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PROMETEU

o dador do fogo

[ CENA 01 ]

(Sentado ao lado da ânfora lendo um livro. Na deixa sonora, olha para plateia e
pergunta)

O que veio primeiro? O homem, ou a ideia do homem?

(Levanta e vai até o meio do proscênio, diante da plateia)

Nesta vida eu nasci como Bruno, e desde pequeno a fantasia sempre me chamou,
talvez mais que as outras pessoas, sempre fui fascinado por lendas, mitos e contos de
fadas. E esse livro, o livro da mitologia, foi um dos presentes mais especiais que já recebi.
Pois ele junta diversas histórias e mitos em suas mais de 600 páginas.
A nossa civilização ociedental nasceu na Grécia antiga e é de lá que vem as minhas
histórias favoritas, muitas histórias que vocês podem conhecer, como Hércules ou os
famosos deuses olimpo. Histórias que por algum motivo sobreviveram ao tempo e por mais
que sejam antigas, permanecem atuais, pois os mitos não falam apenas das histórias dos
heróis e dos deuses, os mitos falam da nossa história, falam de cada um de nós, como
herói da sua própria história.
À medida que fui crescendo, e lendo, ou vendo filmes com histórias mágicas e
fantásticas, eu queria tanto que essa magia das lendas fossem reais (ajoelha) que comecei
a estudar sobre magia e descobri que sim, ela é real, só não é bem como a maioria pensa.
Nesse caminho, (pega as cartas no bolso) eu me deparei com o tarô, e quando finalmente
pude comprar meu primeiro deck de cartas e comecei a realmente estudar o tarô, eu
entendi que o futuro que podemos ver através das cartas, é apenas o presente disfarçado
de futuro. É como quando você anda em uma estrada, se você continuar por esse caminho,
é bem provável que chegará em determinado destino, mas se mudar de direção, passar por
um caminho diferente, o seu destino será outro. Então o destino não é fixo, afinal, temos
livre arbítrio. Nós podemos escolher nosso destino, mas nossas escolhas são tão
previsíveis que o nosso destino também o é. É assim que a previsão do futuro através das
cartas funciona, por fim, o tarô não lê o futuro, o tarô lê o presente. De acordo com as suas
escolhas hoje, você mesmo determina o seu destino. E por falar em destino, através destas
cartas contarei uma das histórias que mais me deixa intriga, o mito de prometeu, aqui
representado pela carta do enforcado, a carta do enforcado fala daquele que encara com
coragem seu destino e suporta todas as dores pois ele sabe que no fim tudo valerá a pena,
essa é apenas uma das inúmeras versões do taro que existem, é o taro mitológico, onde
cada uma das cartas é representada por um mito grego. Neste caso, o enforcado é
apresentado na figura de Prometeu, que mesmo sabendo qual era seu terrível destino,
permaneceu firme em seu propósito em nome de algo maior.
Talvez vocês não saibam, mas nós só estamos todos aqui, graças a Prometeu. Por
isso hoje, eu lhes conto a sua história.
[ CENA 2 ]

(Acende a tocha)

O que veio primeiro? O homem, ou a ideia do homem?

(Acende as luminárias)

Apanhando um punhado de terra e misturando com um pouco de água, Prometeu moldou e


criou o primeiro homem. A imagem e semelhança dos deuses, do barro ele moldou uma
legião dessas figuras e com o ar de seus pulmões, Prometeu lhes deu vida. Terra, água e
ar, mas faltava ao homem conhecimento. Mesmo vivos e dotados de espírito, os homens
tinham olhos, mas não enxergavam o que viam, tinham ouvidos, mas não compreendiam os
sons, como vultos em um sonho andavam sem propósito e sem direção. Faltava ao homem
o fogo da consciência. Prometeu então, subiu até o monte olimpo e ascendeu em uma
tocha o sagrado fogo dos deuses. (Tira a ânfora e põe no chão) Desceu e entregou o fogo
dos deuses aos mortais. Esse fogo se tornou a fonte de todas as artes, racionalidade e
consciência. (Tira o fogo da ânfora e põe no pilar ao fundo) Mas as consequências de tal
ato, foram extremamente severas para Prometeu e toda a humanidade.

