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Contexto Histórico das

Políticas Sociais

Nelson Russo de Moraes


Silma Rosa da Silva Moreira
Mônica Brito

3º Período

Palmas/TO - 2007
FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE DO TOCANTINS
Reitor
Humberto Luiz Falcão Coelho

Vice-Reitor
Lívio William Reis de Carvalho

Pró-Reitor de Graduação
Galileu Marcos Guarenghi

Pró-Reitora de Pós-Graduação e Extensão


Maria Luiza C.P. do Nascimento

Pró-Reitora de Pesquisa
Antônia Custódia Pedreira

Pró-Reitora de Administração e Finanças


Maria Valdênia Rodrigues Noleto

Diretor de Educação a Distância e Tecnologias Educacionais


Claudemir Andreaci

Coordenador Pedagógico
Geraldo da Silva Gomes

Coordenadora do Curso
Jaqueline Carvalho Quadrado

EDUCON – EMPRESA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA LTDA


Diretor Presidente
Luiz Carlos Borges da Silveira

Diretor Executivo
Luiz Carlos Borges da Silveira Filho

Diretor de Desenvolvimento de Produto


Márcio Yamawaki

Diretor Administrativo e Financeiro


Júlio César Algeri

MATERIAL DIDÁTICO
Organização dos Conteúdos
Nelson Russo de Moraes
Silma Rosa da Silva Moreira
Mônica Brito

Processo Editorial I
Darlene Teixeira Castro e Maria Lourdes F. G. Aires

Processo Editorial II
Karylleila Andrade Klinger e Kyldes Batista Vicente

DESIGN GRÁFICO
Chefe de Setor
Vivianni Asevedo Soares Borges

Designers
Edglei Rodrigues e Irenides Teixeira

Ilustrações
Edglei Rodrigues

Diagramação
Douglas Donizeti Soares

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Serviço Social
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Apresentação

Prezado (a) Acadêmico (a),

Você está recebendo o material referente à disciplina Contexto


Histórico das Políticas Sociais, que traz o início de um conteúdo bastante
importante: o entendimento de políticas sociais, sob uma ótica que permeia a
sua concepção histórica e o tratamento específico dado ao assunto pelo
próprio Serviço Social.
O campo prático do Assistente Social passa cotidianamente pelas
Políticas Sociais, por seu desenho e planejamento, por sua implementação
por meio de projetos e ações estatais e não governamentais e por seu
desenvolvimento prático no atendimento às demandas sociais existentes nas
mais distintas comunidades.

Bons estudos,

Prof. Nelson Russo de Moraes


Profa. Silma Rosa da Silva Moreira
Profa. Mônica Brito

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
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PLANO DE ENSINO
CURSO: Serviço Social
PERÍODO: 3º
DISCIPLINA: Contexto Histórico das Políticas Sociais

EMENTA
Fundamentação histórica da política social. A era Vargas:
modernização conservadora e políticas sociais brasileiras. Sujeitos políticos
das políticas públicas e privadas. Política social por excelência, suas
características e categorias. O Serviço Social e as ações de enfrentamento da
questão social via políticas sociais. A contribuição do Serviço Social no
controle, na participação e na avaliação.

OBJETIVOS
• apresentar os primórdios das políticas sociais;
• contextualizar historicamente o processo de ruptura do liberalismo,
que propunha a existência do Estado-mínimo;
• conhecer as políticas sociais brasileiras a partir da era Vargas;
• conhecer o contexto das políticas sociais contemporâneas.

CONTEÚDO PROGRAMÁTICO
• Proteção Social nos séculos XVIII e XIX
• Estado mínimo (liberalismo)
• Estado nação (modelo keynesiano)
• O Estado de Bem-estar Social (welfare state)
• Introdução às políticas sociais no Brasil
• A era Vargas e as políticas sociais universalistas
• Políticas sociais compensatórias
• A redemocratização
• A redução do Estado: de nação para gerente
• Repercussões dos ideários neoliberais
• Políticas sociais e cidadania

BIBLIOGRAFIA BÁSICA
FALEIROS, V.P.F. A política social do estado capitalista. São Paulo:
Cortez, 2000.
PEREIRA, P.A.P. Necessidades humanas: subsídios à crítica dos mínimos
sociais 2; ed. São Paulo: Cortez, 2002.

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
BOBBIO, N. Liberalismo e democracia. São Paulo: Brasiliense, 2004.
DEMO, P. Política social, educação e cidadania. Campinas, SP: Papirus,
1994.
DRAIBE, S.M. Uma nova institucionalidade das políticas sociais. São Paulo
em Perspectiva: São Paulo, ano 11, n° 4, p.3-15, dez.1997.

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FERNANDES, R.C. Privado porém público. Rio de Janeiro: Relume-
dumará, 1994.
HAL, J.A.; IKENBERRY, G.J. O Estado. Lisboa: Estampa, 1990.
HOBSBAWN, E.J. Era dos extremos: o breve século XX: 1914 a 1991. São
Paulo: Companhia das Letras, 1995.
OMAHE, K. O fim do estado-nação. Rio de Janeiro: Campus, 1999.

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Serviço Social
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Sumário

Unidade 1 – A Proteção Social nos Séculos XVIII e XIX ....................... 9

Unidade 2 – O Liberalismo e o Estado-mínimo ................................... 14

Unidade 3 – A ruptura do Estado-mínimo .......................................... 19

Unidade 4 – O modelo econômico keynesiano .................................... 22

Unidade 5 – O Estado de Bem-estar Social ........................................ 26

Unidade 6 – Políticas sociais no Brasil: aspectos introdutórios .............. 29

Unidade 7 – As políticas sociais no Brasil:


de 1930 a 1945 - “Era Vargas”.......................................................... 34

Unidade 8 – As políticas sociais no Brasil:


de 1945 a 1964 – fase populista........................................................ 39

Unidade 9 – As políticas sociais no Brasil:


de 1964 a 1985 – fase da ditadura militar e abertura política................. 43

Unidade 10 – As políticas sociais no Brasil: de 1980 a 1990 – transição


democrática ................................................................................... 49

Unidade 11 – A Constituição Federal de 1988 e as políticas sociais ....... 53

Unidade 12 – O Período Neoliberal: o Processo de descentralização das


Políticas Sociais no Brasil – (1990 a 1998) .......................................... 57

Unidade 13 – O Período Neoliberal: o Processo de descentralização das


Políticas Sociais no Brasil – (1998 a 2002) .......................................... 62

Unidade 14 – Política social na sociedade moderna............................. 68

Unidade 15 – As Políticas Brasileiras de Seguridade Social................... 73

Unidade 16 – Políticas Sociais fundamentadas na legalidade e


transparência ................................................................................. 79

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A proteção social nos séculos XVIII e XIX

Meta da unidade
Contextualização dos princípios históricos da proteção social,
apontando sua correlação com o Estado e com a economia e sua relevância
para a constituição das políticas sociais.

Objetivos
• contextualizar o enfoque social da Europa, em especial na
Inglaterra e Alemanha, durante a época em que as primeiras
políticas públicas de proteção social foram implementadas;
• reconhecer o modelo de proteção social da Inglaterra no
século XVIII;
• reconhecer o modelo de proteção social da Alemanha no
século XIX.

Pré-requisitos
Você já cursou a disciplina Introdução ao Serviço Social (no
primeiro período do Curso de Serviço Social). Portanto, já possui
conhecimentos acerca da organização da sociedade nos séculos XVIII e XIX
(especialmente urbana) para o atendimento dos pobres. Nesse contexto você
conheceu o importante trabalho da Igreja e das chamadas “damas de
caridade”. Sugerimos que você faça uma nova leitura do capítulo do
Cadernos de conteúdos e Atividades “Introdução ao Serviço Social” que
trata das “damas de caridade” e do papel da Igreja daquela época. Atente
também para o correto entendimento do contexto da Revolução Industrial,
que se desenrola no século XVIII, pois, nesse século, as políticas de
atendimento às necessidades sociais são propostas inicialmente pelo Estado.
Sempre que possível consulte a bibliografia indicada ao final da unidade
didática.

Introdução
Em uma época em que as tendências consumistas se misturavam à
liberalidade de produção e em que novos inventos supriam as necessidades
humanas mais imediatas, na Inglaterra concebeu-se uma legislação para a
demarcação de garantias sociais mínimas.
O século XVIII expõe os contrastes da maximização produtiva da
Revolução Industrial. A industrialização dos processos artesanais, a
substituição das manufaturas por produtos de melhor qualidade e a

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urbanização intensificam-se exponencialmente, em detrimento da qualidade
de vida, destacadamente dos trabalhadores. Nesse cenário, na Inglaterra e
posteriormente na Alemanha, foram experimentados os modelos iniciais de
proteção social.
A Revolução Industrial foi um processo em que, com o aumento
livre das demandas e das necessidades humanas, houve a implantação de
processos industriais para a produção de bens que anteriormente eram
fabricados de maneira artesanal por pessoas isoladas ou por organizações
familiares.

A antiga lei dos pobres (Poor Law)


O modo de produção capitalista, em seus primórdios, baseava-se na
relação de troca de bens que poderiam suprimir necessidades humanas até
então confinadas no âmbito das expectativas das pessoas e famílias. A regra
geral era a de que aquelas pessoas que possuam mais recursos tenham a
possibilidade de adquirir máquinas, equipamentos e matérias primas,
passando à condição de proprietários dos meios de produção.
Esse ciclo simplório existente na relação entre o capital e o trabalho
aponta para uma escassa preocupação e atenção para com as necessidades
dos trabalhadores com dificuldades sociais, no caso de acometimento de
doenças, acidentes de trabalho ou por outros motivos de caráter sócio-
familiar.
Nos primórdios, há verdadeiras tentativas de isolamento (ou retirada
da circulação social) das pessoas que não conseguiam sustentação por suas
próprias mãos, como idosos, crianças órfãs e pessoas doentes. Essas ações
consistiam em uma reflexão mais aprofundada sobre as relações de trabalho
para a supressão de dificuldades nessas relações. Conforme Polanyi (apud
PEREIRA, 2002):

As Leis dos Pobres (Poor Law) formavam um conjunto


de regulações pré-capitalistas que se aplicava às pessoas
situadas à margem do trabalho, como idosos, inválidos,
órfãos, crianças carentes, desocupados voluntários e
involuntários etc. Contudo, a despeito de, na aparência,
esse conjunto de regulações se identificar com a
pobreza, era no trabalho que ele se referenciava. Tanto é
assim que, entre 1536 e 1601, as Leis dos Pobres, de par
com o Estatuto dos Artífices (Statute of Artificiers),
compuseram o Código do Trabalho na Inglaterra
(POLANYI apud PEREIRA, 2002, p.103).

Pode-se definir a antiga Lei dos Pobres como sendo altamente


punitiva por assumir características de isolamento das pessoas que não se
enquadravam nos processos produtivos das fábricas ou que não conseguiam
produzir mesmo que artesanalmente. É correto afirmar, então, que a presença
do Estado, nessa época, ocorre como balizador do direito à propriedade e da
liberalização da relação entre capital e trabalho, próprios do liberalismo
econômico.
A Lei dos Pobres (Poor Law), desenvolvida desde 1536 na
Inglaterra, que previa o atendimento (confinamento) em asilos, albergues e
orfanatos das pessoas desocupadas ou improdutivas (sob a óptica do
Capital), tem seu caráter excludente reforçado pela Lei do Domicílio (Act of
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Settlement). Essa lei reduziu a liberdade de trânsito entre as localidades das
pessoas improdutivas, de maneira a proteger as paróquias (vide apostila
Introdução ao Serviço Social, sobre o trabalho das paróquias no
atendimento às demandas das famílias de seu entorno), onde o atendimento
aos pobres era melhor, como afirma Polanyi (apud Pereira, 2002):

[...] em 1662, incorporaram a Lei de Domicílio (Act of


Settlement), que restringia a mobilidade espacial das
pessoas, protegendo as paróquias mais dinâmicas da
invasão de indigentes de paróquias menos ativas. Esse
conjunto de leis era mais punitivo do que protetor. Sob a
sua regência, a mendicância e a vagabundagem eram
exemplarmente castigadas (POLANYI apud PEREIRA,
2002, p.103).

O cenário histórico aponta, então, para a obrigatoriedade do


trabalho, sem muitos direitos e por qualquer remuneração, sendo que a
assistência, sob a forma das Casas de Trabalho, abrigava apenas crianças,
idosos, inválidos e outros indivíduos sem condições produtivas.

A Speenhamland Law (uma nova Lei dos Pobres)


Em 1795 – virada do século XVII para o século XVIII –, a Inglaterra
(Grã-Bretanha) implanta o mínimo de renda. As pessoas passam a ter um
rendimento garantido, ou seja, o reconhecimento público do direito de
homens e mulheres a sua subsistência.
A nova lei estabelece como responsabilidade da sociedade a
sustentação ou complementação do mínimo necessário à sobrevivência dos
indivíduos e famílias, mesmo daqueles não inseridos no processo produtivo
por diferentes motivos. O aspecto mais contraditório da Speenhamland Law
foi a proclamação de que toda família teria sustentação garantida (por menor
que fosse sua produção), enquanto o crescimento da atividade industrial
necessitava de grandes massas de pessoas que necessitassem do trabalho
para a sua sustentação.

Lei Revisora (Poor Law Amendment Act)


Em 1834, ainda na Inglaterra, foi realizada a revisão das leis dos
pobres anteriormente promulgadas. Nessa nova versão da política social, a
ideologia da economia liberal ganhara espaço e as pessoas perderam a
proteção dos mínimos necessários à sua manutenção. O novo
direcionamento agradou aos liberais que pregavam a antinaturalidade da
proteção social o direito de livre circulação dos trabalhadores e a negociação
direta e autônoma do valor da mão-de-obra no mercado de trabalho.
Segundo os liberais, a pobreza era sinônimo de mau funcionamento da
relação entre o capital e o trabalho, devido à proteção do sistema social e à
interferência do Estado.
Ao final do século XIX, em um período de forte aquecimento da
economia, os trabalhadores passaram a se organizar em sindicatos,
reivindicando melhores condições salariais e de trabalho.
Em 1911, com a criação de um novo modelo de Seguro Social
(auxílio doença e auxílio desemprego), aliado à Lei de Assistência aos

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Idosos de 1908, iniciou-se na Inglaterra uma grande inovação plenamente
gerida pelo Estado.
Esse seguro era obrigatório e aplicava-se unicamente
aos operários que ganhassem menos de 320 libras por
ano. Gerido pelo Estado, abrangia igualmente o risco de
invalidez (...) Esta lei foi complementada em 1920 e
1931 por planos mais desenvolvidos de assistência ao
desemprego. Em 1923, foi igualmente instituído um
sistema de pensões em favor das viúvas e dos órfãos.
(ROSANVALLON, apud PEREIRA, 2002, p.110).

A Alemanha e as políticas sociais de Bismarck


Na Alemanha, Otto von Bismarck, que se constituiu em um dos mais
importantes líderes nacionais do século XIX, na década de 1880, reconheceu
os sindicatos, criou a lei dos acidentes de trabalho e o auxílio doença. O
sistema previdenciário de Bismarck foi o primeiro da história
contemporânea, o que lhe garantiu o apoio da classe operária em sua gestão.

Síntese da unidade

Esta unidade didática trouxe o entendimento acerca da história


mais antiga da formação das políticas sociais. Foram os governos
britânicos e alemães a iniciar o atendimento das populações menos
abastadas ou excluídas.

1 - Quais eram os grupos sociais alvo da Lei dos Pobres?


( ) crianças, independentemente das condições sociais;
( ) desempregados, mendigos, idosos e crianças
abandonadas;
( ) toda a sociedade era protegida pela Lei dos Pobres;
( ) os idosos para que não pedissem ajuda às empresas.

2 - Agora que você conhece os primórdios históricos da política social na


Europa, destacadamente na Inglaterra e na Alemanha, indique e comente a
fragilização da condição do trabalhador trazida pela Lei Revisora de 1834.

Comentário

A Lei dos Pobres (Poor Law) contemplava as pessoas que não se


enquadravam no processo produtivo. Se, por um lado, as pessoas perderam
a proteção da sociedade, dada pela Nova Lei dos Pobres (Speenhamland
Law), por outro, o mercado apontava para a necessidade de livre
negociação dos preços da mão-de-obra para o processo produtivo-
industrial. Temos então, com o afastamento do Estado e com a liberação
das relações trabalhistas, uma maior exposição do trabalhador às condições
de exploração do capital (Lei Revisora).

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Informações sobre
a próxima unidade
Você vai conhecer, estudar e compreender o Liberalismo
econômico e o modelo de Estado-mínimo, que forneciam
escasso atendimento às necessidades sociais.

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Serviço Social
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O liberalismo e o Estado-mínimo

Meta da unidade
Contextualização histórica, conduzindo o acadêmico ao
entendimento do liberalismo econômico e a projeção de um modelo de
Estado não intervencionista, omisso na relação entre o capital e o trabalho.

Objetivos
• resgatar o conceito e o entendimento do modo de produção
capitalista;
• reconhecer o sistema econômico liberal, delineado pelo
pensamento de Adam Smith;
• conhecer e contextualizar o Estado-mínimo, dentro da ótica
da economia liberal.

Pré-requisitos
Esta unidade é complementar aos seus estudos acadêmicos
desenvolvidos na área da economia. Portanto, além do entendimento da
unidade didática 1 do Caderno de Conteúdos e Atividades, você já deverá ter
claros alguns conceitos básicos da disciplina Fundamentos da Economia.

Introdução
Esta unidade didática nos remete aos estudos do contexto econômico
e social da segunda metade do século XIX e primeiras décadas do século
XX. Tentaremos aqui um entendimento resumido e prático do liberalismo,
segundo um dos seus principais pensadores, o economista Adam Smith.
Iniciaremos com uma sucinta compreensão da origem do Estado e,
posteriormente, passaremos ao surgimento do pensamento liberal
introduzido na Europa no século XVII, concluindo com um breve resumo
das características do liberalismo e de sua ótica de bem- estar social.

Considerações sobre o surgimento do Estado


Alguns autores falam sobre o
surgimento do Estado antes As primeiras formas de Estado surgiram com o aumento da
mesmo da estruturação das complexidade das relações sociais, para assim objetivar a melhor
relações comerciais, enquanto
outros apontam para o
distribuição do trabalho e para assegurar a consecução dos principais
surgimento do mercado e objetivos da comunidade, não só no âmbito de se prover alimentos e de se
posteriormente a organização do expandir os territórios, como também para se cultuar deuses.
Estado.

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Com o surgimento do Estado, observa-se sua divisão em classes
A revolução neolítica foi a
sociais. Com a posse legitíma ou imposta do poder por parte de alguns, todos passagem da caça primitiva à
os demais passam à condição de submissão. agricultura doméstica. Boa parte
dos estudos acerca do Estado
O Estado é considerado como um conjunto formado por três
(inclusive o marxismo) toma isso
elementos básicos: quadro de pessoal, território geograficamente delimitado como marco para o seu
e monopólio de elaboração das leis para todos aqueles que compõem a surgimento, devido ao aumento
considerável da complexidade
nação. das relações sociais.

O Estado-mínimo
Após um longo período da história da humanidade, compreendido
entre a caça primitiva e a revolução neolítica e desta à introdução de relações
comerciais pautadas sobre a troca de bens in natura, começa a surgir no
século XVII uma nova corrente de pensamento: o liberalismo. Na Inglaterra,
o liberalismo se constitui como sendo um conjunto de doutrinas e princípios
com enfoque principal na defesa e proteção da liberdade individual
(liberdade de pensamento, expressão e religião).
As doutrinas liberais não ficam apenas no campo abstrato das
liberdades individuais. Na área econômica e política, o liberalismo se
caracteriza pela teorização de um Estado-mínimo, ao qual caberia não mais
que a intervenção na manutenção da paz e da ordem, a coleta de impostos
leves para a manutenção de uma pequena instância de administração e de
justiça e, principalmente, a proteção da propriedade privada e do direito de
constituição de patrimônios particulares. Adam Smith foi um economista
O principal pensador do liberalismo foi Adam Smith (1723 – 1790), escocês, formulador da teoria do
liberalismo econômico, descritas
que escreveu muito sobre a constituição das riquezas das nações. Adam em sua obra “Ensaio sobre a
Smith pensava que a verdadeira riqueza dos povos estava no trabalho, que riqueza das nações”. Nasceu em
1723 e morreu em 1790.
deveria ser dirigido livremente pela iniciativa dos empreendedores, estando
o Estado limitado a garantir o individualismo econômico, a livre
concorrência, o livre câmbio, a liberdade de comércio e a inviolabilidade da
propriedade privada.

