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Frutas do Brasil, 14 Uva de Mesa Fitossanidade

DOENÇAS
CAUSADAS ,
POR BACTERIAS
Mirtes Frei/as Lima
Marisa Alvares da Silva Vel/oso Ferreira

INTRODUÇÃO assim como também as medidas para o


seu maneJo.
o cancro-bacteriano foi registrado
pela primeira vez no Brasil, em 1998, em
parreirais do polo Petrolina, PE - ]ua- CANCRO-BACTERIANO
zeiro, BA, muito provavelmente, intro- Xanthomonas campestris
duzido no País em material propagativo pv, vitico/a
importado de forma irregular. Até en-
tão, as doenças causadas por bactérias Em todo o mundo, o cancro-bacte-
em videira não eram expressivas no Bra- riano causado por Xanthomonas campestris
sil. Relatos de galhas-da-coroa, causadas pv. viticola (Nayudu) Dye apresenta distri-
por Agrobacterium spp., constituíam as buição geográfica bastante limitada. A
únicas ocorrências de doenças bactéria- sua ocorrência foi relatada apenas na Ín-
nas no País, sem entretanto, causar da- dia, em 1972, onde não causou grandes
nos significativos na videira. Dessa ma-
danos (NAYUDU, 1972).
neira, o cancro-bacteriano tornou-se a
O cancro-bacteriano constitui-se na
primeira bacteriose economicamente
primeira bacteriose com incidência ex-
importante para a cultura no Brasil. De-
pressiva em videira no País. Os primeiros
vido à limitada distribuição geográfica
sintomas dessa doença foram observados
da doença em todo o mundo, tendo sido
em videiras da cv. Festival e, posterior-
detectada apenas na Índia (NAYUDU,
mente, na cv. Red Globe, no Submédio
1972) e no Brasil, pouco é conhecido so-
do Vale do São Francisco, situado nos es-
bre a sua biologia e diversidade genética
tados da Bahia e Pernambuco. Entre 1998
(BRASIL, 1998).
e 1999, sintomas da doença foram consta-
Outras bacterioses relatadas em vi-
deirasão o mal de Pierce (XJlella fastidiosa) tados em parreirais nos municípios de Pe-
e a queima-bacteriana [XJlophilus ampelinus trolina e Santa Maria da Boa Vista, no
(Xanthomonas ampelina)], ambas de impor- Estado de Pernambuco, e nos municípios
tância quarentenária para o Brasil. Essas de Curaçá, Casa Nova, Sento Sé e ]uazei-
doenças foram registradas em parreirais ro, na Bahia. Ainda naquele período, o
devários países, entretanto, nenhuma de- cancro-bacteriano foi também identifica-
las foi ainda detectada no Brasil. do em videiras das cultivares Red Globe,
Nesse capítulo, serão descritas as Itália e Ribier, no Estado do Piauí (MA-
doenças causadas por bactérias que ocor- LAVOLTA ]ÚNIOR et al., 1999a), e nas
rem em videira no Brasil, em particular, cultivares Red Globe, Superior e Flame,
no Submédio do Vale do São Francisco, no Ceará, (FREIRE; OLIVEIRA, 2001).
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Mais recentemente, a doença foi detecta- isolados brasileiros e o isolado indiano,