(Canta)

Aos olhos Imortais de Titã,


os Sofrimentos da mortalidade,
vistos em sua realidade triste,
pelos deuses não são desprezados;
Qual foi a recompensa de tua Piedade?
um sofrimento silencioso intenso;
o Rochedo, o abutre e a corrente;
toda dor que atinge os orgulhosos;
a agonia que eles não exibem;
Ô sufocante sofrimento da desgraça.
teu Divino crime foi ser bom;
foi servir com teus preceitos menos
a soma das misérias humanas,
e fortalecer o homem com sua própria mente.
e, confundido como tu foste pelo alto,
ainda assim, na tua enérgica paciência,
na resistência e na repulsão
de teu espírito impenetrável,
que a terra e o céu não puderam abalar,
Uma poderosa lição herdamos nós.

[ CENA 03 ]

(Põe a máscara do Prometeu, põe os homens de barro)


Prometeu - Ó divino éter! Ó sopro alado dos ventos! Regatos e rios. Ondas inumeráveis que
agitais a superfície dos mares! Ó terra, mãe de todos os viventes e tu, ó sol, cujo olhar que
tudo vê aquece a natureza! Eu os invoco. Vede o sofrimento que recebe um deus entre os
deuses. Vede a que suplício ficarei sujeito durante milhares de anos. E que hediondas
cadeias o senhor dos imortais mandou forjar para mim. (Vai pro chão e constrói bonecos
de barro) Oh eis me a gemer pelos males presentes e pelos males futuros. Quando virá o
término de meu tormento? Ora, mas que digo eu? O futuro não tem segredos para mim,
nenhuma desgraça imprevista me pode acontecer. Não sei eu por acaso que é inútil lutar
contra a força da fatalidade?
Mas assim como não me era incerto o futuro que hoje vivo, em consequência do que fiz,
não me é incerto o futuro que me aguarda. Há de vir o meu salvador! E é preciso que eu
suporte com resignação esta injusta punição.
Pois o maior crime não é dar o fogo dos deuses aos mortais. não. o maior crime que
eu possa ter cometido foi ter desafiado a autoridade de Zeus. (Levanta e vai pro fundo em
diagonal) Foi esse o meu maior crime. Outro crime talvez tenha sido amar a humanidade
que criei do barro com as minhas próprias mãos e o ar de meus pulmões. (Volta pro
proscênio mas fica em pé)
E esta é a punição de Prometeu! Se ver preso por indissolúveis cadeias a este
inóspito rochedo. Hora exposto a fúria das tempestades hora vendo o sol nascer apenas
para que seus raios ofuscantes possam me queimar lentamente. Sem sono, sem repouso,
oprimido ao peso de uma dor perene pois sequer nasceu o meu libertador. Melhor seria que
me jogasse as profundezas do tártaro, do próprio inferno de Hades, destinado aos mortos e
prendendo-me por indestrutíveis e cruéis cadeias, lá no fundo onde nem os deuses e nem
os mortais pudessem se alegrar com isso. Melhor seria isso do que a punição que estou
fadado. E que obscuro senso de humor tem Zeus, o novo senhor dos imortais. Mandar
todos os dias a águia, que é o símbolo de seu poder e imponência a devorar meu fígado
apenas para que este se regenere durante a noite e a águia retorne no dia seguinte com
sua fome insaciável. Não basta me prender a estes grilhões, precisa o próprio Zeus em
forma de águia me visitar e comer meu fígado pela eternidade para rir da minha desgraça.

