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CONTRA
DIÁSPORAS
DA CIDADE
Aymée Godoy
Carolina Rodrigues
de Lima
Geovana Melo
Jean Carlos Azuos
Jorge Freire
Juliane Gamboa
Junior Negão
Letícia Puri
Lucas Magalhães
Marina Souza
Melissa Alves
Rosemeri Conceição Residência
Thamires Siqueira Territórios Curatoriais
Yuri Menezes 2023
Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro e
Secretaria Municipal de Cultura apresentam
FRACTAIS:
CONTRA DIÁSPORAS
DA CIDADE
Aymée Godoy
Carolina Rodrigues
de Lima
Geovana Melo
Jean Carlos Azuos
Jorge Freire
Juliane Gamboa
Junior Negão
Letícia Puri
Lucas Magalhães
Marina Souza
Melissa Alves
Rosemeri Conceição
Thamires Siqueira
Yuri Menezes
Residência
Territórios Curatoriais
Organização
Patrocínio
Patrocínio Estratégico
Patrocínio
A Prefeitura do Rio, por meio da Secretaria Municipal
de Cultura, cuida de um dos maiores patrimônios bra-
sileiros: a cultura carioca.
São mais de cinquenta equipamentos espalha-
dos por toda a cidade, entre teatros, arenas, museus,
bibliotecas, salas de leitura e centros culturais. Uma das
maiores redes municipais de equipamentos de cultura
da América Latina.
Investimos mais de R$ 200 milhões por ano
em cerca de 1.200 projetos pensados, produzidos e
estrelados pela cena cultural carioca. São milhares
de empregos gerados e um grande aporte financeiro
para a cidade.
Criada em 2013, a Lei Municipal de Incentivo
à Cultura da cidade do Rio de Janeiro (Lei do ISS) é o
maior mecanismo de incentivo municipal do país em
volume de recursos e busca estimular o encontro da
produção cultural com a população. Acreditamos que
a cultura é um vetor fundamental de desenvolvimento
econômico e social e de protagonismo da diversidade,
da democracia e da nossa identidade.
PREFEITURA DO RIO
Secretaria Municipal de Cultura
A Deloitte definiu uma estratégia global de responsa-
bilidade corporativa e sustentabilidade refletida no
conceito WorldImpact, que prevê impactar o mundo
a partir de quatro grandes programas — WorldClass,
WorldClimate, DE&I e Impact Every Day —, todos re-
plicáveis em cada firma-membro da organização e
hoje plenamente implementados no Brasil. Por meio
deles, a Deloitte busca se antecipar às demandas da
sociedade e promover impactos tangíveis. Ao fazer
isso, conecta-se também aos anseios dos talentos
da própria organização e do mercado.
162 RESIDÊNCIA
TERRITÓRIOS CURATORIAIS
CURADORIA
DE CRIA: QUANDO
O MUSEU ESCUTA
O TRÂNSITO
DA CIDADE
Renata Sampaio
Lais Daflon
Shion L
Em 2023, ano em que o MAM Rio comemora 75 anos,
relembramos todos os museus que ele já foi e
perguntamos que museu queremos ser daqui para
a frente. O programa de residências da instituição
busca trazer a participação de diferentes públicos
nessa construção. Territórios Curatoriais aconte-
ceu entre 29 de março e 27 de setembro de 2023,
sob a coordenação da gerência de Educação e
Participação do museu, e foi constituída por onze
pessoas curadoras periféricas da cidade do Rio
de Janeiro. As pessoas residentes conversaram
com profissionais de diversas áreas do MAM Rio,
além de curadores independentes e vinculados
a outras instituições, ampliando seus repertórios
com diferentes formas de pensar e fazer curado-
ria, ao mesmo tempo em que aqueciam debates
importantes para a instituição nesse momento
de revisão.
A residência foi constituída em várias
etapas, começando com o curso online “Diálogos
sobre curadoria”, no qual convidamos pessoas
curadoras e articuladoras culturais com diversas
formações e atuações no campo das artes visuais
para encontros acerca de suas práticas, trazendo
conceitos e exemplos de curadorias desenvolvidas
por elas. Aliado ao curso, um ciclo de palestras
trouxe enfoque para as trajetórias de quatro
pessoas curadoras convidadas, em palestras
abertas também ao público — Igi Ayedun, Raphael
Fonseca, Bitú Cassundé e Walla Capelobo —, nas
quais cada uma pôde compartilhar seus diferentes
percursos na área, de maneira a exemplificar como
o ofício da curadoria é ainda muito sui generis, a 11
depender dos repertórios e contextos (históri-
cos, geográficos, pessoais etc.) do profissional
que conduz essas práticas. Durante o percurso
da residência, aconteceram também encontros
presenciais de caráter imersivo, exclusivos para
os residentes, com os seguintes setores e pro-
fissionais do MAM Rio: educação com Shion L e
Daniel Bruno, da equipe educadora; museologia
com a gerente Cátia Louredo e a coordenadora
de conservação Manuela Pereira; cinemateca
com o gerente Hernani Heffner; curadoria com
a curadora-chefe Beatriz Lemos; pesquisa e do-
cumentação com a coordenadora Aline Siqueira,
a pesquisadora Moema Bacelar e o bibliotecário
Reinaldo Alves; e produção e projetos com a ge-
rente Jusele Sá e o analista de projetos Ualace
Miliorini. Nesses encontros os residentes puderam
conhecer e acompanhar o trabalho das equipes
e aprender com as expertises da instituição.
Para contribuir com reflexões necessárias para
o desenvolvimento das pesquisas das pessoas
residentes e com a conceituação e produção do
evento de encerramento da residência, foram
feitas também mentorias individuais e coletivas.
A partir dessa reunião de referências,
além de suas próprias vivências e pesquisas em
curso, os residentes foram curadores do evento
que marcou o fim da residência, Fractais: contra
diásporas da cidade, com uma programação di-
versa no campo das linguagens artísticas e das
perspectivas sociais, raciais e de gênero. Um
exercício curatorial elaborado coletivamente, em
diálogo com os interesses de cada pesquisador. 12
Como resultado das discussões presentes no
curso, nas palestras, nos encontros imersivos e
mentorias, cada residente também nos apresenta
nesta publicação um texto que torna públicas
suas pesquisas e reflexões realizadas ao longo
desse período.
No processo de seleção das pessoas
residentes, priorizamos dois critérios: a aproxi-
mação com a prática curatorial em contextos não
hegemônicos e o compromisso com a seleção
de pessoas nascidas e atuantes em diferentes
territórios periféricos, com a intenção de gerar
pesquisas que pudessem contemplar a cidade
do Rio de Janeiro em parte significativa da sua
extensão. Partindo da premissa de que os mo-
radores dessas regiões, em sua maioria, não
fazem parte do público frequente do MAM Rio,
pensamos este diálogo como uma possibilidade
para perceber o que a cidade espera do museu,
e como as instituições culturais podem atuar na
integração de territórios, edificando novas visões
e compromissos.
Além da diversidade territorial, conside-
ramos necessário que os residentes estivessem
envolvidos em diferentes áreas e estágios de
desenvolvimento profissional, gerando assim um
espaço de convívio e formação mútua. Entre os
residentes, alguns apresentam uma trajetória
mais longa no circuito de artes, já tendo desen-
volvido projetos culturais independentes ou em
instituições, ao passo que outros encontram-se
num contato mais introdutório com o campo. Esta
variedade foi importante para que o programa 13
pudesse gerar espaços de contribuição entre
os residentes, de modo que a presença de pes-
quisadores mais experientes pudesse colaborar
com o repertório de quem está começando, e
os pesquisadores mais jovens pudessem trazer
frescor às reflexões e experiências mais maduras.
Assim, foram selecionados residentes das
áreas de curadoria, audiovisual, produção, música,
museologia e educação, com idade entre 18 e 56
anos, oriundos dos seguintes bairros do Rio de
Janeiro: Gamboa, Pavuna, Fazenda Botafogo, Vila
da Penha, Abolição, Irajá, Méier, Vila Isabel, Bangu
e Santa Cruz. Localidades que se multiplicam ao
considerarmos os trajetos percorridos por cada
residente em suas dinâmicas de deslocamento
na cidade, pensando que a palavra “trânsito” foi
unanimidade na residência como uma das prin-
cipais características que unem as pessoas dos
subúrbios cariocas.
Achamos importante também contar
com pessoas mentoras que compartilhassem
dessas percepções sobre a cidade e os sistemas
de arte. Profissionais da curadoria de origens
suburbanas que trazem em suas práticas reper-
tórios periféricos como indicadores conceituais
de suas pesquisas. Assim surgiu o convite para
Carolina Rodrigues, Jean Carlos Azuos e Melissa
Alves estarem conosco nessa empreitada. As
mentorias foram acompanhadas por nós, Renata
Sampaio, Lais Daflon e Shion L, contribuindo com
as discussões acerca da instituição.
A residência Territórios Curatoriais é
um projeto de curadoria com concepção da 14
gerência de Educação da instituição, portanto,
algumas indagações desde o princípio sulearam1
nossa atuação: Qual expertise precisa ter uma
pessoa para ser curadora? Qual é a formação
de uma pessoa curadora? Quais pessoas são
autorizadas a curar e o que as torna aptas para
isso? Embora, na atualidade, alguns avanços no
que diz respeito às discussões sobre diversida-
de de gênero, raça e território estejam sendo
negociados no campo da curadoria, a presença
masculina, branca e sudestina ainda se apresenta
como uma constante.
Ao longo da residência, tanto no curso
quanto no ciclo de palestras, convidamos profis-
sionais de diferentes áreas de conhecimento e
atuação, buscando propor interdisciplinaridades
entre os espaços de produção de pensamento
nas artes. Entre as premissas da concepção do 1. O verbo sulear
curso e na escolha dos intelectuais convidados, e o substantivo
suleamento têm
tomamos como critério a interseção da prática sido usados nos
curatorial com outros aspectos dos sistemas últimos anos como
de arte. Com isso, apresentamos ao grupo uma contrapontos
críticos ao caráter
inclinação à abordagem trabalhista do campo,
eurocêntrico dos
diálogos com pedagogias dissidentes, a curadoria vocábulos nortear
em espaços não hegemônicos e as dinâmicas e norteamento,
que sugerem
de institucionalidade, sem perder de vista, em
o norte global
função da heterogeneidade do público partici- como orientação
pante, um compromisso pedagógico e por vezes universal (N. da E.).
