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Para já, o 'lead': «Os problemas de atenção passaram a ser a nova marca das crianças e
jovens. Um estudo recente, ignorado em Portugal, põe em causa a explicação genética. A
exposição muito precoce aos écrãs, sobretudo à televisão, com as suas muitas imagens
rápidas e variadas, poderá estar a condicionar o seu cérebro a só aceitar um alto nível de
estimulação. “Formatados" pela velocidade e pela fragmentação, existirá já um fosso
irremediável entre eles e uma escola que lhes exige o que já perderam. Neste cenário
intervém a omnisciente Ritalin (Ritalina, na gíria portuguesa), a anfetamina que, por receita
médica, milhões de crianças em todo o mundo estão a tomar por conta da desatenção.»
«(...) nos EUA foi dada como testada uma relação entre a exposição precoce à televisão e os
problemas de atenção que, nos últimos anos, parecem estar a tomar de assalto as crianças e
jovens do mundo desenvolvido. "Não é possível saber se o crescimento da desordem por
défice de atenção e hiperactividade é real, ou se é motivado pelo maior conhecimento da
desordem. Mas existem razões para acreditar que, na primeira infância, os factores
ambientais são importantes no desenvolvimento da desordem. Deste modo, a televisão pode
muito bem ser um desses factores", comentou à Pública o pediatra norte-americano Dimitri
Christakis. Foi ele que liderou o estudo do Child Health Institut, da Universidadede
Washington, que veio dar uma primeira grande resposta afirmativa à questão, abanando assim
a abordagem genética do chamado défice de atenção, ainda a preponderante nos EUA, em
Portugal ou em mais meio mundo.»
Não era por acaso que Michel Foucault dizia que a loucura era um 'facto de civilização'...
Muito há, pois, a pensar, para além das 'razões' genéticas.
«(...) Cristakis e a sua equipa pegaram numa amostra de mais de duas mil crianças com um e
três anos de idade e seguiram-nas até por volta dos sete. O que foi feito do seguinte modo:
quando os miúdos tinham um ano perguntaram aos seus pais quantas horas viam eles
televisão; fizeram o mesmo quando chegaram aos três anos e depois, quando já tinham sete,
as questões aos pais incidiram sobre a capacidade de atenção dos observados, sobre a
capacidade para se concentrarem, sobre se eram impulsivos ou se se distraíam facilmente.
Para além destes questionários foram levadas em linha de conta variáveis como a depressão
materna, a estimulação cognitiva e o apoio emocional, entre outras.
«Christakis explica o que se poderá estar a passar: "Nos primeiros três anos de vida está em
curso um desenvolvimento crucial do cérebro, especificamente as conexões entre neurónios.
Aquilo a que chamamos sinapses do cérebro estão a formar-se. É uma espécie de montagem
da mente que está a ocorrer naquele período. (...)
«Frente à televisão, geralmente a sós, as crianças estarão a ser sujeitas precisamente a uma
sobre-estimulação visual, dada sobretudo a velocidade com que se sucedem as imagens e a
sua diversidade, que é hoje a própria matéria dos media electrónicos. Esta exposição aos
écrãs - que começa na televisão e se prolonga depois nos jogos de computador, "game boy",
internet, etc. - poderá ter já "condicionado o cérebro a um alto nível de estimulação", como
sublinha o pediatra norte-americano
«A psicóloga educacional Jane Healy, que há mais de 10anos tem vindo a alertar para os
efeitos do uso excessivodos media electrónicosna mente das crianças, admite que este
processo induziu já alteraçõesno funcionamento do cérebro:"Temos que aceitar e capitalizar
o facto de as crianças de hoje serem portadoras de novas competências apropriadas a este
novo século. A mudança que constatamos nas nossas crianças pode ser a parte visível de uma
mudança na inteligência humana, traduzida numa progressão para formas de pensar mais
imediatas, visuais e tridimensionais". A ser assim, e é esta uma porta também aberta pelo
estudo liderado por Christakis, o estado de desatenção em que hoje vivem tantas crianças e
jovens seria, não o sintoma de uma doença, mas sim uma marca geracional, ou até mesmo
civilizacional. O que tornaria insuperável o fosso já existente entre eles e o sistema de ensino
prevalecente nas nossas sociedades. As escolas mais não estariam hoje do que a exigir-lhes o
que eles já perderam, ignorando o que entretanto ganharam.»
http://irrealtv.blogspot.com/2005/12/televiso-os-seus-perigos-e-criana.html