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OLFATO E VISÃO

Neuroanatomia
VIAS OLFATÓRIA E ÓPTICA (MOTRICIDADE OCULAR)
Neste ebook serão estudadas, detalhadamente, a anatomia, função e principais
disfunções das estruturas do sistema nervoso central e periférico relacionadas
à:
• Via olfatória
• Via óptica
• Motricidade ocular

As estruturas do sistema nervoso periférico responsáveis por essas ações são,


respectivamente, os nervos cranianos: olfatório (NC I), óptico (NC II),
oculomotor (NC III), troclear (NC IV) e abducente (NC VI).

VISTA INFERIOR E ANTERIOR DO ENCÉFALO

https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Brain_human_
normal_inferior_view_with_labels_pt.svg
REVISÃO: PADRÃO DE PROCESSAMENTOS
SENSITIVO E MOTOR
As vias sensitivas apresentam um padrão sequencial para processamento da
informação:

• Receptor: responsável pela percepção da sensibilidade do meio


ambiente e a transformação do estímulo em impulso nervoso. Pode ser
uma célula epitelial especializada ou um neurônio especializado.
• Trajeto periférico: realizado por neurônios sensitivos do sistema
nervoso periférico (SNP) que transmitem a informação sensitiva em
direção ao sistema nervoso central (SNC).
• Trajeto central: realizado por neurônios do SNC, que recebem e
transmitem a informação sensitiva ao córtex cerebral, onde essas
informações tornam-se conscientes para o indivíduo.

Com exceção da sensibilidade olfatória, todas as sensibilidades (gerais ou


especiais) contam com um neurônio localizado no tálamo, para sua
transmissão. Por isso, o tálamo é considerado a porta de entrada central no
processamento das informações sensitivas.

• Área de projeção cortical: região do telencéfalop que realiza o


processamento consciente da sensibilidade.
• O processamento cortical é realizado em níveis distintos:
• Área primária: a primeira região do córtex que recebe a informação
sensitiva. Chamada de área de projeção.
• Área secundária: é um córtex de associação, que recebe a informação
da área cortical primária, e processa complexamente uma derterminada
sensibilidade. É chamada de área de processamento unimodal.

Para ilustrar, enquanto na área visual primária há apenas a percepção do


ambiente em esboço da imagem, as áreas secundárias da visão, são
responsáveis pela percepção do movimento e do reconhecimento dos objetos
no campo visual,
• Área terciária: é um córtex de associação extremamente complexo, que
processa mais de uma sensibilidade ao mesmo tempo (área de
associação supramodal), garantindo percepção ampla do ambiente. O
córtex terciário também é responsável pelo pensamento inteligente,
que nos permite criar juízo de valor às situações, armazenar vivências
por meio de memórias, entre outros comportamentos complexos. A
área terciária corresponde à área pré-frontal e área parietal posterior, e
ao córtex da ínsula além das estruturas do sistema límbico.

Já a motricidade ocorre em caminho inverso à sensibilidade, pois primeiro a


ação é pensada no cérebro, para então ser transmitida até as células efetoras
(células musculares).

• Córtex terciário: cria a intenção de movimento, é o grupo de neurônios


ativado quando pensamos no movimento.
• Área motora secundária: programa o plano de execução motora do
movimento, influenciada por circuitos inconscientes que envolvem
núcleos da base e cerebelo, essenciais para o controle e coordenação
do movimento.
• Área motora primária: última área cortical a ser ativada, onde estão os
neurônios motores primários. Também chamada de área de projeção,
de onde emergem as fibras dos tratos descendentes.

Os neurônios motores primários compõem os tratos descendentes (motores),


como o trato corticoespinal e corticonuclear, e alcançam os neurônios motores
periféricos, que possuem o corpo celular no interior do sistema nervoso central,
mas que seguem para o sistema nervoso periférico. Por meio dos nervos, estes
neurônios alcançam o território muscular de inervação e geram resposta
muscular para realização do movimento.
VIA OLFATÓRIA
Via sensitiva que permite a percepção dos odores do meio ambiente.