da em mudas do porta-enxerto IAC 572, sugerindo uma origem comum entre os
em Goiás QUNQUEIRA et al., 2006), e dois grupos (TRINDADE et al., 2005).
em videiras, em Roraima (HALFELD-
VIEIRA; NECHET, 2006).
Sintomatologia
e epidemiologia
Agente causal
Sintomas do cancro-bacteriano sur-
No Brasil, a bactéria X. campestris pv. gem em ramos, folhas e frutos de videira.
viticola foi isolada de videiras exibindo sin- Em folhas de plantas afetadas pela doen-
tomas típicos da doença e identificada em ça, observam-se manchas pequenas, de
laboratório por meio de testes bioquími- 1 mm a 2 mm de diâmetro, circundadas
cos, nutricionais e fisiológicos, além de ou não por um halo amarelado (Figura
testes de patogenicidade em plantas da la), que podem estar localizadas em todo
cv. Red Globe, que confirmaram ser a o limbo foliar ou ao longo das nervuras
bactéria o agente causal da doença (LIMA primárias e secundárias, as quais delimi-
et al., 1999; MALAVOLTA J' IOR tam as lesões, tornando-as angulares (Fi-
et al., 1999b). A classificação dessa gura 1b). Posteriormente, coalescem, cau-
bactéria ainda não está totalmente escla- sando a morte de extensas áreas da folha
recida. O estudo taxonórnico do gênero (Figura 1c). Manchas de coloração parda
Xanthomonas, realizado por Vauterin et al. e em forma de "V" também podem sur-
(1995), que propôs a reclassificação do gir a partir dos bordos da folha (Figura
gênero em 20 espécies, não incluiu a pv. 1d). Ainda nas folhas, manchas escureci-
viticola entre os isolados analisados. Assim, das e alongadas que evoluem a cancros
até que novos trabalhos mais detalhados podem surgir nas nervuras primárias e
sejam realizados, o patógeno pode ser re- secundárias e também em pecíolos (Figu-
ferido também como X. sp. pv viticola ras 1e e lf).
(Nayudu) (VAUTERIN et aI., 1995). Em ramos verdes e maduros, há o
A bactéria produz colônias de cor desenvolvimento de cancros, que são fen-
creme-esbranquiçada, arredondadas, con- dilhamentos longitudinais e de coloração
vexas, brilhantes e de bordos lisos. negra (Figuras 2a, 2b e 2c). Com o agra-
É gram-negativa, possui metabolismo vamento da infecção, esses, gradualmen-
aeróbico, sendo capaz de crescer in vitro, te, alargam-se expondo os tecidos inter-
entre 48h e 72h, a temperaturas de 28°C nos. esses cancros, a bactéria permanece
a 33°C. A ausência do pigmento amare- latente durante o período seco do ano,
lo xanthomonadina, particular à grande mas durante o período chuvoso, há exsu-
maioria das espécies do gênero dação de pus bacteriano. A infecção pode
Xanthomonas, é uma característica mar- atingir o sistema vascular da planta e a
cante do pv. viticola, quando isolado em descoloração vascular pode ser verificada
meio de cultura. em uma pequena extensão, a partir de
O estudo comparativo por meio de cortes longitudinais dos ramos, principal-
técnicas moleculares entre isolados de mente dos que estão próximos à região de
X. campestris pv. viticola, coletados de 1998 localização dos cancros.
a 2001, na região de ocorrência da doença Em inBorescências, manchas necró-
no Brasil, e o isolado tipo dessa bactéria, ticas podem surgir a partir do engaço, no
originalmente descrito na Índia, e no qual qual são observados sintomas similares
a descrição dessa bactéria se baseou, indi- àqueles verificados em ramos, com a pre-
caram alta similaridade genética entre os sença de lesões escuras e a formação de
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Figura 1. Sintomas do cancro-bacteriano em folhas de videira, cv. Red Globe.


Sintomas iniciais (A); manchas angulares (B); coalescimento de lesões (C); manchas
necróticassetoriais (D); cancros em nervuras (E); cancros em pecíolo de folha (F).

cancros (Figura 3a). Nos cachos, obser- Os sintomas causados por X. campestris
vam-se cancros no engaço e nos pedice- pv. viticola em videira variam em intensi-
los, e nas bagas podem surgir manchas dade, segundo a cultivar afetada. A cv.
necróticas levemente arredondadas (Fi- Red Globe é considerada a mais suscetível
gura 3b). Em cachos já formados, ocorre à doença, podendo apresentar alta inci-
murcha das bagas após necrose da ráquis dência de sintomas em parreirais infectados.
e dos pedicelos. Os sintomas da doença Entre 1998 e 1999, o cancro-bacteriano
são mais severos nos cachos quando a in- foi também constatado em videiras das cul-
fecção ocorre no início da frutificação. tivares Itália, Festival, Brasil, Piratininga,
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Figura 2. Sintomas de cancros em ramos verdes (A, B), e em ramo maduro de


videiras cv. Red Globe (C).