(Entra som da águia -


Tira a máscara do Prometeu coloca na frente lado da ânfora e os homens de barro na
alça do lado esquerdo - Tira a máscara de Ethon de dentro da ânfora, veste, dá uma
volta nela e para no proscênio;)

[ CENA 04 ]

Ethon - Prometeu sempre se faz tamanha vítima da história, mas esquece que a princípio
Zeus havia permitido que Prometeu entregasse o fogo dos deuses aos mortais, mas então
ele cometeu outra grande falta que cometeu contra Zeus. Em uma oferenda ao rei dos
deuses, Prometeu dividiu um boi ao meio sendo que metade caberia aos homens e a outra
metade a Zeus. Na primeira metade estavam as carnes e as vísceras, cobertas com o
couro. Na segunda, apenas ossos, cobertos com a banha do animal. E Zeus sendo atraído
pela banha, escolhe os ossos achando que aquela era a melhor carne. Que desonra ao rei
dos deuses. Apesar de tamanho crime, Zeus não puniu Prometeu, apenas… retirou o fogo
dos deuses da posse dos homens, algo justo. No entanto, quando Prometeu novamente
roubou o fogo dos deuses para dar aos mortais, ah, ele passou dos limites… Prometeu
precisa se colocar em seu lugar. Mas ele permanece preso às rochas por escolha própria,
pois Zeus o libertaria em um instante se lhe revelasse o que sabe. Por isso… Hmm… Está
na hora de… Incentivar Prometeu a falar….

(Vai até o lado direito da ânfora tira a máscara da Ethon, segura na mão, pega a
máscara de Prometeu na mão e vai pra frente da ânfora)

[ CENA 05 ]

Narrador - E mais um dia Ethon, a devoradora de fígados, cumpre sua tortura contra
Prometeu a mando de Zeus.

Ethon - Olá velho amigo!

Prometeu - Não somos amigos.

Ethon - Isso é jeito de receber o único que vem lhe visitar em milênios?

Prometeu - Me visitar todos os dias não nos faz amigos, muito menos quando a visita vem
para devorar meu fígado e me chantagear.

Ethon - Mas que grosseria, Prometeu. Nos últimos 3 milênios você parecia estar bem mais
tranquilo, conformado com o destino que escolheu.

Prometeu - Não escolhi estar acorrentado às rochas, Ethon, devoradora de fígados.

Ethon - Mas escolheu bem a atitude que o fez chegar aonde está.

Prometeu - Por que não vens apenas comer meu fígado e vai-te embora? Estou bem ciente
das minhas escolhas.

Ethon - Sabe que podes ser libertado, Prometeu, minha fome é insaciável e de fato as
entranhas de um titã tem um gosto muito atrativo, mas sabes, que não faço isso por
vontade própria, são ordens de Zeus.

Prometeu - Pois então cumpre tuas ordens, capacho.

Ethon - Prometeu, meu caro Prometeu… Comer teu fígado não basta. Quero comer tua
mente. hahahaha

(Põe a máscara da Ethon em cima da ânfora e vai pro proscênio com a máscara do
Prometeu na mão)

[ CENA 06 ]

Prometeu - Mas Zeus apesar de seu colossal orgulho, ele há de ser coagido a recorrer a
mim, para saber qual a próxima conspiração que o arrebatará do trono dos imortais. Mas
em vão há de empregar as mais terríveis ameaças contra mim. Não, não lhe revelarei tal
segredo enquanto não houver rompido estas correntes e consentido em reparar tal injúria.
Zeus é rígido e bem o sei, para ele, sua vontade é o mesmo que justiça. No entanto, na
iminência de golpes imprevistos a ele, essa sua cólera indomável há de se aplacar. Assim
ele há de procurar meu socorro e minha amizade, bem o sei. Zeus há de me procurar sim,
ele há de me procurar. Não por nada que me chamo Prometeu, aquele que vê antes. Assim
como Zeus destronou seu pai Cronos, Zeus também será destronado.