O mercado livre e o bem-estar social


O pensamento liberal critica as excessivas intervenções e restrições
do Estado na economia, afirmando que a sua participação no planejamento e
no cotidiano da economia prejudica o crescimento e a expansão do mercado.
Por extensão, defende o direito de o mercado se organizar livremente,
produzindo a quantidade e espécies de bens de que a sociedade necessita.
Para melhor compreendermos o pensamento liberal, vamos ver o
exemplo de uma fabriqueta de calçados que produz – sozinha – calçados
para uma comunidade. A fabriqueta em questão produz sem concorrência.
Portanto, seus preços são elevados, pois a quantidade ofertada é reduzida e
quem tiver interesse na aquisição de calçados não tem outra opção de
compra. Como os preços praticados são bons para o produtor proprietário
dos meios de produção, novos empreendedores entram no mesmo ramo,
aumentando a oferta e conduzindo o mercado ao equilíbrio de preços. Essa é
a lei da oferta e da procura.
A corrente liberal afirma que o Estado não precisa se preocupar com
a economia, pois uma “mão invisível” traria o equilíbrio entre os preços e a
quantidade de bens disponibilizadas no mercado. Esta “mão invisível” é a lei

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da oferta e da procura, por meio da qual, mesmo as pessoas procurando
somente os seus benefícios, todos serão beneficiados.
Em suas obras, Adam Smith critica os cartéis e os monopólios, que
rompem o equilíbrio econômico, trazendo benefícios unilaterais. Outro
aspecto importante do pensamento liberal é a teoria do pleno emprego,
segundo a qual pressupõe que no mercado livre, com o crescimento dos
capitais, haveria uma maior oferta de vagas para trabalhadores. Essa
elevação espontânea do “bem-estar social”, isentaria o Estado da política de
assistência social.
É importante destacar que existem correntes contrárias ao Estado-
mínimo, como as correntes marxistas que enfatizam a disparidade e as
injustiças sociais.

Síntese da unidade

O Liberalismo Econômico, típico de um sistema de produção


capitalista, implica em seu período de vigência:
1) em um Estado-mínimo, com estrutura e atuação
reduzidas, cabendo a ele a garantia da propriedade, de
segurança, e da justiça; o Estado mínimo pode ser chamado
também de Estado de funções cartorárias;
2) em um mercado livre para atuação e ampliação do
capital;
3) em relações de trabalho livremente definidas entre as
partes, sem a presença de leis trabalhistas;
4) em ausência de previdência social, de maneira que o
trabalhador ganha pelo que produz, ou seja, somente na sua
idade economicamente ativa e se não for incapaz (física ou
mentalmente), mesmo que a incapacidade tivesse sido
gerada pelo trabalho.

1 - Pode-se dizer que o Estado é o conjunto dos seguinte elementos:


( ) território delimitado, comunidades rurais e constituição
federal;
( ) regiões que compõem o país, monopólio na elaboração de
leis para alguns grupos da sociedade e agrupamento armado para
defesa;
( ) território geograficamente delimitado, monopólio de
elaboração das leis para todos aqueles que compõem a nação e
quadro de pessoal;
( ) quadro de pessoal, governantes e sociedade em geral.

2 - Pode-se dizer que são princípios liberais:


( ) liberdade de pensamento, de expressão e de religião;
( ) acumular as riquezas privadas e fortalecer o Estado;
( ) liberdade de pensamento, expressão, religião, propriedade
e relacionamento comercial, inclusive no câmbio;
( ) conduzir o povo ao bem estar social, por meio do
trabalho.
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Comentário

O pensamento liberal propunha, mediante uma forte corrente de


pensamento, a existência do Estado-mínimo e da livre negociação de
mercado (tanto na comercialização da mercadoria, como na relação entre
capital e trabalho).

Referências
BOBBIO, N. Liberalismo e democracia. São Paulo: Brasiliense, 2004.
FERNANDES, R.C. Privado porém público. Rio de Janeiro: Relume-
dumará, 1994.
HAL, J.A.; IKENBERRY, G.J. O estado. Lisboa: Estampa, 1990.
MORAES, N.R. As empresas e o atendimento as demandas sociais em
Bauru/SP: responsabilidade ou marketing? 2005, 140f. Dissertação
(Mestrado em Serviço Social) – Faculdade de História, Direito e Serviço
Social, UNESP, Franca, 2005.

Informações sobre
a próxima unidade
Você vai estudar o que sucedeu ao liberalismo, o
que levou esse pensamento com forte teor
mercadológico à ruptura, crise e conseqüente
declínio.

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A ruptura do Estado-mínimo

Meta da unidade
Apresentação dos elementos sociais e econômicos que levaram à
crise do pensamento liberal, conduzindo à compreensão dos reflexos sociais
do movimento econômico da primeira metade do século XX, culminando na
adoção do modelo econômico keynesiano.

Objetivos
• contextualizar historicamente os acontecimentos da
sociedade humana na primeira metade do século XX;
• conhecer os efeitos da quebra da Bolsa de Nova Iorque.

Pré-requisitos
Esta unidade didática está alocada em uma seqüência lógica para a
compreensão do contexto histórico das políticas sociais. Para seu correto
entendimento, fazem-se necessárias as unidades 1 e 2 deste Caderno de
Conteúdos e Atividades.

Introdução
A recessão econômica das décadas de 1920 e 1930 desenhou um
cenário de grandes problemas sociais e econômicos que suscitaram a
necessidade de urgentes reformas no modelo de Estado e de mercado. Nesta
unidade, busca-se o entendimento das posturas das nações com relação à
economia e dos reflexos desse cenário no estabelecimento de políticas de
atendimento social.

Século XX – a era das grandes mudanças


Na disciplina Introdução ao Serviço Social, você estudou a
Revolução Industrial, que trouxe uma nova dinâmica à produção artesanal,
Frederick Winslow Taylor (1856- conduzindo a sociedade à adoção de processos industriais pautados na
1915) foi o engenheiro norte
mecanização de tarefas. A partir desse fato histórico, a sociedade adentrou
americano que dedicou-se ao
estudo dos métodos e dos no século XX sob a ótica liberal da livre negociação de mercado (na
tempos necessários para o comercialização de produtos e na relação entre o capital e o trabalho), com
trabalho na indústria, sendo o
fundador da Administração
uma dinâmica de intensa produção nas indústrias, organizada segundo os
Científica. trabalhos desenvolvidos por Taylor, sobre o Estudo dos Tempos e
Movimentos (assunto já estudado também na disciplina Introdução ao
Serviço Social).

Contexto Histórico das Políticas Sociais


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O ritmo de produção e de consumo era bastante aquecido pois a
maioria das famílias estava inserida no processo produtivo, tendo acesso ao
consumo de bens e serviços. A ótica adotada era que, com o pleno emprego
previsto pelo liberalismo econômico, as pessoas e suas famílias tivessem
acesso fácil aos bens do mundo industrializado, não sendo necessária a
proteção social.
O Estado mínimo, como já visto, era o provedor da retaguarda
jurídica que garantia o direito à propriedade e ao livre comércio, inclusive
nas trocas internacionais. Na esfera social o Estado pouco fazia, ofertando
alguns serviços de saúde, educação e assistência social, que de uma forma
geral eram relegados à ação da Igreja. Mas o ritmo de produção e de
consumo que dava força ao pensamento econômico liberal se depara com um
recuo do consumo. Com a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), o mundo
passa pelo colapso do regime político e econômico liberal e assiste à
ascensão dos Estados Unidos da América como centro do poder capitalista.
No período compreendido entre 1914 até depois da Segunda Guerra
Mundial, chamado de “Era da Catástrofe” pelo historiador Eric Hobsbawn
(1995, p.15), o mundo passa por uma profunda crise que culmina com a
quebra da Bolsa de Valores de Nova Iorque em 1929.

Uma crise econômica mundial de profundidades sem


precedentes pôs de joelhos até mesmo as economias
capitalistas mais fortes e pareceu reverter a criação de
uma economia mundial única, feito bastante notável do
capitalismo liberal do século XIX. Mesmo os Estados
Unidos, a salvo de guerra e revolução, pareceram
próximos do colapso. Enquanto a economia balançava,
as instituições liberais praticamente desapareceram
entre 1917 e 1942 [...] (HOBSBAWN, 1995, p.16-17)

A quebra da Bolsa de Valores de Nova Iorque


O pensamento econômico liberal era dominante até a quebra da
Bolsa de Nova Iorque em 1929, que acabou por arrastar a economia
capitalista para o período de sua maior crise, quando um grande colapso
comercial internacional afetou diretamente a doutrina que regia as relações
político-econômicas na América do Norte e Europa.
Até a entrada do século XX, o mundo vivia um crescimento
econômico muito grande, em que os mercados se auto-regulavam e o
Estado-mínimo dava condições de crescimento sem restrições e sem grandes
dificuldades. É importante observar que, na contra-página da economia
liberal, as famílias dos trabalhadores necessitavam de atenção em momentos
especiais como na maternidade, na chegada da velhice, na invalidez e
mesmo quando a remuneração não era suficiente para cobrir as despesas
fundamentais como a alimentação do grupo familiar, a moradia, o vestuário
digno, o acesso à escola, ao atendimento médico e aos medicamentos.
As necessidades sociais não eram atendidas, pois o Estado-mínimo
do liberalismo era demasiadamente pequeno e seu papel não avançava muito
além da proteção da propriedade privada e do direito ao livre mercado.
Nesse cenário de contradições, com a produtividade das empresas
aumentando, o mundo dos negócios se desenvolvia muito bem, de modo que
os bancos experimentaram altos índices de comercialização de papéis –

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investimento nos títulos das empresas – com os quais o investidor passava a
possuir um percentual das organizações, investindo sua poupança em um
negócio de risco, mas rentável.

• Para melhor esclarecer, observe o exemplo de


movimento de títulos em Bolsa de Valores:
• Naquela época, uma fábrica de colchões de mola
vendia muito, de maneira a não possuir estoques, tudo
o que podia produzir era rapidamente comercializado.
Era realmente um bom negócio. Para ampliar seu
capital, ou comprar mais máquinas, o seu proprietário
recorre ao banco para obter financiamento.
• Paralelamente, um fabricante de sapatos artesanais
que também vendeu muito e conseguiu acumular
dinheiro quer investir em um bom negócio, que
possua maior rentabilidade, com menos trabalho. Ele
procura o banco para emprestar seu dinheiro a juros
(ele será o investidor).
• O banco então emite, com a autorização do
proprietário da fábrica de colchões, um título (papel)
que equivale a 1% da fábrica de colchões e vende-o ao
fabricante de sapatos (investidor). Nesse negócio, se a
fábrica de colchões prosperar o seu patrimônio
aumenta e então o valor do título (1% do valor da
fábrica de colchões) aumenta também, mas se os
negócios forem mal e o patrimônio da fábrica de
colchões diminuir o título comercializado tem o valor
reduzido, podendo chegar a valer menos do que o
valor que foi pago inicialmente ao banco pelo
investidor.

Como a história aponta para a redução do consumo, ditado


principalmente pelo instável ambiente de guerra, as empresas vendem
menos, acumulando suas dívidas. Ocorre, então, uma corrida de investidores
aos bancos para resgatar seus títulos (trocar novamente o papel do
investimento feito por dinheiro), levando o sistema bancário, a Bolsa de
Valores de Nova Iorque e as empresas à quebra em cadeia.

Em 24 de outubro de 1929, inicia-se uma crise


econômica sem precedentes nos Estados Unidos, com
repercussões mundiais: a quebra da Bolsa de Nova
Iorque, conhecida também como “crack da bolsa”, que
provoca a regressão das atividades econômicas, faz o
número de desempregados atingir 13 milhões e
mergulha o país em depressão. (MORAES, 2005, p.48)

No contexto histórico dessa primeira metade do século XX pode-se


destacar a quebra da Bolsa de Nova Iorque como um divisor de águas que
marca a mudança do pensamento econômico mundial.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
22
Síntese da unidade

Nesta unidade didática, você pôde observar e estudar a relação


histórico-social que envolveu a quebra da Bolsa de Nova Iorque com os
aspectos sociais daquela época. Isso levará à necessidade precípua de
um novo modelo de Estado mais interventor e presente.

1 - Pode-se afirmar que a quebra da Bolsa de Nova Iorque aconteceu devido:


( ) à corrida dos investidores para a troca dos papéis por
dinheiro, em um período marcado pela recessão econômica e
social;
( ) aos interesses antagônicos do capital e do trabalho;
( ) ao receio das medidas econômicas que viriam com a
adoção do modelo keynesiano;
( ) à guerra em curso e à guerra fria estabelecida com a
União Soviética.

2 - Para tornar seu entendimento mais prático, busque mais informações


sobre a quebra da Bolsa de Nova Iorque e sobre o período de recessão que
viveram os Estados Unidos.

Comentário

A quebra da Bolsa de Valores de Nova Iorque representa um fato


histórico importante na contextualização dos caminhos que levaram ao
surgimento das políticas sociais, já que afetou de maneira direta a doutrina
que regia as relações político-econômicas dentro do ideário liberal.

Referências
HOBSBAWN, E.J. Era dos extremos: o breve século XX: 1914 a 1991. São
Paulo: Companhia das Letras, 1995.
MORAES, N.R. As empresas e o atendimento as demandas sociais em
Bauru/SP: responsabilidade ou marketing? 2005, 140f. Dissertação
(Mestrado em Serviço Social) – Faculdade de História, Direito e Serviço
Social, UNESP, Franca, 2005.
OMAHE, K. O fim do estado-nação. Rio de Janeiro: Campus, 1999.

Informações sobre
a próxima unidade
Você vai estudar as propostas do modelo
econômico keynesiano, que foi inicialmente
implantado para o reestabelecimento do
equilíbrio social e econômico dos Estados
Unidos e, depois, adotado por outras nações.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
23
O modelo econômico keynesiano

Meta da unidade
Apresentação dos principais aspectos sociais e econômicos que
compuseram o modelo econômico keynesiano, implantado nos Estados
Unidos, após a quebra da Bolsa de Valores de Nova Iorque.

Objetivos
• contextualizar historicamente os acontecimentos da
sociedade humana na primeira metade do século XX;
• reconhecer os principais aspectos do modelo econômico
keynesiano.

Pré-requisitos
Esta unidade é uma complementação da anterior, pois o modelo
econômico keynesiano foi implantado como resposta da sociedade norte-
americana à grave crise da década de 1920, que culminara com a quebra da
Bolsa de Valores de Nova Iorque.

Introdução
O conhecimento do Estado de Bem-estar Social (Welfare State),
responsável pelas políticas sociais, é de fundamental importância para a
formação do Assistente Social.

O novo modelo econômico


No momento imediatamente após a quebra da Bolsa de Nova Iorque,
começa a se desenhar oficialmente um novo modelo de Estado para dar
atendimento a milhões de famílias sem fonte de renda, como também para
reconduzir a economia a uma situação de equilíbrio. Nesse sentido, em 1932,
com a posse do Presidente Franklin Roosevelt, os Estados Unidos passam a
Franklin Delano Roosevelt
(1882—1945) foi um dos mais adotar o modelo econômico keynesiano, em que o Estado tem seu papel e
importantes estadistas norte- suas responsabilidades largamente ampliados. Moraes (2005) destaca
americanos, tendo sido
presidente dos Estados Unidos
aspectos dessa política de restabelecimento da ordem e do equilíbrio sócio-
por quatro mandatos econômico nos Estados Unidos:
consecutivos.

No auge da crise, em 1932, Franklin Roosevelt assumiu


a presidência dos Estados Unidos, iniciando um
programa de reformas conhecido como New Deal
(Novo Acordo), influenciado pelas idéias de John
Maynards Keynes. Roosevelt criou mecanismos de

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
24
controle de crédito e um banco para financiar as
exportações; concedeu linha de crédito especial para os
agricultores levantarem suas hipotecas e, também,
subsídios aos Estados para o seguro-desemprego; fixou
salários mínimos e limitou as jornadas de trabalho;
legalizou os sindicatos; ampliou o sistema de
previdência social e iniciou um programa de grandes
obras públicas, com o objetivo de reduzir o número de
desempregados. No ano de 1937, o número de
desempregados já havia sido reduzido a metade, a renda
nacional havia crescido 70% e a produção industrial,
64% no período. (MORAES, 2005, p.49)

É importante salientar que a economia estava quebrada e seria


necessário dar condições de restabelecimento às empresas. Nesse sentido, o John Maynards Keynes (1883-
1946) foi um economista inglês,
modelo keynesiano, desenhado pelo inglês John Maynard Keynes (1883- cuja principal obra foi “Teoria
1946), previa a estruturação de um Estado forte e presente que interferia na Geral do Emprego, do Juro e do
Dinheiro”, de 1936, considerada
sociedade desenvolvendo ações sociais e protegendo a economia das
a base da revolução keynesiana.
empresas nacionais. Assim, o modelo econômico keynesiano possui forte
teor de proteção à economia e de atendimento social, trazendo um novo
posicionamento e uma nova estrutura para o Estado, que passa de Estado-
mínimo (liberalismo) para o chamado Estado-nação, que assume postura
mais nacionalista, de maior abrangência social e com mais poder de
intervenção na economia, destacando-se por sua atuação em três frentes:

1. Investimento na indústria de base e na logística


O Estado passa a investir na estruturação de áreas estratégicas para o
desenvolvimento econômico, em que a iniciativa privada não possue
condições de atuar, como a construção de rodovias, portos e ferrovias, a
produção de energia e aço e as pesquisas na prospecção e desenvolvimento
da indústria petrolífera.

2. Defesa da indústria nacional


Após o final da Segunda Guerra Mundial, aumenta as
movimentações internacionais de pessoas e de mercadorias, impulsionando-
se a globalização, fortalecendo e expandido a atuação das empresas. Nesse
sentido, para proteger a “indústria nacional” (empresas particulares de
capital nacional) o Estado passa a impor altas tarifas de importação para
produtos estrangeiros e a interferir na negociação de exportação.

3. Implantação de políticas sociais de amplitudes


universalistas
O modelo implantado nos Estados Unidos por Roosevelt, à luz da
teoria keynesiana, representou um esforço de melhoria política, econômica e
social, defendendo idéias como a segurança do emprego, a previdência
social pública, os direitos de cidadania, a justiça social, a solidariedade e a
construção da democracia. Como exemplo, pode-se destacar a ampliação do
sistema previdenciário, o seguro desemprego, o limite de jornada, o direito
às férias remuneradas e a legalização de sindicatos.
Nesse panorama, como um desenho técnico das políticas sociais
universalistas, surge o Welfare State, concebido ao final do período

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
25
econômico do liberalismo, quando o Estado passava a interferir no mercado
assumindo o controle econômico, mas também social.

Síntese da unidade

Esta unidade didática apresentam algumas das conseqüências


sociais trazidas pela quebra da Bolsa de Nova Iorque e a apresentação
de um novo modelo de Estado (o Estado-nação), pautado sobre três
pilastras principais: o investimento na indústria de base (siderurgia,
petróleo, energia e estruturas de logística), defesa da indústria nacional
e implantação do Estado de Bem-estar Social (Welfare State).

1 - Qual o principal problema trazido pela quebra da bolsa?


( ) a existência de mais de 13 milhões de desempregados e
um Estado mínimo despreparado para prestar assistência social
por ser “mínimo”;
( ) a busca, por parte dos empresários, por novos
financiamentos junto aos bancos que estavam falidos;
( ) a insistência do trabalhador em permanecer nas fábricas,
mesmo estando falidas, como forma de pressionar o Estado;
( ) a inexistência de rodovias, ferrovias e eletricidade para
todos.

2 - Sobre o modelo econômico keynesiano é correto afirmar:


( ) que o Estado-nação substitui a postura e o papel do
Estado-mínimo, que vigorava no liberalismo;
( ) que o Estado investe na proteção das empresas privadas
da sua nação e também no atendimento das demandas sociais,
através de políticas sociais universalistas;
( ) que a mudança do modelo econômico nos Estados Unidos
(e posteriormente no mundo) ocorre sob influência do contexto
histórico mundial marcado por grandes mudanças,
principalmente pelas guerras;
( ) todas as alternativas estão corretas.

3 - Quais as três áreas principais onde o Estado passa a atuar de maneira


mais forte e interventiva, estruturando-se como Estado-nação?
( ) educação, saúde e assistência social;
( ) transportes, produção de alimentos e atenção à criança;
( ) investimento na estrutura da indústria de base (aço,
petróleo, energia, rodovias, ferrovias), proteção da indústria
nacional e implantação de políticas sociais universalistas
(Estado de Bem-estar Social);
( ) reconstrução do sistema financeiro, fortalecimento das
empresas e criação do seguro social.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
26
Comentário

O entendimento do modelo econômico keynesiano e do novo papel


designado ao Estado, agora interventor e presente, deve fazer parte da
bagagem teórica dinâmica do acadêmico de Serviço Social, devendo
também ser o entendimento básico para a resolução das questões propostas
acima.

Referências
HOBSBAWN, E.J. Era dos extremos: o breve século XX: 1914 a 1991. São
Paulo: Companhia das Letras, 1995.
MORAES, N.R. As empresas e o atendimento as demandas sociais em
Bauru/SP: responsabilidade ou marketing? 2005, 140f. Dissertação
(Mestrado em Serviço Social) – Faculdade de História, Direito e Serviço
Social, UNESP, Franca, 2005.
OMAHE, K. O fim do estado-nação. Rio de Janeiro: Campus, 1999.

Informações sobre
a próxima unidade
Iremos estudar com maiores detalhes o Estado de Bem-estar
Social (welfare state), que surge oficialmente dentro do
modelo keynesiano de economia nacionalista.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
27
O Estado de bem-estar social
(WELFARE STATE)

Meta da unidade
Definição de política social e de Estado de Bem-estar Social, no bojo
do modelo econômico keynesiano.

Objetivos
• conhecer a definição de Estado de Bem-estar Social;
• definir política social.

Pré-requisitos
Esta unidade avança para o entendimento das políticas sociais e do
Estado de Bem-estar Social. Portanto, para sua melhor compreensão, é
importante o conhecimento do processo histórico que culminou na sua
implantação, que pode ser enriquecido com a leitura da bibliografia indicada
no final desta unidade didática.