Figura 3. Sintomas da doença em inflorescências e em frutos de videira, cv. Red


Globe. Cancros no engaço da inflorescência (A); cancros no engaço do cacho e
manchas necróticas em bagas (B).
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Patrícia, Benitaka, Ribier e Catalunha, tomas de cancro no engaço e pedicelos, e


mas com incidência bastante variável. As com a presença de manchas nas bagas,
cultivares Itália e Benitaka se apresentaram inviabilizando-os para a comercialização.
menos suscetíveis à doença em campo Os danos causados nas plantas po-
quando comparadas à cv. Red Globe. dem ser bastante significativos, conside-
Sintomas típicos da doença também rando-se que a videira é uma cultura pe-
foram verificados em plantas do porta- rene e o patógeno permanece na planta
enxerto cv. IAC 572. de um ano para o outro; a bactéria pode
No Submédio do Vale do São Fran- ser disseminada entre plantas durante a
cisco, a incidência e a severidade dos sin- realização dos tratos culturais; as podas
tomas da doença em cultivares suscetíveis severas em videiras infectadas podem
são maiores no primeiro semestre, devido afetar a formação dos ramos produtivos
à ocorrência de chuvas e de temperaturas e, consequentemente, os ciclos produti-
amenas, condições que favorecem a dis- vos subsequentes; e que ainda não exis-
seminação da bactéria e também a infec- tem medidas curativas para o controle da
ção. As chuvas propiciam a ativação da doença.
infecção a partir dos cancros presentes Após a detecção do cancro-bacteria-
nas plantas, favorecendo a exsudação de no no polo Petrolina, PE - ]uazeiro, BA
pus bacteriano, a disseminação do pató- verificou-se uma redução significativa
geno e, consequentemente, o estabeleci- dos plantios com a cv. Red Globe nessa
mento de novos focos de infecção. A rea- região. Isso ocorreu devido à alta susceti-
lização de tratos culturais que causam bilidade da cultivar ao cancro-bacteriano,
ferimentos nas plantas durante o período à dificuldade de manejo da doença e ao
chuvoso, em cultivares suscetíveis, pode consequente aumento nos custos de pro-
propiciar o surgimento de novas infec- dução. Nas áreas ainda remanescentes
ções nas mesmas plantas ou em plantas com a cv. Red Globe no Submédio do
vizinhas. Muito frequentemente, sinto- Vale do São Francisco, a poda de produ-
mas da doença em cultivares suscetíveis ção é realizada no período seco do ano e
são observados após a poda, na fase de apenas uma safra anual é obtida.
floração, no início da frutificação, após o A bactéria sobrevive em videiras in-
raleio de bagas e, em alguns casos, na fase fectadas, em restos de cultura e em hos-
de maturação dos cachos e também no pedeiras alternativas. É disseminada a
período de repouso das plantas, entretan- longas distâncias em material propagati-
to, sempre associados à ocorrência de vo de copa e porta-enxerto infectados,
chuvas. utilizados em enxertia e na formação de
Os prejuízos causados pela doença mudas. Dentro do parreiral ou entre áre-
dependem da cultivar de uva plantada, do as próximas, a disseminação é favorecida
nível de infecção das plantas no parreiral por ventos associados a respingos de chu-
e, também, da ocorrência de condições va ou pela irrigação por aspersão sobre-
ambientais favoráveis ao desenvolvimen- copa. Essas mesmas condições podem
to da doença e das medidas adotadas para também causar ferimentos no limbo fo-
o seu manejo. Nas cultivares suscetíveis, liar, propiciando a penetração da bactéria
a produtividade e a qualidade dos frutos na planta. A disseminação entre plantas
podem ser significativamente afetadas em parreirais afetados ocorre também
pelos sintomas presentes nas folhas e ra- durante a realização dos tratos culturais
mos, que interferem na área foliar fotos- que resultam em ferimentos nas videiras,
sinteticamente ativa e no transporte de como torção de ramos e desbrotas e, ain-
nutrientes e água. Além disso, plantas da, em tesouras utilizadas nas operações
afetadaspodem produzir cachos com sin- de poda de ramos, raleio de bagas e co-
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lheita e em canivetes, em enxertias. De- Considerando esses aspectos, esfor-