Imagem de Patrick J. Lynch, 2006,


acesso via Wikimedia Commons.

1. Mucosa olfatória | 2. Bulbo olfatório | 3. Trato olfatório

Receptor e 1º neurônio: os neurônios bipolares da mucosa olfatória,


localizados nas porções superior e posterior da mucosa nasal e do septo nasal,
são receptores e, também, os primeiros neurônios da via olfatória. As fibras
nervosas atravessam a lâmina cribriforme do osso etmoide e transmitem a
informação para o segundo neurônio da via olfatória.

2º neurônio: são os neurônios mitrais, localizados no bulbo olfatório, logo


abaixo do córtex cerebral orbitofrontal. Seus axônios seguem para o encéfalo
pelo trato olfatório. Bulbo e trato olfatórios ficam no sulco orbital, entre os giros
orbitais e o giro reto.
Imagem de Servier Medical Art by Servier,
2020, acesso via Wikimedia Commons.

1. Células olfatórias | 2. Células mitrais


3. Bulbo olfatório | 4. Trato olfatório

Esquema, vista em perfil, das fibras do nervo olfatório comunicando-se com as


células mitrais.
VISTA INFERIOR DO ENCÉFALO

Imagem adaptada de John A, Beal, PhD,


2005. Acesso via Wikimedia Commons.

1. Sulco olfatório | 2. Giros orbitais | 3. Giro reto | 4. Estria olfatória lateral


5. Substância perfurada anterior | 6. Estria olfatória medial | 7. Trato olfatório
8. Bulbo olfatório | 9. Sulcos orbitais

Contínuas ao trato olfatório estão as estrias olfatórias medial e lateral. Por meio
da estria olfatória lateral os estímulos olfatórios alcançam o córtex cerebral,
onde a informação será processada, tornando-se consciente. Não há neurônio
talâmico (relé talâmico) como meio de acesso ao córtex olfatório - uma exceção
desta via em relação às demais vias das sensibilidades. Já a estria olfatória
medial conta com axônios de neurônios cerebrais que fazem sinapse no bulbo
olfatório.

Área primária do olfato: córtex piriforme, localizado na estrutura macroscópica


do unco, no lobo temporal em posição inferior medial. Trata-se de um córtex
filogeneticamente antigo e também estruturalmente simples, contendo apenas
três camadas neuronais (alocórtex).
Área secundária do olfato: localizado no córtex entorrinal rostral (porção
anterior do giro parahipocampal), importante na associação dos odores a
memórias, sentimentos e comportamentos.

As fibras olfatórias também realizam conexões com o sistema límbico


(responsável pela sensação de prazer e formação de memórias), o que
explica nossa facilidade de evocar memórias e sentimentos, ao sentirmos
certos odores.

VISTA SAGITAL DO ENCÉFALO

Imagem adaptada de John A, Beal, PhD,


2005. Acesso via Wikimedia Commons.

1. Unco | 2. Giro parahipocampal | 3. Giro occipitotemporal lateral


4. Giro denteado
A partir do unco, a informação sensitiva pode seguir via tálamo para o córtex
orbitofrontal e para o giro reto que parecem ser ativados para discriminação
olfatória.

PECULIARIDADES DA VIA OLFATÓRIA

Via curta, com apenas dois neurônios periféricos.


Não possui relé talâmico.
Via homolateral – a informação de da mucosa nasal de um lado é
processada pelo úncus do mesmo lado (direito ou esquerdo).
Processamento em alocórtex

CORRELAÇÕES ANATOMOCLÍNICASC
• Doenças que cursem com processo inflamatório na mucosa nasal
Córtex
podem cursar com diminuição do olfato (hiposmia) ou até completa
ausência de olfação (anosmia). Infecções pelo vírus H1N1 e COVID-19,
por exemplo, podem cursar com estes sintomas. Fraturas de base do
crânio com acometimento da lâmina cribriforme do osso etmoide
também podem cursar com perda definitiva do olfato.

