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Chanceler
Dom Dadeus Grings
Reitor
Joaquim Clotet
Vice-Reitor
Evilázio Teixeira
Conselho Editorial
Agemir Bavaresco
Ana Maria Mello
Armando Luiz Bortolini
Augusto Buchweitz
Beatriz Regina Dorfman
Bettina Steren dos Santos
Carlos Gerbase
Carl os GraeffTeixeira
2º Edição no Brasil
Clari ce Beatriz da Costa Sohngen
Cl áudi o Luís C. Frankenberg
Elain e Turk Faria
Eri co Joa o Hammes
Gi lberto Keller de Andrade
Jane Ri t a Ca et ano da Silveira
Jorge Lul s Ni co las Audy - Presidente
Lau ro Kopp r Filho
Lu lan KI kn er
~
EDIPUCRS
Jt• r 1111110 .irl Sa ntos Braga - Diretor
Jrniw e 111t1po d Costa - Editor-Chefe ediPUCRS
Po rto Alegre, 201 3
SUMÁRIO
11 NOTA PRÉVIA
13 PREFÁCIO
167
·011 ·ci LO , (; ' 11 'li ' pro ·u rou 'S jl t' i 11 ,li !l oh jl'l t l 1',l 1,d l.1 po(- 1j ':l , rt' !' ·ri 11do M' 11 110 .11 l- q11 1· 11.10 p11111m li X lll~ (t o11H1 {- o r: 1M1 d.i ~ Vi1tgl'l1S) ·011sli1ufr:im a
-lhe como sendo a propricdad · da 1r:i11s 't• 11dt 1H t.1 1 ·x 111 .d, ·m f'u11 ç:10 da qu:il 1 111 11niorkd:1d · li1 rd ii.1 v 1d1ur:1l a partir d a subversão dessas prescrições. Uma
possível "saber tudo o que põe lo texto.! cm r · l:i~·:io , manifesta ou scc r ·ta, rn 111 11l1v1•rs:10 positiv:1111l'l11 l' valorada numa perspetiva histórico-literária, atitude tor-
outros textos". 3 11111.1 poss ívd prec isam ente desde que se neutralizou a rigidez normativa que essa
De acordo com a postulação genettiana e conforme noutro local desta oh1 .1 1111 1.10 ·onbcceu, no tempo do Renascimento e do Classicismo europeu.
notámos já, a arquitextualidade é entendida, então, como um tipo particular d1
relação transtextual, a par da intertextualidade, da paratextualidade, da m ctn l .2 Entretanto, outras categorias literárias podem também ser entendidas
4
textualidade e da hipertextualidade. Assim, a arq ui textualidade define-se co 11111 111110 ·ategorias arquitextuais: o verso e as suas modulações técnicas, as figuras de
"o conjunto das categorias gerais ou transcendentes - tipos de discurso, modos d1· t 1111 l ·a, certos reportórios temáticos, míticos e simbólicos, revestem igualmente
enunciação, géneros literários etc. - de onde decorre cada texto singular" .5 11 .ll l T convencional, sendo dotados de variada tensão institucional e diversa-
Como é óbvio, o domínio em que com mais evidência se observa o exl'I 1111 111 • aceites pelos sujeitos que, em determinados quadros histórico-culturais,
cício da arquitextualidade é o dos modos e géneros literários. De facto, quand 11 111111 ·iam os textos literários.
dizemos do Memorial do Convento de José Saramago que é um texto narrativo 1
" e os modos, os géneros e os subgéneros literários possuem um forte
mais propriamente, um romance, mas não exatamente um romance históri rn , 1111 h·r de categorização arquitextual, deve-se isso em parte ao facto de, desde a
estamos a operar uma reflexão dimensionada, nesse caso, a três níveis distintos: :til 111 guidade, terem sido objeto de uma atenção considerável. Os textos platóni-
nível dos modos do discurso, ao nível dos géneros literários e ainda ao nível do ' 11 1· aristotélicos de incidência doutrinária (sobretudo, A República de Platão e a
subgéneros do romance, entendidos como arquitextos daquele texto. A narrati v.1, ,, tlr11 de Aristóteles) incidem com algum pormenor sobre os modos de enuncia-
o romance e o romance histórico constituem, então, referências arquitextuai ~. " do discurso e sobre questões de índole genológica: a distinção de fundamen-
investidas de capacidade classificativa e configurando, simultaneamente, um ho 1 111 dos de representação de propensão narrativa, dramática ou mista, a defi-
rizonte de expectativas que enquadra e rege a leitura. 1\ .lll de géneros como a tragédia, a comédia ou a epopeia, também problemas
Isso não significa que, sempre que aludimos às vinculações arquitextuais dr 1 11,1wreza técnico-compositiva (como o uso do verso ou da prosa) em certos
um texto, seja possível pronunciarmo-nos sobre ele de forma tão particularizad a; 111·ros etc. etc. Algumas dessas questões foram depois muitas vezes retomadas,
e isso não quer dizer também que o estabelecimento de relações arquitextuais dcv.1 l11d.1 na Antiguidade Clássica por Horácio, durante o Renascimento 6 sob o signo
ser entendido necessariamente como critério para a formulação de juízos de valo1 1 111na consciência doutrinária e normativa que se acentua no Neoclassicismo,
definitivos. Obras como as Viagens na minha terra de Garrett (este "desproposi 1Ih tarde em reflexões de Hegel e Goethe; ocorrem estas últimas imediatamente
tado e inclassificável livro das minhas VIAGENS", como lhe chama o narrador) 1111' de a contestação romântica impor uma conceção inovadora, libertária e
ou como o Livro do Desassossego de Bernardo Soares são consabidamente muitn 111111ormativa da criação literária, o que, naturalmente, conduz à subversão dos
problemáticas quanto a uma classificação precisa, no que ao estatuto arquitextu:tl 111 r s ou, no mínimo, à sua hibridização.7
dos géneros diz respeito; e mesmo o citado Memorial do Convento, dialogando d1· Ainda no rasto de atitudes criativas de tipo idealista e de reminiscência
forma algo crítica e num contexto cultural pós-moderno com o romance histó 1111. ntica, é por vezes refutada a existência de entidades transcendentes de tipo
rico oitocentista, não interpreta de forma passiva a dinâmica arquitextual que o 1q11itcxtual, quando se afirma o princípio da irrepetível singularidade dos tex-
liga ao romance e a um seu reputado subgénero. Ora, não parece legítimo, e111 1 literários. Contudo, nos últimos anos, a teoria da literatura tem insistido na
nenhum desses casos - e dificilmente em qualquer outro caso-, exprimir juízo,, 11~ . 10 de que, tanto de um ponto de vista teórico como em termos operatórios,
de valor acerca da qualidade artística de um texto, tendo em atenção apenas .1 1111inua a ser epistemologicamente pertinente o recurso a essas entidades arqui-
forma como esse texto cumpre ou ignora prescrições de índole arquitextual; 1· 111ais; uma tal noção apoia-se no trabalho teórico de autores fundamentais da
náveis com a possibilidade de entendermos os modos co mo universais tk n· 11 kvt•, no cntanto, s1.·r ·11 ·arada co mo rigidamente exclusiva; de fac10, st· di 'l.1'
presentação. Na reflexão fundamental de Northrop Frye sobre essa matéria (qi w 1111 d'Os Lusíadas que predominantemente contemplam o modo nar rati vo po
frequentemente se apoia em manifestações literárias da Antiguidade C láss ic 1). 1 1110 ~ afirmar também que certos episódios (como o de Inês de CasLro, no ·:11110
a questão tem que ver com a definição dos chamados radicais de apresenta~·: H i. 11 ll , 1 ,.~urnem uma entoação modal lírica, suscetível de ser encontrada ig u:tl 111 t•111 t'
111 d ·1 ·rminados passos d'O Indesejado; e alguma poesia de Cesário Vndv, ,1·111
segundo Frye,
1 .1r de ser, sobretudo, lírica, privilegia por vezes procedimentos de rcsso 11. 111 i.1
111.11iva (p. ex., quando em "O Sentimento dum Ocidental" são d esc rit os n· rto,,
a origem das palavras "drama", "épica" e "lírica'' sugere que o princí11i11 11.11 ios físicos e humanos).
central do género é bastante simples. A base das distinções de género 11.1
Parece claro, desse modo, que a condição modal não anula a possibilid :1d1·
literatura parece ser o radical de apresentação. As palavras podem ser reprr
sentadas diante de um espectador; podem ser faladas perante um ouvin1 1·,
111crferências ou contaminações, quase sempre insuficientes, contudo, para
1
podem ser cantadas ou entoadas; ou podem ser escritas para um leitor. • 1111 ll1 em causa uma determinada tendência marcante, de feição lírica, narrativa
11 1l1amática. E pelo menos no contexto da tradição cultural do Ocidente, essa
111k ncia modal é observável na esmagadora maioria dos textos literários, se ex-
Mais significativo do que o termo utilizado por Frye (género) é o fac111 111 .irmos caso híbridos ou de transição de que falaremos ainda.