ve-se considerar que a bactéria pode tam- ços têm sido empregados no Brasil para o
bém ser transportada em partes de plantas desenvolvimento e otimização de méto-
infectadas, como folhas, frutos e pedaços dos diagnósticos mais sensíveis e rápidos.
de ramos, aderidos em contentares, ferra- Esses métodos empregam a sorologia
mentas, implementos agrícolas e veículos. (ARAÚJO, 2005) e a técnica molecular
N o Brasil, X. campestris pv. viticola conhecida por PCR (reação em cadeia da
infecta naturalmente as plantas invasoras polimerase) (TRINDADE et al., 2005,
apaga-fogo (Alternantera tene/la), caruru 2007) para a detecção e identificação des-
(Amaranthus sp.), soja perene (Gfycine sp.) e sa bactéria em amostras vegetais.
fedegoso (Senna obtusifolia) (NASCIMEN- A sorologia é um método imuno-
TO et al., 2006), além da videira. Entre- lógico de detecção que emprega anticor-
tanto, ainda não se tem conhecimento pos específicos capazes de reconhecer
do papel desses hospedeiros alternativos moléculas, tais como proteínas ou polissa-
na epidemiologia da doença em campo. carídeos, presentes nas células bacterianas.
Em condições experimentais, essa bacté- Araújo et aI. (2005) desenvolveram anti-
ria foi patogênica a plantas de cajá-manga corpos policlonais, ou seja, uma mistura
(Spondias dulcis), mangueira (Mangiferae de diferentes anticorpos produzidos em
indica), cajueiro (Anacardium ocidental e) e resposta a diferentes antígenos de X.
umbuzeiro (Spondias tuberosa) (ARAÚJO campestris pv. viticola. Esses anticorpos,
denominados AC 4558 e AC 4560, mos-
et al., 1999), que são fruteiras comumente
traram-se altamente reativos e específicos
encontradas na região Nordeste. Na Índia,
para a pv. viticola.
o neem (Azadirachia indica), utilizado
A PCR se baseia na detecção da bac-
como quebra-ventos e como inseticida
téria pela amplificação do seu material
natural (DESAI et al., 1966), e a man-
genético, o DNA, utilizando um par de
gueira (CHAND; KISHUM, 1990) são
oligonucleotídeos desenhados baseado
hospedeiros naturais desse patógeno, en-
no genoma desse patógeno. A técnica
tretanto, a infecção natural dessas plantas
propicia a detecção do DNA da bactéria
pelo agente do cancro-bacteriano da
em amostras vegetais infectadas pela pro-
videira ainda não foi constatada no Brasil.
dução de milhões de cópias de uma deter-
minada região presente no seu genoma.
Após a amplificação via PCR, o DNA do
Diagnose do
patógeno pode ser visualizado por eletro-
cancro-bacteriano forese em gel de agarose, que propicia a
separação dos fragmentos de DNA de
A diagnose da doença é normalmen-
te realizada pela observação dos sintomas
acordo com seu tamanho. °emprego de
brometo de etídio, corante que forma um
nas plantas afetadas, verificação da pre- complexo com o DNA, permite sua visu-
sença de fluxo bacteriano nos tecidos in- alização sob luz ultravioleta.
fectados, isolamento da bactéria em meio No caso de X campestris pv. viticola, oli-
de cultura, seguido da realização de uma gonucleotídeos (Xcv1FjXcv3R) (TRIN-
bateria de testes bioquímicas e do teste de DADE et alo, 2007) foram desenhados
patogenicidade em videira, quando ne- com base na sequência de um gene liga-
cessário.° processo pode consumir mais do à patogenicidade (hrp-B). Quando a
de dez dias e dificilmente pode ser em- bactéria está presente em uma amostra,
pregado na detecção da bactéria em plan- milhões de cópias desse gene serão pro-
tas assintomáticas, nas quais a população duzidas no tecido vegetal e o correspon-
da bactéria é baixa. dente fragmento de DNA, amplificado
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por PCR com a utilização dos oligonu- medidas a serem tomadas no manejo e
