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Agradecimentos .................................................................................................................................... ix
Resumo ................................................................................................................................................... x
Introdução .............................................................................................................................................11
Objectivos .............................................................................................................................................12
Geral ......................................................................................................................................................12
Específicos ............................................................................................................................................12
Justificativa ...........................................................................................................................................12
Problematização ...................................................................................................................................13
Hipóteses...............................................................................................................................................14
1.4.1.A deficiente organização dos serviços de saúde e sua relação com abandono à TARV20
3.5.3. Factores relacionados com o tratamento vs Factores relacionados com a doença ...........41
3.6. Estratégias para evitar o Abandono ao TARV: desejos dos pacientes .................................45
Conclusão .............................................................................................................................................48
Sugestões ..............................................................................................................................................49
Bibliografia ...........................................................................................................................................51
Anexos
Apêndices
v
ARV - Antiretroviral;
EFV –Efavirenz
TARV - TratamentoAntiretroviral;
TDF –Tonofovir
RTV –Ritonavir
SQV –Saquinavir
%- Porcento
3TC - Lamivudina
vi
.
vii
Declaração de honra
Declaro por minha hora que esta Monografia Científica é resultado da minha investigação
pessoal e das orientações da minha supervisora e co-supervisor, o seu conteúdo é original e
todas as fontes consultadas estão devidamente mencionadas no texto, nas notas e na
bibliografia final. Declaro ainda que este trabalho não foi apresentado em nenhuma outra
instituição para obtenção de qualquer grau académico.
________________________________
Dedicatória
Agradecimentos
Manifesto a minha gratidão especial ao Pai Consolador, pela vida e saúde concedida para
levar avante a árdua tarefa de estudante, pois, sem o seu apoio não teria conseguido realizar
este trabalho.
Agradeço igualmente aos meus pais Sebastião Carlos Gungulo e Anacleta José Gove, pelo
apoio incondicional que me prestaram durante estes quatros anos do curso, e por tornarem
possível este sonho.
grade o minha supervisora Prof. outora risalita jeco unes e ao meu co-supervisor Ma.
Arlindo Romão pela dedicação, apoio e confiança na elaboração da presente monografia
científica.
Aos meus colegas do curso, em particular à Verónica e ao Édio, pela sua amizade, apoio
incondicional, por todos estes quatro anos de vivencias, aprendizado, críticas sábias,
sugestões e conselhos e, acima de tudo, pela confiança depositada nas minhas capacidades,
encorajando-me a chegar ao fim desta caminhada.
Finalmente, à Dra. Rita (médica do HRC) pela simpatia e compreensão. Aos pacientes pala
abertura e simplicidade. À todos que directa ou indirectamente contribuíram na materialização
desta caminhada. Nambonga
x
Resumo
Introdução
1
Ao nível do Ministério de Saúde o mês começa no dia 21 e termina no dia 20 do mês seguinte.
12
Objectivos
Geral
Justificativa
A escolha deste tema deve-se ao facto de se constituir numa discussão actual nos planos da
psicologia educacional; da necessidade de contribuir cientificamente na análise das causas de
abandono ao tratamento antiretroviral no Hospital Rural de Chicuque, bem como na busca de
soluções tendentes a mitigar o fenómeno. Como estudantes de Psicologia Educacional com
Habilitações em Educação e Assistência Social vemos este problema numa demissão que
ultrapassa os muros hospitalares, precisando da nossa contribuição.
Assim, esta pesquisa torna-se pertinente para proporcionar aos pesquisadores referências que
permitirão aprofundar a investigação sobre temas relacionados com abandono ao tratamento
antiretroviral na vertente psico-educacional e assistência social. Ainda, poderá servir de alerta
aos provedores de saúde ao nível do HRC e do país, para a necessidade de intervenções
psicoeducativas e psicossociais para prevenir o abandono do tratamento podendo-se constituir
numa mais-valia para o sucesso das intervenções em prol do combate ao abandono do
tratamento antiretroviral esperando desse modo que se melhore a qualidade de vida dos
seropositivos visto que com a interrupção do tratamento a possibilidade de morte é maior.
Desta feita, o estudo desta problemática vai permitir conhecer as causas do abandono ao
tratamento e por via disto, propor sugestões ao serviço de saúde, em particular ao HRC, para
enfrentar a problemática a partir de desenvolvimento de estratégias que ajudem a prevenir, em
tempo hábil o abandono ao TARV, uma vez que as suas repercussões reflectem-se em
13
Problematização
2
Vide em anexo
14
Tais consequências são reveladoras de que o abandono ao TARV é seguramente um dos mais
ameaçadores perigos para a efectividade do tratamento, no plano individual e, para falência de
esquemas terapêuticos, no plano colectivo, constituindo assim, um problema de saúde pública.