17
4
5
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1
30
TERRITÓRIO
E ARTE VISUAL
NO FUNK
CARIOCA
Jorge Freire
JORGE FREIRE
é produtor cultural há mais de dez anos. Tem expe-
riência em gestão de projetos e recentemente vem
se especializando na coordenação de equipamentos
culturais. Com foco em arte e cultura periféricas, tem
no horizonte a busca por entender suas complexida-
des e belezas. É pai da Bia, do Pedro e da Bethânia.
E suburbano apaixonado.
BANDEIRA NAÇÃO – O TEMA, O FUNK,
A CIDADE DO RIO DE JANEIRO
Este texto nasce da tentativa de fazer um diálogo
entre as artes visuais e o movimento funk carioca
da década de 1990, revisto hoje no movimento
batizado de “funk da antiga”. O principal objeto de
análise deste trabalho, entre os muitos que o funk
tem, serão as bandeiras que identificam nações
e são utilizadas durante os bailes de galera.
O que despertou meu interesse na resi-
dência Territórios Curatoriais no MAM Rio foi poder
pensar quem tem direito ao acesso aos espaços
oficialmente dedicados às artes, ampliar a visi-
bilidade sobre um campo não institucionalizado,
periférico, mas que produz potentes espaços de
fruição artística, atentar para a capacidade pro-
dutiva das pessoas que estão à borda da cidade
e olhar o fazer artístico por meio de lógicas mais
democráticas e diversas. Com isso em mente, e
a partir das discussões e conceitos apreendidos
durante os encontros formativos, entendi que
era possível levar para o Museu de Arte Moderna
do Rio de Janeiro o movimento funk, mais espe-
cificamente na potência de sua produção visual.
A década de 1990 marca a vida de mui-
tos jovens na periferia. Este trabalho passa pelo
olhar de uma pessoa que a viveu diretamente. Eu
fui um jovem funkeiro dos anos 1990, assim como
grande parte dos meus amigos e amigas. Este
texto é escrito a partir do olhar e da paixão de
um homem negro, oriundo da baixada fluminense,
atuante das artes e que sempre teve uma rela- 33
ção de muita proximidade com tudo que envolve
a cultura funk. Alguém que viveu intensamente a
maior manifestação cultural protagonizada por
jovens periféricos já vista.
O território aparece no funk não só nas
letras das músicas, mas em toda a produção visual
que envolve a realização de um baile. Aqui, buscarei
relacionar as artes visuais presentes nas bandei-
ras, que identificam as “galeras” ou “nações”, com
o desenvolvimento de uma ideia de território, a
construção de imaginários sobre ele e sua relação
com a cidade e todos os seus conflitos.
Os bailes “funk de corredor” nasceram na
década de 1990 no Rio de Janeiro e consistiram em
eventos em que grupos de diferentes favelas se
encontravam para curtir, conforme relata Ricardo
Índio, produtor de funk, em entrevista concedida
ao jornal Extra em 2020: “O baile era a parte boa,
o ruim era o caminho para chegar até lá porque
se tornou perigoso por conta das brigas do baile
de corredor. Como os grupos eram divididos, os
jovens que brigavam nos bailes não podiam marcar
bobeira em qualquer lugar”.
O produtor está se referindo às brigas que
aconteciam dentro dos bailes funks, durante os
“cinco minutinhos de alegria”, momento em que
as galeras se dividiam em lado A e lado B para se
enfrentar. O lado A e o lado B estavam diretamen-
te ligados aos territórios dos funkeiros, ou seja,
dependendo de onde você morava, você poderia
ser do lado A ou do B. E essa divisão limitava seu
direito de ir e vir dentro da cidade. Você não po-
deria curtir uma festa no lado que não fosse o 34
seu, porque, se fizesse isso, corria risco de morte.
Por isso as músicas exaltam tanto os territórios.
Cada galera tinha que se sentir represen-
tada durante o baile. Me recordo de um cantor
famoso que morava em uma comunidade que
não era mencionada na música “Nosso sonho”,
de Claudinho e Buchecha, que cita vários bairros
do Rio, lamentando que o bairro dele não era
nem citado na música. As comunidades já eram
invisíveis pelo Estado e, pelo menos nos bailes, os
moradores sentiam que seu território poderia ser
motivo de orgulho, pertencimento e identidade.
A violência era algo que o produtor Luís
Cláudio não gostava de ver dentro dos seus
eventos. Ele defendia que o fim da violência
nos bailes deveria ser alcançado pela música,
e não pela presença da polícia. O famoso jargão
“o baile foi feito para curtir e dançar”. Para pro-
mover a paz, ele distribuiu durante anos mais de
620 troféus para as galeras que frequentavam o
baile, segundo entrevista concedida ao Jornal
do Brasil em 1992.
Cláudio criou o evento chamado Matinê
Premiada, que promovia um concurso sema-
nal, aos finais de semana, onde centenas de
jovens de diferentes territórios disputavam
entre si em alguns quesitos: dança, tamanho
do grupo — popularmente chamado de bonde —
e o famoso grito da galera. Para que o grito da
galera ganhasse ainda mais força, os jovens in-
ventaram uma forma de se destacar no meio da
multidão. E assim surgiram as bandeiras dentro
do baile, que eram bem simples: uma faixa de 35
5 por 5 metros, com os nomes dos territórios
de determinada galera escritos, estendida em
dois paus de bambu.
A Furacão 2000 e outros grandes produ-
tores da década de 1990 também promoveram
concurso entre as galeras e campanhas pelo fim
das brigas e das mortes dentro dos bailes. E as
brigas poderiam até não acontecer mais dentro
dos eventos, porque a equipe de segurança ex-
pulsava os baderneiros, mas fora dos bailes, nas
ruas ao redor, a rivalidade e a violência perma-
neciam presentes.
A bandeira como elemento de identifica-
ção se organiza a partir dessa divisão fundamen-
tal. Mas essa divisão vai se consolidar depois no
Império Serrano, local que, para muitos, foi a
primeira vez que viram uma corda dividir o espa-
ço do baile e estabelecer concretamente aquilo
que já existia simbolicamente.
1. Célio José
BANDEIRA TERRITÓRIO – dos Santos, “A
PERTENCIMENTO, IDENTIDADE insurgência do
lugar em tempos
de globalização:
O território é o lugar em que desembo- uma análise a
cam todas as ações, todas as paixões, partir da cultura
hip-hop”, Caminhos
todos os poderes, todas as forças, todas
de Geografia,
as fraquezas, isto é, onde a história do Uberlândia, v. 16,
homem plenamente se realiza a partir n. 54, jun. 2015, p. 13.
BANDEIRA DEMOCRACIA –
ARTE COMO DIREITO
[...] espaço invisível aos olhos da socie-
dade que, muitas vezes, despreza-o, na
tentativa de apagamento dos sujeitos e
de suas produções culturais marginaliza-
das, não porque encontradas à margem
geográfica do sistema, mas porque co-
locadas de lado pela produção calcada 39
no dinheiro, que volta sua atenção e seus
olhos para os sujeitos e as produções da
alta sociedade, sendo, esses, colocados
em local central de visibilidade e impor-
tância sociais.2
41
RODA – ROMPENDO
SILÊNCIOS: UMA
REFLEXÃO SOBRE A
ANCESTRALIDADE E A
CIRCULARIDADE NA
ARTE E NA VIDA DAS
MULHERES NEGRAS
Juliane Gamboa
JULIANE GAMBOA
é formada em história da arte pela UFRJ, musicista e
professora de musicalização e canto. Tem experiência
em produção de eventos, arte-educação e curadoria
artística e musical. Pesquisa artes e músicas negras,
interessada em abordagens transdisciplinares.
PERFORMANCE SONORA
A quem lê,
45
No sonho que nos sonharam,
não havia o impossível.
Leda Maria Martins
4. Trecho da música
Os meus sonhos não são meus, mas dos “Quilomba”, da
meus ancestrais.4 cantora Azula.
Azula
5. Conceição
Evaristo, Poemas
A escritora Conceição Evaristo em seu da recordação
e outros
poema “Vozes-mulheres”5 descreve um proces-
movimentos, Rio
so geracional da tomada desse mesmo lugar de de Janeiro: Malê,
libertação. 2017, pp. 24—25.
Vozes-mulheres
8. Um símbolo
que faz parte de
um conjunto
de ideogramas
chamados Adinkra,
representado por
um pássaro que
volta a cabeça à
cauda. O símbolo
é traduzido como
“retornar ao
passado para
ressignificar
o presente e
construir o futuro”.
52
CURADORIA ALÉM
DA PASSARELA:
ANÁLISE SOBRE
AS DIVERGÊNCIAS
TERRITORIAIS E
SOCIOCULTURAIS
ENTRE A ZONA SUL
E A ZONA OESTE
Thamires Siqueira
THAMIRES SIQUEIRA
tem 23 anos, é técnica em administração, graduada em
museologia e pós-graduada em arquivo e patrimônio.
Atualmente, coordena a área de patrimônio e assuntos
culturais no NOPH — Núcleo de Orientação e Pesquisa
Histórica de Santa Cruz. É especialista visitante em muse-
ologia na UFRRJ. Pesquisa museus, território e sociedade.
O Rio de Janeiro é considerado uma cidade diversa
devido à sua vasta extensão territorial e à sua
grande população, que se apresenta de diferentes
formas. Sabe-se que a identidade de uma socie-
dade se modifica de acordo com as influências e
características do território onde ela está inse-
rida, e isso se manifesta nas zonas que dividem
a cidade não só geograficamente, mas também
em estratos socioculturais. Ao analisar o trecho
da zona sul à zona oeste, é nítida a diferença em
diversos aspectos, principalmente no acesso a
direitos básicos como cultura, lazer, educação,
segurança, infraestrutura e transporte, que, por
sua vez, derivam do investimento do poder público
e não são distribuídos de maneira igualitária.
A zona oeste é a maior zona da cidade,
correspondendo a mais de 70% do Rio de Janeiro em
extensão territorial e com grande concentração
populacional. Mesmo assim, carece de investimentos,
que são mal distribuídos, prioritariamente aplicados
na zona sul e na região central, lugares que o poder
público enxerga com potencial cultural e turístico
e, por isso, concentra seu olhar. De acordo com
o Mapa da Desigualdade, isso colabora para que
a população com menos recursos financeiros se
reúna em bairros periféricos e tenha dificuldade
de acesso às fontes de cultura. Em 2020, entre
os 136 museus do município do Rio de Janeiro, 96
estavam na zona sul e no centro, e apenas 40 se
dividiram entre as outras zonas.