(Tira a máscara da frente do rosto, coloca na alça esquerda da ânfora, coloca a


máscara de Ethon na alça direita e depois vai para o proscênio pegar a carta do
imperador)

[ CENA 07 ]

Narrador - Zeus, no tarô mitológico, representa o imperador. A carta do imperador simboliza


o poder e autoridade. Para os deuses não existe bem e mal, e Zeus, como rei dos deuses,
também podia ser tanto bom, quanto um tirano. A história de Zeus começa antes do início
dos tempos.

[ CENA 08 ]

(Vai até a ânfora, vira de costas e tira o tecido)

Narrador - Antes da criação, o caos pairava sobre o abismo, o caos era o deus primordial,
de loucura e confusão onde havia a semente de todas as coisas. Até que do caos surgiu a
primeira deusa: Gaia, nossa mãe terra.
Gaia sentiu o desejo por um companheiro, então de si mesma, gerou e gestou sozinha, um
filho que seria seu amante, Urano, o céu estrelado. Da união entre Gaia e Urano, surgiram
os titãs, os primeiros deuses. No início, não havia separação entre o céu e a terra, Gaia e
Urano viviam grudados, tanto que seus filhos sequer tinham oportunidade de sair do ventre
de mãe Gaia. Até que Gaia arrancou de seu próprio corpo, um veio de metal cinzento, com
o qual forjou uma foice, a primeira arma, jogou aos seus filhos e Cronos, o titã do tempo
apanhando a arma, castrou o próprio pai e jogou sua genitália no mar. Urano fugiu para as
alturas, nunca mais voltou a se deitar sobre sua amada terra, mas enquanto fugia, lançou
contra cronos e todos os titãs a terrível maldição de que eles um dia seriam punidos por
erguer a mão contra seu pai.
Cronos então, casou com sua irmã Réia e tornou-se rei dos titãs, tiveram então 5
filhos, mas Cronos, deus do tempo, avisado de que um de seus filhos o derrotaria, engolia
um por um, assim que ele nascia. Tal como o tempo nos devora lentamente. Para salvar o
seu sexto filho, Réia enganou Cronos, dando-lhe uma pedra enrolada em roupa de bebê e
escondeu a criança entre as Ninfas, que a criaram em segurança. Esta criança era Zeus.
Quando cresceu, Zeus regressou a casa de seu pai e libertou seus irmãos. Uma longa e
feroz batalha então teve lugar e os deuses mais novos saíram vitoriosos. Os Titãs foram
banidos para o Tártaro, a mais profunda prisão. Zeus ficou como Senhor dos Céus e rei de
todos os deuses.

(Tampa a ânfora com o tecido - Pega as máscaras de Prometeu e Ethon na mão e fica
atrás da ânfora)
[ CENA 09 ]

Prometeu - Zeus se tornou rei dos deuses sim, mas foi apenas graças a mim e aos meus
conselhos que Zeus pôde derrotar os titãs, pois não foi através da força, mas da astúcia de
que os deuses conquistaram a vitória. E após tamanho serviço, eis o prêmio que me
recompensou o tirano do céu.

Ethon - Mas poderás ser recompensado agora, Prometeu. Zeus me manda para negociar
sua liberdade.

Prometeu - Ah Ethon... Somente quem é livre pode negociar. A liberdade não é algo que
pode estar em negociação.

Ethon - Se revelares a Zeus o que sabe, estarás liberto.

Prometeu - Estarei liberto destas correntes, mas ficarei preso a uma cadeia ainda mais
asquerosa. A vontade de Zeus.

Ethon - E seria assim tão ruim? Deixar de lado teu orgulho e simplesmente servir a Zeus?
Ele é o rei dos deuses e merece subserviência.

Prometeu - Meus motivos são maiores do que Zeus.

Ethon - E quais seriam esses motivos? Há! Os homens?

Prometeu - Desde que os criei Zeus apenas pensou em dizimá-los. Por medo. Medo que os
homens se tornassem maiores que os deuses!

Ethon - Hoje você estava particularmente delicioso Prometeu, obrigada mas pense bem, é
graças aos homens, tu se vês obrigado a suportar o peso destas correntes.