Sendo assim, a adesão ao TARV é pertinente para a possibilidade de recuperação do sistema
imunológico e de redução das cópias virais no organismo permitindo uma melhoria na
qualidade de vida dos seropositivos.
É neste contexto da problemática que surge a seguinte pergunta de partida: Quais são as
causas do abandono ao tratamento antiretroviral no Hospital Rural de Chicuque?
Hipóteses
Para responder à nossa pergunta de partida consideramos as seguintes hipóteses:
H1. O medo de estigma e discriminação por parte dos pacientes seropositivos contribui para
que estes abandonem ao tratamento antiretroviral
H2. O início do tratamento antiretroviral na fase assintomática do HIV aliado aos efeitos
colaterais dos antiretrovirais contribui para o abandono ao tratamento antiretroviral.
H3. A deficiente organização dos serviços de saúde contribui para o abandono ao tratamento
antiretroviral.
H4. As variáveis sociodemográficas como a baixa renda familiar contribuem para o abandono
ao tratamento antiretroviral.
15
1.1.Tratamento Antiretroviral
A infecção pelo HIV tem sido considerada crónica e controlável, desde o início da expansão
da terapia antiretroviral em Moçambique no ano 2003. Pois, com este tratamento está a mudar
o perfil da infecção, de “doen a fatal” para doen a crónica.
3
Vide na página 24
16
O autor que temos vindo a citar refere que “o tratamento antiretroviral é complexo e requer
acompanhamento médico constante, pois, há a necessidade de avaliar a reacção do organismo
ao tratamento, sendo que, à medida que ocorre resistência ao tratamento, por motivo de
abandono, ou reinfecção, ou efeito do próprio organismo, são prescritas combinações mais
fortes dos medicamentos, ou, TARV de segunda e terceira linha” (Ibid: 10).
Na óptica de Tibúrcio etal., (2010: 19), “a reinfecção ocorre quando um indivíduo infectado
com uma cepa de HIV-1 é infectado com uma segunda cepa diferente HIV-2 a partir de um
indivíduo diferente, após ter ocorrido relação sexual desprotegido. Como consequência da
reinfecção pode haver uma recombinação de material genético entre dois vírus geneticamente
distintos durante o processo de transcrição reversa que ocorre no interior de uma mesma
célula”.
Ou seja, “a reinfecção é condição necessária para que ocorra uma recombinação. Esta, por sua
vez, pode produzir cepas com maior virulência, com resistência aos antiretrovirais, com
alteração no tropismo celular, ocasionando então a falha terapêutica e pode também acelerar a
progressão da infecção e aumentar a probabilidade de transmissão sexual devido a elevada
carga viral;” sendo, sem dúvida, a consequência mais temida em termos de saúde
pública(Idem).
Percebe-se que a terapia antiretroviral apresenta inúmeros benefícios para o paciente, visto
que serve de preservação da sua vida; prevenção do agravamento do estado de saúde e
melhoria da qualidade de vida, o que requer por parte do paciente aderir adequadamente ao
TARV.
A adesão ao tratamento entre os pacientes com doenças crónicas é considerada uma questão
de difícil manejo, pois, normalmente as pessoas estão acostumadas a fazer um tratamento por
um certo período de tempo para curar uma enfermidade ou para aliviar um sintoma.
17
Braweley e Culos-reed (2000) citados por Lima (2006: 13) ao falar de adesão trazem a tona
dois termos mais utilizados na língua inglesa adherence e compliance contendo significados
diferentes: o termo compliance, que pode ser utilizado como „obediência‟, „cumprimento de
regras‟ pressupõe um papel mais restrito do paciente, que teria como papel apenas cumprir as
prescrições médicas. Já o termo adherence, ou aderência/adesão, designa uma possibilidade
de escolha livre das pessoas em adoptarem ou não certa recomenda ão, uma „concordância
autónoma‟ (ou patientempowerment), em que o papel do sujeito é mais activo.
Entretanto, nesta pesquisa o termo adesão será utilizado como “uma rela ão onde o paciente
consegue compreender a própria condição, os aspectos básicos de sua doença e a importância
de sua adesão não apenas para melhoria do quadro clínico individual, mas também no
contexto da história da doen a em questão” (OMS, 2001) Idem.