Santa Cruz, bairro da zona oeste onde
vivo, é um exemplo disso. Com mais de 450 anos
de história, foi palco para fatos de forte impor- 55
Fonte: Casa Fluminense, 2020.1
para o território.
Ao analisar as vivências adquiridas durante
a residência Territórios Curatoriais, pudemos re-
pensar estes lugares, como se apresentam, quais
são suas dificuldades e seus atrativos. Conside- 60
ramos esses espaços — que foram delimitados
não só geográfica como politicamente — como
responsáveis pela criação de nossas comunida-
des, da identidade e da memória das pessoas que
os habitam e que merecem conhecer e executar
seu direito à cidade e aos seus espaços.
Ao vivenciar nossos percursos, seja pelo
transporte, para trabalho, estudo ou lazer, con-
seguimos observar as fronteiras que cruzamos
para conseguir adentrar e se estabelecer em
novos espaços. Podemos ver essas dificuldades
de deslocamentos como as diásporas da cidade,
como nomeamos no evento final da residência.
Elas representam a dispersão e a reinserção que
enfrentamos em uma cidade e em um país, tão
vastos e múltiplos, onde, mesmo com diferenças,
as comunidades conversam entre si, sendo fractais,
fragmentos semelhantes que complementam um
todo. Assim conseguimos nos reconhecer, identi-
ficar e se aproximar das vivências das trajetórias
de outras localidades.
Poder dar esta visibilidade e este protago-
nismo aos trabalhos comunitários é importante,
pois auxilia no autorreconhecimento de seu valor
através da educação patrimonial, essencial para
manter vivas a história e a memória dos territó-
rios. Ao trabalhar de maneira coletiva e afetiva,
todos criam um vínculo com a causa e reconhe-
cem a importância de passar esse legado entre
as gerações.
Observando as diferentes formas de
curadoria e sua aplicação nos espaços, pode-
mos analisar as mudanças ocorridas ao longo do 61
tempo, quebrando os paradigmas estabelecidos
pela sociedade e indo além em busca de nossos
objetivos. Com uma curadoria mais inclusiva,
igualitária e acessível a todos os públicos, en-
xergamos que, independentemente de nossas
trajetórias e territórios, mesmo distantes dessa
elite curatorial, todos temos potencialidades que
se complementam nessas funções. Seja no papel
de curador ou em outras áreas da cultura, devemos
pensar principalmente em quem queremos atingir
e na mensagem que queremos passar.
Com nossas influências, esperamos que
no futuro, após 75 anos de instituição, o MAM Rio
possa abrir seus horizontes, indo além da passa-
rela Paulo Bittencourt. E busque não só alcançar
novos territórios através de seus projetos e ex-
posições, mas também ser atrativo e acessível
para que pessoas, mesmo distantes social e
geograficamente, possam ocupar seus espaços,
seja buscando oportunidades de trabalho ou for-
mas de lazer. Esperamos que o museu permita às
pessoas que criem uma ponte que interligue de
maneira inclusiva uma ponta à outra da cidade, e
seja um espaço aberto a idas e vindas que formam
diferentes percursos territoriais.
62
REFERÊNCIAS
BARBOSA, Jorge. L., “Território e cultura
na metrópole”, em BARBOSA, Jorge.
L. e outros, O novo carioca, Rio de
Janeiro: Mórula, 2012, pp. 151—163.
63
Marc Augé”, ARTITEXTOS, n. 3, 2006.
SAMPAIO, Alice; MENDONÇA, Elizabete,
“Democracia cultural, museu e patrimônio:
relações para a garantia dos direitos
culturais”, E-cadernos CES, n. 30, 2018.
64
TECER NOVOS
CENTROS:
TERRITÓRIOS
CRIATIVOS EM
MOVIMENTO
Yuri Menezes
YURI MENEZES
é curador e pesquisador cultural. Cofundou o coletivo
SISC RUN e a Meio Fio Galeria. É formado no curso de
qualificação profissional em produção cultural pelo
Polo Educacional SESC. Desde 2015 desenvolve práticas
culturais no território da zona oeste carioca.
A criação de “novos centros” e a descentralização
dos espaços de arte e cultura na cidade do Rio
de Janeiro são impulsos que nascem em nossos
próprios territórios. É lá, nesses lugares, que as
histórias, as obras e os artistas ganham vida e,
por fim, convergem para o “centro”. Durante o pro-
cesso de construção do evento Fractais: contra
diásporas da cidade, os residentes não apenas
contribuem para a formação de narrativas, mas
também reafirmam suas origens, dando forma
aos espaços, promovendo o desenvolvimento e
fortalecendo o sentimento de pertencimento.
Este texto transcende a mera introdução,
é um manifesto de transformação. Ao mapearmos
com nossas ações um território que redefine o
papel do curador e do agente de mudança no
cenário das artes visuais, quebram-se os limites
impostos pelo mercado, pelas instituições e pelos
espaços artísticos tradicionais. Aqui, estamos
forjando um novo capítulo na história da curadoria.
No coração do Museu de Arte Moderna do Rio de
Janeiro, onde fractais se entrelaçam com as nar-
rativas dos lugares que representam, emerge um
espaço de possibilidades, no qual os territórios
se conectam e as negociações entre passado e
presente engendram novas realidades.
Minha presença nesse espaço é um
capítulo contínuo na jornada das artes visuais
e da curadoria, originada nas periferias, muitas
vezes à margem do centro de poder da cidade,
em contraste com os espaços artísticos mais
convencionais. Trata-se de um ato de negociação
que transcende o espaço físico; é um convite 67
para expandir nossas perspectivas e reconhecer
a riqueza dos variados territórios culturais que
influenciam nossas experiências. É um chamado
para abraçar o que trouxemos de outras paragens
na construção do nosso próprio cenário artístico.
O conceito de curadoria de território é o
elemento central deste texto. Com ele, cada ação,
intervenção e obra simbolizam uma cuidadosa
negociação entre passado, presente e futuro
entre diversas experiências e perspectivas.
Durante os encontros da residência, tive a
oportunidade de conhecer um programa criado pelo
crítico e curador Frederico Morais em 1971. Naquela
época, ele ocupava a posição de coordenador de
cursos no MAM Rio e organizou seis edições dos
Domingos da Criação. Especificamente, o Domingo
do Tecido despertou meu interesse, levando-me
a investigar mais sobre essa terceira edição do
evento realizada nos jardins do museu. Naquele
encontro, foram disponibilizadas duas toneladas
de materiais doados por empresas têxteis, tais
como as Casas Pernambucanas, a Fábrica Bangu,
localizada em Bangu, bairro onde vivo há 31 anos,
e que carrega seu nome, e a Sudamtex.
Retalhos, sobras de seda, jérsei, malha,
brim, lã, telas e sacos de aniagem foram disponibi-
lizados ao público para que ele pudesse interagir
e criar livremente na área externa do museu. A
presença histórica da Fábrica de Tecidos Bangu
na trajetória do MAM Rio capturou minha atenção
e me impeliu a buscar uma compreensão mais
profunda do espaço criativo daquela época e nos
dias de hoje. Como curador de Bangu, atuando no 68
MAM Rio 50 anos após aquela atividade, senti a
necessidade de reexaminar a contribuição dos
territórios suburbanos cariocas, tantas vezes
empurrados à margem pelas dinâmicas de poder
estabelecidas.
Ao ultrapassar as barreiras que se erguem
na cidade e considerar a colaboração da Fábrica
de Tecidos Bangu, descobri uma conexão entre o
passado e o presente. Os rolos de tecido doados
para a atividade tornaram-se mais do que simples
materiais. Eles carregam as histórias de quem os
produziu, partes da cidade e vidas entrelaçadas.
Para a exposição Contracentro: cartogra-
fias do subúrbio, que integrou o evento Fractais:
contra diásporas da cidade, desenvolvi a ação/
obra Territórios de criação. Para além da simples
contemplação, a obra foi um instrumento para ex-
pressar como cada pedaço de território na cidade
possui o potencial de contribuir com habilidades
e trabalho na criação, construção e no debate em
torno da arte contemporânea, transcendendo os
limites dos subúrbios e periferias.
Ao trazer a referência histórica de Do-
mingo do Tecido para a residência Territórios
Curatoriais, desejo explorar a relação entre arte,
moda e territórios. Investigar como a presença
da antiga Fábrica de Tecidos Bangu influenciou a
identidade e a memória coletiva de sua região, e
como isso pode ser ressignificado artisticamente
nos dias de hoje. Com a ação/obra Territórios de
criação, pretendi estimular trocas entre os ar-
tistas convidados e o público, a fim de conhecer
melhor suas histórias e vivências relacionadas 69
ao pertencimento territorial. Minha intenção foi
criar uma obra/ação artística que não apenas
resgatasse a memória da fábrica, mas também
promovesse uma reflexão sobre o impacto social
dos espaços não formais de arte.
Territórios de criação consiste em uma
tela formada por fractais, camisas de algodão
brancas sobrepostas umas às outras, formando
um painel de dimensão 3,37 x 1,90 m em forma de
losango na cor vermelha, uma forma geométrica
encontrada na logomarca da fábrica. No interior
dessa forma, é reservado o espaço para convidar
artistas a intervir com sua técnica pictórica.
A obra foi originada na residência Territórios
Curatoriais, conectando a história do museu ao
longo dos seus 75 anos de existência ao território
onde está situado: a cidade do Rio de Janeiro. A
ação envolveu a geração de fractais em forma de
camisas, fragmentos da obra que foram doados ao
público. Ao trazer esses fractais para os espaços
do MAM Rio, além de moldar uma obra, buscamos
redefinir o próprio conceito de centro criativo.
Usar Territórios de criação como meca-
nismo e suporte de experimentação sugeriu uma
delimitação espacial e material para os artistas,
que eles poderiam ultrapassar apenas se neces-
sário. Com o setor de Educação e Participação do
museu que acompanhou onze curadores durante
a residência nas escutas e mediações com a
instituição, conseguimos a ocupação Fractais:
contra diásporas da cidade.
“Fractal é tecnologia ancestral. É uma fi-
gura geométrica produzida por meio de equações 70
matemáticas, nas quais o todo forma a parte e a
parte reflete o todo, assim como o todo traduz
a parte”, disse o curador residente JR Negão. As-
sim, abrimos espaço para mais de 24 artistas dos
mais variados segmentos das artes e da crítica na
cultura periférica contemporânea carioca. Além
de movimentar comércios locais, prestadores de
serviços e ateliês em nossos territórios.