• A hérnia do unco, que ocorre em situações de hipertensão


intracraniana, é uma condição grave devido ao potencial risco de
compressão do mesencéfalo. O paciente pode apresentar rebaixamento
de consciência, como no estado de coma, devido às lesões
mesencefálicas.

• Pacientes com epilepsias focais de unco costumam relatar alterações


no olfato, sentindo cheiros, em geral, desagradáveis e sem explicação!
VIA VISUAL (óptica)
A visão é o sentido especial que garante ao indivíduo a percepção do meio a
partir de imagens, de modo qualitativo, permitindo a identificação e
caracterização de elementos/objetos do meio e também garante a percepção
de movimento de desses elementos. É um sentido complexo, processado em
uma extensa região encefálica, e extremamente adaptativo, uma vez que as
informações captadas do meio nos permitem reagir rápida e complexamente às
situações.

Por meio da via visual há estímulo para:

• Consciência da sensibilidade visual.


• Arcos reflexos de proteção corporal.
• Arcos reflexos de acuidade visual.

Na retina estão localizados os primeiros neurônios da via óptica, organizados


de modo laminar, em dez camadas. A retina é originada de uma vesícula
diencefálica que se destaca durante a embriogênese, a vesícula óptica, e migra
para a região posterior do bulbo do olho. Os neurônios da retina não apenas
transmitem o estímulo nervoso, mas são adaptados para captação dos raios
luminosos, transformação da informação luminosa em impulso elétrico e
transmissão do estímulo nervoso.

Receptor e 1º neurônio: fotorreceptores da retina.


ANATOMIA DA RETINA - OFTALMOSCOPIA

Imagem de Rhcastilhos, 2008.


Acesso via Wikimedia Commons.

1. Câmara posterior | 2. Câmara anterior | 3. Córnea | 4. Pupila | 5. Úvea


6. Íris | 7. Músculo ciliar | 8. Corióide | 9. Esclera | 10. Fibras zonulares
11. Lente 12. Humor vítreo | 13. Canal hialóideo | 14. Retina | 15. Mácula lútea
16. Fóvea | 17. Disco óptico | 18. Nervo óptico
19. Vasos sanguíneos da retina

Estruturas retinianas essenciais para funcionamento da via óptica podem ser


facilmente visualizadas nas consultas médicas, durante o exame físico, com
auxílio do oftalmoscópio. Este momento do exame físico é chamado de
oftalmoscopia, fundoscopia ou exame de fundo de olho.
EXAME DE FUNDO DE OLHO

Imagem de Häggström, Mikael (2014).


Acesso via Wikimedia Commons.

1. Nervo óptico | Vasos sanguíneos da retina | 3. Mácula lútea

Fundoscopia do olho esquerdo sem alterações ou achados patológicos.

Na porção central da retina há uma área amarelada, a mácula lútea, que fica
em posição alinhada à pupila, onde há processamento da informação com
altíssima acuidade visual, ou seja, com bastante nitidez. Observe que na sua
visão neste exato momento, há um campo central, com alta nitidez, que permite
que você leia cada palavra, e na periferia do campo visual o ambiente pode ser
visualizado, porém, embaçado/desfocado.

Quando olhamos para um objeto posicionamos os olhos de modo que os raios


luminosos refletidos do objeto incidam na região da mácula lútea da retina.
Observe também que o posicionamento do olho é inicialmente intencional,
com movimentação voluntária pela ação da musculatura extrínseca do bulbo do
olho, a partir da decisão. No entanto, quando há movimentação da cabeça, há
um movimento reflexo dos olhos, que visa manter o foco em determinado
objeto, sem que seja preciso pensar na ação. Esse controle é reflexo e, portanto,
independe da nossa vontade. Você pode observar esse movimento reflexo ao
olhar para um ponto fixo em frente a um espelho e movimentar a cabeça. Seus
olhos movimentam-se involuntariamente, mantendo o foco no objeto.