(Coloca a máscara da Ethon na alça direita e traz a de Prometeu pra frente do rosto)

[ CENA 10 ]

Prometeu - Graças a Zeus estou preso a estas cadeias, não aos homens. Tudo o que fiz foi
protegê-los. (Veste a máscara de Prometeu) Somente o fogo dos deuses os permitiriam
sobreviver. E se Zeus não o cedia aos homens, eu os dei, honrando o seu direito, tendo
sido feitos a imagem e semelhança dos deuses. Por isso sofro esta injusta punição.
E como se não bastasse punir a mim, Zeus puniu também a toda a humanidade. (Vai para
o proscênio se relacionar com os bonecos de barro ajoelhado) Quando o caos se
acalmou e foram separados os rios das porções de terra, surgiram os animais e eu senti
que faltava algo… Uma animal mais nobre… Então, do barro, da água e do ar, criei o
homem, a imagem e semelhança dos deuses. Diferente dos outros animais, dei ao homem
uma postura ereta, de tal modo que enquanto os outros animais apenas voltam sua face
para baixo, o homem poderia admirar as estrelas, admirar algo além do que há nessa
matéria. No início, contemplei os homens com o dom da clarividência, assim como eu, eles
podiam ver qual era o seu destino. Mas vislumbrar a própria mortalidade fez muitos homens
enlouquecerem. Eu só queria protegê-los, acreditei que ao saber seu destino eles poderiam
ser mais cautelosos, mas ver a própria morte os paralizava. Por isso, decidi retirar esse dom
dos homens, e buscar um dom mais adequado. Apenas alguns permaneceram com o dom
da clarividência. E então entra nessa história, meu irmão epimeteu… Ah, Epimeteu… Bem
merece o nome que recebeu. É um tolo.

(Tira a máscara e põe no chão ao lado direito)

[ CENA 11 ]

Narrador - Se você não sabe falar grego o nome Epimeteu, significa aquele que vê
depois. Como havíamos mencionado, Prometeu significa aquele que vê antes e Epimeteu...
só vê depois que a burrada já foi feita. E foi justamente isso que aconteceu… mais de uma
vez. Epimeteu foi incumbido da tarefa de presentear a TODOS, todos os animais da terra
com dons necessários à preservação de cada espécie. Deus asas á uns, garras a outros,
chifres a outros... Mas acontece que ele foi tão generoso em ceder esses dons aos
animais, que quando chegou a vez dos humanos de receberem algum Dom, não havia
sobrado mais nada. O homem estava completamente desprotegido.
Prometeu então roubou o fogo dos deuses e entregou aos mortais. Foi graças a esse dom
que o homem se tornou muito mais capaz que os outros animais. (Pega a máscara de
Ethon e põe do lado oposto a máscara de Prometeu) Zeus não gostou nada disso
quando descobriu e decidiu punir a Prometeu e a toda a humanidade.

[ CENA 12 ]

Narrador - A carta da estrela, é a carta da esperança, a estrela é representada pelo mito da


caixa de Pandora que na versão original, não era uma caixa, mas sim um jarro.

[ CENA 13 ]

Quando Prometeu criou os homens, ele criou apenas os homens, não havia criado a
mulher, imagina o mundo inteiro só com homens, um nojo. Zeus foi quem criou a primeira
mulher, que se chamou Pandora. Os deuses a presentearam com diversos dons, o da
beleza, o das artes, e também a persuasão e curiosidade. Curiosidade, foi essa a
característica que condenou Pandora e toda a humanidade. Pandora foi deixada à porta da
casa de Epimeteu, que se apaixonou perdidamente por ela. E eles se casaram e os deuses
mandaram como presente de seu casamento, um grande jarro de azeite ricamente
trabalhado com lindas imagens e uma rolha que o lacrava. (Gira a ânfora, revelando o
outro lado dela) Junto do jarro, estavam as instruções que diziam que o jarro não deveria
ser aberto em hipótese alguma, e era apenas para ser admirado.
Mas pouquíssimos dias se passaram e Pandora já se corroía de curiosidade para abrir o
jarro, apesar dos alertas de Epimeteu para não abri-lo.
Mas a curiosidade falou mais alto e ela não conseguiu se segurar. (Entra trilha)

