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A deterioração das estruturas

Disponivel em
http://www.altoqi.com.br/suporte/Eberickgold/Eberick.htm#Textos_explicativos/Vida_util_das_estruturas_de_concreto.htm
Publicado em 2003.
André Matte Sagave; M.Eng.
Silvia Santos; Dra.

Nos últimos tempos, a introdução do conceito de durabilidade das estruturas de concreto


na fase de projeto faz com que a resistência do material deixe de ser a única
característica buscada pelos projetistas de estruturas. Quando todas as fases da produção
do concreto são conduzidas de forma adequada, o mesmo normalmente apresenta uma
vida útil longa. Porém, ainda assim, as falhas nas estruturas de concreto podem ocorrer,
em detrimento da durabilidade das mesmas. Cabe tirar lições destas ocorrências para
melhor controlar os fatores que afetam a durabilidade das estruturas.

Do ponto de vista científico, Neville (1997), divide as causas da durabilidade


inadequada das estruturas de concreto, em mecânicas, físicas e químicas. A deterioração
mecânica pode ser por cavitação, erosão, abrasão ou impacto; a física compreende a
ação gelo-degelo, os efeitos de altas temperaturas e as diferenças de coeficiente de
dilatação térmica agregado/pasta; as causas químicas incluem as reações álcali-agregado
e o ataque por íons agressivos (cloretos, sulfatos e dióxido de carbono), bem como o
ataque por certos tipos de líquidos e gases. Convém lembrar que as armaduras precisam
manter também sua integridade e por meio de ações que coíbam a instalação do
processo corrosivo é possível se atingir uma melhor durabilidade do conjunto. Qualquer
um que se deteriore, concreto ou armadura, causará a deterioração da estrutura.

Via de regra a deterioração do concreto está ligada à ação da água em todas as suas
fases de produção/utilização e muitas são as formas de atuação da mesma no material.
De acordo com Mehta e Monteiro (1994), a capacidade solvente da água é notável e esta
propriedade é a responsável pelo grande número de íons e gases nela presentes. Isto a
torna responsável pela deterioração química de muitos sólidos, entre eles o
concreto. Sendo o concreto um material de natureza básica (pela presença dos
compostos alcalinos de cálcio nos produtos de hidratação do cimento Portland), as
águas ácidas sempre representam um risco maior de deterioração. Outras formas de
ação da água são por meio da deterioração física e a físico-química, que estão
diretamente ligadas à permeabilidade do material.

Por tudo isso é importante estabelecer as características do meio no qual o concreto


estará inserido, uma vez que, segundo Mehta e Monteiro (1994), “durabilidade sob um
conjunto de condições, não significa necessariamente durabilidade sob outro conjunto”.
Desta forma, de acordo com Helene (2000), é preciso avaliar a agressividade do
ambiente para estabelecer a durabilidade do material. Por outro lado, também, é
importante que se conheçam o concreto e a geometria da estrutura. Assim, será possível
estabelecer uma relação entre agressividade do meio e durabilidade da estrutura de
concreto, conforme o que propõe o texto da NBR 6118 (2007).
Causas da deterioração das estruturas

De forma a abordar de maneira mais enfática a questão da durabilidade das estruturas, a


NBR 6118 (2007) classifica os mecanismos de envelhecimento e deterioração das
estruturas de concreto, da seguinte forma:

Mecanismos de envelhecimento e deterioração relativos ao concreto

Dentre os mecanismos de envelhecimento e deterioração do concreto, destacam-se


lixiviação, expansão por ação de íons sulfato e reação álcali-agregado.

Entende-se por lixiviação a dissolução e o carreamento dos compostos hidratados do


cimento Portland, por meio da ação de águas puras ou não. Este fenômeno poderá
ocorrer quando o concreto for mal adensado, estiver, por algum motivo, fissurado ou
apresentar juntas mal executadas, permitindo, desta forma, percolação da água através
do material. Quando isso ocorre, o concreto apresenta superfície arenosa ou com
agregados expostos sem a pasta superficial, eflorescências de carbonato e redução do
pH do extrato aquoso dos poros (HELENE, 2000). Com isso, além de problemas
relacionados à estética da estrutura ou da peça, tem-se a redução da resistência mecânica
do concreto, o aumento da permeabilidade e, conseqüentemente, maiores possibilidades
de corrosão das armaduras (figuras 1 e 2).

