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2024 - MARÇO

RELATÓRIO
Situação dos povos indígenas e
comunidades tradicionais afetadas por
ações da Empresa ENEVA nos
municípios de Itapiranga e Silves.

350.ORG/RESISTENCIA-AMAZONICA
SUMário
índice

INTRODUÇÃO 03

PROCEDIMENTOS 04

CONTEXTUALIZAÇÃO DAS COMUNIDADES AFETADAS 06

AUSÊNCIA DA CONSULTA PRÉVIA AOS POVOS INDÍGENAS E 10


COMUNIDADES TRADICIONAIS

O ARGUMENTO DA INEXISTÊNCIA POVOS INDÍGENAS NA REGIÃO 12

IMPACTOS NEGATIVOS NAS COMUNIDADES INDÍGENAS 21

TRANSFORMAÇÕES NA VIDA COTIDIANA E CONFLITOS 27


SOCIAIS

INDÍGENAS ISOLADOS 30

IMPACTOS LOCAIS NAS COMUNIDADES TRADICIONAIS 34


RIBEIRINHAS

CONSIDERAÇÕES FINAIS 44

TRANSIÇÃO ENERGÉTICA NA AMAZÔNIA: RUMO A UMA 46


ABORDAGEM JUSTA E POPULAR

CONCLUSÃO 48

REFERÊNCIAS 51

ANEXOS 52
Introdução
O Brasil, com sua riqueza cultural e biodiversidade, é lar de uma
miríade de povos indígenas e comunidades tradicionais cujas
vidas estão profundamente entrelaçadas com o ambiente ao
seu redor.

Nos municípios de Itapiranga e Silves, no coração da Amazônia,


essas comunidades mantêm um modo de vida ancestral,
preservando não apenas suas tradições, mas também a
harmonia com a natureza que as cerca.

No entanto, a chegada da Empresa ENEVA trouxe consigo uma


série de mudanças significativas nesses territórios. As
operações e intervenções da ENEVA nessas regiões têm
impactado diretamente as dinâmicas sociais, culturais e
ambientais dessas comunidades. O presente relatório busca
analisar de forma abrangente e crítica os efeitos das ações da
ENEVA sobre os povos indígenas e comunidades tradicionais,
enfocando os desafios e impactos causados por suas
atividades.

As informações presentes neste relatório são: comunidades


indígenas não consideradas na licença ambiental, falta de
consulta às comunidades, impactos socioambientais sofridos
nos territórios, discussão da atribuição de licenciamento
estadual ou federal- precisa ser incluída, o Argumento de que
não existem Povos Indígenas na região.
procedimentos
Procedimentos Científicos na Investigação dos Impactos
da Exploração de Gás em Silves e Itapiranga
Na condução desta pesquisa, foram adotados procedimentos científicos
rigorosos para compreender os impactos da exploração de gás nas regiões de
Silves e Itapiranga. As atividades realizadas seguiram uma metodologia que
incluiu diversas etapas, destacando-se:

1. Planejamento e Logística da Viagem 4. Envolvimento com Lideranças


Locais e Indígenas
Deslocamento para Silves: No primeiro dia,
a equipe viajou para Silves, onde pernoitou, Reuniões com Lideranças: A equipe buscou
preparando-se para as atividades de o envolvimento de líderes locais, como o
campo. Cacique Jonas Mura, para entender as
perspectivas das comunidades e obter
informações mais aprofundadas.
2. Coleta de dados nas Comunidades Presença em Aldeias Indígenas: A pesquisa
indígenas e ribeirinhas estendeu-se às aldeias indígenas, como
Gavião Real 1, buscando compreender os
Apoio Local: A equipe buscou apoio local, impactos nas comunidades tradicionais.
contando com a presença de agentes
pastorais da CPT para orientação e 5. Investigação de Estruturas e
facilitação das interações nas Atividades da ENEVA
comunidades.
Deslocamento para Estruturas de
Visitas Programadas: As comunidades Perfuração: A equipe empreendeu
foram visitadas conforme um cronograma esforços para investigar de perto as
preestabelecido. estruturas de perfuração e atividades da
ENEVA, incluindo o registro de máquinas e
Declarações e Informações: Em cada operações no local.
comunidade, foram obtidas declarações e
informações relevantes por meio de Entendimento Ambiental: Durante a
entrevistas estruturadas, visando capturar investigação, foram coletadas informações
as experiências e percepções dos sobre alterações ambientais, como
moradores locais. mudanças na coloração da água e impactos
na fauna.
3. Registro de dados geoespaciais
6. Reuniões e Troca de Informações
Utilização de GPS: Para uma análise com a População
geoespacial precisa, pontos de GPS foram Reuniões Comunitárias: Foram realizadas
registrados em locais estratégicos, como reuniões comunitárias para compartilhar os
portos, residências e áreas de perfuração objetivos da pesquisa, explicar o propósito
dos poços. da visita e coletar informações sobre os
impactos percebidos.
Plotagem de Mapas: Com base nos dados
de GPS, foram plotados mapas para Troca de Experiências: A equipe buscou
visualizar a distribuição geográfica dos compreender as experiências das
pontos relevantes na pesquisa. comunidades, incluindo aspectos sociais,
territoriais, econômicos e culturais.
Documentação e Relatórios

Registro Fotográfico: Durante as visitas, foram tiradas fotografias para


documentar visualmente as condições locais, estruturas da ENEVA e
qualquer evidência relevante.

Relatório Detalhado: Com base nos dados coletados, iniciou-se a


elaboração de um relatório detalhado, visando compilar todas as
informações de forma organizada.

Esses procedimentos permitiram uma abordagem científica abrangente,


considerando as diversas perspectivas e impactos relacionados à
exploração de gás nas regiões em questão. O rigor metodológico adotado
contribui para a confiabilidade e validade dos resultados obtidos.

Impactos Soc ioambientais e Desafios e P erspectivas


Culturais Futuras
O relatório abordará detalhadamente os Além de expor os impactos, o relatório
impactos socioambientais, territoriais e se propõe a discutir os desafios que
culturais dessas atividades. Isso incluirá uma essas comunidades enfrentam no
análise das mudanças na ecologia local, as contexto das atividades da ENEVA e
consequências para a subsistência das explorar possíveis perspectivas para
comunidades, a interrupção de práticas mitigar esses impactos negativos. A
tradicionais, e os efeitos psicossociais sobre busca por alternativas sustentáveis e
esses povos diante das mudanças em seu soluções que promovam a coexistência
modo de vida. harmoniosa entre a preservação
cultural e ambiental e o
desenvolvimento econômico será um
dos pontos desta análise.

Este relatório foi produzido por


membros da Rede Resistência
Amazônica(1).

(1) Resistência Amazônica é uma rede de organizações da sociedade civil que atuam contra a
exploração predatória da Amazônia e por Justiça Climática. No Amazonas é composta por
ASPAC, CPT, GTA, IPDA, Alternativa Terrazul, 350.org Brasil, além de outras lideranças de
Movimentos sociais, indígenas, acadêmicos, ambientalistas e pesquisadores.
Contextualização das
Comunidades Afetadas

Para a elaboração deste relatório um grupo de ativistas


socioambientais da região, com apoio do Grupo de Trabalho Amazônico
- GTA e da organização ambiental 350.org realizaram visitas em agosto
de 2023 para verificar in loco a situação das comunidades impactadas
por perfurações e construções da empresa ENEVA nos municípios de
Silves e Itapiranga visando a exploração de gás natural.

Como povos Indígenas e populações tradicionais, entende-se aquelas que


geracionalmente usam de suas estratégias culturais, no uso e na ocupação
da terra de um determinado lugar ou território com equilíbrio e
sustentabilidade do uso da biodiversidade.

Para Louzada (2014), essas populações tradicionais são aquelas


etnicamente diferentes das sociedades nacionais dominantes dos países
onde vivem, haja vista a forte relação diferenciada com o sistema natural
à sua volta.

Para Vianna (2008), as populações tradicionais formam um conjunto de


pessoas residentes em um lugar, detentoras de uma relação direta com a
natureza, por meio do uso dos recursos naturais, de atividades
extrativistas e/ou agricultura com tecnologia de baixo impacto no
sistema ambiental.

Destacam-se nessa categoria: pescadores artesanais, pequenos


agricultores, caiçaras, caipiras, camponeses, extrativistas, pantaneiros,
ribeirinhos e coletores.

Essas populações tradicionais, devido a relação e ao contato direto com a


biodiversidade produzindo relação de equilíbrio e sustentabilidade, tais
como:

a adaptação às sazonalidades ambientais,


o etno conhecimento de manejo sustentável dos sistemas naturais,
e a condição de produtores de biodiversidade.

As aldeias são as seguintes:


Quadro 01: aldeias indígenas estudadas na região:

população e
aldeia localização histórico e posse de terra município etnia
demografia

32 Chegada após Segunda


2°57'19" S
Mura Carará famílias Guerra Mundial, Silves Mura
58°24'27" W
cadastrada na prefeitura

Morador mais antigo:


26
São 2°59'17" S João Barbosa dos
famílias Silves Mura
Francisco 58°30'26" W Santos, cadastrada na
prefeitura

2°57'50" S 18 O Senhor Pedro Pereira


Santo
58°30'20" W famílias Ramos já mora na aldeia Silves Mura
Antônio
desde 1960

Aldeia estabelecida há
3°1'30" S 13
Lago das cerca de 50 anos, Mura e
58°29'51" W famílias Silves
Pedras chegada de João Gomes Munduruku
dos Santos

2°59'17" S 110 Família do Cacique Jonas


Gavião
58°30'26" W famílias Reis de Castro é o núcleo Silves Mura
Real 1
residencial mais antigo

2°50'12" S 13 Chegada à região por


Gavião
58°38'16" W famílias volta de 1975, vindas do Silves Mura
Real 2
município de Borba

A família chegou no Rio


2º57’44” S 49 Anebá em 1971, vinda da
Vila Sateré
58º29’1”W famílias localidade chamada Silves
Barbosa Mawé
Terra Preta do Limão no
município de Parintins

entre o Rio
14
Uatumã e o
Vila Izabel famílias Itapiranga Mura
Lago do
Inajatuba

Fonte: Resistência Amazônica


Mesmo com a presença real destas comunidades no município de Silves, a
imagem abaixo, (Figura 1) mostram aquelas que foram desconsideradas
pelo poder público e pela empresa ENEVA quando obtiveram, do estado,
as licenças de instalação e operação, numa afronta a legislação e as
convenções da qual o Brasil é signatário.

