seus respectivos perfis e históricos, quando sua palavra se torna o único meio
probatório dentro do processo penal. Para essa abordagem este trabalho abordará
brevemente sobre o contexto fático do crime de estupro na história bem como no
ordenamento jurídico brasileiro, também irá explorar os meios de inquirição utilizados
no sistema processual vigente. Quanto à metodologia utilizada, enfatiza o emprego de
mecanismos jurisprudenciais, doutrinários e legais, bem como a forma exploratória.

Palavras-chave: Absolvição. Condenação. Estupro. In dubio pro reo. Laudo Pericial.


Palavra da Vítima. Valor Probatório. Vítima.
ABSTRACT

It is well known that, in case of uncertainty, the court must base itself on the in dubio
pro reo - a principle that guides (in theory) Brazilian law and states that when in doubt,
it decides in favor of the defendant - this is done in an attempt to settle cases (not so
rare) of injustice. Contrary to popular sense, the present work tends to question the
veracity of the narrative of rape victims older than 14 (fourteen) years of age. Sexual
crimes, especially rape, are rarely consummated in an explicit way in the eyes of a third
party, and the word of those involved is the only means of proof to be explored. Thus,
it is intended to demonstrate before the analysis of judgments collected between the
years 2017 and 2019 in the Court of Justice of Santa Catarina, the importance of the
psychic analysis of the parties, as well as the analysis of their respective profiles and
histories, when their word becomes the only evidential means within the criminal
process. For this approach this work will briefly address the factual context of the crime
of rape in history as well as in the Brazilian legal system, it will also explore the means
of questioning used in the current procedural system. As for the methodology used, it
emphasizes the use of jurisprudential, doctrinal and legal mechanisms, as well as the
exploratory form.

Keywords: Absolution. Conviction. Rape. In dubio pro reo. Expert Report. Word of the
Victim. Probatory Value. Victim.
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................9

2. CRIME DE ESTUPRO: ANÁLISE CONCEITUAL...........................................10

2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CRIME DE ESTUPRO....................................11

2.2 EVOLUÇÃO PROCESSUAL DO CRIME DE ESTUPRO ..............................13

3. TEORIA DA PROVA........................................................................................18

3.1 SISTEMAS PROCESSUAIS..........................................................................18

3.1.1 Sistema Processual Acusatório...............................................................19

3.1.2 Sistema Processual Inquisitório..............................................................19

3.1.3 Sistema Processual Brasileiro.................................................................20

3.2 PROVAS NO CÓDIGO DO PROCESSO PENAL...........................................21

3.3 DEPOIMENTO DO OFENDIDO COMO MEIO DE PROVA NOS CASOS DE


CRIMES SEXUAIS.........................................................................................23

3.3.1 O valor probatório da palavra da vítima...................................................24

3.3.2 Vitimização primária, secundária e subjetiva..........................................26

3.3.3 Falsas memórias........................................................................................28

3.3.4 Síndrome da mulher de Potifar.................................................................29

3.4 INQUIRIÇÃO DA VÍTIMA MAIOR DE 14 ANOS..............................................30

3.4.1 Lei nº 14.245/2021 – Lei Mariana Ferrer....................................................31

3.4.2 Realização de acompanhamento psicológico no momento da


Inquirição.................................................................................................33

4. ASPECTOS JURISPRUDENCIAIS NO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA


CATARINA SOBRE A PALAVRA DA VÍTIMA QUANDO UTILIZADO COMO
ÚNICO ELEMENTO DE PROVA.....................................................................34

4.1 JULGADOS RELACIONADOS AO TEMA.....................................................34


4.2 ANÁLISE DAS ALEGAÇÕES UTILIZADAS....................................................43

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................52

6. REFERÊNCIAS...............................................................................................54
9

1. INTRODUÇÃO

A pesquisa visa apresentar a evolução histórica/processual dos crimes de


violência sexual no Brasil, das alterações que a Lei nº 12.015/2009 e a Lei nº
13.718/2018 trouxeram ao Código Penal, além de abordar as implicações que a Lei nº
14.245/21 trouxe ao cenário processual atual.
Busca apresentar ainda como é realizada a oitiva da vítima maior de 14
(quatorze) anos, a partir do inquérito policial até a fase judicial, abordando os principais
meios utilizados para tal inquirição.
Incumbe destacar ainda que vítimas que já ultrapassaram referida idade, não
raras vezes, não estão consumando aquele ato pela primeira vez (perda da
virgindade), incorrendo na ineficiência, consequentemente, do laudo de corpo e delito.
Em relativa maioria, ademais, não há vestígios que determinem de forma
indubitável o que de fato ocorreu, assim sendo, a palavra da vítima se tornou a única
maneira de punir aqueles que cometem o ato tão vil e repugnante.
Nesta seara, atendo-se ao processo penal e doutrinas vigentes, comprovar-
se-á a importância de um acompanhamento imediato, duradouro e eficiente de
profissionais da área da saúde (em especial, psicólogos e psiquiatras) para com tais
vítimas a modo de identificar o perfil comportamental, bem como eventuais distúrbios
e síndromes, como o transtorno de Borderline e a Síndrome da mulher de Potifar.
Não obstante, como também será abordado, alguns desembargadores têm-
se mostrado resistentes a aplicar o princípio in dubio pro reo, proferindo condenações,
por consequência, com base exclusivamente em declarações das vítimas (rasas, em
não raras oportunidades), em depoimentos que foram colhidos sem atentar-se a
fatores (e gatilhos) que poderiam gerar uma declaração dissimulada, ou ainda,
baseada em falsas memorias.
Além disso, discorrer-se-á acerca da falta de uniformização dentre às
Câmaras Criminais do Tribunal de Justiça de Santa Catarina a respeito do tema, uma
vez que, diante de casos que havia apenas a fragilidade palavra da vítima como prova,
as decisões não criam um padrão entre o órgão julgador.
Pretende-se com esta pesquisa chegar a conclusões pontuais e entender as
perspectivas dos juízes e desembargadores ao proferirem as decisões nos casos de
crimes sexuais.
10

No mais, para discorrer sobre os fundamentos empregados para condenar ou


absolver um acusado de crime de estupro, em que sua palavra é a única prova diante
da palavra da vítima, cuja qual também está posta como único elemento probatório,
apresenta-se os julgados do Tribunal de Justiça de Santa Catarina no interregno de
janeiro de 2017 e dezembro de 2019, e seus respectivos fundamentos pelas 5
Câmaras Criminais do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, que por vezes
mantiveram as decisões de primeiro grau que condenaram ou absolver o acusado, por
vezes reformaram afim de condenar ou absolver o réu.
A pesquisa fora realizada no site do tribunal de justiça de Santa Catarina,
utilizando-se as palavras-chave “estupro”, “vítima” e “palavra”, excluindo-se a palavra
“vulnerável”, localizando-se 129 (cento e vinte e nove) processos, dos quais foram
extraídos 8 (oito) para este trabalho.
Emprega-se neste projeto exploratório, mecanismos jurisprudenciais,
doutrinários e legais visando trazer maior compreensão do tema escolhido, detalhando
os argumentos utilizados pelos desembargadores para proferirem as condenações e
para as absolvições, quando a única prova disponível é a palavra do ofendido,
comparando tais acórdãos para alcançar o resultado almejado, que será a inexistência
de segurança jurídica e uniformização das decisões fundamentadas em provas de
igual natureza, dentro do mesmo tribunal de justiça. Entender o porquê de
condenações resultarem apenas deste único meio probatório e as razões pelas quais
após tantos avanços na área jurídica, essa (palavra do ofendido) ainda ter tamanha
relevância no processo penal.

2. CRIME DE ESTUPRO: ANÁLISE CONCEITUAL

A renomada pensadora política da Alemanha no século XX, Hannah Arendt


(1906-1975), afirmou em determinado momento que “vivemos tempos sombrios, onde
as piores pessoas perderam o medo e as melhores perderam a esperança" 1.
Muito embora estivesse vivenciando situação bem diversa de nosso atual
cenário (ascensão de Hitler no comando da Alemanha), referida frase se perdura no
tempo e mostra-se atual e compatível com ambas as sociedades.

1 https://www.pensador.com/frase/MjY4MDEyMg/
11

Adequando-se o pensamento ao tema aqui abordado, crimes sexuais, que ao


longo dos anos tem se manifestado cada vez mais frequente, tornando a insegurança,
em especial de mulheres, cada dia maior.
Tendo isto em mente, o presente capítulo abordará o conceito de crime
sexual, como tal conduta típica se deu pelo tempo e como nosso legislativo se
amoldou à sociedade vivenciada a cada momento.

2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CRIME DE ESTUPRO

Dentre as condutas atualmente tipificadas no Código Penal, verifica-se


algumas que desde os primórdios procedem de repúdio do convívio em sociedade,
como o caso do crime de estupro, conduta esta que sempre sofreu considerável
repudia e punições aos que este ato realizavam.
No Código Penal vigente (1940), o crime de estupro está tipificado no Art.
2132, prevendo, na conduta simples, pena de 6 (seis) a 10 (dez) anos.
Nas palavras de Rogério Greco, define-se:

De acordo com a redação legal, verifica-se que o núcleo do tipo é o verbo


constranger, aqui utilizado no sentido de forçar, obrigar, subjugar a vítima ao
ato sexual. Trata-se, portanto, de modalidade especial de constrangimento
ilegal, praticado com o fim de fazer com que o agente tenha sucesso no
congresso carnal ou na prática de outros atos libidinosos.
Para que se possa configurar o delito em estudo, é preciso que o agente atue
mediante o emprego de violência ou de grave ameaça. Violência diz respeito
à vis corporalis, vis absoluta, ou seja, a utilização de força física, no sentido
de subjugar a vítima, para que com ela possa praticar a conjunção carnal, ou
a praticar ou permitir que com ela se pratique outro ato. (GRECO, 2022, pág.
621).

O conceito empregado para o delito de estupro atualmente, é visível em todos


os povos do mundo e pouco sofreu alteração, no entanto, tratando-se das suas
punições, estas sofrem grande mudança ao longo dos períodos históricos da
humanidade a depender de cada povo.
Os Gregos (1100 a.C. a 146 a.C) e os Romanos (27 a.C até 476 d.C) puniam
os estupradores com a morte. Já os Egípcios (1550 a.C até 1070 a.C) usualmente
mutilavam aquele que estuprasse alguém.

2Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a
praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.
12

Até o surgimento/expansão do Cristianismo pela região da Grécia e Império


Romano não se tinha uma reprovação por parte da sociedade para a realização de
sexo entre adultos e crianças. Tanto o é, que a existência de prostíbulos com escravos
ainda em idade infantil era plenamente aceita socialmente.
Na Grécia antiga, a infância era marcada por muitas ocasiões eróticas, sendo
que em muitos casos as próprias filhas eram estupradas por seus pais e, nessa
cultura, muitas mulheres da Roma e da Grécia não tinham seu hímen integro.
Ademais, vale destacar que não eram apenas as mulheres vítimas desse abuso, pois
muitos filhos homens eram entregues a outros homens mais velhos desde os 07 (sete)
anos, onde eram abusados sexualmente até completarem 21 (vinte e um) anos.
(HISGAIL, 2007, s/p).
Já os povos Hebraicos (2000 a.C), compulsamos a Bíblia 3 , distinguia a
punição para o ato sexual sem consentimento a depender do estado civil da mulher
ofendida, e do local onde o ato se consumou. Sendo a moça ofendida, casada e então
violada em local ermo, o agressor seria punido com a morte, porém sendo a mesma
moça violada em local povoado, ambos sofreriam a pena de morte, ainda dispõe o
livro sagrado dos católicos, que caso a moça fora virgem e o ato se tornar de
conhecimento público, esta deveria se casar com seu agressor.
Seguindo neste mesmo diapasão, temos que no Antigo Oriente a mulher era
claramente tida por objeto, isto se comprova novamente por outro trecho da Bíblia:
“Não cobiçarás a casa do teu próximo, não cobiçarás a mulher do teu próximo, nem o
seu servo, nem a sua serva, nem o seu boi, nem o seu jumento, nem coisa alguma do
teu próximo. (Bíblia, Êxodo, 20:17)”.
No Brasil, este assunto foi regido inicialmente pela norma portuguesa ainda
quando colônia.

3 Quando houver moça virgem, desposada, e um homem a achar na cidade, e se deitar com ela, então trareis
ambos à porta daquela cidade, e os apedrejareis, até que morram; a moça, porquanto não gritou na cidade,
e o homem, porquanto humilhou a mulher do seu próximo; assim tirarás o mal do meio de ti. E se algum
homem no campo achar uma moça desposada, e o homem a forçar, e se deitar com ela, então morrerá só o
homem que se deitou com ela; porém à moça não farás nada. A moça não tem culpa de morte; porque, como
o homem que se levanta contra o seu próximo, e lhe tira a vida, assim é este caso. Pois a achou no campo;
a moça desposada gritou, e não houve quem a livrasse. Quando um homem achar uma moça virgem, que
não for desposada, e pegar nela, e se deitar com ela, e forem apanhados, então o homem que se deitou com
ela dará ao pai da moça cinqüenta siclos de prata; e porquanto a humilhou, lhe será por mulher; não a poderá
despedir em todos os seus dias. Nenhum homem tomará a mulher de seu pai, nem descobrirá a nudez de
seu pai. (Bíblia, Deuteronômio 22:23-30).
13

Após, em 1830, com o advento do Código Criminal do Império, se falou dentro


do crime sexual, pela primeira vez, o termo “mulher honesta”, distinguindo esta das
prostitutas, as quais, se vítimas, ensejariam diferentes punições aos agressores.
A palavra “estupro”, propriamente dita, apenas foi utilizada pelo Código Penal
de 1890. Este que foi duramente criticado à época em razão de ter reduzido as
punições para este crime em relação aos anteriores, sofrendo algumas modificações
pontuais em 1932 com a Consolidação das Leis Penais.
Contudo, as críticas às punições mais brandas apenas iriam surtir efeito com
o advento do Código Penal de 1940, em que houve flagrante evolução técnica por
parte dos legisladores.