Introdução
O Estado de Bem-estar Social surge de um novo desenho de Estado,
segundo o qual esse passa a assumir a responsabilidade pelo
desenvolvimento das políticas de atendimento às demandas sociais não
atendidas pela remuneração do trabalho. O Estado passa a ter uma estrutura
maior e mais presente junto à sociedade, interferindo na economia e na
regulação da relação entre o capital e o trabalho.

Estados fortes, centralizadores e de Bem-estar Social


No momento em que o papel do Estado e a sua participação no
desenvolvimento social são repensados, sua estrutura é reorganizada
burocrática e fisicamente, a fim de se conseguir planejar e implantar
políticas sociais e serviços de atendimento às necessidades da população, na
concepção de Estado conhecida como Welfare State ou Estado de Bem-estar
Social, que pode ser considerado um instrumento de contenção dos efeitos
das desigualdades sociais produzidas pelo mercado do pós-guerra, como
destaca Draibe (1997):

A novidade do pós-guerra – o Estado de Bem-estar


Social – foi ter imposto um particular mecanismo de
freios às forças brutas da desigualdade socialmente

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
28
produzida pelo mercado, através do sistema de direitos e
políticas sociais.[...] Não se deve entender o freio à
desigualdade como supressão da pobreza e muito menos
como instauração da plena igualdade. Porém, não resta
dúvida de que tal sistema de freios à violação do
mercado corresponde a formas mais densas de
participação na riqueza social e de elevação do patamar
de eqüidade, permitindo a Habermas descrever o Estado
de Bem-estar Social como uma formidável máquina de
produção de igualdade (DRAIBE, 1997, p.8)

No Brasil, as políticas sociais tiveram a sua trajetória em grande


parte influenciada pelas mudanças econômicas e políticas ocorridas no plano
internacional e pelos impactos reorganizadores dessas mudanças na ordem
política interna. Essas influências e impactos ajudaram a produzir uma
experiência nacional, uma adaptação do Welfare State. As políticas sociais
no Brasil serão melhor estudadas nas próximas unidades.

Definindo uma política social


O entendimento histórico do desenvolvimento da sociedade
planetária aponta para a necessidade de atender aqueles que não conseguem
sua inserção no mercado de trabalho, ação desenvolvida há tempos, de
maneira emergencial e contínua, pela Igreja. A política social tem então,
após o início do século XX, especialmente após a implantação do Estado-
nação, uma forte conotação organizativa das ações sociais. Sob esse prisma,
Demo (1994) destaca:

A política social pode ser contextualizada, de partida, do


ponto de vista do Estado, como proposta planejada de
enfrentamento das desigualdades sociais. Por trás da
política social existe a questão social, definida desde
sempre como a busca de composição pelo tolerável
entre alguns privilegiados que controlam a ordem
vigente e a maioria marginalizada que a sustenta.
(DEMO, 1994, p.14)

Síntese da unidade

O entendimento do Estado de Bem-estar Social (Welfare State),


concebido para introduzir políticas sociais universalistas após a
recessão econômica da década de 1930, e a definição de política social
são os aspectos mais importantes desta unidade didática.

1 - Comente as principais diferenças entre o “Welfare State” e o liberalismo


econômico no campo do atendimento às demandas sociais.

2 - Defina resumidamente política social, a partir dos textos e estudos que


você realizou nesta unidade.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
29
Comentário

Com esta unidade você concluiu o entendimento sobre a inserção


da política social no âmbito do modelo econômico nacionalista idealizado
por Keynes. Todo o processo histórico e as implicações políticas,
econômicas e sociais que levaram à concepção de política social e do
Welfare State fazem parte do conhecimento indispensável ao profissional
de Serviço Social.

Referências
DEMO, P. Política social, educação e cidadania. Campinas/SP: Papirus,
1994.
DRAIBE, S.M. Uma nova institucionalidade das políticas sociais. São Paulo
em Perspectiva: São Paulo, ano 11, n° 4, p.3-15, dez.1997.
OMAHE, K. O fim do estado-nação. Rio de Janeiro: Campus, 1999.

Informações sobre
a próxima unidade
Você terá uma introdução ao contexto histórico das
políticas sociais no Brasil, a partir dos reflexos da quebra da
Bolsa de Nova Iorque em nosso país, durante a era Vargas.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
30
Políticas sociais no Brasil: aspectos
introdutórios

Meta da unidade
Contextualização das Políticas Sociais e sua correlação, com os
planos econômicos e com a participação da sociedade para a conquista de
direitos sociais em diferentes períodos da história do Brasil.

Objetivos
• compreender a relação entre Políticas Sociais, Estado e
Sociedade;
• identificar os períodos históricos que marcam a trajetória das
políticas sociais brasileiras;
• contextualizar as políticas sociais na primeira fase da
República brasileira.

Pré-requisitos
Este tema faz uma introdução aos nossos estudos sobre os modelos
de políticas sociais elaborados e implementados no Brasil nos seus diferentes
períodos históricos. Portanto, é necessário que você, acadêmico do Serviço
Social, retorne aos conhecimentos já analisados nas unidades didáticas (de 1
a 5) desta disciplina, quando destacamos a trajetória histórica das políticas
sociais em grande parte influenciadas pelas mudanças políticas e econômicas
globais.
Outra referência importante é a compreensão do processo de
formação e estruturação do Estado brasileiro que se apresenta nas relações
políticas, econômicas, sociais e culturais caracterizadas nos diferentes
períodos históricos do Brasil: Colônia (1500 – 1822), Império (1822 – 1889)
e República (de 1889 até hoje).

Introdução
O objetivo desta unidade é conhecer a trajetória das políticas sociais
brasileiras em suas dimensões mais essenciais e no seu processo histórico.
Para tanto, vamos identificar os períodos que se destacam historicamente no
processo político e econômico do Brasil, que influenciam diretamente na
elaboração e implementação das políticas sociais até os anos 30.
Apresentaremos a relação do Estado com a sociedade e a economia pela qual
se definem e estruturam as formas de relação dominantes para a reprodução
da força de trabalho e sobrevivência da população. Também, explicitaremos
Contexto Histórico das Políticas Sociais
Serviço Social
31
as principais ações governamentais e/ou negligências,
na criação das políticas sociais com o propósito de
reconhecer o Estado como principal agente regulador
da área social.

Políticas Sociais, Estado e Sociedade


As políticas sociais se referem, em uma
primeira aproximação, ao processo de reprodução da
força de trabalho por meio de serviços e benefícios
financiados por fundos a eles destinados. Essa
reprodução, quando estruturada pelo Estado capitalista,
é um mecanismo distributivo de renda ou riqueza
socialmente produzida, sob a forma de benefícios,
proteção e serviços, sem que sejam afetadas, entretanto,
as relações de produção capitalistas. Os mecanismos distributivos exprimem
a correlação de forças existentes na sociedade e no próprio aparelho estatal,
mas têm uma dimensão legitimadora do próprio Estado e do governo.
Sob a influência das idéias de
O Estado se modifica na dinâmica das forças sociais e políticas e,
Keynes (1883-1946), especialmente nos regimes democráticos, se configura como suporte
economista inglês que criticava o resultante da cidadania. A cidadania compreende o reconhecimento dos
puro liberalismo de mercado,
foram implementadas, sob indivíduos como sujeitos na construção da história, pela participação
pressão de milhões de idosos política, pelo exercício da autonomia e pela garantia que lhes é dada, em um
sem proteção que saíam às ruas,
uma política de seguro social
Estado de Direito.
para idosos (aposentadoria com Esse sistema de garantia de direitos implica Estado, sociedade e
um teto mínimo, ficando o economia, modificando-se nos embates sociais, políticos, culturais e nas
restante para o mercado) e uma
política de seguro-desemprego, crises econômicas. As políticas sociais surgem em situações emergenciais ou
com contribuições dos são propostas nos planos econômicos do governo com ações voltadas para
beneficiários e patrões.
(FALEIROS, 1999, p.44).
atender áreas como educação, habitação, defesa do meio ambiente, mínimos
sociais.

A Inglaterra, no pós-guerra, como resposta preventiva a


novas crises, por influência de Keynes, e sob elaboração
de Beveridge (1879-1963), adotou um sistema de
proteção social para todas as eventualidades de perda de
renda: desemprego, doença, velhice, morte, nascimento,
acidente, invalidez. Suponha-se que as crises
econômicas seriam passageiras e o chamado pleno
emprego (pouco desemprego) fundado no contrato
salarial daria, juntamente com os impostos, condições
de se financiar o sistema. É o modelo beveridgiano de
seguridade social (FALEIROS, 1999, p.44).

No Brasil, assim como em todo o processo de formação e


desenvolvimento político, econômico, social e cultural, tivemos uma
influência determinante das mudanças políticas e econômicas ocorridas no
plano internacional. As políticas sociais tiveram a sua trajetória em grande
parte influenciada pelas mudanças econômicas e pelos impactos
reorganizadores dessas mudanças na ordem política interna. [...] Tais
influências ajudaram a produzir uma experiência nacional, que pode ser
tipificada como um “sistema de bem-estar periférico” (PEREIRA, 2002,
p.125).

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
32
A experiência brasileira de proteção social se diferencia de outras Na Alemanha em 1883, seguro
saúde; em 1884, seguro de
realidades sociais devido às condições de dependência que marcaram seu
acidentes do trabalho; em 1889,
desenvolvimento econômico. Em contrapartida, os países capitalistas aposentadoria. Esse modelo de
avançados gozam de independência econômica e garantem para seus proteção através do seguro
,obrigatório se define como
cidadãos pleno emprego e serviços sociais universais, inspirando-se nos modelo bismarckiano.
modelos de seguridade social bismarckiano e beveridgiano.
No contexto brasileiro não ocorreu esse mesmo processo, uma vez
Modelo beveridgiano de
que, não se conseguiu construir uma rede de apoio social e uma estruturas do seguridade social é o sistema de
pleno emprego. proteção social inglês proposto
por William Beveridge, em 1943.
Segundo Pereira (2002), existe um modelo de “Welfare State” na O plano pressupunha a formação
presença das seguintes características: de um sistema complexo e
completo de proteção social na
• ingerência imperativa do poder executivo;
ausência do salário que deveria
• seletividade dos gastos sociais e da oferta de benefícios e ser fruto do pleno emprego.
serviços públicos ;
• heterogeneidade e superposição de ações;
• desarticulação institucional;
• restrição e incerteza financeira.

Para tornar mais explícitas as particularidades da experiência


brasileira no campo das políticas sociais, podemos adotar a seguinte
periodização conforme aponta Pereira (2002, p. 127):
1) Período anterior a 1930: política social do laissez-faire;
2) de 1930 a 1964: política social predominantemente
populista, com laivos desenvolvimentistas;
3) de 1964 a 1985: política social do regime tecnocrático-
militar, incluindo a fase da abertura política;
4) de 1985 a 1990: política social do período de transição para
a democracia liberal;
5) a partir dos anos 90: política social neoliberal.

Período anterior a 1930: política do laissez-faire


As políticas sociais no Brasil emergem no final da Velha República,
portanto, antes de 1930, devido ao processo de industrialização
desencadeado pela crise na economia brasileira de base agro-exportadora,
em razão da crise mundial de 1929. Desencadeia-se, assim, uma crise
política, marcada pelo agravamento das condições de trabalho, com um alto
índice de desemprego provocado pela falência de inúmeras fábricas. Fica
evidente a existência de um sistema político caracterizado pela ausência de
planejamento social. Nesse panorama, cabe ao empresariado progressista a
concessão de benefícios à classe trabalhadora. O processo de provisão social
é deixado às seguintes instâncias: o mercado, que atende as preferências e
demandas individuais; a iniciativa privada não mercantil, que dava respostas
tópicas e informais aos reclamos da pobreza; a polícia, que controla,
repressivamente, a questão social então emergente. Data dessa época a frase
famosa do então presidente da República Washington Luiz, emblemática do
estilo brasileiro de dar respostas aos reclamos sociais: “A questão social é
questão de polícia”(PEREIRA, 2002, p. 128).
No âmbito das políticas sociais as áreas que mereceram maior
atenção, ainda que limitada e precariamente, foram o trabalho e a
previdência. Dentre as principais medidas adotadas, destacam-se: a criação,
Contexto Histórico das Políticas Sociais
Serviço Social
33
Em 1923, por iniciativa do em 1923, dos Departamentos Nacionais do Trabalho e da Saúde; o Código
deputado paulista Eloy Chaves
Sanitário; a Lei Elói Chaves, relativa à previdência social.
(1875-1964), foi implementada
a previdência social dos
ferroviários, como resposta às O Estado daquela época movia-se essencialmente a
lutas sociais e greves , para partir de uma perspectiva liberal. Grande parte das
manter a economia de concessões conferidas à classe trabalhadora coube ao
exportação do café (FALEIROS,
empresariado mais progressista (PORTO, 2001, p.21).
1999, p.45).

Áreas como saúde, educação e habitação, tiveram um tratamento


residual, no qual o mercado e a família têm a primazia da oferta de proteção
social (TITMUSS, 1974, apud PEREIRA, 2002, P. 126). As estratégias de
ação coletiva na área da saúde foram assumidas por autoridades locais por
força de situações emergenciais como as epidemias. A educação era
privilégio da minoria da população, isso porque a rede escolar existente
estava a serviço da elite, que valorizava uma aprendizagem acadêmica. As
medidas mais significativas para atender às demandas ligadas à habitação,
foram assumidas pelas empresas industriais.
Configuravam-se nesse período (laissefariano) um modelo de
desenvolvimento econômico e uma base de sustentação financeira das
políticas sociais incompatíveis com a concepção de que existem direitos
sociais irrenunciáveis como, por exemplo, a garantia de uma renda mínima
enquanto fator de inclusão social.

Síntese da unidade

Devemos compreender que a garantia de direitos sociais está


diretamente ligada à estrutura do Estado, aos interesses dos planos
econômicos e à participação da sociedade. Todos esses elementos
compõem o contexto histórico das políticas sociais em diferentes
tempos e lugares. No contexto do Brasil, é de suma importância a
compreensão dos fatores políticos, econômicos, sociais e culturais que,
no início da República, apontam para uma prática clientelista em
detrimento das necessidades básicas da maioria da população, diante
de um Estado descompromissado com a instituição da cidadania.

1 - Elabore uma lista de políticas sociais implementadas durante a primeira


fase da República brasileira (1889-1930) e comente-a destacando os
interesses do Estado de acordo com a política econômica do período.

2 - Identifique as características dos períodos históricos e o contexto das


políticas sociais no Brasil, eem umerando de forma cronológica e escrevendo
as datas correspondentes aos diferentes períodos:
( ) Política social neoliberal: _________________________.
( ) Política social predominantemente
populista/desenvolvimentistas: __________________.
( ) Política social do laissez-faire: ___________________.
( ) Política social do regime tecnocrático-militar, incluindo a
fase da abertura política: ____________________________.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
34
( ) Política social do período de transição para a democracia
liberal: _________________________.

Comentário

Caro (a) acadêmico (a), para responder essas atividades busque


fazer uma revisão a respeito dos principais fatos que marcaram os governos
da primeira República , como também sobre o planejamento das políticas
sociais e seus reflexos na sociedade.

Referências
ABEPSS – CEAD – UNB, 1999.
FALEIROS, Vicente de Paula. Natureza e desenvolvimento das políticas
sociais no Brasil. In: Capacitação em Serviço Social, Mod. IV. CFESS.
__________A política social do estado capitalista. São Paulo: Cortez, 2000.
PEREIRA, P.A.P. Necessidades humanas: subsídios à crítica dos mínimos
sociais 2: edição. São Paulo: Cortez, 2002.
PORTO, Maria Célia da Silva. Cidadania e (“des)proteção social”: uma
inversão do estado brasileiros? In: Serviço Social e Sociedade nº 68. São
Paulo: Cortez, 2001.

Informações sobre
a próxima unidade
Você vai conhecer estudar e compreender o contexto histórico
das políticas sociais brasileiras, no período de 1930 a 1945,
conhecido como Era Vargas, quando o Estado passa a intervir
nas Políticas Sociais como estratégia de solução da crise do
capital.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
35
As políticas sociais no Brasil de 1930 a
1945 – Era Vargas

Meta da unidade
Contextualização histórica das políticas sociais adotadas durante o
governo Vargas (1930-1945), analisando as ações do Estado nos âmbitos
político, econômico e social.

Objetivos
• contextualizar os fatos históricos mais relevantes da Era
Vargas;
• identificar as ações políticas voltadas à criação e
implementação das políticas sociais;
• compreender os reflexos das políticas sociais adotadas nesse
período da República brasileira.

Pré-requisitos
Para melhor compreensão dessa unidade, convidamos você,
acadêmico do Serviço Social, a fazer uma pequena viagem pela história do
Brasil, observando de maneira especial a chamada de Era Vargas, durante a
qual o Presidente Getúlio Vargas governava por longos quinze anos: de 1930
a 1945. Assim fazendo, será mais fácil a identificação e compreensão das
políticas sociais desse período.

Introdução
A Era Vargas é um período da história brasileira que nos chama
muito a atenção pelos fatos, mas principalmente pela imagem construída em
torno da figura carismática de Getúlio Vargas. Em 1930 ele assume o poder
graças a uma revolução que contou com o apoio das Forças Armadas e de
boa parte da população desejosa de transformações sociais e econômicas.
É importante compreendermos as mudanças que perpassam sua
postura política enquanto chefe de governo. Podemos afirmar que ficam
evidenciadas no mínimo duas faces com as seguintes características. Uma
primeira fase é a modernizadora, quando incentivou não só o
desenvolvimento industrial e a dinamização das atividades agrícolas, mas
também uma série de leis trabalhistas que resultaram no Consolidação das
Leis do Trabalho (CLT); quando instituiu o salário mínimo entre outros
benefícios à classe trabalhadora. A outra fase, a conservadora (Estado Novo)
com caráter autoritário, limitava seriamente a participação dos brasileiros no
Contexto Histórico das Políticas Sociais
Serviço Social
36
processo político, impunha a censura e reprimia com dureza seus opositores.
Esse contexto é determinante para o direcionamento das políticas sociais e
de seus reflexos na sociedade da época até nossos dias, quando observamos
avanços e retrocessos, compromissos e negligências na efetivação das
conquistas sociais, que constituem um estado “mínimo de direito” para o
cidadão.

Era Vargas: Modernização Conservadora


Após a crise de 1929, surge uma intervenção estatal ou
Welfare State nos países que tinham o capitalismo como economia
central, inclusive os países periféricos como o Brasil. Seguindo o
modelo dos países capitalistas, Vargas rompeu com o setor
oligárquico-agrário e reforçou o setor de infra-estrutura com a
construção de estradas e indústrias, desenvolveu instituições de
política social voltado a administrar as questões trabalhistas. O
governo Vargas fragmentou as políticas sociais, na medida em que
privilegiou as classes trabalhadoras mais organizadas politicamente,
em detrimento das mais fragilizadas e desorganizadas,
implementando assim uma política de seguridade social
fragmentada e seletiva.
Podemos dividir a Era Vargas nos seguintes sub-períodos:
• 1930-1937: governo Vargas, instituído pela
chamada “Revolução de 30” e finalizado com um
golpe de Estado;
• 1937-1945: Estado Novo em sua fase ditatorial.

Transformações no campo político e econômico apontam


para mudanças de uma economia agro-exportadora para uma
economia urbano-industrial. Mudanças essas que, por não existir um
planejamento centralizado, não atingem o campo social. Efetivamente, entre
1930 e 1964, não houve, no terreno social, um rompimento decisivo com o
laisse-faire nem com a antiga estrutura do poder oligárquico da era agro-
exportadora.
Na conjuntura dos anos 30, houve um a integração do mercado
interno e o desenvolvimento da industrialização, sem cessar a exportação de
produtos agrícolas, nem a dependência dos países centrais.

Embora a questão social não fosse mais considerada


uma “questão de policia”, ela não foi alçada a questão
de política maior que merecesse a mesma atenção que o
governo dispensava a área econômica. Na verdade, a
política social brasileira funcionava como uma espécie
de zona cinzenta, onde se operavam barganhas
populistas entre Estado e parcelas da sociedade e onde a
questão social era transformada em querelas reguladas
jurídica ou administrativamente e, portanto,
despolitizada (PEREIRA, 2002, p. 130).

Getúlio Vargas, mediante sua política trabalhista, buscava, ao


mesmo tempo, controlar as greves e os movimentos operários e estabelecer
um sistema de seguro social. Falava explicitamente em substituir a luta de

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
37
classes pela colaboração de classes. Na prática, o Ministério do Trabalho,
criado em 1930, articulou o atrelamento dos sindicatos ao Estado, por meio
do controle de suas eleições, finalidades, finanças e atividades. O sistema de
seguros foi paulatinamente implementado por intermédio dos Institutos de
Previdência Social para categorias de trabalhadores como marítimos,
Mesmo antes da promulgação da estivadores, bancários e industriários. Os trabalhadores rurais, maioria da
Constituição de 1934, uma das população, sem condição salarial por pressão dos latifundiários e também
conquistas mais democráticas foi
o feminino, por meio do Decreto
sem organização de classe, ficaram de fora do sistema estatal de previdência.
20.076 de 24 de fevereiro de
1932, que instituía um novo
Segundo Pereira (2002), as principais medidas de proteção social
código eleitoral para o país.
desse período foram:
• Na década de 30: criação do Ministério do Trabalho,
Indústria e Comércio, da Carteira de Trabalho, da
Legislação Trabalhista, do Ministério da Educação e Saúde e
dos Institutos de Aposentadoria e Pensão; promulgação da
Constituição Federal de 1934, que contemplou tanto os
ideais do liberalismo político quanto os do reformismo
econômico; imposição pelo Estado Novo da Constituição de
37, inspirada nos modelos constitucionais corporativo-
fascistas; criação do Conselho Nacional de Serviço Social,
em 1938 (ligado ao Ministério da Educação e Saúde), com o
objetivo de normalizar e fiscalizar as ações de assistência
social, preponderantemente desenvolvidas por entidades
privadas.