Neste mesmo rumo, as comunidades tradicionais também foram


totalmente ignoradas no curso do licenciamento e da execução dos
projetos. Destaca-se que as atividades passíveis de concessão e que
atinjam comunidades indígenas devem ter autorização do Senado. Neste
sentido, a legislação brasileira relacionada a concessões e autorizações
para atividades que impactam comunidades indígenas está
principalmente disposta na Constituição Federal de 1988 e na Lei nº
6.001/1973, conhecida como Estatuto do Índio.

O artigo 231 da Constituição Federal de 1988 trata dos direitos dos povos
indígenas e estabelece que:

"São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes,


línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as
terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União
demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens."

O artigo 49, inciso X, da mesma Constituição estabelece que é


competência exclusiva do Congresso Nacional (que inclui o Senado
Federal) legislar sobre:

"à criação, funcionamento e processo do juizado de pequenas


causas; (...) e a concessão de terras devolutas."

A concessão de terras devolutas pode envolver áreas habitadas por


comunidades indígenas, e, conforme a Constituição, a competência para
legislar sobre esse tema é do Congresso Nacional. Neste mesmo sentido
vemos que a legislação brasileira trata de áreas ocupadas por indígenas, e
não diz que tem que ser necessariamente a demarcação formal desses
territórios. O reconhecimento se baseia na presença histórica e contínua
dos povos indígenas.
Figura 01: Comunidades Indígenas e tradicionais em Silves

Fonte: Resistencia Amazônica

Também verificar na imagem as comunidades presentes no município de Itapiranga, que também


foram completamente ignoradas pelo Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas e pela empresa
ENEVA no processo de licenciamento, na contramão do que diz a legislação e as convenções da qual
o Brasil é signatário.

Figura 02: Comunidades Indígenas em Itapiranga

Fonte: Resistencia Amazônica


Ausência da Consulta
Prévia aos Povos Indígenas
e Comunidades Tradicionais

A Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT)


representa um marco crucial na proteção dos direitos dos povos
indígenas e das comunidades tradicionais, estabelecendo a obrigação
de consulta prévia, livre e informada em decisões que impactam
diretamente suas vidas e territórios.

No entanto, as obras realizadas pela ENEVA em Silves erguem um


questionamento contundente: a ausência de consulta prévia às
comunidades afetadas.

O município de Silves, conforme figura 1, abriga povos indígenas e


comunidades tradicionais cujas vidas estão profundamente entrelaçadas
com suas terras ancestrais.

Todavia, a execução das obras pela ENEVA neste local sensível ocorreu
sem o devido diálogo e consentimento prévio desses grupos, em
desrespeito flagrante à Convenção 169 da OIT.

A falta de consulta prévia não apenas contradiz os princípios


fundamentais de direitos humanos estabelecidos internacionalmente,
mas também desconsidera a sabedoria ancestral e os conhecimentos
tradicionais dessas comunidades, que muitas vezes detêm um
entendimento profundo e vital sobre o ambiente em que vivem.

A ENEVA, enquanto empresa, tem a obrigação ética e legal de respeitar os


direitos dos povos indígenas e das comunidades tradicionais.

A consulta prévia não é apenas uma formalidade, mas um processo


essencial para garantir o consentimento livre, prévio e informado
desses grupos, reconhecendo sua autonomia e soberania sobre suas
terras e recursos naturais.
A não realização da consulta prévia acarreta consequências
significativas, não apenas do ponto de vista legal, mas também em
termos de impacto social e ambiental. A falta de diálogo pode resultar
em conflitos, perda de identidade cultural, destruição de modos de vida
tradicionais e danos irreversíveis aos ecossistemas locais.
Nesse contexto, é imperativo que as decisões do Instituto de Proteção
Ambiental do Amazonas, IPAAM e a empresa ENEVA sejam analisadas porque
demonstra-se aqui que as ações foram na contra mão da legislação nacional,
pois não houve um processo genuíno de consulta, que garantam, conforme a
legislação vigente a preservação dos direitos e da cultura desses grupos.

Foto divulgação: Políticos do Estado do Amazonas junto a empresários da ENEVA


anunciando áreas de exploração de gás em evento social.

Neste sentido, solicitamos que as autoridades judiciarias e ao - IBAMA -


Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais, que são as
autoridades competentes, que atuem para garantir o cumprimento das
disposições da Convenção 169 da OIT, assegurando que consultas prévias
sejam realizadas em todos os projetos que possam impactar os territórios e as
vidas das comunidades indígenas e tradicionais do estado do Amazonas, pois,
a ausência de consulta prévia como esta que ocorreu em Silves e Itapiranga
com as atividades da ENEVA é uma clara violação dos direitos fundamentais
estabelecidos internacionalmente.

É fundamental que todas as partes envolvidas reconheçam a importância de


atendimento da Legislação vigente, quanto consulta prévia como um princípio
inegociável para a proteção dos direitos humanos, da cultura e do meio ambiente,
visando um desenvolvimento verdadeiramente sustentável e inclusivo para todas
as partes envolvidas.
O Argumento da inexistência
Povos Indígenas na região

O território amazônico da região do Amazonas constitui-se em palco de


embate entre interesses corporativos capitalistas e a preservação dos
direitos dos povos indígenas.

No cerne desse debate, a ENEVA e órgãos públicos municipais e estaduais,


têm empregado um argumento infundado: a inexistência de povos indígenas
na região.

Este argumento é utilizado como artifício para evitar a realização da consulta


prévia e informada, um direito fundamental consagrado pela Convenção 169
da OIT. A visita das organizações locais e nacionais pela região no mês de
agosto, lança luz sobre estas informações.

Foto : Visita técnica às comunidades indígenas e tradicionais | 350 Brasil


Nas visitas às comunidades na região de Silves e Itapiranga o grupo de
entidades revela a presença e a importância significativa dos povos indígenas
em Silves, Itapiranga e áreas circunvizinhas, como demonstrado pelo
documento da Funai de 2015, apresentado na figura 3.

Figura 3: Documento da Funai De 2015 que indica Indígenas em Silves

Fonte: Aldeia Gavião Real


Figura 4: Data de assinatura do relatório da visita de reconhecimento
dos indígenas do Território Gavião Real.

Fonte: Aldeia Gavião Real

A declaração mostrada na figura 3, já traz em si, informações para que a ENEVA


e demais órgãos governamentais reconheçam a presença dos povos
indígenas, garantindo-lhes o direito inalienável à consulta prévia em decisões
que afetam diretamente suas vidas e territórios.

Este não reconhecimento desrespeita não apenas os direitos consagrados


internacionalmente, mas também os anos de estudo e pesquisa que evidenciam
a presença e a importância dessas comunidades na região.

As figuras 1, 2, 3 e 4 deste documento, demonstram clareza sobre o processo


de qualificação do Território Gavião Real, o que comprova pelo menos duas
falhas, ou vícios de origem, no processo de licenciamento, pois mostram a data
06/08/2015 da visita de servidores do Órgão Federal para o reconhecimento
dos povos indígenas, conforme declaração expedida pela Fundação Nacional
do Índio FUNAI Coordenação Regional Manaus (Figura. 3), e a data que o
relatório da visita foi assinado, dia 05/07/2023 (Figura 4).
Ainda como forma de demonstrar a presença dos povos indígenas e a ausência
de consentimento prévio e informado, colocamos aqui apenas o cabeçalho de
declaração, (figura 5) coletadas nas nossas visitas às comunidades indígenas e
tradicionais dos municípios de Silves e Itacoatiara. Não vamos colocar a figura
da página completa, com nomes, sobrenomes e número de documentos, no
sentido de não expor publicamente estes indígenas, que de acordo com alguns
relatos já vem sofrendo ameaças e perseguições. Os documentos completos
serão entregues a Justiça Federal no Amazonas como anexo, para subsidiar
nosso pedido de cancelamento do licenciamento ambiental.

Figura 5: Declaração de Identidade Étnica

Fonte: Resistência Amazônica

Por entender que tanto o empreendimento como o Poder Executivo não


cumprem com a legalidade, é que se recorreu ao Judiciário, para garantir a
presença de comunidades indígenas e tradicionais, e desta forma manter a
proteção dos direitos fundamentais dos povos indígenas. É imperativo que a
ENEVA e os órgãos públicos sejam responsabilizados por suas ações, bem
como promover um diálogo genuíno e respeitoso com as comunidades
afetadas, em conformidade com os princípios estabelecidos pela Convenção
169 da OIT.

Cabe destacar que o poder público sabe da existência de indígenas na região, como
exemplo o atendimento da saúde aos indígenas na região de estudo, em Silves e região,
portanto demonstrando que existe indígenas na região.
Figura 7: Estrutura da SESAI na Aldeia Gavião - Município de Silves

Foto: Cacique Jonas Mura

Figura 8: Estrutura da SESAI na Aldeia Gavião - Município de Silves

Foto: Cacique Jonas Mura


A instituição que é responsável pelos indígenas, Fundação Nacional do Índio (FUNAI),
por intermédio do Ofício Número 1705/2023/DPDS/FUNAI, emitiu uma recomendação
expressa para a suspensão do processo de licenciamento ambiental das atividades
de exploração de gás no Campo Azulão.

