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CFIT – Controlled Flight Into Terrain

(Colisão com o solo em voo controlado)

Apesar de todos os esforços, o CFIT continua a se apresentar como uma das principais
causas de acidentes aeronáuticos

1. Definição

Pode-se definir Controlled Flight Into Terrain (CFIT) como colisão ou quase
colisão, durante o voo, com o terreno, água ou obstáculo em voo controlado.

Algumas observações importantes para a classificação do CFIT incluem:


- Deve ser utilizado apenas para ocorrências durante as fases aéreas do voo;
- Inclui colisões com aqueles objetos que se estendem acima da superfície;
- Inclui situações em que a tripulação de voo é afetada por ilusões visuais ou
ambiente visual degradado que levam a aeronave a ser voada sob controle contra o
terreno, água ou obstáculos.
O CENIPA não considera CFIT quando a ocorrência envolve operações a
baixa altitude (ex: aplicação de pesticidas, operações aéreas próximas a obstáculos
e operações SAR próximas à água ou superfície do solo), quando ocorrer o pouso
antes/depois da pista e quando o controle da aeronave for perdido.
Uma outra forma de entender o que é CFIT é vê-lo como “o acidente
aeronáutico que ocorre quando uma aeronave, mesmo tendo seus equipamentos e
sistemas funcionando bem e estando sob o controle de um piloto, colide com o solo,
água ou obstáculo.”
Todavia, mais importante do que procurar um significado único para
determinar o que seria CFIT é identificar quais são os fatores que contribuem com
sua ocorrência e como evitá-los. Afinal, apontado em alguns estudos como uma das
principais causas de acidentes em todo o mundo, o CFIT provoca ainda maior
espanto quando se constata que eles se dão com uma aeronave perfeitamente
aeronavegável e sob controle dos pilotos.
Muitos acidentes classificados como CFIT ocorrem por conta de perda de
consciência situacional, mais frequentemente nas fases de aproximação e pouso.
Aliás, é bastante provável que você, infelizmente, já tenha perdido algum
companheiro nesse tipo de acidente. As causas podem parecer óbvias após a
investigação, mas um dos pontos mais intrigantes é o fato de que esses eventos são,
muitas vezes, difíceis de prever – justamente porque se tratavam de pilotos e
aeronaves em perfeitas condições. Por que, então, ainda ocorrem eventos de CFIT?

2. Identificando o problema

A tarefa principal de uma investigação aeronáutica é verificar os fatores


contribuintes e encontrar formas de mitigá-los, evitando, por conseguinte, a
ocorrência de novos acidentes.
Essa é uma tarefa fundamental dentro do Sistema de Investigação e
Prevenção de Acidentes Aeronáuticos, mas não a única. A atuação apenas de
maneira reativa significaria aceitar a presença de uma lacuna ao excluir eventos de
menor impacto que (ainda) não tiveram consequências mais sérias.
O CFIT já provocou uma grande quantidade de acidentes, mas muitos outros
que estiveram perto de ocorrer também oferecem valiosos ensinamentos para a
comunidade aeronáutica. Abordagens mais modernas levam em consideração as
situações que envolveram esses eventos menores, que poderiam ter tido resultados
catastróficos sob circunstâncias apenas ligeiramente diferentes. Esses estudos
podem determinar indicadores que, em última análise, auxiliarão a reduzir ainda mais
a ocorrência do CFIT.

3. Indicadores de CFIT

Empregando métodos e ferramentas apropriados para a análise da segurança


da aviação, diversos órgãos públicos e privados identificaram, com base em
acidentes ou falhas que poderiam ter gerado um desastre, fatores os quais podem
dar origem a eventos de CFIT. Um dos grandes benefícios dessas pesquisas é
oferecer a possibilidade de elaboração de programas de gerenciamento do risco
específicos para cada tipo de operador.
No que diz respeito ao CFIT, a Associação Internacional de Transportes
Aéreos (IATA), por exemplo, oferece excelentes informações a partir de seu banco
de dados de incidentes, o IDX – Incident Data Exchange1. Circunstâncias
identificadas nos estudos da Associação, que são baseados em incidentes, quando
somadas às descobertas decorrentes das investigações de acidentes aeronáuticos,
permitem conceber um cenário dos principais eventos que podem levar à ocorrência
de um CFIT.

4. Eventos que dão origem ao CFIT

A vontade de cumprir a missão, a pressa em chegar, a pressão exercida pelos


órgãos de controle e o cansaço provocado por extensas jornadas são exemplos de
armadilhas que levam pilotos que têm sua aeronave sob controle a colocá-la em uma
situação de perigo, muitas vezes irreversível.
Dentre as várias situações que podem ocasionar um CFIT, encontramos:
• resposta tardia ou inadequada a alertas de GPWS / TAWS;
• ausência prolongada de comunicação entre piloto e controlador;
• aproximações com baixo nível de energia;
• execução de circuito de tráfego a baixa altura;
• desvio lateral durante a execução de SID ou STAR;
• desvio ou voo abaixo da altitude mínima de segurança;
• falha em verificar a precisão da navegação antes do início do procedimento
de descida;

1
https://www.iata.org/en/services/statistics/gadm/idx/
• demora ou falha em reverter o voo para auxílios à navegação
convencionais em caso de dúvida sobre a automação;
• vetoração incorreta por parte do ATC;
• continuação da aproximação abaixo da DA/MDA sem referências visuais;
• aproximação não estabilizada; e
• falha em executar arremetida e/ou em seguir o perfil de aproximação
perdida.

