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Citometria de fluxo: 8 passos essenciais para você criar seu painel multicolor
E-mail da Autora: barbaradurocher@ymail.com

Revisão e Edição: Bárbara Du Rocher D’Aguiar Silva


Capa: Bárbara Du Rocher D’Aguiar Silva
Revisão Gramatical: Julio Cesar Madureira de Freitas Junior
Editoração Eletrônica: Bárbara Du Rocher D’Aguiar Silva

Como citar este guia:


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Silva, Bárbara Du Rocher D’Aguiar, Explore Cytometry
Citometria de fluxo: 8 passos essenciais para você criar seu painel
multicolor / Bárbara Du Rocher D’Aguiar Silva, Explore Cytometry. – 1ª edição
– Rio de Janeiro, 2023. Download disponível no Linktree:
https://linktr.ee/explorecytometry

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Pocket Book: 8 passos essenciais para criar seu painel multicolor em citometria de fluxo | 2
Sumário

1. Introdução
2. Passo 1 – Conheça o sistema ótico do seu equipamento
3. Passo 2 – Conheça a biologia das suas células/partículas de interesse
4. Passo 3 – Conheça seus antígenos de interesse
5. Passo 4 – Conheça os fluorocromos dos seus anticorpos
6. Passo 5 – Desenhe seu painel
7. Passo 6 – Use marcadores de viabilidade
8. Passo 7 – Faça sempre a titulação dos seus anticorpos. Faça o voltration
caso seu painel seja muito grande!
9. Passo 8 – Controles são essenciais! Faça-os!
10. Considerações finais
11. Referências bibliográficas

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Introdução
Neste Pocket Book você encontrará os 8 passos essenciais para criar seu
painel multicolor em citometria de fluxo. Imprima-o no modo retrato (quatro
páginas por folha) e deixe-o sempre a mãos para se lembrar de checar estas
8 etapas!
Como é um Pocket Book nossa ideia é apenas pontuar as etapas, assim,
desejando um conhecimento mais detalhado recomendamos que você faça
nosso curso completo de citometria de fluxo básica! E não esqueça de nos
seguir nas redes sociais (@explorecytometry)!
Seja bem-vindo ao mundo da Explore Cytometry!!!

Passo 1 – Conheça o sistema óptico do seu equipamento


Antes de começar qualquer experimento em citometria de fluxo é mandatório
que você conheça a configuração do seu equipamento, isto é: Quantos e quais
lasers ele possui e os filtros e espelhos utilizados para cada laser (Tabela 1).
Isso porque não adianta, por exemplo, você marcar uma amostra com um
anticorpo acoplado a APC e querer ler em um citômetro que não possui o
laser vermelho. Veja na figura abaixo um exemplo de uma configuração real
de um FACSCelesta da marca BD.

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Tabela 1 - Configuração real de um FACSCelesta da marca BD. Obs: Note que filtros
próximos ou iguais estão com as mesmas cores. Ex: Rosa fúcsia para filtros 780/60 e
verde para os filtros 525/50 e 530/30.

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Passo 2 – Conheça a biologia das suas células/partículas de interesse
Um passo importante para uma citometria de sucesso é fazer uma análise da
biologia das suas células/partículas de interesse e quais os possíveis impactos
disso no protocolo de marcação. Por exemplo:

2.1 Suas células crescem aderidas? Em suspensão? Ou serão processadas a


partir de tecido fresco? No caso de crescerem aderidas ou de tecido fresco,
qual protocolo você irá utilizar para processar esta amostra? Digestão
mecânica? Enzimática, como tripsina ou colagenase? Química, como EDTA?
Qual o possível impacto disso no protocolo de marcação?

2.2 Sobre a localização do seu antígeno alvo: Ele está localizado na membrana,
no citoplasma ou no núcleo? Lembre-se que cada localização definirá o tipo
de protocolo de marcação. Marcações de membrana requerem protocolos
rápidos e com pouca manipulação. Marcações intracelulares requerem
protocolos mais demorados que podem ter diferentes níveis de
permeabilização, dependendo do antígeno de interesse (citoplasmático ou
nuclear).