2.2 EVOLUÇÃO PROCESSUAL DO CRIME DE ESTUPRO

Conforme citado brevemente no tópico anterior, o crime de estupro foi tratado


no país ainda quando do Brasil Colônia, logo após seu descobrimento (1500 a 1822).
Quando do descobrimento do Brasil em 1500, por Pedro Alvares Cabral, o
estado brasileiro se viu diante da jurisdição de seu colonizador, o estado português,
este que por vez era regido por normas denominadas, Ordenações.
As Ordenações Portuguesas implantadas no Brasil colônia passaram por três
importantes fases, as Ordenações Afonsinas, que vigorou do descobrimento do Brasil
até meados de 1513, quando substituída pelas Ordenações Manuelinas, que por sua
vez, vigorou até 1603, quando da promulgação das Ordenações Filipinas.
Nas Ordenações Afonsinas, o crime de estupro era disposto em seu Quinto
Livro, no Título VI “Da molher forçada, e com fe deve a provar a força”, e dentre
algumas peculiaridades que ali dispõe, destaca-se a necessidade após a
comunicação do ato de estupro, que a mulher abusada seja retirada da casa de seu
pai e levada para a casa de um homem bom ou para a casa de um dos juízes, para
que esta não fosse difamada.
Também traz eu seu texto, situação similar ao tratado pelos Hebreus, quanto
ao abuso ocorrido em lugar ermo ou povoado. Porém, com a ressalva que caso
abusada em lugar deserto, a vítima deveria proferir 5 sinais: gritar os dizeres “vedes
que me fez Foam”, que em tradução livre seria “veja o que me fez fulano”, citando
assim o nome do agressor; deveria estar chorando; durante seu caminho de retorno
para casa, deveria a todos que encontra-se, gritar os mesmos dizeres, “vedes que me
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fez Foam”; e ainda deveria chegar o mais rápido possível a sua vila e ao chegar, esta
deveria procurar a justiça e não entrar em casa. Na falta de qualquer um desses sinais
não seria possível receber as acusações feitas.
Para punir tal ato, as ordenações Afonsinas previam a pena de morte, mesmo
que o abusador viesse a casar-se com a moça violada, sendo tal matrimônio
totalmente ignorado, como se não tivesse existido. Ainda responderia com a mesma
pena, aquele que ajudasse no crime.
Após sua revogação, e então do surgimento das Ordenações Manuelinas,
pouca coisa se alterou, prevendo assim no V livro, desta vez sob o Título XLIII, “Do
que dorme por força com qualquer mulher, ou trava della, ou a leve por sua vontade",
as ordenações Manuelinas dispunham que qualquer homem, de qualquer estado e
condição que forçadamente dormisse com uma mulher a força, ainda que esta fosse
escrava ou prostituta, teria pena de morte.
Ainda seria aplicada a mesma pena àquele que ajudasse e mais, àquele que
desse conselho para tal ato. De mesmo modo, o casamento e até mesmo o
consentimento posterior, por parte da vítima, não isentariam o acusado da sua pena.
As ordenações Manuelinas ainda previam no mesmo título, o termo “traua
della, que em tradução livre, seria “trava dela”, entedia-se com o uso desta expressão
que aquele que constrangesse (trauar) qualquer mulher, seja na rua ou qualquer parte,
seria preso por 30 (trinta) dias na cadeia, além de pagar uma multa àquele que o
acusasse do crime.
Por fim, chegamos à terceira ordenação que regeu o Brasil Colônia antes da
sua independência, seja qual, as Ordenações Filipinas, que previa o crime de estupro
também no Livro V, Título XVIII, ““Do que dorme por força com qualquer mulher, ou
trava della, ou a leve por sua vontade". Quando da vigência das Ordenações Filipinas,
não houve alteração na tipificação do crime, nem a sua pena em relação às
ordenações anteriores.
Enquanto vigente estas normas, as punições para os estupradores eram
definidas com base em quatro fatores: (i) se a mulher era virgem; (ii) se casada; (iii)
se o criminoso possuía bens e (IV) o status social do agressor, estes parâmetros iriam
definir como o caso concreto seria solucionado.
Em seguida, quando da independência do Brasil, tivemos o Código Criminal
Imperial (1830), criado apenas 6 (seis) anos após a Constituição Federal de 1824. O
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art. 2224 (que tratava do crime de estupro e se localizava no capítulo que tratava dos
Crimes contra a Segurança da Honra), cumulava vários delitos sexuais como se
apenas um o fossem.
Previa-se ainda a pena de 3 a 12 anos mais pagamento de um dote em favor
da vítima – apenas se esta não fosse prostituta (mulher honesta)5 -, acaso fosse, a
pena era de apenas 1 mês a 2 anos de prisão.
Discrepante, portanto, a distinção entre as possíveis vítimas, tendo as
tipificado, separando-as em categorias, e menosprezado o sofrimento destas.
Após adveio o Código Penal de 1890 (Republicano), que assim como o
imediatamente anterior, não mais distinguia a mulher virgem, mas apenas em honesta
ou não 6 . Tal crime se localizava no Capítulo que tratava “Dos Crimes Contra a
Segurança da Honra e Honestidade das Famílias e do Ultraje Público ao Pudor”
(MESTIERE apud PRADO, 2001).
Assim como disposto nos códigos anteriores, delimitou-se que o crime de
estupro apenas assim seria considerado acaso a vítima fosse mulher.
Analisando-se as penas previstas, evidente que foram reduzidas em confronto
com as anteriores, dos demais códigos. Diversas foram as tentativas de modificá-lo,
ou até mesmo sucedê-lo, que não ocorreu.
O mais próximo que se chegou de suprimi-lo, foi com a criação da
Consolidação das Leis Penais em 1932, ou seja, 42 anos após sua entrada em vigor,
mas ainda assim, não se é possível afirmar com veemência que realmente houve
mudanças significativas.
A natural profusão de leis durante o período republicano e as tendências muito
vivas no sentido de se rever o Código Penal de 1890 levaram o Governo a promover
uma consolidação das leis existentes.
Havia dificuldades não somente de aplicação das leis extravagantes, como
também de seu próprio conhecimento. Na Exposição de Motivos do Decreto n. 22.213,
de 14/12/1932, o chefe do Governo Provisório admitia o malogro das várias tentativas
de reforma do Código Penal brasileiro “que ora se empreende e ainda tardará em ser

4 Art. 222. Ter copula carnal por meio de violencia, ou ameaças, com qualquer mulher honesta. Penas
- de prisão por tres a doze annos, e de dotar a offendida.
5 Nelson Hungria, enxergava como honesta (mulher) “não só a conduta moral sexual irrepreensível,
como ‘também aquela que ainda não rompeu com o minimum de decência exigido pelos bons
costumes’”
6 Art. 267. Deflorar mulher de menor idade, empregando seducção, engano ou fraude: Pena - de prisão

cellular por um a quatro annos.


16

convertida em lei, não obstante a dedicação e competência da respectiva


Subcomissão Legislativa”.
O trabalho de consolidação foi realizado pelo Desembargador Vicente
Piragibe e continha 410 artigos. Nos termos do decreto de promulgação, o diploma
aprovado não revogava dispositivo da lei em vigor no caso de incompatibilidade entre
os textos respectivos (art. 1º, parágrafo único). (DOTTI, 2011, p. 196).
Não tivemos grandes alterações materiais, apenas algumas acerca da
ortografia, em especial pela soma de outras formas de violência além daquela direta
física.
E por fim, chegamos ao Código Penal de 1940 (vigente), já neste, a conduta
do estupro fora tipificada no capítulo “Dos crimes contra os costumes e contra a
liberdade sexual”.
Nélson Hungria, o qual a autoria do Código Penal é, normalmente, atribuída,
relata que “o novo projeto utilizou de alguns temas específicos dos códigos penais
suíço, polonês e dinamarquês, além daquele projeto de Virgílio de Sá que foi ofertado
anteriormente, em 1927” (HOFFBAUER, 1959, p. 149).
Tal projeto originou o Decreto-Lei nº 2848/1940, que, em que pese tenha sido
sancionado em 1940, apenas entrou em vigor em 1º de janeiro de 1942, eis que
previsão expressa nas Disposições Finais, em seu Art. 361.
Ao longo da atual vigência, o Código Penal sofreu mudanças significativas no
seu texto, a exemplo da alteração feita em 07 de agosto de 2009 quando foi criada a
Lei 12.015/2009, em que alterou dentre outras disposições, em especial o que tange
ao crime de estupro.
As mudanças trazidas pela Lei. 12.015 foram sentidas principalmente quanto
a tipificação das condutas dispostas como violações sexuais, de forma a abranger o
crime de estupro não só ao ato sexual em que há cópula vagínica. Como exemplo
dessa abrangência, possuímos a extinção do art. 214 7 , conhecido como atentado
violento ao pudor, sendo este então incorporado sua redação ao atual artigo 213 do
Código Penal, passando as condutas lá descritas a configurar também como crime de
estupro.

7Art. 214 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com
ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal: Vide Lei nº 8.072, de 25.7.90 (Revogado
pela Lei nº 12.015, de 2009)
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Além disso, valiosa mudança à sociedade fora criada - o crime de estupro não
mais restringia a figura da vítima apenas a pessoas do sexo feminino, possibilitando a
tipificação para quando praticado tal ato contra qualquer pessoa.
Ainda com o advento da Lei 12.015 houve a tipificação de forma exclusiva dos
crimes de estupro praticados com menores de 14 (quatorze) anos, caracterizando
assim o delito de estupro de vulnerável, que passou a ser previsto no art. 217-A, com
pena mais severa, podendo chegar a 15 anos.
A criação de um tipo penal exclusivo para as vítimas vulneráveis contou
também com um rol taxativo, que detém além do crime praticado com crianças em
idade inferior a 14 anos, o crime praticado contra pessoa acometida por enfermidade
ou deficiência mental, que possa afetar seu discernimento para a prática do ato.8
Sendo assim, em distinção ao tratado pelo Código antes da vigência da Lei
12.015, que apenas considerava os sujeitos vulneráveis, a presunção do crime de
estupro, passou então não só a presumir a vulnerabilidade, mas também um aumento
na sua sanção.
Ainda dentre as comutações ocorridas, temos que tanto o crime de estupro,
quanto estupro de vulnerável foram inseridos no rol de crimes hediondos, Lei nº
8.072/90. Situação que reflete no cumprimento de pena dos condenados pelo crime.
No que tange a persecução da ação penal, anteriormente a vigência da Lei.
12.015, regia-se por ação privada, antes disposta no art. 2259 do Código Penal. A
Ação Penal privada era regra aos crimes sexuais apenas sendo suprida quando da
não possibilidade para arcar com os custos processuais.
Com o avanço da legislação desde 1940, percebeu-se a necessidade de
alteração da propositura da ação penal para tal delito, e antes mesmo das alterações
trazidas pela Lei. 12.015, o Supremo Tribunal Federal, a fim de suprir as necessidades

8 Art. 217-A.Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze)
anos:(Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009) Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.(Incluído
pela Lei nº 12.015, de 2009) § 1o Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput
com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a
prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.
9 Art. 225. Nos crimes definidos nos capítulos anteriores, somente se procede mediante queixa. § 1º

Procede-se, entretanto, mediante ação pública: I - se a vítima ou seus pais não podem prover às
despesas do processo, sem privar-se de recursos indispensáveis à manutenção própria ou da família;
II - se o crime é cometido com abuso do pátrio poder, ou da qualidade de padrasto, tutor ou curador. §
2º No caso do nº I do parágrafo anterior, a ação do Ministério Público depende de representação.
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da sociedade, redigiu a Súmula 60810, que previa que diante dos crimes sexuais com
violência real (lesões graves, gravíssimas ou morte), a ação pública incondicionada.
Com o advento da Lei. 12.015, as ações penais que tratam de violência sexual
passaram a ser de regra, públicas condicionadas a representação, salva a exceção
quando das vítimas vulneráveis, que em suma irão reger-se por ação pública
incondicionada.

3. TEORIA DA PROVA

De acordo com Eugênio Pacelli (2002, pág 251), a prova judiciária tem um
objetivo claramente definido: “a reconstrução dos fatos investigados no processo,
buscando a maior coincidência possível com a realidade histórica, isto é, com a
verdade dos fatos, tal como efetivamente ocorrido no espaço e no tempo”.
Isto é fato, provar com exatidão os fatos descritos no decorrer de um processo
penal é algo extremamente complexo. Grande parte das provas que surgem nos autos
possuem algum entrave - quiçá vários -, especialmente quando se fala de extrair a
verdade com base em prova testemunhal e na oitiva do ofendido.
A comprovação dos fatos, isto é, provar que os atos imputados a alguém
realmente ocorreram é um procedimento que surgiu bem antes do formato que hoje
conhecemos, ainda que sempre estivesse presente nos julgamentos.

3.1 SISTEMAS PROCESSUAIS

A história molda nosso modo de pensar, nossos atos, permite-nos aprofundar


conhecimentos e por consequência, traçarmos o rumo ao qual decidimos para a
sociedade em que vivemos.
As leis em cada país são atribuídas grande parte pelo seu momento histórico.
Não se pode desconsiderar toda sistemática enraizada nos cidadãos para se analisar
as leis vigentes em cada local.
Sendo assim, os sistemas processuais são a forma que um país irá reger seu
processo penal, e a depender de seu modelo de Estado (democrático ou não) adotará
um dos sistemas processuais dispostos pela doutrina abaixo elencados.

10Súmula 608/STF: "No crime de estupro, praticado mediante violência real, a ação penal é pública
incondicionada".
19

3.1.1 Sistema Processual Acusatório

O Sistema Processual Acusatório tem origem em meados de 1166 e tem como


prerrogativa que o sujeito lesado leve sua demanda ao judiciário, a fim de que esta
possa ser analisada, processada, e então julgada.
Trabalha com a ideia de que o juiz não interfere no julgamento dos fatos –
agindo como mero conciliador, no intuito de manter a ordem e conduzir a “solenidade”
processual -, assim sendo, tem-se basicamente um grande debate entre a parte autora
da ação e a parte ré, onde cada um utilizava as provas produzidas, no intuito de
provarem suas versões.
Aury Lopes Jr. (2020. P. 57, 58) enumera algumas características marcantes
deste modelo:

a) clara distinção entre as atividades de acusar e julgar;


b) a iniciativa probatória deve ser das partes (decorrência lógica da distinção
entre as atividades);
c) mantém-se o juiz como um terceiro imparcial, alheio a labor de investigação
e passivo no que se refere à coleta da prova, tanto de imputação como de
descargo;
d) tratamento igualitário das partes (igualdade de oportunidades no
processo);
e) procedimento é em regra oral (ou predominantemente);
f) plena publicidade de todo o procedimento (ou de sua maior parte);
g) contraditório e possibilidade de resistência (defesa);
h) ausência de uma tarifa probatória, sustentando-se a sentença pelo livre
convencimento motivado do órgão jurisdicional;
i) instituição, atendendo a critérios de segurança jurídica (e social) da coisa
julgada;
j) possibilidade de impugnar as decisões e o duplo grau de jurisdição.

Apesar das aparentes vantagens e da defesa de um sistema mais justo e


humano, em meio ao período histórico vivenciado na aplicação do sistema Acusatório,
verificou-se a crescente onda de violência e uma baixa representação dos crimes
perante os juízes da época, assim, fortificou-se o modelo processual inquisitório.

3.1.2 Sistema Processual Inquisitório

Influenciado especialmente pelo direito canônico no início do século IV, surgiu


o sistema processual inquisitório, sistema esse que passou a vigorar de forma
substitutiva ao sistema processual acusatório
20

No sistema inquisitório, a figura do juiz, influenciada pelos regimes


monárquicos, se mostra como único e absoluto, sendo ele o responsável pela
acusação e julgamento.
Segundo Denilson Feitoza (2008, p. 33): “O sistema Inquisitivo correspondia
à concepção de um poder central absoluto, com a centralização de todos os aspectos
do poder soberano (legislação, administração e jurisdição) em uma única pessoa.”
No sistema inquisitivo não há que se falar em contraditório e muito menos em
ampla defesa, as provas possuem valores prefixados, as chamadas hoje, provas
tarifadas. Ainda se ressalta que no sistema inquisitivo a prova de maior valor é a da
confissão, raramente sofrendo esta, qualquer objeção.
Sobre isso, esclarece José Laurindo de Souza Netto (2003, p.30):

Especificamente com relação às provas, é importante ressaltar que elas eram


tarifadas por lei (sistemas de prova legal), ou seja, cada prova possuía um
valor probatório diverso, e a confissão era denominada a ‘rainha das provas’,
suplantando qualquer outra, mesmo que obtida mediante tortura. Quanto as
provas documentais e testemunhais, havia uma tarifação, que observava,
principalmente, a condição da testemunha (sexo, parentesco com a vítima
etc.). Havia até mesmo uma graduação para a comprovação de determinados
fatos – por exemplo, um roubo se provava com número específico de
testemunhas masculinas, ou, então, femininas, sendo que um homicídio tinha
sua autoria comprovada por um número diverso.