de as suas palavras apontarem para grandes universais de representação (cf. es1:1 Mesmo quando nos referimos a textos que não reconhecemos como lite-
expressão: "a base das distinções de género"), de dimensão modal, suscetíveis dl' 1 11s (ou que, quando muito, confinam com ou parcialmente invadem o campo
particularização histórica em termos de género. E embora aparentando alargar .1 l 1 1; rio), tais como biografias, memórias, sermões, relatos de viagens, diários, car-
tripartição a uma quadripartição, a verdade é que a descrição de Frye envolve, dl' , .1utobiografias, textos historiográficos etc., é ainda possível referirmo-nos, com
facto, apenas três situações de representação: é que, do ponto de vista da reprc 11.1 segurança, a uma determinada propensão modal: no Portugal Contemporâneo
sentação discursiva, é irrelevante que as palavras sejam ditas (segundo modo dl' l >liveira Martins, em muitas cartas de Eça, no Diário de Sebastião da Gama, na
apresentação) ou escritas (quarto modo); o que é essencial é que elas provenhan 1 l111-1rafia Salazar, da autoria de Franco Nogueira, detetamos uma dinâmica narra-
de um narrador que assim protagoniza uma relação narrativa com o destinatári o. 1; ·ertos sermões do Pe. António Vieira envolvem também atitudes narrativas,
É, aliás, muito significativo o facto de Frye se ter referido, no primeiro passo p.tr de episódicos afloramentos líricos; alguns relatos de viagem e de naufrágios,
citado, a drama, épica (implicitamente: narrativa) e lírica, como é igualmentl' 11do fundamentalmente narrativos, não excluem pontuais e intensas represen-
significativo que acabe por reduzir a quadripartição a uma tripartição, quando dc ~o ·s dramáticas: lembre-se o patético relato do naufrágio de Manuel de Sousa
clara: "Epos [i.e., a narrativa épica] e ficção [narrativa impressa, como o romance ! p1'1lveda, na História Trágico-Marítima. 20
formam a área central da literatura e são flanqueados, de um lado, pelo drama e, É possível até, a partir daqui, aventarmos a hipótese de tais géneros discur-
, . " 18 os (como lhes chamaria Bakhtine) poderem muitas vezes ser entendidos como
d o outro, pe la 1inca .
Assim, quando falamos de modos literários, entendemos por essa ex 1 drios, precisamente por força de uma dinâmica modal similar à que reco-
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pressão basicamente os chamados modos fundacionais da literatura : o modo lw ·emos em textos consagrada e consabidamente literários, como Os Lusíadas,
lírico, 0 modo narrativo e o modo dramático. E dizemos que Os Lusíadas, /•/·ei Luís de Sousa ou Os Maias. Exemplificando: se observamos no Portugal
como epopeia, pertencem ao modo narrativo; que os textos insertos no voluml' 1111temporâneo uma propensão narrativa, confirmada até por procedimentos
naturalista alarga-o à série romanesca (os Rougon-Macquart de Zola, os Episodi111 1.1h o u funcionando apenas como tradição não contestada: assim, o teatro de
Nacionales de Galdós, as Cenas da Vida Contemporânea de Júlio Lourenço P in111 ' 1 Vicente, de Sá de Miranda e a Castro de António Ferreira enunciam-se em
etc.), espécie de macrogénero que procura apreender a ampla dimensão de u111.1 1 1so; o mesmo acontece com as tragédias de Corneille e Racine e com muito
sociedade em evolução.
d11 teatro de Shakespeare; igualmente com o teatro de C alderón de la Barca,
O que aqui está em causa também, como se vê, é a questão da forma dm dl Lope de Vega e de D. Francisco Manuel de Melo. Mas já no século XVII, a
géneros literários, expressão que importa entender numa aceção a:argada, repo1 l111ação tende a mudar: algumas das mais representativas comédias de Moliere
tando-se tanto à forma do conteúdo como à forma da expressão. E já um ent<.:11 ( 11, 'X.: Les Précieuses Ridicules, L'Avare, Le Malade lmaginaire ou Le Bourgeois
dimento m uito próximo deste que transparece nos termos (muito sintéticos, ma.\ f 1'r11tilhomme40 ) são escritas em prosa, quando o que está em causa
é, cada vez
m u ito sugestivos) em que Wellek e Warren se referem ao conceito de género: "u111 111 .il s, representar satiricamente os costumes d e uma sociedade em mudança,
agrupamento de obras literárias, teoricamente baseado tanto na forma exterio1 drnunciando-os nos termos diretos e vigorosos que uma versificação conven-
(metro e estrutura específicos) como também na forma interior (atitude, tolll , 1 llln al aparentemente prejudicava. Na sequência de Moliere e ainda no contex-
finalidade - mais grosseiramente, sujeito e público)" .37 111 l'volutivo do teatro francês - teatro que, nessa época, constitui um modelo de
Significam essas palavras, desde já, que importa abandonar uma análise do~ 11f n ência incontornável, mesmo para além do universo cultural em que se ma-
géneros fundada apenas na caracterização da forma da expressão. Para ser mais e~ nifesta - , dramaturgos como Le Sage (sintomaticamente autor também de ro-
pecífico: a distinção poesia/prosa38 não constitui, só por si, um fator distintivo do~ 111 .tnces de pendor fortemente crítico), M aurivaux e, sobretudo, Beaumarchais
géneros literários; quando muito, a opção pelo verso ou pela prosa é uma consl' 11 .1duzem em prosa o que resultava da aguda observação dos costumes, da vida
quência, ao nível da forma da expressão, de certas características dominantes, no p i ológica e das contradições sociais do seu tempo. Em oposição, as tragédias
plano da forma do conteúdo. 39 O mesmo pode dizer-se de outros aspectos atinente\ li Voltaire, enunciadas no verso que o gosto clássico mantinha, contemplavam
à configuração formal dos textos literários, com implicações de índole genológic:1. 111 11 itas vezes questões de ordem moral e filosófica mais do que social, perdendo
como acontece com a estrutura macrocompositiva e mesmo com a extensão. 11 iontacto com a realidade envolvente. Algo do que, por outras razões , entre
110 ~ aconteceu com o pesado e convencional teatro de Manuel de Figueiredo e
2.4 Uma caracterização mais minuciosa dessa questão consegue-se se rc orreia Garção, em contraste com a vivacidade dramática e crítica do teatro em
fletirmos acerca do seguinte: é sabido e empiricamente verificável que, na st1.1 p1nsa de António José da Silva.41
tcs, avulta o p ro pós ito c.k: sc instaurar u11 1.1 t1• 11.1 11.11111'.did :i 1· ·x p r ·ssiva, 1H·11 1 1 1 , .1,111 to hi ogr:dl.11·1c ) 111111 1111.1111 1i • ·m prosa , porqu · '·esta q ue u mp re um a
sempre compatível com o culto do verso. A ·ss · pro pós ito, é muito signifl ·:ll iv.1 d 11. mi ·a di s ·u rsiv:i dt· w 111 i11uidac.l e, de regul aridad e e di reta referencialidade
e não isenta de contradição a posição adotada po r Vi cor Hugo no prcf::í ·io dr• l mo logi amcnt e, pros:i r ·!acio na-se com o advérbio latino prorsum, "em fren-
Cromwell: admitindo (e praticando) o verso no teatro, Hugo relativiza-o co 11.,i 11", "direto"); são precisam ente essas propriedades que se afiguram correlatas
deravelmente e declara que ele "não é senão uma forma e uma forma que c.kVt' d ICJll ·lc propósito de representação verosímil, que, em casos extremos (p. ex. :
tudo admitir, que não tem nada a impor ao drama e que, pelo contrário, deli• 1111 ·ontexto do Naturalismo e do Neorrealismo), chega a pretender a fidelidade
deve receber tudo, para transmitir ao espectador: francês, latim, textos de k i,, , d1 1 1 ·s tcmunho documental. 44
blasfémias reais, locuções populares, comédia, tragédia, riso, lágrimas, p ros:1 1· Mas se é assim com géneros narrativos modernos, torna-se necessário
poesià'. Significativamente, contudo, Victor Hugo acaba por concluir: "De IT~ 11 !1 1· rv r também o seguinte: a prosa constitui uma opção formal desses gé-
to, que o drama seja escrito em prosa, que seja escrito em verso, que seja escri111 1111os, mas não um atributo congenitamente requerido pelo modo narrativo.
em verso e em prosa, é apenas uma questão secundária. O nível de uma oh1 .1 N11 11tros géneros narrativos, vinculados a cenários epocais e a contextos comu-
deve fixar-se não segundo a sua forma, mas de acordo com o seu valor intrín s1· 11 11,1·i nais diversos dos do romance e da novela, a utilização do verso não põe
co". 42 Entre nós e pouco depois, Almeida Garrett, que compôs ainda algum:!\ 111 rnusa a condição modal narrativa; essa opção pode até ser legitimada tanto
das suas obras dramáticas de juventude em verso (p. ex., as tragédias de infl uxo p111 ·onvenções próprias desses cenários epocais como por conveniências de
neoclássico Catão e Mérope), opta pela prosa n' O Alfageme de Santarém, em l/111 l11do l · pragmático-comunicativa: acontece assim com a epopeia e também com
Auto de Gil Vicente e no Frei Luís de Sousa, já sob o signo da estética românti c:1. 11 11 r;ttivas de natureza folclórica. No primeiro caso, o peso da convenção alia-se
Justamente a propósito do Frei Luís de Sousa e no que a essa questão n:~ 11junções da declamação: disso se encarregava o rapsodo , em contexto de co-
peita, Garrett adota uma posição clara, afirmada embora de forma algo cautelos:1: 111 1111i ação oral; no caso das narrativas folclóricas, a enunciação eventualmente
depois de declarar que não acredita "no verso como língua dramática possível p:ir.1 111 v ·rso (e com o auxílio da prosódia poética) facilita a fixação de textos em
assuntos tão modernos", acrescenta: pii 11dpio fluidos, fluidez que se explica por força da transmissão oral que lhes
ação dos géneros sob re os seus rccepLOrcs (11111 co nlo propõe-s' no r111 :dnw 111 1 11, lll l'S rn o, t:m ·cno~ . 1w .~, l'l'ª ·ionário e rcstauracionista) que deu lugar àquele
a concretizar efeitos recetivos diferentes d os at in gidos por urn a elegia); mcs11111 11l1g '·11 TO e o legitirnm1.