• Na década de 40, durante o governo Vargas: instituição do


salário mínimo; reestruturação do Ministério da Educação e
Saúde; promulgação da Consolidação das Leis do Trabalho
(CLT); criação do imposto sindical, do Serviço de
Alimentação da Previdência Social (SAPS), de nova
legislação sobre acidentes de trabalho, do Serviço Especial
O salário mínimo foi a primeira
medida oficial instituída no país de Saúde Pública (SESP), implantado em regiões insalubres
relacionada à idéia de proteção (Amazônia e Minas Gerais) que constituíam fontes de
social mínima. O Brasil foi o
conceito de salário mínimo 12º
matérias-primas (borracha, mica, quartzo) utilizadas pelos
país no mundo a incorporar na aliados na Segunda Guerra Mundial; criação do
sua constituição de 1934 Departamento Nacional da Criança, da Comissão Nacional
(Retratos do Brasil, 1984 apud
PEREIRA, 2002, p.131). de Alimentação, do Serviço Social do Comércio (SESC), do
Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC), do
Serviço Social da Indústria (SESI), do Serviço Nacional de
Aprendizagem Industrial (SENAI), da Lei Orgânica do
Ensino Comercial e da Fundação da Casa Popular. Em 1942,
foi criada a Legião Brasileira de Assistência (LBA),
coordenada pela primeira-dama, para atender às famílias de
pracinhas envolvidos na guerra. Mas, depois de 1946, a
LBA passa a dedicar-se à maternidade e à infância,
implantando postos de serviço de acordo com interesses,
apoios e conveniências, buscando a legitimação do Estado
junto aos pobres. Na distribuição de benefícios sociais
predomina o assistencialismo, em uma junção de obras de

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
38
caridade, na maioria religiosas, com ações das primeiras-
damas

• Na década de 40, durante o governo Dutra: promulgação


da Constituição Federal de 1946 (defensora dos ideais
liberais) e criação, com posterior esvaziamento, do Plano
SALTE (Saúde, Alimentação, Transporte, e Energia), o
primeiro a incluir setores sociais como saúde e alimentação.

Afinal, qual modelo de proteção social se desenhava no Brasil nesse


período da Era Vargas? Podemos afirmar que mostrava-se fragmentado em
categorias, limitado e desigual na implementação dos benefícios, em troca de
um controle social das classes trabalhadoras. Dirigentes de institutos foram
cooptados pelo poder em uma troca de favores, o que fez com que se
caracterizasse um modelo de corporativismo, por levar em conta mais a
relação personalizada do presidente ou do ministro com os dirigentes
sindicais (chamados de pelegos) que as relações de garantia da cidadania.
Vargas governou sob ditadura (Estado Novo), após o golpe de 1937, até
1945, quando foi derrubado militarmente, dando-se início a fase dos
governos populistas até 1964.

Síntese da unidade

Esta unidade traz para nós aspectos da conjuntura política,


econômica e social da chamada Era Vargas, que nos levam a compreender
que foi um período marcado por mudanças políticas (Revolução de 30 e a
perda do poder das oligarquias cafeeiras); por mudanças econômicas
(declínio do foco da agro-exportação para um avanço rumo à
industrialização e urbanização); por mudanças sociais (vinculadas às
conquistas trabalhistas, dentro de um cenário ideológico nacionalista, em
que os benefícios sociais possuem um caráter assistencialista e
corporativista, sem, portanto, promover a liberdade democrática, a redução
da desigualdade social e a conquista da cidadania para a maioria da
população).

1 - Identifique e relate as principais políticas sociais adotadas no período da


Era Vargas. Comente sobre seus reflexos na sociedade da época e nos dias
atuais.

2 - Remuneração mínima devida a todo trabalhador adulto, sem distinção de


sexo, por dia normal de serviço, capaz de satisfazer, em determinada época,
as suas necessidades normais de alimentação, habitação, vestuário, higiene e
transporte” [...] Decreto-Lei nº 2.162, de 1º de maio de 1940 (RETRATOS
DO BRASIL, 1984, Apud PEREIRA, 2002, p.131).
Considerando esse conceito de salário mínimo, podemos considerar
hoje essa remuneração como realmente correspondente às necessidades de
renda mínima do trabalhador como também de sua família. Elabore uma
argumentação contextualizada sobre o assunto.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
39
Comentário

Você deverá responder essas atividades considerando os fatos que


marcaram essa fase da República brasileira, prestando a devida atenção não
só às políticas implementadas nos planos internos de governo, mas também
aos reflexos dos fatores externos que influenciaram na construção de um
modelo de Estado centralizador, corporativista e populista.

Referências
FALEIROS, V.P.F. A política social do estado capitalista. São Paulo:
Cortez, 2000.
PEREIRA, P.A.P. Necessidades humanas: subsídios à crítica dos mínimos
sociais. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2002.

Informações sobre
a próxima unidade
Você vai conhecer e estudar o contexto histórico das políticas
sociais, no período da República brasileira marcada pelos
governos populistas de 1945 a 1964, quando do golpe militar.
É de suma importância que você, acadêmico do Serviço
Social, faça leituras prévias sobre os fatos históricos mais
relevantes que marcaram cada um dos governos desse período,
pois irão ajudá-lo na identificação e compreensão das políticas
sociais implementadas.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
40
As políticas sociais no Brasil: de 1945 a
1964 – fase populista

Meta da unidade
Contextualização histórica das políticas sociais dos governos
populistas dentro de uma análise conceitual do fenômeno populismo
associado aos planos econômicos governamentais.

Objetivos
• conceituar populismo;
• identificar as políticas sociais em cada um dos governos do
período em questão;
• compreender os reflexos das políticas sociais dos governos
populistas.

Pré-requisitos
Ter conhecimento dos principais fatos que marcaram a trajetória dos
governos populistas, com o objetivo de facilitar a identificação e
compreensão das políticas sociais adotadas em seus planos de governo.

Introdução
Todo governo populista brasileiro apelou para uma ideologia difusa
de adesão das massas seja ao nacionalismo (Vargas), seja ao
desenvolvimentismo (Kubitschek), seja ao moralismo (Quadros), seja ao
reformismo (Goulart). A compreensão desses conceitos nos ajuda a
identificar os projetos pessoais e políticos dos governos populistas como
também, suas estratégias econômicas.

Um Brasil populista e desenvolvimentista


Esta fase da República brasileira é marcada por uma política
caracterizada pelo populismo e pelo desenvolvimentismo. Populismo é um
fenômeno típico da América Latina, que surge com a emergência das classes
populares urbanas, resultantes da industrialização, insatisfeitas com suas
condições de vida e trabalho. O governo populista revela-se ambíguo: se por
um lado, reconhece os anseios populares e reage sensivelmente às suas
pressões, por outro, desenvolve uma “política de massa” procurando
manipular e dirigir essas aspirações.
No Brasil, vimos essa tendência desde 1930, quando gradualmente o
modelo agrário-exportador começou a ser substituído pelo nacional-
Contexto Histórico das Políticas Sociais
Serviço Social
41
desenvolvimentista. Podemos exemplificar esse fenômeno com a criação da
Petrobrás que estabelece um monopólio estatal. No governo JK, os
investimentos na indústria automobilística com a inserção do capital
estrangeiro, que, por um lado, amplia e diversifica as atividades econômicas,
por outro, acentua a dependência externa abrindo espaço para interferências
nos rumos econômicos e políticos do país. Assim, crescem as disparidades
regionais com a ocupação desordenada dos centros urbanos e as distorções
da concentração de renda.
A partir da concepção de que as políticas sociais não estão
desassociadas dos modelos políticos econômicos adotados pelos governos
que marcam essa fase da República brasileira, é importante primeiramente
identificar como estão divididos os sub-períodos, que, segundo Pereira
(2002), podem ser assim dimensionados:
• 1945-1950: governo Dutra , fase da redemocratização;
• 1950-1954: governo Vargas, reassumido por meio das
eleições diretas;
• 1954-1956: governos provisórios que preencheram o
interstício entre o governo Vargas (que se suicidou, em
1954, durante seu mandato) e o governo Kubitschek ;
• 1956-1961: governo Kubitschek, fase desenvolvimentista;
• 1960-1961: governos Jânio Quadros (que durou apenas sete
meses) e João Goulart (defensor de reformas de base).

Vamos agora destacar, resumidamente, as principais ações contidas


nos planos econômicos desses governos populistas que influenciaram
diretamente o campo social.
Na década de 50, o governo Vargas empenhou-se em alterar sua
imagem, deixando de se apresentar como uma ditadura para mostrar-se como
uma política democrática interessada apenas em garantir o bem-estar das
classes mais pobres. Foram poucas as medidas efetivas tomadas para
melhorar as condições de vida da população. A inflação continuou elevada;
as cidades contavam com poucos recursos para expandir os serviços de água
e esgoto; o atendimento médico gratuito era precário, mesmo com o
desconto de uma porcentagem do salário para financiar os serviços de saúde
e a aposentadoria. Para amenizar os descontentamentos, o governo decretou
temporariamente o congelamento dos preços e criou o Ministério da Saúde.
Decisões que surtiram poucos efeitos na melhoria da qualidade de vida da
população. Ao lado disso, reajustou o salário mínimo, após oito anos de
Contexto Histórico das Políticas Sociais
Serviço Social
42
congelamento, sofrendo ajustes periódicos sem, contudo, recuperar as perdas
salariais passadas. Intensificou-se a intervenção do Estado na economia. Daí
a criação das empresas estatais: Petrobrás, Eletrobrás e Banco Nacional de
desenvolvimento Econômico – BNDE.
Na década de 50, o governo Kubitschek utilizou como estratégia um
“slogan” nacional-desenvolvimentista: “Cinqüenta anos em cinco”. Com seu
carisma e uma intensa utilização dos meios de comunicação, Juscelino
Kubitschek conquistou a confiança da maioria da população, na esperança de
que todos seriam beneficiados com as melhorias prometidas. Essa é a marca
dos governos populistas.
No campo das políticas sociais poucos investimentos. O Plano de
Metas disponibilizou para os setores sociais apenas 4% para a educação e
3% para a alimentação. Diante das críticas sobre a distribuição de verbas, o
presidente alegava que seu objetivo era expandir o mercado de trabalho
nacional. Esse fato repercutiria positivamente nos setores diretamente
relacionados com as necessidades das camadas mais pobres. Houve um
deslocamento do eixo trabalhista, privilegiado por Vargas, para as demais
áreas sociais, mas sem grande expressão. O destaque concedido as questões
regionais, explica a criação da Superintendência do Desenvolvimento do
Nordeste (SUDENE) e a criação do Conselho Nacional de Desenvolvimento,
com a missão de estudar os problemas nacionais e equacioná-los no prazo de
cinco anos bem como a criação de Brasília.
Na década de 60 (até 1964), com os governos de Quadros e Goulart,
houve uma estagnação econômica e uma intensa mobilização das massas em
torno de pleitos por reformas socioeconômicas. No governo Goulart, foi
elaborado o Plano Trienal contemplando reformas institucionais de base
administrativa, bancária, fiscal e agrária. No campo do trabalho foram
adotadas as seguintes medidas: criação do Estatuto do Trabalhador, da
Confederação dos Trabalhadores da Agricultura (CONTAG), criação do 13º
salário, do salário-família para o trabalhador urbano e promulgação da Lei
Orgânica da Previdência Social (LOPS), visando à uniformização de
benefícios e serviços, priorizando a padronização da qualidade da assistência
médica. Contudo, a cobertura previdenciária prevista na LOPS só cobria os
trabalhadores celetistas (CLT), deixando de fora os trabalhadores rurais e
domésticos. (PEREIRA, 2002, p. 133).
Na educação, destacamos a criação da Lei de Diretrizes e Bases, do
Programa de Alfabetização de Adultos e o Movimento de Educação de Base
(MEB). Na saúde , houve a transformação do Serviço Especial de Saúde
Pública em Fundação e a criação de um novo Código Sanitário.
Os últimos anos do governo Goulart foram marcados pela
articulação e reação das forças conservadoras (burguesia industrial e classe
média) contra as reformas de base propostas pelo Plano Trienal de
desenvolvimento econômico e social. O plano foi atacado por não deixar
claras as dimensões e implicações políticas e econômicas para os setores
mais ativos do empresariado industrial e rural. Quando Goulart resolveu se
apoiar nos grupos de esquerda a oposição, composta por lideranças militares
com o apoio dos empresários e da classe média conservadora, articularam
sua deposição. Goulart exilou-se no Uruguai. Era o início do Regime militar
de 1964 a 1985.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
43
Síntese da unidade

Esta unidade traz para nós aspectos da conjuntura política,


econômica e social da República Populista. Destacamos a importância
da compreensão do populismo como um fenômeno de “política de
massa”, em que as ações políticas rumo ao desenvolvimento se
justificam pela exaltação da pessoa do governante com seu idealismo
em detrimento do atendimento da coletividade. O populismo ignora as
políticas sociais que promovam a liberdade democrática, a redução da
desigualdade social e a conquista da cidadania para a maioria da
população, a fim de garantir ao trabalhador uma melhor qualidade de
vida.

1 - Aponte a características fundamental dos governos brasileiros de 1930 a


1964:
a) nacionalismo;
b) desenvolvimentismo;
c) moralismo;
d) reformismo;

2 - Identifique as principais políticas sociais adotadas pelos governos


populistas e analise seus reflexos na sociedade.

Comentário

Para responder as questões propostas, busque primeiro uma


compreensão conceitual dos termos que caracterizam as ações políticas
adotadas nessa fase da República populista. Também poderá pesquisar na
internet, além da leitura das bibliografias indicadas nessa unidade didática.

Referências
FALEIROS, V.P.F. A política social do estado capitalista. São Paulo:
Cortez, 2000.
FILHO, C.B. De Getúlio a Juscelino 1945-1961. São Paulo: Ática, 2000.
PEREIRA, P.A.P. Necessidades humanas: subsídios à crítica dos mínimos
sociais. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2002.

Informações sobre
a próxima unidade
Analisaremos o contexto histórico das políticas sociais
criadas e implementadas durante a fase militar da República
brasileira (1964-1985), destacando o processo de composição
do poder, as medidas ditatoriais e os momentos de mudanças
que apontam para a redemocratização do nosso país.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
44
As políticas sociais no Brasil: de 1964 a
1985 – Fase da ditadura militar e abertura
política

Meta da unidade
Contextualização histórica das políticas sociais criadas e
implementadas durante a fase da ditadura militar, de seus reflexos para as
conquistas sociais e dos fatores que determinaram as transformações
políticas para a abertura democrática.

Objetivos
• contextualizar as ações políticas e econômicas propostas
pelos planos dos governos durante a ditadura militar;
• identificar as políticas sociais e seus reflexos nos governos
de caráter tecnocrático e militar;
• compreender o processo que marca o final da fase ditatorial
e o início para da abertura política.

Pré-requisitos
Ter conhecimento dos principais fatos que marcaram a trajetória dos
governos militares com o objetivo de facilitar a identificação e compreensão
das políticas sociais adotadas em seus planos de governo, para tal é
interessante a leitura da bibliografia citada nessa unidade didática.

Introdução
Esta fase da República brasileira corresponde ao período de 1964,
ano do golpe militar, a 1988, ano da promulgação da constituição
democrática. A ditadura se caracterizou por forte censura, ausência de
eleições, controle do Congresso Nacional pelo poder militar, então no
Executivo, e repressão violenta dos opositores, considerados subversivos por
lutarem, de forma armada ou não, pela derrubada do sistema autoritário e
pela sua substituição por um sistema democrático e/ou socialista.
A organização e articulação dos diferentes setores da sociedade para
uma participação política se dá a partir da conjunção das lutas dos operários,
de movimentos dos base, da contribuição de intelectuais e de setores
progressistas da Igreja Católica. A fundação do Partido dos Trabalhadores
(PT), em 1980, torna-se uma das principais formas de enfrentamento da

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
45
ditadura que só admitia dois partidos: a Aliança Renovadora Nacional
(Arena), governista, e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB).

As políticas sociais nos anos da ditadura militar


As reformas institucionais resultaram na reestruturação da máquina
estatal, privilegiando o planejamento direto, a racionalização burocrática e a
supremacia do saber técnico sobre a participação popular.

Esse modelo repressivo, centralizado, autoritário e


desigual foi sendo implantado como um complexo
assistencial-industrial-tecnocrático-militar. Controlado
pela gestão tecnocrática, não veio a se constituir como
um projeto universal de cidadania. Era a continuidade
de um modelo fragmentado e desigual de incorporação
social da população em estratos de acesso, conforme os
arranjos de bloco no poder, para favorecer grupos
privados ou particulares, conquistar clientelas,
impulsionar certos setores economicamente influentes,
obter lealdades e, é claro, dinamizar a acumulação. O
regime de repartição simples teve continuidade com o
impulso à previdência privada e a planos de saúde
privados em franca expansão (FALEIROS, 1999, p.48).

Pereira (2002) nos apresenta os seguintes marcos históricos e ações


políticas correspondentes à Ditadura Militar:
• entre 1964 e 1966, sob o governo Castelo Branco: adoção do
Programa de Ação Econômica do Governo (PAEG),
mediante o qual foram criados o Banco Nacional de
Habitação, o Instituto Nacional da Previdência Social
(INPS) e o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço
(FGTS), como a mais profunda alteração das relações
trabalhistas, implicando a extinção da estabilidade no
trabalho;

• entre 1967 e 1969, sob o governo Costa e Silva: criação do


Plano Estratégico de Desenvolvimento (PED) em meio a um
espetacular crescimento econômico, rotulado de “milagre”, e
a um maior endurecimento do regime autoritário com a
declaração do AI/5. Esses foram alguns dos mais tirânicos
anos da história da repressão política brasileira, nos quais se
aprofundaram, simultaneamente, as relações do Estado com
o capital estrangeiro e o fosso na relação entre esse mesmo
Estado e a maioria da população;

• entre 1970 e 1973, sob o governo Médici: instituição de dois


Planos de Governo – Metas e Bases para Ação do Governo,
que vigorou de 1970 a 1971, e I Plano Nacional de
Desenvolvimento (I PND), com vigência de 1972 a
1974. Nesse subperíodo, caracterizado pelo auge do
“milagre econômico”, iniciado em1968, a autoconfiança do
regime autoritário se fortaleceu;

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
46
• entre 1974 e 1979, sob o governo Geisel:por meio do II
Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND),
reintroduziram-se formas autoritárias de controle político, ao
mesmo tempo em que proliferaram as políticas sociais como
respostas estratégicas aos descontentamentos da sociedade
civil. As principais reformas políticas outorgadas pelo
governo Geisel estão contidas no “Pacote de Abril”
(PEREIRA, 2002, p.138).

A implementação de políticas sociais no período da ditadura militar


expressa o caráter de uma política de dominação burguesa aliada à
modernização conservadora. A desigualdade de renda e a injustiça social
ganham ênfase compensatória, mediante programas sociais que reforçam
mais o assistencialismo, caracterizando, assim, o que Porto (2001) chama de
“não cidadania”. Nesse sentido é importante destacar algumas situações de
ações políticas voltadas à questão social:
• em relação à questão agrária não foram feitas alterações
nas condições de posse e uso da terra. Temos a criação do
Programa de Redistribuição de Terras e de Estimulo à
Agricultura do Norte e do Nordeste (PROTERRA). O Fundo
do Trabalhador Rural para Previdência Social
(FUNRURAL) apresentou uma inovação no campo da
previdência, visto que os seus recursos não advinham de
contribuições do beneficiário, mas da tributação dos
produtos agrícolas consumidos nas áreas urbanas.
Entretanto, esse programa – o único de feição redistributiva
– foi desativado em 1977;

• para enfrentar o problema das disparidades regionais, foi


criado, em 1970, o Programa de Integração Nacional (PIN),
com o objetivo de realizar a conexão física de áreas
geográficas consideradas economicamente deprimidas
(Amazônia e Nordeste);

• no que tange à proteção do capital à custa do trabalho, foi


criado o Programa de Integração Social (PIS), em 1970, e,
logo depois, o Programa de Formação do Patrimônio do
Servidor Público (PASEP), que representavam mais um
mecanismo de poupança a serviço da reprodução do capital
e da harmonia entre capital e trabalho do que uma tentativa
de integração do trabalhador no desenvolvimento
econômico;

• em uma conjuntura de emprego, embora com arrocho


salarial, os limites estruturais da economia não impediram
que se ampliasse a previdência aos trabalhadores rurais
(1971), aos empregados domésticos (1972), aos jogadores
de futebol (1973) e aos ambulantes (1978). Os trabalhadores
rurais apenas tiveram acesso a uma previdência com
benefício de meio salário mínimo e sem contribuição direta;
Contexto Histórico das Políticas Sociais
Serviço Social
47
• a Previdência Social, em 1974, beneficiou os idosos
pobres, de mais de 70 anos, por uma lei que implementou a
renda mensal vitalícia no valor de um salário mínimo para
os que houvessem contribuído, ao menos durante um ano.
Nesse mesmo ano, foi criado o Ministério da Previdência e
Assistência Social com a incorporação da LBA, Fundação
para o Bem-Estar do Menor (Funabem), Central de
Medicamentos (Ceme), Empresa de Processamento de
Dados da Previdência Social (Dataprev). O sistema foi
unificado em 1977, com a criação do Sistema Nacional de
Previdência Social (Sinpas), que compreendia, além do
INPS, o Instituto da Assistência Médica da Previdência
Social (Inamps) e o Instituto Nacional de Administração da
Previdência Social (Iapas). Nesse mesmo ano, foi
regulamentada a previdência privada. 40 milhões de
brasileiros não tinham nenhum acesso a serviços médicos. O
setor privado destinava-se aos ricos; os planos de saúde a
um grupo seleto de assalariados e de classes médias; os
serviços públicos, a pagantes da previdência. Para os pobres,
a caridade, feita em geral por entidades municipais
filantrópicas com apoio estatal. É um arranjo tecnocrático-
político do sistema, na busca de legitimidade e de
modernização do modelo getulista;

• a política de financiamento habitacional do Banco


Nacional da Habitação (BNH) serviu ao governo para
reativar a economia e financiar o acesso da classe média à
casa própria. Para os pobres, a LBA passou a ter programas
de cursos de artes domésticas e de ajudas restritas, definidos
em pacotes elaborados pelos tecnocratas de cima para baixo.

