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Mulheres que migram por questões climáticas: escassez de estudos?

Importância de
políticas públicas especializadas1

Handiara Oliveira dos Santos2

Resumo: A proposta deste artigo é mostrar a fase inicial de pesquisa da tese de doutorado, que
tem como objetivo investigar as experiências e demandas das mulheres que migram por
questões climáticas no Rio Grande do Sul, a partir de uma perspectiva sociológica, crítica,
interseccional e sensível. A investigação busca preencher uma lacuna nos estudos sobre
migrações com foco em mulheres e nas questões climáticas, que são um fenômeno crescente e
complexo, mas ainda pouco reconhecido e atendido pelas políticas públicas. Através da escuta
e do acompanhamento das trajetórias dessas mulheres, pretende-se ao longo da pesquisa dar
visibilidade às histórias de vida, ao cotidiano, demandas e prioridades, a decisão de migrar, aos
entendimentos e sugestões sobre as mudanças climáticas, suas expectativas e frustrações sobre
a região do país que escolheram para vive. Como resultado da tese será elaborada
recomendações para a melhoria ou criação de serviços e acolhimento especializado para as
mulheres em situação de migração climática. Como a pesquisa está no início, neste artigo
apresentarei o projeto de pesquisa e os resultados parciais da fase de revisão bibliográfica que
embasam a questão abordada sobre a lacuna nos estudos das áreas de migrações e mudanças
climáticas com foco nas mulheres.

Palavras-chave: interseccionalidade; mulheres; migrações; mudanças climáticas; políticas


públicas.

1. INTRODUÇÃO

"Los impactos del cambio climático y los conflictos ambientales provocados por el
modelo extractivo y desarrollista en los países de la región, interactuando con otros
motivos como la pobreza y la violencia, serán cada vez más motivo de desplazamiento
forzado y los marcos normativos actuales de protección no dan cuenta de esto. Por un
lado, será necesaria una ampliación de las causas de protección para la concesión de
refugio para incluir factores relacionados al cambio climático. Al mismo tiempo, será
fundamental una reformulación sobre los sistemas de protección actual que
compartimentan de manera estrecha las injusticias y sufrimiento de las personas.”
(Ceja; Velasco; Berg, 2021, p. 112)

Presenciamos nos últimos anos um aumento nas catástrofes ambientais causadas ou


agravadas por questões climáticas, chuvas torrenciais com alagamentos como no caso do Vale
do Taquari região metropolitana de Porto Alegre (RS), (Garcia, 2023) e das centenas de cidades
de Santa Catarina (SECOM, 2023). Ao mesmo tempo secas (Gama, 2023) e altas temperaturas

1 Artigo elaborado para a submissão ao evento VI SIPINF – seminário internacional de políticas públicas,
intersetorialidade e família: desafios à preservação/reconstrução da democracia, da saúde e da vida.
2 Graduada e Mestra em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS),

Doutoranda em Ciências Sociais pela PUCRS como bolsista PROEX – CAPES.


(Pacheco, 2023) acontecem em outras regiões do país. Apesar de já vivenciarmos situações
muito parecidas em outros momentos, fica nítido o aumento e piora destes eventos nas últimas
décadas, infelizmente não há mudança nas ações governamentais de precaução, é realizado
operações quando já acontece os desastres e quando refletimos sobre as medidas de mitigação?
Quais e como as políticas dão assistência às pessoas após estes acontecimentos?
Muitas que não conseguem se reerguer nestes lugares decidem migrar para outras regiões do
país (Ramos, 2020), diante disso o que os governos fazem enquanto as pessoas migram por
questões de desastres ambientais? E as mulheres, que são as mais afetadas seja em decorrência
das mudanças climáticas ou da migração (Silva; Martins, 2021), o que está previsto para atender
esta crescente demanda?
Sobre isso, Lavínia de Jesus Rodrigues (2018) responde que não há leis ou políticas
públicas no Brasil especificas para as mulheres em situação de migração, ela comenta que existe
uma invisibilidade sobre as mulheres migrantes. Erika Ramos Pires em seus estudos sobre
migrações ambientais 3reforça a importância de olhar para as políticas públicas:

“[...] a revisão das políticas públicas ambientais deve considerar a mobilidade humana
para que essa estratégia seja utilizada de forma segura e apoiada pelo poder público.
É necessário considerar os aportes do conhecimento técnico-científico e as percepções
e os aportes tradicionais das comunidades afetadas e de acolhida, bem como as
necessidades e demandas de cada ator através da ampla participação dos atores
envolvidos nos processos de tomada de decisão” (Ramos, 2020)

Entendo que, para a elaboração de políticas públicas é preciso pesquisas, se é apontado


a inexistência de políticas especializadas para as mulheres que migram internamente no Brasil
por questões climáticas. Pode-se esperar então que também não há pesquisas suficientes para
basear ações públicas ou fomentar a criação delas.
Portanto, qual é o conhecimento disponível sobre essa temática e o que sabemos sobre
essas mulheres e como são recebidas quando chegam ao destino escolhido? Estas são algumas
questões que pretendo investigar em minha tese de doutorado, para isso trago alguns pontos
que chamam minha atenção a partir de leituras iniciais sobre mulheres e migrações, que
orientam este estudo: a) a importância de estudos contemporâneos na área de migrações por
questões climáticas com foco nas mulheres; b) quem são estas mulheres; c) a falta de políticas
públicas especializadas; d) e o preenchimento de uma lacuna nas pesquisas sobre o assunto.

3“A migração ambiental ocorre quando pessoas impactadas por grandes eventos e grandes mudanças ambientais
precisam sair dos seus territórios ou locais de origem ou residência, em razão de um evento súbito ou de um
processo de degradação ambiental progressiva.” Érika Ramos em entrevista Fundação Heinrich Böll (2023)
As adversidades sempre estão presentes quando se trata de mulheres e se forem
migrantes4 ainda mais, pois sempre há uma pluralidade de atravessamentos que pretendo
tensionar a partir da teoria da interseccionalidade. Ao considerar o viés ambiental sobre as
mulheres que migram, o nível de complexidade e atravessamentos aumenta, pois o racismo
ambiental5 afeta principalmente mulheres e crianças (Carvalho; Jacobi, 2023). Diante disso
desenvolver estudos nesse âmbito faz parte da construção de uma justiça ambiental que trata
das pessoas em maior vulnerabilidade fortemente afetadas pelas consequências das mudanças
climáticas. E são estas pessoas que precisam obter maior visibilidade porque não há leis
específicas que as protejam (Wendling; Giongo, 2022).
Falta compreensão sobre essas pessoas para saber como recebê-las. É necessário
refletir sobre como ocorre todo o processo migratório desde a saída até a chegada, focando no
percurso feito por mulheres, levando em conta que o Brasil possui altos índices de crimes de
ódio contra mulheres, sobretudo as racializadas. O comportamento das pessoas que migram
difere principalmente se tratando de gênero (Pérez, 2019), como mulheres estão mais propensas
a violência sexual, exploração no mercado de trabalho, podem estar amamentando ou grávidas,
com necessidades distintas precisam de abordagens diferentes. Para isso, se faz fundamental
ouvir as perspectivas destas mulheres a fim de criar possibilidades mais responsáveis e dignas
de recebê-las.
A carência de pesquisas na área afeta todos os âmbitos de atendimento aos migrantes,
pois, na falta de informações, os profissionais ou voluntários muitas vezes não estão preparados,
cometendo sucessivas violências como relatado por Handerson Joseph e Iréri Ceja (2021). Se
o Estado não desenvolve uma política de acolhimento eficaz às pessoas que migram no próprio
país, o que esperar de uma sociedade desinformada sobre as questões migratórias? Com certeza
resultará na construção de estereótipos que irão fomentar preconceitos como racismo,
aporofobia6 e xenofobia. O processo de migração possui inúmeras barreiras, no caso das
mulheres essas barreiras são reforçadas pelas questões estruturais de uma sociedade
eurocentrada patriarcal. É preciso trazer o cotidiano das migrantes, expondo a complexidade de
suas motivações para a migração, suas rotinas e identidades, mostrando seus saberes e
dificuldades.