situações socioculturais que permitem a popularização de certos géneros, 1"111 Nos termos de Alastair Fowler e confirmando as palavras de Marie-Laure
detrimento de outros: não por acaso, o século XIX foi um tempo cultural pri v1 1 )'• ln , dir-se-á, então, que os "subgéneros possuem as características comuns do
legiado para a publicação e consumo do romance, mas já não para a da epo1wi .1 pi 11 ·ro - formas externas e tudo o mais - e, sobre e acima delas, acrescentam
ou para a representação da tragédia. 1.1r,1·ccrísticas substantivas especiais. Uma écloga piscatória ou marítima é uma
O que aqui implicitamente se sugere é que a emergência dos géneros li11· 1Ioga como o é a pastoril, mas acrescenta-lhe um novo leque de tópicos, relacio-
rários pode ser entendida como o resultado disso a que Claudio Guillén chanH HI 11.1dos com pescadores e não com pastores" .54 Além disso, também a configuração
um convite à forma; mas esse convite à forma concretiza-se, por um lado, l'l11 l111'111al dos subgéneros há-de ser entendida como resultado desse convite à forma
termos retrospetivos (isto é, informado pelo peso da tradição formada pelas obr.1 •. d1 tiue falava Guillén: assim, as soluções técnico-literárias que definem um ro-
anteriormente existentes), por outro lado, em termos prospetivos, ou seja, dl'i 111.ince epistolar são muito diversas, no duplo plano da matéria e da forma, das
xando antever (ou, pelo menos, almejando) outras concretizações afins. Coll111 qw· encontramos num romance de família, com óbvias consequências também
escreveu Guillén, "olhando para trás, um género é um enunciado descritivo , di 1111 plano das motivações recetivas.
zendo respeito a um certo número de obras com ele relacionadas. Olhando c111
frente, torna-se, acima de tudo [... ], um convite à combinação (dinamicame1111·
falando) de matéria e forma''. 52 3 ODRAMA EOESPETÁCULO TEATRAL
De modo nalguns casos ainda mais significativo, são os subgéneros q111·
incutem evidente especificidade àquela combinação. Quando aludimos a od l'
3.1 O facto de, no contexto deste trabalho, atribuirmos ao drama um
anacreôntica, a écloga pastoril, a conto policial, a romance gótico, a romanu·
11 lcvo diverso do que reservamos à poesia lírica e à narrativa literária, tem que ver
epistolar ou a romance histórico, é, de facto, a subgéneros que nos estamos .1
d1·s<le já com propriedades fundamentais do modo dramático e com a problemá-
referir; assim, como se deduz das expressões mencionadas (utilizando um subs
111 .1 da sua realização teatral. Com efeito, sem podermos artificialmente separar o
tantivo, que é a designação genológica abrangente, completado por um atribul o
1ptl' é indestrinçável - ou seja: considerar o texto dramático isolado do espetáculo
que o especializa), os subgéneros constituem uma particularização, em contexto.\
11'.ll ral-, a verdade é que os termos em que o modo dramático plenamente se con-
histórico-culturais bem caracterizados, dessa outra categoria mais ampla que é o
111·tiza transcendem o plano da leitura e dos estudos literários, naquilo que eles
género literário. Conforme escreveu Marie-Laure Ryan, "quando dois género,,
111 nificam no presente contexto. Com efeito, se a recepção dos textos líricos e dos
possuem um conjunto comum de regras, mas um apresenta requisitos adicionais,
11·x los narrativos se consuma pela leitura, ela é insuficiente para o pleno enten-
então ele deve ser encarado como subgénero do outro". 53
dim ento do texto dramático, tendo em vista as suas virtualidades espetaculares.
Tal como os géneros, também os subgéneros são entidades historicamen1 r
Por isso mesmo pode afirmar-se, correndo-se embora o risco de algum
localizadas; do mesmo modo, podem cumprir uma função normativa, com di
11•ducionismo, que os textos líricos e os textos narrativos são fundamentalmente
versos graus de impositividade; sendo também, como os géneros, transitórios 1·
llll'rários, num sentido que remete para a dimensão verbal do literário, razão pela
instáveis, são-no de forma por assim dizer mais intensa, uma vez que a sua insti
qtial esses textos merecerão aqui uma atenção mais alongada; mas já os textos
tuição responde a peculiares e não raro fugazes cenários epocais: por isso mesm o,
dramáticos, sendo também literários (porque obviamente, nesse mesmo sentido,
o Memorial do Convento de José Saramago resiste, como ficou sugerido no início
estabelece o cenário em que se desenrola o primeiro ato: sabe-se, então, que l' ll 1111·11co" 61; assim, nos textos dramáticos uma ação normalmente singular é vivid:t
tem lugar numa "câmara antiga, ornada com todo o luxo e caprichosa elegâm i.1 p111· um conjunto de personagens que entre si se relacionam de forma muitas ve'.l.cs
portuguesa dos princípios do século XVII"; que de "duas grandes janelas rasgad.1 1111ílituosa e com recurso dominante ao diálogo 62 ; essas relações são apresentadas
[... ] se vê toda Lisboà'; que, entre outros elementos decorativos, se destaca "11 111 processo evolutivo, num tempo concentrado que imita, em regime de isocro-
retrato, em corpo inteiro, de um cavaleiro moço, vestido de preto, com a cn1 1 111,1, devir e a duração da ação, muitas vezes conduzindo a um desenlace.
60 Esses elementos estruturantes preexistem, entretanto, a uma representação
branca de noviço de S. João de Jerusalém"; e que "é no fim da tarde".
Isso significa desde logo o seguinte: tal como na narrativa, a personagc 111 11.1 presença do público, na qual são atualizadas certas virtualidades expressivas,
e o seu discurso constituem elementos destacados, na configuração de uma aç:11 1 p1t• se encontram previstas quer no texto segundo (rubricas e indicações cénicas),
que começa a ser representada. Mas diferentemente do que ocorre na narrati v:1, ptt•r na disposição macroestrutural do texto dramático, no seu conjunto (repar-
não se manifesta aqui, ao mesmo nível textual do discurso das personagens, u111 ,1 11\,lO em atos, cenas etc.). Daí o poder falar-se na dualidade do texto dramáti co :
voz estruturante e organizadora da ação, correspondendo àquela que na narrati v,1 dualidade do texto dramático é, por um lado, condicionada pelo carácter d ·
é a voz do narrador. É certo que, como leitores, temos acesso aos dois textrn , 111:1.s fases históricas do teatro (em conexão com, p. ex., a ênfase na 'teatralidade',
trata-se, contudo, de uma situação por assim dizer provisória e circunstancial , 1 procura de específicos meios teatrais de expressão, a escrita de argumentos para
ainda aquém do que deverá ser o completamento e a plena articulação de an1 p1nduções individuais, com a possibilidade de adaptação e modificação do texto
bos os textos referidos, no espetáculo teatral. Neste, o público escutará apen:1'> t1 ,); por outro lado, a natureza e interpretação do texto dramático é influenciada
as palavras de Madalena e não as daquela entidade anónima, responsável pcl:1•1 111 lo desenvolvimento da arte verbal (incluindo o desenvolvimento das relações
192 'l' l•X l'O LI TERÁRIO E ARQUITEXTUALIDADE O CONHECIMENTO DA LITERATURA l 9J
ll'.lll!) ) [... !; l 1d111l ,1 lnl ll'll H' lll l' l11lltH'IH i.1d.1 1)('1.t
nllllll.IS L'llll"l' :\ lit l' r;tllll.I l' O p1 1 rnt.11 •1(· 111 pod t• 111 v.tl ·1 prn todo 11111 rl· t r.tto Ml l'i111.11n ·111 · d ·lin ·:ido: no Auto
tradição do pensamento teon'.: ti co :1'L·rc.1 d.1 litl'1.11111.1". 1>1 ,, /l,m ·11 rio !1tji·mo dL· ( :11 Vi 'l'lll " a cadeira qu e acompanha o fidalgo denuncia
11111.1L<>ndi çao social de certo destaque; o lavrador do Auto da Barca do Purgatório
3.4 Referindo-se ao carácter co nce ntrado do dram a, a qu e rcpetidanw11l 1 1111 11111 arado às costas e assim evidencia emblematicamente uma profissão; e na
aludimos já, Emil Staiger observa que os grandes dramaturgos / ,11 "' rios Físicos, o estranho latim exibido por um dos médicos conota um vício de
11 11•111açfo científica, afinal nada eficaz para curar um clérigo doente de amores.
I>~ o l'ísico mestre Fernando:
encuentran conveniente acartar el tiempo, estrechar el espacio, y elegie cl 1
un vasto suceso el momento cargado de interés - un momento poco ;1111 1~
dei final -, y, desde aquí, reducir lo múltiple a una unidad abarcablc ;1 1 11 ~ Dizem os nossos doutores -
sentidos, para que de este modo aparezcan con claridad no las partes ~ i11 11
Ouvi-lo? ouvis que vos digo? -
las trabazones, no lo singular sino la totalidad de relaciones, y nada dr 111
que los oyentes han de retener se esfume en el olvido". 64 Non es bona purgatio, amigo,
illa qui incipit cum dolores,
porque traz flema consigo,
É ainda essa concentração dramática que permite aprofundar uma co 11 e illa qui incipit trarantran,
frontação já esboçada: a do drama com a narrativa.
quia tranlarum est.