Outra característica de tal sistema processual era a prisão do acusado que


ocorria no início do processo e se valia como regra durante todo o transcurso
processual.11
No entanto com os acontecimentos históricos, como a revolução francesa, que
conforme dispõe Aury Lopes Jr. (2020, p. 57), postulou de valorização do homem e
dos movimentos filosóficos que surgiram com ela, para influenciar no processo penal,
houve a remoção paulatina das novas características do modelo inquisitivo.

3.1.3 Sistema Processual Brasileiro

O direito penal brasileiro, apesar de já muito se assemelhar ao modelo


acusatório, guarda ainda resquícios do sistema inquisitório, se tornando assim para
muitos doutrinadores, um sistema misto.

11 15 Cf. ARAGONESES ALONSO. Instituciones de Derecho Procesal Penal, p. 42.


21

Aury Lopes Jr. (2020, p. 61), conceitua o modelo misto como sendo a divisão
do processo em duas fases, fase pré-processual (inquérito) e fase processual, sendo
a primeira de caráter inquisitório e a segunda acusatória.
Apesar do entendimento da doutrina majoritária, no ano de 2019, com a
promulgação da Lei. 13.964 (Pacote Anticrime), com redação dada ao Art. 3º-A12 do
Código Penal, consagrou-se que o modelo acusatório deveria ser seguido.
No entanto, em meio a polemicas diante de algumas redações trazidas pela
Lei. 13.964, dentre elas, a redação do art. 3º-A, houve a instauração das ADIn's n.
6.298, 6.299, 6.300 e 6.305, que liminarmente, suspenderam alguns dispositivos da
nova lei, e consequentemente, suas eficácias.
Porém, mesmo que atualmente não haja de forma explicita o modelo a ser
seguido pelo nosso sistema processual, Aury Lopes Jr. (2020, 60) dispõe que:

a Constituição demarca o modelo acusatório, pois desenha claramente o


núcleo desse sistema ao afirmar que a acusação incumbe ao Ministério
Público (art. 129), exigindo a separação das funções de acusar e julgar (e
assim deve ser mantido ao longo de todo o processo) e, principalmente, ao
definir as regras do devido processo no art. 5º, especialmente na garantia do
juiz natural (e imparcial, por elementar), e também inciso LV, ao fincar pé na
exigência do contraditório.

3.2 PROVAS NO CÓDIGO DO PROCESSO PENAL

De acordo com Távora e Alencar (TÁVORA e ALENCAR, 2016, p. 826), “a


prova é tudo aquilo que irá contribuir para a formação do convencimento do juiz, que
irá demonstrar os fatos e até mesmo o próprio direito discutido. O conceito de prova é
a própria essência da sua finalidade, que é convencer aquele que irá julgar”.
A prova processual no direito penal é algo decisivo, seja para absolver seja
para condenar, pelo que tão imprescindível que sua apuração, valoração e conclusão
possibilitem o mínimo de equívocos.
Tourinho Filho exemplifica o sistema Ordálico: “havia a prova da água fria:
jogado o indiciado à água, se submergisse, era inocente, se viesse à tona seria

12 Art. 3º-A. O processo penal terá estrutura acusatória, vedadas a iniciativa do juiz na fase de
investigação e a substituição da atuação probatória do órgão de acusação.
22

culpado [...] A do ferro em brasa: o pretenso culpado, com os pés descalços, teria que
passar por uma chapa de ferro em brasa. Se nada lhe acontecesse, seria inocente; se
se queimasse, sua culpa seria manifesta [...]" (FILHO, 1992, v. 3, p. 216).
Os mecanismos de prova baseados em Deus (ou deuses) tornaram-se
obsoletos por volta do século XVIII, com o surgimento e aperfeiçoamento da forma
que temos o conceito de jurisdição.
Houve um tempo ainda que se falava de prova tarifada. Trata-se de um
formato processual com origem no sistema inquisitivo, e partia do pressuposto de que
as provas já dispunham de valor probatório prefixados pelo legislador, de modo que
ao magistrado apenas era facultado apreciar o acervo probatório conforme já definido
em lei.
Isto é, havia clara hierarquia entre as normas. Com isso em mente, neste
período que surgiu o termo “a confissão é a rainha das provas”, dado que, dentre as
provas possíveis previstas pelo legislador, a confissão possuía maior relevância sobre
qualquer outra.
Outro ponto a se destacar ainda, é que, sob nenhuma hipótese se resolveria
a controvérsia judicial com apenas uma testemunha, testis unus, testis nullus (uma só
testemunha não tem valor).
Tal linha de raciocínio permitia flagrante injustiça, eis que, se para dizer a
verdade existisse apenas uma testemunha, e para a mentira, duas, o testemunho falso
iria prevalecer, em razão da maioridade numérica.
Em que pese tais ideias nunca tenham sido implantadas no Código de
Processo Penal, há situações que remetem a algo próximo a elas, vide art. 158.
Neste artigo foi determinado que em havendo vestígios da infração, não basta
a confissão do acusado, fazendo-se imprescindível o exame de corpo e delito, ou seja,
esta (prova pericial) se sobrepõe àquela.
Tal situação pontuada é um dos motivos pelos quais o sistema processual
penal brasileiro é tido como um modelo misto (acusatório e inquisitório).
Em pesquisa realizada pelo Ministério da Justiça com parceria da Instituição
de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA) em 2015: Em relação ao depoimento
testemunhal prestado em juízo, os problemas mais mencionados foram “o
direcionamento do depoimento quanto aos interesses buscados (30,7%) e a leitura
prévia da ocorrência antes do depoimento (28,8%)”.
23

Ainda, o testemunho foi apontado como a principal prova do processo,


principalmente na hipótese em que houve uma descrição detalhada dos fatos.
Essa consideração vai de encontro à conclusão de Adam Benford, no sentido
de que o sistema de justiça criminal deve deixar de depender de prova da percepção
e da memória humana, falíveis, o que restou evidente em estudos realizados ao longo
do tempo, que se apresentará em seguida.
Dessa forma, conclui-se que as provas são meios de reconstrução da
verdade, sendo assim, há de se prever que a depender do fato a ser provado,
diferentes provas se farão necessárias.
Tendo isso em mente, imprescindível compreendermos a relevância de cada
uma dessas provas, analisá-las em conjunto e individualmente, sem, no entanto, criar
hierarquia entre os presentes.

3.3 DEPOIMENTO DO OFENDIDO COMO MEIO DE PROVA NOS CASOS DE


CRIMES SEXUAIS

“Eu me senti muito mal, uma sensação esmagadora de culpa, porque um erro
havia sido cometido, e eu havia contribuído para isso, tirando dele 11 anos de vida.
Eu chorei, chorei, culpei-me por isso por um longo tempo”13.
Este homem que “perdera” 11 anos de sua vida é Ronald Junior Cotton.
Referida transcrição se trata de um trecho do depoimento de Jennifer
Thompson, que foi publicado em um artigo do Innocence Project.
Jennifer, à época do ocorrido (1984), tinha 22 anos quando fora estuprada em
seu apartamento. Após, compareceu à polícia, realizou a denúncia, fez-se o retrato
falado do agressor, auxiliou nas investigações e reconheceu seu agressor em juízo, o
qual foi condenado à prisão perpétua – muito embora se declarasse inocente durante
todo o trâmite.
Em 1995, através do Innocence Project, com o auxílio do exame de DNA,
recentemente descoberto, provou-se que, o que o acusado havia afirmado ao longo
de todo o processo (sua inocência), era verdade.
No interregno de 1989 e 2014, 325 pessoas tiveram suas condenações
revistas nos Estados Unidos, apenas em razão do auxílio do exame de DNA.

13 L. Rev., V. 79, 2015, p.776.


24

Tais (in)justiças feitas, ainda que em atraso, se deram graças às evoluções


no estudo da biologia, isto se comprova pelos métodos que antigamente eram
utilizados para aferição de culpa do acusado.
Assim, considerável quantia de casos eram “solucionados” de forma incorreta,
dado que o “meio de prova” em muito se afastava da objetividade e exatidão,
características imprescindíveis para se condenar alguém.
Os dados alarmantes citados acima ainda se complementam, outras
constatações tão significantes quanto foram definidas:

De acordo com o Innocence Project, 72% das condenações revistas a partir


da atuação do projeto haviam ido fundamentadas em depoimentos
testemunhais equivocados, isto é, cerca de trės quartos das pessoas
inocentadas haviam sido sentenciadas com lastro em prova testemunhal.
Nos demais casos, 47% envolveram erros relativos à má utilização de
perícias científicas, seguido de 27% com base em falsas confissões e 15%
concernentes ao uso de informantes da polícia. A soma é superior a 100%,
pois algumas situações envolveram mais de uma categoria probatória
equivocada.

Quando tratamos de crimes sexuais e sua instrução processual, é inegável


que a vítima é a prova principal do processo. E isto nem se discute. Não raras vezes,
ela acaba sendo, além de principal e mais robusta, a única prova disponível.
Uma vez único meio de prova existente, se faz necessário que a vítima seja
inquirida da forma mais completa, imparcial e profissional possível, isso porque no
sistema processual acusatório que utilizamos, as provas são o objeto de convicção do
julgador/juiz, de modo que a inquirição necessita ser a menos incisiva possível, algo
ainda muito difícil de ser verificado no mundo fático.

3.3.1 O valor probatório da palavra da vítima

A palavra da vítima mesmo quando desacompanhada de qualquer outro


elemento de prova é validada pelo nosso ordenamento jurídico com um imenso valor
probatório, chegando a tal patamar em razão de todo o contexto histórico envolvendo
a mulher e sua posição de submissão, objetificação e vulnerabilidade em relação ao
homem.
Porém, essa desproporcional valoração frente a outros meios mais seguros
de prova, gera tremendo desequilíbrio no processo penal, que possui dois polos, duas
versões e um sopesamento de uma em relação a outra.
25

Como destacado nos tópicos anteriores, nosso ordenamento visa reconhecer


o meio de prova testemunhal como de grande valor, sendo o principal meio de prova
para decidir os processos penais.
Cabe destacar que historicamente a vítima tem sido colocada em um local
dentro do crime de estupro, apenas como figurante, onde o estado escolhe seu
destino, onde a vítima, mulher, não é ouvida e tem seu agressor como protagonista
que escolhe seu futuro. Diante disto é fundamental que o estado desempenhe um
papel onde a vítima seja colocada como protagonista, onde ela possa escolher seu
futuro com base nas suas ações e que essas ações, e aqui trata-se da escolha de
representar contra seu agressor, seja ouvida e respeitada, dando início a um
procedimento de apuração dos fatos narrados.
Ocorre que após esse primeiro momento, onde há o acolhimento do estado
em relação a vítima, é necessário a ampliação do direito resguardando garantias
individuais de forma que alcance também o acusado, e que esse possa se defender
de forma igualitária.
Nucci (2016, p. 431) afirma que “A palavra isolada da vítima, nos autos, pode
dar margem à condenação do réu, desde que resistente e firme, harmônica com as
demais circunstâncias colhidas ao longo da instrução”. Sendo assim, há margem para
condenações baseadas apenas na palavra da vítima, desde que esta seja coerente e
consistente.
Em contrapartida, essa margem merece ser verificada com cautela, uma vez
que crimes dessa natureza podem estar envoltos de angústias, vinganças e paixões.
Assim, se não houver prova robusta além da palavra da vítima, não pode o réu ser
condenado (LOPES JÚNIOR, 2016, p. 731).
De acordo com Lara Telles (2020, p. 63), a valoração de uma prova como a
análise do nível de força para justificar que um meio probatório pode oferecer a uma
das teses, que pode posteriormente ser confirmada ou não.
Como destacado nos tópicos anteriores, nosso ordenamento visa reconhecer
o meio de prova testemunhal como de grande valor, sendo o principal meio de prova
para decidir os processos penais. Nos casos de crimes sexuais, denota-se com
clareza essa situação, uma vez que a prova testemunhal, seja qual, o depoimento da
vítima, por vezes será o único meio de prova a ser produzido.
Seja pelo teor histórico ou pelo que vemos atualmente com a divulgação
rápida de informações nas redes sociais e mídia que desencadeia um senso de justiça,
26

mas fato é que, colocar a palavra da vítima no mesmo patamar de valoração que a
versão do acusado se tornou algo totalmente descabido.
Como bem pontuado por João Bastista Oliveira (2016, pág 35), a palavra da
vítima deve sim em um primeiro momento ter força e gozo de presunção de
veracidade, haja vista a necessidade social da apuração dos fatos, porém esta
presunção não deve macular os direitos e garantias do ofendido, ante a instrução
processual.
Ocorre que essa valoração pode encontrar algumas barreiras que
posteriormente irão manchar a instrução processual, como falsas memórias,
vinganças e paixões.
Ainda se tratando de casos em que o estupro é realizado por pessoa estranha
ao convívio, envoltos de sentimentos e pensamentos conturbados de tudo que
ocorreu, pode-se gerar confusão e erros quando da identificação do acusado, como
verificamos no início do capítulo.
Assim como afirmado anteriormente, a vítima deve sim, em um primeiro
momento ter força e gozo de presunção de veracidade, haja vista a necessidade social
da apuração dos fatos, porém como dito, deve ficar no campo da especulação ainda,
não devendo sopesar os direitos e garantias do ofendido, ante a instrução processual.

3.3.2 Vitimização primária, secundária e subjetiva

Quando tratamos de vítimas de crimes sexuais menores de 14 (catorze) anos,


tratamos de um acolhimento a parte, mais robusto, criam-se leis de proteção e
procedimentos que visam na menor exposição da vítima, tanto quanto possível.
Amparadas por métodos sofisticados, como o “Depoimento sem Dano”, cria-
se um cenário de extremo resguardando não só à vítima, mas a todos os envolvidos.
Aplicada pela primeira vez em 2003 no estado do RS pelo Juiz de Direito da
2ª Vara da Infância e Juventude, Doutor José Antonio Daltoé Cezar, o Depoimento
sem Dano foi posteriormente, em 2010 amparado pelo Conselho Nacional de Justiça
que encampou a utilização do método dando-o uma nova nomenclatura, passando a
chamá-lo de "Depoimento Especial", onde por meio da Resolução 33/2010
(CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2010) recomendou aos Tribunais a criação
de ambientes especiais para atendimento de crianças e adolescentes vítimas ou
testemunhas de violência (um local reservado, menos formal e “ameaçador” que um
27

ambiente jurídico, como tribunais ou delegacias, por exemplo) e com o apoio de


profissionais especializados que transmitem segurança para que os depoimentos
sejam colhidos.
Profissionais especializados, por assim dizer, nas especificidades das vítimas,
e não no caso. Ou seja, busca-se capacitados em atender as necessidades dos
envolvidos menores.
Essa atenção voltada ao depoimento de crianças e adolescentes vítimas de
violência sexual se deu, pois, como disposto pelo próprio juiz José Antonio, “as
informações prestadas na fase policial não se confirmavam em juízo”, sendo que tal
fato criava “situações de constrangimento e desconforto para todos”, mas
especialmente à criança e aos adolescentes, sendo que ao final as “ações
terminavam, na sua maior parte, sendo julgadas improcedentes, com base na
insuficiência de provas.”
Assim, todo o trâmite processual restava inútil, dado que sequer se
apresentou qualquer resposta concreta aos envolvidos.
Conforme exposto, existe uma severa preocupação em evitar que a vítima
ainda criança seja obrigada a reviver todo o trauma já sofrido.
Tal situação não se molda às vítimas maiores de 14 anos, que possuem outros
procedimentos mais enrijecidos.
Prosseguindo, destacamos a existência de um tipo de vitimização que pode
ser chamada de subjetiva. Ela se manifesta apenas no temor de alguém se tornar
vítima de uma ofensa, ou ainda, no exagero desta quanto aos efeitos de uma ofensa
sofrida, de forma desproporcional e desconexa à realidade. Vale a lição do professor
Alvino Augusto de Sá (1996. P. 17), que conceitua a vitimização subjetiva como sendo:

Aquela na qual se constrói e se promove a figura de uma vítima, com um perfil


definido de prejuízos e sofrimentos, sem que, porém, ocorra uma ofensa real
e objetiva. E, se a ofensa existe, não apresenta absolutamente a proporção
e a dimensão que se lhe quer atribuir, a partir do suposto alcance e suposta
gravidade dos prejuízos e sofrimentos da vítima.