A acomodação da pupila por meio de dilatação (midríase) ou constrição


(miose) é outro mecanismo essencial para a projeção das imagens diretamente
na retina.

Também há a papila óptica, região da papila que não apresenta o neuroepitélio,


onde estão localizadas as fibras do nervo óptico (NC II) e, também, por onde
entram os vasos sanguíneos responsáveis pela irrigação do bulbo do olho.

A formação extremamente complexa da retina em 10 camadas pode ser


simplificada, segundo as características morfofuncionais dos neurônios locais:

• Camada dos neurônios fotossensíveis: localizados na região mais


externa da retina.
• Camada das células bipolares: localizados em posição intermediária na
retina.
• Camada dos neurônios ganglionares: na porção mais superficial
da retina.
ESTRUTURAS DO OLHO

Imagem de OpenStax Copyright Holders,


2016. Acesso via Wikimedia Commons.

1. Íris | 2. Pupila | 3. Córnea | 4. Humor aquoso | 5. Retina | 6. Lente


7. Humor vítreo | 8. Nervo óptico | 9. Vasos sanguíneos da retina | 10. Fóvea
11. Raio luminoso | 12. Bastonetes (1º neurônio) | 13. Cones (1º neurônio)
14. Celulas horizontais | 15. Células bipolares (2º neurônio)
16. Células amácrinas | 17. Células ganglionares (3º neurônio
18. Nervo óptico e estrato limitante externo
Observação: as células horizontais recebem informação aferente das células
fotorreceptoras e modulam o funcionamento das mesmas. Já as células
amácrinas recebem aferência das células bipolares e modulam as células
ganglionares, atuando como interneurônios na retina.

Os raios luminosos atravessam as estruturas do bulbo do olho e são detectados


pela camada mais externa da retina, pelos neurônios fotorreceptores, divididos
em cones e bastonetes. Eles são responsáveis pela transformação do estímulo
luminoso em impulso elétrico, fenômeno da fototransdução. Os cones são
especializados para a percepção de cores e imagens de alta luminosidade
enquanto os bastonetes são especializados na percepção da forma e de
imagens com baixa luminosidade local.

Nas porções periféricas da retina, há predominância de bastonetes. A


proporção entre cones e bastonete varia ao longo da retina, com aumento
gradual de cones em direção à porção central, ate que na região da mácula
lútea há número parecido de cones e bastonetes. No centro da mácula lútea, na
fóvea central, há exclusivamente cones.

Os fotorreceptores fazem sinapse com o segundo grupo de neurônios da via


óptica, da camada imediatamente acima do fotorreceptores, as células
bipolares. As células bipolares, por sua vez, fazem sinapse com o terceiro
grupo de neurônios da via, os neurônios ganglionares. Os axônios das células
ganglionares constituem o nervo óptico, nervo craniano responsável pelo
trajeto periférico da via visual.

As células fotorreceptoras da periferia relacionam-se com uma única célula


bipolar e várias células bipolares periféricas realizam sinapse com apenas uma
célula ganglionar. Na região da mácula lútea, cada fotorreceptor relaciona-se
com uma única célula bipolar, que, por sua vez, realiza sinapse com apenas
uma célula ganglionar. Dessa forma, grande parte do nervo óptico é composta
por axônios oriundos de células ganglionares da mácula lútea, o que garante a
alta nitidez da informação visual processada nessa região.
O nervo óptico deixa a retina pela papila óptica (ponto cego da retina) onde,
também, emergem os vasos sanguíneos que irrigam a retina. A observação do
aspecto desses vasos, posicionados no interior do nervo óptico, por meio do
exame oftalmoscópico, é essencial para rastreio de doenças locais ou
complicações de doenças sistêmicas que cursam com microvasculopatias,
como ocorre em casos avançados e com controle inadequado de diabetes
melittus II, por exemplo.