A concentração que o drama implica provém da necessidade de uma n·
Ouvi-lo? De físico sam eu mestre,
presentação em princípio ajustada a um tempo limitado: à parte exceções L' 111
mais que de surlugiam,
situações especiais 65 , modernamente essa representação tem em conta a cap:11i
em que me chamam sudeste. 66
dade de fixação da atenção por parte do público, ao assistir a uma sessão l t'. I
tral; diversamente, a narrativa, mesmo quando materialmente muito alargad.1, A existência de elementos comuns ao drama e à narrativa (a personagem,
estrutura-se em função de sucessivas sessões de leitura: quem lê O Crime do Prtrlrr• 1 11•mpo, o espaço etc.) não impede, pois, o reconhecimento de uma especifici-
Amaro fá-lo obviamente em várias etapas. Mas a adaptação teatral do mes11111 1ulc modal que tem que ver com peculiares procedimentos de representação e de
romance (realizada em Portugal em 1978 por Artur Portela e Mafalda Mendes d1 011netização: na narrativa, a representação processa-se por meio de um narrador,
Almeida) encerra a história no lapso temporal de cerca de duas horas que dur:1.1 111 idade ausente no drama; neste, a representação requer a mediação do espetá-
representação. 1110 teatral. Por outro lado, a concretização da narrativa dá-se através da leitura
A concentração dramática efetiva-se ainda por outros motivos. O car:í1 111 malmente silenciosa; a do drama exige performances de diversa natureza (por
ter eminentemente imitativo da ação dramática - contando com a personagl'll1 11 io de atores, com o suporte de técnicos etc.), visando um público fisicamente
em cena, vestida de um certo modo, lidando com determinados adereços c11 11·s •nte e modulando o texto dramático em termos que podem ser visivelmente
- dispensa as intervenções descritivas levadas a cabo na narrativa pelo narrad o1, 111Ílo distintos: uma determinada comédia de Moliere é concretizável de formas
descrições que podem revestir-se de grande minúcia. Quando muito, é no tex 111 1 Llveis, em função de encenações que recorram a diferentes conceções cenográ-
segundo (conforme se observou no passo citado do Frei Luís de Sousa) da oh1.1 f 1.1s, a vários ritmos de marcação do trabalho dos atores etc.
dramática que se exerce essa função descritiva, ainda assim quase sempre em ll' I Isso não impede, como é óbvio, ocorrências de contaminação, ou seja, que
mos muito mais económicos do que aqueles que encontramos na caracterizac,·;111 1111 drama se encontrem momentos narrativos (quando uma personagem narra
de uma personagem ou de um espaço ficcionais. E mesmo em teatro afeta d11 ·ncos passados, quando uma voz "off" estabelece ligações entre atos e cenas etc.)
por alguma rudimentaridade técnica, a presença visível e o discurso direto d.1 111 que na narrativa reconheçamos momentos dramáticos. O episódio do capítulo
Verdadeira, falsa ou simplesmente deformada, a história atesta bem a for~.1 11·x to dramático ao espetáculo teatral como momento decisivo da existência cul-
persuasiva que pode caracterizar os discursos e os gestos da representação dramá1 i 111 ral do teatro.
ca, sobretudo quando se encontra anulada a distância emocional que o espectad01
de teatro usualmente cultiva: é essa distância emocional que lhe permite assistir .1 3.6 Nos últimos anos, como consequência do desenvolvimento da teoria
conflitos e mortes, dilaceradas separações ou finais felizes sem se envolver na aç:111 .1nálise semiótica, os estudos sobre as práticas teatrais instituíram um domínio
com o excesso atribuído ao soldado que assistia ao Otelo. O que não impede qu(' 111ctodologicamente autónomo: o da semiótica teatral. 73 Em termos gerais, pode
os discursos dramáticos (e também os gestos, as situações encenadas etc.) surj am, di1,er-se que a semiótica teatral interessa-se pela representação teatral considerada
damente dirusos (n o qu e diz res p ·iLO , co lllo (· 1>hvio, :1 u111 a possÍvL· I ·ara 'l ·l'i·1.. 1~ . 111
1
1111 d;1s de gc'.·11l·ro, M' lll 11111 11 1•1 ohl'igat o ria1rn.: nte nos ri scos da co nvenção o u da
enquanto género) como escrita, texto o u lkçao co nsLit ue m po r vo.cs a 111 .111.1 11h1'ol ·sc~ n ·ia. l ) ir .w .1. Il i' q11 · :1ass umida co nsciência dessa recuperação pode ser
externa dessa crise, sobretudo quando surgem expressamente refe rid os no rn q 111 1 11.1ra11tia de qu e tais proçcdim entos se encontram protegidos contra os riscos da
do texto ou nos paratextos.96 111ulação pass iva. Po r o utras palavras: o poeta adota (agora sem a coerção insti-
De forma semelhante, também o termo fragmento parece refletir algo d1·, llll ion al que antes provinha de academias, precetivas ou mecenas) determinados
se movimento de desagregação dos géneros, sintoma visível de uma indagação q111 1 11 ·ros líricos, mas não hipoteca, por isso, a possibilidade de inovar pelo interior
se interroga sobre a unidade da linguagem, a da obra literária e, mediatamc1111 , 11.1 1radição. Assim, Epitáfios de Eugénio de Andrade não cumprem minuciosa-
sobre a do sujeito que a enuncia; na Literatura Portuguesa, o caso paradigm ;Íti111 1111•11 te as regras formais do que era, no passado, esse género lírico, subsumindo
de uma escrita fragmentária, plural e indefinida, em termos de género, é O U1 111 1 1111•s mo, no seu contexto, outros géneros líricos, como a ode e a elegia; isso não
do Desassossego de Bernardo Soares; por sua vez, em Rumor Branco de Alm cid.i l111pede que os poemas que naquele volume se encontram ressoem, do ponto de
Faria abandona-se a organização convencional em capítulos e o texto estrutur;1 " hta funcional e temático, como epitáfios, com tudo o que emocionalmente isso
em fragmentos; e Vergílio Ferreira, em vários momentos do volume Pensar, al11 d1 ltnplica. Por sua vez, os Sonetos Românticos de Natália Correia não anulam uma
mesmo à atualidade e ao significado de uma verdadeira estética do fragmen dri11 1111 te personalidade lírica nas constrições formais de uma forma poética que nesse
"º' além do mais, remete para o grande poeta do soneto que foi Antero. O
lllt' permite encarar essa espécie de revivescência técnico-formal sob o signo de
A obra de arte inacabada ou mutilada, o esboço, o fragmento . Ma i ~ d11
1111a modulação lúdico-simbólica que encontramos num outro importante poeta
que nunca isso nos fascina. Porque o que mais importa numa obra de :11 11
é o que ela não diz. É o não dizer que hoje sobretudo se pode dizer. () ronuguês, episódico cultor também de formas poéticas canonizadas: Carlos de
fragmento ou o inacabado acentua a voz do imaginário, antes de ser a d11 )liveira que, no volume Terra de Harmonia, insere um "Vilancete castelhano de
perfeito silêncio. E o silêncio sem mais é hoje o nosso modo de falar. ( lt1 111 Vicente", um "Soneto castelhano de C amões", "Sonetos de Shakespeare rees-
seja, a forma única de a razão ter razão. 97 1lt os em português" etc.
Assim se relativiza de novo o género (porque uma certa prática de género, no
Note-se, entretanto, o seguinte: se até agora temos falado, sobretudo, L· 111 1 .~ente, remete ao passado), atitude que fica ainda aquém de uma outra possível
relativização e crise dos géneros narrativos, enquanto fenómeno recente, tal dew l.1ção, esta de índole desconstrutiva: a de José Gomes Ferreira reutilizando o sone-
1, enquanto forma poética culturalmente reputada. O "soneto que só errado ficou
-se ao facto de os géneros líricos terem sido objeto já, praticamente desde finais d11
século XIX, do impulso de libertação que veio a tornar, em muitos casos, inteir;1 110" , como se lê em epígrafe, cumpre normas rimáticas e estróficas estritas, mas não
situa-se e resolve-se muitas vezes num cenário recetivo mais restrito, seletivo e so ll , para te dizer, com a simplicidade do bater do coração
ticado do que aquele que é próprio da ficção narrativa; o que, como parece óbvio, que afinal ao pé de ti apenas sinto as mãos mais frias
favorece também uma comunicação literária por assim dizer desguarnecida des~." e esta ternura dos olhos que se dão.
balizas de orientação comunicativa que, em parte, são os protocolos de género.
l 1•11· •ira. 104 Por outro lado, se uma escritora como Maria Gabriela Llansol inviabi-
Ser como sou e ver-te como és:
11 1.11 •m textos como Causa Amante ou Na Casa de julho e Agosto, qualquer filiação
dois bichos de suor com sombra aos pés.
1•11o lógica estrita, a mesma escritora vem a acolher designações de género - que
. - de 1uas e sal'1va. 101
e omp11caçoes 11,10 forçosamente a sua prática canónica - em obras como Contos do Mal Errante,
111/1 Falcão no Punho - Diário 1 e Finita - Diário 2.