Tais reformas regressivas constituem um duro golpe no processo de


distensão política. Vários movimentos sociais revigoraram-se em torno dos
pleitos democráticos. Abriram alternativas de luta para uma participação
política da população como: Ordem dos Advogados do Brasil (OAB),
Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Igreja Católica Progressista, com
as suas Comunidades Eclesiais de Base (CEB), União Nacional dos
Estudantes (UNE) e uma combativa classe operária – a do ABC paulista -,
todos mobilizados em torno da bandeira da democracia.
Como resposta mais imediata a esses movimentos, o governo tratou
de instituir uma nova política salarial, baseada nas negociações diretas entre
empregados e empregadores. Foi nesse contexto que a política social passou
a ser estrategicamente intensificada, não como uma resposta conscienciosa
às necessidades sociais, mas como uma via de reaproximação do Estado com
a sociedade. Desse modo, ampliou-se o leque de benefícios da ação do
Estado.
Os anos de 1974 – 1979, corresponderam ao mais expressivo esforço
governamental de imprimir modificações na economia brasileira e de
ampliar o alvo da política social com um objetivo estratégico bem
Contexto Histórico das Políticas Sociais
Serviço Social
48
especifico: reaproximar o Estado da sociedade como tentativa de adiamento
para uma abertura política.

Síntese da unidade

Podemos entender que esta foi a fase difícil da história do


Brasil, quando a sociedade foi tolhida toda e qualquer forma de
liberdade. O golpe militar levou ao poder governantes autoritários
responsáveis por perseguições e mortes. No campo econômico, não se
alcançou o desenvolvimento tão propagado e a questão social, apesar
de algumas conquistas, foi ignorada por falta de um processo
plenamente democrático no qual a participação popular é
fundamental.

1 - Identifique, nas políticas sociais do período militar, as principais medidas


adotadas, como também os grupos sociais atendidos e os que foram
marginalizados das conquistas sociais.

2 - Houve participação popular no processo de abertura para a democracia?


Justifique.

Comentário

As questões propostas sugerem uma análise da conjuntura política,


econômica e social dos governos militares (concentradores e excludentes),
revelando as seguintes tendências: menosprezo pelas massas; valorização do
capital estrangeiro.

Referências
ABEPSS – CEAD – UNB.1999.
FALEIROS, Vicente de Paula. Natureza e desenvolvimento das políticas
sociais no Brasil. In: Capacitação em Serviço Social, Mod. IV. CFESS.
__________ A política social do estado capitalista. São Paulo: Cortez, 2000.
PEREIRA, P.A.P. Necessidades humanas: subsídios à crítica dos mínimos
sociais 2. ed. São Paulo: Cortez, 2002.
PORTO, Maria Célia da Silva. Cidadania e (“des)proteção social”: uma
inversão do estado brasileiros? In: Serviço Social e Sociedade nº 68. São
Paulo: Cortez. 2001.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
49
Informações sobre
a próxima unidade
Analisaremos o processo de transição democrática
pelo qual passamos na história brasileira na década de 80. Os
movimentos populares e as instituições públicas e privadas se
mobilizaram na expectativa de conquistar direitos sociais
dentro de um processo de democracia.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
50
As Políticas Sociais no Brasil: de 1980 a
1990 – Transição democrática

Meta da unidade
Contextualização histórica das políticas sociais, criadas e
implementadas durante a fase de transição entre a ditadura militar e a
redemocratização do Brasil.

Objetivos
• identificar os fatos e fatores que determinaram as mudanças
políticas que resultaram na abertura democrática;
• identificar as políticas sociais criadas e implementadas pelos
planos de governos nesse período.

Pré-requisitos
Ter conhecimento dos principais fatos que marcaram o processo de
transição democrática ocorrido no Brasil durante a década de 80, em especial
o contexto da convocação, composição e atuação da Assembléia Constituinte
em 1986.

Introdução
Podemos considerar que a ruptura com o regime militar foi lenta e
gradual, com a anistia de 1979, que possibilitou o perdão dos torturadores e
concedeu direitos políticos e civis aos inimigos internos do regime de
segurança nacional. Em 1982, houve eleições para governadores e, em 1984,
a luta pelas eleições diretas para Presidência da República resultou em
eleições indiretas e convocação de Assembléia Nacional Constituinte, em
1986, com os mesmos congressistas eleitos para a legislatura normal.
Importante marco desse período, denominado de “Transição Democrática”
ou “Nova República” é uma reorganização institucional e uma concepção de
proteção social, na qual tanto os direitos sociais quanto as políticas de tutela
desses direitos recebem atenção especial. Pela primeira vez na história
política do país, temos a inclusão da assistência social (com sua proposta de
“mínimos sociais”), em uma constituição federal, e um Sistema de
Seguridade Social e de direito de cidadania.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
51
A transição para a democracia liberal
A ala conservadora do Congresso articulou um bloco chamado
centrão, em oposição às pressões por direitos sociais e para defesa dos
interesses dominantes. Cada artigo da Carta Constitucional foi objeto de
muita disputa e negociação entre blocos de forças. Em linhas gerais, a
Constituição se colocou como liberal-democrática-universalista, expressando
as contradições da sociedade brasileira, fazendo conviver as políticas estatais
com as políticas de mercado nas áreas da saúde, da previdência e da
assistência social. Conseguiu-se, no entanto, no plano econômico, a defesa
de certos monopólios estatais como do petróleo, das comunicações, do
transporte de cabotagem, dos portos; no plano social, o avanço dos direitos
das mulheres, das crianças, dos índios e a inclusão do conceito de
Seguridade Social, que compreende direitos universais à saúde, direitos à
previdência e à assistência social. Depois de quase 50 anos de sua
implementação na Inglaterra, esse conceito é consagrado no Brasil,
contrariando tendências neoliberais de ver no mercado a resposta às
necessidades de políticas sociais. Estaria o Brasil na contramão da história?
Assim pensavam os conservadores, defensores da redução do Estado.
A discussão sobre os direitos inscritos na Constituição, repudiada
pelos conservadores como inviabilizadora do desenvolvimento pelo
chamado custo Brasil em função dos benefícios previstos, contribuiu para
fazer emergir a consciência dos direitos do trabalhador no bojo das lutas
sociais. Contribuiu também para a construção de um novo pacto federativo
com a descentralização de responsabilidades e recursos para os níveis
estadual e municipal, sem contudo, compensar todas as responsabilidades a
eles atribuídas. As políticas de saúde, de educação, da infância, de
assistência foram municipalizadas com controle social previsto para os
conselhos de direitos da criança, de assistência, de educação, de saúde. Os
conselhos devem ser paritários, o número de representantes escolhidos pela
sociedade deve corresponder ao número de representantes escolhidos pelo
poder público.
Em 1999, pelo menos 50% dos municípios (com diferenças
marcantes em alguns Estados onde a taxa sobe a 90%) organizaram
conselhos, mas, freqüentemente, registram-se ingerências de prefeitos. Vive-
se um processo de conflito entre um modelo de garantia de direitos,
descentralizado e participativo, e uma política clientelista, de distribuição de
favores, cooptadora e fragmentada, que usa os recursos públicos para fins
privados. O sistema prevê a dualidade e a desigualdade de acesso à saúde e à
educação por intermédio tanto de empresas privadas como do setor público,
fragilizando-se a cidadania. O regime por repartição da previdência continua
estratificado em camadas de acesso, por exemplo, por tempo de serviço (para
salários mais altos) ou por idade (para salários mais baixos), para professores
(menos tempo de serviço) e não professores, para militares, juízes. É
tolerada pelos governos a sonegação de pagamentos à previdência social por
parte das empresas, com seguidas anistias a seus devedores.
Podemos reconhecer essa nova orientação institucional, sob o
primeiro governo civil do período, o de Sarney: Subsídios para a Ação
Imediata contra a Fome e o Desemprego, preparado, em 1985, pela comissão
para o Plano do Governo (COPAG); Programa de Prioridades Sociais, em
1985; Plano de Prioridades Sociais, em 1986; Plano de Metas, em 1986 –
Contexto Histórico das Políticas Sociais
Serviço Social
52
1989. Vale salientar, também, o relatório elaborado pelo Grupo de Trabalho
para a Reestruturação da Previdência Social, criado pelo decreto nº. 92.654
de 1986. Esse relatório apresenta uma proposta ampla de Seguridade Social
(de estilo beveridgiano) que extrapola o âmbito do seguro, sugerindo uma
vertente não contratual e não contributiva de proteção social pública, nos
seguintes termos: “Todo cidadão brasileiro é titular de um conjunto mínimo
de direitos sociais, independentemente de sua capacidade de contribuição
para o financiamento dos benefícios e serviços implícitos nesses direitos”.
Essa proposta, depositária de um avanço conceitual importante no contexto
tradicional da proteção social brasileira, viria, não sem dificuldades, a ser
acatada pela maioria dos constituintes e incorporada à Constituição Federal d
1988.

No biênio 1985 – 1986 as principais iniciativas de conteúdo


econômico-social adotadas pelo governo Sarney podem ser assim
dimensionadas (PEREIRA, 2002, p.150-151):
• Plano Cruzado: deu início à política econômica da Nova
República, que privilegiou o controle da inflação por
medidas como: reforma monetária (substituindo o cruzeiro
pelo cruzado); congelamento de preços; ajustamento dos
salários. Porém, este plano alimentou temporariamente a
ilusão de crescimento econômico com distribuição de renda
e mostrou suas limitações quando não foi capaz de conter a
inflação, o que resultou no descongelamento dos preços;

• Plano de Metas: concebido como plano de sustentação de


crescimento e de combate à pobreza. Segundo Mollo e Silva
(1988 p.121), tal plano não passava da contabilização de
gastos de cada área de responsabilidade dos Ministérios de
forma individualizada;

• Política emergencial de alimentação: desenvolvida por meio


do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), do
Programa de Suplementação Alimentar (PSA) e do
Programa Nacional do Leite para as Crianças Carentes
(PNLCC);

• Criação do Ministério da Reforma e Desenvolvimento


Agrário (MIRAD) e lançamento da primeira versão do Plano
Nacional de Reforma Agrária (PNRA);

• Instituição do seguro-desemprego, precedido de estudos de


viabilidade da ampliação da sua cobertura e dos benefícios.

À medida que o Congresso incorpora direitos e define o conceito de


cidadania, o governo Sarney promove o desmonte das políticas sociais
federais, reduzindo os programas de habitação, sucateando a saúde,
controlando as verbas da educação e distribuindo cargos para se manter no
poder por cinco e não por quatro anos, como estava previsto quando assumiu

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
53
o governo, em 1995, após a morte do presidente Tancredo Neves, de quem
Sarney era o vice.

Síntese da unidade

Destacamos nesta unidade didática, o processo que marcou a


transição dos governos ditatoriais para a conquista democrática na
república brasileira. Enfocamos as articulações ideológicas e políticas
na composição e atuação da Assembléia Constituinte em 1986, sendo
essa um marco histórico para as mudanças de caráter político
econômico e social que seriam legitimadas pela Constituição de 1988.

1 - Faça uma pesquisa em jornais e revistas publicados na época destacada


por esta unidade (década de 80), procurando identificar os principais fatos
históricos que determinaram os rumos da política brasileira para uma
abertura democrática como:
a) campanha das “Diretas já”;
b) eleição do presidente José Sarney;
c) convocação e atuação da Assembléia Constituinte em 1986;
d) promulgação da Constituição de 1988.

2 - Identificar as políticas sociais aprovadas no governo Sarney que


marcaram o processo de transição democrática destacado nessa unidade
didática.

Comentário

Esta é uma atividade que você poderá fazer em grupo a partir de


uma discussão sobre o tema desenvolvido nesta unidade didática.

Referências
ABEPSS – CEAD – UNB.1999.
FALEIROS, Vicente de Paula. Natureza e desenvolvimento das políticas
sociais no Brasil. In: Capacitação em Serviço Social, Mod. IV. CFESS.
__________ A política social do estado capitalista. São Paulo: Cortez, 2000.
PEREIRA, P.A.P. Necessidades humanas: subsídios à crítica dos mínimos
sociais 2. ed. São Paulo: Cortez, 2002.

Informações sobre
a próxima unidade

Vamos destacar as principais leis referentes aos


direitos e garantias sociais com enfoque na Constituição
brasileira de 1988.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
54
A Constituição Federal de 1988 e as
políticas sociais

Meta da unidade
Contextualização histórica das políticas sociais criadas na
Constituição Federal de 1988.

Objetivos
• identificar os fatos e fatores que determinaram as mudanças
políticas que resultaram na abertura democrática;
• identificar as políticas sociais criadas e implementadas pelos
planos de governo nesse período;

Pré-requisitos
Ter conhecimento dos principais fatos que marcaram o processo de
transição democrática ocorrido no Brasil durante a década de 80, em
especial, do contexto da promulgação da Constituição Federal de 1988, com
o objetivo de facilitar a identificação e compreensão das políticas sociais
adotadas para atender às demandas da questão social.

Introdução
Na década de 1980 a 1990, ocorreram significativos avanços
políticos e sociais no sentido de uma redemocratização, marcada pela
promulgação da Constituição Federal de 1988. Houve manifestações
populares como a campanha pelas “Diretas já”, que revelou um
descontentamento social de diversos setores da sociedade como partidos
políticos, igreja, entidades científicas, imprensa, empresariado,
universidades, sindicatos e outros. Todos reivindicavam uma mudança de
rumo para um país que havia mergulhado em uma das maiores crises de sua
história, que se refletia nas elevadas taxas de inflação, no assombroso
endividamento externo e no déficit público que comprometeu o plano
econômico do governo Sarney. A frustração dos brasileiros pela não
aprovação das eleições diretas foi, de certa forma, amenizada pela
convocação de uma constituinte.
Instalada em 1º de fevereiro de 1987, a Assembléia Constituinte
compunha-se dos membros da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.
Não foi uma Assembléia Constituinte exclusiva. Funcionou juntamente com
o Congresso Nacional , sendo, por isso, chamada também de Congresso
Constituinte. Depois de 20 meses de trabalho, debates e discussões com a
Contexto Histórico das Políticas Sociais
Serviço Social
55
sociedade, a Assembléia Nacional Constituinte promulgou a nova Carta
Magna do país.

Nesta Constituição, a reformulação formal do sistema


de proteção social incorporou valores e critérios que,
não obstante antigos no estrangeiro, soaram, no Brasil
como inovação semântica, conceitual e política. Os
conceitos de “direitos sociais”, “seguridade social”,
“universalização”, “eqüidade”, “descentralização
político-administrativa”, “controle democrático”,
“mínimos sociais”, dentre outros, passaram, de fato, a
constituir categorias-chave norteadoras da constituição
de um novo padrão de política social a ser adotado no
país (PEREIRA, 2002, p.152).

As garantias sociais previstas na constituição


Mesmo sob o julgamento dos conservadores, que rotularam a
nova carta de “inviável” e contrário à corrente neoliberal dominante,
houve um grande avanço democrático quando foram aprovadas
garantias sociais voltadas ao atendimento das demandas mais latentes
manifestadas nos diferentes setores da nossa sociedade. Queremos aqui
destacar alguns pontos importantes como:
Constituição Federal – TÍTULO VIII – Da Ordem Social :
CAPÍTULO I – DISPOSIÇÃO GERAL – Art. 193. A ordem
social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-
estar e a justiça sociais. Segundo Pereira (2002), temos que:
Na área social, a legislação prevê maior responsabilidade do
Estado na regulação, financiamento e provisão de políticas sociais;
universalização do acesso a benefícios e serviços; ampliação do seguro
social, de caráter contributivo; controle democrático exercido pela sociedade
sobre os atos e decisões estatais; redefinição dos patamares mínimos dos
valores dos benefícios sociais; adoção de uma concepção de “mínimos
sociais” como direito de todos.
Na esfera trabalhista, o trabalhador empregado foi objeto de
significativa atenção constitucional, graças às seguintes medidas:
• redução da jornada semanal de trabalho de 48 horas para 44
horas;
• redução de 6 horas para os turnos de revezamento;
• férias anuais remuneradas com 1/3 de salário;
• extensão do FGTS a todos os trabalhadores;
• estabilidade no emprego dos funcionários públicos, após
dois anos de contrato;
• licença paternidade;
• direitos iguais para todos os trabalhadores (urbanos, rurais e
domésticos);
• fixação de 50% para o valor mínimo de remuneração de
horas extraordinárias de trabalho;
• vinculação de aposentadoria ao salário mínimo, visando à
segurança mínima de trabalhadores quando inativos;

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
56
• extensão aos aposentados dos benefícios concedidos aos
trabalhadores ativos;
• ampliação de 90 para 120 dias do período de licença à
gestante;
• elevação da idade mínima para começar a trabalhar de 12
para 14 anos;
• reconhecimento do direito de greve e da liberdade e
autonomia sindicais;
• inclusão do seguro-desemprego como direito dos
trabalhadores urbanos e rurais;
• pagamento, no âmbito do PIS-PASEP, de um abono anual
no valor de um salário mínimo aos trabalhadores com
remuneração mensal de até dois salários mínimos (antes, o
abono anual do pis-pasep contemplava trabalhadores que
recebessem no último ano salários mínimos e fossem
cadastrados pelo menos há cinco anos) (FAGNANI apud
PEREIRA, 2002, p.154).

Na educação, registram-se também os seguintes progressos:


universalização do ensino fundamental; destinação de recursos públicos para
este nível de ensino e para a erradicação do analfabetismo; ampliação de
13% para 18% do percentual das Receitas da União a serem aplicadas na
educação; garantia de gratuidade do ensino público em todos os níveis; nova
concepção da creche em como serviço educacional de particular importância
na preparação das crianças de até 6 anos de idade para o ingresso no sistema
escolar (DRAIBE apud PEREIRA, 2002, p.155).
No campo da Seguridade Social, a Constituição avançou , apesar de
abarcar apenas três políticas sociais: Saúde e Assistência Social, de caráter
distributivo, e Previdência Social, de caráter contributivo.
• no âmbito da Saúde, foi criado um sistema único – o SUS –
sob a forma de rede integrada, descentralizada e
regionalizada, com vistas ao atendimento igualitário de toda
a população atendendo o princípio da universalização;
• na Previdência Social, promoveu-se a igualdade de direitos
para todos os trabalhadores: urbanos, rurais e domésticos;
• na Assistência Social, rompeu-se a prática assistencialista,
transformando em direito o que sempre fora tratado como
favor Os “desamparados” começaram a ser reconhecidos
como titulares ou sujeitos de direitos (PEREIRA, 2002,
p.127). A política de assistência olhava especialmente para
as seguintes categorias sociais: família, gestante, nutriz,
criança, adolescente, idoso, pessoa portadora de deficiência,
desempregado afetado em suas necessidades básicas.

Sabemos da importância para a sociedade da existência de uma


legislação que represente as lutas dos diferentes setores (sociedade civil,
instituições, organizações), como, também, de todas as dificuldades para
implementação das leis. Queremos aqui destacar algumas leis, entre as
muitas que existem, que complementam as bases da Constituição Federal e
regulamentam as ações voltadas à elaboração de políticas sociais.
Contexto Histórico das Políticas Sociais
Serviço Social
57
• Lei Orgânica da Saúde – Lei nº 8080-SUS - (19.09.1990)
• Lei Orgânica da Assistência Social - Lei nº 8.742
(07.09.1993)
• Lei da Pessoa Portadora de Deficiência - Lei nº 7.853
(24.10.1989)
• Lei de Diretrizes e Bases da Educação - Lei nº 9.394
(20.12.1996)
• Estatuto da Criança e do Adolescente - Lei nº 8.069
(13.07.1990)

Síntese da unidade

Destacamos, nesta unidade, a legitimação das conquistas sociais


por meio da promulgação da Constituição Federal de 1988, resultante
de um processo de abertura política que permitiu a organização e
articulação de diferentes setores da sociedade para uma participação
política mais ativa nas lutas por melhores condições de vida com acesso
e garantia de direitos fundamentais (saúde, educação) que deveriam
ser garantidos pelo Estado.