O Componente Indígena emerge como uma faceta substancial na Ação Civil


Pública proposta pelas comunidades indígenas de Silves, em colaboração com
a Associação de Silves pela Preservação Ambiental e Cultural (ASPAC) - ACP
1021269-13.2023.4.01.3200 que tramita na 7 Vara Federal Ambiental e Agrária-
Seção Judiciária do Estado do Amazonas.

Esta conjuntura preconiza a imperatividade da necessidade de substituir o órgão


licenciador, transferindo essa responsabilidade ao IBAMA e não mais do Instituto
de Proteção Ambiental do Amazonas (IPAAM) procedendo a suspensão imediata das
autorizações anteriormente concedidas à empresa ENEVA e retomando todo o
licenciamento sob a tutela do órgão federal.

Esta medida cautelar de suspensão do licenciamento aferido pelo órgão


ambiental estadual, deveria permanecer em vigor até que a Eneva efetue uma
revisão abrangente do Estudo de Impacto Ambiental referente ao projeto
original do Campo Azulão, atendendo de maneira integral às prescrições legais
inerentes aos procedimentos de licenciamento ambiental pelo órgão federal.

No âmbito da gestão do licenciamento ambiental, a competência para sua


condução pode ser atribuída à União, Estados ou Municípios. Contudo, os
empreendimentos e atividades localizados ou desenvolvidos em terras
indígenas, são submetidos ao licenciamento por apenas um ente federativo,
sendo o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis (IBAMA) o órgão executor responsável pelo licenciamento
ambiental de competência da União.

A normativa vigente que rege essa distribuição de competências é a Lei


Complementar nº 140/11, mais precisamente em seu artigo 7º, inciso XIV,
complementada pelo Decreto nº 8.437/15. Estas legislações estabelecem os
critérios e categorias de atividades e empreendimento sujeitos ao
licenciamento ambiental do Ibama. Cabe ao Ibama, especificamente, a
responsabilidade pelo licenciamento ambiental de atividades e
empreendimento situados ou desenvolvidos em terras indígenas.
As atribuições da União, por sua vez, estão delineadas no artigo 7º da Lei
Complementar 140/2011, destacando-se a promoção do licenciamento
ambiental de empreendimentos e atividades localizados ou desenvolvidos em
terras indígenas. Nesse contexto, o IBAMA, como órgão executor da União,
assume a execução da política ambiental, incluindo a emissão de licenças e a
fiscalização de empreendimentos nessas localidades.

Ao considerar a caracterização do local de estudo como território indígena,


destaca-se a competência do IBAMA para realizar o licenciamento ambiental
correspondente, conforme preconizado pela Lei nº 6.938/1981 e pela Resolução
CONAMA nº 237/1997. Essa interpretação está alinhada com os preceitos da
Constituição Federal e reflete entendimento jurisprudencial do Superior
Tribunal de Justiça (STJ).

A atribuição de competência do IBAMA não se restringe ao disposto no


artigo 1º da Lei nº 6.001/73, mas é fundamentada na premissa de que as
terras afetadas pelo empreendimento, mesmo que de forma indireta,
impactam áreas indígenas específicas. Tal fundamento encontra
respaldo na Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho
(OIT), nos artigos 5º, XXXV e 231 da Constituição Federal, bem como no
artigo 67 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT).

Neste sentido, propugnamos que a Justiça Federal do Amazonas determine a


transferência da competência para a concessão de licença do
empreendimento "Complexo de Azulão" do Instituto de Proteção Ambiental do
Amazonas (IPAAM) para o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis (IBAMA). Essa proposição, sustentada por
considerações fundamentais, destaca a presença de Terras Indígenas, a
elevada sensibilidade ambiental na região, os impactos ambientais de alcance
transversal estadual, bem como a influência direta sobre o Rio Amazonas e o
Aquífero Alter do Chão, dentre outros elementos contemplados pela
legislação vigente.

Neste ponto, ao falar sobre o Aquífero, temos que refletir com ainda
mais responsabilidade, pois, apesar de sua importância vital, o Aquífero
Alter do Chão enfrenta ameaças significativas.
A exploração de gás na região amazônica envolve a perfuração de poços
profundos em busca de reservatórios de gás natural. Durante esse processo,
uma variedade de produtos químicos é utilizada para estimular a produção de
gás, incluindo fluidos, ácidos e outros agentes químicos. Esses produtos
químicos são injetados nos poços a alta pressão para abrir fissuras nas rochas
e liberar o gás natural retido.

No entanto, a utilização desses produtos químicos apresenta sérios riscos de


contaminação do meio ambiente, incluindo o Aquífero Alter do Chão. Os
vazamentos de produtos químicos durante o processo de retorno a superfície
podem infiltrar-se no solo e alcançar as camadas freáticas, contaminando
assim as águas subterrâneas do aquífero.

Além disso, o retorno do gás natural e dos fluidos utilizados no processo de


exploração também pode infiltrar-se no aquífero, comprometendo ainda mais
sua qualidade e disponibilidade.

Os impactos da exploração de gás no Aquífero Alter do Chão não se


limitam apenas à contaminação química. O aumento da atividade de
perfuração e extração de gás também pode levar à subsidência do solo e
à alteração do fluxo de água subterrânea, afetando assim a capacidade
de recarga e descarga do aquífero.

Além disso, o uso intenso de água durante o processo de exploração do gás


fóssil pode competir com as demandas de abastecimento de água para as
comunidades locais, exacerbando assim os conflitos pelo uso dos recursos
hídricos na região.

Diante desses desafios, é imperativo adotar medidas eficazes para mitigar os


impactos da exploração de gás fóssil no Aquífero Alter do Chão e garantir sua
proteção a longo prazo.

Isso requer uma abordagem integrada que leve em consideração não apenas
os aspectos técnicos e ambientais da exploração de gás, mas também os
aspectos sociais, econômicos e hidrogeológicos.
E voltando novamente a questão indígena, vemos que a subsistência do
Componente Indígena na referida Ação Civil Pública materializa-se como uma
esfera preponderante, sendo seu papel central evidenciado pela colaboração
entre as comunidades indígenas e a ASPAC.

Esta dinâmica ressalta a necessidade premente de ação por parte do


IPAAM, demandando a suspensão imediata das autorizações atribuídas à
ENEVA até a conclusão integral da revisão do Estudo de Impacto
Ambiental do Campo Azulão.

Este procedimento almeja assegurar a conformidade do empreendimento


com as exigências legais inerentes ao licenciamento ambiental, além de
assegurar a aplicação do “Princípio da Precaução”, uma vez que os impactos
das atividades de exploração, construção de dutos, transporte e até a
instalação de uma Termoelétrica, impactarão de forma severa e irreversível
todo o bioma amazônico regional, os afluentes e o Rio Amazonas e a base de
oferta de água potável para a todas as formas de vida e a população.

Paralelamente, a obrigação legal de transferência da competência


para a concessão de licença do "Complexo de Azulão" do IPAAM para o
IBAMA é fundamentada em uma análise abrangente dos fatores
preponderantes.

Destacam-se a presença de Terras Indígenas, a marcante sensibilidade


ambiental na região, os potenciais impactos ambientais transcendentais
às fronteiras estaduais, assim como a influência direta sobre recursos
hídricos vitais como o Rio Amazonas e o Aquífero Alter do Chão.

Estes elementos, meticulosamente previstos pela legislação aplicável,


respaldam a argumentação pela transferência da responsabilidade de
concessão de licença para uma entidade federal, o IBAMA, que apresenta
maior abrangência e expertise para avaliar e mitigar os desafios ambientais
associados ao empreendimento em questão.
Impactos Negativos nas
Comunidades Indígenas
A Presença da ENEVA em Silves e Itapiranga

A presença da empresa ENEVA na região de Silves e Itapiranga tem


desencadeado uma série de impactos negativos nas comunidades indígenas
e tradicionais, especialmente nas aldeias Mura.

A exploração de gás natural, conduzida pela ENEVA, vai além das operações
industriais, infiltrando-se na rotina, tradições e modos de vida das comunidades.

Este contexto apresenta um cenário complexo e multifacetado, no qual as


comunidades indígenas enfrentam desafios ambientais, socioeconômicos e
culturais decorrentes da presença da empresa em sua região.

Vamos lembrar aqui que exploração e produção de gás fóssil em Silves


envolve uma série de atividades, começando com a pesquisa geológica e
sísmica para identificar reservatórios, deslocamento mata a dentro com
grandes estruturas físicas na abertura de ramais e estradas em áreas
sensíveis, construção de plataformas de perfuração, perfuração de poços
exploratórios, construção de infraestrutura para processamento e coleta,
extração do gás fóssil, compressão e o transporte através de caminhões e
projeta-se a construção de gasodutos até as instalações de liquefação.

À medida que o gás é transportado através de caminhões ou outros meios, obras de


engenharia são essenciais para a construção e manutenção dessas estruturas.
As plantas de liquefação, que representam uma parte crucial do processo,
requerem infraestrutura específica, incluindo tanques criogênicos para o
armazenamento temporário do LNG, Gás Natural Liquefeito.

Portanto, não é um processo simples e sem impactos. Estes impactos já


iniciam na prospecção, aumentam durante a instalação e persistem depois na
operação.
A análise a seguir se propõe a explorar detalhadamente os impactos adversos
experimentados pelas comunidades indígenas diante dessa dinâmica,
ressaltando a necessidade premente de uma abordagem consciente e
equitativa para a gestão dessas questões delicadas.

Quadro 2: Impactos ambientais e sociais das interferências no território


- Ruído constante e movimentação intensiva de caminhões
afetando a tranquilidade da comunidade.
1 Impactos
Ambientais - Poluição da água devido às atividades industriais, resultando em
sistemas de purificação forçados

- Redução significativa na disponibilidade de alimentos devido à


escassez de caça e pesca.
Impactos na
2 - Interrupção nas práticas agrícolas e artesanais, levando à perda
Subsistência de identidade cultural e enfraquecimento da economia local.
Tradicional
- Afugentamento da caça e dos peixes, em razão do excessivo
barulho de máquinas, equipamentos

- Divisões na comunidade devido à oferta de empregos pela


empresa, gerando conflitos internos.