cleotídeos, pode ser visualizado no gel de controle do cancro-bacteriano na região.
agarose como uma banda de cerca de Essa instrução normativa foi revoga da
240 pares de bases. A ausência dessa ban- em 2006, tendo sido substituída pela
da indica que a amostra não contém o Instrução ormativa n? 9/2006
patógeno, ou que esse se encontra abaixo (BRASIL, 2006).
do limiar de detecção da técnica. As recomendações descritas na Ins-
A utilização de ambas as metodolo- trução ormativa n° 9 envolvem práticas
gias, sorologia e PCR, na detecção de X. corretas de manejo da doença que devem
campestris pv. viticola ainda é objeto de pes- ser adotadas, tais como evitar as opera-
quisa e otimizações, visando à disponibi- ções de poda, desbaste e raleio de cachos
lização de métodos de simples aplicação e no período chuvoso, visando reduzir a
baixo custo. () grande desafio é a sua apli- disseminação da bactéria e o surgimento
cação em material assintomático, seja em de novos focos de infecção. Contudo, no
manejo da doença em pomares afetados,
plantas já infectadas ou simplesmente em
medidas devem ser adotadas não apenas
órgãos da planta que carregam popula-
no período chuvoso, mas também na
ções epífitas em sua superfície.
época seca do ano, dentre as quais, poda
de ramos doentes, eliminação de plantas
severamente afetadas, desinfestação de
Controle
ferramentas de poda, queima de restos de
o Brasil, a bactéria X. campestris cultura e emprego de produtos à base de
cobre nas áreas podadas (CO nssxo
pv. viticola é considerada uma praga qua-
TÉC ICA PARA A CULTURA DA
rentenária A2 pelo Iinistério da Agricul-
UVA, 1998; LIMA, 2000; f\SCIME -
tura, Pecuária e Abastecimento (Mapa)
TO et al., 2000).
(BRASIL, 1999) ou, segundo a nova ter-
Medidas preventivas são recomen-
minologia da Instrução Normativa n°
dadas para parreirais com cultivares sus-
52/2007, uma praga quarentenária "pre-
cetíveis que ainda não apresentam sinto-
sente" (BRASIL, 2007). Isso signi fica
mas da doença e naqueles que ainda estão
que a ocorrência dessa bactéria é restrita a
em fase de implantação. Entre essas me-
determinadas regiões do País e que a pra-
didas, destacam-se: plantar mudas com-
ga se encontra sob controle oficial.
provadamente sadias, evitar o trânsito de
Quando da primeira ocorrência da
máquinas e implementos agrícolas entre
doença no Submédio do Vale São Francisco, propriedades, instalar pedilúvio com
em 1998, representantes da Secretaria de amônia quaternária 0,1% na entrada do
Defesa Agropecuária, do Departamento pomar, estabelecer quebra-ventos e evitar
de Defesa Sanitária do Mapa, juntamente operações que resultem em ferimento nas
com pesquisadores da Embrapa Serniá- plantas na época chuvosa. As medidas
rido, representantes da Valexport (Asso- descritas devem ser adotadas como parte
ciação dos Produtores e Exportadores de do manejo integrado, visando possibilitar
Hortifrutigranjeiros e Derivados do Vale a convivência com o cancro-bacteriano
do São Francisco) e outros profissionais em áreas de ocorrência da doença.
envolvidos no setor produtivo da videira Na formação de novos parreirais, o
reuniram-se para discutir o problema do emprego de mudas com sanidade com-
cancro-bacteriano. Como resultado dessa provada é a primeira e mais importante
discussão, foi elaborado o documento recomendação para assegurar a estabili-
Instrução ormativa nO233/1998 (BRA- dade fitossanitária inicial do pomar. Essa
SIL, 1998), no qual são recomendadas medida é também obrigatória para que
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os produtores possam obter a certifica- dentro da família Vitaceae (Ampeiocissus,