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Passo 3 – Conheça seus antígenos de interesse
Não esqueça de analisar os antígenos de seu interesse quanto ao tipo de
expressão (Figura 1), densidade (Tabela 2) e coexpressão.

3.1 Tipo de expressão: Seus antígenos são primários, secundários ou


terciários?

Antígenos primários: Frequentemente classificados como positivos ou


negativos. Tipicamente definem subtipos ou linhagens celulares. Ex: CD4,
CD8, CD3 e CD19.

Antígenos secundários: Frequentemente expressos em densidade alta ou


moderada e com expressão gradual (over a continuum). Ex: CD27, CD28,
CD45RA e CD45RO.

Antígenos terciários: Frequentemente expressos em baixa densidade, de


expressão desconhecida ou crítico para sua análise. Ex: Moléculas de ativação
e fatores de transcrição.

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3.2 Densidade: Qual a densidade do antígeno na célula/partícula de interesse?
Saber essa informação pode te ajudar muito na hora de montar o painel pois
antígenos pouco expressos ou desconhecidos devem preferencialmente
serem usados com anticorpos acoplados a fluorocromos muito brilhantes
enquanto antígenos muito expressos podem ser usados com anticorpos
acoplados a fluorocromos pouco brilhantes. Segue abaixo uma tabela com
alguns dos antígenos mais utilizados em citometria de fluxo para guiá-lo neste
assunto (Tabela 2).

Adaptada do Site da BD
Figura 1 – Classificação dos antígenos quanto à sua expressão. Os antígenos podem
ser classificados como primário, secundário e terciário quanto ao tipo de expressão.
Antígenos primários: Frequentemente classificados como positivos ou negativos.
Antígenos secundários: Frequentemente expressos em densidade alta ou moderada e
com expressão gradual (over a continuum). Antígenos terciários: Frequentemente
expressos em baixa densidade, de expressão desconhecida ou crítico para sua análise.
Da esquerda para a direita temos histogramas representativos de antígenos primários
(Ex. CD4), antígenos secundários (Ex. CD45RA) e antígenos terciários (Ex. CD25).

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Tabela 2 – Densidade celular de alguns antígenos. Tabela sumarizando a densidade de
alguns dos antígenos mais utilizados em citometria de fluxo de acordo com o subtipo
celular onde o antígeno é expresso. Obs: Note que um mesmo antígeno pode ter sua
densidade variada de acordo com o tipo de célula. Fonte: Site da Bio-Rad e da BD.
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3.3 Coexpressão: Seus antígenos são coexpressos, como por exemplo CD3
e CD4 ou CD3 e CD8 (no caso de linfócitos T)? Isso será importante na hora
de desenhar o seu painel. Fiquem atentos!

Passo 4 – Conheça os fluorocromos dos seus anticorpos


É de fundamental importância que você conheça seus fluorocromos de acordo
com suas características (brilho, sobreposição de espectros e estabilidade).

4.1 Brilho: Os fluorocromos dos seus anticorpos brilham muito ou pouco?


Para saber isso visite as páginas das empresas que vendem os anticorpos que
você irá utilizar e procure por “Stain index of various fluorochrome” ou algo
similar. Algumas empresas dividem em 4 níveis de brilho, outras empresas
dividem em 3 níveis (Tabela 3).

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Tabela 3 – Intensidade de brilho de alguns fluorocromos de acordo com os lasers que
os excitam. Obs: Note que a intensidade do amarelo está de acordo com a intensidade
de brilho da coluna correspondente.

4.2 Sobreposição de espectros: Por definição, sobreposição de espectros (do


inglês Spillover) é quando um sinal que deveria ser detectado por um filtro
específico acaba sendo detectado por outro filtro. Isso ocorre basicamente por
três motivos: Detectores adjacentes, Fluorescência residual do fluorocromo
base (no caso dos tandem dyes) e espectro de emissão similar (cross-laser).

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4.2.1 Detectores adjacentes
Exemplo hipotético: Fluorescência do FITC (filtro 530/30) entrando no
detector do PE (filtro 575/25).

4.2.2 Fluorescência residual do fluorocromo base (no caso dos tandem dyes)
Exemplo hipotético: Fluorescência do APC-Cy7 entrando no detector do APC
(neste caso APC é o fluorocromo base do tandem APC-Cy7).