1 - Identifique no texto da Constituição Federal de 1988, leis que


correspondam às políticas sociais de maior relevância para a sociedade na
época e nos dias atuais.

Comentário

Caro (a) acadêmico (a), a questão proposta sugere uma busca


importante para uma melhor compreensão das leis que regulamentam o
atendimento das demandas sociais.

Referências
ABEPSS – CEAD – UNB.1999.
FALEIROS, Vicente de Paula. Natureza e desenvolvimento das políticas
sociais no Brasil. In: Capacitação em Serviço Social, Mod. IV. CFESS.
__________ A política social do estado capitalista. São Paulo: Cortez, 2000.
MAIA, Milka Costa ANJOS, Carla Batista Grassi. Assistente Social: a
serviço da cidadania. (Col.).Goiania: CRESS 19ª Região. 2004.
PEREIRA, P.A.P. Necessidades humanas: subsídios à crítica dos mínimos
sociais 2. ed. São Paulo: Cortez, 2002.

Informações sobre
a próxima unidade
Conheceremos o contexto das políticas sociais públicas
no Brasil, identificando as diretrizes apontadas pelos governos
da década de 90, marcadas por medidas chamadas contra-
reformistas com ideário neoliberal que aponta para um novo
cenário onde não cabe mais a presença excessiva do Estado.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
58
O período neoliberal: o Processo de
Descentralização das Políticas Sociais no
Brasil – ( 1990 a 1998)

Meta da unidade
Contextualização histórica do processo de descentralização das
políticas sociais no Brasil, nos governos de Collor de Melo e Itamar Franco,
inspirado em uma ideologia neoliberal.

Objetivos
• compreender os fatores internos e externos determinantes
para a implementação das políticas sociais no Brasil;
• identificar as principais políticas sociais adotadas neste
período da República brasileira.

Pré-requisitos
Ter conhecimento sobre os fatos históricos que marcaram as
transições dos governos, como, também, os fatores externos que acabaram
por interferirem nas concepções ideológicas e ações políticas que definiram
as prioridades na adoção das políticas sociais.

Introdução
Diante da intensificação mundial do processo de globalização da
economia e da guinada para a direita das políticas sociais, também o Brasil
tornou-se campo fértil para a disseminação da ideologia neoliberal. A
fortalecer essa ideologia estavam não só mudanças tecnológicas – que
alteraram significativamente o modelo de produção e de regulação social
prevalecente – e a debilidade estrutural do paradigma
keynesiano/beveridgiano/fordista de produção e reprodução social, mas
também a derrocada do socialismo real e o enfraquecimento dos partidos e
das organizações de esquerda.

Ancorada na tese de que este novo cenário não


comportava mais a excessiva presença do Estado, a
ideologia neoliberal em ascensão passou, cada vez mais,
a avalizar políticas de ingerência privada. Isso teve
como resultado uma alteração na articulação entre
Estado e sociedade no processo de proteção social,
concorrendo para o rebaixamento da qualidade de vida e

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
59
de cidadania de consideráveis parcelas da população do
planeta (PEREIRA, 2002, p.159).

Além da libertação e da desregulamentação como princípios básicos,


propunham-se agora “reformas estruturais”, incluindo a reestruturação
institucional. Baseadas, a princípio, no receituário do “Consenso de
Washington”, que, nos anos 80, impunha uma forte disciplina fiscal, controle
da inflação e uma drástica redução da presença do Estado na economia e na
sociedade, as políticas neoliberais nos anos 90 mudaram de tática. No setor
financeiro, foi tentada, como medida de eficácia, uma reforma, que, no
Brasil, ocorreu em 1988. Foram promulgadas leis para dar maior
independência aos bancos e fortalecer os regulamentos que afetavam os
mercados de capital e os próprios bancos. Outras reformas fizeram-se
necessárias, como a estabilização da economia (adotada no Brasil em 1986 e
em 1994), a liberalização do comércio (adotada no Brasil em 1990), a
reforma tributária (em tramitação no Brasil), a privatização previdenciária
(gradativa e crescentemente adotada no Brasil).
A integração regional foi outra tendência de ajustamento à ofensiva
neoliberal que, contraditoriamente, resultou da crescente integração
econômica global e da liberação do comércio. Na América Latina, o acordo
bilateral entre o Brasil e a Argentina, em1986, redundou na criação do
MERCOSUL (Mercado Comum do Cone Sul), em 1991, constituído dos
seguintes países: Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. O Chile e a Bolívia
tornaram-se associados, respectivamente em 1996 e 1997.

O governo Collor - (1990 a 1992)


No Brasil, a repercussão da ofensiva neoliberal, em suas diferentes
fases, pode ser assim sintetizada:
Entre 1990 e 1992, tem-se o que, em um tour de force, a imprensa
brasileira chamou de “era Collor”, em referência ao efêmero governo do
primeiro presidente eleito – Fernando Collor de Mello, em 1989 -, após 29
anos das últimas eleições diretas, realizadas em 1960. Foi assim que de
“amigo dos pobres” ou dos “descamisados” e “perseguidor das elites
econômicas” ou dos “marajás”, o presidente Collor, no dizer de Fiori (1991,
p. 115), transformou a política social não em “prima pobre” da política
econômica – como sempre aconteceu na história republicana brasileira -,
mas em “gata borralheira”. Efetivamente, forte foi a discrepância entre a sua
proposta eleitoral e a sua prática governamental.
Para alcançar seus objetivos, o governo Collor não vacilou em lançar
mão de Medidas Provisórias, alegando emergência diante de um quadro
inflacionário e de crescentes dificuldades fiscais. Além disso, propôs a
antecipação da revisão da Constituição Federal (prevista para cinco anos
após a sua promulgação), por julgá-la inflacionária.
Mas os projetos de Collor foram inviabilizados pela persistência da
inflação e pela frenética prática da corrupção que caracterizou o seu governo
e que o levou a ser destituído da Presidência da República em 1992. Ainda
assim, o governo Collor é lembrado como o precursor “moderno” da
desmontagem do “defasado” modelo nacional-desenvolvimentista (tributário
da era Vargas) e da internacionalização da economia brasileira, mesmo que
isso tenha gerando mais crise social e política do que real modernização

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
60
administrativa. Afinal, foi Collor quem primeiro adotou medidas
liberalizantes de integração da economia nacional com a internacional, tais
como suspensão de barreiras tarifárias para compras no exterior e para
importações; desregulamentação das atividades econômicas; privatizações
das empresas estatais e integração regional.

O Governo Itamar Franco – (1992 a 1994)


Em 1993, com o impeachment de Collor, o então vice-presidente
assume a Presidência da República. Itamar defrontou-se com um cenário de
estagnação e de destruição do sistema de proteção social construído desde os
anos 30. São exemplos dessa tendência o desaparelhamento, a fragmentação
e a pulverização de recursos; a forte redução do gasto social federal; a
desarticulação das redes de serviços sociais, como resultado indireto da
“reforma” administrativa do governo e como conseqüência direta dos cortes
de programas sociais, particularmente no campo da assistência social (como
os programas de alimentação e nutrição vigentes até 1990, com exceção da
merenda escolar e do Programa de Alimentação do Trabalhador) (DRAIBE
apud PEREIRA, 2002, p.164); o retorno do clientelismo e do fisiologismo; a
corrupção; o esvaziamento do projeto do SUS; o represamento da concessão
de benefícios previdenciários; o veto ao projeto de criação da Lei Orgânica
da Assistência Social; a falta de apoio governamental à descentralização das
políticas públicas; a ausência de acompanhamento e controle oficiais de
execução física e financeira de políticas sociais, na educação, habitação,
assistência social etc.; a centralização das decisões na esfera social.
Na esfera econômica, o seu maior feito foi o controle da inflação por
meio do Plano Real, que, ao adotar uma nova moeda – o real -, fixou
artificialmente a cotação em relação ao dólar. Controlada a inflação e
estabilizados os preços, assim como a capacidade de consumo, a renda dos
mais pobres melhorou nas regiões metropolitanas, embora tal melhoria fosse
mais tarde deteriorada pelo aumento de juros embutidos nas compras a
prazo.
Dos feitos sociais, merecem menção as ingerências oficiais na
Seguridade Social, destacando-se a aprovação, em dezembro de 1993, da Lei
Orgânica da Assistência Social (LOAS), protelada por cinco anos, e a
liberação de recursos previdenciários represados pelo governo Collor.
Todavia, ambos os feitos foram movidos por pressões externas e nem
sempre surtiram efeitos positivos.
No primeiro caso, a decisão governamental de, finalmente, sancionar
a LOAS, teve como indutor a ação do Ministério Público. Com a aprovação
da LOAS, os Benefícios de Prestação Continuada, que passaram a
caracterizar a política de renda mínima preceituada pela Constituição Federal
de 1988, puderam ser implementados, mas em detrimento da vigência de um
benefício anterior mais generoso – a Renda Mensal Vitalícia -, que ficava a
cargo da Previdência Social.
No segundo caso, o governo cumpriu determinação do Supremo
Tribunal Federal, que, ainda no governo Collor, expediu sentença judicial
exigindo o reajuste dos benefícios previdenciários dos aposentados em
147%. Mas, para arcar com essa despesa, o governo utilizou quase
integralmente as fontes de financiamento da Seguridade para a cobertura dos
benefícios previdenciários, o que, se por um lado agradou momentaneamente
Contexto Histórico das Políticas Sociais
Serviço Social
61
a opinião pública, por outro “comprometeu a implantação do SUS, alvo
privilegiado do ataque neoliberal, e provocou uma crise conjuntural sem
precedentes no setor”.
Ainda na área social, há de se fazer menção à readmissão feita por
Itamar Franco de vários funcionários públicos demitidos por Collor e ao
Plano de Combate à Fome e à Miséria pela Vida (PCFMV), de 1993, que,
ancorando-se na colaboração entre o governo e a sociedade, pautou-se por
três princípios-chave: a solidariedade privada: a parceria entre Estado,
mercado e sociedade; a descentralização da provisão social. Tal plano teve
como órgão coordenador um Conselho Consultivo, de composição mista
(governamental e não-governamental, com prevalência desta) – o
CONSEAS -, e como mentor intelectual o sociólogo Herbert de Souza,
conhecido nacionalmente como “Betinho”.Esse, apostando na força da
solidariedade da sociedade, coordenou com reconhecida eficácia uma
campanha nacional de combate voluntário à fome e a à miséria no Brasil.
Contudo, como era previsível, o PCFMV teve vida breve. Seus
impactos mobilizadores não foram (e nem poderiam ser) suficientes para
alcançar seus complexos objetivos. Cedo, impasses institucionais,
financeiros e logísticos impuseram-se, tornando inviável o sucesso da
campanha. Sem o comprometimento decisivo do Estado, o Plano foi
inviabilizado por problemas como “restrições orçamentárias”, “fragilidade e
desarticulação institucional”, “corrupção e clientelismo”, aliados ao
“voluntarismo” da sociedade, da parceria e descentralização que constituía a
idéia-força do referido plano. Assim, dos três princípios básicos, apenas o
ultimo deixou um singelo legado: a descentralização da merenda escolar.
Com esse legado, somado à falta de um consistente projeto político, o
governo Itamar Franco pouco teve a contribuir para a melhoria das
condições sociais da nação.

Síntese da unidade

Destacamos, nesta unidade didática, o processo de


descentralização das políticas sociais, identificado nas ações dos
governos Collor e Itamar que determinaram um modelo de proteção
social alinhado às concepções neoliberais, com medidas liberalizantes
reduzindo cada vez mais a presença do Estado no atendimento às
demandas sociais.

1 - Faça um levantamento das principais medidas adotadas pelo governo de


Fernando Collor de Mello que representaram conquistas ou perdas nas
formas de implementação das políticas públicas sociais.

2 - Faça um levantamento das principais medidas adotadas pelo governo de


Itamar Franco que representaram conquistas ou perdas nas formas de
implementação das políticas públicas sociais.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
62
Comentário

Caro (a) acadêmico (a), as questões propostas sugerem uma busca


importante para a melhor compreensão das leis que regulamentam o
atendimento das demandas sociais, por meio de políticas públicas sociais,
contribuindo para uma análise das ações dos governantes, ajudando-nos a
caracterizá-los historicamente.

Referências
FALEIROS, V.P.F. A política social do estado capitalista. São Paulo:
Cortez, 2000.
PEREIRA, P.A.P. Necessidades humanas: subsídios à crítica dos mínimos
sociais, 2. ed. São Paulo: Cortez, 2002.

Informações sobre
a próxima unidade
Conheceremos o contexto das políticas sociais públicas no
Brasil, identificando as diretrizes apontadas pelo governo de
FHC nos seus dois mandatos com ideário neoliberal que
aponta para um novo cenário em que se observa uma redução
do Estado na construção do modelo de proteção social.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
63
O período neoliberal: o Processo de
Descentralização das Políticas Sociais no
Brasil – (1998 a 2002)

Meta da unidade
Contextualização histórica do processo de descentralização das
políticas sociais no Brasil no período marcado pelos dois mandatos de
governo de FHC, compreendendo a ideologia neoliberal como diretriz na
concepção do modelo de proteção social.

Objetivos
• caracterizar o modelo de Estado desenvolvido durante o
governo de FHC e seus reflexos no atendimento as
demandas sociais;
• identificar as medidas políticas , econômicas e sociais que
marcaram o governo de FHC.

Pré-requisitos
Conhecer as concepções de neoliberalismo, de proteção social, de
mínimos sociais e as referências a fatos históricos que marcaram esta fase da
República brasileira. Para tal se faz necessária a leitura de Pereira e Faleiros,
indicados nas referências desta unidade didática.

Introdução
Ao final do governo Itamar Franco, foi eleito presidente da
República, para o período de 1994-1998, Fernando Henrique Cardoso
(FHC), o qual teve como principal bandeira de sua campanha política a
continuidade da estabilidade macroeconômica e reformas na Constituição
Federal vigente e a consolidação da democracia. Para tanto, preservou e deu
novo impulso ao reformismo liberal, mas sem abrir mão do seu principal
símbolo de prestígio e de poder hegemônico, adquirido antes mesmo de sua
eleição: a estabilização da moeda.

O Governo de FHC – ( 1994 a 2002)


Durante o seu primeiro mandato, FHC deu mostras de que tinha
abraçado (embora o negasse) o ideário neoliberal, elegendo como principais
alvos de governo a redução da participação do Estado nas atividades
econômicas e a desregulação do mercado. Por essa perspectiva, segundo

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
64
Pereira (2002), o Estado não mais teria funções empresariais, cedendo lugar
ao mercado, nem assumiria o papel de provedor social, dando vez à
iniciativa privada. Ademais, o país deveria abrir-se ao capital estrangeiro,
integrando-se ao sistema econômico mundial.
Tais posturas chocavam-se, evidentemente, com os preceitos
constitucionais, que não liberavam o Estado do seu papel regulador e
provedor. Mas esses choques não representaram empecilhos aos propósitos
liberalizantes do governo, que conseguiu aprovar no Congresso Nacional,
onde tinha maioria, projetos de reforma da Constituição. Assim, foram
aprovados, quase que integralmente, projetos que visavam a) ao fim da
discriminação constitucional em relação a empresas de capital estrangeiro; b)
à transferência para a União do monopólio de exploração, refino e transporte
de petróleo e gás, antes detido pela PETROBRAS, que se tornou
concessionária do Estado (com pequenas regalias em relação a outras
concessionárias privadas); c) à autorização por parte do Estado para
concessão o direito de exploração de todos os serviços de telecomunicações
(telefone fixo e móvel, exploração de satélites etc.) a empresas privadas
(antes empresas públicas tinham o monopólio da concessão). Além disso,
conseguiu aprovar no congresso lei complementar regulando as concessões
de serviços públicos para a iniciativa privada, já autorizadas pela
Constituição (eletricidade, rodovias, ferrovias etc.), bem como uma lei de
proteção à propriedade industrial e aos direitos autorais , preservando, ainda,
o programa de abertura comercial que já havia sido implementado. Calcado
na legislação preexistente e nas reformas constitucionais, promovidas desde
1995, esse governo também executou com desenvoltura e sucesso um
enorme programa de privatizações e de venda de concessões, tanto no
âmbito federal como no estadual.
Estavam postas, assim, as vigas mestras de um projeto político, de
orientação radicalmente neoliberal, que iria caracterizar um novo estilo de
gestão pública no país e conformar um novo bloco hegemônico, cada vez
mais ampliado e constituído, inclusive, de quadros antes pertencentes à
esquerda, como foi o caso do presidente. Privilegiando abertamente as
prioridades citadas, o governo conseguiu, de fato, pôr fim à hiperinflação e à
desestabilização dos preços, mas com grandes custos sociais. Pois,
obstinando-se em manter intocado o tripé que sustentava o Plano Real –
atração de capitais externos, câmbio sobrevalorizado e altas taxas de juros –,
contribuiu para que essa obstinação (aliada posteriormente, à meta de ajuste
econômico imposta pelo FMI) aumentasse a dívida pública e desacelerasse o
crescimento. Fica patente, pois, que o governo FHC elegeu a política
monetária como a sua prioridade número um, descuidando, durante todo seu
primeiro mandato, das políticas propriamente econômicas e, principalmente,
das sociais. Já em 1995 o descaso para com os assuntos sociais foi
oficialmente denunciado. Naquele ano, o Relatório do Tribunal de Contas da
União (TCU), com base na análise das ações e das contas do governo,
indicou que os gastos governamentais com o combate à pobreza, com
investimentos em educação e com o programa de reforma agrária eram
menores do que os de 1994, no governo Itamar. Efetivamente, as
substanciais reduções na liberação de recursos para essas rubricas já
afiguravam-se, no início da administração FHC, como um forte indicador de

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
65
que a área social, apontada em discurso de campanha eleitoral como
prioritária, não teria vez (como não teve).
Tanto foi assim que estreitou os seus laços com o FMI, pedindo-lhe
empréstimos e seguindo à risca o seu receituário, exacerbando, desse modo,
a sua política anticrescimento e desregulamentadora da legislação trabalhista
e das atividades empresariais. Fazem parte dessa política o desmonte de
direitos sociais sacramentados pela legislação trabalhista, o desmoronamento
do patrimônio público, por meio de um amplo processo de privatizações, e a
retirada do apoio estatal a “importantes setores produtivos, como a
agricultura (MERCADANTE apud PEREIRA, 2002, p.171).
Cabe registrar, também, que, ao lado da preocupação com a
estabilidade da moeda, FHC tinha uma outra prioridade - pessoal e política -
que habilmente associou à garantia de sucesso, em a longo prazo, do Plano
Real. Tratava-se da sua reeleição à Presidência da República, a qual exigiu
de FHC, durante todo o seu primeiro mandato, intenso envolvimento pessoal
e articulações políticas nada edificantes (tal qual fizera Sarney), para fazer
aprovar essa pretensão no Congresso Nacional. E isso, evidentemente,
contribuiu para desviar a atenção do governo dos problemas econômicos e
sociais que se avolumavam.
Para não dizer que a área social não ficou à margem das atenções
governamentais, cabe mencionar o Programa Comunidade Solidária,
criado no dia da primeira posse de FHC, mediante Medida Provisória (MP
813/95), como estratégia de combate à pobreza. Mas esse programa,
quererendo reeditar – na estratégia e na intenção – o controvertido PCFMV
do governo anterior, sobrepôs-se à nova concepção de previdência social
preconizada pela Constituição e regulamentada pela LOAS. Ironicamente, o
Comunidade Solidária acabou por reeditar ações assistencialistas da Legião
Brasileira de Assistência, fruto da era Vargas, tão abominada pelo governo,
desconsiderando determinações constitucionais.
Hoje, aproximadamente 24 milhões de trabalhadores estão à margem
do mercado formal de trabalho, e cerca de 10 milhões de brasileiros estão
desempregados. Políticas sociais básicas, nas áreas de saúde e educação
estão perdendo aceleradamente o seu caráter universal e a sua finalidade
pública. A situação dos salários, especialmente a do salário mínimo, é
calamitosa. Há cinco anos, os servidores públicos não recebem aumento, e o
salário mínimo continua arrochado. As justificativas apresentadas pelo
governo para manter o salário mínimo tão baixo (desequilíbrio das contas da
Previdência, aquecimento do consumo, aumento da inflação, etc.) só servem
para confirmar a sua relutância em combater a pobreza. Paralelamente a isso,
a propalada redistribuição de renda da fase inicial do Plano Real perdeu
solidez. “O rendimento médio das pessoas ocupadas vem caindo a um ritmo
crescente desde 1997; entre 1996 e 1998, enquanto o total de ocupados
aumentou apenas 3% (dados PNAD), o número de pessoas ocupadas com
rendimentos iguais ou inferiores a um salário mínimo aumentou quase 13% e
ao trabalhadores com rendimentos superiores a dez salários mínimos viram
queda de cerca de 18%. Ou seja, há um claro deslocamento dos
trabalhadores ocupados para os níveis baixos de remuneração”
(MERCADANTE apud PEREIRA, 2002,p.173).