4 É importante mencionar que neste artigo, utilizarei tanto o termo de migrante ambiental quando de
migrante climática, considerando que ambos estão corretos, a partir dos estudos das áreas de
migração e de mudanças climáticas.
5 “O racismo ambiental é um termo utilizado para se referir ao processo de discriminação que

populações periferizadas ou compostas de minorias étnicas sofrem através da degradação


ambiental.” (Fuentes, 2021)
6 Este termo corresponde ao preconceito contra pessoas pobres.
Alguns estudos já realizados pontuam o sofrimento das migrantes e a tendência a
desenvolverem ansiedade, depressão e Perturbação de Estresse Pós-Traumático (Wendling;
Giongo, 2022), reforçando a necessidade de políticas públicas especializada às mulheres
migrantes (Rodrigues, 2018). Porém, essas reflexões precisam se ampliar, principalmente se
adicionamos as questões climáticas, visto que ainda faltam pesquisas que foquem em relatos de
mulheres migrantes nestas situações específicas. Ouvir o que tem a dizer sobre si e sobre sua
vida em outro estado, a sua cultura, e então entender como constroem estratégias de
sobrevivência, frente às violências, aos preconceitos cotidianos e a precarização da vida.
Compreender quem são estas mulheres é descontruir uma ideia estereotipada de
mulheres que migram como uma forma também de “desmontaje de las relaciones de poder y
de concepciones del conocimiento que fomentan la reproducción de jerarquias raciales,
geopolíticas y de imaginários que fueron creadas em el mundo moderno/colonial.” (Curiel,
2014, p.4.).
Refletir em como o Brasil e o mundo e no caso deste estudo o Rio Grande do Sul, trata
as pessoas em situação de migração climática e desenvolver um paralelo entre o que é feito e
como poderá ser, a partir da escuta das mulheres migrantes, possibilita através do cruzamento
dessas ideias, a elaboração de sugestões para melhorias ou criação de atendimento e
acolhimento especializado. Uma vez que, ao migrar, essas pessoas acabam em regiões muitas
vezes precárias com riscos ambientais, como encostas de morros, regiões não pavimentadas ou
sem saneamento básico, com difícil acesso às assistências existentes.
Em minha tese proponho desenvolver recomendações para acolhimento destas
mulheres, a partir da escuta sensível considerando seus saberes e histórias de vida, apresentando
quem são estas mulheres que migram por questões ambientais. Dando visibilidade as suas
demandas emergenciais e essenciais, enfatizando seus entendimentos, sugestões sobre as
mudanças climáticas, expectativas e frustrações sobre a região do país que escolheram para
construir uma vida melhor e segura.
Essas questões abordadas até agora impulsionam este trabalho, entendendo a
necessidade de maiores discussões locais e nacionais, mas considerando o tempo e recursos
desta pesquisa, o foco a princípio será as mulheres que migram internamente e para o estado do
Rio Grande do Sul. Importante mencionar que a pesquisa está em fase inicial, portanto este
artigo será apresentado em duas partes, a primeira se refere ao meu projeto de pesquisa
incluindo os objetivos geral e específicos, as discussões iniciais da parte teórica e a metodologia
a ser utilizada, a segunda compõem o desenvolvimento da revisão bibliográfica e seus
resultados parciais.
2. MULHERES QUE MIGRAM POR QUESTÕES CLIMÁTICAS: O PROJETO DE
PESQUISA

Ao desenvolver minha pesquisa busco entender as relações, situações e necessidades


das mulheres migrantes em decorrência de desastres ambientais causadas por questões
climáticas, identificando qual a melhor forma de acolhê-las. Espero que ao compreender melhor
quem são estas mulheres seja possível desmistificar os estereótipos, com a intenção de
promover a diminuição de preconceitos e dessa forma fomentando a elaboração de políticas
públicas focadas às migrantes ambientais.