Através de Territórios de criação, convidei
os e as artistas Cety Soledad, Mayra Karvalho e
Lolly a desenvolver e criar sobre esse suporte
obras construídas para contemplação, em uma
ação que se fragmentou, junto com as pessoas
que estiveram no salão de eventos no MAM Rio
no dia 23 de setembro de 2023.
A experiência de curadoria dessa obra/
ação nos permitiu vivenciar o cotidiano do ateliê
de Railda Maria. Além disso, revelou a vitalidade de
espaços como a Meio Fio Galeria, o Ghetto Colletive
e muitos outros espalhados pelo subúrbio carioca.
Esses locais abrigam a criação artística e servem
como pilares cruciais no desenvolvimento da cena
artística e do mercado fora do centro de poder da
cidade. Eles são os alicerces onde nossos pares
constroem novos espaços e oportunidades, ali-
mentando a riqueza das memórias e fomentando
uma infinidade de possibilidades.
Finalizo minha colaboração na residência
Territórios Curatoriais com agradecimentos à
mentora Carolina Rodrigues, aos meus pares Cesar
“The Cria” Oliveira, JR Negão, Gisele Nascimento,
Junior “IRA”, Paulo Oliveira, Cety Soledad, Mayra
Karvalho, Lolly, Vykthorya A. Barbosa, minha mãe 71
Andreia de A. Menezes e, em especial, ao meu avô
Alípio Menezes.
Pensamento positivo, energia criadora.
72
PRÁTICA E
PENSAMENTO A
CONTRAPELO
Jean Carlos Azuos
JEAN CARLOS AZUOS
é curador, pesquisador e educador. Atualmente, atua
como curador na Escola Livre de Artes ELÃ (Galpão Bela
Maré, Rio de Janeiro) e como curador assistente no
Museu de Arte do Rio (MAR). Doutorando no programa
de pós-graduação em literatura, cultura e contempo-
raneidade da PUC Rio, desenvolve pesquisas e práticas
em curadoria e educação na perspectiva contracolo-
nial, refletindo sobre as presenças negras, indígenas,
LGBT+ na composição política de outras cenas na arte
contemporânea. Em 2023, atuou como mentor na resi-
dência Territórios Curatoriais do MAM Rio.
Eu não tento liberar esses documentos
do contexto em que foram coletados,
mas tento explorar a superfície dessas
considerações para propósitos e consi-
derar a forma de resistência assumida
em um determinado contexto. Minha
tentativa de ler a contrapelo é talvez
melhor entendida como uma combinação
de pilhagem e desfiguração.1
Saidiya Hartman
3. Diane Lima,
É imprescindível assentar a ideia de que “Não me aguarde
somos um país em diáspora, de rastro colonial na retina”,
e segregação, e que são muitos os fractais que SUR — Revista
Internacional de
compõem nossas identidades, heranças e ances-
Direitos Humanos,
tralidades. E, por isso, uma crítica à curadoria e São Paulo (Rede
sua possível reformulação precisa estar atenta Universitária de
Direitos Humanos),
às diferentes biografias, geopolíticas, intersec-
v. 15, n. 28,
cionalidades, dissidências e outras centralidades. pp. 245—257, dez.
2018, p. 248.
81
ENXERGAR AS
MULHERES COMO
O INÍCIO DE TUDO
Aymée Godoy
AYMÉE GODOY
tem 18 anos e é moradora da Vila da Penha, zona norte
do Rio de Janeiro.
Quando me inscrevi para a residência Territórios
Curatoriais do MAM Rio, não imaginava que seria
uma experiência tão enriquecedora e refrescante
como foi! Eu tinha acabado de terminar o ensino
médio, estava procurando emprego ou uma fonte
de renda para movimentar minha vida, não tinha
conseguido passar na universidade, estava com
medo do meu futuro e extremamente desanimada
para começar algo novo. Naquele momento, es-
tava enquizilada, porque tinha a sensação de que
estava muito à deriva, sem saber direito para onde
ir ou o que fazer, como se eu fosse uma pequena
ilha no meio de um oceano imenso.
Eu entrei no MAM sem nem saber o que era
curadoria e, justamente por isso, achei que não
iria conseguir. Na minha cabeça, era muito distante
a ideia de eu, Aymée, uma garota de 18 anos, que
sabe tão pouca coisa da vida, entrar em um lugar
tão grande, com pessoas tão grandes, que estão
acostumadas a fazer e ver coisas tão grandes.
Tinha momentos até que eu me questionava, já lá
dentro: "Será mesmo que eu estou no lugar certo?
Para onde será que os Ọrişas me trouxeram? Eu não
entendo quase nada do que esse povo fala. Eles
falam difícil, com palavras que eu nem conheço".
Mas com o tempo percebi que estava exatamente
onde deveria estar, e que assim como as outras
pessoas, eu também tinha o que agregar no museu.
Sempre pensei nos museus como lugares
extremamente inacessíveis por causa da con-
centração no centro ou na zona sul, pelo preço
de alguns e pelas artes expostas que, muitas
vezes, não conversavam com os meus interesses, 84
minhas vivências e/ou meus repertórios. É que,
tipo, as exposições nas quais eu tive a oportu-
nidade de ir eram muito legais, interessantes e
enriquecedoras, mas, grande parte das vezes,
sentia que faltava o tchan, tá ligado? Algo que
realmente me interessasse, algo com que eu
me identificasse de fato. Às vezes, sinto que
as exposições seguem um padrão, que têm o
objetivo de atingir e agradar um único público: a
galera branca, mais velha, moradora da zona sul.
E mesmo quando a exposição é voltada para um
outro grupo de pessoas, a maioria delas acontece
em instituições que estão localizadas no centro
ou na zona sul. Então, se eu moro em Sepetiba
e tem uma exposição que me interessa no MAM
Rio, eu teria que fazer uma viagem demorada e
custosa para ir até lá.
Dito isso, eu entrei na residência com o
desejo de tentar deixar o museu mais amplo e demo-
crático, tá ligado? Óbvio que eu não tenho a capaci-
dade de mudar o museu de lugar, ou espalhá-lo pelo
Rio de Janeiro, mas gostaria de trazer exposições ou
eventos que tocassem pessoas com idades, vivência
e origens diferentes. E aí, pensei em abordar algo do
mundo da música, porque, para mim, a música tem o
poder de conversar com a alma de todas as pessoas
e sintonizá-las em uma única dança, independente-
mente de qualquer diferença entre elas. Mas além da
música, pensei em discutir o lugar da mulher preta
no processo de criação da sua arte, porque não faz
sentido, para mim, escrever um texto para um lugar
tão grande como o MAM sem botar a mulher preta
em evidência. 85
A figura da mulher preta sempre foi muito
presente na minha vida — e com "figura da mulher
preta" me refiro à minha mãe, que é a mulher que
ensinou tudo o que sei hoje, à minha iyalorixá,
minhas irmãs, minhas tias, minhas primas, minhas
amigas, minhas professoras, minha mãe Oyá, e até
ao meu cargo no candomblé, que é referente a
figuras femininas — e acredito que o ser feminino
é o início, o meio e a continuação futura de todas
as coisas.
Uma vez minha ìyá me ensinou que Oşun
criou a água com reflexo para que toda vez que
ela fosse se banhar, a primeira coisa que ela
visse fosse sua imagem, e assim passasse a se
enxergar como um ser sagrado, o ser capaz de
povoar o mundo. Por ter o dom da fertilidade, Oşun
nos ensina a enxergar as mulheres como o início
de tudo. E não tá errada. Assim, suas filhas e as
pessoas que cultuam sua energia carregam con-
sigo o poder da estratégia e a divindade feminina,
algo muito além desse tal "encanto" que o povo
do candomblé cisma em resumir Ọmọ's ty Oşun.
Quando recebi meu cargo no candomblé,
a ideia da divindade feminina se fortificou. No meu
cargo, eu lido com as Iyamis (não só com elas,
mas principalmente com elas), três entidades
femininas que guardam o segredo da criação do
mundo. E quando fui escolhida para exercer esse
cargo e lidar com elas, comecei a pensar de uma
maneira mais matricentral e aprendi que isso vai
além de ser mãe. Por exemplo: em África, há o
entendimento cultural de enxergar a ìyá (mãe)
em uma posição socialmente e espiritualmente 86
importante, e isso não se limita somente às mães
que geram uma criança, mas se estende, inclusive,
às mulheres que criam algo estético/cultural. Por
exemplo, em Igbeti, cidade na Nigéria, acontece
um festival anual para Ìyámàpó, divindade femini-
na responsável por moldar sua prole com beleza
e cuidado. Ìyámàpó é considerada a divindade
tutelar das artesãs, ceramistas e tintureiras, por-
que, assim como ela, as pessoas (principalmente
mulheres) que exercem essas profissões também
são vistas como ìyá (mãe), já que, de certa forma,
nasce algo lindo delas, suas artes.
Pensei que seria bom montar uma roda
de conversa com artistas mulheres para discutir
os diversos significados de mãe partindo do prin-
cípio yorubá. Perguntar se elas já conheciam esse
conceito, como se sentiam diante disso, como o
processo criativo delas se formava e de que maneira
era influenciado pelo território em que elas vivem.
A roda foi pensada e desenvolvida por Rosemeri
Conceição, que é graduada pela UERJ e mestre
pela USP em história, professora de artes visuais da
Escola de Artes Visuais do Parque Lage e pesquisa-
dora da vestimenta masculina dos homens pretos
do século XX, e por mim, Aymée Godoy, estudante
e, agora, curadora pelo Museu de Arte Moderna do
Rio de Janeiro. As convidadas foram Azula, cantora,
ativista e pesquisadora da música negra; Tayná Uràz,
fotógrafa e artista visual, filmmaker e pesquisadora;
Azizi Cypriano, artista e pesquisadora licenciada
em artes; e Juliana da Conceição Pereira, que tem
graduação, mestrado e doutorado em história, é
uma das idealizadoras do podcast Atlântico Negro 87
e autora do livro A era do maxixe: a história social
de uma dança nacional (1870—1930).
Como filha de uma mulher de Oşun, sem-
pre aprendi com ela que sou capaz de conquis-
tar qualquer coisa com paciência e estratégia.