O nervo óptico segue para posição posterior (dorsal) em direção ao tálamo. Na


altura da hipófise há um cruzamento oblíquo das fibras do nervo óptico,
formando o quiasma óptico, onde há cruzamento parcial das fibras nervosas
entre os nervos ópticos do lado direito e esquerdo. A porção do nervo óptico
distal ao quiasma óptico é chamada trato óptico.

As fibras do trato óptico realizam sinapse com os neurônios do corpo


geniculado lateral, no tálamo.

Imagem de OpenStax, 2016, acesso via Wikimedia Commons.

Quiasma óptico | 2. Corpo geniculado lateral (tálamo) | 3. Bulbo do olho


4. Nervo óptico | 5. Trato óptico | 6. Mesencéfalo | 7. Lobos occipitais
Observe abaixo o corpo geniculado lateral, no tálamo, que recebe as fibras do
trato óptico, visualizado na vista posterior do diencéfalo.

As fibras do trato óptico que alcançam o corpo geniculado lateral são


chamadas fibras retinogeniculares, responsáveis pelo processamento da visão.

Os reflexos visuomotores são realizados por outras fibras nervosas que


compõem o nervo óptico:

• Fibras retinotetais: seguem pelo trato óptico e alcançam o colículo


superior por meio do braço do colículo superior. Por meio dessas
conexões, há o reflexo de piscar e o reflexo de movimentação do corpo,
quando algum objeto aproxima-se em alta velocidade, que promove
autoproteção do indivíduo. Essas fibras garantem, também, o reflexo de
movimentação dos olhos para manutenção do foco, durante a
movimentação da cabeça.
• Fibras retino-pré-tetais: levam a informação retiniana à área pré-tetal
do mesencéfalo, na porção anterior do colículo superior. São
responsáveis pelos reflexos pupilares em resposta ao estímulo
luminoso, com contração da pupila (miose) da pupila homolateral,
chamado de reflexo fotomotor direto, e na pupila contralateral, o
reflexo consensual.

CAMPOS VISUAIS
Campo visual consiste em toda a área visual observada por um dos olhos. Pode
ser dividido em campo visual temporal, a metade do campo próxima ao osso
temporal (lateral) e campo visual nasal (medial), que corresponde à metade do
campo em posição medial, próxima ao nariz. O campo visual também pode ser
divido superior ou inferior.

OLHO ESQUERDO OLHO DIREITO Campo visual temporal

CVT CVN CVN CVT

CVT: Campo visual temporal


CVN: Campo visual nasal
Imagem de Jim87, 2011. Acesso via Wikimedia Commons

1. Bulbo do olho | 2. Nervo óptico | 3. Encéfalo


4. Trato óptico | 5. Corpo geniculado lateral | 6. Radiação óptica
7. Lábios do sulco calcarino - córtex primário da visão
8. Raio luminoso do campo visual temporal
9. Raio luminoso do campo visual nasal | 10. Campo visual nasal

Pelos estudos da física, sabemos que o raio luminoso sempre é propagado na


forma de vetor, direcionando-se em linha reta. Dessa forma, o raio luminoso
refletido do campo visual temporal atravessa a pupila e segue em direção à
retina nasal. O mesmo ocorre para a retina temporal, que recebe a informação
visual proveniente do campo visual nasal.

Na altura do quiasma óptico, as fibras nervosas oriundas da retina nasal


cruzam e passam para o trato óptico do lado oposto. Em termos funcionais,
esse cruzamento implica no fato de que o cérebro processa as imagens dos
campos visuais contralaterais ao córtex visual, de ambos os olhos. Ou seja,
o cérebro direito processa os campos visuais esquerdos de ambos os
olhos (campo visual temporal direito e campo visual nasal direito). Vemos
esse padrão de processamento cerebral contralateral para a maioria das
sensibilidades corporais (com exceção do olfato, como estudamos
anteriormente).

Essa informação pode ser confusa. Por isso, consolide a relação entre a
informação do campo visual processada por cada porção da retina.