(Tira o tecido da ânfora e pega os swing pois de dentro, gira eles por um tempo -
baixa o volume da trilha)
Logo que abriu o jarro saíram dali miríades de pragas sobre os homens, saíram do jarro
todos os males que hoje vos afetam, doenças de todos os tipos, inveja, despeito, vingança,
egoísmo. Os males do corpo e do espírito passaram a assolar o homem. (Sobe trilha -
movimenta mais os swing pois - trilha baixa)

Assustada, logo depois que abriu o jarro se apressou a fechar. Mas infelizmente, todo o
conteúdo já havia se espalhado, restando apenas no fundo do jarro,(Para de mover os
swing pois) a esperança. (Olha pra dentro da ânfora - Efeito sonoro)
Você pode me perguntar o que a esperança estava fazendo em um jarro repleto de coisas
maléficas. (Desliga as luzes dos swing pois e os coloca nas alças da ânfora) Não sei
dizer ao certo. Talvez seja porque a esperança é a última que morre.
Ou porque Zeus tem senso de humor e quer ver os homens com esperança de que irão se
recuperar de seus males sendo que ele sabe que no fim todos vão para o mesmo lugar.
Depois disso a humanidade que vivia em inocência e felicidade começou a decair em
injustiças, estouraram guerras e a terra ficou encharcada pelo sangue dos massacres e
novamente Zeus estava insatisfeito com os homens.
E desta vez decidiu exterminá-los de vez. E qual foi sua brilhante idéia? Afogar todo o
mundo. Literalmente. Ele resolveu inundar o planeta, enviando um dilúvio. (Pega o tecido e
cobre a ânfora - Pega a ânfora e gira ela pro fundo do palco) E as águas varreram cada
pedaço de terra e tudo o que havia sobre ela até que o mundo todo se tornou um grande
mar, sem litoral. Quase toda a vida na terra havia sido exterminada pela água. (Vai pra
frente da ânfora e conta sem ações)
Mas Prometeu já havia previsto que Zeus tentaria contra os mortais, então antes do dilúvio,
disse a Deucalião, que era filho de Prometeu, um homem justo e a sua esposa, que era filha
de Epimeteu e Pandora, Pirra, uma fiel adoradora dos deuses, que eles deveriam construir
uma arca, e por lá um casal de cada espécie de animal.
Sim, ainda estamos falando de um mito grego. Eles então construíram a arca e
sobreviveram ao dilúvio. Quando as águas baixaram, a arca pousou no monte Parnaso,
onde havia um grande oráculo. (Pega as máscaras e coloca na ânfora)
Deucalião e Pirra entraram no templo do oráculo para buscar orientações do que fazer em
seguida, e o oráculo os disse para sair do templo e jogar para trás de si os ossos de sua
mãe. Então eles saíram do templo e jogaram para trás de si, inúmeras pedras, os ossos de
sua mãe terra. Cada uma das pedras que Deucalião jogava para trás de si, se transformava
em um homem e cada pedra que Pirra jogava, se transformava em uma mulher. Assim,
muito rapidamente a terra estava novamente povoada.