2.1 Objetivos

Pretende-se investigar quem são as mulheres que migram por questões climáticas no
território do estado do Rio Grande do Sul e quais são as suas histórias e demandas. Busco
compreender as trajetórias de vida e de migração, situações e necessidades destas mulheres.
Identificando quais as melhores formas de acolhê-las. Com isso elaborar sugestões para
políticas públicas com atendimentos sociais mais focados às mulheres migrantes nas situações
de catástrofes ambientais.
Como objetivos específicos tese de doutorado, a revisão bibliográfica é a primeira fase
e já está em elaboração, onde busca-se por pesquisas e artigos desenvolvidos sobre as mulheres
migrantes ou em relação às mudanças climáticas, focando nas produções que indiquem os três
temas em conjunto. Para a pesquisa será realizada também uma revisão de literatura. Pretende-
se também elaborar um levantamento das regiões onde ocorrem a saída e chegada de pessoas
que migram entre os territórios brasileiros, centralizando nas localidades com maiores índices
de recebimento.
Identificar as instituições e organizações governamentais e não governamentais que
realizam acolhimento às pessoas que migram será atividade fundamental para a realização do
campo de pesquisa. A partir disso acessar as mulheres que migram e identificar aquelas que
tenham as mudanças climáticas como motivo da migração, e através de uma escuta sensível
desenvolver conversas em grupo e individuais. Todos os passos serão documentados e
consentidos por elas, e se necessário pelo comitê de ética, além das autorizações necessárias
para a minha inserção em ambientes de acolhimento.
Diante dos dados obtidos das entrevistas semiestruturadas, conversas livres e da
observação participante, entrelaçando os resultados com a revisão bibliográfica, irei elaborar
sugestões para o desenvolvimento de políticas públicas especializadas ao atendimento às
mulheres migrantes por mudanças climáticas. Por fim, essas sugestões serão apresentadas às
mulheres migrantes que colaboraram com a pesquisa para que possam opinar sobre a produção
e se necessário as sugestões serão reformuladas, essa ação e a entrega de uma cópia da tese será
encaminhada a cada participante como retorno e agradecimento da participação na pesquisa.

2.3. Metodologia e referencial teórico

O caminho metodológico a ser trilhado é de uma pesquisa sociológica qualitativa com