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
66
Para agravar essa situação, Estados e municípios, que poderiam,
mais agilmente, prestar serviços sociais públicos locais – valendo-se da
autonomia, para esse fim, que a Constituição lhes oferece –, estão obrigados,
em nome da defesa do Plano Real, do ajuste fiscal e do equilíbrio
macroeconômico, a amortizar as suas dívidas para com a União, mediante
acordos que comprometem de 10% a 15% de suas receitas líquidas
(SINGER apud PEREIRA, 2002,p.173). Mesmo assim, vários Estados e
municípios criaram, autonomamente, programas de renda mínima, de caráter
condicional, atrelados à obrigatoriedade das famílias pobres de manterem
seus filhos na escola.
Seguindo essa tendência (até porque ela tem raízes liberais), o
governo federal, antevendo a reeleição, criou também o seu programa de
renda mínima em dezembro de 1997, atrelando-o, igualmente, à
obrigatoriedade da escola, para retirar das ruas e “da prática condenável do
trabalho infantil”, especialmente no meio rural, crianças pobres. Também
com vista à reeleição, FHC apresentou, em setembro de 1998, as metas de
seu segundo programa de governo para até 2002. No lançamento do
programa admitiu que a miséria no Brasil é “motivo de vergonha e
indignação”, propondo-se a debelá-la com o resgate de mais de cinco
milhões de famílias da indigência, por meio de medidas emergenciais e
genéricas, tais como: “garantia de estoques de emergência de alimentos para
calamidades, distribuição de cestas básicas nos focos agudos de fome (...) e
programas de alimentação associados a ações de saúde voltados para a
erradicação da desnutrição em crianças menores de dois anos” (Folha de S.
Paulo apud PEREIRA, 2002,p.174).
Quanto à reforma agrária – uma demanda exaustivamente colocada
na agenda pública pelo Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST) em
todo o primeiro mandato de FHC –, o programa de governo do segundo
mandato fala genericamente de uma política fundiária, sob o título “Um
Novo Mundo Rural”, mas sem estabelecer metas de assentamentos (Folha de
S. Paulo, 1998b). Em vez disso, o documento prefere remeter-se às ações já
realizadas no meio rural, como o Programa de Fortalecimento da Agricultura
Familiar (PRONAF) e distribuição de cerca de 38 milhões de cestas básicas,
em 1998, nas áreas de seca.
Dentre outras realizações sociais do primeiro mandato, o documento
ressalta também as 35 milhões de refeições servidas diariamente aos alunos
do ensino fundamental, mediante o programa de merenda escolar, e as 8
milhões de pessoas atendidas mensalmente pelo Programa de Alimentação
do Trabalhador.
Entretanto, uma vez reeleito, FHC continuou prisioneiro da sua
política de estabilização, que novamente o conduziu ao poder, sendo incapaz
de formular uma agenda voltada para ultrapassá-la ou para construir uma
proposta de desenvolvimento livre do fundamentalismo neoliberal.
Para não criar problemas com os seus aliados, o presidente da
República adotou uma solução inédita no Brasil: decidiu deixar para os
Estados da Federação a liberdade de ultrapassar o salário mínimo nacional,
através de pisos diferenciados. Com isso, o Executivo federal acabou
separando o piso pago pela Previdência Social do que será adotado no
restante da economia, contrapondo-se, com esse fato, à tendência

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
67
internacional de estipular um salário-base para todos os trabalhadores,
visando ao aumento do seu poder de compra.
O Brasil do segundo governo de FHC, portanto, adotou um salário
mínimo que não acompanha nem mesmo os níveis salariais de seus parceiros
do MERCOSUL, pois, na Argentina, o salário mínimo equivale a R$ 376,00,
no Uruguai a R$ 338,00 e no Paraguai a R$ 263,00.
Outra atitude foi a apresentação de um projeto de flexibilização da
legislação trabalhista, mediante a qual direitos garantidos aos trabalhadores
pela Constituição de 1988 (salário mínimo, Fundo de Garantia por Tempo de
Serviço, seguro-desemprego, férias anuais, 13º salário, aposentadoria,
licença-maternidade etc.) seriam flexibilizados (leia-se: desmantelados), sob
o imperativo de baixar os custos de contratação de mão-de-obra. Isso,
inevitavelmente, conduz à maior degradação das condições de vida dos
trabalhadores e a uma maior precarização da segurança social, já tão
fragilizada.
A agenda de reformas dos anos 90, iniciada no governo Collor e
encampada, de modo mais radical, por FHC, caracteriza-se mais exatamente
como uma ruptura com as propostas progressistas dos anos 80, tributárias da
Constituição Federal de 1988.
Há, pois, fundadas razões para se acreditar que, nesse governo, o
Brasil assistiu não só à destruição de um legado de conquistas institucionais,
econômicas e sociais, construído entre os anos 30 e 80, mas também a
flagrantes demonstrações de idiossincrasia governamental com os
trabalhadores e com os pobres. Trata-se, evidentemente, de um governo anti-
social, que, ao aderir à ala mais fundamentalista do neoliberalismo, não se
preocupou sequer em garantir o mínimo de proteção social, admitido até
mesmo por Hayek (o pai do neoliberalismo ortodoxo), em casos de pobreza
crítica.
Por força da LOAS, o governo FHC viu-se instado a tematizar, nos
últimos anos, a noção de mínimos sociais, com vista à regulamentação dessa
matéria na LOAS e à instrumentação da Política de Assistência Social a
cargo do órgão gestor no âmbito federal – a Secretaria de Estado de
Assistência Social (SEAS), do Ministério da Previdência e da Assistência
Social (MPAS). Acontece que os poucos esforços empreendidos para a
definição desses mínimos são ainda insipientes e experimentais. A maioria
toma a noção de mínimos sociais ao pé da letra, relacionando-a necessidades
sociais elementares, cuja satisfação é concebida como um atendimento
setorial em conformidade com a tradicional setorialização existente no
campo da política social (saúde, educação, previdência etc.). Ademais, tais
esforços vêm reproduzindo problemas conceituais como o de relativismo na
concepção de necessidades e a identificação de necessidades com
preferências, desejos e até compulsões, o que dificulta a definição de
políticas públicas e facilita a ingerência do mercado e de ações voluntárias
no processo de provisão social. Mas nem mesmo essas tentativas de criar
uma noção minimamente consensual em torno da satisfação de necessidades
primárias tem tido eco no âmbito do próprio Estado (PEREIRA, 2002,
p.179).

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
68
Síntese da unidade

Destacamos, nesta unidade, o processo de descentralização das


políticas sociais, com ênfase no modelo de Estado liberal adotado por
FHC em seus dois mandatos de governo.

1 - Procure fazer uma análise da conjuntura atual no contexto da comunidade


local. Identifique e relate as situações mais graves, exigem do Estado ações
que possam promover uma melhor qualidade de vida .

2 - Faça um levantamento das principais medidas adotadas pelo governo de


FHC que representaram conquistas ou perdas nas formas de implementação
das políticas públicas sociais.

Comentário

As questões propostas sugerem uma busca interessante para análise


e compreensão das diretrizes adotadas no governo FHC. Tudo aponta para
um projeto de Estado neoliberal com seus reflexos nas mudanças políticas,
econômicas e sociais dessa fase contemporânea da República.

Referências
FALEIROS, V.P.F. A política social do estado capitalista. São Paulo:
Cortez, 2000.
PEREIRA, P.A.P. Necessidades humanas: subsídios à crítica dos mínimos
sociais. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2002.

Informações sobre
a próxima unidade
Conheceremoas o contexto das políticas sociais públicas no
Brasil e como se apresenta a construção do modelo de
proteção social na sociedade moderna.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
69
Política Social na Sociedade Moderna

Meta da unidade
Contextualização da constituição das políticas de proteção social da
sociedade no mundo moderno, atual e globalizado.

Objetivos
• contextualizar a valorização das redes de cooperação
microterritoriais e do associativismo;
• apresentar a matriz da Política Social Contemporânea;

Pré-requisitos
Para bem acompanhar e melhor aproveitar esta parte do seu material,
você deverá ter um bom entendimento das unidades didáticas iniciais deste
Caderno de Conteúdos e Atividades, pois elas fornecerão o contexto
histórico e a fundamentação teórica para esta unidade que trata das políticas
sociais na modernidade.

Introdução
Vivemos em uma época em que os desenhos sociais estão
fortemente atrelados aos movimentos econômicos, que por sua vez ditam as
inter-relações entre as mais diversas instituições e nações, configurando um
mapa de alianças que se sobrepõe ao mapa histórico e geográfico do planeta.
No Brasil, a reabertura democrática, após o período de ditadura
militar, descortina lentamente um cenário de muitas demandas sociais até
então não atendidas pelas políticas sociais.
O cenário histórico, econômico e social aponta para a
emergência de um novo modelo de políticas sociais, com um
forte teor de participação pública em seu planejamento.

Um novo prisma das políticas sociais


As políticas sociais desde o Poor Law (Lei dos Pobres)
têm toda a caracterização de combate à pobreza e às suas
expressões mais cruéis como a fome, a falta de moradia e a
necessidade de auxílio assistencial. Nesse sentido, podia
esperar-se que, na virada do século XX para o século XXI, as
nações tivessem obtido êxito na redução das demandas que
compõem o quadro de pobreza.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
70
Pensar que a pobreza deveria ter sido erradicada nos países
desenvolvidos e que não deveria ser tão presente nas nações em
desenvolvimento talvez fosse um quadro que tenha sido sonhado pela
sociedade dos séculos passados. Mas, no momento atual, a simples
superação da pobreza mais avassaladora tem se tornado uma meta de boa
parte das políticas sociais.

Dentro da modéstia a que somos compelidos a


reconhecer, coloca-se primeiro apenas a tentativa de
superar a pobreza absoluta, definida como aquela
situação social na qual a sobrevivência não é possível. O
problema já começa aí, porque pobreza absoluta não é
de poucos, de alguns deserdados, mas de muita gente,
por vezes da maioria. (DEMO, 2000, p. 55-56)

Alguns aspectos relevantes constituem-se em tendências que


norteiam as políticas sociais contemporâneas, no final do século XX e início
do século XXI, dentre as quais podemos destacar:

1. O movimento globalizador e o Estado-nação de


papel reduzido:
Conforme já visto anteriormente o processo de globalização das
relações comerciais e culturais acaba por inserir o mercado no contexto do
atendimento de demandas sociais e subtrair do rol das atividades do Estado a
execução de políticas públicas, desdobradas em programas, projetos e ações
sociais, ambientais, culturais e de defesa dos direitos.
No cenário de redução do papel do Estado, temos o desenho de uma
nova postura perante o atendimento de demandas, anteriormente a ele
atribuídas. Esse novo desenho deixa o atendimento universalista estatal de
lado, assumindo-se para o Estado o desempenho de um atendimento mais
emergencial, conforme afirma Carvalho:

O Estado-nação acaba se comportando como um


“pronto-socorro” do mercado/economia e “pronto-
socorro” do social. Já não se espera que exerça um
papel/poder intervencionista em ambos os campos. É
neste contexto que muitos atores apontam para uma
perigosa clivagem, em que a concepção social
universalista seria deixada à margem. (CARVALHO,
1997, p. 17)

2. Competitividade e individualismo:
Outra tendência que caracteriza fortemente as políticas sociais
contemporâneas é a do aumento, na sociedade atual, do individualismo,
destacadamente na busca de formação profissional e de espaço no mercado
de trabalho. Isso se reflete no fortalecimento de valores como o
empreendedorismo, a fragmentação e o corporativismo. Essa tendência
acompanha o mercado no que tange à maior competitividade entre as
organizações.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
71
3. Descentralização do Estado de Bem-estar Social
(Welfare State):
Um dos mais importantes aspectos que caracterizam a nova
configuração das políticas sociais é a descentralização do chamado Estado
de Bem-estar Social, conhecido como Welfare State, que deixa de ser um
todo desenhado quase que exclusivamente pelo Estado (forte, protetor e
intervencionista), passando a uma nova fase de valorização das condições,
contextos e potencialidades das redes de solidariedade microterritoriais.

Mesmo durante o auge do Estado-nação, as redes de cooperação e de


fortalecimento das pequenas regiões (usualmente chamadas de redes de
solidariedade microterritoriais) mantiveram-se ativas e cooperantes para o
sucesso do projeto das políticas sociais universalistas. Mas, dada a
fragilização do atendimento às necessidades sociais, tais redes são
novamente valorizadas no desenho da política social contemporânea,
conforme afirma Carvalho (1997):

Na realidade, pesquisas recentes constataram que estas


microrredes de solidariedade – e sociabilidades por elas
engendradas – mantiveram-se como condições
privilegiadas de proteção e pertencimento a um campo
relacional importante na reenergização da vida cotidiana
dos indivíduos.[...] Sem dúvida, o fator principal deste
retorno se deve às crescentes demandas de proteção
social postas não apenas pelos “pobres”, ou
“desempregados”, mas por uma maioria de cidadãos,
que se percebem ameaçados pelos riscos de, a qualquer
momento, perderem a segurança advinda de seus tutores
tradicionais: o mercado e o Estado.[...] Hoje, as
demandas de proteção social ganham novas
peculiaridades. É que os processos contemporâneos de
globalização da economia, da informação, da política,
da cultura, assim como os avanços tecnológicos e a
transformação produtiva, vêm produzindo uma
sociedade complexa e multifacetada. Uma sociedade
global que, de uma lado , mantém seus cidadãos
fortemente interconectados e, por outro lado,
extremamente vulnerabilizados em seus vínculos
relacionais de inclusão e pertencimento. Já não são
apenas as mercadorias que podem ser descartadas, mas
também segmentos da população que se tornam
“sobrantes”. (CARVALHO, 1997, p.18).

Políticas sociais contemporâneas


Pode-se, então, apresentar o novo modelo de gestão das políticas
sociais como políticas sociais contemporâneas, a partir do momento em que
se atenta para as seguintes considerações:
1) A promulgação da Constituição Federal de 1988 – que
destaca competências indelegáveis do Estado, como também as
possibilidades de parcerias desse com outros setores (mercado e
terceiro setor) para o financiamento e execução de ações,
projetos, programas e políticas públicas;
2) A fragilização das políticas sociais públicas – que
deixaram seu caráter universalista (welfare state) e perderam a

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
72
capacidade de atender com presteza às demandas sociais da
comunidade;
3) A revitalização das redes de solidariedade
microterritoriais (fortalecimento da sociedade civil organizada)
– que tornam a ter força de expressão a partir dos movimentos
sociais, passando pela estruturação de grupos sociais de
discussão de políticas sociais como os fóruns de DLIS –
Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável e o
fortalecimento do associativismo nas microrregiões e territórios;
4) Por extensão, a formatação de sistemas mistos de bem-estar
chamados de WELFARE MIX, em que o Estado, o mercado e o
terceiro setor passam a desenvolver ações que se complementam
no atendimento às demandas sociais. Esse modelo, que se
iniciou na década de 1980, foi desenvolvido no bojo da idéia do
‘pluralismo de bem-estar’ com o fortalecimento do setor privado
não lucrativo (terceiro setor).

Segundo Carvalho (1997), o welfare mix traz uma combinação de


recursos e esforços que se complementam junto ao Estado, ao mercado, às
iniciativas privadas sem fins lucrativos e aqueles que derivam das redes de
microssolidariedades (em geral originadas na família, nos territórios e na
igreja).
Pode-se dizer, então, que é de competência exclusiva do Estado a
elaboração e a legislação das políticas sociais, que posteriormente se
desdobrarão em programas e projetos. Na execução e no financiamento da
implementação dos programas e projetos, se tornam atores, além do Estado,
o mercado e as organizações do terceiro setor, que podem planejar suas
ações dentro desse nível, devendo seguir os ditames das políticas sociais
desenhadas pelo Estado. Por fim, cabe ao Estado a fiscalização da execução
dessas políticas, mesmo quando desenvolvidas pelo mercado ou pelo terceiro
setor, como vemos a seguir no QUADRO DE COMPETÊNCIAS abaixo,
que aponta atividades exclusivas do Estado, limitações do mercado e do 3°
setor e a possibilidade de cooperação e complementariedade no campo do
financiamento e execução de políticas sociais:

Quadro de competências quanto às polìticas sociais

Etapa da Política Social Estado Mercado 3°Setor

Planejamento / legislação acerca de políticas


exclusivo não não
sociais

Financiamento e execução de políticas sociais sim sim sim

Fiscalização do atendimento às demandas e às exclusivo


não não
leis (*)
(*) A fiscalização, pode se dar através de Conselhos de Políticas
Públicas, que somente são empoderados em suas funções, por meio de ato do
Estado. (Este quadro foi elaborado pelos autores deste Caderno de
Conteúdos e Atividades).

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
73
1 - As políticas sociais atuais cooperam para a superação:
( ) total da pobreza;
( ) da pobreza absoluta;
( ) da fome;
( ) da falta de condições para a inserção no mercado de
trabalho.

2 - As políticas sociais contemporâneas estão fundamentadas em:


( ) participação, ONGs e Estado/
( ) amparo da Constituição, fragilização do welfare state,
nova valorização das redes microterritoriais de solidariedade e
fortalecimento do Estado;
( ) amparo da Constituição, fragilização do welfare state,
nova valorização das redes microterritoriais de solidariedade e
fortalecimento do welfare mix;
( ) descrença no Estado e no mercado, fortalecimento da
sociedade civil organizada e de suas associações.

Comentário

A redução do Estado-nação se dá pela insuficiência de suas


políticas públicas universalistas no combate à pobreza. As políticas sociais
atuais buscam a sua superação, pelo menos nos níveis da pobreza absoluta.
Tais políticas sociais contemporâneas fundamentam-se em um novo
cenário, cujo aspecto mais relevante é o surgimento do conceito de welfare
mix, em que se agrupam (junto ao Estado) novos atores para o atendimento

Referências
CARVALHO, M.C.B. A reemergência das solidariedades microterritoriais
na formatação da política social contemporânea. São Paulo em Perspectiva,
São Paulo, ano 4, n°11, p. 16 a 21, dez. 1997.
DEMO, P. Política Social e cidadania. Campinas/SP: Papirus, 2000.
NEUMANN, L.T.V. e NEUMANN, R.A. Desenvolvimento comunitário
baseado em talentos e recursos locais - ABCD. São Paulo: Global, 2004.

Informações sobre
a próxima unidade
Conheceremos um pouco mais acerca das políticas
sociais brasileiras.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
74
As Políticas Brasileiras
de Seguridade Social

Meta da unidade
Conhecimento da evolução histórica da previdência social até o
conceito atual de seguridade social.

Objetivos
• conhecer as bases de criação e funcionamento da
previdência social no mundo e no Brasil com base nos
modelos de governo;
• conhecer a política de assistência social adotada pelo Brasil
por meio da Constituição Federal.

Pré-requisitos
Entendimento dos temas anteriormente estudados neste Caderno de
Conteúdos e Atividades, principalmente da unidade didática anterior.

Introdução
A gênese e a expansão da seguridade social no Brasil e no mundo,
no âmbito do sistema capitalista, está intimamente relacionada com a relação
estabelecida entre o capital e o trabalho. O exame da política econômica e da
política social deve estar fundamentado no desenvolvimento contraditório da
história. Em nível lógico, tal exame mostra as vinculações
dessas políticas com a acumulação capitalista. Em nível
histórico, consiste em respostas às necessidades sociais,
satisfazendo-as ou não. Portanto, a previdência social,
como uma das políticas da seguridade social, é expressão
das suas bases sociais e produtivas e surge para o
atendimento das demandas da sociedade.

Bases históricas da Seguridade Social


O grande marco inicial do seguro social com
caráter compulsório tem como chão histórico o período de
consolidação da Revolução Industrial alemã e o processo
de lutas operárias que se travaram naquele país, sob a
direção do Partido Social Democrata. Em 1871, Bismarck
envia ao parlamento um projeto de lei que institui o seguro-acidente
obrigatório. Porém, é nos marcos do chamado ciclo de ouro do capitalismo

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
75
avançado, calcado na teoria intervencionista de Keynes e nas propostas
formuladas por William Beveridge, de 1942, que o sistema de segurança
social passa a se estruturar como serviço público e ganha status de direito
social, sob os princípios da universalidade da unificação dos sistemas e da
uniformidade das prestações, princípios que ainda hoje são consagrados.
Durante o pós-guerra, esse sistema de seguridade se consolida como
um padrão de proteção social, tornando-se hegemônico nas décadas de 1950
e 1960, consideradas os anos dourados do capitalismo, marcadas por altas
taxas de crescimento econômico e prosperidade em âmbito mundial. Nos
anos 1970, a crise no sistema capitalista põe em questão esta proposta de
seguridade. A configuração dessa crise revela-se como fundamentalmente de
corte estrutural, localizada na incapacidade do capitalismo de manter altas
taxas de lucro e de crescimento econômico. Tem-se como conseqüência um
quadro econômico recessivo, que põe em questão as garantias sociais
preconizadas pelo estado de bem-estar social. Nos grandes centros
capitalistas a superação da crise é marcada pela busca de um novo padrão
produtivo – de caráter flexível, com forte emprego de terceirização,
utilização de alta tecnologia e intensificação do ritmo produtivo – aliado à
adoção de metodologia de gerenciamento de mão-de-obra, que procura
comprometer os trabalhadores com a lógica do capital, convocando-os como
colaboradores. Esse novo padrão produtivo tem levado a uma sensível
redução nos postos de trabalho, forte precarização, crescimento do emprego
informal e quebra das conquistas trabalhistas.