[ CENA 14 ]

Narrador - A carta da roda da fortuna fala da força invisível do destino atuando sobre
nossas vidas. A roda da fortuna é representada pelas Parcas, que são deusas 3 deusas
que tecem a teia do destino. Nem os deuses podem mudar o destino que as Parcas
determinaram.
O destino não vem ao nosso encontro, somos nós que nos dirigimos a ele, mesmo sem
saber. Mas não falaremos das Parcas, a roda da fortuna vem pra contar a história de Ío,
uma mulher que sofreu com o destino pelas parcas e foi amaldiçoada pelos deuses a
viver em forma de novilha e vagar sem rumo, fugindo do moscardo que lhe aferrava a
carne.
(Entra trilha - Coloca a máscara da Io e sobe na pilastra)

[ CENA 15 ]

Ío - Que país será este? Quem o habita? A quem vejo ali, acorrentado aqueles
rochedos gelados que sofre às intempéries, que crime teria cometido para se encontrar
em tal aflição, como sofro eu com meu perseguidor e minha maldição. Oh Zeus! De que
crime fui culpada para sofrer tão triste sorte? Por que queres torturar uma infeliz que
perdeu a própria consciência a vagar sem descanso? Por que não me aniquila com teu
raio ou me joga aos monstros marinhos para acabar de vez com este sofrimento?
Quando, quando virá o término de meu tormento? (ferroada do moscardo) Oh céus! Oh
deuses, como sou desgraçada! Já o moscardo vem me fere de novo! Ele sai dos
infernos para me perseguir, para me obrigar a fugir, faminta por estas terras sem fim.

[ CENA 16 ]

(Entra Io - Partitura de Caminhada, Ataques do Moscardo e Quedas)

[ CENA 17 ]

(Põe as duas máscaras nas mãos)

Narrador - Apesar do destino terrível de Io, sua sorte começava a se transformar pois
seu destino estava cruzado com o de Prometeu.

(Faz o movimento rotatório durante o diálogo)

Prometeu - Ó Ío, filha de Inácio, sofreste tu também a injustiça que vem dos deuses.
Que bela donzela eras antes de ser transformada em uma novilha pelo próprio Zeus
que te desejava.

Ío - Como sabes de toda minha história? Quem és tu que sabes o nome do meu pai e a
que suplício me encontro? Sabes tu como posso cessar meu sofrimento?

Prometeu - Lhe direi com franqueza tanto quanto desejas saber. Aqui fala Prometeu, o
dador do fogo dos deuses aos homens.

Ío - Ó benfeitor aparecido a toda humanidade. A que pena estás a cumprir acorrentado


ao caucaso?

Prometeu - Ao crime de ser bom e revelar a consciência aos homens.

Ío - E como se decorreu tal fato?


Prometeu - O que disse, já te basta. Mas conte-me, porém, Ío, a história de teu
sofrimento e do infortúnio que a persegue.

(Faz troca de máscara frontal)

Ío - Em meu retiro virginal, Zeus em sonhos, com sua voz insidiosa me dizia: Ó ninfa
ditosa, por que insiste em conservar sua virgindade se pode realizar as mais gloriosas
núpcias? Por ti, arde Zeus, na chama do desejo. Contigo ele quer fruir os prazeres do
amor. Cede ao olhar de um deus que te adora. Pobre de mim! Tais eram os sonhos que
me perseguiam todas as noites. Como não cedi ao desejo de Zeus, meus traços se
alteraram: cresceram estes chifres em minha fronte e um moscardo me fere com seu
ferrão agudo expulsando-me de um país a outro. Eis a minha sorte. E visto que sabes o
que ainda me resta a sofrer, diz-me eu te peço.

Prometeu - Ao saíres deste lugar, dirigirás os teus passos para as portas do oriente, teu
caminho te levará ao Egito. Nos próprios areais que o nilo banha, acariciando-te, Zeus
irá te restituir a razão E terás um filho dele.

Ío - Oh, céus! Como sou desgraçada!

Prometeu - De ti, Ío, uma numerosa geração sairá. E então, Zeus para seu mal, tomará
uma esposa que o fará arrepender-se. Ela dará à luz a um filho mais forte que seu pai.

Ío - E Zeus não poderá evitar este golpe?

Prometeu - Não… Antes que isso aconteça estarei livre destas correntes.

(Movimento de máscara em cima e máscara embaixo, na frente do corpo)

Ío - E quem virá te libertar?

Prometeu - Um de teus descendentes. É o que há de acontecer.