Segundo Brasil (2007) apud Santos (2011: 13) a adesão ao tratamento transcende a simples
ingestão de medicamentos, devendo ser bem compreendida, incluindo, o fortalecimento das
pessoas vivendo com vírus, o estabelecimento de vínculo com a equipe de saúde, o acesso à
informação, o acompanhamento clínico-laboratorial, a adequação aos hábitos e necessidades
individuais e o compartilhamento das decisões relacionadas à própria saúde.
esta feita, Brasil (2008: 14) ensina que a “adesão ao tratamento deve ser entendida como um
processo de negociação entre o usuário e os profissionais de saúde, no qual são reconhecidas
as responsabilidades específicas de cada um, visando fortalecer a autonomia para o auto-
cuidado”.
Entretanto, ser sujeito participativo e activo implica que o paciente adere ao plano de
tratamento porque compreende a necessidade de tomar os medicamentos conforme a
prescrição médica, conhece o impacto de ingerir correctamente os medicamentos na melhoria
da qualidade da vida; aceita as mudanças nos hábitos quotidianos e é activo nos cuidados da
própria saúde.
Nessa perspectiva, a busca consentida coloca-se como uma estratégia de intervenção, que
deve ser discutida e organizada com a participação de todos os membros da equipe de saúde,
observando os princípios éticos e legais da acção.
Entendemos que, qualifica-se como paciente em estado de abandono aquele que completa
sessenta dias antes de voltar à consulta e como faltoso aquele que a partir do décimo quarto
dia até quinquagésimo nono dia não volta à consulta, e em atraso aquele paciente que ainda
não foi à US dentro de duas semanas, contando a partir da data marcada para a próxima
consulta.
Em relação às causas e/ou motivos do abandono ao TARV, pode-se dizer que são diversos e
de diferentes naturezas. Observam-se na literatura causas relacionados com pessoa, com
tratamento, com a doença, com serviço ou profissional de saúde e de ordem social, alguns dos
quais explicitados a seguir (Santos, 2011), (Camargo etal., 2014).
Relacionadas àpessoa - segundo Santos (2011:14) incluem os que a pessoa tem sobre a
doença, suas crenças e valores, sua saúde mental, factores socioeconómicos e as condições
clínicas, acesso a informação. Por seu turno, Camargo etal., (2014: 224) destacam o perfil
socioeconómico, aceitação e nível de conhecimento da doença, sintomas psicológicos ou
transtornos psiquiátricos associados e percepção de suporte social ou material inadequado
como factores relacionados com à pessoa.
4
Santos, 2011: 15
20
Pires etal, (2014: 23) em seu estudo descritivo realizado nos centros de saúde de cinco
distritos da província de Nampula, encontraram a prevalência de abandono ao tratamento
antiretroviral na ordem de 40% e o principal motivo alegado é o estigma e discriminação
ligado à infecção pelo HIV. Contudo, a insegurança alimentar constitui igualmente um factor
determinante, para além de início recente do tratamento, número elevado de antiretrovirais
por dia, os efeitos secundários dos antiretrovirais, falta de apoio familiar, desconhecimento
dos Grupos de Apoio à Adesão Comunitária (GAAC), dos riscos da má adesão terapêutica e
confiança na medicina tradicional.
1.4.1. A deficiente organização dos serviços de saúde e sua relação com abandono ao
TARV
Segundo MIS U (2016: 52) “a organização dos serviços de saúde inclui a preparação do
provedor na qualidade da atenção (acolhimento e aconselhamento) – que se reflecte na relação
provedor-paciente – a qualidade dos edifícios físicos, e a qualidade e rapidez no
atendimento”.
21
Petersburgo (2010: 11) alinhando do mesmo diapasão, assume que “a deficiente organiza ão
dos serviços de saúde reflecte-se no tempo de espera para obter atendimento por parte de
pacientes e o fluxo da US”.
Este autor acredita igualmente que “a demora no atendimento muitas vezes está associada
impaciência, destrato por parte do pessoal de saúde, pese embora as dificuldades estruturais
(poucos recursos humanos qualificados e em quantidade para prestar assistência atempada às
PVHIV) e problemas da organização do atendimento versus número limitado de provedores,
também contribuem na demora no atendimento e consequentemente no abandono ao
tratamento” (Ibid: 13).
Neste caso, o abandono do tratamento pode se dever a alguma desmotivação por parte de
paciente motivado pela demora no atendimento porque a fila é longa ou porque os provedores
demonstram despreparo no atendimento.