a utilização de metodologia mista que compõem a observação participante, entrevistas
qualitativas e grupos focais. O campo será escolhido conforme identificação das regiões do
Estado do Rio Grande do Sul que mais ocorre migrações por parte de mulheres por questões
climáticas. O acesso será realizado mediante comunicação com as organizações e as mulheres
migrantes com seu devido entendimento sobre a pesquisa como também seu consentimento.
Além da revisão bibliográfica a partir do levantamento de produções acadêmicas em
periódicos que possuam os seguintes temas (mulheres, migração e mudanças climáticas).
Posteriormente será realizada a revisão de literatura para situar o estado atual da temática
estudada. Ao final do tratamento de dados do campo será elaborado a análise social crítica dos
resultados a partir da teoria da interseccionalidade. Também farei uso de caderno de campo e
diário pessoal anotando todos os insights, questionamentos e sentimentos em relação ao campo
e à pesquisadora, conforme sugere Robert K. Yin (2016) na realização de pesquisa qualitativa.
Reportagens que abordem mulheres, migrações e mudanças climáticas dos últimos dez
anos e dados sobre organizações governamentais (e não) e internacionais sobre migração e
mudanças climáticas com foco em mulheres, serão utilizadas nesta pesquisa, com intuito de
dialogar com os resultados obtidos na pesquisa. Por fim, será elaborada um banco de sugestões
para servir de insumo às novas elaborações de políticas públicas especializada para mulheres
que migram por questões climáticas.
Como base teórica da pesquisa será utilizada a interseccionalidade, a partir da proposta
de Patrícia Hill Collins socióloga estadunidense, especialista em feminismo negro e referência
nos estudos da interseccionalidade. Que propõem a interseccionalidade como teoria social
crítica, onde entende que a interseccionalidade é olhar para os problemas causados pelo
colonialismo, racismo, sexismo, nacionalismo como problemas interconectados e que agem
dessa forma sobre as pessoas. E não só olhar para estas questões, mas também e principalmente
pensar em possibilidades de mudanças sociais (Collins, 2022).
A escolha da teoria da interseccionalidade é justamente por compreender que as
experiências de opressão que afetam diferentes pessoas são espaços muito importantes para se
realizar de maneira crítica uma análise e ação sobre estas desigualdades e seus problemas.
Tendo em vista um dos propósitos da teoria de provocar mudanças sociais, espera-se que o
resultado da tese de doutorado de alguma forma provoque mudanças a partir das sugestões de
acolhimento.
A teoria tem por objetivo investigar e praticar a crítica considerando a interconexão
entre pessoas, problemas sociais e ideias, dessa forma entendendo e transformando o mundo
social ainda de acordo com a autora (op. cit.). A interseccionalidade é caracterizada pela sua
amplitude tanto nos sentidos que abarca nas ideias, como na sua formação epistêmica e
metodológica o que exige uma constante autorreflexão crítica. Reforçando estas ações sobre os
objetivos da pesquisa, enquanto se elabora as análises e durante as práticas, que segundo a
autora esse é um dos caminhos para promover uma análise complexa e convincente.
Ainda segundo a autora a interseccionalidade como teoria social crítica considera o
conjunto de conhecimentos que explicam o mundo social e o teoriza como processo ou modo
de trabalho que produz a teoria social. A contextualização e o engajamento dialógico 7são
fundantes da teoria, mas também devem estar presentes na pesquisa, assim como a
relacionalidade8 sendo central por aborda as relações das pessoas entre as entidades, sendo
possível a identificação e entendimento das relações de poder.
Compreendo que o meu problema de pesquisa deve ser elaborado a partir desses
pressupostos apresentados até agora, onde “[...] a interseccionalidade como uma importante
ferramenta intelectual, política e ética.” (Collins, 2022, p.33). Olhando para a situação destas
pessoas como importante e emergencial, pois, estamos falando de situações inevitáveis como a
migração por questões climáticas, sendo preciso haver um devido preparo para o acolhimento
às mulheres que migram, por serem as mais afetadas nestas situações (Schmidt; Gomes, 2020).
É importante mencionar que a pesquisa para além da teoria da interseccionalidade
pretende abarcar teorias e pesquisas sobre processos migratórios e climáticos com foco em
mulheres, como apresentado nos diálogos da introdução deste artigo. Não trazê-los neste
momento tem a ver com a ênfase na teoria base e pela questão de não ultrapassar o limite de
páginas conforme regras para submissão.