4.3 Uma consequência dos processos de questionação e reformulação, de' Num texto muito cauteloso, onde são mais frequentes as interrogações do
construção e desagregação dos géneros estabelecidos poderá ser a que co nd1 11 q11 1• as respostas, Alastair Fowler avança algumas sugestões, no que toca à postu-
à eventual postulação de novos géneros. Uma postulação que enfrenta desall11 l 1 ~ .10 de novas categorias genológicas, sobretudo no âmbito modal da narrativa.
de ordem teórico-epistemológica equacionáveis em duas perguntas: existem d1 1 declara mesmo, não sem alguma hesitação, que determinados estudos sobre
facto, enquanto tais e por si só, novos géneros? Por outro lado, é legítimo (e \Hll 1 111etaficção podem contribuir para essa redefinição do campo genológico. ''A
' ;>
parte de quem) designar e descrever novos generos. llH'taflcção", escreve Fowler, "deve agora ser encarada como um bem estabelecido
Note-se, desde já, que uma tal postulação não implica um processo de IH 111 ' ro contemporâneo; embora nalguns aspectos dificilmente constitua um gé-
gação e substituição radical dos géneros legados pela tradição literária vivida pr l 1 ll l' IO totalmente satisfatório, já que é mais um agrupamento em função de uma
Cultura Ocidental. A existência e consagração de novos géneros pode fundar '• 111.1neirà de período".
num processo de harmonização discursiva e ontológico-ficcional, por assim d Noutros casos, o subgénero esboçado constitui uma hipótese tão inovado-
zer de reinvenção pós-moderna, mas com antecedentes ilustres. Na Antiguid:1 d1 11 (e mesmo precária) que é difícil ainda atribuir-lhe uma designação facilmente
Clássica, a tragédia e a epopeia incorporavam o mito, de certo modo aquém d1 , irnilável e traduzível: o "poioumenon ou o romance da obra em progresso"
uma indagação acerca da sua ficcionalidade; por sua vez, os relatos de viagr11 11 11stitui, segundo Fowler, "a narrativa da elaboração de uma obra de arte". 105
românticos tendiam a dissolver a factualidade que intrinsecamente os m o ti v.1 \s im se insinua um subgénero a que provavelmente poderá corresponder, de
va numa hipersubjetividade de propensão hibridizante e transfigurante (líri1 ,1 lmma ainda assim algo instável, o Manual de Pintura e Caligrafia de Saramago.
dramática, novelística, filosófico-ensaística etc.): as Viagens na Minha Terra d1 1 1 facto, nele parece operar-se uma subversão avant la lettre da hipótese teóri-
Garrett não são em rigor uma narrativa de viagens, entre outras razões exataml'llll 1 formulada, pois que, ao mesmo tempo, afirma-se e desmente-se a invenção
102 lo género, insinua-se e perturba-se a filiação genológica: porque o que o título
por serem irredutíveis a esse protocolo de referência puramente factual .
Nos nossos dias, não são o mito, o ensaio filosófico, o drama romântico 1111 11uncia - o manual que rege o trabalho do artista em ato de criação - vem a
até mesmo a História (a oficial e heroizante) que fundamentam a referida hari 1111 1 ontrariado por uma designação tentativa e (deliberadamente?) hesitante, em
nização pluridiscursiva; são a notícia de jornal, o relatório policial, a telenovcl:1, 1 lll f\:tr de subtítulo, designação que afinal reconduz à tradição: ensaio de romance.
marcado pela Art Poétique (1674) de Boileau; a Estética de Hegel const1tm, no 111rnar do ~omant1smo. u11 111 l 11111cs", in ). P. Strelka (ed .), Theories of Literary Genres, University Park/London, The Pennsylvania State
decisiva intervenção com influência determinante até aos nossos dias; na passagem do seculo XVIII pai •111 1l11lv. Press, 1978, pp. 94- 111.
século XIX, a intervenção de Goethe confina com a dos irmãos August W1lhelm e Fnedr:ch von S~hl q.,1 I. N. Frye, Anatomy of Criticism. Four Essays, Princeton, The Univ. of Princeton Press, 1973, p. 246-247. Cf.
Victor Hugo, sobretudo no prefácio de Cromwell, contribui deci sivame_nte para ª. aftnnaçao _do 1d~'.m" 1" 1 111h6n a importante obra de Claudio Guillén, Literature as System. Essays Toward the Theory of Literary His-
mântico no que à questão dos géneros diz respeito; e depois das pos1çoes defendidas por Bmne~1e1 e, 1111111 11111•, Princeton, Princeton Univ. Press, 1971, sobretudo no cap. "On the Uses ofLiterary Genre'', pp. 114 ss.
quadro ideológico positivista, o idealismo estético de Benedetto Croce vem contranar a propensao no111 111 N. Frye, op. cit., p. 250. Diversas reflexões modernas seguem o princípio da tripartição, com maior ou
tiva dos géneros literários. _ . 111111or consistência e baseando-se em princípios teóricos e epistemológicos por vezes muito diversos entre
s Obras desses diversos autores, com maior ou menor influência na explanaçao que aqu_1 se l~v_a a c.tl 1t1, 1 (11, G. Genette, Introduction à l'architexte, ed. cit., pp. 33 ss.; A. García Berrio, Teoría de la literatura, Ma-
encontram-se mencionadas na bibliografia referente a este capítulo. O historial da reflexao teonca. s11l 111 li 1d, Cátedra, 1989, pp. 444 ss.
essa questão (historial que não cabe aqui fazer, como é óbvio) encontra-se, entre outros'. em M. h~\~ 111 1 . ( '. f. Earl Miner, Comparative Poetics, ed. cit., p. 7. Tanto nesta obra como, sobretudo, no ensaio anterior-
"Genesi e storia dei generi", in Critica e Poesia, Ban, Laterza, 1956, pp. 143-274; P. Hernad1, Beyond (,. 11 " 1111 1 ~ citado, M iner trata a questão com uma certa desenvoltura term inológica, mas refere-se obviamente
New Directions in Literary Classificalion, Ithaca/London, Cornell Univ. Press, 1972, PP· 10 ss., 54 ss. e 11 •I "' 111110 a que aqui chamamos modos.
G Genette Introduction à l'architexte ed. cit., pp. 14- 62; H. Dubrow, Genre, London/New York, Metl1111·11 ( l que aqui se exemplifica leva-nos a compreender a tendência para explicar a tripartição modal, em
1982, pp. 4S-104; V. M . de Aguiar e Sil~a, Teoria de Literatura, 6' ed., Coimbra, Almed ina, 1984, PP· 340 IH\ 1111<10 da forma como a linguagem verbal (a literária e a não literária) modeliza fundamentais categor ias
jean-Marie Schaeffer, Qu'est-ce qu'un genre littéraire?, Paris, Seuil, 1989, PP· 7-63.. . 11 h'mpo: o presente, o passado e o futuro. O modo lírico, o modo narrativo e o modo dramático aparecem
' j. M. Pozuelo Yvancos, "Teoría de los géneros y poética normativa", in M. A. Garrido Gallardo (<'d l 1111\11 como proj eções daquelas categorias, n em sempre, contudo, entendidas em termos idênticos pelos
Teoría semiótica: lenguajes y textos hispânicos, Madrid, C.S.l.C., 1984, p. 395. . . 11l111«S (Hegel, Jean Paul, E. Staiger etc.) que privilegiam essa explicação. Cf. G. Genette, Introduction à
'° Escreve Wittgenstein, no parágrafo 67 das suas Investigações Filosóficas: "Não comigo caractenzar 11 11 "/1/tcxte, ed. cit. , pp. 50-53.
lhor estas parecenças do que com a expressão 'parecenças de família'; porque as diversas parecenças '.' " /\. Fowler, Kinds of Literature, ed . cit., p. 111 .
tre os membros de uma família constituição, traços faciais, cor dos olhos, andar, temperamento etc. 1li Embora apareça muitas vezes afetado por alguma ambiguidade, pensamos que o modo novelístico
sobrepõem-se e cruzam-se da ~esma maneira. - E eu ~irei: os jogos constituem urna família" (Tratad'.'. / 11 vr relacionar-se, em primeira instância, com a novela de feição imaginativa e sentimental. A ambigui-
gico-Filosófico. Investigações Filosóficas, Lisboa, Fundaçao Calouste Gulbenkian,' 1987, PP· ~28- 229) . Y.11 111 •ih• referida leva, entretanto, a que por vezes o adjetivo novelístico seja utilizado como referência à ficção
estudiosos (p. ex.: A. Fowler e E. M iner) apoiaram a sua reflexão acerca dos generos hteranos no con u ·t1 11 11.11lva de um modo geral; não é certamente estranha a essa generalização a diversidade de sentidos que
wittgensteiniano de semelhanças de família . . 111< lcriza novela (e o seu correlato novel) em diversos idiomas.
11 M. M . Bak11 tin, "Th e Problem of Speech Genres", in Speech Genres and Other Late Essay~, Austm , ll 11 l1 /\ consciên cia que os escritores por vezes revelam dessas caracterizações modais e até da sua pluralidade
ofTexas Press, 1986, p. 60. Alguns exemplos de géneros de discurso, segundo Bakhtme: dialogos e r~· l.11 11 .1111. se de formas muito diversas. Victor Hugo, no prefácio de Cromwell, comenta que "Racine, divino po-
do quotidiano, discursos escritos em várias formas, ordens de comando _militares, documentos de ~e~'." 111 , , 1 l'icgíaco, lírico, épico; Moliere é dramático" (V. Hugo, "Préface", Cromwell, Paris, Garnier-Flammarion,
comentários políticos etc. Esse texto destinava-se a u ma obra que se mlltulana prec1sament~ Os G~ne111 1 ili llH, p. 94). E Agustina Bessa Luís, confirmando a propensão eminentemente aforística da sua ficção nar-
Discurso. Uma perspetiva idêntica à de Bakhtine (mas informada pela moderna teona sem1ot1ca) e ad11 t.11 l 1 ll\'11, publicou um volume precisamente intitulado Aforismos, composto por extratos dos seus romances,
por Marie-Laure Ryan em "Toward a competence theory ~,r_genre", in Po~tics, 8, 19;9. PP· 30~~337; ct. ' ',',' " 11111 essa propriedade modal é flagrante.
bém ). Flamend, "Le concept de genre chez Bakhtine repns , m Zagadmema Rodza;ow Literack1ch, 29, 1 ( 1 ll. lngarden, A Obra de Arte Literária, Lisboa, Fund. Calouste Gulbenkian, 1973, pp. 317-318; cf. também
1987, pp. 5-14 (que não se refere, contudo, ao texto de Bakhtine que citámos).
ss.); cf. também Marie-Laure Ryan, "Toward a competence theory of genre': in Poetics, 8, 1979, pp. 307 - ~ .\'/ t11t 1od. e notas de Ana Maria de A. Martins; Lisboa, Ed. Caminho, 1989, vol. II, p. 748).