Para Ferreira (2011) apud Lopes (2012: 50) “a rela ão provedor-paciente deve ser de ajuda,
pois, ao ter tempo para acolher, escutar, aconselhar e compreender o doente e as suas crenças,
potencia-se confian a no provedor de saúde e por conseguinte, a adesão terapêutica”. Nesta
ordem de ideia, Seidl (2005) apud Brasil (2012:22) refere que “o acolhimento, a escuta activa
ao paciente possibilita a criação de vínculo com os profissionais e o servi o de saúde”.
Segundo a INSIDA (2013: 10) estigma é “ofenómeno social caracterizado pela reprovação,
descrédito, desconsideração e/ou sub-valorização de um indivíduo ou grupo de indivíduos
com determinadas características, comportamentos ou crenças, não alinhados com as normas
sociais ou culturais. requentemente leva marginaliza ão e discrimina ão”.
22
Por seu turno, asimiro etal., (2001: 160) definem o estigma como “qualquer característica
que coloca um indivíduo ou grupo à parte da maioria da população, sendo tratado com
suspei ão ou hostilidade”.
Para ONUSI (2005: 8) “o estigma está profundamente enraizado, agindo dentro dos
valores da vida todos os dias. Embora as imagens associadas à SIDA variem, são modeladas
de maneira a assegurar que o estigma com ela relacionado, favoreça e reforça as
desigualdades sociais”. Tais desigualdades incluem especialmente as que estão ligadas ao
sexo, raça, etnia e sexualidade.
Assim, por exemplo, o homem e a mulher não são muitas vezes tratados da mesma maneira
quando infectados pelo vírus. É mais provável que seja culpabilizada a mulher mesmo quando
é o marido que está na origem da sua infecção. Além disso as mulheres infectadas têm menos
probabilidades de ser aceites nas suas comunidades.
e acordo com a ONUSI (2000: 10), “a discrimina ão ocorre quando é feita uma distin ão
em relação a uma pessoa, em consequência da qual ela é tratada incorrecta e injustamente, por
pertencer, ou por presumir-se que pertence, a determinado grupo.”
orroborando com a cita ão anterior Taela (2004: 8) considera discrimina ão como “qualquer
forma arbitrária de distinção, exclusão ou restrição afectando pessoas devido a sua condição
serológica, confirmada ou suspeita, em rela ão ao HIV”.
Sobre os dois conceitos Brasil (2008: 75) refere que “o estigma e a discrimina ão
relacionados com o vírus enfraquecem os esforços de prevenção e tratamento pois, para não
levantar suspeitas sobre a sua serologia do HIV as pessoas têm receio de saber se estão ou não
infectadas, de procurar informações sobre a maneira de reduzir o risco de exposição ao HIV, e
de alterar o seu comportamento para um mais seguro”.
Todavia, “o medo do estigma e da discrimina ão também faz com que as pessoas que vivem
com o HIV não tenham coragem de revelar a sua infecção, mesmo a membros da família e
parceiros sexuais. O segredo que rodeia a infecção por vírus e que resulta de estigma e
discrimina ão leva as pessoas a imaginar não correrem perigo de infec ão por mesmo”
(Idem).
É nesta óptica que erqueira (2014: 29) considera que “a vergonha associada ao HIV – uma
manifestação de estigma que tem sido descrita por certos autores como estigma interiorizado
– também pode impedir as pessoas que vivem com o HIV de procurar tratamento, cuidados e
apoio e de exercer outros direitos tais como trabalhar, frequentar a escola, etc”.
Portanto, esta vergonha pode ter uma grande influência psicológica sobre a maneira como as
pessoas seropositivas se consideram e se adaptam ao seu estado, tornando-as vulneráveis a
culpa, depressão e isolamento. Podendo igualmente confidenciarem a condição da doença
devido ao medo de serem apontados na rua como portador de vírus, neste sentido, o abandono
ao tratamento é provocado por medo da pessoa ser discriminada por amigos e familiares e
sociedade em geral.
Seidl et al., (2007) apud Pereira etal., (2012: 150), apontam as variáveis sóciodemógraficas, a
exemplo de sexo, idade, etnia, escolaridade, renda, como intervenientes na adesão a TARV,
com o destaque para a escolaridade e baixa renda, uma vez que há uma associação
significativa de abandono em pessoas com menor nível de instrução e com baixa renda
familiar.
linhando do mesmo diapasão, Zunge (2013: 65) diz que “homens adultos com menor idade
e idade avançada estão predispostos à não adesão ou abandono ao TARV, por vezes
relacionada com questões cognitivas, ao contrário das mulheres, tende a aderir; porém, a
baixa renda familiar e baixa escolaridade, especialmente com ensino primário incompleto,
apontam a prevalência reduzida de adesão”.