3. Mulheres, migração, mudanças climáticas: resultados parciais da revisão bibliográfica

7 Faz relação com o ato de dialogar. (Collins, 2022)


8 Termos utilizado pela autora Patricia Hill Collins (2022) para falar sobre relações de poder.
Neste capítulo apresentarei os dados iniciais da revisão bibliográfica e algumas
reflexões diante destes resultados. Estes embasam provisoriamente alguns pressupostos do
estudo, que poderão ou não modificarem até a conclusão desta fase da pesquisa, essa revisão
faz parte da primeira etapa que está em fase inicial. Os bancos de dados utilizados nesta revisão
são: SCIELO9 e SCOPUS10.
O foco da revisão bibliográfica é localizar trabalhos que tratem das três temáticas
centrais deste estudo: mulheres, migração, e mudanças climáticas. Há obstáculos nessa busca
porque esses temas podem estar dentro de outro tema guarda-chuva ou simplesmente tratar de
um dos assuntos de maneira superficial, às vezes nem mesmo mencioná-la devido ao foco de
cada pesquisador. Outra questão são os conceitos que vão se modificando, conforme as áreas e
acaba com um leque muito grande de possibilidades como por exemplo: migrante ambiental,
refugiado ambiental, migrante climático, refugiado climático entre outros.
Sobre o recorte histórico das produções decido focar nos últimos dez anos. Associando
ao aumento das migrações por mulheres nos últimos anos e pelo que estamos presenciando de
catástrofes ambientais no Brasil e no mundo na última década. Também utilizei os descritores
na língua inglesa, pois em uma tentativa experimental ao colocá-los em português os resultados
eram insuficientes.
A primeira combinação executada no banco de dados da SCIELO foi: women, migration
e climate change. Como resultado obteve-se zero artigos. Já na segunda combinação quando
utilizo somente os descritores: women, climate change. Resulta em vinte e nove artigos, realizo
a leitura dos resumos e somente uma produção apresenta menção sobre migrações, ou seja, as
três temáticas são consideradas.
Realizo uma terceira combinação: women; migration. E dessa vez é mais expressiva
somando quinhentos e oitenta e quatro artigos. Entendo que esse resultado tem a ver com a
existência de uma larga produção sobre migrações e mulheres, principalmente nos últimos anos
em decorrência da grande quantidade de migrantes recebidos e do aprofundamento sobre os
estudos de gênero, como a interseccionalidade. Considerando a possibilidade de ler todos os
resumos, foi necessário a utilização de alguns filtros, a saber: Brasil, idioma português, data de
2013 a 2023. Resultando quarenta e três artigos, para a minha surpresa nenhum artigo
mencionava qualquer relação com mudanças climáticas.

9Scientific Electronic Library Online. Banco de produções acadêmicas de acesso livre. https://www.scielo.br/
10
SciVerse Scopus. Um dos maiores Banco de dados de produções acadêmicas.
https://www.scopus.com/home.uri.
Tabela 1 - SCIELO
PALAVRAS- WOMEN; MIGRATION; WOMEN; CLIMATE WOMEN; MIGRATION
CLIMATE CHANGE CHANGE
CHAVE

RESULTADOS 0 30 584
artigos, 2013-2023,
FILTROS / Artigos, 2013-2023: 29 Brasil, Português: 43
Menciona mudanças
Menciona algo climáticas ou qualquer
relacionado a migrações: outro termo desse
RESUMOS / 1 sentido: 0 (ZERO)
Fonte: a autora (2023)

Quanto aos resultados da busca no SCIELO, já é possível delinear algumas


considerações como por exemplo: a) a maioria dos artigos comentam da importância de
políticas públicas para mulheres; b) atenção para as discussões das relações de gênero; c) busca
trazer o protagonismo das mulheres diante de vulnerabilidades e invisibilidades; c) a escassez
de estudos sobre mulheres que migram internamente no brasil.
SCOPUS é o segundo banco de dados utilizado para realizar a busca de artigos
científicos. Os descritores seguem os mesmos da busca na base SCIELO: women; migration;
climate change. Porém não realizo aos demais combinações como no periódico anterior,
entendendo que os resultados obtidos no momento seriam satisfatórios para esta primeira
exploração. Como a pesquisa está em fase inicial outras buscam estão sendo realizadas no
decorrer desta escrita e devido ao tempo em que demandam para a leitura de resumos, creio que
para este momento, as informações que trago ajudam a compreender mesmo que breve a
necessidade de mais pesquisas na área quando consideramos as produções brasileiras.
Como resultado da busca no SCOPUS, o total foi de cento e noventa e três artigos, diante
desse número resolvi aplicar os seguintes filtros: artigos, data de 2013 a 2023 e acesso aberto.
Cinquenta e um artigos resultantes, destes, vinte e quatro fazem relação com os três termos de
forma significativa, ou seja, dialogam de fato entre os temas propostos, alguns artigos tratavam
de mulheres em situações de mudanças climáticas, mas a migração era em relação ao homem,
no caso os maridos. Importante mencionar que nenhum destes trata do Brasil.