Ío - Um de meus filhos virá dar fim a teus sofrimentos?

Prometeu - Sim, o terceiro que nascer, depois de dez gerações. Daí surgirá um
poderoso herói, que com suas flechas, dará fim ao meu tormento.

som de mosquito

Ío - Céus! Um novo acesso, um novo furor me inflama! O moscardo novamente fere-me


com seu ferrão ardente. A loucura me arrebata, a língua já se recusa a obedecer e… a
razão luta em vão contra um vendaval de insanidade. (sai)

(Entra trilha)
[ CENA 18 ]

(Entra OFF - Organiza a cena para próxima cena)

O próprio mundo é uma prisão, um mundo onde um olho vale um olho é um mundo fadado
a cegueira. De que adianta tantos acorrentados se todos nós já estamos presos a prisão da
carne? Não apenas a prisão da carne, mas a cadeias que o próprio homem forjou para si
mesmo, para não sentir que está preso, o homem nasce livre, mas ainda sim, por toda a
parte, vive acorrentado, pois a prisão não são apenas as grades, nem a liberdade é a rua,
existem homens presos nas ruas e homens livres na prisão, é tudo uma questão de
consciência. A mente é a mais obscura das prisões, onde o homem aferra às próprias
crenças e ideias a dogmas estabelecidos por terceiros, mas eu prefiro morrer de pé, a viver
ajoelhado, pois os grandes só parecem grandes aos olhos de quem está de joelhos.

[ CENA 19 ]

(Pega as máscaras de Ethon e Prometeu e as manipula nas mãos)

Ethon - Ah, meu caro Prometeu… Por que insistes em tamanha teimosia de se negar a
estar do lado de Zeus. Mesmo após suas transgressões, Zeus estaria disposto a perdoar.

Prometeu - Hahhaha Eu conto cada dia que estou preso às rochas, cada segundo, e depois
de mais de 10 mil anos na situação em que me apresento, tu vens me dizer que é Zeus
quem tem que me perdoar.

Ethon - Se não tivesse cometido tamanhos crimes contra Zeus, o próprio teria cedido o fogo
dos deuses aos homens.

Prometeu - Zeus apenas se preocupa em manter-se no poder. Ele não cederia o fogo dos
deuses aos homens sabendo que este fogo traria poder aos homens. Zeus quer se manter
como soberano a qualquer custo.

Ethon - Talvez você não entenda as atitudes e os métodos de Zeus, mas existem motivos
para que ele permaneça no poder.

Prometeu - Mas não permanecerá por muito tempo. Os homens podem não ser tão
poderosos quanto os deuses agora, mas um dia serão.

Ethon - Você superestima os homens,


Prometeu.

(Guarda máscara de Ethon e veste a de Prometeu)

[ CENA 20 ]
Prometeu - E você subestima. Os homens são minha criação e eu os quero ver prosperar,
crescer. Para isso eles enfrentarão muitas provações e altos e baixos. Mas eu sei, eu sei
que tudo valerá a pena. Cada minuto das dores lancinantes que senti e sentirei, assim como
a dor que cada homem sentirá ao longo de suas vidas valerão a pena, pois a humanidade
vale a pena, eu acredito neles, eu acredito que podem fazer coisas grandiosas e
maravilhosas, não só acredito, eu sei. Por isso venha, devoradora de fígados, dilacera-me a
carne para que esta cresça novamente e tu voltes, até que nem eu, nem tu estejamos mais
aqui. Nada é eterno. 20 ou 30 mil anos não são nada para um titã. Minha fé e esperança me
mantêm, assim estarei vivo dentro de cada homem que não se sujeita às injustiças. E
nunca, NUNCA entregarei meus segredos a Zeus, insista o quanto quiser, enquanto
tamanha injustiça contra um deus igual aos outros deuses não for reparada, resignado
aguentarei todas as dores até que chegue meu salvador, pois sei que chegará.

[ CENA 21 ]

(Imagem poética da Esperança)

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