Por seu turno, Brasil (2005: 19) refere “como factor influenciador ao abandono ou à não
adesão ao TARV a escolaridade inferior a 4 anos de estudos, visto que, interfere tanto na
compreensão da história de doença, estratégias de prevenção e a ingestão de medicamentos
propriamente dita”.
Noutro estudo sobre a problemática do HIV/SI , Brasil (2004) afirma que “o nível baixo de
escolaridade afecta negativamente a formulação de conceitos de auto-cuidado em saúde e o
entendimento das orientações recebidas sobre a doença e o tratamento. Sendo que reduz em
20% as possibilidades de adesão ao tratamento antiretroviral” (Idem).
Por seu turno, Zunge (2013: 84) afirma que “a renda familiar apresenta uma tendência de que
pessoas com menor poder aquisitivo (renda menor que dois salários mínimos) tem maior
24
probabilidade de abandonar o tratamento, dado que a pessoa não possui dinheiro de transporte
para se deslocar ao posto de saúde ou não tem comida suficiente para suprir a fome que os
medicamentos provocam e isto causa sofrimento”.
Percebe-se, no entanto, que quanto menor for a renda familiar, maior será a probabilidade de
abandono ao tratamento. Desta forma, as condições sociodemográficas, principalmente, as
ligadas à renda devem ser sempre avaliadas no início e durante tratamento, a fim de se
identificar se estão interferindo de modo positivo ou negativo ao longo do tratamento.
Segundo Vervoortetal., (2007) apud Carvalho, (2008: 54) “conversar com o portador do vírus
HIV sobre tomar os antiretrovirais é como informar o diagnóstico de infecção pela segunda
vez”. Pois, segundo o autor, apesar dos pontos positivos levantados sobre as medica ões, as
dificuldades não deixam de existir.
Ademais, os efeitos colaterais dos ARV, provocam grande desconforto para quem tm que
tomar estas medicações todos os dias e são apontados como um dos motivos da não adesão ou
da vontade de desistir do tratamento.
Neste sentido, os efeitos colaterais dos medicamentos podem causar o abandono da terapia,
pois, criam desconforto para quem tem de tomar a medicação todos os dias, pese embora, a
sua intensidade varie segundo o fármaco pertencente a determinada classe dos ARV como
podemos ver a seguir, conforme atesta o MISAU (2010:25):
Sabendo que o tratamento antiretroviral é composto por pelo menos três antiretrovirais
combinados, sendo dois medicamentos de classes diferentes, o clínico prescreve ao paciente
um esquema terapêutico composto, por exemplo, por um medicamento da classe INTR, outro
da classe INNTR, resultando no esquema terapêutico: TDF+3TC+EFV. Uma vez que cada
26
fármaco tem seus efeitos colaterais, a gravidade dos efeitos colaterais aumenta, diminuindo
assim a adesão por parte do paciente.
Dada a gravidade dos efeitos colaterais, o paciente numa fase assintomática do HIV, tomando
os medicamentos o grau de insatisfação aumenta levando-o a não aderir à medicação. Pois,
segundo Lima (2006: 96) “na ausência de sintomas, se o paciente apresenta intensos sintomas
colaterais aumenta a possibilidade de não aderir e abandonar a medica ão/tratamento”.
e acordo com araciolo (2007: 29) “nos assintomáticos a doen a parece uma realidade
distante e abstracta, sendo do que, nesta fase a tomada de medicamentos e a ocorrência de
eventuais efeitos colaterais que os aproxima, a doença leva a recusa ou interrupção de toma de
medicamentos”.
Nesta ordem de ideia, arvalho (2008: 59) ressalta que “há uma importante diferen a entre
pessoas que sentem os sintomas da doença e os que não sentem. Os sintomáticos têm a doença
como concreta, já sentiram melhoras dos seus sintomas ao tomar a medicação e possuem uma
menor quantidade de obstáculos. Por sua vez, os assintomáticos têm somente os resultados de
exames como prova da existência da doença – o que a faz, provavelmente, parecer abstracta –
e vivenciam, muitas vezes o conflito de tomar a medicação devido aos efeitos adversos, ou
não aceitar a sua existência e por consequência, em outros casos negligenciam a medica ão”.