27 Conforme escreve Mario Fubini, "o poeta, mesmo aquele a que se chama primitivo, não enun cia o "1 '11 ll. Wellek e A. Warren, Teoria da Literatura, ed. cit., p. 289.
canto num mundo virgem, novo, ignaro quanto a outras expressões virtual ou atualmente poéticas, se 111\11 llcferimo-nos aqui a poesia numa aceção corrente, que se refere à enunciação de textos em verso. Essa aceção
mesmo de contos de outros poetas: toda a obra poética assenta numa tradição[ ... ] e encontra[ ... ] na tr.1111 • •111 l' nle não anula uma outra (virtualmente ambígua) que entende poesia como designação geral do modo lírico.
ção o seu fundamento e, pode dizer-se, o seu corpo" ("Genesi e storia dei generi letterari", Critica e Poesi11, t'd 1) ivergimos assim das análises que assentam na distinção poesia/prosa como fator crucial de organização
cit., p. 158. Por sua vez, C. Guillén observa "que o poeta, o crítico e o teórico convergem num certo nL11 111·111 111 'u mpo dos géneros ou até de definição da literariedade: é o caso de autores como Massaud Moisés (A Cria-
de situações ou até coincidem" (Literature as System, ed. cit., pp. 122-123), quanto à validação institucio 111il 1d« W erária, 6° ed., São Paulo, Melhoramentos, s/d., pp. 40-42) e Jean Cohen (Structure du langage poétique,
dos géneros. Uma evidência muito significativa dessa convergência verifica-se através da presença, crn 111 11.11 Is, Plammarion, 1966; id. , Le haut langage. Th éorie de la poéticité, Paris, Flammarion, 1979).
ris de prémios literários, de escritores, críticos e professores de literatura; por outro lado, o facto de L'S" '~ ~ muito conhecida (mas merece ainda assim ser referida pelo especial significado de que nesse contexto
prémios (que possuem uma certa dimensão de validação institucional; cf. supra, pp. 25-27 [Cap. I]) mu lt11- 1 11•vcste) a surpresa do protagonista de Le Bourgeois Gentilhomme quando o professor de filosofia lhe diz
vezes serem convocados em referência expressa a géneros (p. ex.: o Grande Prémio de Romance e Nov..111 •1111' "tout ce qui n'e st point Prose, est Vers; et tout ce qui n'est point Vers, est Prose"; e Monsieur Jourdain,
da A.P.E.), confirma a tendência normativa desses géneros. O que não obsta naturalmente a que eles sl'j11111 I" 1pl exo com a descoberta de que falar com naturalidade corresponde a usar a prosa, pergunta: "Quoi,
postos em causa por obras (e até por decisões de júris) que procuram subvertê-los. q111tnd je dis, Nicole apportez-moi mes pantoufles, et me donnez mon bonnet de nuit, c'est de la Prose?"
28 Os termos em que Herculano alude ao primado de Scott são muito curiosos: ao declarar que o Ü<1 l1" 1 11 in cntário final: "Par ma foi, il y a plus de quarante ans que je dis de la Prose, sans que j'en susse rien"
"não é um romance histórico, ao menos conforme o criou o modelo e desesperação de todos os roman<IM li l1•11vres Completes de Moliere, s/l., Le Club du Meilleur Livre, 1956, vol. III, pp. 227-228).
1 Na advertência ao leitor inscrita na publicação das obras de António José da Silva, o autor pronuncia-se
tas, o imortal Scott" (nota ao prólogo do Eurico, 41' ed., Lisboa, Bertrand, s/d., p. 285), Herculano rec us11 11
género, ao mesmo tempo que implicitamente reconhece a sua relevância cultural. 11li r' a questão do estilo, em termos que remetem diretamente para o uso da prosa e não do verso: "Saberá o
29 Claudio Guillén assinalou, num ensaio muito perspicaz, o significado de que se reveste, na Cu l111 111 11 1r mo leitor desapaixonado não desprezar por menos polida a frase que no contexto de semelhantes Obras
Espanhola dos séculos XV e XVI, o "diálogo" género/contragénero, traduzido, por um lado, na form ação d11 1 11•l1uer, pois muito bem conheço que no cómico se precisa um estilo mediano; que, como a representação
novela picaresca e, por outro, na sua rejeição pelo Quijote de Cervantes (cf. C. Guillén, "Genre and Cou11 t1·1 11111 u imitação dos sucessos que naturalmente acontecem, também a frase deve seguir o mesmo preceito,
genre: The Discovery ofthe Picaresque", in Literature as System, ed. cit., pp. 135-158. l 111•1Hlo diferença que o estilo subl ime e elevado, a que chamaram os Romanos coturno, só se permite nas
3° Cf. R. Wellek e A. Warren, Teoria da Literatura, ed. cit., p. 289. Numa obra recente, Maurice Coutu 1li•1 11.11111di as, em que se trata de cousas graves e nimiamente sérias, como ações e obras heroicas de príncipes.
mostrou mesmo que desde o século XVIII, quando se industrializa a produção do livro (e também qu a11d11 N111omédia, porém, há-de ser o estilo doméstico, sem afetação de sublime, a que chamam soco por se repre-
o número de leitores aumenta consideravelmente e quando o escritor se autonomiza em relação à prote1 1l11 111t ,1r nela matérias de enredos feminis e ações amorosas" (Obras completas de António José da Silva, Lisboa,
mecenática), criam-se condições propícias para a rearticulação dos géneros e em particular para a afirma1 1t11 l lv Sá da Costa, 1957, pp. 5-7).
do romance como grande género moderno (cf. Textual Communication. A Print-based Theory of the NMl'i , V. Hugo, "Préface" de Cromwell, ed. cit., p. 96. Curiosamente, contestando, em textos dramáticos an-
London/New York, Routledge, 1991, especialmente pp. 36 ss. e 93 ss.). t 1lnrcs ao Romantismo, uma certa versificação pomposa, Hugo defende o uso do verso precisamente em
31 Trata-se de um tipo de composição (ou grupo de composições) de definição algo problemática, usa d11 11111 11 ' da naturalidade e como forma de superação da banalidade.
em Portugal nos séculos XVII e XVIII: segundo Coimbra Martins, "a designação aplicava-se às manifesta1·111·- A. Garrett, "Ao Conservatório Real'; in Zoe. cit., p. 1.083 . Que a naturalidade procurada por Garrett
de estro em que o poeta, abalado subitamente por um sentimento violento, soltasse de improviso cantos d1 li 11vés do recurso à prosa tenha sido contrariada pelo empolamento do dramalhão romântico, é algo que
forma fácil e fundo ardente; ou, bem entendido, aos poemas elaborados que imitassem tal espontaneidade 1111 111 ll rre da degenerescência estética sofrida pelo Romantismo português, ao arrepio da clarividência doutri-
desordem'' (in Dicionário de Literatura dir. por J. do Prado Coelho, 3' ed., Porto, Liv. Figueirinhas, 1973, 4" v111 1111l,1 do autor das Viagens.
p. 1.020) . Outras aceções para o mesmo termos encontram-se em A. Fowler, op. cit., pp. 134-135. ' llecordem-se, por exemplo, as palavras de joão da Ega, quando, num episódio conhecido d'Os Maias,
32 M . de Unamuno, Niebla, Madrid, Cátedra, 1982, p. 200. Unamuno constrói nessa sua obra uma curio ,.1 ll11na a sua radical conceção do Naturalismo, conceção não isenta de contradições: "A forma pura da arte
situação de criação ficcional en abyme, assumida precisamente pela personagem Víctor Goti, autor fiel h 111 111 t11rulista devia ser a monografia, o estudo seco dum tipo, dum vício, duma paixão, tal qual como se se tra-
da narrativa que está a ser lida. Também o escritor Ramon Gómez de la Serna tentou, de forma m ais p1·1 t 1 t' d um caso patológico, sem pitoresco e sem estilo! .. :' (E. de Queirós, Os Maias, Lisboa, Livros do Brasil,
sistente, uma inovação de género: as greguerias, descritas numa espécie de teoria geral que se encontra 1111 '" ' p. 164).
advertência prévia às Greguerías escogidas (Paris/Madrid/Lisboa, Agencia Mundial de Librería, s/d.) . Atente-se no que escreveu Bruce A. Rosenberg: "O gén ero de concretização oral [... ] não existe em
33 Jean-Marie Schaeffer, Quést-ce qu'ungenre littéraire?, ed. cit., p. 153. Cf. do m esmo autor, "Literary Gc1111•1 l11 1111 n fixa , como o soneto o hino ou a el egia, mas antes como um ideal fluido, por depender de forças
Ilíada - e não considerando que se trata de um texto do modo narrativo-, Edgar Poe sugere que o q111· 111 li W. Kayser, Análise e interpretação da obra literária, 5° ed., Coimbra, Arménio Amado, 1970, II vol., p. 273.
se encontra é uma série de fragmentos líricos (Zoe. cit., p. 267). A relevância do diálogo no contexto do drama é assim comentada por Peter Szondi: "La suprématie du
48
Sobre a poesia em prosa, a sua configuração estilística e as suas práticas literárias, a obra de re l'c· r 111 li1 .lhilogue et donc de l'é change interhumain du dram e indique que celu i-ci n'a d'autre matiere que la reproduc-
obrigatória continua a ser a de Suzan ne Bernard, Le poeme en prose de Baudelaire à nos jours, Paris, Nl11 I 111111 du rapport entre les homm es et qu'il ne connait que ce qui brille dans cette sphere" (Théo rie du drame
1959. Veja-se também: Barbara Johnson, "Quelques conséquences de la différence anatomique des il' xl1• 11111r/erne, Lausanne, LÂ.ge d'Homme, 1983, p. 14).