E isso me lembra muito o conceito de nakoada,
que aprendi em uma das palestras do MAM, com
Beatriz Lemos. Basicamente, nakoada é uma es-
tratégia de guerra do povo Baniwa que consiste
em observar e aprender os costumes do seu ad-
versário para assim achar formas de permanecer
no mundo. Legal, né? Descobrir a curadoria como
uma estratégia de educação também foi lindo.
Ver que a curadoria se desdobra em estratégias
de ensino, de mercado, de crítica, de inclusão, de
oportunidade e de pertencimento foi ótimo, um
divisor de águas para mim, porque, como disse,
entrei sem nada saber sobre curadoria.
O texto está chegando ao fim, e devo con-
fessar que o processo de criação dele não foi nada
fácil, mas eu juro que veio do coração e eu tentei
botar o máximo da minha essência aqui. Inclusive,
esse foi um dos motivos pelos quais eu optei por
escrever com uma linguagem mais simples, e fazen-
do uso de algumas (poucas) gírias. Queria que este
texto fosse absorvido de forma leve e por quem
quer que tenha acesso a ele. Outro motivo é que
durante o convívio com o pessoal da residência,
percebi que às vezes eles falavam de assuntos
simples usando palavras meio complicadas, tá li-
gado? E eu até conseguia compreender o assunto,
mas ficava meio desanimada para falar. Não sei se
era porque elas eram mais velhas e experientes do 88
que eu, ou mais acadêmicas, e por isso sentiam a
necessidade de passar um ar mais sério e profis-
sional, até mesmo por causa do ambiente. Ou talvez
era algo completamente natural adquirido com o
tempo, com a vivência e a convivência com seus
similares, assim como meu jeito de falar.
Obrigada, equipe do MAM, pela oportuni-
dade, pelo cuidado e carinho. Foi uma experiência
ótima e enriquecedora. Entrei nessa residência
muito de cabeça e me senti superacolhida e
amparada pelos mentores. Apesar de ser muito
introvertida, isso não me impediu de desfrutar o
máximo dessa experiência maravilhosa. Encerro
essa residência com uma visão de mundo mais
rica do que quando entrei, e sou grata por isso.
Até!
Àşé para todos!
89
CORRESPONDÊNCIA
MODULAR
Lucas Magalhães
LUCAS MAGALHÃES
26 anos, cursa licenciatura em artes visuais na Uni-
versidade Estadual do Rio de Janeiro. É formado em
direção de fotografia pela Academia Internacional
de Cinema e em direção cinematográfica pela Escola de
Cinema Darcy Ribeiro. Atua na área de fotografia e
vídeo, principalmente como diretor de fotografia em
videoartes, documentários e curtas-metragens, e é
cofundador da produtora audiovisual Três Marias Fil-
mes. Atualmente faz parte do grupo de extensão Arte
e Afro Brasilidade do Instituto de Artes da UERJ (IART),
coordenado pelo professor e curador Marcelo Campos.
01.
homens pretos em cavalos
meninos pretos em motos
92
04.
uma imagem não violenta é uma profecia.
00. paradoxal.
01.
homens pretos em cavalos
meninos pretos em motos
97
O QUE QUEREM AS
MULHERES ARTISTAS:
REFLEXÕES SOBRE
IMAGENS E AFETOS
NA AFRODIÁSPORA 1
Rosemeri Conceição
ROSEMERI CONCEIÇÃO
é doutoranda do programa de pós-graduação em artes
visuais da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Mes-
tre em história social pela Universidade de São Paulo
e graduada em história pela Universidade do Estado
do Rio de Janeiro. Investiga o protagonismo negro, o
racismo e as representações negras com ênfase nas
tramas entre artes visuais, cultura e identidades negras
na diáspora africana. Foi curadora residente da Escola
de Artes Visuais do Parque Lage.
Há alguns meses adquiri mais um livro de Beatriz
Nascimento. Devorei O negro visto por ele mesmo
(2022) como se fosse quadrinhos. Transformei em
curso, palestra e, agora, enquanto escrevo este
1. Agradeço
texto, visito-o novamente. Dessa vez, quero contar
imensamente aos
uma história que abre para mim novos caminhos mentores Lais
de interpretação. Daflon e Jean
Carlos Azuos pela
Durante uma longa entrevista transcrita
troca sensível,
no livro,2 Beatriz Nascimento conta que, quando cuja escuta e
pequena, usava o cabelo bem rentinho à cabeça indicações foram
e, por conta disso, a molecada da rua a chamava fundamentais
para a conclusão
de João. As provocações aconteciam todas as
deste texto.
vezes que ia à escola ou saía pela região para fazer
2. Beatriz
algo que lhe fora solicitado. Em um desses dias,
Nascimento, O
uns rapazes e homens já feitos jogavam bola e, negro visto por ele
quando ela passou, a puseram numa roda e levan- mesmo: ensaios,
entrevistas
taram sua saia, segundo eles, para ver se ela era
e prosa, São
menina ou menino. O episódio ocorrido em 1954 Paulo: Ubu, 2022,
foi recuperado em sua memória quase trinta anos pp. 136—137.
depois com facilidade e narrado com expressões 3. bell hooks,
como “era uma tortura” e “era um horror”. “Vivendo de
O relato da pensadora está em confluência amor”, trad. Maísa
Mendonça, em
com um conjunto de testemunhos semelhantes
Portal Geledés,
que povoam a infância de mulheres negras em disponível em
diferentes partes das Américas e que, mais recen- https://www.
geledes.org.
temente, vêm sendo cuidadosamente analisados.
br/vivendo-de-
Todos e todas devem lembrar da história amor/, acesso
resgatada por bell hooks,3 em que a pequena em 29 set. 2023.
CONCLUSÃO
11. “Silvana
Como concluir um trabalho que ainda está alicer-
Mendes”, site
çado em perguntas? Talvez seja melhor afirmar da galeria Vilas
que esse é apenas o primeiro passo no sentido de Secas, disponível
trazer indagações sobre o mar de transformações em https://www.
portasvilaseca.
que vem sendo conduzido pela presença potente com.br/br/
que cosmogonias, poéticas, estranhamentos e artistas/silvana-
fabulações têm operado no universo das artes mendes/, acesso
em 6 out. 2023.
contemporâneas. Um viés importante das estru-
turas afrodecoloniais que talvez sirva de escopo 12. Para ver o
trabalho de Ani
para abordagens supranacionais.
Ganzala, acessar:
Seja como for, é um oceano de possibi- http://www.
lidades teóricas que nunca mais permitirá que aniganzala.com/.
115
REFERÊNCIAS
EVARISTO, Conceição, Becos da memória,
Rio de Janeiro: Pallas, 2017.
116
DE ONDE EU VIM
TEM MAIS
Geovana Melo
GEOVANA MELO
é bacharel e licenciada em ciências sociais pela Univer-
sidade Federal Fluminense e mestranda em sociologia
na mesma universidade. Pesquisadora de relações
étnico-raciais, territorialidades e sociologia urbana. É
educadora popular, curadora e moradora da zona oeste
do Rio de Janeiro.
De onde venho chamam isso de SORTE.
Onde estou, chamam de OPORTUNIDADE.
Para mim, um não existe sem o outro.
Eliane Firmino
(In)felizmente a exceção,
(Geovana M.)
127
REFERÊNCIAS
GONZALEZ, Lélia, Por um feminismo afro-latino-
-americano, Rio de Janeiro: Zahar, 2020.
128
A FÚRIA E A
CURANDERIA:
PARA ALÉM DAS
CURADORIAS E, MUITO
MAIS POTENTE E
IMPORTANTE QUE TAL
PRÁTICA, A FORÇA
DO TERRITÓRIO
Junior Negão
JUNIOR NEGÃO
é fundador do Movimento Ghetto Run Crew e do HUB
Criativo Ghetto Colletiv. Um dos principais conectores
da Cultura da Rua do Eixo Rio-SP, prioriza conduzir o
processo de curanderia com o olhar para os subúrbios
entre pretes e não pretes, principalmente os pretes.
Como especialista em movimento urbano suburbano
no campo do esporte, desenvolvimento de potências,
arte e cultura, seu estudo está para a Insurgência
Suburbana, suas Encruzilhadas e os Novos Rebeldes.
FÚRIA
substantivo feminino | ímpeto de cólera, ira
Etimologia: do latim, emoção, loucura e raiva
CURANDERIA
Não foi encontrada uma explicação plausí-
vel para a origem da palavra como tantas
palavras que explicam várias práticas e
memórias dos povos originários. Segundo
o site InfoEscola: “O curandeirismo é uma
prática comum à humanidade, também
denominada como ‘medicina popular’.
Suas raízes estão gravadas na cultura oral
de um povo. É a prática de ministrar ou
aplicar substâncias sem conhecimento
técnico ou científico. O objetivo é a cura
de diversas enfermidades”.
ABRE-ALAS
Agradeço infinitamente em qualquer tempo, em
qualquer escrita ou memória, à imensa capacidade
de Gi Nascimento de estar lado a lado no claro e
no escuro e por me permitir conviver com uma
pessoa magnífica. Lutamos juntos, vencemos
juntos, tacamos fogo na Babilônia juntos.
Acima de tudo sou um educador e sonha-
dor, então agradeço e parabenizo o grupo que
esteve conosco propondo e provocando nosso
melhor nessa jornada: Renata Sampaio, Melissa
Alves, Shion L, Lais Daflon, Carolina Rodrigues e
meu amigo Jean Carlos Azuos. 132
Em pleno 2023, as práticas tradicionais
das grandes potências do mercado tendem a
silenciar mulheres pretas, instituições desde-
nham do poder da oralidade e jovens se intitulam
trem da arte e da curadoria sem saber pregar um
prego na parede.
Agradeço à Keyna Eleison, minha amiga,
parceira de trabalho, ícone suburbano e aproveito
para citar suas felizes linhas:
(...) Parem.
Simplesmente parem de romantizar a
resistência. O que somos, o que temos e
o que criamos não é um objeto. É inteli-
gência. Temos que entender, todas nós,
que toda potência, toda alegria e toda
capacidade que temos de resistir, criar,
desenvolver, vem de uma INTELIGÊNCIA, de
uma intelectualidade, e por conta disso
não podemos ser objetos de estudo, e sim
estar à frente dos centros de pesquisa
e de decisão, porque só assim vamos
desenvolver novas saídas para proble-
mas criados por conta da romantização
desses fatos e de nossos corpos.
O PAR DE TÊNIS
NO FIO
Diversos “entendedores” de cidades e culturas
urbanas tentam explicar esse fenômeno, só quem
viveu e/ou vive o subúrbio poderá explicar com
propriedade. Fato é: um tênis no fio é um aviso 133
e um chamado, em diversas camadas. Meu flow,
meu ritmo e linhas também.