Desta forma, percebe-se que a pessoa que inicia o tratamento numa fase assintomática tem
mais possibilidade de abandonar o tratamento, pois, o acto de consumir medicamentos é
muitas vezes visto como forma de atenuar os sintomas e não para provocar dor como ocorre
com os efeitos colaterais dos ARV.
27
Para Brasil (2005: 22), o aconselhamento psicológico em pessoas vivendo com HIV (PVHIV)
é entendido como “um processo de escuta activa, individualizado e centrado no cliente”.
Sem se distanciar dos autores que temos vindo a citar, Pequeno etal., (2013: 434) dizem que
“o aconselhamento configura-se uma acção em saúde, que contribui para a formulação de
discursos que propõem a reflexão, a superação de dificuldades no enfrentamento dos
problemas relacionados ao HIV e adopção de medidas preventivas na busca de melhor
qualidade de vida e, sobretudo, da autonomia do sujeito no processo de preven ão e cuidado”.
Algumas intervenções psicoeducativas e psicossociais têm sido propostas para pessoas que
vivem com HIV, com diversos objectivos. Contudo, poucos são os estudos, quer ao nível
interno, quer ao nível internacional com propostas de prevenção do abandono ao tratamento
antiretroviral.
O desafio é desenvolver as habilidades por parte de usuário para lidar de maneira eficaz com
eventuais factores que podem influenciar no abandono ao longo do tratamento. Assim, o autor
deixa algumas estratégias de abordagem Psicoeducativa fundamentadas em teoria centrada na
pessoa pautadas em Aconselhamento Psicológico e Educação para Saúde.
orroborando com a tese acima, para arvalho (2009: 35) “o aconselhamento em HIV/SI
preconiza o estabelecimento de confiança, a fim de fortalecer o indivíduo como sujeito de sua
própria saúde e transformação, baseando-se em dois componentes: apoio educativo
(transmissão de informação e esclarecimento de dúvidas), apoio emocional/psicológico
(oferecido a partir de escuta sensível e acolhedora) ”.
não é suficiente para que os pacientes formem opiniões e se apoderem das rédeas de suas
vidas. Assim, nesta componente esclarece-se dúvida sobre o tratamento, apura-se a
necessidade de fazer o tratamento, seus benefícios associados, analisa-se as vantagens e
desvantagens de fazer o tratamento, discute-se sobre a natureza do tratamento (os efeitos
colaterais) considerando que são passageiros, sobre mudan as no estilo de vida”.
No que tange ao apoio emocional/psicológico, Caraciolo (2007: 70) afirma que este
procedimento implica “conceder ao paciente um tempo para reflexão sobre a tomada dos
medicamentos, antes da introdução deles (trabalhar a aceitação). Promover a autonomia do
indivíduo, incentivando-o a assumir a própria condição de saúde, o tratamento e motivar o
paciente que adere ao tratamento”.
arvalho (2009: 36), refere que “o apoio psicológico visa facilitar o desenvolvimento de
habilidades de auto-eficácia e adaptação psicológica por parte de usuário para lidar de
maneira eficaz com os aspectos conscientes que lhes impede a usar o seu potencial em prol da
adesão tratamento e auto-cuidado, como o medo de estigma e descriminação, a não-aceitação
de doença, os efeitos colaterais, e demais situações que podem aparecer ao longo do
tratamento.
demais, segundo araciolo (2007: 69) “para todos os casos, o medicamento deve ser
oferecido, e a decisão sobre o início do tratamento precisa ser pactuada entre médico e
paciente. Se o paciente não tiver intenção de iniciar o tratamento, é importante que este
momento seja respeitado, retardando-se a introdução dos remédios para momento mais
oportuno. Muitas vezes prorrogar o início do tratamento pode prevenir o abandono”.
e acordo com osta & Lopes (2005) citado por arvalho (2009: 33) “a educa ão para saúde,
se constitui numa abordagem que ajuda na modificação de comportamentos dos indivíduos,
em prol da aquisição ou manutenção de hábitos saudáveis de vida no que concerne ao auto-
cuidado e tratamento”.
ssim, o conteúdo educativo pode ser composto por temas como: “explica ões sobre
diferença entre HIV e SIDA, o significado de período assintomático e aparecimento de
doenças oportunistas, explicações sobre o tratamento de HIV e importância de fazer o
tratamento precocemente mesmo não apresentando sintomas; explicar o significado e
importância de exames de 4, carga viral e outros”. Estes temas vão permitir o
desenvolvimento de habilidades na tomada de decisões, objectivando a manutenção de seu
estado de saúde e a qualidade de vida.