4.2.3 Espectro de emissão similar (cross-laser)


Exemplo hipotético: Fluorescência do BUV 737 (excitado pelo laser ultravioleta
e com emissão máxima em 737nm) entrando no detector do BV711 (excitado
pelo laser violeta e com emissão máxima em 711nm).

4.3 Estabilidade: Quando o assunto é estabilidade, dois processos químicos


são comumente responsáveis pela maioria da perda de fluorescência do seu
anticorpo: Fotobranqueamento e degradação de tandem-dyes.

4.3.1 Fotobranqueamento
Fotobranqueamento (do inglês “photobleaching”) é uma alteração fotoquímica
no fluorocromo que resulta na perda da sua capacidade de fluorescer de forma
permanente.

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4.3.2 Degradação de tandem-dyes
É a dissociação da ligação entre o fluorocromo doador (base) e o fluorocromo
aceptor, fazendo com que o fluorocromo comece a ser detectado no canal do
corante base. Ex: APC-Cy degrada em APC e Cy. O anticorpo, por estar ligado
ao APC, começará a ser detectado no canal do APC e não mais no canal do
APC-Cy7.

Passo 5 – Desenhe seu painel


Esta etapa deve ser executada com muita paciência. Um painel mal desenhado
é, digamos, “um tiro no pé”. Então atente-se aos passos 1-4 (descritos acima)
e siga sempre que possível estas regras:

5.1 Quanto ao passo “4.1 Brilho”, reserve:


* Os fluorocromos mais brilhantes para os antígenos de menor expressão ou
de expressão desconhecida;
* Os fluorocromos menos brilhantes para os antígenos de maior expressão;
* Os fluorocromos de brilho intermediário para os antígenos usados na
determinação de subtipos (que compõem sua estratégia de gate) (Figura 2).

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Adaptada do Technical note – Beckman Coulter

Figura 2 – A escolha do fluorocromo deve levar em consideração a densidade do


antígeno na célula de interesse. Antígenos de fraca expressão serão beneficiados se
marcados com anticorpos acoplados a fluorocromos muito brilhantes, já antígenos de
alta expressão podem ser marcados com anticorpos acoplados a fluorocromos pouco
brilhantes. Obs: Note que combinar antígeno pouco expresso com fluorocromo pouco
brilhante resultará num provável sinal com baixa resolução, enquanto combinar
antígeno muito expresso com fluorocromo muito brilhante resultará num provável sinal
muito forte que não só poderá extrapolar o limite de detecção do citômetro (quando
comparado à sua amostra não marcada) como também causar sobreposição de
espectros em outros canais de leitura do seu equipamento.

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5.2 Quanto ao passo “4.2 Sobreposição de espectros”, atente-se para:

5.2.1 Seleção dos canais


Otimize seu painel escolhendo para antígenos altamente expressos
fluorocromos que influenciem menos em outros canais e para antígenos de
baixa expressão reserve canais de leitura que sejam pouco impactados por
sobreposição de espectros de outros fluorocromos. Para saber isso é
imprescindível conhecer a configuração ótica do seu equipamento.

5.2.2 Exclusão antigênica


Reserve para canais de grande sobreposição (exemplo hipotético: Filtro
780/60 do laser violeta e filtro 780/60 do laser azul) antígenos que não são
coexpressos, como por exemplo CD3 e CD19 ou CD4 e CD8 (no caso de
amostra de sangue periférico). Isso porque mesmo que um fluorocromo acabe
sendo detectado um pouco no outro canal, você não terá uma população
duplo positiva no seu dot plot de interesse, portanto, essa sobreposição de
espectros não irá impactar no seu resultado (Figura 3).