- Ofertas de empregos, a maioria temporários e de baixa


Impactos qualificação e remuneração, sem uma política de formação
3 Sociais e técnica de pessoal da região.
Culturais - Aumento das tensões sociais, com acusações de resistência ao
desenvolvimento do município.

- Mudança na dinâmica social, com distanciamento das casas


devido às obras, impactando negativamente as práticas diárias

- Pânico e preocupações com a segurança devido a incidentes


como tombamento de caminhão transportando gás.
Riscos à - Denuncias de incidentes com vítimas nas dependências da
4 Segurança e empresa.
Saúde
- Exposição a riscos associados à queima do gás no local de
extração.

-Perda tangível da identidade cultural devido à interrupção nas


práticas tradicionais e na transmissão de conhecimentos.
Desafios à
Identidade - Assédio de funcionários ou terceirizados ou prestadores de
5 Cultural serviços da empresa, nos territórios tradicionalmente ocupados
pelos indígenas e comunidades tradicionais.

- Necessidade de percorrer distâncias significativas para


garantir recursos alimentares básicos, devido à escassez local.
Deslocamento
6 Forçado - Aumento significativo do custo de aquisição, captura ou coleta
de seus alimentos e insumos para o artesanato.

Fonte: Resistência Amazônica


Impactos Ambientais e
Socioeconômicos

A presença ostensiva da empresa ENEVA no cenário de exploração de gás


natural gera mudanças significativas que transcendem os limites da rotina
diária, permeando a esfera cultural e socioeconômica dos povos indígenas e
comunidades tradicionais que habitam a região, em especial do povo Mura
que é o mais numeroso, embora estejam presentes também os Satere Mawe
e os Munduruku.

Uma das principais preocupações destacadas pelos indígenas e tradicionais


é a presença constante de caminhões na rodovia regional, utilizados para
transporte relacionado à exploração de gás.

O ruído incessante e a movimentação intensiva desses veículos têm acarretado


perturbações significativas na tranquilidade das comunidades, tornando-se uma
fonte constante de incômodo. Em um incidente específico que ilustra a fragilidade
da segurança local, o tombamento de um caminhão transportando gás (houveram
outros) gerou pânico, intensificando a apreensão quanto aos potenciais riscos
associados à exploração de gás natural na região.

Paralelamente, os indígenas ressaltam as transformações na prática da


queima do gás no local de extração, uma alteração que inicialmente suscitou
preocupações devido às explosões e ao fogo associado. A adaptação gradual
da comunidade a essa nova realidade não obscurece a percepção de que tal
mudança impactou significativamente a segurança e a estabilidade
percebida pelos habitantes locais, alterando fundamentalmente a relação de
confiança com o ambiente e produzindo efeitos danosos as suas crenças e
tradições muito respaldada na tradicionalidade das relações e suas
cosmovisões.
Figura 9: Poço de Gás dentro da área de uso dos Indígenas

Fonte: Resistência Amazônica

A influência negativa direta da exploração de gás nas atividades tradicionais


de subsistência, como pesca e caça, é evidente nos relatos dos indígenas. Uma
queda expressiva na disponibilidade de alimentos é apontada como resultado
direto do aumento do barulho e das explosões decorrentes das atividades de
exploração e sísmicas.

A fauna local, outrora abundante, agora se tornou escassa devido às


perturbações constantes, forçando os membros da comunidade a se
aventurarem a distâncias consideráveis, muitas vezes superando 10 km, em
busca de recursos alimentares básicos.

Na região do território Gavião Real, é observada ainda a presença de oito áreas


de terra preta, destacando-se que uma destas áreas abriga um antigo
cemitério indígena, configurando-se como um dos Sítios Arqueológicos locais.
Durante a exploração realizada pela Equipe da Resistencia Amazônica, foram
identificados dois fragmentos arqueológicos na superfície do terreno. Além
disso, destaca-se a existência de um cemitério indígena atualmente em uso
Figura 10: Poço de Gás/óleo dentro da área de recursos naturais
estratégicos indígenas

Fonte: Resistência Amazônica

A região também apresenta a presença de quatro importantes fragmentos de floresta


com arvores de andiroba nativos, sendo que as coordenadas foram registradas para
um deles, assim como a presença de quatro fragmentos de florestas de arvores de
copaíba nativos, sendo registrado um conjunto específico.

Além disso, são identificados três castanhais nativos, sendo um de grande porte e
dois de pequeno porte, evidenciando a diversidade ecológica da área.
Figura 11: Area de uso e Recursos Naturais estratégicos indígenas

Fonte: Resistência Amazônica

A análise descrita acima dos impactos iniciais destaca a complexidade e a


abrangência dos efeitos gerados pela exploração de gás natural na região
habitada pelos povos indígenas. Os desafios ambientais e socioeconômicos
desencadeados por essa atividade demandam uma atenção cuidadosa não
apenas das autoridades competentes, mas também da sociedade em geral, a
fim de abordar efetivamente as questões levantadas pelos membros da
comunidade.
Transformações na Vida
Cotidiana e Conflitos Sociais

Mais relatos dos indígenas e comunidades tradicionais, expõem


transformações significativas no modo de vida e nas atividades tradicionais
da comunidade não apenas a deterioração da qualidade da água, mas
também a modificação substancial de práticas fundamentais que
historicamente sustentaram a vida e a cultura dos Mura e dos comunitários.

A problemática central se manifesta na questão da poluição da água, um desafio


sério que impactou diretamente duas comunidades. Essas comunidades agora
dependem de um sistema de salta z para purificar a água contaminada, uma resposta
crucial diante da degradação ambiental causada pelas atividades da ENEVA.

Contudo, essa iniciativa, embora valiosa em seu propósito de preservar a


saúde hídrica, representa uma mudança imposta nas práticas diárias,
evidenciando a perda da qualidade da água como uma consequência direta
das atividades da empresa.

Nestes aspectos, a liderança desempenha um papel crucial nas comunidades


indígenas, representando não apenas a voz da comunidade, mas também
enfrentando uma série de desafios quando a realidade local entra em conflito
com interesses externos, como no caso da exploração de gás fóssil pela
ENEVA. O Cacique Jonas Mura, figura proeminente nessas comunidades,
emergiu como um defensor dos direitos e interesses dos indígenas. No
entanto, sua posição também o colocou no centro de uma série de ameaças e
desafios, revelando as complexidades envolvidas na resistência a práticas
que afetam profundamente o modo de vida dessas comunidades.

As ameaças enfrentadas pelo Cacique Jonas Mura vão além das pressões
econômicas e sociais exercidas pela presença da ENEVA. Elas abrangem
desde tentativas de deslegitimar sua liderança até situações mais graves,
como intimidações, ameaças e possíveis represálias.
Numa entrevista que fizemos com Ele, fica muito claro o grau de ameaças e
intimidações que ele sofre por defender os interesses de seu povo e da
preservação ambiental. Estranhos armados com espingarda já foram a sua
casa à sua procura e objetos seus já sofreram vandalismo, sempre no intuito de
fazer ameaças a sua voz e posicionamento.

A influência direta da ENEVA nas atividades cotidianas dos Indígenas é


evidenciada pela alteração significativa no modo de vida tradicional e um
outro ponto relevante é que a oferta de empregos pela empresa desencadeou
divisões profundas na comunidade, a maioria dessas ocupações temporárias e
todas com baixa qualificação, resultando em conflitos entre aqueles que
aceitaram empregos e os que resistem à presença da ENEVA.

Essa divisão, além de gerar tensões sociais, propiciou acusações direcionadas


aos indígenas, rotulando-os como opositores ao desenvolvimento do
município, que é uma narrativa comum dos impactos gerados por grandes
empreendimentos, nos quais os contrários aos empreendimentos sejam
contrários ao desenvolvimento local; destaca-se que os grandes
empreendimentos produzem geração de emprego e impostos, apesar dos
subsídios governamentais que são utilizados e que não entram na matemática
econômica de geração de renda e nem impostos/royalties. Entretanto os
problemas causados geram impactos negativos à sociedade.

A economia da comunidade foi severamente impactada, com alguns membros


optando por abandonar atividades tradicionais, como agricultura e
artesanato, em prol de empregos oferecidos pela ENEVA. Esta mudança não
apenas comprometeu a renda da comunidade, mas também enfraqueceu a
preservação da cultura e das práticas tradicionais.

A interrupção nas atividades de plantação e produção do artesanato, por


exemplo, representa uma perda tangível da identidade cultural dos Mura,
contribuindo para a erosão gradual de aspectos essenciais da sua herança. Da
mesma forma, o abandono às culturas tradicionais impõe outro problema que é
o consumo de produtos industrializados, altamente processados e que pode
gerar problemas de saúde, normalmente pressão alta, diabetes e obesidade.
Adicionalmente, a mudança na dinâmica das atividades cotidianas,
especialmente o aumento da distância das casas devido às obras, afetou
negativamente a capacidade da comunidade de realizar práticas como caça,
pesca e coleta. Essas atividades, fundamentais para a subsistência e a coesão
social, tornaram-se mais desafiadoras e menos acessíveis, intensificando
ainda mais os impactos socioeconômicos e culturais dessa transformação
imposta.

Os indígenas enfatizam que o apoio do governo federal às comunidades indígenas na


região não é uma iniciativa recente, mas sim um compromisso que se estende ao
longo de uma década. Sublinhando que, embora o suporte governamental tenha
iniciado há aproximadamente 10 anos, a presença da comunidade indígena na região
transcende um período de mais de 40 anos, evidenciando uma história longeva de
contribuição dessas comunidades à região.