Dando continuidade à via visual, fibras nervosas provenientes dos corpos


geniculados laterais (geniculocalcarinas) seguem em direção ao lobo occipital
formando, ao longo desse trajeto, a radiação óptica (de Gratiolet) e realizam
sinapse nos lábios do sulco calcarino, área primária da visão.

A projeção dessas fibras na área primária da visão apresenta padrão de


correspondência entre a informação da retina e do córtex, o que é chamado de
retinotopia. Logo, a informação da parte inferior da retina é projetada nos
lábios inferiores do sulco calcarino. Para fixar, observe que a lesão dessa região
cursa com o sintoma de perda do campo visual superior do paciente, uma vez
que ela recebe os raios luminosos do campo visual superior.

AS ÁREAS SECUNDÁRIAS DA VIA VISUAL


SÃO DIVIDIDAS EM DUAS VIAS
Via ventral: que compreende partes do lobo occipital. Em destaque, porções do
giro occipitotemporal medial, giro occipitotemporal lateral, giro temporal médio
e giro temporal inferior. Relacionada com reconhecimento de faces e objetos.

Via dorsal: que compreende porções do lobo parietal. Em destaque, porções do


cuneo e do pré-cuneo. Relacionada com o reconhecimento do movimento do
objeto e de sua localização geoespacial.

As lesões de áreas sensitivas secundárias são conhecidas como agnosias. São


condições em que o paciente possui a sensibilidade, mas não conseguem
interpretá-la adequadamente, o que pode levar à limitações nas atividades
cotidianas. Com relação às lesões das áreas interpretativas da visão, o paciente
pode apresentar:
Prosopagnosia: dificuldade em reconhecer faces e objetos. Fato curioso é que
áreas límbicas intactas do paciente continuam processando a percepção
emocional proveniente da informação visual. Assim, o paciente não consegue
reconhecer faces dos familiares, mas sabe que eles estão com medo ou
tristonhos. Ocorre por lesão da via ventral da visão.

Acinetopsia: dificuldade em processar a informação de movimento da visão. Os


pacientes veem o mundo na forma de “flashes”, em fotografias seriadas, e
apresentam dificuldade para atravessar a rua ou frequentarem locais
movimentados. Ocorre por lesão da via dorsal da visão.

GIROS DA FACE DORSAL LATERAL DO CÉREBRO


PEÇA ANATÔMICA

Imagem de John A, Beal, PhD, 2005. Acesso via Wikimedia Commons.

1. Giro frontal superior | 2. Giro frontal médio | 3. Giro frontal inferior


4. Giro pré-central | 5. Giro temporal superior | 6. Giro temporal médio
7. Giro temporal inferior | 8. Giro pós-central | 9. Lóbulo parietal superior
10. Giro angular | 11. Giro supramarginal | 12. Giros do lobo occipital
VISTA DE CORTE MEDIANO DO ENCÉFALO
PEÇA ANATÔMICA

Imagem adaptada de John A, Beal, PhD,


2005. Acesso via Wikimedia Commons.

1. Giro paraterminal | 2. Área subcalosa


3. Corpo caloso (A: rostro; B: joelho; C: tronco; D: esplênio)
4. Giro frontal superior | 5. Giro do cíngulo 6. Lóbulo paracentral | 7. Pré-cuneo
8. Cuneo | 9. Giro occiptotemporal medial
10. Ramo marginal do giro do cíngulo | 11. Sulco central | 12. Sulco calcarino
13. Fórnice | 14. Comissura anterior | 15. Comissura posterior

As áreas corticais terciárias são responsáveis pela percepção geoespacial,


formam juízos de valores para as situações observadas, comparando a
informação visual às memorias e aos conceitos de mundo que adquirimos ao
longo da vida.
LESÕES NO CAMPO VISUAL
São classificadas segundo a sintomatologia no campo visual do paciente.
• Escotomas: falhas pontuais no campo visual.
• Quadrantopsia: acometimento de um quadrante do campo visual, por
exemplo, campo visual superior temporal.
• Hemianopsia: acometimento de metade do campo visual, por exemplo,
campo visual temporal. Hemianopsias que acometem o mesmo lado
(direito ou esquerdo) do campo visual em ambos os olhos são
chamadas de homônimas enquanto à perda da visão bilateral em
campos visuais de lados distintos é chamada de hemianopsia
heterônima, por exemplo, por acometimento dos campos visuais
nasais.