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Adaptada do Technical note – Beckman Coulter

Figura 3 – Exclusão antigênica. A sobreposição de espectros entre espectros de


emissão de antígenos mutuamente exclusivos não irá impactar no seu painel pois estes
antígenos não serão expressos juntos na mesma célula de interesse. Obs: Note no
exemplo do dotplot acima que mesmo que um canal acabe detectando fluorescência do
outro canal e vice-versa isso não irá impactar no resultado pois não há uma população
duplo positiva. Portanto, este tipo de sobreposição de espectros é tolerável e não trará
prejuízos para seu painel.
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5.2.3 Coexpressão de antígenos
A sobreposição de espectros pode mascarar, em especial, antígenos de
expressão baixa ou moderada, impactando a sensibilidade e resolução do seu
dado (Figura 4). Além disso, muitos destes antígenos são geralmente aqueles
modulados dentro da sua população de interesse após condições
experimentais (como ativação celular), portanto, são antígenos
frequentemente coexpressos. Para estes casos, reserve fluorocromos com
pouco ou nenhuma sobreposição de espectros.

Adaptada do Technical note – Beckman Coulter


Figura 4 – Coexpressão de antígenos. No caso de coexpressão de antígenos, a
sobreposição de espectros pode mascarar seu dado, em especial, caso os antígenos
sejam de baixa expressão. Portanto, este tipo de sobreposição de espectros poderá
trazer prejuízos para seu painel.
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5.2.4 Marcadores parentais x Marcadores descendentes
É aceitável que a população descendente cause uma sobreposição de
espectros na população parental, já que a população parental será toda
positiva para o antígeno em questão. Já o inverso não é aceitável, uma
sobreposição de espectros da população parental na população descente não
é tolerável e impactará a sensibilidade e resolução do seu dado, especialmente
no caso de antígenos de expressão baixa ou moderada (Figura 5).

Adaptada do Technical note – Beckman Coulter

Figura 5 – Marcadores parentais x Marcadores descendentes. Uma população parental


tolera uma sobreposição de espectros da população descendente, mas o inverso não é
verdadeiro. Dica: Para facilitar a compreensão, imagine que estamos falando de um CD3
como população parental e um CD4 como população descendente!

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5.2.5 Threshold positivo
Uma sobreposição de espectros em antígenos coexpressos é possível se você
estiver tentando identificar somente células altamente brilhantes ou tentando
discriminar entre uma expressão altamente brilhante versus pouco brilhante
(Figura 6). Uma sobreposição de espectros não é tolerável se você deseja
discriminar entre população negativas versus pouco brilhante, já que esta
sobreposição de espectros irá mascarar seu dado levando a conclusões
erradas.

Adaptada do Technical note – Beckman Coulter

Figura 6 – Threshold positivo. Uma sobreposição de espectros no caso de antígenos


coexpressos provavelmente só possibilitará a separação de populações muito brilhantes
de populações pouco brilhantes. Populações intermediárias terão sua detecção
prejudicada.

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Passo 6 – Use marcadores de viabilidade
O uso de marcadores de viabilidade é essencial para uma boa análise em
citometria de fluxo pois a não remoção de células mortas resulta em
resultados não confiáveis, duvidosos e de baixa acurácia (Figura 7). Isso corre
ao menos por conta de dois motivos: 1. Células mortas irão se ligar a
anticorpos e sondas de forma inespecífica e 2. Células mortas podem ser
tornar mais autofluorescentes. Além disso, células mortas liberaram DNA que
causa “grumos celulares” comprometendo a eficiência da técnica (lembre-se
que citometria é uma técnica de single cell!!!)

Figura 7 – Dot plots representativos de CD4 x CD8 excluindo ou não células mortas na
estratégia de análise. Obs: Note que no dotplot da direita aparece uma população
CD8+(dim) CD4- (dentro de Q1) que não aparece ao se remover células mortas. Os
percentuais das regiões Q1-Q4 também ficam alterados.

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Passo 7 – Faça sempre a titulação dos seus anticorpos. Faça o voltration caso
seu painel seja muito grande!
A titulação dos anticorpos é uma das etapas mais importantes ao se montar
um painel multicolor mas, infelizmente, pouquíssimas pessoas fazem. A
recomendação é que seus anticorpos sejam usados sempre na concentração
ideal encontrada na titulação. Já para o voltration não existe uma
recomendação oficial de quando fazê-lo, mas costuma-se fazer em citômetros
capazes de detectar acima de 16 cores.