Da chapa quente ao puro suco, das brusas
de times aos Nike doze molas, a malandragem
sustenta o Subúrbio da Central. Nada relacionado
à criminalidade, estamos falando de economia
colaborativa, criativa, HUBs criativos, termos
intangíveis que replicam uma forma de viver e
avançar presentes desde a Pequena África e do
Morro da Providência até hoje. A pandemia nos
colocou num momento de desespero contempo-
râneo que nos fez lembrar o que significa e qual
função tinha o Cemitério de Pretos Novos. E, mais
uma vez, nos reerguemos, resistimos, e jovens se
lançaram, se descobriram e se mantiveram vivos
ao retratar através da arte possibilidades incríveis
que nunca nos são dadas.
Atentar para a falta, e não para o excesso,
é o caminho que precisamos estabelecer. Verdade
que a arte é um mercado criado, mas também é
verdade que ela parte de um lugar ancestral. Ora,
então é necessário que apareçam estudiosos
e estudiosas que vêm da Rua, das experiências
viscerais, pretos e pretas suburbanos com a
capacidade de criticar obras, desenvolver uma
cadeia de produção e colecionar obras. E que
nasça um novo tipo de representação artística
mais alinhada com a realidade do que fazemos e
construímos. Há uma lacuna bem grande nesse
aspecto e estamos atentos não só a novos artistas
oriundos de subúrbio e favelas, mas também em
onde estão as pessoas que podem produzir e con-
tar essas histórias de forma fidedigna e não com 134
suposições de quem nunca pegou um ônibus para
atravessar a cidade. A contribuição da curanderia —
para além de uma forma menos mercadológica e
mais histórica de propor trabalhadores da arte —
é olhar o humano, sua capacidade de criar e suas
experiências de vida, não para a reprodução que
tem jogado tantas potências numa mesmice de
composição artística. A curanderia tem a respon-
sa de, lado a lado com os novos rebeldes, propor
outro olhar para as produções suburbanas pretas
e indígenas: o livre caminho, não apenas produzir
pautas de racialidade e representatividade para
alimentar o mercado. Que se pinte o que quiser, que
se construa o que quiser, somos corpos políticos e
não precisamos vomitar isso em tudo que fazemos!
A cura para as mazelas de anos de apagamento, a
proposta de um novo olhar, de resgate, de repa-
ração histórica e da visceralidade do construir a
partir das experiências.
Acredito muito em residências, em vi-
vências de produção e troca de saberes, mas em
residências que englobam a cadeia produtiva e
outros saberes. Propor a um curador pensar só a
curadoria não vai trazer uma outra proposta em que
o salto alto da academia se torne os pés no chão.
Trazer um pintor ou uma escultora para criticar o
caminho que eles constroem é redundante. Propor
os saberes para além do que se constrói é urgente
para que o respeito a toda cadeia, e principalmente
a quem tá na parte da produção e da educação,
seja cotidiano e, claro, para que surjam pessoas
diferentes que não olhem a estrutura vertical e seus
dogmas comportamentais como bote salva-vidas. 135
O comportamento higienizado da academia
pode até ser algo, pode até ser um ponto da his-
tória, mas o que tenho eu a ver com quem pintava
meu povo num olhar totalmente equivocado ou
com produções europeias cheias de quiquiqui?
O lazer de viver com os crias é o que nos alimen-
ta e sempre alimentou os crias do passado, do
presente e alimentará os do futuro.
Imagina eu ficar tolhido para trocar com
quem eu admiro das formas menos formais pos-
síveis por conta do status cor ou, “ainda”, que eu
seja tão eloquente a ponto de não saber produzir
um evento? Sei lá, imaginar que toda regra tem
uma exceção e que a exceção das instituições
e academias são o furto e a maquiagem entre o
que é verdade histórica e o que os livros dizem.
Prefiro imaginar a exceção da Rua, que também
é excesso de força e troca de vontade de potên-
cia, para o bem e para o mal, que é justamente
a experiência de vida. Ter a opção de competir
menos e aquilombar mais.
PRÁTICAS DO CORRE
E DA CORRERIA
Tudo tem conexão com a Rua/Tudo tem conexão
com Esù: Favela, lugar de moradia e de desenvolvi-
mento do povo que sofre sistematicamente para
não crescer em saberes, memo assim seguimos.
Subúrbio da Central e toda a falta de tantas coisas
que freiam a cultura suburbana de ser oficialmen-
te o que ela sempre foi: um marco. Diferentes
microSubúrbios pelo mundo que formam toda
uma cadeia de criação e produção. Moda, terri-
tório, dialeto, comportamento. O funk é o estilo
musical mais ouvido pelos rappers americanos e
londrinos, mas segue marginalizado e enlatado
por afro-convenientes. O samba, que teve sua
tentativa de apagamento pela lei e depois pela
bossa nova, a cultura de bate-bolas que é memória
viva ancestral, de produções e saberes, perde
espaço para Flávio de Carvalho e suas epifanias.
As práticas do corre e da correria suge-
rem a potencialização real do nosso território;
em formas gerais, temos:
• representação descentralizada
• novos colecionadores
• novos rebeldes
• caminhos para o sucesso olhando para
cada humano
• a inspiração da pintura vem do cotidiano, 139
mas lembrando que precisamos ter as
necessidades básicas atendidas/não
cooptação mais colaboração
• como vc vai atingir seu melhor
• potencializar o artista e o ser humano
que produz
• acompanhar as ferramentas de facili-
dade/tecnologia sem perder o humano
• que o humano possa transitar e escolher
• os artistas não cederem à produção em
massa de obras
• desenvolvimento de potência com base
no autoconhecimento
Um salve às crianças!
O futuro do mundo!
143
AQUI JÁ FOI
ALDEIA: A PRÁTICA
CURATORIAL
COMO EXERCÍCIO
DE COMUNIDADE
Letícia Puri
LETÍCIA PURI
(Letícia da Paz Maia) é historiadora, pesquisadora e
curadora com atuação nos cruzamentos entre arte,
cultura e educação, especialmente sob o prisma das
práticas anticoloniais e perspectivas originárias.
Minha família não sabia o que era curadoria.
Quando os convidei para a abertura da exposi-
ção da qual fui uma das curadoras, no evento
de encerramento da residência Territórios
Curatoriais, me questionaram: “Mas o que é que
você faz?”, “O que é ser curadora?” e até mes-
mo “Nunca tinha ouvido falar disso”. As minhas
contínuas tentativas de explicação, bem como
o apoio dessas pessoas que não entendiam o
que significava aquilo, me fizeram refletir sobre
quais eram as probabilidades históricas de eu ser
curadora de uma exposição no Museu de Arte
Moderna do Rio de Janeiro. Tal pensamento me
levou à conclusão de que isso jamais seria uma
possibilidade dentro da realidade do mundo do
qual faço parte. Logo, o que eu estou vivendo e
escrevendo aqui parte da premissa do impossível.
Coincidentemente, a 35ª Bienal de São
Paulo, que ocorreu neste ano de 2023, teve o
título Coreografias do impossível, e ainda que
eu não tenha participado da Bienal, senti que a
experiência da residência foi um ensaio para co-
reografias desse tipo, e as dançamos no fim. Um
fim que, na verdade, é um meio para um começo.
De alguma forma, percebo que nosso tempo
opera com desafios da ordem do inimaginável,
dos absurdos e dos limites que envolvem nossa
própria sobrevivência física e subjetiva. Como é
possível viver e nutrir subjetividade enquanto o
céu cai sobre nossas cabeças, como anunciou
Davi Kopenawa? Como podemos contar mais uma
história para adiar o fim do mundo, como sugere
Ailton Krenak? Vejo como urgente romper com 146
as estruturas ocidentais que impõem extinções
e fins, que não existem na ordem de pensamento
dos povos tradicionais que, nas palavras de Nêgo
Bispo, há milênios se organizam dentro do cíclico
começo-meio-começo. Um tempo espiralar e não
hierárquico em que a terra é a memória do mundo.
Nesse encontro de tempos, relembro
quando visitei, mais de uma vez, as exposições
Nakoada: estratégias para a arte moderna e Aqui
estamos, em 2022, no MAM Rio. Ambas foram con-
duzidas por perspectivas indígenas não somente
na curadoria, nas obras ou na temática, mas na 1. Nas palavras de
Denilson Baniwa:
forma de propor entendimentos do presente e de
“Nakoada é um
futuros voltados para a ancestralidade e para o gesto de retorno.
enraizamento, em um movimento de voltar para si Seria o momento
em que as pessoas
para pensar o mundo. Enquanto via e me via nas
que foram alvos
obras, refletia sobre as feridas coloniais que doem de ações externas
em nós, indígenas, que vivemos nas cidades, que entendem o poder
enfrentamos há séculos os fins, os discursos de opressor do outro
e agora procuram
desaparecimento e a negação de identidade. Dói, uma possibilidade
principalmente porque um pensamento constante de retornar à sua
me persegue em qualquer lugar que vou: aqui já própria autonomia”.
Disponível em
foi aldeia. Ao mesmo tempo, a experiência de ver
https://mam.rio/
um painel com vários rostos de indígenas urbanos, programacao/
diferentes uns dos outros, de diversos lugares do nakoada-
estrategias-para-
Brasil, na exposição de Uýra, me fez sentir próxima
a-arte-moderna/,
àqueles parentes, um lugar de respiro em que ali acesso em 27
era possível ser e estar junto, assim como utilizar set. 2023.
2. “Serpente de
sangue incendeia
a terra” em
kwaytikindo,
língua puri.
152
QUEM NOS
ENSINOU QUE
NOSSO CORPO
NÃO CABE
NOS ESPAÇOS
DE ARTE?
Marina Souza
MARINA SOUZA
é artista visual, produtora e mediadora cultural. De-
senvolve pesquisa sobre ancestralidade e memória a
partir de fotografias de família. Possui experiência em
desenvolvimento de projetos artístico-culturais, produ-
ção e direção de arte. Seus conhecimentos englobam
as áreas de arte contemporânea, música e cultura ori-
ginária, com foco em perspectivas identitárias negras.
