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O híbrido no Brasil sempre foi uma questão complexa, horas visto como o
conformado, símbolo da dominação, ou conceitualmente acusado de privilegiado por
suposições de estar sempre em uma contínua transição. Mas de qualquer forma o
híbrido na construção epistemológica quando não é o sem lugar, é vinculado a
outras existências que por vezes não comportam sua complexidade.
Kabengele Munanga, na obra “Rediscutindo a mestiçagem no Brasil” (1999)
explica que todos os movimentos sociais, incluindo o movimento negro, lutam pela
justiça social e sabemos que é difícil para todos mobilizar os membros numa luta
comum para transformar a sociedade. Como o autor defende, a superação dos
obstáculos exige a construção de uma nova consciência, que por sua vez não é
possível sem partir da questão da auto identificação, onde desencadeará um
processo de construção de uma identidade coletiva, que serve como um norteador
teórico. Com base nisso, Munanga critica a separação de negros e mestiços, e
revela essa separação como sendo empecilho para que essa identificação coletiva
aconteça. Concordo que há um processo de alienação nessa separação, e uma
tentativa de branqueamento, mas discordo do autor; não porque mestiços não faz a
força junto aos negros, como ele afirma, mas sim porque o mestiço é uma figura
complexa do Brasil que se reduz a definição do outro. Ou cabe ali ou aqui, mas
nunca em si.
Assim como o autor, a proposta deste ensaio é fazer uma breve reabertura da
discussão sobre a mestiçagem em suas identidades múltiplas, e sabemos que o
processo de formação da identidade nacional no Brasil recorreu aos métodos
eugenistas visando o embranquecimento da sociedade, e tal afirmação é
comprovada historicamente. Não estou aqui para revisionar a História. O ensaio não
é para buscar a palavra fundadora do mestiço. Até porque é óbvio, estamos em uma
sociedade miscigenada. Também não é intenção deste, recorrer a uma lógica
salvacionista, literário- romântica nacionalista em relação ao que se entende como
mestiço, nos termos de se negar as contradições envolvidas.
Aqui se pretende partir,
(...) Da constatação (e não da reivindicação) do mestiço. A mistura é um fato que nada tem de
circunstancial, de contingente, de acidental. A condição humana (a linguagem, a história, o ser no
mundo) é encontro, nascimento de algo diferente que não estava contido nos termos em presença.
Não é, pois, necessário reivindicar a miscigenação, fazer a defesa da mestiçagem como se
estivéssemos confrontados com uma alternativa, porque ela não é senão o reconhecimento da
pluralidade do ser no seu devir (Laplantine; Nouss, 2002).
Como Munanga bem coloca, a mestiçagem não pode ser concebida apenas
como um fenômeno estritamente biológico, e que pode-se constatar que os estudos
clássicos só trataram de alguns casos no conjunto dos fluxos que se estabeleceram
de uma população à outra, e excluíram implicitamente outros casos. Pensando
nisso, o foco do ensaio vai ser a questão parda- indígena ou indígena-parda, que é
implicitamente excluída do debate.
Diante disso, vou trabalhar com a questão da mestiçagem e do híbrido, através
da categoria “pardo”, que aparece quase sempre como alvo de críticas. Em uma
pesquisa feita por Nogueira de Souza para a Revista Latino Americana de Estudos
em Cultura e Sociedade, ele reescreve as falas dos entrevistados sobre o termo:
“pardo é papel”,
“pardo é japonês”
“não sei o que é ser pardo”
[...] coloca em xeque aqueles processos que tendem a conceber as identidades como
fundamentalmente separadas, divididas, segregadas. O processo de hibridização confunde a suposta
pureza e insolubilidade dos grupos que se reúnem sob as diferentes identidades nacionais, raciais ou
étnicas. A identidade que se forma por meio do hibridismo não é mais integralmente nenhuma das
identidades originais, embora guarde traços delas.
Bibliografia:
Souza, G. N. de. (2019). Análise do sistema de classificação por cor/ raça no Brasil.
RELACult - Revista Latino-Americana De Estudos Em Cultura E Sociedade, 5(5).
https://doi.org/10.23899/relacult.v5i5.1442 .