7.1 O que é titular e porque titular? Titular é achar a concentração de anticorpo


ideal que permite a melhor resolução entre a população negativa e positiva
(maior razão sinal/ruído) (Figura 8). Isso porque pouco anticorpo faz com que
você tenha uma baixa resolução, com uma separação entre a população
negativa e positiva muito comprometida (picos muito próximos) enquanto o
excesso de anticorpo não só causa marcação inespecífica na população
negativa como também extrapola o limite de detecção da máquina (quando
comprado com suas amostras não marcadas). Assim, titular garante que você
não perderá seu experimento (usando uma concentração muito baixa ou
muito alta), melhora a qualidade da sua informação e faz você economizar
tempo e recursos financeiros!

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7.2 Como titular? Para titular basta fixar número de células, volume da
marcação, tempo de marcação e temperatura da incubação (devem ser iguais
ao seu protocolo experimental) e variar somente a concentração do anticorpo
por diluição SERIADA (Figura 8). Eu costumo fazer de 1:12,5 até 1:3200.

Adaptada do Site da Cheeky Scientist

Figura 8 – Titulação de anticorpo. A. Overlay de histograma (esquerda) e de dotplot


(direita) mostrando um resultado representativo de uma titulação, B. Esquema de como
executar uma diluição seriada sempre caindo a concentração pela metade. Obs: Note
que último poço será nosso controle não marcado.

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7.3 Como analisar a titulação?
1°. Análise “visual”. Plotar os gráficos e estimar visualmente a melhor
separação entre os picos negativo e positivo. Aqui você já consegue excluir
algumas concentrações muito baixas ou muito concentradas (Figura 9).

2°. Calcular o staining index e gerar o gráfico. Existem ao menos três formas
de se calcular o SI: Staining index, separation index ou Fold Over Background.
Todas muito parecidas. Por aqui uso o Staining index (Figura 10).

3°. Escolher a melhor concentração. Para tal você deverá levar em conta:
1. A curva de SI;
2. O percentual de células positivas e negativas;
3. A distância entre a população negativa e positiva e
4. O quanto a fluorescência do anticorpo está entrando nos outros canais do
equipamento!

OBS1: Cada anticorpo se comporta de maneira única na titulação, então,


variações na análise poderão ser necessárias.
OBS2: Este assunto, que mais parece “tabu” em citometria, é bem fácil de
executar na bancada desde que você tenha uma pipeta repetidora e uma
multicanal. Do contrário, será bem trabalhoso.

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A

Adaptada do Site da Bite Size Bio

Figura 9 – Cálculos para análise da titulação. A. Após aquisição das amostras, analise
seus dados seguindo uma ordem de gates lógica, como a sugerida aqui. B. Após
análise, plot os dados de forma a obter seu gráfico de Staining index. Obs: Note que
concentrações altas de anticorpo não são necessariamente as melhores.

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7.4 O que é voltration, como fazê-lo e porque fazê-lo? Pouquíssimo conhecido
no Brasil, o Voltration está começando a ser discutido e executado por aqui
bem recentemente. Essencialmente é como se fosse uma “titulação” da
voltagem dos detectores do citômetro! Você primeiro irá adquirir sua amostra
em 250 volts (para todos os detectores de fluorescência). Depois irá adquirir
a mesma amostra com 300 volts, depois com 350 volts e assim por diante,
sempre aumentando a voltagem em 50 volts (Figura 10). Alguns protocolos
pedem para aumentar a voltagem de 30 em 30 unidades. O objetivo é
encontrar a melhor voltagem que resulta na melhor diferença (separação)
entre as populações negativas e positivas. Esse valor é encontrado após você
aplicar a fórmula de cálculo do Staining Index (SI). No gráfico representativo
pode-se observar, sem fazer uso do cálculo do SI, que com baixas voltagens
o SI é bem ruim, baixo. Com altas voltagens você não só extrapola o limite de
detecção do citômetro como também começa a ter um espalhamento da sua
população negativa (do inglês “spread”). Já em voltagens mediadas, podemos
dizer que o SI foi otimizado, pois estes valores permitem uma melhor
visualização das duas populações (mas para saber o valor preciso da voltagem
mais otimizada, só utilizando a fórmula de cálculo de SI mesmo).