Tabela 2 - SCOPUS
PALAVRAS-CHAVE WOMEN; MIGRATION; CLIMATE CHANGE

RESULTADOS 193
FILTROS Artigos, 2013-2023, Acesso aberto: 51

RESUMOS Faz alguma relação com os 3 termos: 24

Fonte: a autora (2023)

Diante dessa busca também foi possível identificar alguns aspectos sobre os artigos
como: a) o foco nas regiões rurais e costeiras; b) tratavam de estudos sobre os continentes
asiático e africano; c) também mencionaram a importância de políticas de assistência para
mulheres nestas situações.
Entendo da necessidade de realizar novas buscas em outros bancos de dados
combinando termos diferentes, por isso afirmo que a pesquisa está em fase inicial, que se
caracteriza mais exploratória. Também compreendo que na aplicação dos filtros, possa ter
ocorrido a perda de alguns artigos, assim como eu entendo que poderá haver artigos escritos
em outras línguas por brasileiros ou estrangeiros que tratem do brasil, mas nesta primeira fase
acredito ser compreensível certas escolhas. Outra questão é que talvez dentro dos artigos, os
assuntos estejam mais desenvolvidos e não constem no resumo, mas esta será uma próxima
análise, onde será desenvolvida uma nova filtragem visando as produções que contemplarão a
revisão de literatura. Mesmo assim, só com estes poucos dados é possível perceber uma lacuna
dentro dos estudos que tratam de mulheres que migram devido a questões climáticas, seja no
mundo ou no Brasil, se considerarmos os eventos dos últimos anos.

4. Discussões finais

A partir do acesso a literatura que obtive, dos resultados parciais da revisão bibliográfica, além
das inúmeras reportagens fica nítida a necessidade produções acadêmicas mais aprofundadas
para compreender as relações, situações e necessidades destas mulheres e identificar qual a
melhor forma de acolhê-las. É preciso entender a vulnerabilidade da mulher migrante que se
torna mais acentuada quando as questões são políticas, religiosas e de desastres ambientais
(Rodrigues, 2018).
Mas, é preciso que estas ações não fiquem estacionadas, é indispensável compreender
as necessidades particulares destas mulheres, e se tornarem políticas públicas especializadas,
visto que a invisibilidade das mulheres que migram resulta exatamente na deficiência de
construções destas políticas (Dornelas; Ribeiro, 2018). Pois, ao atendê-las se estende o cuidado
as crianças que as acompanham, dos companheiros ou companheiras, dos pais, enfim das
famílias que dependem da mulher. Ao promover uma vida melhor a estas pessoas após sair de
suas casas, de passar por situações estressantes, atendê-las de maneira empática e efetiva, os
benefícios afetam toda a sociedade.
Espero que ao compreendermos melhor quem são as pessoas que estão em situação de
migrações climáticas seja possível desmistificar os estereótipos, diminuindo preconceitos e
promovendo sugestões para as questões ambientais, de políticas públicas e atendimentos sociais
mais focados às mulheres migrantes. Compreendo os desafios tanto práticos quanto teóricos
para a elaboração desta pesquisa, pois ainda há muito a se fazer, mas acredito que com
dedicação é possível desenvolver um bom trabalho. Apesar do longo trabalho que terei pela
frente sinto uma enorme satisfação de buscar uma melhoria mesma que ambiciosa a estas
mulheres a partir da minha pesquisa, e entendo que desta forma realizo um retorno à sociedade,
pois sou bolsista desde a graduação e sem fomento jamais teria chegado ao doutorado. Finalizo
com a frase que despertou o interesse sobre estes estudos, “[...] es necesario que se habilite una
mirada orgánica y dialógica entre el campo de las migraciones y los estudios ambientales”
(Ceja; Velasco; Berg, 2018, p.109).

REFERÊNCIAS

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