Reconhecer que o problema existe, identificar as circunstâncias sob as quais


ele pode surgir e apontar indicadores e eventos que dão origem ao CFIT permitem
conceber a fundação que dará ao gestor e ao piloto ferramentas destinadas a
eliminar (ou ao menos fortemente reduzir) esse tipo de ocorrência.

5. Mitigando eventos de CFIT

A presença de elementos externos ao operador e a diversidade de fatores que


podem contribuir com um evento de CFIT dificultam a determinação de
recomendações e a elaboração de estratégias destinadas a mitigar esses acidentes.
Todavia, três principais áreas resumem onde se pode atuar para reduzir o CFIT:

a) Procedimentos Operacionais Padrão (SOP)

Instituir na organização uma cultura de aderência aos SOP é uma das


melhores formas de diminuir a possibilidade de um CFIT. Isso envolve, por exemplo,
o estabelecimento de callouts padronizados, o respeito aos mínimos meteorológicos
e a adoção dos conceitos de aproximação estabilizada.
Os briefings de decolagem e aproximação também possuem um relevante
papel nessa área. Esses devem ser ao mesmo tempo sucintos, para evitar que
informações irrelevantes desviem a atenção, bem como abrangentes o suficiente
para cobrir tudo aquilo que realmente importa. Algumas boas práticas para esses
briefings são as seguintes:

• O PM (piloto monitorando) deve ter concluído a preparação da aeronave


antes do briefing (FMS, inserção do procedimento, ajuste dos mínimos,
sintonia de auxílios, etc.), a fim de que possa devotar toda a sua atenção
para essa crucial parte do voo.
• O PF (piloto que voa) deve transferir o controle da aeronave para o PM
para poder realizar o briefing, a fim de não se distrair com os comandos
de voo.
• O briefing deve ser realizado preferencialmente em voo de cruzeiro,
imediatamente antes da descida. Isso evita que orientações transmitidas
com muita antecedência sejam esquecidas e permite que sejam utilizadas
as informações mais atualizadas (condições do aeródromo e
procedimento de descida a realizar, por exemplo).
b) GPWS/TAWS

O advento dos equipamentos de alerta de proximidade com o solo provocou


uma forte redução nos acidentes decorrentes de CFIT. É preciso, porém, que os
pilotos saibam interpretar e utilizar as importantes informações derivadas do
GPWS/TAWS, bem como que estejam doutrinados e treinados para responder
corretamente a esse tipo de evento.
As manobras de escape devem ser realizadas imediatamente, sob pena de
não haver mais tempo e espaço para a recuperação. Via de regra, estas envolvem
a desconexão do automatismo, seleção de potência máxima, colocação em elevada
atitude de cabrada (pitch) até determinada velocidade e retração dos freios
aerodinâmicos. Recolhimento de trem de pouso e flapes normalmente são feitos
quando o obstáculo já não é mais um fator. Os manuais das aeronaves estabelecem
correta a sequência de eventos. Siga exatamente a técnica determinada pelo
fabricante.

c) Alerta Situacional em relação ao terreno

Essa área de atuação envolve, além da atenção redobrada no caso de


vetoração radar, o correto gerenciamento da fadiga, cujas consequências mais
danosas ocorrem justamente nas fases de aproximação e pouso.
Principalmente nas aeronaves que não contam com GPWS, TAWS ou display
de visão sintética, é sempre importante saber a todo momento onde se encontram
as elevações do terreno.
Um dos eventos de CFIT mais estarrecedores ocorreu em 1995, na Colômbia.
Os pilotos não possuíam uma boa representação mental de onde se localizavam
durante o procedimento de aproximação para Cali. A falha em planejar e executar a
aproximação, a demora em realizar a manobra de escape após o alerta do GPWS e
a falta de consciência situacional com relação a navegação vertical, proximidade do
terreno e posição relativa aos auxílios-rádio custaram a vida de 159 passageiros e
tripulantes.

6. Informações Complementares

Maiores informações acerca de CFIT podem ser encontradas em:


• http://sunnyday.mit.edu/accidents/calirep.html - Relatório do acidente
ocorrido em 20 de dezembro de 1995 com American Airlines 965 –
Colômbia. Documento preparado por Peter Ladkin, Universidade
Bielefeld, Alemanha.
• Eurocontrol Hindsight nr 1 – Jan 2005. Controlled Flingh into Terrain.
Disponível em https://www.scribd.com/document/31732/Hindsight-
Number-1-January-2005
• Flying Tiger Line 66. Acidente ocorrido em 19 de fevereiro de 1989 – Kuala
Lumpur, Malásia. Disponível em https://aviation-
safety.net/database/record.php?id=19890219-0
• Controlled Flight into Terrain Education and Training Aid. Documento
elaborado pela Flight Safety Foundation.
Disponível em https://www.skybrary.aero/bookshelf/books/2507.pdf
• CFIT reduction products, Flight Safety Foundation. Disponível em
https://flightsafety.org/toolkits-resources/past-safety-initiatives/controlled-
flight-into-terrain-cfit/cfit-reduction-products/
• Manual de Investigação do SIPAER (MCA 3-6).

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