Em relação ao tratamento Caraciolo (2010: 26) refere que deve se fazer a prescrição ou
adaptação do esquema terapêutico à rotina diária, simplificação dos esquemas terapêuticos,
educação e/ou informação sobre ocorrência de efeitos colaterais, tratamento de efeitos
colaterais.
Na nossa óptica, o grupo deve ser composto por pessoas que acabam de iniciar o tratamento e
os que já iniciaram há bastante tempo, tendo uma coordenação multiprofissional, envolvendo
médicos, psicólogos e assistentes sociais.
31
Nesta direc ão, “as interven ões psicossociais precisam desmistificar as cren as sobre HIV e
estimular nos membros da família e amigos do doente o senso de fornecer apoio emocional ao
doente para com isso, reduzir a sua angústia e aumentar os níveis de adesão ao tratamento”
(Idem), pois, segundo Seidletal., (2007) apudBrasil (2008: 27) os pacientes sem apoio, ou
mesmo com insuficiente, de familiares, amigos tendem a apresentar mais dificuldades de
adesão.
Neste capítulo, apresentamos a metodologia usada na elaboração deste trabalho, que segundo
Marconi &Lakatos (2011: 46) “constitui um conjunto de actividades sistemáticas e racionais
que, com maior segurança e economia, permite alcançar o objectivo – conhecimentos válidos
verdadeiros – traçando o caminho a ser seguido, detectando erros e auxiliando as decisões do
cientista”. Mas ainda, aqui delineamos o método, o tipo de pesquisa, as técnicas de recolha de
dados e as considerações éticas utilizadas para se alcançar os objectivos do trabalho.
Como toda pesquisa requer o uso de método, esta não foge da regra pois, para facilitar a
análise e interpretação dos dados baseamo-nos no método indutivo.
Segundo Ruiz (2009: 139), “método indutivo é um processo de raciocínio, que parte de
enunciados particulares, para chegar conclusão ampliada em enunciado mais gerais”. Este
método permitiu-nos na determinação das conclusões sobre as reais causas de abandono ao
tratamento antiretroviral no HRC; para tal, os dados colhidos foram analisados de forma
singular para se chegar a uma conclusão geral.
2.2. Tipo de pesquisa
O tipo de pesquisa utilizada neste estudo classifica-se de três formas nomeadamente: quanto a
abordagem do problema, quanto aos objectivos e quanto aos procedimentos metodológicos.
Quanto à abordagem, o estudo é do tipo misto (qualitativo e quantitativo) visto que os dados
obtidos por técnicas qualitativas foram igualmente analisados quantitativamente através de
técnicas estatísticas simples concretamente percentuais.
Segundo Pinheiro apud Michel (2015: 41), “a pesquisa qualitativa caracteriza-se por um
estudo de carácter analítico, cujo propósito é identificar e analisar com maior grau de
profundidade dados e informações não mensuráveis, sentimentos, sensações, pensamentos,
comportamentos passados, expectativas futuras, vivências. E a pesquisa quantitativa, é uma
actividade em que se usa a quantificação tanto nas modalidades de colecta de informação,
quanto no tratamento dessas, através de técnicas estáticas, desde as mais simples como:
33
percentual, média, desvio padrão, às mais complexas como coeficiente de correlação, análise
de regressão e outras”.
Assim, o uso desta abordagem do ponto de vista qualitativo, visou identificar, descrever e
analisar os motivos do abandono ao tratamento antiretroviral no HRC. E do ponto de vista
quantitativo, visou a definição percentual das causas do mesmo.
Quanto aos objectivos, o estudo é do tipo descritivo, pois, permitiu-nos identificar e descrever
as causas do abandono ao tratamento antiretroviral, analisando com mais detalhes o que deve
ser feito para reverter a situação no Hospital Rural de Chicuque.
Enquanto a pesquisa de campo segundo Gil (2007: 47) “procura o aprofundamento de uma
realidade específica. É basicamente realizada por meio de observação directa das actividades
do grupo estudado e de entrevistas com informantes para captar as explicações e
interpreta ões do que ocorre naquela realidade”. Neste estudo, baseamo-nos na entrevista para
adquirir as informações sobre as causas do abandono ao tratamento antiretroviral na realidade
em estudo.
5
Vide em apêndices
34
Segundo ortinetal., (1999: 43) “a popula ão engloba todos os elementos com características
comuns estabelecidas para o estudo”.