Pour une théorie du poeme en prose", in Poétique, 28, 1976, pp. 450-645; Dominique Combe, Poésic ct 11'1 li Miroslav Procházka, "On the Nature of Dramatic Text", in Herta Schmid e A. Van Kesteren (eds .), Se-
Une rhétorique des genres, Paris, J. Corti, 1989, pp. 91-108. 111/otics of Drama and Theatre, Amsterdam/ Philadelphia , John Benjanins, 1984, p. 102.
49
Poemas de Alberto Caeiro, Lisboa, Atica, 1978, p. 52. Acerca da contaminação dos textos líri rn' 11111 • E. Staiger, Conceptos Fundamentales de Poética, Madrid, Rialp, 1966, p. 174.
procedimentos narrativos, cf. L. Jenny, "Le poétique et le narratif", in Poétique, 28, 1976, pp. 440-449. f. supra, nota 46, Cap. IV, p. 214.
'º N. Frye, Anatomy of Criticism, ed. cit., pp. 250-251. A ressalva que há que fazer é a seguinte: Frye ui Il i 11 G. Vicente, Auto chamado dos Físicos, Obras Completas; pref. e notas de Marques Braga; 3'ed., Lisboa,
substantivamente termos (epos, ficção, drama, lírica) que, de acordo com o critério aqui perfilhado, dl'vrn1 1 lv. á da Costa Ed., 1968, vol. VI, p. 112.
referir-se antes, de forma tripartida, a modos literários, integrando -se epos e ficção no modo narrn1 1v11 A. Garrett, Viagens na minha terra, Lisboa, Ed . Estampa, 1983, p. 229. Mais adiante, anuncia-se, no
por outro lado, de acordo com essa opção que fi zemos, os modos a que alude Frye remetem, de fact o, 1'111 11 ll111ior do capítulo XXXIV, "a peripécia do dramà'. Devendo considerar- se adventícios, esses episódios de
géneros. As teses apresentadas e defendidas nessa importante obra de Northrop Frye foram comentada ' 1•111 11111lam in ação não afetam a essencial condição modal dos textos em que surgem . Parece, pois, excessivo
pormenor por P. Hernadi, Beyond Genre, ed. cit., pp. 131 ss. 1tllr111ar que "se o romance nunca é puramente dramático, é essencia lmente dramático. Não é um jogo de
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Cf. A. Fowler, Kinds of Literature, pp. 60-74. Andre Lefevere analisou os termos em que se processa a L'V11h 1 p1dnvras dizer que o romance não é uma forma narrat iva com momentos dramáticos, m as uma forma dra-
ção dos géneros literários, em articulação com o processo geral de evolução da história literária (cf. "Systc1m 111 1111\1 ica inserida num quadro narrativo" (S. W Dawson , Drama and the Dramatic, London, Methuen, 1970,
Evolution. Historical Realitivism and the Study ofGenre'; in Poetics Today, vo\. 6, 4, pp. 665-679). l'I'· 79-80). As relações entre texto narrativo e texto teatral foram pertinentemente analisadas por Cesare
52
Cf. C. Guillén, Literature as System, ed. cit. pp. 109- 111. C. Guillén procura esclarecer os sentido, q1 11 1•gre, em Teatro e romanzo. Due tipi di comunicazione /etteraria, Torino, Einaudi, 1984, pp. 3 ss. e 15 ss.
atribui a matéria e a forma; notando que "uma fo rma preexistente nunca pode ser simplesmente 'usurl'.11 111 Cf. Oscar Lee Brownstein e Darlene M. Daubert, Analytical Sourcebook of Concepts in Dramatica The-
p elo escritor ou transferida para uma nova obra'; Guillén sublinha que matéria não se con funde com tl·111 11 •11 y, ed. cit., pp. 220-232. A questão da ilusão dramáti ca encontra-se analisada, n uma perspetiva psicossem i-
assunto ou conteúdo e afirma: "Todas as form as prévias [... ] tornam-se m atéria nas mãos do arti sta q111 111 ka, por Stratos E. Constantinidis, "Illusion in Th eater. The Sign/Stimulus Equ iva lence", in Poetics Today,
trab alha. Se a matéria é aquilo a que o poeta dá forma, então a prosódia, nesse preciso momento, é mat {·1l11 VII I. 8, 2, 1987, PP· 245-260.
o m etro é matéria e um motivo ou uma intriga são-no também tal como um plano de composição nu 1111 1 ,. Stendhal, Racine et Shakespeare, Paris, Librairie Ancienne Honoré Champ ignon, 1925, pp. 15- 16.
princípio de estruturà'; e mais ad iante: "A forma é a presença de uma 'causa' num objeto criado e conslrnl./11 O sentido em que aqu i nos referimos ao vigor ilocutório dos atos discursivos formulados no espetáculo
pelo homem. É a revelação ou o signo de uma relação dinâm ica entre o artefacto 'acabado' e a sua origc 111 1111 1t•1tlral remete para a teo ri a da linguagem de J. Austin , aprofundada por John Searle: o ato ilocutório é aquele
vida e na história prévias" (op. cit., pp. 110-111 ). r 111 que o ato discursivo não só produz um enunciado, mas realiza também uma ação (p. ex.: "Juro que farei
53
Marie-Laure Ryan acrescenta ainda: "A diferenciação dos géneros em subgéneros é potencialmente il i111li 11 11 <1ue me pedes", "Declaro-vos marido e mulher", "Ordeno -te que obedeças!") .
da: para cada género codificado, precisamos apenas de juntar uma regra obrigatória para obtermos um su\>111 1 Sandy Petrey, Speech Acts and Literary Th eory, New York/London, Ro utledge, 1990, p. 86. Centrando -
nero. Contudo, esta proliferação de subgéneros é travada pelos limites do reconhecimento cultural" ("Tnw.11 il '' no drama como exemplo de ato d iscursivo de índole eminentem ente performativa (quer dizer: como
a competence theory of genre'; Poetics, 8, 1979, p. 312). Outro ensaio da mesma autora sobre o mesmo assu111 11 ilt ~c urso que se faz ação), Petrey observa: "Força dramática e força ilocutória coincidem sempre que uma
"Introduction. On the why, what and how of generic taxonomy", Poetics, 10, 1981, pp. 109-126. Jll'Ça é representadà' (loc. cit.). Cf. também K. E Iam, Th e Semiotics of Theatre and Drama, London, Methuen,
54
A. Fowler, Kinds of Literature, p. 112. llJSO, pp. 156 ss.; C. Segre, Teatro e romanzo, ed. cit., pp. 9-11.
55
Cf. Oscar Lee Brownstein e Darlene M. Daubert, Analytical Sourcebook of Concepts in Dramatica '/'/i r Sobre o problema da distância na receção do espetáculo teatral, cf. Daph na Ben Chaim, Distance in th e
ory, Westport/London, Greenwood Press, 1981, pp. 124 ss. Como é evid ente, limitamo-nos por agrn .111 /'/1eatre. The Aesthetics of Audience Response, Ann Arbor, UMI Research Press, 1984. Numa perspetiva m ais
considerar a aceção modal do termo drama. Essa aceção modal não se confunde com designações de gén,·111 11111pla, cf. Susan Bennett, Th eatre Audiences. A Th eory of Production and Reception, Lon don/New York,
como drama burguês ou drama romântico. J(o utledge, 1990.
56
M. Esslin, An Anatomy of Drama, London, Temple Smith, 1976, p. 20. Victor Turner chama a atc111,111 Os funda mentos teóricos da sem iótica teatral en contram-se descritos e bibliograficamente elucida-
para os sentidos que podem ser atribuídos a representar, em relação estreita com a dramatização do q11111I dos em M. de Marinis e Patri zi Magli, "Materiali bibliografici per una sem iotica dei teatro", in Versus,
diano: "Representar é, p ois, trabalho e jogo, uma atividade solene e lúdica, simulação ou verdade, aqui\11 d1 11 , 1975, pp. 53-128; André Helbo, "Theater as Representation", in Sub-Stance, 18/19, 1977, pp. 172-181;
que são feitas as nossas transações mundanas e aquilo que fazemos ou observamos no ritua.I ou no teat 111 Robert Marty, "Bases pour une téatrol ogie", in Kodika s/Code. Ars Sem iotica, vol. 8, nº 1/2, 1985, pp. 121-
(Victor Turner, From Ritual to Theatre. The Human Seriousness of Play, New York, Performing Arts )11111 110. Alguns títulos fundamentais: K. Elam, Th e Semiotics of Th eater and Drama, ed. cit.; M. de Marinis,
na! Public., 1982, p. 102). Cf. também Josette Féral, "La théâtralité. Recherche sur la spécificité du lang.if\• ~1 • miotica dei teatro. L'analisi testuale dello spettacolo, Milano, Bompiani, 1982; Ernest W. B. Hess-Lüttich
que parte da existência do texto dramático, cf. J. L. Styan, "The Play as a Complex Event", in Ge11rl', 1, I , li11 llll\ s?" (loc. cit., pp. 83-84).
1968, pp. 38-54 e Andrzej Zgorzelski, "The Systemic Potential of a Dramatic Text as Theatrical C od cx·: 111 Por exemplo, Maurice Blanchot, não por acaso convocado em duas reflexões distintas, mas conexioná-
Zagadnienia Rodzajów Literackich, XXXV, 1-2 (69-70), 1992, pp. 89-97. 1I t1uanto ao que temos chamado relativização dos géneros: na de Todorov (cf. Les genres du discours, ed.