Cabe destacar que a vitimização nada mais é do que as consequências de


um evento traumático sob a vítima, essa vitimização no âmbito do estudo da
criminologia, se divide em 4 principais tipos, a ser destacado neste projeto, os 2
primeiros.
28

A vitimização primária são os efeitos diretos desencadeados na vítima após o


evento, são efeitos desde psicológicos até materiais, que decorrem da ação imposta
à pessoa vitimizada.
A vitimização secundária, por sua vez, é a vítima perante os responsáveis do
sistema jurídico estatal que irão lhe amparar. São os efeitos que um processo penal
acarreta à resolução dos fatos ocorridos e seu impacto na vida pessoal/profissional,
da vítima.
Diante disso, percebe-se ainda mais a importância de um acompanhamento
na inquirição da vítima, e que essa atenção prestada se estenda à todas as vítimas,
contenham elas, mais ou menos de 14 (catorze) anos.
Esta preocupação se dá para que, além dos sofrimentos que não se é possível
evitar (traumas diretos do crime ocorrido), a vítima não venha a desencadear ainda
outros durante o procedimento.

3.3.3 Falsas Memórias

A memória, pode ser entendida como a capacidade de adquirir, armazenar e


recuperar informações, conforme palavras de Robert Sternberg (2012, p. 153).
António Damásio assevera que “sempre que recordamos de um dado objeto,
um rosto ou uma cena, não obtemos uma reprodução exata, mas antes uma
interpretação, uma nova versão reconstruída do original”. (DAMÁSIO, 1996, p. 116)
Em que pese a área da psicologia seja vasta e detalhada, quando tratamos
de casos de estupro, sem dúvidas será a área mais próxima à do direito para que se
possa se chegar à verdade dos fatos.
Por isso é tão importante tratar dos perfis comportamentais e transtornos que
podem vir a atingir os comunicantes de violência sexual.
É imprescindível que os profissionais ligados a ocorrências consigam
identificar esses perfis, como por exemplo, o Transtorno de Borderline.
O indivíduo que sofre com esse transtorno de personalidade é extremamente
propenso a ter repentinas mudanças de humor e a tendência a apresentar
comportamentos impulsivos, além de vulnerabilidade à pseudomemória e fantasias.
De acordo com estudos realizados, 90% dos casos de pacientes com essa
doença teriam sido vítimas de violência sexual, contudo, em sua maioria, os relatos
eram embasados em falsas memórias.
29

Nesta perspectiva fica fácil entender a importância de traçar um perfil logo de


início em supostas vítimas de crimes sexuais, isto porque, assim que fornecida a
constatação de que há tendência de que o relato seja distorcido, irá resguardar os
investigadores.
Dessa forma, se assim não fosse, irá somar-se com os elementos do
processo, como interrogatórios, sugestionamentos do ocorrido e sopesando a falta de
preparo dos operadores do direito no momento da inquirição, criando um cenário
perfeito para a construção de uma narrativa totalmente contrária aos fatos originais.

3.3.4 Síndrome da mulher de Potifar

Diversas pessoas, em algum momento de sua vida, já ouviram falar de


Síndrome da Mulher de Potifar, especialmente se inserido no mundo do direito.
Este é um ponto no universo da psicologia que merece grande destaque ao
tratarmos de crimes sexuais, explico.
Utilizada no campo da criminologia, o termo corresponde a um texto bíblico,
em Gênesis, Capítulo 39, o qual se destaca o seguinte trecho:

Sucedeu num certo dia que ele veio à casa para fazer seu serviço; e nenhum
dos da casa estava ali;
E ela lhe pegou pela sua roupa, dizendo: Deita-te comigo. E ele deixou a sua
roupa na mão dela, e fugiu, e saiu para fora.
E aconteceu que, vendo ela que deixara a sua roupa em sua mão, e fugira
para fora,
Chamou aos homens de sua casa, e falou-lhes, dizendo: Vede, meu marido
trouxe-nos um homem hebreu para escarnecer de nós; veio a mim para
deitar-se comigo, e eu gritei com grande voz;
E aconteceu que, ouvindo ele que eu levantava a minha voz e gritava, deixou
a sua roupa comigo, e fugiu, e saiu para fora.
E ela pôs a sua roupa perto de si, até que o seu senhor voltou à sua casa.
Então falou-lhe conforme as mesmas palavras, dizendo: Veio a mim o servo
hebreu, que nos trouxeste, para escarnecer de mim;
E aconteceu que, levantando eu a minha voz e gritando, ele deixou a sua
roupa comigo, e fugiu para fora.
E aconteceu que, ouvindo o seu senhor as palavras de sua mulher, que lhe
falava, dizendo: Conforme a estas mesmas palavras me fizeram teu servo, a
sua ira se acendeu. Gênesis 39:11-19

A história conta os fatos ocorridos com Potifar, capitão egípcio da guarda do


palácio real, que comprou um escravo de nome José.
30

Após a chegada de José, a mulher de Potifar começou a sentir forte atração


pelo escravo, imaginando inclusive a ideia de ter conjunção carnal com ele. Porém
José, fiel a Potifar, recusava-se em compactuar com o adultério.
José era atraente e de boa aparência, e, depois de certo tempo, a mulher
começou a cobiçá-lo, nunca obtendo retorno positivo. Assim, embora ela insistisse
com José dia após dia, ele se recusava a deitar-se com ela e a evitava.
Diante das infrutíferas tentativas, a mulher de Potifar tentou coagi-lo por uma
última vez, a manter a relação carnal, porém, novamente teve seu pedido negado.
Assim sendo, na oportunidade o acusou de ter lhe forçado a ter relações com
ela. Logo, José foi preso por Potifar que lhe imputou o ato de abuso sexual.
Tal história não se tornou tão famosa à toa, esta é uma hipótese que sempre
deve ser ventilada ao se receber uma denúncia de crimes sexuais.

3.4 INQUIRIÇÃO DA VÍTIMA MAIOR DE 14 ANOS

Dentro de uma perspectiva mais abrangente, verifica-se que vítimas menores


de 14 anos, processualmente chamadas de vulneráveis, assim o são no claro intuito
de preservar (na medida do possível) seu processo de desenvolvimento, e a qualidade
deste.
Com isso, no processo penal brasileiro, principalmente em casos de crimes
sexuais (mais abordado aqui) com vítimas ainda em idade tênue, há um maior cuidado
para com essas, despende-se uma atenção e zelo bem superior quando comparado
a casos com vítimas já adultas. Mas ressalta-se, o tratado lá empregado, é o que
deveria se oferecer para todas, sem distinção.
E conforme destaca João Batista Oliveira (2016, p. 59), “a vitimização
secundária é comum a vítimas de crimes sexuais de qualquer idade, consequência da
natureza desse tipo de violência, a qual deixa marcas traumáticas profundas por atingir
a intimidade humana na sua forma mais significativa, atentando ao corpo e psiquismo
da vítima.”
Em outro momento, afirma ainda que “a ineficácia no julgamento dos
processos envolvendo crimes sexuais se dá não só à má condução das provas em
geral, mas pela incansável busca pela verdade baseada na vítima como um todo, seja
no seu corpo através de laudos periciais ineficazes ou seja pela inquirição, de forma
incorreta que enseja muitas vezes na vitimização secundária.” (Oliveira, 2016 p. 39).
31

Por fim, conclui que “a inquirição judicial deve evoluir a um paradigma que
hoje se posiciona como ato isolado no processo para um ato dinâmico que se constrói
desde a notícia crime.” (Oliveira, 2016, p. 40).
Os trechos retirados acima se complementam e corroboram com o já
destacado ao longo desta pesquisa, eis que em diversos momentos durante a fase
investigativa, busca-se tanto a punição para alguém, que acaba deixando de lado o
núcleo de toda essa problemática, e ponto mais importante, o estado mental da vítima
e como ajudá-la dali em diante.

3.4.1 Lei nº 14.245/2021 – Lei Mariana Ferrer

Em 15 de dezembro de 2018 ocorreu o julgamento que repercutiu no Brasil, o


caso da Jovem Mariana Ferrer foi julgado duas vezes, pelo tribunal catarinense e pelo
povo brasileiro que acompanhou através das redes sociais (este apenas trechos dos
autos e do que realmente foi o caso).
Apesar do clamor popular, as alegações de estupro atribuídas a A.C.A em
face de Mariana, foram julgadas improcedentes. No entanto, a onda de indignação
trazida pela absolvição e principalmente pela maneira a qual a audiência de instrução
foi conduzida, geraram reflexos em especial, no Código de Processo Penal.
Em trechos divulgados nas redes sociais é possível observar o depoimento
colhido da vítima, Mariana, na data dos fatos, já maior de idade, onde a mesma é
inquirida pelo magistrado presente e pelo advogado de defesa.
Nos trechos é possível observar a inquirição não apenas voltada aos fatos
narrados na inicial acusatória, mas também ao modo de vida da vítima e a forma como
ela se apresenta na sociedade, atitude esta da defesa, severamente questionada (e
até repudiada) por leigos e até mesmo por outros operadores do direito.
Não obstante, a forma conduzida na inquirição de Mariana lhe trouxe a
vitimização secundária, que é claramente visível nos trechos divulgados, onde a
mesma aparece abalada diante dos questionamentos e da maneira incisiva das
perguntas realizadas, onde em diversos momentos é necessária uma pausa para que
pudesse se recompor.
Em busca de aprimorar a condução da audiência de instrução frente a crimes
sexuais, em especial em defesa à integridade da vítima, tramitou em 2020 o projeto
lei 5096, visando a alteração do Art. 400, Código de Processo Penal.
32

Em justificativa para apresentação do projeto a então deputada LÍDICE DA


MATA (PSB/BA) ressaltou o despreparo do poder judiciário frente a oitiva das vítimas
de crimes sexuais, o qual em contrapartida ao acolhimento, permite a tortura
psicológica das vítimas em momentos de fragilidade.
Após tramitação regular, em 22 de novembro de 2021, o projeto de lei foi
sancionado pelo então Presidente da República, o qual acrescentou no atual Código
de Processo Penal, os artigos 400-A14 e 474-A15, a fim de que as partes presentes na
audiência de instrução, trabalhem a fim de preservar a integridade da vítima, seja ela
física ou psicológica, bem como vedou a manifestação de argumentos e apresentação
de documentos com teor alheio a apuração dos fatos, que desta forma possam
denegrir a imagem da vítima.
Mais uma vez, em que pese a honrável tentativa de criar um meio de proteção
às vítimas, criou-se mais um obstáculo para a defesa, onde se encoraja que a palavra
da vítima seja prova suficiente dos fatos, e que sua palavra não deve ser questionada
de modo a não lhe causar uma nova vitimização.
Eduardo Luiz Santos Cabette (2022, s/p) dispõe que quando a lei limita a
referência a questões alheias aos fatos objeto de apuração, bem como o uso de
linguagem, informações ou materiais que possam ser ofensivos à vítima ou
testemunhas acaba por restringir e tornar insegura a atuação dos defensores.
Cabette (2022, s/p) ainda chama atenção ao fato de que de um lado
possuímos um total culpado e do outro uma total vítima, onde para o culpado, se vale
de todos as circunstâncias para condenar e aplicar-lhe a pena, vide o Art. 59 do Código
de Processo Penal, e quanto a vítima, se emprega o máximo possível de esforço para
que apenas sua palavra sirva de credibilidade para manter sua sanidade, vide o
surgimento da Lei 14.245.

14 Art. 400-A. Na audiência de instrução e julgamento, e, em especial, nas que apurem crimes contra a
dignidade sexual, todas as partes e demais sujeitos processuais presentes no ato deverão zelar pela
integridade física e psicológica da vítima, sob pena de responsabilização civil, penal e administrativa,
cabendo ao juiz garantir o cumprimento do disposto neste artigo, vedadas:
I - a manifestação sobre circunstâncias ou elementos alheios aos fatos objeto de apuração nos autos;
II - a utilização de linguagem, de informações ou de material que ofendam a dignidade da vítima ou de
testemunhas.
15 Art. 474-A. Durante a instrução em plenário, todas as partes e demais sujeitos processuais presentes

no ato deverão respeitar a dignidade da vítima, sob pena de responsabilização civil, penal e
administrativa, cabendo ao juiz presidente garantir o cumprimento do disposto neste artigo, vedadas:
I - a manifestação sobre circunstâncias ou elementos alheios aos fatos objeto de apuração nos autos;
II - a utilização de linguagem, de informações ou de material que ofendam a dignidade da vítima ou de
testemunhas.
33

Destaca-se que referido PL, altera não só o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de


dezembro de 1940 (Código Penal), mas também a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de
1995 (Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais).

3.4.2 Realização de acompanhamento psicológico no momento da Inquirição

Conforme se discorreu anteriormente, nem sempre há um acompanhamento


adequado às vítimas, dado que ao que muitas vezes transparece, o único objetivo do
processo, é o encerramento deste o quanto antes, e a qualquer curso. Neste sentido
leciona João Batista Oliveira:

Há uma clara ineficácia do método usado na inquirição de vítimas no sistema


penal brasileiro, e essa ineficácia advém de todo um sistema processual
baseado em apenas condenar ou absolver, ou seja, na mera finalidade de
resolver o litígio, sem se preocupar com o impacto social da decisão, seja ela
em detrimento da vítima ou do acusado, e ainda, da sociedade no geral, visto
por vezes tratar de um crime real que necessita de além da sanção, a
prevenção de novos casos. (Oliveira, 2016, p. 39).