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Considerações:
1. Para fazer a voltration deve-se utilizar o mesmo anticorpo, do mesmo
clone, para todos os detectores de fluorescência do seu equipamento.
Em geral utilizamos o CD4 do clone RM4-5, GK1.5 para células de
camundongo e o CD4 do clone SK3 (Leu3a) para células humanas.
2. Este anticorpo deve ser titulado antes de ser usado para fazer a
voltration.

Adaptada do Site da University of Chicago

Figura 10 – Voltration. Dot plot representativo de um experimento de voltration. Obs:


Note que com baixas voltagens o SI é ruim. Com altas voltagens você não só extrapola
o limite de detecção do citômetro como também começa a ter um espalhamento da sua
população negativa. Já em voltagens mediadas, podemos dizer que o SI foi otimizado.

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Passo 8 – Controles são essenciais! Faça-os!
Os controles em citometria de fluxo são fundamentais para evitarmos ao
máximo a subjetividade do usuário levando a resultados mais confiáveis,
reprodutíveis e consistentes. Afinal, nada mais frustrante do que ter que
descartar um experimento inteiro por ter percebido que esqueceu de fazer
algum controle e isso gerou uma insegurança na hora de desenhar os gates
e fazer a análise. Em suma, os controles são indispensáveis para uma análise
com maior qualidade, salvando seu tempo e dinheiro e te fornecendo aquela
paz de espírito para você analisar com segurança seus dados. Basicamente
temos 3 tipos de controles em citometria de fluxo: Controle de ajuste do
equipamento, Controles de compensação e Controles negativos: De marcação
inespecífica, spillover & spread e controles biológicos.

8.1 Controle de ajuste do equipamento: Não é específico do experimento,


garante a performance do equipamento e deve ser feito diariamente. Aqui
usamos as beads de calibração! Estas beads servem para checar se o
equipamento está em pleno funcionamento. Basicamente, o citômetro irá
adquirir as beads e comparar os valores obtidos com os valores default que
vieram da fábrica e encontram-se especificados no lote daquela bead.

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8.2 Controles de compensação: São experimento específicos, servem para
determinar a sobreposição de espectros entre os fluorocromos e são usados
a cada experimento, reproduzindo a combinação específica de fluorocromos
do experimento. Exemplo: Imagine que seu painel de citometria seja este:
Viabilidade BV786, Ter-119 APC-Cy7, CD45 PE-Cy7, CD19 APC, CD3 PerCP,
CD4 BB515 e CD8 BV510.
Então, seus controles de compensação serão:
1. Células não marcadas,
2. Células marcadas somente com corante de viabilidade,
3. Células marcadas somente com Ter-119,
4. Células marcadas somente com CD45,
5. Células marcadas somente com CD19,
6. Células marcadas somente com CD3,
7. Células marcadas somente com CD4 e
8. Células marcadas somente com CD8.
O que sempre me perguntam é: Mas posso compensar com beads? Pode,
mas compensar com suas células é sempre a melhor opção pois elas
possuem a mesma autofluorescência do seu experimento; irão marcar os
antígenos na mesma intensidade do seu experimento; são de fato necessárias
no caso de utilização de corantes fluorescentes (como PI, 7AAD e FVS) e são
a opção mais barata! As desvantagens de se compensar com células são: A

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quantidade de amostra necessária costuma ser grande e a dependência da
densidade dos antígenos nas células, já que antígenos de baixa expressão são
ruins para compensar. Nestes casos usar as beads é uma ótima opção! Então,
por aqui, costumo usá-las somente para substituir células no caso de
fluorocromos em tandem cuja marcação do anticorpo seja sabidamente muito
fraca na minha população de estudo como, por exemplo, FoxP3 PE-Cy7 e
IL17 APC-H7 (proteínas pouco expressa na minha amostra, como citocinas e
fatores de transcrição, associadas a tandem dye).

8.3 Controles negativos: De marcação inespecífica, spillover, & spread e


controles biológicos.