Umbigo: depressão cutânea localizada no centro
do abdômen, formada a partir da cicatriz do corte
do cordão umbilical. O meu, particularmente, sal-
tado um pouco para fora por conter uma hérnia. A
obra Umbilical, do artista William Araujo, me trouxe
provocações imediatas. A imagem de um umbigo
preto pixelado fincado por um prego na parede de
um espaço de arte diz tanto sobre tantas coisas:
corpo, travessia, território, conexão, deslocamen-
to, diáspora, movimento, pertencimento. Como
seria ter o meu próprio umbigo como centro? Se
a branquitude se estruturou por tanto tempo ten-
do a noção de universalidade partindo de si para
falar do todo, tendo o outro como Outro, por que
eu não posso partir de mim para falar de tudo?
Meu umbigo preto, favelado, na parede
do MAM! É assim que traduzo a experiência de
compor a segunda turma de residentes de Terri-
tórios Curatoriais. A residência foi proposta pela
equipe de Educação e Participação, representada
por Renata Sampaio, Shion L e Lais Daflon, contou
com três jovens curadores pretos convidados para
acompanhar o processo com mentorias, Carolina
Rodrigues, Jean Carlos Azuos e Melissa Alves, e
com uma turma de onze pessoas racializadas,
oriundas de territórios fora do circuito artístico
(centro-zona sul). As trocas com a turma geraram
em mim uma noção de reconhecimento e per-
tencimento. Estar durante seis meses no museu
em contato com vivências e pesquisas diversas
e ao mesmo tempo semelhantes às minhas, por
se alinharem ao passarem por corpos negros em
deslocamento, vivendo a diáspora na cidade do Rio 155
de Janeiro, foi enriquecedor para esse processo
de cura em um espaço onde já desenvolvo uma
relação há anos.
Em 2019, ingressei ao corpo de orienta-
dores de público do Museu de Arte Moderna do
Rio. Com muito fascínio em compor a equipe de
uma instituição tão importante para a história da
arte brasileira, a possibilidade de interagir com
as obras e o público me fascinava. Mas esperava
alguma formação para que essa mediação acon-
tecesse sob a proposta do museu. Por estar em
um espaço de arte, minha presença era movida
pela possibilidade de encontrar formas para que
as pessoas como eu que frequentam o museu se
deixassem tocar pelas obras, principalmente as
contemporâneas, que são mais passíveis de serem
deslegitimadas pelo grande público. Eu ainda não
sabia muito sobre o papel da arte-educação, mas
era o que me atraía.
Mas como pensar em acolhimento ao
público em um espaço de arte como o MAM Rio,
onde a arquitetura já impõe certo distanciamento
e evidencia a pequenez das pessoas diante de
tamanha imensidão e grandiosidade? Com o aces-
so prejudicado por não fazer parte dos espaços
centrais de arte e por manter certo isolamento
em relação a outras instituições e percursos de
arte? Como fazer as pessoas se sentirem parte
desse espaço que é — ou deveria ser — para to-
des? Quais estratégias assumir para que esse
espaço majestoso e imponente se atente às
questões atreladas à pequenez de seus visitantes,
principalmente visitantes de outras regiões que 156
passam por ali sem saber do que se trata, mas
que acessam os arredores e consequentemente
adentram o museu?
Para além de todas essas questões impos-
tas, como ser um corpo negro que se apresenta
nesse espaço sem ligar para o desconforto de
outros corpos semelhantes ao meu que se sen-
tem enrijecer ao passar pela porta de entrada?
Como não ser instrumento de opressão quando
minha função se resume apenas em apontar as
placas de sinalização e cuidar para não usarem
flash ao fotografar as imagens que os tocam?
Por que não interagir mais abertamente com o
público, trocando informações sobre as obras,
o espaço, tornando a visita um pouco mais in-
teressante com informações que agreguem e
facilitem o entendimento?
Passei pela fase de me sentir encantada
com a instituição, depois desanimada e, por fim,
frustrada por saber que, na época em que estive
trabalhando nela, outras pessoas com formação
e possibilidade de atuação no contato direto com
o público eram desperdiçadas por um modo de
trabalho que não compreendia a importância do
papel da mediação.
Acredito que os espaços de arte pre-
cisam estar atentos às questões levantadas
pela sociedade e pelo público e se deixar serem
afetados por outras vivências, camadas e clas-
ses sociais. A arte-educação como ferramenta
possível de transformação social possibilita um
ambiente acolhedor, de escuta ativa e atenta
às proposições, promovendo um espaço menos 157
desigual onde os saberes são possibilitados e
cultivados, e não cerceados. Hoje, após diversas
experiências profissionais, minha atuação se
estrutura na arte-educação. Apenas a educação
encontra respostas a diversas inquietações e,
mesmo quando não as encontra, acolhe e incentiva
a descoberta coletivamente, aguçando o olhar,
instigando a curiosidade e apontando possíveis
caminhos. É o fio que tece as relações, as chegadas
e cheganças, que estrutura o olhar, o acesso, as
condições de permanecer e confrontar o espaço.
Não esqueço de uma visita escolar mediada
por Lais Daflon e Shion L que pude acompanhar
enquanto orientadora, para dar suporte ao edu-
cativo, na qual a proposta era ver a exposição por
outra perspectiva e todas as crianças deitaram
no chão.
Somente a educação pode criar espaços
de trocas com tanta liberdade, deixar o público
fluir em liberdade, estimulando a autonomia, ainda
que com acordos firmados e supervisionamento,
tendo o cuidado de entender que muitas vezes é
o primeiro contato do público com um espaço de
arte, que o corpo nasce livre e nós o adestramos.
Quem nos ensinou a andar com os braços para
trás em uma exposição? Quem nos ensinou a
não correr? A fazer gestos tão milimetricamente
controlados ou a prender a respiração ou boce-
jar/tossir baixinho para não atravessar a aura de
silêncio imposta? Quem nos ensinou que nosso
corpo não cabe nos espaços de arte?
Permitir que a espontaneidade se apre-
sente num lugar tão engessado quanto pode 158
ser um museu é um ato transgressor. Por isso
é imprescindível que a equipe seja composta
de pessoas diversas, que estejam atentas às
inúmeras possibilidades de existências, para
transformar esse espaço verdadeiramente em
um lugar para todes.
A possibilidade de reconstrução dessa
relação MAM------eu só foi possível por ver e me
sentir representada e acolhida por alguém que
se parece comigo, ter um grupo de pessoas com
vivências parecidas com as minhas, comparti-
lhando os prazeres e perrengues de morar em
territórios descentralizados, dividir os incômodos
físicos ao atravessar a entrada das instituições
e saber que eles não são particulares apenas da
minha vivência.
Através da residência foi possível rees-
tabelecer um vínculo com o museu, entrar nas
exposições e ressignificar cada espaço, criar
relações mais interessadas, conhecer as es-
truturas que possibilitam o dia a dia de um lugar
tão importante como o MAM, visitar o acervo e
entender as complexidades entre o fazer possí-
vel e o ideal. Me sentir parte, enquanto pessoa
pesquisadora interessada em saber mais desse
lugar que foi mais minha casa do que meu próprio
lar por bastante tempo.
Saio desse ciclo com o título de curado-
ra, com a honra de ter curado uma exposição no
Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro com
sete artistas pretes e indígenas de territórios
descentralizados, ao lado de três curadores in-
críveis, Geovana Melo, Junior Negão e Letícia Puri. 159
E com a sensação de ter realizado um trabalho
importantíssimo na vida de cada pessoa envolvida
e na história da própria instituição, vivenciando
o que pude e o que minha autossabotagem me
permitiu viver, mas com a leveza de conseguir
firmar meus pés nesse chão.
Esse processo me possibilitou viver o que
há tempos busco encontrar: ser legitimada en-
quanto pesquisadora, curadora e artista no mesmo
espaço que já foi palco para desconstrução da
autoconfiança acerca de tudo isso.
Por muito tempo pensei ser errado me
colocar como ponto de partida e centro das
coisas, como se fosse possível ver com outro
olhar, pensar por outro ponto de vista, ter outra
perspectiva, mas isso tudo constitui quem eu sou.
Olhar para o meu próprio umbigo e entender que
dele parte a complexidade do universo, envolto
pela circularidade, conexão materna ancestral.
Se em algum momento este museu foi
palco para modernistas se apropriarem de cultu-
ras originárias para definirem o que é brasilidade,
hoje eu, Marina Souza, filha de dona Rosa e João
Batista, finco aqui o meu umbigo como forma de
me apoderar desse espaço, estabelecer novos
centros e esperançar novos futuros.
160
RESIDÊNCIA
TERRITÓRIOS
CURATORIAIS
A residência Territórios Curatoriais é um programa
voltado para pessoas a partir de 16 anos, moradoras
de regiões periféricas do município ou da região
metropolitana do Rio de Janeiro, interessadas
nas áreas de curadoria, crítica de arte, história da
arte, escrita e outros profissionais que se sintam
convocados a pensar curadoria. Em sua segun-
da edição, foi constituída de encontros online e
presenciais, coletivos e individuais, que reuniram
processos formativos em curadoria. Entre março e
setembro de 2023, onze residentes acompanharam
palestras e um curso, receberam mentorias indivi-
duais e coletivas e, por fim, realizaram a curadoria
e a produção do evento Fractais: contra diásporas
da cidade.
RESIDENTES
Aymée Godoy Lucas Magalhães
Geovana Melo Marina Souza
Jorge Freire Rosemeri Conceição
Juliane Gamboa Thamires Siqueira
Junior Negão Yuri Menezes
Letícia Puri
MENTORIA
Carolina Rodrigues de Lima
Jean Carlos Azuos
Melissa Alves
163
PROGRAMAÇÃO
CICLO DE PALESTRAS 31 de junho
ONLINE PALESTRA COM BITU CASSUNDÉ
Em quatro palestras, profissio- Gerente de patrimônio e memória
nais da curadoria e da pesquisa do Centro Cultural do Cariri (Crato/
apresentaram suas trajetórias e CE). Foi curador do Museu de Arte
diferentes experiências. Contemporânea do Ceará de 2013
a 2020 e coordenou o Laboratório
12 de junho de Artes Visuais do Porto Iracema
PALESTRA COM IGI LOLA AYEDUN da Artes de 2013 a 2018.
Artista autodidata, diretora e
fundadora da galeria/residência 21 de agosto
HOA. Trabalha com pintura, dese- PALESTRA COM WALLA CAPELOBO
nho, texto, vídeo, imagens em 3D, Transfeminista e anticolonial,
fotografia e som. pesquisadora e artista que cria
na espiral do tempo, na busca
10 de junho de ser semente crioula capaz de
PALESTRA COM RAPHAEL FONSECA regenerar terras invadidas.