Figura 1: Depósitos de cor branca na superfície do concreto de uma barragem nos Estados Unidos,
como conseqüência da lixiviação (fonte: Profº César Franco – UFSC)

Figura 2: Formação de estalactite no Reservatório Santa Efigênia – Curitiba – PR.


(fonte: http://direnserver.dainf.cefetpr.br, 2003)
A expansão por ação de sulfatos ocorre pela reação química entre os compostos da pasta
de cimento hidratada e os íons sulfatos trazidos pela água. Esta reação é expansiva,
gerando grandes aumentos de volume da fase sólida (formação de etringita). O aumento
do volume gera tensões de tração no interior do concreto, resultando na desagregação
progressiva do material. Com isso, novamente tem–se acentuada a possibilidade de
surgimento da corrosão da armadura.

Com relação às reações álcali-agregados, existem basicamente três tipos: reação álcali-
sílica, álcali-silicato e álcali-carbonato (FURNAS, 1997; HASPARIK, 1999).

A primeira ocorre quando a solução alcalina da pasta de cimento ou de uma fonte


externa reage com alguns minerais do grupo do quartzo (opala, calcedônia, cristobalita e
tridimita) encontrados no agregado.

Já a reação álcali-silicato se manifesta quando da reação entre os álcalis disponíveis no


cimento e determinados tipos de silicatos presentes em rochas sedimentares, rochas
metamórficas e ígneas (basalto). Essa reação é lenta e bem mais complexa que a
anterior, sendo a responsável pela deterioração de algumas obras no Brasil, como a
Barragem Apolônio Sales (Rio São Francisco), Barragem de Joanes (Salvador, BA) e
Barragens de Billings/Pedra (São Bernardo do Campo, SP) (SILVEIRA, 2001).

A reação álcali-carbonato ocorre entre agregados carbonáticos, como o calcário


dolomítico argiloso, e os álcalis disponíveis no cimento. No Brasil, não existem
registros deste tipo de reação (HASPARIK, 1999).

O produto destas reações é um gel que se forma nos planos mais fracos ou poros do
agregado ou ainda na sua superfície, destruindo a aderência pasta/agregado. O gel é do
tipo “reação ilimitada”, isto é só pára de ocorrer quando faltar um dos reagentes. Ele
consome água, aumenta de volume e, conseqüentemente, leva à desagregação do
concreto. (NEVILLE, 1997).

Mecanismos de envelhecimento e deterioração relativos à armadura

A deterioração das armaduras está ligada ao processo de corrosão. Para que a corrosão
se instale é necessário e indispensável a presença de um eletrólito (a água, por
exemplo), de uma diferença de potencial (que pode ser gerada por diferença de
umidade, aeração e tensões no concreto ou no aço, entre outros) e a disponibilidade de
oxigênio (CUNHA E HELENE, 2001).

Como já foi citado, o concreto é um meio altamente alcalino (pH em torno de 12,5).
Nestas condições, a armadura em seu interior encontra-se protegida da corrosão pela
formação de um filme passivador ao seu redor, de acordo com a reação abaixo:

Sob estas condições, a taxa de oxidação da superfície do aço é da ordem de 0,1m/ano,


o que, em termos de vida útil do concreto pode ser considerada desprezível
(CASCUDO, 1997). A despassivação da armadura pode ocorrer por ação de íons cloreto
e/ou carbonatação do concreto.
Os íons cloreto não atacam o concreto, mas destroem a película passivadora e, em
presença de água e oxigênio, ocorre a corrosão. O poder de destruição destes íons é
grande, exigindo um cuidado maior na execução de obras litorâneas (figura 3).

Os íons cloreto podem vir tanto do meio externo, atingindo a armadura por difusão ou
podem estar presentes no próprio concreto, originados da água de amassamento, de
agregados contaminados ou ainda provenientes de aditivos. No primeiro caso, a
qualidade o concreto, especialmente no que diz respeito ao controle da relação
água/cimento e do cobrimento da armadura, é essencial para impedir a ação dos íons
cloretos. Já o segundo caso está ligado ao controle da qualidade dos materiais
constituintes do concreto.