ção no programa de Produção Integrada Ampelopsis Cayratia, Cissus, Parthenocissus,
J

(PI) (BRASIL, 2001). Entretanto, a com- Tetrastigma e Leea) e, também, em diversas


provação do estado sanitário de mudas, espécies de Vitis (V. cinerea, V. longii,
baseado apenas na expressão de sinto- V. riparia, V.palmata e V.parviflora). Outras
mas, é complexa diante de evidências de espécies de Vitis, como V. rotundifolia,
que populações epífitas da bactéria po- V. cbampini, V. cordifolia, V. aestivales,
dem estar presentes na superfície de fo- V. rupestris, V. berlandieri, V. candicans,
lhas sem sintomas e que a bactéria pode V. cinerea e V. labrusca, também apresen-
sobreviver em infecções latentes em ra- taram níveis diferenciados de resistência
mos da copa (ARAÚJO, 2005; NASCI- à X. campestrispv. viticola.
MENTO et al., 2000). No Brasil, experimentos em casa de
Experimentos conduzidos na Índia vegetação revelaram a presença de resis-
indicaram que aplicações de produtos à tência ao cancro-bacteriano nas espécies
base de cobre reduziram a intensidade do V. candicans e V. somalliana (LIMA; BA-
cancro-bacteriano (CHAND et al., 1992). TISTA, 2007), nas cultivares de copa Isa-
Entretanto, o tratamento de plantas in- bel, Niágara Rosada e Niágara Branca, e
fectadas (85% a 100%) com oxicloreto de no porta-enxerto Paulsen, que apresenta-
cobre, sulfato de estreptomicina, tetraci- ram reduzida severidade da doença (MA-
clina e bacterinol-100, não foram eficien- LAVOLTA JÚNIOR et al., 2003; NAS-
tes no seu controle. No Brasil, apesar de CIMENTO et al., 2006).
não haver ainda nenhum produto regis-
trado no Mapa para o controle do cancro-
bacteriano, produtos à base de cobre têm GALHAS-DA-COROA
sido aplicados como protetores no mane- Agrobacterium spp.
jo dessa doença em parreiras do Submé-
dio do Vale do São Francisco. O desen- Um dos primeiros relatos da ocorrên-
volvimento de resistência em X. campestris cia de galhas induzidas por Agrobacterium
pv. viticolaa produtos derivados de cobre e spp. ocorreu na França, em 1853. En-
ao antibiótico estreptomicina foi relatado tretanto, a sua natureza infecciosa foi
na Índia (CHAND et al., 1994). No Bra- demonstrada apenas em 1897. Os maiores
sil, Araújo et al. (2005) e Marques e Fer- prejuízos são verificados, particularmente,
reira (2007), também verificaram a ocor- em cultivares de Vitis viniflra, em condições
rência de isolados mais tolerantes ao de clima frio que propiciam o surgimento
cobre e uma tendência à redução no con- de ferimentos nas plantas, favorecendo a
trole da doença ao longo dos anos, suge- penetração da bactéria e o desenvolvimen-
rindo que o uso frequente de cúpricos to da infecção. Nos Estados Unidos, a
pode comprometer a sua eficiência. doença foi relatada em 1889 e, atualmente,
A busca por fontes de resistência ao causa sérios prejuízos em videiras no
cancro-bacteriano tem sido uma constan- Estado da Califórnia.
te preocupação, considerando-se que não No Brasil, a galha-da-coroa induzi-
existem medidas de controle curativo pa- da por Agrobacterium spp. não é expressi-
ra essa doença em áreas já infectadas, va na cultura da videira. Entretanto, a
indicando a importância da identificação sua ocorrência foi relatada em parreirais
da resistência genética e da sua utilização da região Nordeste e dos estados de Mi-
em programas de melhoramento. Chand nas Gerais (MARQUES et al., 1994), Rio
(1992) identificou fontes de resistência a Grande do Norte (BERIAM et al., 1991)
esse patógeno em diferentes gêneros e São Paulo (BERIAM et al., 1992).
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A doença foi ainda registrada no Rio dessa doença, podendo ocorrer em raizes,
Grande do Sul, onde a biovar 3 dessa na parte basal do tronco, próximo ou logo
bactéria foi introduzida em material pro- abaixo da linha do solo ou, ainda, na parte
veniente de Israel (OLIVEIRA et al., aérea do tronco das plantas (Figura 4). As
1994). No Submédio do Vale do São galhas são formadas por tecidos desorga-
Francisco, sintomas esporádicos dessa nizados do sistema vascular e do parên-
doença também têm sido detectados em quima. Apresentam, inicialmente, colora-
videira (LIMA; MOREIRA, 2002). ção clara e superficie lisa quando novas,
entretanto, tornam-se escurecidas e áspe-
ras à medida que aumentam em tamanho
Agente causal e envelhecem. Segundo Agrios (2005), as
galhas podem surgir no tronco de videiras
A doença é causada por A. tumifaciens adultas a uma altura de até 1,5 m do solo.
(E. F. Smith ScTouwnsend) Conn, atual- Outros sintomas que podem ser observa-
mente denominada de A. vitis, que per- dos em plantas afetadas pela doença são
tence à familia Rhizobiaceae. Essa bacté- brotações pouco desenvolvidas e morte
ria possui três biovares, sendo a biovar 3 de porções da planta, acima da região de
predominante em videira. É gram-negati- ocorrência das galhas.
va, bastonetiforme com um fl.agelo. O pa- Bactérias pertencentes ao gênero
tógeno é facilmente identificado pela pro- Agrobacterium possuem um amplo circulo
dução de galhas quando inoculado em de plantas hospedeiras, infectando cerca
plantas hospedeiras. Atraida por exsuda- de 600 espécies de dicotiledôneas (BURR,
dos da planta, a bactéria penetra a hospe- 1994). A disseminação desses patógenos
deira via ferimentos e introduz nas célu- ocorre por meio de mudas e material pro-
las vegetais um fragmento especifico do pagativo de videira contaminados, como
DNA (o T-DNA), contido em seu plasmi-
dia Ti. O T-DNA é incorporado às célu-
las como parte do genoma da planta, sen-
do, mais tarde, transcrito por elas.
O T-DNA contém genes que codificam
para a produção de ácido indolacético
(IAA) e citocinina. Quando esses genes
são expressos pelas células da planta, há
produção desses reguladores de cresci-
mento que, por sua vez, induzem ao au-
mento do volume celular, assim como
também estimulam a divisão das células
afetadas. Dependendo da concentração
dos reguladores de crescimento nas célu-
las afetadas, a infecção pode resultar na
produção de galhas desorganizadas (tu-
mores) (AGRIOS, 2005).