Doutor em história da arte pela
UERJ e pesquisador nas áreas
de história da arte, curadoria e
educação. Curador de arte latino-
-americana moderna e contem-
porânea no Denver Art Museum,
nos Estados Unidos. Trabalhou
como curador do MAC Niterói
entre 2017 e 2020.
164
CURSO ONLINE: DIÁLOGOS Aula 4 | 17 de maio
SOBRE CURADORIA DIÁLOGOS ENTRE
O curso refletiu sobre o conceito CURADORIA E TERRITÓRIO
de curadoria a partir de falas de Com Ana Paula Lopes e João Paulo
profissionais da área, da pesquisa Ovídio
e da história da arte de diferen-
tes contextos, a fim de ampliar a Aula 5 | 22 de maio
noção de prática curatorial para ESPAÇOS INSURGENTES
além dos limites historicamente E SUAS PROPOSTAS
construídos. Com Alan Weber e Lorraine Mendes
165
EVENTO DE ENCERRAMENTO
FRACTAIS: CONTRA
DIÁSPORAS DA CIDADE
23 SET. 2023 | 10H — 18H
166
TERRITÓRIOS DE CRIAÇÃO apresentaram diferentes formas
Obra com performance de ativa- de ocupação desses espaços e
ção | Salão de eventos do MAM sua importância. Após a exibição,
Rio | 10h — 18h houve uma roda de conversa sobre
Obra e ação artística que res- direito à cidade, história local,
gata a memória da Fábrica de patrimônio histórico e produção
Tecidos Bangu — que, em 1971, artística sob um viés territorial,
doou tecidos para uma edição do divergente dos grandes centros.
programa Domingos da Criação, A conversa com Rossandra Leo-
criado por Frederico de Morais ne, Bruno Ribeiro, Sandra Maria,
no MAM Rio — enquanto promove Ynara Noronha e Giulia Maria Reis
uma reflexão sobre o impacto foi mediada por Lucas Magalhães
social e os espaços não formais e Thamires Siqueira.
de arte. Em uma tela formada
por fractais de camisas de algo- • Pipa o ano todo, de Rossandra
dão brancas sobrepostas umas Leone. Brasil, 2022. 16’41”.
às outras formando um painel, • BR3, de Bruno Ribeiro. Brasil,
os artistas Cety Soledad, Mayra 2018. 22’45”.
Carvalho e Lolly intervieram com • Memória não se remove: museus
técnica pictórica. das remoções, de Lia Peixinho.
Brasil, 2022. 12’54”.
PERCURSOS TERRITORIAIS • Crônicas de Santa Cruz, de Ynara
Sessão de filmes e debate | Noronha. Brasil, 2023. 15’.
Auditório da Cinemateca do • Km/h, de Giulia Maria Reis. Brasil,
MAM | 10h — 12h 2023. 6’.
Trajetórias formadas por diferen-
tes percursos se cruzam em meio Programação acessível com le-
ao território do Rio de Janeiro, gendas e intérpretes de libras.
em caminhos interligados em um
mesmo objetivo: coexistir e habitar
na cidade. Seja na arte, cultura,
lazer ou infraestrutura, os curtas
do programa Percursos Territoriais 167
CONVERSA COM A CURADORIA A pesquisadora Juliana
Salão de eventos do MAM Rio | Pereira e as artistas Azizi Cypriano,
14h — 15h Azula e Tayná Uràz foram con-
Conversa com curadoras e cura- vidadas para um encontro em
dores da programação, mediada que se ouviu e festejou as vozes
por Geovana Melo e Marina Souza. e as artes das muitas mulheres,
Programação acessível com in- indagando sobre apagamentos,
térpretes de libras. limites, estratégias e porvir. Me-
diação: Rosemeri Conceição e
TODO TELHADO TEM UMA Aymée Godoy.
SUSTENTAÇÃO: DIÁLOGOS A roda de conversa foi
SOBRE ARTES E MULHERISMOS iniciada com a performance de
Roda de conversa | Salão de Juliane Gamboa, lendo o poema
eventos do MAM Rio | 15h — 17h “Vozes-mulheres”, de Conceição
Em junho de 2023, ao ser premiada Evaristo.
pelo Museu Nacional de Música
Afro-americana, a artista Missy Programação acessível com in-
Elliott agradeceu a todas que a térpretes de libras.
precederam e afirmou: “Nenhum
telhado numa casa pode ficar
sem sustentação. Aqueles antes
de mim representam cada tijolo
necessário para mantê-la de pé”.
Tomando o Atlântico como
elemento de coesão das múltiplas
artes em diáspora, vamos em
busca das trajetórias e presen-
ças de mulheres artistas que,
em solo brasileiro, funcionaram
como início e fim, parte e todo,
parede e telhado de um mesmo
processo criativo.
168
AZULA E ELOÁ PURI
Pocket show | Salão de eventos
do MAM Rio | 17h — 18h
Azula Eloá Puri
Cantora e compositora. Sua arte Cantora e compositora. Suas
é travesti. Seu primeiro EP relata composições são marcadas pela
questões relacionadas aos trau- musicalidade indígena e pela re-
mas das populações negras e presentação da paisagem sonora
LGBTQIAPNB+, bem como as suas da natureza. As entidades naturais
reelaborações e possibilidades podem ser contempladas em
de superação. Nascida na zona narrativas como o assobio dos
oeste do Rio de Janeiro, começou sacis, o trovão, a cachoeira, o
sua trajetória na música ainda vento. O show ah lekah txori traz
criança nos coros de igreja, e uma mensagem de retomada: é
aos 22 anos iniciou uma vivência preciso saber quem se é e de onde
de corporeidade trans negra em vem para honrar os ancestrais,
que a música aparece como forma em que nada é realizado fora da
de expressar suas inquietações. ótica da coletividade.
169
BENFEITORES Nara Roesler
Gilberto Chateaubriand (in memoriam) Oskar Metsavaht
Joaquim Paiva Ricardo Steinbruch
Luiz Carlos Barreto Rogerio Pessoa
Tanit Galdeano
ASSOCIADOS
PATRONOS
Associados seniores |
Conselho consultivo Alessandra Ragazzo D’Aloia,
Marcia Cristina Correa Fortes e
Armando Strozenberg
Alexandre Monteiro Gabriel
Carlos Alberto Gouvêa Chateaubriand
Francisco Antunes Maciel Mussnich
Eugênio Pacelli de Oliveira
Claudia Moreira Salles
Pires dos Santos
Leonardo Orsini de Castro Amarante
Gustavo Martins de Almeida
Martha e Sergio Scodro
Heitor Reis
Raphael Manhães Martins
Helio Portocarrero
Simone Coscarelli Parma
Henrique Luz
João Maurício de Araújo Pinho CONSELHO
João Maurício de Araújo Pinho Filho
Conselho de administração
Luís Antônio de Almeida Braga
Carlos Alberto Gouvêa
Luiz Guilherme Schymura de Oliveira Chateaubriand Presidente
Luiz Roberto Sampaio Paulo Albert Weyland Vieira
Nelson Eizirik Vice-Presidente
Paulo Albert Weyland Vieira Armando Strozenberg
Ronaldo Cezar Coelho Eugênio Pacelli de Oliveira
Pires dos Santos
Associados plenos
Fernando Marques Oliveira
Full Associates
João Maurício de Araújo Pinho Filho
Alessandro Horta
Luis Paulo Montenegro
Armínio Fraga
Luiz Roberto Sampaio
Claudia Moreira Salles
Nelson Eizirik
Elena Landau
Eliane Aleixo Lustosa de Andrade Conselho fiscal
Fernando Marques Oliveira Cesar do Monte Pires
Fred Gelli Edson Cordeiro da Silva
João Marcello Dantas Leite Ricardo Lopes Cardoso
Joaquim Paiva Comitê de investimentos
José Francisco Gouvêa Vieira Edmar Bacha
Livia de Sá Baião Helio Portocarrero
Luiz Carlos Barreto Luiz Chrysostomo de Oliveira Filho
Marcos Falcão Luiz Roberto Sampaio
Max Perlingeiro Pedro Luiz Bodin de Moraes
EQUIPE Operadores cinematográficos
Edson Gomes
DIRETORIA Sidney de Mattos
Recepcionista
Diretoria executiva
Bernardo Camara
Paulo Albert Weyland Vieira
Diretoria de planejamento, EDUCAÇÃO E PARTICIPAÇÃO
administração e finanças
Gerente
Pedro José Rodrigues
Renata Sampaio
Diretoria artística
Coordenadoras
Pablo Lafuente
Shion L
CURADORIA Stephanie Santana
Patrocinadores
Mattos Filho Advogados, BMA Advogados, Redecard, Sergio
Bermudes Advogados, Gávea Investimentos, Eneva e
Granado por meio da Lei Federal de Incentivo à Cultura.
Vivo por meio da Lei Estadual de Incentivo
à Cultura — Lei do ICMS RJ.
Deloitte, XP Inc., Adam Capital, Concremat, Globo, Guelt
Investimentos, Icatu, JSL e Multiterminais por meio da
Lei Municipal de Incentivo à Cultura — Lei do ISS RJ.
Agradecimentos
Ministério da Cultura.
Governo do Estado do Rio de Janeiro e Secretaria de
Estado de Cultura e Economia Criativa do Rio de Janeiro.
Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro e Secretaria
Municipal de Cultura do Rio de Janeiro.
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e os autores.
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nenhuma forma ou por nenhum meio sem a permissão
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M986
Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro
Fractais: contra diásporas da cidade / Aymée Godoy ;
Carolina Rodrigues de Lima ; Geovana Melo ; Jean Carlos
Azuos ; Jorge Freire ; Juliane Gamboa ; Junior Negão ; Lais
Daflon ; Letícia Puri ; Lucas Magalhães ; Marina Souza ; Melissa
Alves ; Renata Sampaio ; Rosemeri Conceição ; Shion L ;
Thamires Siqueira ; Yuri Menezes — Rio de Janeiro : Museu de
Arte Moderna do Rio de Janeiro, 2024.
177 p. : il. color.
6,2 MB. ; PDF.
ISBN 978-65-88670-26-2 (recurso eletrônico)
Residência realizada entre 29 mar. 2023 — 29 set. 2023
1. Residência. 2. Curadoria. 3. História da arte. 4. Museologia.
5. Educação. I. Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro.
II. Autor. III. Título.
CDD: 069.51
AVISO LEGAL
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