Acompanhe o raciocínio das alterações do campo visual, que serão citadas


abaixo por meio da próxima figura. Observe a relação entre fibras nervosas e os
campos visuais (há correspondências das cores no esquema).

2
3

T- Retina temporal; N – Retina nasal.


Degeneração da mácula lútea: cursa com perda do campo visual central do
olho acometido.

Imagem de National Eye Institute, National Institutes


of Health, 2010. Acesso via Wikimedia Commons.

1. Lesão total do nervo óptico: cegueira do olho acometido.

Perda parcial das fibras do nervo óptico: cursa com hemianopsias nasal (se
perda das fibras da retina temporal) ou temporal (quando há lesão das fibras da
retina nasal).

Hemianopsia nasal do olho direito. Imagem de DanielV27, 2011.


2. Lesão à nível do quiasma ótico: hemianopsia heterônima bitemporal. Uma
causa importante desta condição são os tumores hipofisários, que podem
comprimir o quiasma óptico, devido à proximidade anatômica das duas
estruturas.

PARIS VISTA POR UM PACIENTE


COM HEMIANOPSIA HOMÔNIMA BITEMPORAL

Imagem de Nunh-huh, 2004. Acesso via Wikimedia Commons.

3. Lesões completas do trato óptico ou da radiação óptica: cursam com


hemianopsia homônima do lado contralateral à lesão.

PARIS VISTA POR UM PACIENTE COM LESÃO


COMPLETA DO TRATO ÓPTICO ESQUERDO

Imagem de Nunh-huh, 2004. Acesso via Wikimedia Commons.


(Lembre-se que os campos visuais esquerdos são projetados para o lado direito
do cérebro).

4. Tumores cerebrais podem lesionar a radiação óptica ou regiões do córtex


visual primário de modo imprevisível, podendo cursar com estocomas,
quadrantopsias, hemianopisias e até perda total da visão. Um possível padrão é
a hemianopsia heterônima nasal.

PARIS VISTA POR UM PACIENTE


COM HEMIANOPSIA HETERÔNIMA NASAL

Imagem de Nunh-huh, 2004. Acesso via Wikimedia Commons.

Lesões de estruturas anteriores ao trato óptico cursam com perda dos reflexos
pupilares, pelo acometimento das fibras retino-pré-tetais. Essa característica
permite diferenciar lesões da radiação óptica, em que há manutenção dos
reflexos, pois as fibras que alcançam o tronco encefálico permanecem intactas!
MOTRICIDADE OCULAR
O movimento ocular, assim como os demais movimentos corporais voluntários,
decorre de uma sequência cronológica de ativações do sistema nervoso:

1. Intenção do movimento: criada pelas áreas corticais de associação


terciária, que recebem continuamente as informações sensoriais e as
integram no planejamento de estratégias comportamentais motoras e
não motoras.
2. Planejamento do movimento: função da área motora suplementar
(quando a intenção de movimento é decorrente de uma decisão
exclusiva do indivíduo) ou da área pré-motora (quando há um comando
externo ex. um familiar pede para você verificar se a janela está
fechada). As áreas secundárias recebem aferências do córtex cerebral,
cerebelo e núcleos da base, continuamente, visando à coordenação do
movimento.
3. Ativação do neurônio motor superior: localizado no giro pré-central.

Os neurônios motores superiores responsáveis pelos movimentos oculares


descendem compondo o trato corticonuclear, responsável pela motricidade da
cabeça, e seguem em direção aos núcleos motores dos nervos cranianos III, IV,
VI localizados no tronco encefálico (núcleos do III e IV no mesencéfalo e núcleo
VI na ponte).