Tal inaptidão, não apenas no que tange à preparação do corpo e delito, mas
até mesmo para a oitiva da vítima, é resultado de uma fragmentação, entre as áreas
de atuação profissional dentro do processo penal, onde o Estado como provedor dos
meios, falha quando não percebe que profissionais do direito, bem como os
profissionais da saúde, deveriam juntos, criar o melhor cenário dentro do processo
penal.
Necessário entender que o acompanhamento a ser realizado não deve ser
algo exclusivo apenas no momento de inquirição perante o magistrado, e sim tratar de
um acompanhamento desde a notícia do crime, a fim de conseguir um melhor
desempenho não apenas na busca da verdade, mas também no intuito de resguardar
as memórias ainda presentes, bem como evitar uma vitimização secundária ao longo
do processo.
“Os procedimentos de cautela que tratamos desde o início, em fase de
investigações, impedem inclusive que depoimentos se corrompam por influência de
terceiros, bem como em face de publicidades”. (Oliveira, 2016, p. 41).
“Neste sentido, é necessário que haja uma interdisciplinaridade do direito com
a psicologia e a psiquiatria” (João Batista, 2016 p. 230), objetivando que o depoimento
da vítima possa ser o mais eficiente ao processo e menos prejudicial a sua intimidade.
34

É inquestionável que no modelo atual, para inquirição de vítimas maiores de


14 anos, estão atuando profissionais desprovidos de qualquer experiência técnica
para identificar e entender perfis comportamentais (como já abordado anteriormente
nesta pesquisa), o que, consequentemente, e até de forma involuntária, influencia nos
depoimentos, podendo acarretar inclusive em memórias falsas a depender do perfil
comportamental da vítima.
Por fim, leciona João Batista (2016, p. 230), “é necessário que os
questionamentos dos peritos passem de mero papel coadjuvante e possibilitem a
avaliação prévia ou ainda, se possível, conclusiva da veracidade do relato da vítima
no início do procedimento investigativo, e assim possa inibir a repetição de
inquirições.”

4. ASPECTOS JURISPRUDENCIAIS NO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA


CATARINA SOBRE A PALAVRA DA VÍTIMA QUANDO UTILIZADO COMO
ÚNICO ELEMENTO DE PROVA

Objetivando uma melhor compreensão de como nosso tribunal atua em casos


envolvendo violência sexual, utilizando-se apenas dos elementos já apurados na
instrução do processo, replica-se aqui alguns julgados dos últimos 5 (cinco) anos, dos
quais é possível pontuar os argumentos ventilados pelas nossas 5 câmaras criminais
nos julgamentos daqueles.
Nos tópicos abaixo, pontuaremos trechos dos votos dos relatores, bem como
das denúncias realizadas, confrontando-as às provas presentes nos autos.

4.1 JULGADOS RELACIONADOS AO TEMA

A fim de constituir uma linha de raciocínio consistente sobre as


argumentações nas absolvições proferidas pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina,
entendemos prudente que se traga à baila inicialmente o contexto fático no qual foram
julgados.
Neste sentido, tem-se como primeiro recurso a ser destacado, a Apelação nº
0000214-36.2013.8.24.0084, cujo processo fora julgado no ano de 2017 pela Segunda
Câmara Criminal, sob a relatoria do Desembargador Sérgio Rizelo, o qual trata-se de
35

possível crime de estupro, que teria sido praticado em duas ocasiões, ambas em 2015,
na cidade de Belmonte/SC.
Na referida apelação, interposta pela promotoria de justiça, ressalta-se a
narrativa do magistrado de primeiro grau sobre as fragilidades das provas produzidas,
que não puderam por si só concluir que o ato ocorreu contra a vontade da vítima. 16
Tal fato criminoso teria ocorrido sem a presença de testemunhas dentro da
residência da vítima, que por sua vez alega possuir retardo mental moderado, tais
fatos apresentam controvérsias entre as partes envolvidas sobre o então
consentimento para o ato.17
Situação semelhante ocorreu nos autos da Apelação n. 0000723-
98.2015.8.24.0050, julgado no ano de 2018, na mesma Câmara, sob regência do
mesmo relator, Sérgio Rizelo, a qual foi interposta pela Promotoria de Justiça, e teve
negado provimento, a fim de que a sentença prolatada pelo magistrado de primeiro
grau, na cidade de Pomerode/SC18, fosse reformada e o réu fosse condenado pela

16
APELAÇÃO CRIMINAL. ESTUPRO (CP, ART. 213, CAPUT). SENTENÇA ABSOLUTÓRIA.
RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. 1. PROVA DA VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA.
CONTRADIÇÃO NAS DECLARAÇÕES DA VÍTIMA. PALAVRAS DO MARIDO E DA SOBRINHA.
LAUDO DE LESÃO CORPORAL. FRAGILIDADE DO CONJUNTO PROBATÓRIO. 2. DEFENSOR
DATIVO. NOMEAÇÃO PARA ATUAR NO FEITO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS (CPC, ART. 85, §§
2o E 8o). 1. A existência de contradições nas declarações da vítima, aliada ao laudo de lesão corporal,
que não atestou qualquer tipo de violência, e ao fato de que os demais informantes apontam a
possibilidade de ela ter inventado que foi forçada pelo acusado a praticar os atos sexuais com ele,
diminui o valor probante das palavras daquela e das provas daí decorrentes, devendo ser mantida a
absolvição do agente por insuficiência probatória. 2. Faz jus à remuneração fixada de modo equitativo
o defensor nomeado para atuar no feito e que apresentou razões de apelação. RECURSO
CONHECIDO E DESPROVIDO. DE OFÍCIO, FIXADOS HONORÁRIOS AO DEFENSOR DATIVO.
17
Denúncia Apelação n. 0000214-36.2013.8.24.0084 “Fato 1: No dia 28 de dezembro de 2012, no
período vespertino, na linha São José, s/n, interior do município de Belmonte/SC, o denunciado G. G.
agindo consciente e voluntariamente, teve conjunção carnal, mediante violência, com a vítima L. L. P.,
a qual não tinha o discernimento necessário para consentir com o ato, tampouco poderia oferecer
resistência, uma vez que acometida de deficiência mental (retardo mental moderado, consoante
atestado de fl. 25). Registra-se que o denunciado, objetivando satisfazer seu desejo sexual e
aproveitando-se da ausência do Sr. J. A. K., curador provisório de L. L. P. (fl.24), bem como da relação
de confiança que tinha com a curatelada, porquanto era casado com uma tia dela, lançou mão de seu
maior porte físico para, à força, manter relação sexual contra a vontade da vítima, gerando vermelhidão
em seu órgão genital, conforme laudo pericial de fl. 07. Fato 02: No dia 29 de dezembro de 2012, no
período matutino, no mesmo local acima descrito, o denunciado G. G. agindo consciente e
voluntariamente, teve pela segunda vez conjunção carnal, mediante violência, com a vítima L. L. P.
Destaca-se que o indiciado, objetivando mais uma vez satisfazer sua ânsia libidinosa e aproveitando-
se da ausência momentânea de Sr. J. A. K, que havia ido até o centro de Belmonte para fazer compras,
forçou-a a manter relação sexual, ameaçando-a, ainda, de causar mal injusto e grave, afirmando que
a matéria caso ela contasse algo ao seu marido (fl. 15). Enfatiza-se, por oportuno, que o acusado sabia
do estado de saúde mental da vítima, pois é pessoa próxima, valendo consignar, ainda, que ao ser
questionado sobre os fatos pela testemunha C. da S., afirmou, em tom jocoso, que "foi ela quem queria",
tendo rido e desligado o telefone em seguida (fl. 22) (fls. II-IV).”
18 APELAÇÃO CRIMINAL. ESTUPRO (CP, ART. 213, CAPUT) E AMEAÇA (CP, ART. 147, CAPUT).

SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DA IMPUTAÇÃO. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. 1.


DELITO DE AMEAÇA. PRESCRIÇÃO. PENA MÁXIMA INFERIOR A UM ANO. SENTENÇA DE
36

suposta prática do crime de estupro ocorrido no ano de 201519. A decisão também foi
fundamentada nas contradições nos depoimentos dos envolvidos sobre a vontade de
ambas as partes para a realização do ato.
Em se tratando ainda de teses absolutórias, traz-se o terceiro recurso de
Apelação, de nº 0000467-24.2013.8.24.0084, julgado no ano de 2019, pela Primeira
Câmara Criminal do TJSC, de relatoria do Doutor Desembargador Ariovaldo Rogério
Ribeiro da Silva20.
Tal recurso se originou da insurgência da promotoria de justiça quanto aos
fatos alegados na inicial acusatória21, que trata da suposta prática do crime de estupro

ABSOLVIÇÃO. MARCOS INTERRUPTIVOS. TRANSCURSO DO PRAZO. 2. PROVA DA


MATERIALIDADE DO DELITO CONTRA A LIBERDADE SEXUAL. PALAVRAS DA VÍTIMA E DE
INFORMANTE. CONTRADIÇÕES. RESULTADO NEGATIVO DO LAUDO PERICIAL DE PESQUISA
DE ESPERMA. NEGATIVA DO ACUSADO. IN DUBIO PRO REO. 1. Se é cominada pena máxima
inferior a 1 ano para o delito, o prazo prescricional é de 3 anos. Superado tal interregno entre a data do
recebimento da denúncia e a do presente julgamento, extingue-se a punibilidade do acusado, restando
prejudicada a análise da pretensão recursal. 2. Tratando-se de crime contra a dignidade sexual, a
palavra da vítima possui elevado valor probante. No entanto, verificadas contradições internas e
externas nas declarações da ofendida, aliadas à negativa do suposto agressor acerca da conjunção
carnal e ao resultado negativo do exame de pesquisa de espermatozoides, revela-se devida a
manutenção da absolvição do acusado, com fundamento no princípio in dubio pro reo. RECURSO
PARCIALMENTE CONHECIDO E DESPROVIDO. DE OFÍCIO, DECLARADA EXTINTA A
PUNIBILIDADE DO APELADO QUANTO AO CRIME DO ART. 147 DO CÓDIGO PENAL.
19
Denúncia Apelação 0000723-98.2015.8.24.0050: “Fato 1: Em de 21 de junho de 2015, durante a
madrugada, na residência onde convivia com a vítima T. A. da S. buscando satisfazer a concupiscência
própria, o denunciado J. J. S. D. constrangeu a vítima a com ele praticar conjunção carnal, ameaçando-
a com uma faca de cozinha, com lâmina de 17,5 cm, e agredindo sua integridade física, causando-lhe
as lesões descritas no laudo de fl. 30.Fato 2: No mesmo dia, ainda na residência dos envolvidos, na
frente dos policiais militares que já estavam no local, o denunciado ameaçou a vítima de causar-lhe mal
injusto e grave, dizendo que a mataria caso fosse preso (fls. 33-34).”
20 APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL. ESTUPRO ARTIGO 213,

CAPUT E § 1o, DO CÓDIGO PENAL. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. RECURSO MINISTERIAL.


CONDENAÇÃO. CONJUNTO PROBATÓRIO AMEALHADO AOS AUTOS QUE DÃO CERTEZA DA
AUTORIA DELITIVA. IMPERIOSA REFORMA DA DECISÃO GUERREADA. IMPOSSIBILIDADE.
ABSOLVIÇÃO POR AUSÊNCIA DE PROVAS. DEPOIMENTOS INARMÔNICOS, CONFLITANTES.
LATENTE DÚVIDA QUE ALMEJA ABSOLVIÇÃO. IN DUBIO PRO REO. ARTIGO 386, INCISO VII DO
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. DECISÃO DE ORIGEM MANTIDA. ABSOLVIÇÃO IMPOSTA.
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO
21
Denúncia Apelação n. 0000467-24.2013.8.24.0084 “[...] na madrugada do dia 5 de maio de 2013,
aproximadamente às 3:30h, nos fundos do ginásio municipal de esportes, situado na rua José Pietroski,
no centro de Descanso/SC, especificamente no interior da cabina do caminhão VW/7110S, placas LXE
9637, o denunciado A. C. constrangeu a vítima A. M. W., mediante grave ameaça, a ter com ele
conjunção carnal. Registra-se que o acusado, a fim de satisfazer sua lascívia. Conduziu A. ao lado
externo do ginásio municipal e ofereceu-lhe cerveja, o que a deixou sem capacidade de determinação.
Ato continuo, A. C. puxou a vítima pelo braço e levou-a até a cabina do caminhão VW/7110S, placas
LXE 9637, que estava estacionado nos fundos do ginásio, local em que, contra a vontade dela, de
forma agressiva e ameaçando-a de morte acaso contasse o que ocorria naquele momento a alguém,
arrancou as vestes da vítima e manteve com ela conjunção carnal. Vale dizer que a conduta narrada
acarretou na vítima, além de fortes dores que a levaram a desmaiar, lesão corporal de natureza grave
(perigo de vida), conforme atesta s resposta ao quesito “5” do laudo pericial de conjunção carnal de fls.
55/56, já que A. teve choque hipovolêmico (perda intensa de sangue), devido às lacerações em seu
órgão genital, lesões estas oriundas da conjunção carnal não consentida. [...].”
37

ocorrido em 2013 na cidade de Descanso/SC, alegações essas que vem mais uma
vez corroborar a ideia de que sendo a palavra da vítima inconsistente durante seus
depoimentos, esta não merece credibilidade o suficiente para ensejar uma
condenação.
Necessário pontuarmos que neste caso em específico, diferentemente dos
anteriores, houve a vinculação de um laudo pericial atestando que houve a prática do
ato sexo, e que tal ato teria ocasionado as lesões na genitália da vítima. Todavia, o
parecer se mostrou inconclusivo acerca do consentimento da suposta vítima para a
prática do ato sexual, tendo em vista que este poderia ter ocorrido de forma consentida
e ainda assim ocorrerem os mesmos ferimentos.
Neste sentido, mais uma vez, em sendo as provas frágeis a ponto de ensejar
uma condenação, julgou-se improcedentes as acusações, tanto pelo magistrado de
piso e quanto pelo Tribunal Catarinense, em sede recursal.
Em que pese as ementas até aqui possam nortear a primeira parte desta
pesquisa, se faz necessário para um maior aprofundamento, a análise de mais um
julgado de extrema relevância, sendo o próximo, a apelação de n. 0001689-
84.2011.8.24.0023, distribuído na Quarta Câmara Criminal do TJSC, de relatoria do
Desembargador Sidney Eloy Dalabrida, julgada no ano de 201922.
Tal julgado dispõe de crime cometido contra menor de 18 anos, porém,
afastada a vulnerabilidade por ser maior de 14 anos à época dos fatos. O ato teria

22APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE ESTUPRO QUALIFICADO CIRCUNSTANCIADO (ART. 213, §


1o, C/C O ART. 226, II, AMBOS DO CP). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA.
PRELIMINAR. NULIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. ALEGADA FALTA DE ACESSO AOS ARQUIVOS
AUDIOVISUAIS REFERENTES AOS DEPOIMENTOS DAS TESTEMUNHAS, TODOS
DISPONIBILIZADOS NOS AUTOS COM ANTECEDÊNCIA. DEFESA QUE NÃO ADUZIU,
ANTERIORMENTE, A DIFICULDADE DE ACESSO AOS DEPOIMENTOS, BUSCANDO
SOLUCIONAR A QUESTÃO. ADEMAIS, ADVOGADO QUE, MEDIANTE SIMPLES REQUERIMENTO
AO CARTÓRIO JUDICIAL, OBTEVE CONTATO COM OS DOCUMENTOS PRETENDIDOS.
AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. HIPÓTESE DE VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM. EXEGESE DO
ART. 565 DO CPP. VÍCIO AFASTADO. MÉRITO. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO POR AUSÊNCIA DE
PROVAS. DEPOIMENTOS DIVERGENTES PRESTADOS PELA VÍTIMA, ACERCA DE QUESTÕES
CRUCIAIS RELACIONADAS AO FATO DELITUOSO. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE
CORROBOREM A VERSÃO DA ACUSAÇÃO. DÚVIDA ACERCA DA VEROSSIMILHANÇA DAS
ALEGAÇÕES DA VÍTIMA. IN DUBIO PRO REO. ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE (ARTIGO 386, VII,
DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL). SENTENÇA REFORMADA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
COM BASE NA TABELA DE HONORÁRIOS DA OAB. NÃO CABIMENTO. VERBA QUE DEVE SER
ARBITRADA DE ACORDO COM A ATUAÇÃO DO DEFENSOR, OBSERVADOS OS DITAMES DO
ART. 85, §§ 2o e 8o, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, COMBINADO COM O ART. 3o DO CÓDIGO
DE PROCESSO PENAL E ANEXO ÚNICO, ITEM 10.1, DA RESOLUÇÃO CM N. 5 DE 8 DE ABRIL DE
2019. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS RECURSAIS. NÃO CABIMENTO. MONTANTE FIXADO NA
SENTENÇA SUPERIOR AO QUANTUM ESTABELECIDO NA REFERIDA RESOLUÇÃO. RECURSO
CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE.
38

ocorrido no ano de 2010, na Capital do estado Catarinense, Florianópolis, e após


instrução proferiu-se sentença no sentido de condenar o acusado pelo crime de
estupro, com a agravante da idade da vítima, disposta no art. 213 §1º do Código Penal,
conforme dispositivos da denúncia23.
Deste julgado cabe ressaltar erro material cometido na denúncia, onde o
promotor de justiça imputou a capitulação do art. 217-A24, ao crime ocorrido, situação
esta modificada na prolação da sentença, com base no art. 383 25 do Código de
Processo Penal a fim de constar a capitulação do art. 213 do Código Penal, para o
delito em questão.
Após prolação da sentença condenatória houve insurgência da defesa, que
apresentou recurso de apelação de forma tempestiva, tendo seu apelo conhecido e
provido pela câmara, que verificou não só inconsistência no depoimento da vítima,
como também nos depoimentos de testemunhas atreladas ao caso, que teriam
assistido à vítima após o ocorrido.
Diante dos outros fatos até aqui discorridos, este ao contrário daqueles não
dispôs de divergência quanto ao consentimento do ato e sim sobre a sua ocorrência,
de modo que após análise dos elementos de prova presentes (laudo pericial e
depoimentos de testemunhas não oculares), prevaleceu a dúvida da ocorrência dos
fatos narrados pela vítima, havendo assim a reforma da sentença de primeiro grau e
a consequente absolvição do réu.

23 Denúncia Apelação n. 0001689-84.2011.8.24.0023: “ Consta no inquérito policial, que em data que


não é possível precisar, mas no mês de julho de 2010, por volta do meio-dia, no interior da residência
da família, localizada na rua da *, n. *, bairro Vila Aparecida, nesta cidade e comarca, o denunciado J.
de M. praticou atos libidinosos com a vítima J. C. B., sua enteada, nascida em 28. **.1996, a qual, em
razão de deficiência mental, não tinha o necessário discernimento para a prática do ato. Na ocasião, a
genitora da vítima havia saído e incumbido a vítima de preparar o almoço, sendo que o denunciado
deveria cortar a carne. Em razão disso, a vítima chamou o denunciado, que se encontrava no quarto,
para que viesse até a cozinha a fim de cortar a carne. Tendo em vista que o denunciado não atendia
aos seus chamados, a vítima foi até o quarto para acordá-lo. Nesse momento, o denunciado, a fim de
satisfazer os seus vis instintos sexuais, constrangeu, mediante violência, puxando a vítima para cima
da cama onde ele estava deitado, tirou-lhe a roupa e passou a acariciar o corpo dela passando as mãos
nos seios, nas nádegas e na vagina da infante. Ato contínuo, o denunciado a colocou de costas para
ele e passou a se masturbar entre as nádegas da vítima, ejaculando sobre o corpo dela. Após ter
consumado o ato, o denunciado, objetivando manter o sigilo da vítima, advertiu-lhe, em tom ameaçador,
que não contasse nada para a sua mãe (fls. 2-4).”
24 Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze)

anos:(Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009) Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos
25 Art. 383. O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-

lhe definição jurídica diversa, ainda que, em conseqüência, tenha de aplicar pena mais grave. (Redação
dada pela Lei nº 11.719, de 2008).
39

Findada a verificação das sentenças absolutórias proferidas pelo TJSC, é


necessário discorrermos sobre algumas condenações de modo a trazer, ao final, uma
melhor compreensão de quais elementos processuais sopesam em uma absolvição
ou condenação.
Apuradas dentro do mesmo lapso temporal, as condenações proferidas pelo
tribunal demonstram uma linha tênue entre ambas as possibilidades processuais de
decisão. Vejamos.
Em Apelação Criminal de nº 0002211-80.2012.8.24.0022, julgada no ano de
2018 pela Primeira Câmara Criminal, sob relatoria de Ariovaldo Rogério Ribeiro da
Silva26, verificou-se a reforma da decisão do juiz de primeiro grau da Comarca de
Curitibanos/SC que julgou parcialmente procedente as imputações descritas na inicial
acusatória 27 , havendo assim a desclassificação do crime de estupro inicialmente
imputada, para o crime de violência sexual mediante fraude, art. 215 do Código Penal.
Inconformada com a sentença prolatada, a promotoria de justiça recorreu de
tal decisão, alegando não fraude para a incorrência do ato, mas sim de violência, que
configuraria o delito do art. 213 do Código Penal (estupro).

26
APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL. ESTUPRO (ARTIGO 213 C/C
ARTIGO 226, INCISO II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL). DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DE
VIOLAÇÃO SEXUAL MEDIANTE FRAUDE (ARTIGO 215, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL). RECURSO
EXCLUSIVO DA ACUSAÇÃO. LAUDO PERICIAL QUE CONCLUIU PELA INEXISTÊNCIA DE
VESTÍGIOS DE VIOLÊNCIA QUE, POR SI SÓ, NÃO DESCARACTERIZA O DELITO DE
ESTUPRO.MATERIALIDADE E AUTORIA DEVIDAMENTE COMPROVADAS. PALAVRA DA VÍTIMA
NOS CRIMES SEXUAIS. ESPECIAL IMPORTÂNCIA. [...] O crime de estupro, geralmente, não resulta
vestígios no corpo da vítima, em que se tem admitido a dispensa de laudo pericial conclusivo, em
especial quando existem nos autos outros elementos aptos a comprovar a materialidade delitiva, tais
qual as declarações firmes e uníssonas da vítima e dos testigos, que servem, ainda, como fundamento
bastante ao apontamento da autoria do crime. Nesse contexto, é cediço que, com relação aos crimes
contra a liberdade sexual, por via de regra, a imputação da responsabilidade é insuscetível de
demonstração com base em vestígios ou mediante declarações de testemunha ocular, dada a
peculiaridade de que são praticados na clandestinidade (qui clam comittit solent), revestindo-se, assim,
a palavra da vítima, em casos tais, de relevância preponderante, mormente se suas assertivas
mostrarem-se associadas com a realidade dos autos e demais elementos de prova (TJSC, Apelação
Criminal (Réu Preso) n. 2010.078632-1, de Urussanga, rel. Des. Salete Silva Sommariva, j. em 23-5-
2011). CARACTERIZAÇÃO DO DELITO DO ARTIGO 215 DO CP QUE NECESSITA DA EXISTÊNCIA
DE UM ESTRATAGEMA DESTINADO A FAZER A VÍTIMA ACREDITAR EM UMA SITUAÇÃO QUE A
LEVA AO ATO DESEJADO PELO AGENTE. NÃO OCORRÊNCIA. NECESSIDADE DE REFORMA.
CONDENAÇÃO PELO DELITO DESCRITO NO ARTIGO 213, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL.
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
27 Denúncia do recurso de Apelação n. 0002211-80.2012.8.24.0022: “Na data de 9 de novembro de

2011, em horário incerto, porém durante a madrugada, o denunciado Ezequiel Luiz Ribeiro, irmão da
vítima, que estava residindo na mesma casa que a vítima, sito à Rua Ângelo Soncini, (final da Rua),
travessa Direita, Bairro Bom Jesus, neste município de Curitibanos, constrangeu sua irmã, Mara
Aparecida Ribeiro de Souza, mediante violência, enquanto esta dormia, consistente em segurá-la pelos
braços e tampar a boca, à prática de conjunção carnal, conforme faz prova o laudo pericial de fls.
14/15.”
40

Tendo isto em mente, importante distinguirmos os artigos supracitados. E para


isso, colaciona-se definição de Rogério Greco:

De acordo com a redação legal, verifica-se que o núcleo do tipo é o verbo


constranger, aqui utilizado no sentido de forçar, obrigar, subjugar a vítima ao
ato sexual. Trata-se, portanto, de modalidade especial de constrangimento
ilegal, praticado com o fim de fazer com que o agente tenha sucesso no
congresso carnal ou na prática de outros atos libidinosos.
Para que se possa configurar o delito em estudo, é preciso que o agente atue
mediante o emprego de violência ou de grave ameaça. Violência diz respeito
à vis corporalis, vis absoluta, ou seja, a utilização de força física, no sentido
de subjugar a vítima, para que com ela possa praticar a conjunção carnal, ou
a praticar ou permitir que com ela se pratique outro ato. (GRECO, 2022, pág.
621).

Os fatos teriam (em tese) ocorrido no ano de 2011, envolvendo um casal de


irmãos, importante ressaltar, ambos em idade adulta. Atesta a vítima em primeiro
momento, em fase de investigação, ter sido abusada sexualmente, inclusive com
emprego de violência para o ato.
Em segundo momento em fase de instrução, alega que apesar do
constrangimento empregado para a incorrência do ato sexual, o mesmo não envolveu
violência, narração essa que corrobora com o laudo pericial acostado aos autos do
processo que nada atestou no que se refere a vestígios de violência sexual.
Ainda assim, mediante inconsistência no depoimento da vítima corroborada
com a oitiva de duas testemunhas não oculares, houve a alteração do delito
empregado ao réu, sendo-lhe imputada condenação pelo crime de estupro com pena
fixada em 09 (nove) anos de reclusão em regime fechado.
De igual modo, verifica-se a reforma na sentença de primeiro grau no recurso
de Apelação de nº 0000563-38.2017.8.24.0039, recurso este movido pela acusação e
julgado em 2019 pela Quarta Câmara Criminal diante da relatoria de Zanini
Fornerolli28.

28 APELAÇÃO CRIMINAL – ESTUPRO PRATICADOCONTRA MENOR DE 18 (DEZOITO) ANOS E


MAIOR DE 14(QUATORZE) ANOS DE IDADE (ART. 213, §1°, IN FINE, DO CÓDIGO PENAL) –
SENTENÇA ABSOLUTÓRIA – RECURSO DA ACUSAÇÃO. PRETENDIDA CONDENAÇÃO DO
ACUSADO – ALEGADA EXISTÊNCIA DE PROVAS ACERCA DA MATERIALIDADE E AUTORIA
DELITIVA – PROCEDÊNCIA – PALAVRA DA VÍTIMA FIRME E COERENTE COM AS DEMAIS
PROVAS COLHIDAS NO PROCESSO – LAUDOPERICIAL, ADEMAIS, ATESTA A PRESENÇA DE
LACERAÇÃO RECENTE – SENTENÇA MODIFICADA. Tratando-se de crime praticado na
clandestinidade, como o estupro, sem qualquer testemunha ocular dos fatos, a palavra da vítima
assume especial relevância, ainda mais quando as declarações são coerentes e estão amparadas em
outros elementos de prova colhidos no processo, sendo suficiente para embasar o decreto
condenatório. RECURSO PROVIDO
41

A referida apelação discorre sobre a acusação do crime de estupro ocorrido


no ano de 2017, no município de Lages/SC, tendo como vítima uma adolescente de
14 (quatorze) anos à época dos fatos. O pleito do órgão ministerial ataca o fato de que
a vítima, mediante a dissimulação do acusado, foi obrigada a manter relação sexual
de forma violenta29 por mais de uma hora.
Mesmo diante de incontestáveis contraversões no depoimento da vítima e das
testemunhas, bem como um laudo pericial que nada comprovava, consoante
abordado pela própria câmara julgadora, o acusado teve sua sentença reformada e
condenação fixada em 14 (quatorze) anos em regime inicial fechado.
De forma similar ao caso anterior, depreende-se do julgamento proferido pela
Quinta Câmara Criminal do TJSC, nos autos do processo de n. 0001293-
19.2018.8.24.0167, em 2019 sob a regência de Antônio Zoldan da Veiga30.

29 Denúncia Apelação n. 0000563-38.2017.8.24.0039: “a vítima J.A.L.S ao tempo dosfatos ora narrados


possuía 14 (quatorze) anos de idade, condição que era de pleno conhecimento de L.G. Sob tal
circunstância, no dia 19 de janeiro, por volta das 06 horas, no interior do imóvel situado na rua [...], n°
[...], bloco [...], apto. [...], Condomínio [...], bairro [...], em Lages, ciente da ilicitude do ato e com vontade
dirigida para agir conforme ele, além da finalidade de satisfazer a sua lascívia, L.G constrangeu a vítima
J.A.L.S, mediante violência, a ter consigo conjunção carnal e a com ela praticar/permitir que se
praticassem atos libidinosos diversos(beijos lascivos e sexo oral). Para a consecução do ilícito L.G
conduziu a vítima até o interior de sua residência, ocasião em que tentou beijá-la, e, ante negativa,
desferiu 01 (um) tapa no rosto de J.A.L.S; em seguida, a vítima solicitou ao denunciado um carregador
de celular para que pudesse contatar sua mãe, o qual respondeu que o acessório estaria em seu quarto.
Ludibriada, J.A.L.S ingressou no cômodo e foi de pronto surpreendida pelo denunciado, que empurrou-
a contra a cama, apoiou seus joelhos sobre os braços da adolescente, despiu-se e obrigou a mesma a
fazer sexo oral (consistente em chupar o pênis do denunciado). Na sequência, L.G arrancou as roupas
da menor, teve com ela conjunção carnal, e, ao finalizar a prática delituosa, obrigou-a novamente a
realizar sexo oral do mesmo modo como antes da cópula vagínica. A conduta foi agravada pela
dissimulação, pois o denunciado fornecia carona à vítima por ocasião do fato, e, sob o pretexto de
necessitar de dinheiro para abastecer o veículo automotor conduzido, fez com que J.A.L.S
inocentemente o acompanhasse até o imóvel em que reside, o que viabilizou o desenvolvimento de
seu intento criminoso. Assim agindo, incidiu L.G nas sanções do artigo 213, §1°, in fine, do CP,
agravado pela dissimulação (CP, art. 61, inciso II, letra c).”
30 APELAÇÃO CRIMINAL (ART. 593, I, DO CPP). ESTUPRO QUALIFICADO (ART. 213, § 1º, DO CP).

SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. MATERIALIDADE E AUTORIA


INCONTESTES. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO PAUTADO NA SUPOSTA INEXISTÊNCIA DE PROVA
DO DISSENSO DA VÍTIMA SOBRE O ATO SEXUAL. PALAVRA DA OFENDIDA EM SOLO POLICIAL
E EM JUÍZO FIRME, COERENTE E APTA A INDICAR QUE A PRÁTICA SEXUAL OCORREU
CONTRA A SUA VONTADE. DESCRIÇÃO DE VIOLÊNCIA E GRAVE AMEAÇAEMPREGADA PARA
A CONSUMAÇÃO DO CRIME. VERSÃO AMPARADA POR OUTROSELEMENTOS DE PROVA.
PROVA SEGURA APTA A AMPARAR A CONDENAÇÃO. DOSIMETRIA (ART. 59 DO CP).
PRETENDIDO O AFASTAMENTO DA EXASPERAÇÃO DA PENA NA PRIMEIRA FASE.
CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. RÉU QUE SE IDENTIFICOU FALSAMENTE COMO POLICIAL
MILITAR PARA GANHAR A CONFIANÇA DA VÍTIMA. FATO RELEVANTE E QUE JUSTIFICA O
INCREMENTO DA PENA. CONSEQUÊNCIAS DO DELITO. OFENDIDA ACOMETIDA DE DANOS
PSICOLÓGICOS SEVEROS EM RAZÃO DO COMPORTAMENTO CRIMINOSO. FATO QUE
EXTRAPOLA AS CONSEQUÊNCIAS NATURAIS DO COMPORTAMENTO E JUSTIFICA O
AUMENTO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
42

No caso em apreço, ocorrido no município de Garopaba/SC, no ano de 2018,


o Ministério Público denunciou o réu pela prática do crime de estupro, agravada pela
idade da vítima, menor de 18 anos à época dos fatos31.
De contraponto ao apresentado até aqui, este recurso se deu por insurgência
da defesa após a condenação em primeiro grau, em que fora o acusado condenado à
pena de 10 (dez) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime fechado nos termos
da inicial acusatória.
A defesa em suas nas razões de apelação bem pontuou que o ato sexual
imputado foi realizado de forma consentida pela vítima, que inclusive apresentou
versões distintas nos depoimentos prestados. Frisa-se a não existência de
testemunhas oculares. Além de que a condenação se deu com base em laudo pericial
que apenas fora aportado aos autos sem nenhuma conclusão relevante a ensejar tal
decisório.
Em que pese as pontuações cruciais apresentadas nos autos do recurso,
houve a manutenção da condenação proferida em primeira instância.
E por fim, contempla-se o julgado de nº 0001212-56.2009.8.24.0015,
distribuído à Quarta Câmara Criminal, de relatoria do desembargador Alexandre
d’Ivanenko, julgado no ano de 201932.

31 Denúncia da Apelação n 0001293-19.2018.8.24.0167: “No dia 4 de agosto de 2018, por volta das
4h00min, em local que poderá ser especificado durante a instrução processual, no bairro Encantada,
nesta comarca de Garopaba, o denunciado E.F.V. constrangeu a vítima R.M.R.P. com 17
(dezessete) anos de idade, mediante grave ameaça consistente em ordenar a vítima não resistir para
não lhe "acontecer o pior", a com ele manter conjunção carnal e atos libidinosos diversos da conjunção
carnal, tudo a fim de satisfazer a sua lascívia. Registra-se, por oportuno, que o denunciado E.F.V.
aproveitou-se da circunstância de que a vítima R.M.R.P. caminhava pela via pública sem a companhia
de qualquer outra pessoa, oportunidade em que se aproximou dela e se apresentou como sendo policial
"Major Oliveira". Na sequência, E.F.V. ofereceu carona para a vítima R.M.R.P. em sua motocicleta
Honda Repsol, placa MLZ-0067, com subterfúgio de que a levaria para casa em segurança, tendo a
vítima acreditado nas palavras de seu agressor em razão do denunciado estar trajando um colete tático
preto e portar uma tonfa (espécie de cassetete). Foi nesse contexto que o denunciado E.F.V. acabou
levando R.M.R.P para um lugar ermo e de matagal, onde mediante grave ameaça constrangeu a vítima
a com ele praticar conjunção carnal, sexo oral e até mesmo tentativa de coito anal.”
32 APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A LIBERDADE SEXUAL. TENTATIVA DE ESTUPRO

(ART. 213, CAPUT, C/C ART. 14, INC. II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA
CONDENATÓRIA. RECURSO DEFENSIVO. PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.
MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS DEVIDAMENTE COMPROVADAS. RÉU QUE, APÓS
CHEGAR EM CASA EMBRIAGADO E PROFERINDO AGRESSÕES VERBAIS CONTRA SUA
ESPOSA, TENTA MANTER RELAÇÃO SEXUAL NÃO CONSENTIDA, APENAS NÃO LOGRANDO
ÊXITO NA CONSUMAÇÃO EM RAZÃO DE A OFENDIDA TER CONSEGUIDO ATINGIR-LHE A
CABEÇA E FUGIR. PALAVRAS DA VÍTIMA FIRMES E COERENTES. CONDENAÇÃO MANTIDA. "A
partir do momento em que a vítima diz "não", e se recusa a ter qualquer tipo de intimidade com o
acusado, os atos por ele perpetrados, contra a vontade da ofendida, são suficientes para configurar a
prática delitiva prevista no art. 213, caput, c/c o art. 226, II, ambos do Código Penal, independente da
relação de afeto existente entre as partes" (TJSC, Apelação Criminal n. 0004085-10.2011.8.24.0031,
de Indaial, rel. Des. Luiz Neri Oliveira de Souza, Quinta Câmara Criminal, j. 23-08-2018).HONORÁRIOS
43

O fato descrito na denúncia compete a uma de tentativa estupro ocorrida em


contexto doméstico, entre a vítima e seu ex-companheiro, fatos ocorridos na cidade
de Canoinhas/SC33. Findada instrução processual houve a condenação pelo crime
imputado (estupro tentado), sendo o réu condenado à pena de 03 (três) anos de
reclusão, em regime inicial aberto.
Condenação esta rechaçada pela defesa que pugnava pela absolvição,
motivo pelo qual interpôs recurso de apelação. Aduziu a defesa que a condenação se
deu apenas com base na palavra da vítima, situação que se confirma ao longo da
prolação do voto, que não atesta a presença de testemunhas oculares e nem mesmo
laudo pericial.
Ainda se fez presente diversas divergências na versão apresentada pela
vítima, divergências estas totalmente desconsideradas pela câmara julgadora que
manteve a condenação proferida em primeiro grau.

4.2 ANÁLISE DAS ALEGAÇÕES UTILIZADAS

Diante dos julgados apresentados anteriormente, procederá neste momento


a análise comparativa dos argumentos utilizados nos referidos votos, que, conforme
abordado previamente, já se verificou não conter um padrão entre as Câmaras, por
vezes nem mesmo entre os desembargadores de uma mesma câmara criminal
quando da análise de diferentes casos com as mesmas características.
De início, destaca-se a realização e utilização do laudo pericial no contexto do
crime sexual, o qual conforme verificado, dentre os 8 julgados apresentados, apenas
um contou com sua ausência (Apelação nº 0001212-56.2009.8.24.0015).
O laudo pericial, que atesta ou não a presença de violência sofrida no ato
sexual, bem como a consumação do ato em si, tem alto valor probante, inclusive
quando desacompanhado de outros elementos, como testemunhas, que possam

ADVOCATÍCIOS. DEFENSOR NOMEADO PARA ATUAR NA DEFESA DO RÉU A PARTIR DA


APRESENTAÇÃO DAS RAZÕES RECURSAIS. VERBA DEVIDA E FIXADA NOS MOLDES
ESTABELECIDOS NARESOLUÇÃO N. 5, DO CONSELHO DA MAGISTRATURA DESTE TRIBUNAL
E NÃO NOS MOLDES DA OAB, CONFORME REQUERIDO. ACOLHIMENTO, EM PARTE. RECURSO
CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
33 Denúncia da Apelação de n. 0001212-56.2009.8.24.0015: “na noite de dia 25 de dezembro de 2008,

o acusado chegou em casa embriagado, proferindo palavras de calão contra a honra da vítima, sendo
que em seguida rasgou as roupas desta e tentou constranger J. P. F., sua esposa, à prática de
conjunção carnal, apenas não consumando o delito em razão de a ofendida ter alcançado uma
"santinha" (pequena estátua que estava na cabeceira da cama e então golpeado a cabeça de A.,
conseguindo assim se livrar do ataque.”
44

corroborar com a palavra da vítima, conclusão esta que estampada nos julgados
apresentados, que proferiram a absolvição do réu. Isto porque, como já explorado no
início deste trabalho, o estupro tem como sua característica básica, o uso de violência.
Vejamos o caso discorrido de autos n. 0000723-98.2015.8.24.0050, o qual em
relato prestado pela vítima, aduz que sofreu de violência física por horas para que
houvesse a consumação do ato sexual.
Porém no laudo realizado “não apontou nenhuma lesão corporal na Vítima,
não obstante ela tenha relatado que foi subjugada e teve sua boca tampada por cerca
de 6 horas, e que, durante todo o tempo, foi segurada pelos braços pelo Apelado (fl.
30).”
Não diferente do esperado, trata-se esse de um dos casos de absolvição pela
na Segunda Câmara Criminal.
Situação essa que nos leva ao caso n. 0002211-80.2012.8.24.0022, de muita
semelhança, se não fosse a diferença de ter sido julgado pela Primeira Câmara
Criminal, incorrendo na condenação do réu.
Neste caso, do município de Curitibanos, verifica-se mediante apenas a
palavra da vítima, a afirmação de ocorrência de violência, acompanhada, porém de
um laudo pericial atestando que não há indícios de violência. Ainda assim, a
argumentação usada para proferir a condenação foi totalmente contraditória pelo
próprio relator. Vejamos o primeiro trecho:

Ocorre que, o fato de o laudo pericial consignar não haver vestígios de


violência contra a vítima, por si só, não tem o condão de afastar a
materialidade do delito, pois, como cediço, o crime de estupro, na maioria das
vezes, não deixa vestígios, restando comprovado, então, pela prova
testemunhal, principalmente pela palavra da vítima, quando firme e coerente.

Temos que, no referido caso, não há testemunhas oculares do fato, bem como
não há que se falar em relato firme e coerente da vítima, uma vez que, há divergência
nos depoimentos prestados, pois “In casu, malgrado a vítima tenha apresentado
versão diversa quando de sua oitiva na fase judicial. (possivelmente em razão do
evidente medo provocado por E.), negando a existência de agressão no ato.”
Destaque para a argumentação entre parênteses, demonstrando um
entendimento íntimo do julgador em relação aos fatos, apenas pela sua própria
suposição, a fim de afastar o princípio do in dubio pro reo, e proferir tal condenação.
45

Aliás, em se tratando de contradições nas decisões proferidas com base em


laudo pericial, tratamos do caso de n. 0000563-38.2017.8.24.0039, julgado pela
Quarta Câmara Criminal, que condenou o réu.
Em dado momento do voto afirma-se que, “como já decidido no âmbito desta
Corte, as declarações seguras e coerentes da vítima nas etapas inquisitorial e judicial,
de que veio a ser vítima de abuso sexual, corroboradas pela conclusão das demais
provas colhidas no processo – sobretudo as conclusões do exame pericial.”
Declaração feita com base em um dos trechos do laudo que confirma a realização do
coito.
Ocorre que em segundo momento, se referindo à segunda parte do laudo, que
não atesta violência nem presença de material genético do réu (espermatozoides), o
mesmo relator dispõe que, “como bem já ressaltado pelo STJ ‘a ausência de laudo
pericial conclusivo não afasta a caracterização de estupro, porquanto a palavra da
vítima tem validade probante.’”.
No mais, acerca da prova pericial, merece relevância o laudo descrito no
julgado n. 0000467-24.2013.8.24.0084, que em que pese não tenha atestado
ocorrência de lesões à vítima ou ocorrência de violência, atestou grave trauma no
órgão genital da vítima.
No entanto, apesar da grave lesão ocorrida, houve a absolvição do réu
perante a Primeira Câmara Criminal, que diante da análise do laudo, destacou que tal
trauma não necessariamente teria ocorrido por meio de ato sexual não consentido,
nestes termos:

Encerrando, importante rever as alegações médicas da profissional que


atendeu a menina, nessas, muito embora certa a elevada gravidade das
lesões, possível verificar que não há certeza irrestrita de coito sem
consentimento, vejamos (fl. 147): "esse tipo de laceração pode ocorrer de
uma relação sexual normal; não é normal tal fato ocorrer, mas pode ocorrer".

Prosseguindo, passa-se à segunda análise, que diz respeito à utilização do


histórico e do comportamento da vítima como meio de comprovar a veracidade dos
fatos. Como já disposto ao longo do presente trabalho, atualmente, e mais
precisamente após aprovação da Lei 14.245/2021, há especial atenção à não
utilização do histórico, bem como do comportamento social da vítima para fins de
definição de sua credibilidade e de sua narrativa.
Ocorre que, como observaremos adiante, quando nos deparamos apenas
com uma versão dos fatos (a da vítima), aliado à falta de preparo dos profissionais da
46

área jurídica para analisar a veracidade das informações prestadas, a personalidade


da vítima e seu comportamento em momentos anteriores e posteriores ao fato, serão
sim de extrema relevância, e, desde que corretamente sopesados, apenas devem
trazer benefícios à busca pela verdade e justiça.
Na apelação de n. 0001689-84.2011.8.24.0023, em que houve a absolvição
do réu pela Quarta Câmara Criminal, teve grande destaque a narrativa da testemunha
não ocular, que objetivando demonstrar a existência de dúvida na palavra da vítima,
trouxe ao processo, seus comportamentos após os fatos.
Em depoimento prestado pela prima da vítima, esta aduz que “depois que a
vítima foi residir em sua casa, passou a ter dúvidas acerca da real ocorrência dos fatos
descritos na denúncia, pois J., em algumas ocasiões, mesmo quando estava
mentindo, jurava que dizia a verdade.”
E complementa afirmando que “a depoente e sua tia, juntamente do Conselho
Tutelar, tentavam encaminhar a vítima ao psicólogo e davam-lhe tudo o que estava ao
seu alcance, mas a vítima fugia do colégio e não demonstrava querer ser ajudada.”
Em análoga situação, a absolvição proferida pela Segunda Câmara Criminal
nos autos n. 0000214-36.2013.8.24.0084, trouxe o depoimento das testemunhas não
oculares, porém extremamente próximas da vítima, como fator determinante para
aferir a credibilidade do depoimento prestado por ela.
Em relato prestado pelo cônjuge da ofendida, este declara "sem vergonha ela
sempre foi" (04'41'', mídia da fl. 226), "ela andava com meio pessoal lá, Santa Helena
inteira" (04'47'', mídia da fl. 226), afirmou ainda que quando se deslocava para o
trabalho "ela saía com o pessoal”.
A tia da vítima ainda traz o comportamento da ofendida para análise dos fatos:

Que a sobrinha costumava ter relações sexuais fora do casamento, mas em


nenhum outro episódio ela ficou tão abalada quanto naquele dia. Ressaltou
que, na sua visão, "teve culpa dos dois lados", referindo-se tanto ao Apelado
quanto à Ofendida ("porque ela fala uma coisa hoje e amanhã ela já emenda
outra em cima, então não dá pra saber qual é verdade").