Figura 3: Corrosão de armadura por cloretos em estrutura de concreto em zona marítima

(fonte: HELENE, 1992)

A carbonatação do concreto ocorre em função da reação química entre os ácidos do


meio ambiente e o líquido intersticial existente nos poros do material. Este líquido
encontra-se saturado por hidróxidos de cálcio, além de outros compostos como
hidróxido de sódio e potássio. O ácido carbônico (H 2CO3), oriundo da reação entre gás
carbônico e água, age como desencadeador da carbonatação do concreto, reagindo
principalmente com o hidróxido de cálcio, dada a sua maior disponibilidade no material
(CUNHA e HELENE, 2001). A reação se processa segundo a equação a seguir:

A formação dos carbonatos reduz o pH do meio (concreto). Com isso, a película


passivadora da armadura se desfaz e, desde que estejam presentes o oxigênio e a
umidade, o processo de corrosão poderá se instalar.
A corrosão surgida deste processo é do tipo generalizada, já aquela por ação de íons
cloreto é do tipo localizada, conforme ilustra a figura 4.

Figura 4: Diferentes manifestações de corrosão (CASCUDO, 1997)

A conseqüência da ação dos íons cloreto e da carbonatação é a corrosão da armadura


(figura 5). Esta, por sua vez, gera dois problemas à estrutura: a redução da seção
transversal da barra, uma vez que o ferro é consumido durante a reação de dissolução; e
a desagregação do concreto, pois o produto da reação de dissolução do ferro, o óxido
férrico hidratado, ocupa um volume maior do que o aço original gerando tensões
internas no material.

Figura 5: Estrutura danificada por corrosão da armadura, oriunda do ataque de cloretos


incorporados ao concreto. (fonte: CASCUDO, 1997)

Mecanismos de envelhecimento e deterioração relativos à estrutura propriamente


dita

Com relação à estrutura, normalmente sua deterioração está associada à instalação de


fissuração. Esta fissuração pode ser originada por ações mecânicas, impactos,
movimentação de origem térmica, ações cíclicas ou fluência. Uma vez instalada, a
fissuração irá facilitar o acesso de agentes agressivos ao concreto e/ou à armadura,
levando à degradação da estrutura por ação dos mecanismos já citados anteriormente.

Considerações Finais

Os casos aqui abordados, relativos aos mecanismos de deterioração das estruturas, são
aqueles mais correntes na realidade brasileira, sendo inclusive contemplados na NBR
6118 (2007). Outras formas de deterioração poderão acontecer, todavia em menor
incidência.

O concreto é suscetível às mais diferentes formas de ataque e sua deterioração está


diretamente ligada à sua porosidade, resultante de uma relação água/cimento alta e
desaconselhável do ponto de vista da durabilidade, embora compatível com a resistência
especificada. Somado a isso, tem-se as espessuras de cobrimento, em geral muito
baixas, que facilitam a chegada de agentes agressores à armadura.

Mais uma vez fica caracterizada a importância do conhecimento do comportamento e


das propriedades dos materiais envolvidos na execução de estruturas, desde a fase do
projeto, a fim de que se possa eliminar os agentes causadores de sua deterioração e, com
isso, aumentar a durabilidade da mesma.

Novamente é importante ressaltar que, desde que a qualidade do concreto seja adequada
ao fim a que se destina, considerando-se inclusive as condições do ambiente ao qual o
mesmo estará exposto, a probabilidade de ocorrência destas manifestações patológicas é
bastante reduzida. Desta forma, acredita-se que a partir do momento que a nova NBR
6118 entre em vigor, a qualidade das estruturas de concreto será, em muito melhorada.
A partir do momento em que o projetista de estruturas e o tecnologista do concreto
passarem a considerar, à luz do novo texto, ainda na fase de projeto, a agressividade do
meio onde a peça estará inserida, a limitar valores para relação água/cimento e a
especificar cobrimentos maiores, a obtenção de estruturas duráveis será uma
conseqüência natural.

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