As fibras do trato corticonuclear atingem os núcleos motores dos lados direito e


esquerdo. O efeito disso é a motricidade agrupada dos olhos, o que explica o
porquê (em geral) não é possível movimentar apenas um dos olhos.

Nos núcleos do tronco encefálico estão os neurônios motores inferiores, que


alcançam o sistema periférico, por meio dos nervos cranianos III, IV e VI. Por
meio da sinapse na placa motora há contração muscular coordenada dos
músculos extrínsecos do bulbo do olho, promovendo sua movimentação.
MUSCULATURA EXTRÍNSECA DO BULBO DO OLHO
VISTA EM PERFIL

m. oblíquo superior

m. reto medial

m. reto superior

m. reto lateral

m. oblíquo inferior
m. reto inferior

Patrick J. Lynch, 2009. Acesso via Wikimedia Commons.

• O nervo oculomotor inerva os músculos: reto superior, reto inferior,


reto medial, e oblíquo inferior. É o nervo responsável pela maioria dos
movimentos oculares, em especial, a adução do olho (olhar para
dentro).
• O nervo troclear inerva o músculo obliquo superior, responsável pelo
movimento de “olhar para a ponta do nariz”.
• O nervo abducente é inervado o músculo reto lateral, responsável pelo
movimento de abdução do olho (olhar para fora).
CORRELAÇÕES ANATOMOCLÍNICAS
Enquanto as lesões no neurônio motor superior cursam com paralisias
espásticas, as lesões do neurônio motor inferior cursam com paralisias flácidas,
nas quais é perdido o tônus muscular. Lesões dos nervos cursam com paralisias
flácidas nos músculos desenervados.

Observar a posição dos olhos e seus movimentos são etapas essenciais na


consulta neurológica. Deve ser observada a posição neutra (olhando para
frente) e também olhando para cima, baixo, direita esquerda, ponta no nariz e
nos cantos superiores e inferiores dos olhos, para checar a integridade destes
nervos cranianos.

Lesão do nervo oculomotor: devido à paralisia flácida do músculo reto medial


há um desvio do olho acometido para fora, quando o paciente olha para frente.
Isso ocorre devido ao tônus mantido pelo nervo abducente, condição é
chamada de estrabismo divergente. Além disso, o paciente apresenta limitação
para os movimentos oculares, com exceção para o olhar para a ponta do nariz.

ESTRABISMO DIVERGENTE DO OLHO ESQUERDO

Imagem de KLN55,2019. Acesso via Wikimedia Commons.


O nervo oculomotor também contém fibras parassimpáticas, responsáveis pela
contração da pupila (miose). A lesão do nervo oculomotor leva a midríase pela
ação solitária do tônus simpático. Além de ptose palpebral, e perda dos reflexos
pupilares no olho acometido, uma vez que a eferência do reflexo foi lesionada.

Um fato curioso é que o estímulo luminoso no olho acometido leva ao reflexo


consensual (miose do olho contralateral). A integridade do nervo óptico garante
a aferência do reflexo. A observação clínica deste fato ajuda a mapear o local
da lesão no sistema nervoso.

Lesão do nervo troclear cursa com rotação para fora da parte superior do
bulbo do olho. O paciente, em geral, inclina a cabeça em direção ao ombro
contralateral e tem dificuldade para subir escadas, ler livros, ou ações que
dependem do olhar para a ponta do nariz.

Lesão do nervo abducente: o paciente apresenta estrabismo convergente, pela


ação mantida do oculomotor. No exame de movimentação ocular há limitação
em olhar para fora (abduzir o olho) e preservação dos demais movimentos
oculares.

A lesão de qualquer um dos nervos que movimentam os olhos também cursa


com diplopia, queixa de visão dupla. Isso ocorre devido à limitação no ajuste
reflexo e voluntário da posição dos olhos, afetando a projeção da imagem na
retina.

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