A contextualização temporal realizada pelos indígenas reforça a continuidade


das comunidades indígenas na área, desmistificando afirmações enganosas
que negam a existência indígena no município de Silves. Ao ressaltar que sua
própria idade atinge 43 anos, um dos indígenas destaca, que a comunidade
indígena possui uma presença duradoura e estabelecida na região, merecendo
pleno reconhecimento e respeito por parte das autoridades e da sociedade em
geral.

Essa valiosa informação adiciona um elemento crucial à narrativa, destacando


não apenas a persistência histórica das comunidades ao longo das décadas,
mas também a importância vital de políticas governamentais consistentes e
sustentáveis para garantir o bem-estar contínuo dessas comunidades ao
longo do tempo.

A necessidade de reconhecimento e respeito se destaca como um apelo urgente


diante dos desafios contemporâneos enfrentados pelas comunidades indígenas na
região, sublinhando a importância de uma abordagem cuidadosa e equitativa para a
gestão de suas questões.
Indígenas Isolados

Ao nos aprofundarmos nas dinâmicas das regiões de Silves e Itapiranga,


surge uma preocupação vital que deve ser atentamente avaliada pela FUNAI
e outros órgãos governamentais: a presença de Povos indígenas em
isolamento voluntário na área.

Destacamos aqui, de modo especial, a existência de um grupo vinculado aos povos


Pariquis, vivendo em isolamento voluntário. É crucial destacar que, em ambos os
municípios, há famílias e comunidades indígenas que ainda não foram devidamente
mapeadas; possuímos apenas informações sobre a sua presença.

Essa lacuna no mapeamento ressalta a importância de um esforço contínuo


para compreender e respeitar a diversidade cultural, garantindo, assim, a
proteção dos direitos e do modo de vida dessas comunidades indígenas em
isolamento voluntário.

Considerar esta informação é fundamental para garantir a sobrevivência


destes indígenas e como prova de nossa afirmação, reproduziremos abaixo
trechos de relatório de atividades da Comissão Pastoral da Terra do
Amazonas:

“Em 12/08/2023, a CPT Prelazia de Itacoatiara visitou a Comunidade


indígena Vila Isabel, Boca do Inajatuba, no município de Itapiranga, com o
propósito de coletar informações sobre a demanda que motivou a visita da
CPT ao referido local, conforme previamente delineado...”

(continua)
“...Eram quase 11h35min quando a Equipe parou à margem do rio para
descansar, se alimentar e observar a direção para onde teriam que ir.

Depois de uns 15 minutos, a Equipe encalhou o bote em terra e seguiu a pé.


Caminharam uns 4 quilômetros na floresta, quando ouviram um barulho na
mata e pararam para ver o que era, mas não avistaram nada. Seguiram mais
uns metros e ouviram novamente barulho nas folhas.

Logo perceberam que era um homem nu, um indígena, de uns 30 anos de


idade, com um pedaço de galho seco nas mãos, distante a uns 40 metros, ele
demonstrava estar bravo com a presença da Equipe da CPT.

Apareceram mais quatro indígenas, um menino de aproximadamente 14 anos,


uma menina de uns 10 anos, uma senhora de mais ou menos uns 50 anos de
idade e um outro indígena que aparentava ter uns 60 anos. O indígena mais
velho gritou/falou com os outros e eles se afastaram, ficando somente ele
numa distância que dava para a Equipe lhe avistar.

A Equipe tentou se comunicar com o indígena, falando e gesticulando com as


mãos, mas ele ameaçou jogar o galho na Equipe. Um dos agentes da CPT ficou
com receio de sofrer algum ataque e se afastou em direção à margem do rio.

O outro agente continuou insistindo na comunicação com o indígena,


gesticulando com as mãos e perguntando de onde tinham eles tinham vindo e
se eram Mura, Waimiri-Atroari, Hixkaryana ou Sateré, mas o indígena ficava
irritado e fazia um som parecido com um grito.

Uma das vezes, quando o agente apontou na direção do Rio Uatumã e


perguntou se era de lá que eles teriam vindo, o indígena balançou a cabeça
que sim. O gesto causou estranheza ao agente, pois seria um sinal que o
indígena poderia ter compreendido o que ele estava falando e que
possivelmente o indígena já teria tido contato com outros povos.

Diante da possibilidade de o indígena ter compreendido a fala ou o gesto, o


agente perguntou por diversas vezes se eles eram Mura, Waimiri-Atroari,
Hixkaryana ou Sateré, e o indígena bateu os pés com força no chão e falou de
uma forma que deu para entender alguma coisa como “ariri” ou “tariqui”.
O agente perguntou: Tariqui, Pariqui?
O indígena novamente balançou a cabeça como se tivesse afirmando que
sim. O agente pegou o celular e tentou tirar uma foto do indígena, mas ele se
afastou rapidamente e fazendo menção que iria jogar o galho no agente.

Na segunda tentativa o agente conseguiu fazer o registro fotográfico. O


agente estava com um terçado pequeno na cintura e já havia percebido que o
indígena olhava para o terçado.

Então, antes de ir embora, o agente higienizou o terçado com álcool em gel


que leva na mochila e enfiou no chão e se afastou. De longe o agente viu o
indígena pegando terçado. O contato com os indígenas não passou de 10
minutos...”

FIGURA 12: INDÍGENA EM ISOLAMENTO VOLUNTÁRIO NA REGIÃO DE EXPLORAÇÃO


DE GÁS DA ENEVA

Fonte: CPT - Itacoatiara


Na continuidade do relatório há a informação que a Comissão Pastoral da Terra
(CPT) Prelazia de Itacoatiara, informou à Fundação Nacional do Índio (FUNAI)
sobre a situação dos indígenas isolados nas regiões de Silves e Itapiranga.
Ainda no seu relatório, a CPT informa que em 2023 comunicou oficialmente o
Ministério Público Federal (MPF), o Programa de Proteção aos Defensores de
Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas (PPDDH/AM) e ao
Ministério dos Povos Indígenas (MPI) sobre a situação crítica dos indígenas
impactados pela exploração do gás nesses locais, bem como dos indígenas
isolados.

Ainda no seu relatório, a CPT informa que em 2023 comunicou


oficialmente o Ministério Público Federal (MPF), o Programa de Proteção
aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas
(PPDDH/AM) e ao Ministério dos Povos Indígenas (MPI) sobre a situação
crítica dos indígenas impactados pela exploração do gás nesses locais,
bem como dos indígenas isolados.

Destaca-se que a CPT, no mesmo relatório afirma que em conformidade com a


orientação da FUNAI, agiu com cautela para não expor a localização dos
indígenas isolados; e informa também que a foto do indígena isolado foi
compartilhada com os servidores da FUNAI somente em 31 de janeiro de 2024,
após procedimentos seguros para evitar riscos.
Impactos Locais nas
Comunidades Tradicionais
Ribeirinhas
Tendo em vista alcançar o objetivo proposto, que é o de demostrar os
impactos socioambientais negativos para as comunidades ribeirinhas
impactadas pelas atividades da ENEVA nos municípios de Silves e Itacoatiara,
nossa viagem buscou através de entrevistas e aplicação de questionários,
captar a perspectiva das comunidades ribeirinhas da região, invisibilizadas
nos processos de licenciamento ambiental para a exploração de gás fóssil no
chamado Campo Azulão, em Silves (AM). Neste processo de recolha de
informações qualitativas entre os moradores das sequintes localidades:

Quadro 3: Comunidades ribeirinhas

Municipio Comunidade Nº Familias

Comunidade de Nossa Senhora do Bom


Silves 22
Parto - Pontão, do Rio Urubu

Comunidade de Santa Luzia do Rio


Silves 18
Sanabani

Comunidade de São Sebastião do Rio


Silves 13
Itapani

Comunidade de Cristo Rei do Rio Anebá


Silves 30

Comunidade São Pedro – Igarapé da


Silves 34
Capivara

Comunidade Nossa Senhora das Graças.


Silves 26
Maguará Grande

Comunidade Nova Jerusalém. Canaçari


Silves 16

Comunidade São Sebastião do Poção.


Silves 13
Canaçari

Fonte: Resistência Amazônica


Fonte: Resistência Amazônica - Audiência popular realizada pelas comunidades de Itacoatiara e
Itapiranga que estão sendo diretamente impactadas pela Eneva / Agosto de 2022.

Estas comunidades extrativistas são diretamente atingidas pelas atividades


ligadas ao citado empreendimento. Às visitas às comunidades, procurou
suscitar essencialmente o juízo político destes sujeitos sociais, buscando-se
revelar o ponto de vista dos ribeirinhos acerca dos impactos ambientais e
sociais decorrentes dos efeitos das transformações sociais e da dinâmica dos
processos de atuação da empresa ENEVA na região delas.

No pensamento arendtiano, o juízo político é definido como o resultado da


capacidade que todas as pessoas têm para refletir sobre a realidade social em
que vivem (ARENDT, 1993b). O juízo político é uma ferramenta analítica
essencial neste trabalho, pois tendo como referência esta noção, buscamos
captar as considerações dos ribeirinhos sobre o processo que os envolve. E
neste processo as comunidades Tradicionais ribeirinhas relatam diversos
problemas decorrentes da presença e atividades da empresa ENEVA em suas
regiões. Os principais problemas mencionados incluem:
Quadro 4: impactos ambientais e sociais nos extrativistas

- Mudança na cor das águas dos rios


- Desaparecimento de peixes, tornando a pesca mais difícil.
Impactos
1 - Presença de homens armados nas áreas de exploração da
Ambientais
empresa.
- Presença de pessoas de fora da região pescando e coletando
em dias de feriados e finais de semana.

- Moradores adoecem com febre, dor de cabeça, vômito e diarreia,


Problemas de associados à qualidade da água e ar, correlacionando a atividade
2 da ENEVA.
Saúde
- Alunos que frequentam escola na região também enfrentam
problemas de saúde acima descritos.