Importante ressalva neste caso, ao fato de a vítima ter alegado ser portadora
de doença mental moderada, condição esta que, pelos depoimentos prestados,
conclui-se não afetar na livre escolha para seus atos costumeiros.
Observa-se, portanto, que mesmo com laudo indicando a existência do ato, a
palavra da vítima neste julgado em especial, sem contradições, ainda gera dúvidas
47

sobre o consentimento ou não para o ato, dúvidas plantadas pelos depoimentos


colhidos. Por fim, configurou a utilização do in dubio pro reo.
De contraponto, em decisão fundamentada pela Quarta Câmara Criminal para
condenar o réu dos autos n. 0000563-38.2017.8.24.0039, o depoimento prestado
pelas testemunhas que estiveram em contato com a vítima momentos antes dos fatos
narrados de nada foram úteis, apenas serviram para reforçar aos julgadores que a
vítima merecia credibilidade. Dispõe o relator:

Tais relatos dedicam-se, em grande parte, a expor considerações acerca da


personalidade e comportamento da vítima, como a roupa que vestia no dia
dos fatos e seu temperamento extrovertido. Insinuou-se, inclusive, que
adolescente flertou com alguns indivíduos, o que provocou ciúmes até
mesmo na namorada do acusado

E continua:

Com efeito, bem se percebe que semelhantes observações não guardam


relação com o delito narrado na denúncia, e recordam o expediente
corriqueiramente utilizado na defesa de tantos e tantos acusados de crimes
desta natureza, qual seja, atribuir à vítima parcela da responsabilidade pelo
fato.

Insurge-se ainda que apenas o depoimento da genitora, que esteve após os


fatos com a ofendida, teve destaque, eis que “as conclusões do exame pericial,
corroborada pela palavra da mãe –, são elementos de convicção suficientes à
comprovação da materialidade e da autoria delitivas”.
Para concluir a análise deste julgado bem como da atribuição do
comportamento da vítima, denota-se que o caso aqui apurado teve como contra-
argumento à acusação, a menção de que a vítima teria inventado a história por ter
sido rejeitada pelo acusado, tese esta da defesa, rechaçada pela câmara julgadora,
que dispôs ser totalmente fantasiosa tal alegação, uma vez que incrédulo seria
vislumbrar que a vítima moveu toda a máquina judiciária por uma frustração amorosa.
Cabe ressaltar que esta análise fora feita sem qualquer amparo psicológico,
descartando o fato de a vítima ter apenas 14 anos, ou seja, conforme abordado nesta
pesquisa, estar com seus sentimentos no auge da intensidade, bem como
descartando o perfil psicológico da vítima, que poderia, a exemplo, ter desenvolvido a
síndrome da mulher de Potifar.
Portanto, em um caso com laudo pericial que tão logo se limitou a atestar que
a vítima não mais era virgem, com depoimentos que demonstram o interesse pretérito
48

da vítima no acusado (antes dos supostos fatos delitivos), bem como configuradas
contradições no depoimento desta, aliadas ainda à falta de preparo do judiciário em
conduzir uma avaliação psicológica do seu perfil, houve a condenação do réu, com
base em convicções dos julgadores nas rasas provas produzidas.
Como última análise de casos ainda pendente, temos as contradições na
palavra da vítima, que como se identificou nos julgados, a depender da câmara
julgadora, e em dada oportunidade diante da mesma câmara, as contradições na
palavra da vítima ora são suficientes para absolver, ora são mera desatenção da
vítima, que não são capazes por si só de afastar sua credibilidade, acarretando na
condenação do ofendido.
Analisaremos de pronto as absolvições, destacando que dos 4 (quatro)
julgados aqui apresentados, apenas um deles contou com depoimento firme e
coerente da vítima em todas as fases processuais, em que pese, pelos elementos já
destacados anteriormente, não fez prova suficiente para a condenação do réu.
No recurso de nº 0000467-24.2013.8.24.0084 e de nº 0000723-
98.2015.8.24.0050, julgados respectivamente pela Primeira e Segunda Câmara
Criminal, analisamos duas situações muito semelhantes.
Em ambos os casos se verifica a presença de laudos periciais, porém, que
nada puderam auxiliar no decisório, dado que em ambos não há constatação de
violência, não corroborando aos fatos já apresentados, consequentemente, visto que
a discussão se baseia no consentimento ou não do ato, sendo assim, confirmada a
relação sexual por ambas as partes. Também como semelhança não se vislumbram
testemunhas oculares aos fatos narrados.
Ao primeiro caso, ocorrido na cidade de Descanso, as contradições na palavra
da vítima são pontos chave para a análise do caso, isso porque trata-se do caso em
que o laudo pericial demonstrou que o trauma ocorrido no órgão genital era oriundo
de ato sexual.
Detalhes como, o seu consumo de bebida alcoólica horas antes ou minutos
antes dos fatos, bem como, o consumo de bebida alcoólica por parte do acusado.
Ainda há divergência em seus depoimentos como, por exemplo, como ela foi levada
até o veículo onde os fatos teriam acontecido, se teria ido de própria vontade ao ser
convidada ou se conduzida após ter sido aparentemente drogada.
Importante pontuar que a vítima foi ouvida três vezes durante toda a apuração
dos fatos e não foi possível precisar as datas dos atos processuais mas se sabe que
49

a suposta prática sexual se deu no ano de 2013 e o recurso citado fora julgado apenas
no ano de 2019, ou seja, mais de 5 anos se passaram, o que abre brechas para que
a memória da vítima sobre os acontecimentos possa ter se turbado após tamanho
lapso temporal. No mais, verifica-se a vitimização secundária ocorrida, diante da
ausência de uma oitiva especializada em sede policial, que por consequência poderia
esclarecer melhor os fatos narrados.
Já no segundo caso citado, as declarações nebulosas e contraditórias da
vítima sobre elementos importantes do ato, foram de contraponto a depoimentos
prestados pelas testemunhas que relataram o abalo psicológico da vítima após o
ocorrido.
O caso em tela trata-se da violência ocorrida em âmbito doméstico, onde há
relatos da vítima que se contradizem, sobre determinados elementos, como possuir
uma cama no local dos fatos, que foi posteriormente desmentida por policiais que
atenderam a ocorrência e declararam não haver cama, apenas colchão no local, bem
como sobre como a declarante teria se esquivado do acusado para poder chamar a
polícia, vez que em sede policial alega ter desarmado o acusado e fugido para o
banheiro, outrora em juízo, diz ter esperado o acusado adormecer.
Ainda alega ter ligado para a polícia ao adentrar ao banheiro, versão
desmentida por sua filha, que em juízo informou ter sido ela a responsável pela
ligação. Ainda relata ter queimado a roupa utilizada no momento do crime, ato
realizado por orientação da filha, esta que mais uma vez em juízo desmentiu a
genitora, informando ter orientado que se guardasse as vestes.
Diante de tantas contradições verificadas nos autos, restou o réu absolvido,
com base na dúvida que milita em seu favor.
Ainda em relação às absolvições, compete a análise do julgado nº 0001689-
84.2011.8.24.0023, que, diferentemente das duas anteriores, possui a total negativa
do acusado sobre os fatos narrados pela vítima.
Julgado pela Quarta Câmara Criminal, os relatos da vítima, também em
contexto doméstico, tratam da ocorrência de relação sexual entre enteada e padrasto,
situação esta que encontrou além de relatos sobre o comportamento da vítima,
contradições nas suas falas.
Mais uma vez, tratamos de vítima infanto-juvenil neste caso, ouvida em três
oportunidades, com a ressalva de que essas oitivas ocorreram dentro do interregno
de três meses.
50

Divergências quanto a posição que foi colocada para a pratica do ato sexual,
bem como ao ato em si, que ora teria ocorrido mediante coito anal, outrora mediante
apenas a tentativa de coito e ainda em dado momento, teria ocorrido apenas a
masturbação do acusado, com ejaculação no corpo da vítima. Ainda divergência em
seu depoimento quanto à sua coação para se deitar na cama do acusado, que diverge
entre ter sido forçada fisicamente e ter sido convidada a deitar e o feito de forma
espontânea.
Além disso, relatos de testemunhas que estiveram na presença da vítima
posterior ao ato declaram o extremo abalo desta ao contar os fatos após terem
ocorrido, ato que por si só não gerou credibilidade, inclusive, em razão de, apesar de
todo o trauma em tese vivenciado, a vítima se esquiva de acompanhamento
psicológico, sem nenhuma justificativa aparente.
Encerrada a análise das contradições que ensejaram a absolvição, trataremos
agora das contradições que, apesar de presentes, foram irrelevantes, uma vez
alegada existência de provas suficientes para comprovar os fatos descritos.
No mesmo sentido dos casos de absolvições tratadas anteriormente, dentre
as condenações apresentadas, apenas uma não indica contradição na palavra da
vítima, sendo a condenação proferida pela Quarta Câmara Criminal nos autos nº
0001212-56.2009.8.24.0015.
Neste julgado em questão, apesar da coerência no relato da vítima, verifica-
se a ausência de laudo pericial, além de que não há nos autos testemunhas oculares,
restando exclusivamente a palavra da vítima, que corroborada apenas com
depoimentos de um familiar que esteve em contato com ela após o ocorrido e atestou
seu abalo psíquico.
O que ainda chamou atenção nos julgados da Quarta Câmara Criminal foi a
argumentação utilizada nos autos de nº 0000563-38.2017.8.24.0039, de Lages, no
ano de 2019, mesmo ano em que foi julgada a apelação dos autos nº 0001689-
84.2011.8.24.0023, que apresentou um número maior de testemunhas, com a colheita
abrangente de elementos orais, inclusive de testemunhas que relataram o abalo
psíquico da vítima, mas que foram soterradas pelas divergências no depoimento da
vítima, e levaram a absolvição do réu.
Neste julgado da comarca de Lages, a Quarta Câmara atestou a divergência
da palavra da vítima em seus depoimentos, porém foi categórica em alegar que “possa
ter havido a narrativa diferente entre detalhe ou outro o que veio a ser destacado na
51

sentença, mas que, a rigor, não são contraditórios e, que, como se vê, não alteram a
substância do ato em si, o relevante, do enredo.”
Como abordado acima, tal condenação se deu pois entendeu-se que a palavra
da genitora da vítima que dispôs que a mesma sofreu grande abalo após o ocorrido e
ainda corroborada com um laudo pericial, já destacado também, que pouco ou nada
elucidou do ocorrido, foram cruciais independente das divergências constatadas.
Analisando ambos os casos julgados pela Quarta Câmara que apresentam
contradições na palavra da vítima, o que se concluiu foi que a quantidade de
contradições encontradas, foi o fator determinante para separar uma condenação de
uma absolvição.
Tal divergência dentro da mesma Câmara Criminal não se restringe somente
à Quarta Câmara, podendo verificar-se na Primeira Câmara no julgado de nº 0002211-
80.2012.8.24.0022 de Curitibanos do ano de 2018, que traz uma situação com uma
maior carência de provas, mas ainda assim ensejou a condenação do acusado,
diferentemente do julgado pela Câmara nos autos n. 0000467-24.2013.8.24.0084, no
ano seguinte, que apesar do depoimento controvertido da vítima, apontou
consideráveis lesões descritas anteriormente.
No recurso julgado na Comarca de Curitibanos como já apontado quando
tratamos dos laudos periciais, constatou-se divergências no depoimento da vítima, que
mudou sua versão dada inicialmente em sede policial, acerca do emprego de violência
durante o ato sexual, porém tal mudança foi entendida pela Câmara como sendo fruto
de eventual coação do acusado, entendimento este sem qualquer amparo legal de
provas nos autos.
Havendo assim a condenação, baseada no frágil depoimento apresentado
com a colaboração de duas informantes que atestaram o abalo emocional da vítima
após o ocorrido.
Por fim, na tentativa de elucidar todos os pontos dos referidos julgados, traz-
se à baila o julgado nº 0001293-19.2018.8.24.0167, da Quinta Câmara Criminal, que
proferiu a condenação do réu, mesmo reconhecendo a presença de contradições no
depoimento da vítima, ainda que “pequenas variações nas palavras da vítima são
compreensíveis em razão do estado emocional durante o seu primeiro depoimento e
não lhe subtraem a credibilidade.”
Em seu voto, o relator destacou a importância da única testemunha de
acusação, que apenas confirmou que o acusado estava presente com a vítima no dia
52

dos fatos, alegação frágil, quiçá improdutiva, visto que o acusado não negou a relação,
apenas diverge sobre seu consentimento.
No mais, a condenação se deu com base no depoimento da vítima, aliado a
um laudo que teria sido realizado, porém não fora objeto de elucidação no voto.
Diante de todo o exposto aqui acerca das divergências nos depoimentos
prestados pelas vítimas em fases policiais e judiciais, há uma clara identidade em
todos os casos, seja nas decisões de condenação ou de absolvição. Em nenhum
deles, nem mesmo nos casos que envolviam adolescentes entre 14 (quatorze) e 15
(quinze) anos, houve avaliação psicológica dos envolvidos.
Frisa-se, para que não paire dúvidas, o laudo pericial não serve apenas para
determinar distúrbios de personalidade ou captar falsas memórias, mas também para
evitar a vitimização secundária e resguardar as vítimas, em especial as mais jovens,
para que não venham a ter problemas psicológicos e sociais na fase adulta.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conforme amplamente disposto, o processo penal passou por diversas


mudanças ao longo dos anos, e isto se deu, em conformidade com as mudanças
sofridas pela sociedade.
Em que pese tenham ocorrido tais modificações, o crime de estupro
permaneceu sendo repudiado veementemente pela sociedade. E na busca por se
fazer justiça e acalentar os cidadãos, em muitas oportunidades ocorrem injustiças no
ao longo do processo, eis que diversas violações se faziam, e ainda se fazem
presentes, bem como deixava-se de se prestar a devida cautela para situações
alarmantes que poderiam ocorrer, como distúrbios mentais e busca pela vingança.
Tendo isto em mente, o presente trabalho visou apresentar o conceito de
prova, como era abordado tal tema na instrução processual, suas possibilidades e
valoração. Dentre elas, de como o testemunho da vítima é recebido, tendo em vista
que em muitos casos é o único meio probante, e os perigos que isso acarreta, por
consequência. Apresentou-se ainda casos que continham tais cenários desafiadores
aos julgadores, que tinham de solucionar o imbróglio à sua frente, ainda que não
tivessem elementos probatórios em quantia e qualidade suficientes para uma decisão
perfeita, seja em casos que o depoimento da vítima foi malconduzido, seja porque o
crime realmente não ocorreu, mas havia indícios que geravam dúvidas quanto a isso.
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Considerando ainda tais possibilidades, apresentamos os mecanismos


processuais que visam proteger e resguardar especialmente vítimas menores de 14
anos, dada sua vulnerabilidade ainda maior.
Diante da análise dos casos, conclui-se que apenas a palavra da vítima, por
ser o elemento de prova comum ao fato e superestimado no caderno processual, tem
o condão de absolver ou condenar o acusado, sem que haja uma forma coerente pelos
órgãos julgadores, que como bem se viu, não utilizam um entendimento base de forma
unânime, gerando grande insegurança processual uma vez que mesmo diante de
provas frágeis no processo, a absolvição vai depender do olhar pessoal de cada
julgador ao fato. Pontua-se ainda que a palavra da vítima, deveria ser tida como
satisfatória para ensejar uma condenação quando consistente e coerente com os
demais elementos fáticos, o que nem sempre acontece, deixando dúvidas acerca de
sua legitimidade, que muitas vezes é ignorada pelo julgador que irá proferir
condenações, frustrando princípios como o in dubio pro reo.
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