Sintomatologia
e epidemiologia

A formação de galhas ou tumores é o Figura 4. Galho em videira, incitada por


principal e mais caracteristico sintoma Agrobacterium spp.
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tesoura de poda, água e solo. A penetra- preparo de mudas, utilizar materiais pro-
ção da bactéria na planta ocorre através pagativos de copa e porta-enxerto sadios.
de ferimentos resultantes da desbrota, Plantas afetadas pela doença, incluindo as
poda, manejo da cultura, rachaduras na- raízes, devem ser completamente elimi-
turais e injúrias causadas pelo frio nadas, e o solo tratado com fumigantes
(FLAHERTY et al., 1982). (BURR, 1994; FLAHERTY et al., 1982).
O patógeno pode sobreviver em ga- Em viveiros, deve-se manter todo o
lhas, plantas de videira infectadas e tam- equipamento, a área de trabalho e o solo
bém no solo. Quando as plantas são eli- limpos. Operações de viveiro que resul-
minadas, a sobrevivência da bactéria tam em ferimentos, tais como o preparo
pode ocorrer também em restos de raízes de estacas para enraizamento, enxertia,
que permanecem no solo e na rizosfera, transplante, corte de raízes, união de teci-
podendo infectar mudas replantadas. dos e propagação sob nebulização, propi-
ciam a ocorrência da infecção.
Métodos químicos e biológicos têm
Controle sido empregados no controle da doença.
Erradicantes químicos, como o querose-
Várias medidas são recomendadas ne, utilizados na eliminação de galhas em
para o controle da doença. Entretanto, as plantas de videira têm sido pouco eficien-
mais importantes baseiam-se em práticas tes, uma vez que novas galhas voltam a se
sanitárias e em evitar ferimentos, princi- desenvolver no local tratado. A estirpe 84
palmente nas raízes e colo das plantas. A da bactéria A. radiobacter, produtora de
instalação de parreirais em áreas com his- agromicina, tem sido utilizada no trata-
tórico da doença deve ser evitada, dando mento de mudas. Entretanto, essa estirpe
preferência, nesse caso, à rotação de cul- não é ativa contra a biovar 3, predomi-
turas, antes do replantio com videira. No nante em videira (BURR, 1994).

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