Impactos na - Restrições impostas pela ENEVA impedem comunitários de


realizar atividades cotidianas como caça, plantio, colheita de
Atividade frutos e criação de animais.
3
Cotidiana
- Proprietários de terras alugadas para a ENEVA são proibidos de
continuar suas práticas tradicionais.

- Comunidades enfrentam insatisfação devido a promessas não


cumpridas pela ENEVA, como a contratação de moradores.
Descontentamento - Desconforto com a atitude da empresa durante reuniões, onde
4 e Conflitos Sociais são contadas vantagens que não se materializam.

- Conflitos entre moradores que alugaram terras para a ENEVA e


aqueles que não arrendaram.

- Impacto na fonte de renda, com a proibição de atividades


tradicionais afetando a subsistência.
Problemas
5 Econômicos - Proprietários que alugaram terras para a ENEVA enfrentam
dificuldades econômicas e descontentamento.

- Perigos associados ao tráfego de balsas e lanchas da ENEVA,


causando alagamentos e danos nas embarcações dos
comunitários.
Problemas no
6 Tráfego Fluvial - Falta de redução de velocidade dessas embarcações ao passar
pelas comunidades, evidenciando o total desrespeito as
pessoas e colocando em risco as crianças e pequenos animais na
comunidade.

Assédio e - Tentativas contínuas da ENEVA de alugar terras, mesmo diante


do descontentamento e recusa de alguns proprietários.
Pressão por
7 Contratos de - Assédio persistente sobre proprietários de terras que resistem
arrendamento às propostas da empresa.

Fonte: Resistência Amazônica


A exploração de gás fóssil por parte da ENEVA nas proximidades das
comunidades tradicionais ribeirinhas de Silves e Itapiranga trouxe à tona
desafios complexos e multifacetados, afetando diretamente a vida, a cultura e
o ambiente dessas comunidades, seus modos de Ser, Fazer e Viver.

Podemos verificar detalhadamente sete pontos críticos emergentes dos


relatos das comunidades, explorando os impactos na saúde, os desafios
ambientais, as questões de comunicação e participação, as lacunas nas
políticas governamentais e os desafios de sustentabilidade a longo prazo.

Ao fornecer uma análise aprofundada desses aspectos, buscamos


compreender a complexidade da interação entre o desenvolvimento
industrial, a preservação cultural e ambiental, e os direitos fundamentais das
comunidades ribeirinhas.

O objetivo é lançar luz sobre as dificuldades enfrentadas por essas


comunidades e destacar a necessidade de abordagens mais inclusivas,
transparentes e sustentáveis para garantir seu bem-estar e dignidade ao
longo do tempo, coisa que pelos relatos dos comunitários está longe de
acontecer por parte da ENEVA e dos órgãos públicos.

Impactos Ambientais na Comunidade Ribeirinha de Silves e Itapiranga


devido à Atividade da ENEVA

A presença da ENEVA nas margens dos rios de Silves e Itapiranga resultou em


impactos ambientais significativos para as comunidades tradicionais
ribeirinhas locais. Entre os principais problemas enfrentados, destaca-se a
mudança na coloração das águas, especialmente no rio Anebá.

Moradores relatam que as águas se tornaram avermelhadas, indicando


presença de material e com possibilidade de contaminação ou alteração nas
propriedades naturais do rio.

Outro ponto crítico refere-se ao desaparecimento de peixes na região. A


pesca, sendo uma atividade histórica e fundamental para a subsistência
dessas comunidades tradicionais ribeirinhas, enfrenta desafios significativos
devido à atividade da ENEVA. A escassez de peixes prejudica a segurança
alimentar e a economia local, já que a pesca é uma fonte vital de proteínas e
renda para essas comunidades.
Ademais, a presença de homens armados na área de exploração da ENEVA
intensifica a sensação de insegurança nas comunidades ribeirinhas. A relação
entre a empresa e a segurança privada gera preocupações adicionais sobre o
controle do território e a proteção dos direitos das comunidades locais,
levantando questões sobre quem realmente beneficia-se dessas atividades
exploratórias.

Problemas de Saúde nas Comunidades Ribeirinhas devido à Atividade


da ENEVA

Os problemas de saúde enfrentados pelas comunidades ribeirinhas de Silves e


Itapiranga são uma preocupação crescente associada à presença da ENEVA.
Relatos consistentes de moradores adoecendo com febre, dor de cabeça,
vômito e diarreia sugerem uma possível correlação entre esses sintomas e a
atividade da empresa na região. A contaminação do rio pode ser um vetor que
produz diarreia e outros incômodos, entretanto necessita-se fazer a análise da
água visando detectar a presença dos contaminantes, além de muito
provavelmente a qualidade do ar ter sido alterada substancialmente, em razão
que o gás de "escape" da exploração, que não tem odor e não é percebido pela
população, porém seus efeitos são severos a saúde humana.

Todos esses fatores de risco - água e ar - associados, evidenciam que a


atividade exploratória de gás pela ENEVA, tem o potencial de trazer danos
severos a saúde humana e a ecologia da região toda.
O impacto negativo na saúde se estende além dos indivíduos, afetando os
alunos das comunidades Tradicionais ribeirinhas. O ambiente escolar, que
deveria ser um espaço seguro, é comprometido pela ocorrência de problemas
de saúde, principalmente dores de cabeça, relacionados à atividade da ENEVA.
Essa situação não apenas prejudica a educação, mas também sobrecarrega os
recursos médicos e de saúde já limitados nessas comunidades, ou seja, um
custo adicional e não suportado pelo Sistema de Saúde público.

A falta de informações claras e transparentes sobre os potenciais riscos à


saúde associados à atividade da ENEVA intensifica a ansiedade nas
comunidades ribeirinhas. A necessidade urgente de avaliações de impacto à
saúde e medidas corretivas é crucial para salvaguardar o bem-estar dessas
comunidades, caso persistam com a exploração fóssil nessa importante e
sensível região, no coração do Amazonas.
Impactos na Atividade Cotidiana das Comunidades Ribeirinhas devido
à Atividade da ENEVA

A imposição de restrições pela ENEVA, proibindo atividades tradicionais como


caça, roçada e plantio, colheita de frutos e criação de animais, entre outras,
tem um impacto profundo na vida cotidiana das comunidades tradicionais
ribeirinhas. Essas práticas, essenciais para a subsistência e a preservação
cultural, social e ancestral representam não apenas uma fonte de alimento,
mas também a base da identidade dessas comunidades tradicionais.

A proibição dessas atividades tradicionais resulta em uma perda significativa


da autonomia e do modo de vida dessas comunidades ribeirinhas; Esta
autonomia é assegurada pela Constituição Federal aos moradores de
comunidades tradicionais, portanto uma clara violação de direitos, que deve
ser investigada nas ações da ENEVA, da mesma forma estes devem ser
garantidos porque a intervenção é feita em território tradicional ou
tradicionalmente ocupado. A resistência à imposição dessas restrições é
compreensível, uma vez que essas práticas não apenas sustentam
economicamente as comunidades, mas também são parte integrante de sua
herança cultural.

O ambiente de desconfiança gerado pela falta de transparência da ENEVA nas


relações com as comunidades tradicionais ribeirinhas intensifica as tensões
internas e cria um cenário de resistência. A implementação de práticas que
respeitem os modos de vida tradicionais é crucial para a preservação da
cultura e da identidade dessas comunidades.

Divisões e Conflitos Sociais nas Comunidades Ribeirinhas devido à


Atividade da ENEVA

A presença da ENEVA nas comunidades ribeirinhas de Silves e Itapiranga não


apenas impactou as atividades cotidianas, mas também gerou divisões
significativas e conflitos sociais. A oferta de empregos pela empresa, mesmo
com baixos salários, a maioria temporários e com baixa qualificação
profissional, criou uma dicotomia entre aqueles que aceitaram oportunidades
de trabalho e aqueles que resistem à presença da empresa em suas terras.
Essa divisão, além de criar tensões sociais, resultou em acusações
direcionadas aos membros das comunidades que se opõem à presença da
ENEVA. A acusação de serem contrários ao desenvolvimento do município
intensifica a polarização interna, dificultando a coesão social e
prejudicando as relações comunitárias que existiam antes da chegada da
empresa. Esse marco divisório é próprio dos grandes empreendimentos
que investem, território adentro, na busca da garantia de sucesso
econômico, em detrimento a qualidade de vida das populações do entorno
e do meio ambiente.

A economia local também foi afetada, com alguns membros abandonando


atividades tradicionais em busca de empregos oferecidos pela ENEVA.
Essa transição não apenas impactou a renda da comunidade, mas também
fragilizou a preservação da cultura e das práticas tradicionais,
contribuindo para a erosão da identidade cultural dos ribeirinhos.

Impactos na Atividade Econômica das Comunidades Ribeirinhas devido


à Atividade da ENEVA

As atividades econômicas tradicionais das comunidades ribeirinhas, como


a pesca, caça, agricultura e artesanato, sofreram impactos substanciais
devido à presença da ENEVA. A diminuição na disponibilidade de peixes,
associada às alterações na fauna local causadas pela atividade da
empresa, resultou em uma crise na pesca, afetando diretamente a
segurança alimentar e econômica dessas comunidades, o que produz
impacto na segurança alimentar.

As evidências quanto a diminuição dos estoques pesqueiros são muito


fortes, onde os pescadores artesanais tem que competir num mesmo
espaço com os barcos da indústria da pesca, adicionado ainda aos
desastres naturais, como ocorrido com a seca extrema na região, portanto,
esses fatores associados: pesca industrial, ausência de fiscalização,
desastres naturais e as atividades da ENEVA que por si só, levam ao
afugentamento dos peixes e impactos na reprodução das espécies,
conjugados, potencializam para o empobrecimento das comunidades
tradicionais e geram a insegurança alimentar, cujos resultados serão
extremamente danosos a toda a região num futuro breve.
A proibição ou restrição de práticas agrícolas e de criação de animais, que
são cruciais para a subsistência e para gerar renda, não apenas impacta
diretamente a estabilidade econômica das comunidades ribeirinhas, mas
também representa uma séria ameaça à segurança alimentar.