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Tadeusz Kowzan tentou uma descrição de treze sistemas de signos teatrais, agrupáveis em cin co , "" , li. , pp. 44-47) e na de Jacques Derrida (cf. "La Loi du genre", Zoe. cit., pp. 186 ss.).
juntos, dizendo respeito ao sistema linguístico, à expressão corporal, à aparência exterior do ator, ao cs p.<\ 11 • 'l'heo d'haen, "Genre Conventions in Postmodern Fiction", in Theo d'haen, R. Grübel e H. Lethen
cénico e aos efeitos sonoros (cf. Littérature et spectacle, La Haye/Paris/Warsawa, Mouton/PWN-Éditi 1111• 11 dN. ), Convention and Innovation in Literature, Amsterdam/Philadelphia, John Benjamins, 1989, p. 408.
Scientifiques de Pologne, 1975, pp. 181 ss. 'l'heo d'haen, Zoe. cit., p. 411. D'haen nota que o conceito de cesura epistémica proposto por Foucault
77
P. Pavis, Diccionario dei teatro. Dramaturgia, estética, semiología, Barcelona/Buenos Aires/Méxi co, 1'1 11 , l1 111damental para explicar o desaparecimento daquela visão do mundo, "algures em meados do nosso
dós, 1983, pp. 385-386. Sobre a encenação, especialmente no que respeita à sua relação com o trabalho d11 l t ul o": "O momento em que a transição Modernismo/Pós-Modernismo tem lugar coincidiria, pois, com
ator, veja-se Fernando Wagner, Teoria e técnica teatral, Coimbra, Almedina, 1979. 1 11•sura epistémica de Foucault" (Zoe. cit.). Note-se, entretanto, que o fa cto de os escritores mencionados
78
A ligação de determinados atores a determinados papéis constitui uma tendência que pode levar a 111 1111 1111•111 hoje atingido um estatuto de notoriedade considerável (até à consagração pelo Prémio Nobel, corno
certa especialização, mas também a algum a rotina: p. ex., o século XIX conheceu um teatro não raro red1111 11ttnleceu com García Márquez e William Golding), constitui um sintoma de "pacificação", através da incor-
dante quanto ao tipo de personagens que punha em cena (o pai nobre, a ingénua, o galã etc.). 1"11'<1ção no sistema literário (com a confirmação das suas instituições de canonização) dos procedimentos
79
A. Ubersfeld, Lire le théâtre, Paris, Éditions Sociales, 1978, p. 156. .!1 I' •futação genológica.
80
G . Vicente, Auto da Barca do Inferno, Obras Completas, ed. cit., vol. II, p. 39. Sobre o significado e alcance metaliterário de termos como os que foram mencionados, cf. R. Champig-
81
Nalguns romances do século XIX ilustra-se essa situação de forma muito sugestiva, tanto em relaçã o 1111 11 y, "Por and against genre labels", in Poetics, 10, 2-3, 1981, especialmente pp. 164-167.
teatro como em relação à ópera: no cap. XV da segunda parte de Madame Bovary de Flaubert, Emma 1w 11 V. Ferreira, Pensar, Lisboa, Bertrand, 1992, p. 164.
contra Léon durante um intervalo da Lucia de Lamermoor, a que assiste fascinada; no cap. XIII d'O Pri111/1 l)e novo aqui a especificidade do modo dramático, no que implica quanto às complexas relações com o
Basílio de Eça, a ida de Luísa ao S. Carlos, constituindo uma pausa na intriga alucinante que a personaf\1' 111 , )ll' iáculo teatral, dificulta o desenvolvimento de uma reflexão em sentido correspondente à que é possível
está a viver, revela-se também um momento de exibição mundana ("Luísa chegara -se para a frente; ao ru ld11 11 v1tr a cabo nos casos da narrativa e da lírica.
da cadeira, cabeças na plateia voltaram-se, languidamente; pareceu decerto bonita, examinaram-na''); ~ 110 O Modernismo brasileiro ocorre depois do Modernismo português; o Modernismo espanhol tem mais
cap. XVI de La Regenta de Clarín, Ana Ozores vive, sintomaticamente durante a representação do Don }1,.111 , 1111cxões com o Simbolismo do que com o seu homónimo português.
de Zorrilla, um episódio de discreta aproximação ao sedutor Álvaro Mesía. ''
111
f. supra, pp. 237-239.
82
Não tratamos agora de apurar a influência exercida sobre a representação dramática por linguagen,, " •• 11 J. Gomes Ferreira, Poesia IV, Lisboa, Portugália, 1979, p. 92.
meios de comunicação autónomos (rádio, televisão, cinema), que muitas vezes acolhem e adaptam textos d' '' Em vários momentos do texto das Viagens chama-se a atenção precisamente para isso; atente-se no
máticos; cf. P. Pavis, Theatre at the Crossroads of Culture, London/New York, Routledge, 1992, pp. 99 ss. 1fl lilnte passo: "Muito me pesa, leitor amigo, se outra coisa esperavas das minhas Viagens, se te falto, sem o
83 q111•rcr, a promessas que julgaste ver nesse título, mas que eu não fiz decerto. Querias talvez que te contasse,
Descrições relativamente pormenorizadas de espaços e instrumentos de utilização cénica encontram ·' ''
em G. Girard, R. Ouellet e C. Rigault, O universo do teatro, Coimbra, Almedina, 1980, especialmente pp. h'I 11t.11 co a marco, as léguas da estrada? palmo a palmo, as alturas e larguras dos edifícios? algarismo por al-
ss. e em P. Van Tieghem, Technique du théâtre, 3ª ed., Paris, P.U.F., 1969, pp. 50 ss. e 71 ss. ~,11 Ismo, as datas da sua fundação? que te resumisse a história de cada pedra, de cada ruína? .. :' (A. Garrett,
84
Textos fundamentais da doutrina brechtiana encontram-se na recolha organizada por Siegfried Unsdd , \ lllgl'ns na Minha Terra, Lisboa, Estampa, 1983, p. 239-240.
Estudos sobre teatro. Para uma arte dramática não aristotélica, Lisboa, Portugália, s/d. Também de edi 1'.111 '"' G. Genette observa que, "em larga medida, a narrativa de ficção heterodiegética é uma mimesis de
portuguesa, veja-se J. Grotowski, Para um teatro pobre, Lisboa, Forja, 1975. 1111 mas factuais como a História, a crónica, a reportagem"; por outro lado, "os procedimentos de 'ficcio-
85
F. García Lorca, "Charla sobre teatro'', Obras Completas, 18' ed., Madrid, Aguilar, 1973, p. 1.1 78. 1111 1 1 ~.ação' [... ] desde há algumas décadas difundiram -se em certas formas de narrativas factuai s como a
86
E. M iner, Comparative Poetics, ed. cit. , p. 8. Cf. também op. cit., p. 217; note-se que o sentido em que MI 11 portagem ou a investigação jornalística (aquilo a que nos Estados Unidos se chama o 'New fourna-
ner se refere, no último capítulo da sua obra, ao relativismo dos géneros difere daquilo que neste mom ent 11 /1 111 ') e outros géneros derivados como a 'Non-Fiction Novel"' (Fiction et Diction, ed. cit., pp. 90-91).
nos ocupa, contemplando antes as interpenetrações modais (p. ex.: a presença pontual da lírica no drama 1111 "" Neste último caso, esse esvaziamento dos protocolos diarísticos relaciona-se ainda com a estética do
na narrativa) a que noutro local aludimos (cf. supra, pp. 174-175 [Cap. IV, 2]). l1<tf1111entário e evidencia-se por uma espécie de efeito de demarcação: o mesmo escritor compõe e publica
87
Cf. supra, nota 26, Cap. IV, p. 212. 111. 1los por assim dizer canónicos (os volumes da Conta Corrente), mencionados nas "obras do autor" exata-
88
T. Kent, Interpretation and Genre. The Role of Generic Perception in the Study of Narra tive Texts, Lon 111\'n\ e na secção "Diário", que também acolhe o volume Pensar, a propósito de cujos textos o autor escreve: "
don/Toronto, Associated Univ. Press, 1986, p. 146. Kent nota que destacados estudiosos da problernáti u1 t 1 textos que se seguem são o esparso e desordenado e acidental do 'fragmento'. Ele tem que ver assim talvez
da interpretação e da receção literárias (E. D. Hirsch, H . Robert Jauss, W. Iser) confirmam a relevânL111 11111bém com o impensável do nosso tempo. Não porque a organização num todo não seja hoj e possível - e
assumida por essa perceção de género no ato interpretativo. Cf. também A . Fowler, "The Life and Death 111 111 ulguns o foi - mas porque a acidentalidade de tudo, a instabilidade, a circunstancialidade veloz, a
Literary Forms", in R. Cohen (ed.), New Directions in Literary History, Baltim ore, The Johns Hopkins Uni v 111 f1lllividade voraz, recusam a aparência do definitivo de quem constrói para a eternidade, harmonizando-
Press, 1974, pp. 80-83. ' preferentemente com o variável e instantâneo do passar. Daí a atualidade do diá rio - e estes textos são
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Cf. T. Todorov, Les genres du discours, Paris, Seuil, 1978, p. 53. 1111111 espécie de diário do acaso de ir pensando" (Pensar, ed. cit., p. 17).
'º Cf. J. Derrida, "La Loi du genre/The Law ofGenre'', in Glyph. Textual Studies, 7, 1980, pp. 177 e 17'1 f. A. Fowler, "The Future of Genre Theory: Functions and Constructional Types", in R. Cohen (ed.),