8.3.1 De marcação inespecífica


Não é específico do experimento e serve para minimizar ligações inespecíficas
dos anticorpos já que estes podem ser ligar de forma inespecífica pela porção
Fab (lembre-se que células naturalmente se ligam em proteínas em vários
níveis e anticorpo é um tipo de proteína) ou de forma específica pela porção
Fc (via receptores para porção Fc de anticorpos) em células que não são seu
alvo de estudo. Para bloquear essas ligações podemos usar soro (rico em
imunoglobulinas), proteínas como BSA e/ou Fc Block e para descontar

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possíveis ligações inespecíficas podemos usar o controle isotípico (embora
este controle esteja cada dia sendo menos usado).

8.3.2 Spillover & spread e controles biológicos


São experimentos específicos, servem para determinar as populações
negativas e positivas para as populações de interesse do usuário e são usados
a cada experimento de acordo com a necessidade do usuário.

8.3.2.1 Spillover & spread (em Português: Sobreposição de espectros e espalhamento)


Como dito no item 4.2, sobreposição de espectros é quando um sinal que
deveria ser detectado por um filtro específico acaba sendo detectado por outro
filtro. Isso gera sinais em outros detectores resultando em um espalhamento
da sua população negativa nestes outros detectores. Como consequência esta
sobreposição de espectros pode acabar mascarando, em especial, antígenos
de expressão baixa ou moderada, impactando a sensibilidade e resolução do
seu dado. Assim, uma forma de medir isso é fazendo o controle FMO (do
inglês “fluorescence minus one”). O FMO serve para determinar a linha de
corte (cutoff) que separa as populações negativas das positivas, levando em
consideração a sobreposição de espectros que causa o espalhamento da
população negativa. Isso porque o FMO é um controle que contém todos os
fluorocromos do seu painel, exceto o fluorocromo que será avaliado. Portanto,

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neste canal “vazio”, você terá uma ideia do quanto os outros fluorocromos do
seu mix estão sendo detectados neste canal, mesmo após a compensação
(Figura 11).

A Tubos FMO
Antígeno
APC-Cy7 PE-Cy7 APC PerCP BB515 BV510
Ter-119 APC-Cy7 FMO CD45 CD19 CD3 CD4 CD8
CD45 PE-Cy7 FMO Ter-119 CD19 CD3 CD4 CD8
CD19 APC FMO Ter-119 CD45 CD3 CD4 CD8
CD3 PerCP FMO Ter-119 CD45 CD19 CD4 CD8
CD4 BB515 FMO Ter-119 CD45 CD19 CD3 CD8
CD8 BV510 FMO Ter-119 CD45 CD19 CD3 CD4

Adaptada do Site da BIO-RAD


Figura 11 – Controle FMO. A. Tabela mostrando um exemplo dos tubos controles de
FMO que seriam necessários no caso de uma citometria de fluxo usando o painel Ter-
119 APC-Cy7, CD45 PE-Cy7, CD19 APC, CD3 PerCP, CD4 BB515 e CD8 BV510. B.
Dot plots representativos de outro painel exemplificando três situações (da esquerda
para a direita): Tubo não marcado, tudo do controle FMO para PE-Cy5 e tubo do mix
(contendo todos os anticorpos do painel). Obs: Note as linhas de corte vermelha (do
não marcado) e preta (do FMO) e perceba que somente a linha de corte preta (do FMO)
serve como um controle correto para a marcação do tubo do mix.
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8.3.2.2 Controles biológicos
Os controles biológicos são fundamentais e, na verdade, são necessários para
qualquer experimento, independentemente de ser um experimento de
citometria de fluxo ou não. Um exemplo bem básico seria medir a produção
de TNF em PMBC estimulado com PMA+IONO. Neste caso o controle
biológico seria PMBC NÂO estimulado com PMA+IONO. Em citometria de
fluxo, após o período de incubação você iria marcar estas duas amostras com
seu mix e analisar a produção de TNF por citometria.