A dependência dessas comunidades nos recursos naturais locais é uma


característica essencial do seu modo de vida, e a imposição de limitações
nessas atividades compromete de maneira significativa sua capacidade de
garantir o sustento e gerar renda, resultando em consequências diretas
para a segurança alimentar da região.

Além disso, a migração de alguns membros para empregos oferecidos pela


ENEVA representa uma mudança significativa nas dinâmicas econômicas
locais. A transição de atividades tradicionais para empregos no setor
industrial não apenas altera a estrutura econômica das comunidades, mas
também contribui para a descaracterização das práticas culturais e
tradicionais.

ATILES (2015) fez uma análise das consequências que o arrendamento de


terras para a produção de cana produziu doenças porque a diversidade
alimentar foi impactada, bem como o crescimento de ingestão de
alimentos processados, com a incidência de diabetes, pressão alta e
obesidade.

Desafios nas Relações com a ENEVA e as Autoridades Governamentais

A falta de diálogo transparente e participativo entre a ENEVA, as


comunidades tradicionais ribeirinhas e as autoridades governamentais tem
sido um dos principais desafios enfrentados.

A imposição de decisões unilaterais, como restrições às atividades locais e


a falta de informações claras sobre os impactos ambientais e à saúde,
gerou desconfiança nas relações.

A resistência das comunidades ribeirinhas à presença da ENEVA


demonstra a necessidade de um diálogo mais efetivo, envolvendo
todas as partes interessadas. A ausência de canais de comunicação
transparentes contribui para o aumento das tensões e cria um
ambiente propício para conflitos.
Além disso, a persistência de desafios ao longo do tempo, destaca a
necessidade de políticas mais consistentes e sustentáveis.

O reconhecimento da existência duradoura e estabelecida das


comunidades tradicionais ribeirinhas na região ressalta a importância de
abordagens que respeitem e valorizem a história e a contribuição dessas
comunidades.

A Incompatibilidade da Exploração de Petróleo na Amazônia: O Caso da


Comunidade de São Pedro da Vila Lira.

A implantação de empreendimentos voltados para a exploração de


combustíveis fósseis na Amazônia, como evidenciado pelo caso da
PETROBRAS na Bacia do Solimões em Coari/AM, levanta questões cruciais
sobre a incompatibilidade dessas atividades com a preservação ambiental
e o bem-estar das populações locais.

A reflexão sobre esse cenário torna-se essencial, especialmente diante da


repetição desses padrões no contexto do empreendimento da Eneva no
Campo do Azulão.

Ao analisar especificamente a Comunidade de São Pedro da Vila Lira,


situada às margens do rio Badajós, próxima ao poliduto construído pela
PETROBRAS, emerge uma narrativa de impactos negativos profundos.
Composta por 54 famílias que mantinham um modo de vida tradicional
ribeirinho, centrado na pesca, agricultura de subsistência e interação
sustentável com a natureza, a comunidade viu suas condições de vida
dramaticamente alteradas com a chegada do empreendimento.

A situação se agravou com as obras do poliduto, que causaram a poluição


do único igarapé próximo à comunidade, antes utilizado para consumo de
água.

Embora a PETROBRAS tenha construído um poço artesiano para fornecer


água potável, este apresentou problemas de qualidade, forçando os
moradores a continuar consumindo água poluída. Além disso, a abertura
das estradas para o poliduto resultou na destruição das terras de cultivo
das famílias, que receberam indenizações consideradas irrisórias.
Essa realidade expõe a incompatibilidade entre a exploração de
combustíveis fósseis na Amazônia e a preservação ambiental, bem como o
sustento das comunidades tradicionais.

Apesar das promessas de progresso e desenvolvimento econômico, a


experiência da Comunidade de São Pedro da Vila Lira evidencia que tais
empreendimentos frequentemente resultam em degradação ambiental e
social, além de impactos adversos na qualidade de vida das populações
locais.

A noção de que o progresso traria infraestrutura e empregos para


Coari revelou-se um mero devaneio, pois as compensações
financeiras significativas recebidas pelo município não se
traduziram em melhorias tangíveis na qualidade de vida das
populações locais. Muitas comunidades tradicionais ribeirinhas
perderam sua dignidade e viram-se obrigadas a migrar para áreas
urbanas em busca de condições de vida mais dignas, enfrentando a
escassez de recursos econômicos e a ausência de perspectivas de
mudança por parte do poder público.

Essa situação sublinha as injustiças sociais e econômicas enfrentadas


pelas populações locais, que são submetidas a um processo de exploração
predatória em nome do desenvolvimento econômico. Seja em Coari ou em
outras regiões da Amazônia, tais como o Vale do Javari, (anos 70, gerando
conflitos com mortes de indígenas isolados e funcionários da Petrobras,
até o projeto ser abandonado pela empresa) e mesmo em Carauari e no
debate da moda que é a foz do Amazonas, a exploração de combustíveis
fósseis só perpetua um ciclo de degradação ambiental, apropriação
desigual de recursos naturais e empobrecimento das comunidades
indígenas e tradicionais.

Portanto, é fundamental reconhecer a incompatibilidade intrínseca entre a


exploração de combustíveis fósseis na Amazônia e a preservação
ambiental, bem como o bem-estar das populações locais. Isso requer uma
revisão profunda das políticas de desenvolvimento e uma maior
consideração pelas comunidades afetadas, garantindo sua participação
ativa na tomada de decisões que impactam diretamente suas vidas e meios
de subsistência. Somente assim poderemos construir um futuro
sustentável para a Amazônia e suas populações.
Considerações finais
A omissão do órgão licenciador estadual de não realizar consulta as
comunidades, lança uma sombra sobre o delicado equilíbrio entre
desenvolvimento e preservação ambiental na região. O descaso inadvertido
pela riqueza cultural e histórica dessas comunidades resultou em um deslize
que ecoa além das linhas da burocracia.

Além de não atender a legislação vigente de consulta, há outros


pontos que merecem atenção, a falta de autorização da Funai, bem como
o questionamento se este tipo de empreendimento pode ser licenciado
pelo órgão ambiental estadual. O poder público, a pelo menos uma
década, já presta serviços de saúde aos povos indígenas, portanto,
está presente nestes territórios.

Em meio às vastas paisagens dessas localidades, a negligência em


reconhecer a existência e os direitos dos povos indígenas revela uma falha
sistêmica que vai além da simples omissão administrativa. Os povos
indígenas e comunidades tradicionais não são apenas uma parte integral do
tecido social dessas áreas, mas também são os guardiões tradicionais da
riqueza ambiental que caracteriza a região.

A ausência dos indígenas nos procedimentos de licenciamento


ambiental reflete uma desconexão significativa entre as políticas
governamentais e a realidade vivida por essas comunidades. Os
requisitos legais estabelecidos pela legislação brasileira para o
licenciamento ambiental não podem ser cumpridos integralmente sem
considerar a participação ativa e a consulta prévia, livre, informada e
de boa fé desses povos. Essa lacuna não apenas viola normas éticas,
mas também mina os princípios fundamentais do desenvolvimento
sustentável.
A riqueza da biodiversidade e os ecossistemas únicos presentes em Silves
e Itapiranga têm sido sustentados por gerações de conhecimento indígena
e demais comunidades. As práticas tradicionais de manejo ambiental,
transmitidas oralmente ao longo dos séculos, desempenharam um papel
vital na preservação dos recursos naturais. Ao ignorar a presença dessas
comunidades, o órgão licenciador compromete não apenas a integridade
ambiental, mas também a autenticidade cultural que enriquece essas
terras.

Este grave e irreversível incidente serve como um lembrete


contundente de que a busca pelo desenvolvimento não pode ser
divorciada do respeito pelas culturas autóctones e da proteção
ambiental. A sustentabilidade verdadeira requer uma abordagem que
honre a interconexão entre seres humanos e meio ambiente.

Corrigir essa falha não é apenas uma obrigação legal, mas uma
oportunidade de reafirmar o compromisso com um desenvolvimento
que respeita e preserva as raízes culturais e ambientais que tornam
Silves e Itapiranga únicas.

Em última análise, a correção dessa omissão não é apenas uma questão de


procedimentos administrativos, portanto, legal, mas uma questão de
reconhecimento da diversidade e da importância de todas as vozes em
nossa jornada coletiva rumo a um futuro sustentável. O respeito pelos
povos indígenas, das comunidades tradicionais e a integridade ambiental
são pilares essenciais para um desenvolvimento genuinamente equitativo e
harmonioso.

A inclusão de suas perspectivas no processo de licenciamento ambiental


não apenas fortalecerá a legitimidade dessas avaliações, mas também
enriquecerá a compreensão holística dos impactos potenciais das
atividades propostas.

Além disso, a revisão e retificação dessa omissão proporcionará uma


oportunidade valiosa para a construção de pontes entre as comunidades
locais, os órgãos governamentais e as entidades responsáveis pelo
desenvolvimento econômico. É imperativo promover um diálogo aberto e
inclusivo, reconhecendo a importância de todas as partes interessadas
para encontrar soluções equilibradas e sustentáveis.
Transição Energética na
Amazônia: Rumo a uma
Abordagem Justa e Popular
A transição energética é um tema central nas discussões contemporâneas
sobre sustentabilidade e mudanças climáticas. À medida que a sociedade
busca reduzir sua dependência dos combustíveis fósseis e migrar para
fontes de energia renovável, surge a necessidade de uma abordagem que
seja não apenas eficaz em termos ambientais, mas também justa e acessível
para todos os segmentos da população. Nesse contexto, a ideia de uma
"transição energética justa e popular" tem ganhado destaque.