Matrizes da Previdência Social


A Lei Eloy Chaves, de 1923, é considerada o marco inicial da
Previdência Social no Brasil e efetivou-se no período histórico da Velha
República, em uma conjuntura de crise política, em que o liberalismo das
elites brasileiras estava fortemente ameaçado. Para essa crise vão concorrer
questões externas mais amplas, no final da Primeira Guerra Mundial, como a
assinatura do Tratado de Versalles, que invoca a necessidade de um corpo de
medidas sociais no enfretamento da questão social, e, ainda, a vitória da
Revolução Russa descortinando um novo projeto societário, destacando a
centralidade e o protagonismo do proletariado na sua construção.
Os governos da Velha República procuravam ignorar a questão
social, dando ao seu enfrentamento um tratamento repressivo. Entretanto, os
fatores externos e a própria condição objetiva de vida e trabalho no Brasil
põem os trabalhadores em movimento. É importante destacar que as greves
de 1917 e 1919, em São Paulo, colocam na ordem do dia a necessidade de
cumprimento do Tratado de Versalles, do qual o Brasil é signatário, e
exigem medidas de proteção social.
A Lei Eloy Chaves institui um fundo especial de aposentadoria e
pensões – Caixa de Aposentadorias e Pensões, as CAPs – para os
trabalhadores em ferrovias. Posteriomente, a Lei é ampliada pelo Decreto
5.019/26, que estende essas medidas aos marítimos e portuários. A proposta
previdenciária de Eloy Chaves não se dirige aos trabalhadores em geral, nem
se referencia a um conceito de cidadania, mas cria medidas de proteção para
um grupo específico, tomando a empresa como unidade de cobertura.
Propõe, ainda, benefícios pecuniários de aposentadorias e pensões e
prestações de serviços médicos e farmacêuticos. As CAPs eram estruturadas
Contexto Histórico das Políticas Sociais
Serviço Social
76
como organizações privadas, supervisionadas pelo governo e financiadas
pelos trabalhadores, pelo patronato e pela contribuição dos usuários da rede
ferroviária, via impostos. Essa legislação, inicialmente, restringe-se aos
ferroviários: posteriormente, estende-se a outras categorias ligadas à infra-
estrutura de serviços públicos, refletindo as características do
desenvolvimento capitalista do período, centrado em uma economia agro-
exportadora, em que esses serviços são essenciais.
As bases do moderno sistema previdenciário brasileiro, que vigorou
até 1966, tem seus pilares definidos no período Vargas, 1930-1945, e se
constroem a partir do sistema proposto em 1923. O projeto previdenciário
está articulado com um conjunto de medidas sociais e trabalhistas que
integram uma estratégia maior de política estatal da proposta nacional
desenvolvimentista de Vargas. Do ponto de vista estrutural, está em
construção um novo patamar de acumulação capitalista no país com base no
processo de substituição das importações, via instalação de um parque
industrial e ação ativa do Estado na economia e no setor social, redefinindo
novas relações entre esse e a sociedade.
A expansão previdenciária se deu, inicialmente, por meio da
ampliação do número de CAPs; posteriormente, a partir de 1933, foram
criados os Institutos de Aposentadoria e Pensão. Seu perfil organizacional
supera os limites da empresa como unidade estruturante, ao se constituir
como autarquia pública, ainda que preservando a administração colegiada.
Os IAPs possuem planos diferenciados de benefícios e serviços, sendo, os
mais comuns, aposentadoria, pensões, auxílio-funeral e auxilia-doença.
Inicialmente, foram beneficiadas as categorias ligadas à infra-estrutura de
serviços públicos, e gradativamente foram incluídos outros setores, sendo o
dos trabalhadores da indústria o último a ser instalado, em 1938.
Ainda com Getúlio, temos uma tentativa não consolidada de reforma
do sistema previdenciário, com um projeto de unificação da Previdência - a
criação do Instituto de Serviços Sociais (ISS). O debate sobre a Reforma da
Previdência Social brasileira vai desaguar na Lei Orgânica da Previdência
Social – a LOPS, de 1960. Esse debate é caudatário das posições
internacionais que se formam, de um lado, no âmbito da Organização
Internacional do Trabalho, OIT, e, de outro, das idéias de Beveridge, que
continham uma reformulação da Previdência Social inglesa, com ênfase em
uma concepção de política social ancorada no Estado, no pós-guerra.
No período Juscelino (1956-1961), a tônica será a proposta
desenvolvimentista, pela associação ao capital estrangeiro. Ao final do seu
mandato, é aprovada e promulgada a Lei Orgânica da Previdência Social,
após um longo período de debate. A incorporação dos trabalhadores rurais só
vai ocorrer em 1963, com a criação do Estatuto do Trabalhador Rural. No
período de 1960-1964, incorporam-se as reivindicações dos trabalhadores
relativas à ampliação de benefícios, como a abolição da idade mínima de 55
anos para aposentadoria e a afirmação dos 35 anos de serviço como critério
único. A crise econômica e a radicalização crescente, devido às exigências
de reforma de base no período João Goulart, vão resultar no golpe militar de
1964, que lança o Brasil em um período autoritário, com fechamento político
e forte intervenção nas organizações de trabalhadores, além de depuração
política nos IAPS.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
77
Em 1966 é criado o Instituto Nacional de Previdência Social (INSS),
com base na unificação e uniformização dos planos de benefícios e expulsão
dos trabalhadores da gestão previdenciária. Na área da assistência médica
tem-se uma orientação política de compra de serviços de rede privada, com
ênfase na prática da medicina curativa, promovendo um processo de
aumento crescente da lucratividade e da capitalização do setor saúde. O
INPS, em 1967, vai assumir o seguro acidente, apesar da resistência das
seguradoras. Na direção da universalização, registramos, em 1971, a
extensão da previdência aos trabalhadores rurais; em 1972, a incorporação
dos empregados domésticos com caráter compulsório; em 1973, a
incorporação dos autônomos. Concomitantemente, institui-se o amparo à
velhice e aos inválidos e cria-se o salário-maternidade.
O atendimento aos benefícios e serviços na área rural ficou
vinculado ao Funrural, uma autarquia administrativamente desvinculada do
INSS. A proposta do Funrural não vai contar com rede própria para ministrar
serviços e benefícios, mas se vale dos sindicatos rurais que recebem
dotações mensais. Essa proposta incide politicamente sobre esse sindicatos
rurais, inchando-os de serviços e mantendo-os sob um controle oficial direto,
além de forçar a vinculação dos trabalhadores aos sindicatos, em um cenário
em que as organizações sindicais vão cumprir papel coadjuvantes do Estado
na prestação de serviços sociais, em detrimento de sua capacidade de
organização e luta.
Em 1977, institui-se o Sistema Nacional de Previdência e
Assistência Social (SINPAS), pela Lei 6.434/77, composto pelo Instituto
Nacional de Seguro Social (INSS), Instituto Nacional de Assistência Médica
da Previdência Social (INAMPS), Instituto de Administração Financeira da
Previdência Social (IAPS), além da empresa de processamento de dados da
Previdência Social, Dataprev. Compondo também o sistema, tem-se a
Legião Brasileira de Assistência Social – LBA, a Fundação Nacional de
Bem-Estar do Menos (Funabem) e a Central de Medicamentos (CEME).
Essa reforma administrativa vai aprofundar, na área da assistência médica, o
modelo privatista, tendo o Estado como financiador via Previdência Social.
Nessa conjuntura, identifica-se o agravamento da estabilidade econômica
marcada pela falência do chamado milagre brasileiro e pelas crises
internacionais do petróleo, com conseqüente aceleração do processo
inflacionário, explosão da dívida externa, recessão, desemprego e aumento
crescente da pobreza. Diante da crise vêm a tona as debilidades da Caixa da
previdência, uma vez que suas receitas decorrem, fundamentalmente, da
folha de salário e registra-se, ainda, o crescimento dos gastos com assistência
médica, fruto do aumento da demanda deste serviço e do financiamento
público do setor privado de saúde, que se capitaliza e se expande. O
enfrentamento da crise financeira da Previdência vai se dar via aumento das
alíquotas de contribuição –de 8% a 10% para os empregados, aumento na
taxação de alguns produtos importados, além de autorização da rede bancária
para emissão de Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional (OTNs),
referenciadas ao valor do débito previdenciário.

A Previdência Social na lógica da seguridade


No final dos anos 1970, novos sujeitos sociais passam a ter
expressão no cenário político, expressando-se por intermédio das
Contexto Histórico das Políticas Sociais
Serviço Social
78
organizações sindicas e populares, pressionando o Estado por atendimento as
suas necessidades. No debate constitucional, assume importância a proposta
de Reforma Sanitária discutida e formulada no âmbito do movimento
popular de saúde e no movimento sanitarista. No debate sobre a assistência
social vão incidir as analises e propostas formuladas pela categoria dos
Assistentes Sociais nos seus órgãos de representação.

A Constituição de 1988 introduz, no seu artigo 194, o conceito de


seguridade social, compreendido como um conjunto integrado de iniciativas
dos poderes públicos e da sociedade destinados a assegurar os direitos
relativos à saúde, à assistência social e à previdência social.

Ao poder público, de acordo com a lei, cabe organizar a seguridade,


tomando como base os objetivos da universalidade de sua cobertura e do seu
atendimento, além da equidade das formas de participação no custeio, a
equivalência dos benefícios e serviços aos diferentes grupos da população, a
irredutibilidade dos valores dos benefícios; a busca de diferentes fintes de
financiamento e o caráter democrático e descentralizado da gestão
administrativa. Conclui-se que seguridade é um direito próprio dos cidadãos.
Brevemente ressaltamos, como ícone da seguridade social, a
Assistência Social, cuja regulamentação é realizada pela Lei Orgânica da
Assistência Social nº 8742, de 07/12/93, pela Política Nacional de
Assistência Social e pela Norma Operacional Básica, imprimiu-lhe
princípios como seletividade e universalidade na garantia dos benefícios e
serviços, gratuidade e não-contributividade no que tange a natureza dos
direitos; redistributividade, no que se refere aos mecanismos de
financiamento e descentralização e participação quanto a sua forma e
organização político-institucional. Entendemos que o reconhecimento da
assistência social como direito, significou o fim da travessia no deserto. Ela
apresenta-se como ocasião privilegiada para não ser mais entendida como
dever moral de ajuda, passando a ser considerada como dever legal de
garantia de direitos, especialmente pela condição de primazia da
responsabilidade estatal no seu planejamento, financiamento e execução.
Entendemos ainda que tal característica atribui somente ao Estado a
responsabilidade de assegurar as condições financeiras, institucionais e
políticas necessárias à sua materialização, pois o direito só existe no Estado.
Tal característica do dever legal diferencia-se sobremaneira das práticas
assistencialistas orientadas pelo dever moral, pois essas não incorporam a
noção de garantem o direito, não sendo, portanto, passíveis de serem
reclamadas judicialmente ou submeterem-se ao principio da obrigatoriedade.
Enfim, a assistência social como política da seguridade social será objeto de
estudo na disciplina “Seguridade Social – Assistência Social”.

1 - Qual o significado da previdência social enquanto como um dos


componentes da seguridade social?

2 - A partir da realidade do seu município, tente indicar como a atuação do


Assistente Social pode contribuir para a consolidação da assistência social
como direito do cidadão e dever do Estado?

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
79
Comentário

Inegavelmente a Previdência Social possui um papel muito


relevante dentro das políticas de seguridade social, pois materializa a
atenção ao cidadão em suas demandas. Mas, nos municípios (onde
efetivamente as demandas se tornam concretas), ainda existem dificuldades
de acesso aos serviços previdenciários.

Referências
BRASIL. Previdência Social. Disponível em <http://www.inss.gov.br>.
Acesso em 05 de outubro de 2006.
DEMO, P. Política Social e cidadania. Campinas/SP: Papirus, 2000.
LOAS: lei orgânica da assistência social: legislação suplementar / Ministério
do Desenvolvimento Social e Combate à Fome; revisão do texto, Conselho
Nacional de Assistência Social – SNAS ... [et al.]. – 5. ed. – Brasília/DF:
MDS, 2004.

Informações sobre
a próxima unidade
No unidade didática 16, concluindo os estudos desta
disciplina você vai estudar um pouco mais profundamente as
políticas sociais, privilegiando-se os fundamentos sobre os
quais elas devem pautar-se, desde o momento de sua
formulação até sua regulação.

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
80
Políticas Sociais fundamentadas na legalidade
e transparência

Meta da unidade
Visão detalhada da função dos conselhos de políticas públicas, bem
como dos princípios que os regem.

Objetivos
• compreender o caráter, as características e a importância dos
conselhos de políticas públicas para efetivação dos direitos
sociais;
• compreender o perfil do Assistente Social, no desempenho
de papel propositivo das políticas públicas.

Pré-requisitos
Compreensão dos temas anteriores, pois todos os aspectos tratados
neste Caderno de Conteúdos e Atividades permeiam o cotidiano dos
conselhos de políticas públicas.

Introdução
Esta unidade didática apresentará ferramentas úteis para a formação
do Assistente Social, principalmente, no que tange às políticas públicas, pelo
caráter inovador e participativo que desempenham os conselhos de políticas
públicas, representando a sociedade civil tanto na formulação como na
gestão das políticas públicas. Esses conselhos possuem natureza paritária,
deliberativa e são o principal caminho, mediante o qual a comunidade exerce
o controle social das decisões e ações públicas. Consideramos que o grande
salto qualitativo da assistência social diz respeito à existência desses
organismos fundamentais para a concretização dos direitos sociais, com seu
poder de fiscalização e de acompanhamento do atendimento às demandas
sociais pela sociedade civil. Também, será destacado o perfil do Assistente
Social para sua atuação no bojo das políticas sociais públicas.

Caracterização dos Conselhos de políticas públicas


Os conselhos se caracterizam como sendo novos arranjos
institucionais definidos pela legislação brasileira, com a finalidade de
garantir a participação e o controle social, preconizados na Constituição

Contexto Histórico das Políticas Sociais


Serviço Social
81
Federal vigente. São organismos que articulam a participação, a deliberação
e o controle do Estado.
Os conselhos de direitos, também denominados conselhos de
políticas públicas ou conselhos gestores de políticas setoriais, são órgãos
colegiados, permanentes e deliberativos, incumbidos de modo geral, da
formulação, supervisão e avaliação das políticas públicas, em âmbito federal,
estadual e municipal. O caráter deliberativo está assegurado no princípio da
participação popular da gestão pública, consagrado na Constituição Federal
de 1988, sendo instituições cujo sentido é a partilha do poder decisório e a
garantia de controle social das ações e políticas públicas.
Conselhos são instâncias permanentes, sistemáticas, institucionais,
formais e criadas por lei com competências claras. Além disso, são órgãos
colegiados, paritários e deliberativos, com autonomia decisória.
Os conselhos de direitos, independentemente do nível de atuação –
nacional, estadual ou municipal, são espaços nos quais o governo e a
sociedade podem discutir, formular e decidir, de forma compartilhada e co-
responsável, as diretrizes para as políticas públicas de promoção e defesa
dos direitos. Conselhos não são, portanto, executores de políticas, mas
formuladores, promotores de políticas, defensores de direitos,
controladores das ações públicas governamentais e não-governamentais,
normatizadores de parâmetros e definidores de diretrizes das políticas na
perspectiva da garantia dos direitos humanos, sociais e políticos.

Os principais conselhos nacionais existentes, de


acordo com a legislação brasileira são:
1) Conselho Nacional dos Direitos do Idoso –
CNDI.
2) Conselho Nacional dos Direitos da Mulher –
CNDM.
3) Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa
Portadora de Deficiência – CONADE.
4) Conselho Nacional de Promoção da Igualdade
Racial – CNPIR.
5) Conselho Nacional de Combate à
Discriminação – CNCD.
6) Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do
Adolescente – CONANDA.
7) Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa
Humana – CDDPH.

Princípios norteadores dos Conselhos de Políticas


Públicas
Podem ser considerados princípios norteadores dos Conselhos de
Políticas Públicas:
1) Descentralização (busca-se quebrar a cadeia de classes
dominantes na esfera pública, chamando a sociedade à
participação de maneira a reduzir a centralização);
2) Participação (mediante a eleição, com votação livre,
propicia-se ambiente participativo a todos os cidadãos que
desejam cooperar nos Conselhos de Políticas Públicas);
Contexto Histórico das Políticas Sociais
Serviço Social
82
3) Paridade e representatividade (para não existir exclusão
de participação nas decisões e posturas dos Conselhos, a
quantidade de pessoas do governo e da sociedade civil devem
ser equilibradas);
4) Comando único (o comando único dá organização e
integração entre as instituições);
5) Autonomia (não existência de subordinação ao Estado, a
ONGs ou ao mercado, para que nada interfira na liberdade das
decisões);
6) Legalidade (na gestão pública, não existe vontade
particular, só é permitido fazer o que a lei determina);
7) Impessoalidade (determina a isenção, a imparcialidade, a
neutralidade e a objetividade das ações);
8) Moralidade (está intimamente ligada ao conceito do bom
administrador que faz o que é certo e justo);
9) Publicidade (divulgação dos atos e resultados de ações
desenvolvidas).

Participação do Assistente Social nas políticas públicas


Um grande desafio que o Assistente Social vive no presente é a
necessidade de decifrar a realidade e construir propostas de trabalho
criativas, capazes de preservar e efetivar direitos, a partir de demandas
emergentes no cotidiano. Ou seja, ou seja, cabe também ao Assistente Social
o planejamento de Políticas Sociais Públicas. O perfil predominante do
Assistente Social historicamente é de um profissional que apenas
implementa políticas sociais, ou seja, tem atuado como um executor terminal
de políticas sociais que atua na relação direita com a população usuária.
Hoje o mercado de trabalho exige um trabalhador qualificado na
esfera da execução, mas também com competência e habilidades na
formulação e gestão de políticas sociais, públicas e empresariais. Um
profissional propositivo com sólida formação ética, capaz de contribuir no
esclarecimento dos direitos sociais.
Destacamos a seguir algumas elementos indispensáveis para a
atuação do Assistente Social nas políticas públicas:

Estudar a realidade
A pesquisa e o conhecimento da realidade são sem dúvida elementos
que acompanham indissociavelmente o exercício profissional do Assistente
Social, na organização e no desenvolvimento de suas intervenções.

Formular políticas sociais: processo de negociação e


de participação popular
A eficiência e a competitividade do profissional nesse campo se dá
pelo desempenho nos processos de formulação e implementação de políticas
sociais, exigindo-se o domínio de múltiplos saberes, que vão desde as
legislações sociais à capacidade de análise das relações de poder e da
conjuntura, como também à administração e à elaboração de diagnósticos
sociais e de indicadores que possam subsidiar a melhor definição das ações.
Tudo isso acompanhado dos cuidados pelo monitoramento, pela avaliação e
pela prestação de contas.
Contexto Histórico das Políticas Sociais
Serviço Social
83
O traço mais específico e peculiar para o desenvolvimento das
políticas sociais é que, em sua fase de elaboração, precisa contar com o
apoio, a colaboração e a aceitação dos usuários do serviço. A prestação de
serviços sociais é contínua, o que define um relação necessária entre a
burocracia e seus usuários.

Gestor das políticas sociais


O tema gestão é revestido de detalhadas recomendações técnicas, em
virtude de advir da área da administração: a conceituação de noções de
eficiência, eficácia e efetividade, o detalhamento das diferentes funções
gerenciais – planejamento, organização, direção e controle; a caracterização
dos diferentes níveis organizacionais- orientações, análise e exercícios que
podem ser úteis e facilitadores da organização do projeto de intervenção do
Assistente Social, que desempenha a função de gestor na área social.
A atuação do gestor, ao ser remetida ao Serviço Social, vai implicar
a realização de um esforço adicional em termos de efetivação de sistemáticas
de planejamento. Sendo assim, deve-se sugerir uma prática profissional,
vigorosamente comprometida com a gestão das políticas sociais, de forma
que a gestão adquira consistência política concreta, embasada em uma
competente e transparente pauta de compromisso que perpasse eficazmente
pelos mecanismos de controle social.

1 - A atividade é prática: conheça um Conselho de seu município, converse


com um conselheiro sobre o desempenho de suas funções e verifique o
empoderamento da sociedade civil, por intermédio desses instrumentos de
fiscalização e controle.

2 - Escreva sobre os elementos indispensáveis para a atuação do Assistente


Social nas Políticas Públicas.

Comentário

Os conselhos de políticas públicas são órgãos colegiados,


permanentes e deliberativos, incumbidos de modo geral, da formulação,
supervisão e avaliação das políticas públicas, em âmbito federal, estadual e
municipal.

Referências
BRASIL. Ministério da Justiça. Disponível em http://www.mj.gov.br, acesso
em 05 de outubro de 2006.
DEMO, P. Política Social e cidadania. Campinas/SP: Papirus, 2000.
LOAS: lei orgânica da assistência social: legislação suplementar / Ministério
do Desenvolvimento Social e Combate à Fome; revisão do texto, Conselho
Nacional de Assistência Social – SNAS ... [et al.]. – 5. ed. – Brasília/DF:
MDS, 2004.

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