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Considerações finais
Costumo brincar que gastamos uns 15 dias para setar um western blotting,
certo? Mas muitos alunos (talvez por desconhecerem completamente
a técnica de citometria de fluxo) querem fazer um experimento de citometria
de fluxo de 12 cores em uma semana. Infelizmente não dá! Assim como em
qualquer técnica, precisamos nos dedicar um tempo importante para setar a
técnica e, no caso da citometria de fluxo, a etapa de desenho do painel talvez
seja a mais crítica e delicada, especialmente conforme o número de cores do
seu painel vai aumentado. Assim, minha sugestão é que você sempre siga
esta ordem:
1. Desenhe o painel, seguindo ao máximo as regras deste Pocket Book,
2. Titule os anticorpos do seu painel,
3. Teste seu painel com as concentrações encontradas na titulação,
4. Se o painel ficou bom, faça o seu experimento. Se o painel não ficou
bom, faça uma otimização dele (que pode ser alterando a concentração
de um ou outro anticorpo ou eventualmente trocando algum anticorpo).
Esta terceira etapa (testar seu painel) é fundamental pois por conta do efeito
de sobreposição de espectros um ou mais anticorpos podem acabar sendo
detectados em algum grau em outros canais, comprometendo a resolução dos
seus dados e, consequentemente, diminuindo a qualidade dos seus

Pocket Book: 8 passos essenciais para criar seu painel multicolor em citometria de fluxo | 33
resultados. Portanto, jamais pule a etapa 3 e vá direto para a etapa 4.
Certifique-se antes de que o painel esteja funcionando bem.
No mais, espero que este Pocket Book possa guiá-lo nesta exploração do
maravilhoso mundo da citometria de fluxo. Foi um prazer enorme, enorme
mesmo, escrever este Pocket Book e desejando um conhecimento mais
aprofundado faça nosso curso completo de citometria de fluxo básica! E não
esqueça de nos seguir nas redes sociais (@explorecytometry)!
Seja bem-vindo ao mundo da Explore Cytometry!!!

Como citar este guia:


Silva, Bárbara Du Rocher D’Aguiar, Explore Cytometry
Citometria de fluxo: 8 passos essenciais para você criar seu painel multicolor /
Bárbara Du Rocher D’Aguiar Silva, Explore Cytometry. – 1ª edição – Rio de Janeiro,
2023. Download disponível no Linktree: https://linktr.ee/explorecytometry

Pocket Book: 8 passos essenciais para criar seu painel multicolor em citometria de fluxo | 34
Referências bibliográficas
1. Andrea Cossarizza et al. DOI: 10.1002/eji.202170126 Eur. J. Immunol. 2021. 51:
2708–3145. Guidelines for the use of flow cytometry and cell sorting in
immunological studies (Third edition).
2. Andrea Cossarizza et al. DOI: 10.1002/eji.201646632 Eur. J. Immunol. 2017. 47:
1584–1797. Guidelines for the use of flow cytometry and cell sorting in
immunological studies.
3. Teresa S. Hawley & Robert G. Hawley. Book: Flow Cytometry Protocols, Fourth
edition, 2018. Chapter 8, Multiparameter Conventional Flow Cytometry.
4. Flow Cytometry Basics Guide: Practical Advice to Get You Started in Flow. BIO-
RAD.
5. Technical note: Seven Tips for Achieving the Perfect Panel for Multicolor Flow
Cytometry. Beckman Coulter Life Science.
6. Technical note: BD Biosciences Relative Fluorochrome Brightness. BD.
7. Site Bio-Rad - Flow Cytometry Explained: https://www.bio-rad-
antibodies.com/flow-cytometry-explained.html
8. Site Bio-Rad - Think Flow Cytometry: https://www.bio-rad-antibodies.com/flow-
cytometry.html
9. Site BD - Define markers and rank them depending on antigen density:
https://eu.bd.com/panel-design/en/flow-cytometry-markers-antigen-density
10. Site Cheeky Scientist - 4 Steps To Validate Flow Cytometry Antibodies And
Improve Reproducibility: https://expert.cheekyscientist.com/4-steps-to-validate-
flow-cytometry-antibodies-and-improve-reproducibility/
11. Site Bite Size Bio - Importance of Antibody Titration in Flow cytometry:
https://bitesizebio.com/22374/importance-of-antibody-titration-in-flow-
cytometry/
12. Site The University of Chicago - Optimized Voltages on Benchtop Analyzers:
https://voices.uchicago.edu/ucflow/2019/10/18/optimized-voltages-on-
benchtop-analyzers/.
13. Site Bio-Rad - Fluorescence Minus One Controls: https://www.bio-rad-
antibodies.com/flow-cytometry-fmo-controls.html

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