No entanto, a transição energética não é apenas uma questão técnica; ela


tem implicações sociais, econômicas e políticas significativas.
Historicamente, políticas energéticas podem ter impactos desproporcionais
em determinadas comunidades, especialmente aquelas já marginalizadas.
Por exemplo, a construção de usinas de energia eólica ou solar pode deslocar
comunidades locais ou afetar negativamente seus meios de subsistência
tradicionais.

A Amazônia, conhecida por sua vasta biodiversidade e importância


global para o equilíbrio climático, enfrenta desafios significativos
relacionados à geração de energia. Diante desse contexto, a busca por
soluções mais sustentáveis tem levado a um crescente interesse em
fontes de energia renovável descentralizadas, livres de combustíveis
fósseis, como uma maneira de impulsionar o desenvolvimento
econômico e social na região.

A energia renovável descentralizada refere-se à produção de energia em


pequena escala, muitas vezes próxima aos locais de consumo. Na Amazônia,
essa abordagem pode ser especialmente benéfica, considerando a vasta
extensão da região e as comunidades remotas. A utilização de tecnologias
como painéis solares pode fornecer energia de menor impacto e acessível
para comunidades isoladas, reduzindo a dependência de geradores movidos
a diesel, que são prejudiciais ao meio ambiente e caros de operar.
A energia solar apresenta um potencial significativo na Amazônia, dada a
abundância de luz solar ao longo do ano. A instalação de sistemas
fotovoltaicos em comunidades isoladas pode fornecer eletricidade para
residências, escolas e centros de saúde, melhorando a qualidade de vida e
promovendo o desenvolvimento local. Ao adotar fontes de energia
renovável descentralizadas, a região pode reduzir suas de emissões de
GEE e diminuir a pressão sobre ecossistemas frágeis. Além disso, a
geração local de energia promove a autonomia das comunidades, criando
oportunidades para o desenvolvimento econômico sustentável. O desafio,
no entanto, está na implementação efetiva dessas tecnologias,
considerando as complexidades logísticas e as características únicas da
Amazônia. Investimentos em pesquisa, infraestrutura e capacitação local
são essenciais para garantir o sucesso dessa transição para um modelo
energético mais limpo e descentralizado na região.

Uma transição energética justa busca garantir que os benefícios da


mudança para fontes de energia renovável sejam distribuídos de
forma equitativa, minimizando os ônus sobre os grupos mais
vulneráveis e marginalizados. Isso envolve não apenas mitigar os
impactos negativos, mas também criar oportunidades econômicas e
sociais para essas comunidades.

A justiça na transição energética precisa ter várias dimensões, tais como:


Garantir que as comunidades afetadas pela transição tenham voz nas
decisões e sejam compensadas de forma justa por quaisquer impactos
negativos. Tornar as fontes de energia renovável acessíveis a todos,
incluindo aqueles em situação de vulnerabilidade socioeconômica, através
de programas de incentivo e subsídios; Criar oportunidades de emprego na
indústria de energia limpa e fornecer treinamento e capacitação para
garantir que as comunidades locais possam se beneficiar economicamente
da transição, e por fim, garantir processos decisórios transparentes e
participativos, nos quais todas as partes interessadas tenham a
oportunidade de contribuir e influenciar as políticas energéticas.

Portanto, uma transição energética justa e popular é essencial para


garantir que a mudança para fontes de energia renovável seja não apenas
eficaz em termos ambientais, mas também socialmente justa e
economicamente acessível para todos. Isso requer políticas e práticas que
levem em consideração as necessidades e preocupações das
comunidades locais, garantindo que ninguém seja deixado para trás no
caminho rumo a um futuro energético mais sustentável.
Conclusão

A presença da ENEVA nas comunidades ribeirinhas de Silves e Itapiranga


trouxe consigo uma série de desafios significativos, abrangendo desde
impactos socioeconômicos, socioambientais e ambientais, até questões de
saúde e bem-estar. As comunidades ribeirinhas, ao longo do tempo,
enfrentaram divisões internas, conflitos sociais, restrições às suas
atividades tradicionais, além de possíveis impactos negativos na saúde e no
meio ambiente.

A falta de diálogo transparente, consulta prévia e participação


efetiva das comunidades nas decisões relacionadas à exploração de
gás natural tem sido um ponto central de tensão. A resistência das
comunidades tradicionais demonstra a necessidade urgente de uma
abordagem mais inclusiva e colaborativa, envolvendo não apenas a
ENEVA, mas também as autoridades governamentais e outros
stakeholders relevantes.

A sustentabilidade a longo prazo dessas comunidades requer políticas


governamentais mais consistentes e eficazes, considerando a história
duradoura dessas comunidades na região. A análise detalhada desses
desafios destaca a complexidade da interação entre desenvolvimento
industrial, preservação cultural e ambiental, ressaltando a necessidade de
abordagens integradas e sustentáveis para garantir o bem-estar e a
dignidade das comunidades ribeirinhas.

Na derradeira reflexão deste relatório, somos confrontados com a urgência


de agir diante da situação crítica dos indígenas e das comunidades
tradicionais nas regiões de Silves e Itapiranga. A preservação de suas
identidades culturais e a salvaguarda de seus modos de vida demandam
medidas imediatas e incisivas.

É imperativo que sejam tomadas ações urgentes para identificar e proteger


esses grupos indígenas em isolamento voluntário, cuja existência enfrenta
desafios significativos devido à exploração do petróleo e gás na região. O
silêncio de suas vozes ecoa como um apelo para a adoção de estratégias
efetivas que garantam sua segurança e preservação.
Além disso, a intervenção das instituições de justiça federal junto aos
órgãos ambientais e à Empresa Eneva é crucial para esclarecer o processo
de licenciamento para a exploração de recursos naturais em Silves e
Itapiranga. Este é um momento de responsabilidade compartilhada, onde a
transparência e a justiça devem prevalecer para salvaguardar os
interesses dos povos tradicionais, que há muito tempo são guardiões dos
territórios que agora enfrentam sérias ameaças.

Instamos veementemente a atuação conjunta junto aos órgãos


federais, no caso especifico o IBAMA, FUNAI, MPI e MDH para fiscalizar
rigorosamente o projeto de exploração de petróleo e gás. O devido
licenciamento é essencial, mas igualmente crucial é a observância
dos princípios estabelecidos na Convenção 169 da Organização
Internacional do Trabalho (OIT), que demanda a consulta prévia,
livre, informada e de boa fé aos povos afetados. Esta é uma
oportunidade única de harmonizar o desenvolvimento econômico com
a preservação dos direitos fundamentais dos povos indígenas.

Neste contexto, a conclusão deste relatório não marca um fim, mas um


chamado à ação. O desafio agora é transformar as palavras impressas em
medidas práticas que promovam a justiça, a equidade e a preservação das
riquezas culturais e ambientais dessa região tão vital, no coração da
Amazônia. Que este trabalho sirva como catalisador de mudanças,
inspirando aqueles que detêm o poder de decisão a se comprometerem
com a proteção dos indígenas isolados e a promoção de um
desenvolvimento verdadeiramente sustentável.

Como ressalva final, é imperativo enfatizar que ao longo da história das


tentativas de exploração de petróleo e gás na Amazônia, os resultados
foram consistentemente catastróficos para os povos originários e
contribuíram muito pouco para o desenvolvimento local.

A equação econômica não fecha, e os custos sociais, ambientais, culturais


e territoriais são inicialmente suportados pelas comunidades tradicionais e
indígenas, apenas para recair, num segundo momento, sobre a sociedade
como um todo.
A busca desenfreada por recursos naturais na Amazônia tem sido
marcada por uma mentalidade de curto prazo e uma negligência
crônica em relação aos direitos dos povos indígenas e das
comunidades tradicionais, bem como à preservação ambiental. Os
impactos devastadores dessas atividades extrativistas são
evidentes, desde a destruição dos ecossistemas vitais até a
fragmentação das culturas ancestrais.

Os danos não são apenas físicos, mas também sociais e psicológicos. As


comunidades indígenas e tradicionais, que por séculos mantiveram uma
relação harmoniosa com a natureza, são confrontadas com a devastação
de seus territórios sagrados e a perda de sua identidade cultural. Essas
feridas profundas não podem ser quantificadas em termos monetários,
mas sua magnitude é inegável.

É hora de repensar radicalmente nossa abordagem em relação à Amazônia.


Precisamos priorizar a conservação ambiental e os direitos dos povos
indígenas e das comunidades tradicionais sobre os interesses econômicos
de curto prazo. Isso requer um compromisso genuíno com a
sustentabilidade, a justiça social e o respeito à diversidade cultural.

Se quisermos realmente proteger a Amazônia para as gerações


futuras, devemos aprender com os erros do passado e adotar uma
abordagem mais responsável e holística. Somente assim poderemos
garantir que a Amazônia continue a ser não apenas um tesouro
natural, mas também um santuário de vida e cultura para toda a
humanidade.
referências

ARENDT, H. A vida do espirito: o pensar, o querer, o julgar. Rio de Janeiro:


Relumé-Dumará, 1993b

ATILES, M. Agricultura Familiar: Estudo de caso da política do programa


de aquisição de alimento - Paa Em duas associações rurais no município
de Rolim De Moura/Ro. Porto Velho: 2015.

Comissão Pastoral da Terra – Itacoatiara. Relatório de Viagem 01/2024

Gaworra, D. Urucu: Impactos sociais, ecológicos e econômicos do projeto


de petróleo e gás de Urucu. Manaus: 2002

Jesus, José Adilson. Entrevista com os Mura.

Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas. (2021). Climate


Change 2021: The Physical Science Basis. Contribution of Working Group I
to the Sixth Assessment Report of the Intergovernmental Panel on
Climate Change. Cambridge University Press.

Resistência Amazônica. Relatórios de Viagens (2023-2024).


anexos

Para acessar diretamente as imagens por meio digiital, disponibilizamos uma


pasta que pode ser encontrata neste endereço:

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