Para o efeito, constitui universo desta pesquisa realizada no HRC 126 pacientes com infecção
por HIV inscritos nos serviços TARV entre o segundo semestre do ano fiscal de 2016 e 2017
com historial do abandono ao tratamento antiretroviral, que já foram reintegrados, e estão em
seguimento do tratamento antiretroviral.
Para Richardson (2008: 160), numa população finita, uma amostra representativa é
correspondente a pelo menos 10% da população. No entanto, seleccionamos de forma
aleatória uma amostra de 11% que corresponde a 14 participantes, como se pode ver na tabela
abaixo.
35
Importa-nos dizer que para mantermos o contacto com os informantes, primeiro, fizemos o
levantamento dos mesmos depois da sua identificação no livro de visitas domiciliares e, de
seguida, fomos à farmácia para apurarmos as datas em que tinham as próximas consultas
marcadas. Foi nas datas de consultas que procedemos a recolha de dados.
6
Vide em apêndices
36
No que tange à revelação do estado serológico, verificamos que num total de 14 pacientes,
apenas 9 (64%) revelaram a sua serologia a um familiar, amigo ou algum confidente, sendo
que 5 pacientes (36%) preferem manter o segredo em relação ao seu seroestado. A maior
parte dos que não revelaram o seroestado a ninguém é da faixa etária de 26 a 35 anos de
idade, em número de 4 (80%).
7
População e amostra da pesquisa
37
Paxton (2002) citado por equeira (2013: 57) explica que “a revela ão da condi ão de
portador do HIV para o companheiro/parceiro ou a pessoa mais próxima é recompensadora,
pois, diminui stress, melhora a vida produtiva, o bem-estar e diminui a descriminação, pelo
que o segredo da condição serológica constitui uma auto-tortura”.
Entretanto, a doença por ser vista histórica e culturalmente como pertença a um certo grupo,
nomeadamente “pessoas que desonram-se sexualmente” é estigmatizada. Por esta razão, os
portadores sentem-se culpados, segregados e têm uma morte social inerente à revelação do
diagnóstico e, por isso preferem manter o segredo.
Sobre isto, a nossa opinião é que o estigma e a descriminação para com as pessoas vivendo
com HIV determinam várias de suas atitudes, muitas vezes levando-os a mentir para não
exporem a sua serologia. Igualmente, as pessoas por temer reacções negativas dos parceiros,
familiares e sociedade em relação a sua serologia, podem manter o segredo e optarem por não
buscar medicamentos na unidade sanitária, abandonando por conseguinte o tratamento.
Visto o problema doutro lado, as pessoas que são aceites socialmente quando revelam o
seroestado encontram benefícios, pois não precisam esconder-se para tomar medicações,
reduzem stress, na vida sexual não existem suspeitas entre parceiros, dado que se houve a
revelação do seroestado entre parceiros sexuais, sendo fácil a compartilha da necessidade da
prevenção positiva (prevenção da transmissão do HIV centrada nas pessoas que já sabem que
são HIV+) para evitar reinfecção por exemplo.
propósito disto, arvalho (2008: 51) afirma que “o uso de preservativo entre PVHIV
contribui para reduzir a reinfecção pelo HIV, sendo que o contrário aumenta a possibilidade
da mesma”. E tal como fizemos a referência no ponto 1.1. (pág.16), Tibúrcio etal,
consideram que a reinfecção ocorre quando duas pessoas com cepas de diferentes de HIV
matem relações sexuais desprotegidas, uma vez que no acto sexual, ocorre a troca de vírus.
Esta condição pode levar à resistência aos medicamentos, ocasionando a falência terapêutica e
pode também acelerar a progressão da doença.
“Foi chocante, fiquei muito deprimida, pensando em como seria a vida com HIV”
(E14)
“Eu fiquei muito chocado. Nunca pensei que podia ter HIV. Na altura, aceitar porque
nem tinha sintomas que tinham a ver com HIV/SIDA” (E5).
“Chorei! não consegui acreditar que podia ter essa doença. Pensei que a morte já
tinha chegado”. (E3).
A descoberta da condição de portador de HIV é um evento traumático, pois, segundo Santos
(2011: 68) “consiste em grande impacto para a pessoa, não só físico, mas também psicológico
e social devido cronicidade da doen a, ao estigma e discrimina ão associados a doen a”.
No caso do HIV, o medo do estigma e a presença de crenças sobre a doença como sinónimo
de morte, podem aumentar a frequência de transtornos depressivos em pessoas vivendo com
HIV, afectando assim a saúde mental do indivíduo.
Para além da depressão, alterações psicológicas como ansiedade e stress também podem estar
presentes durante a descoberta do diagnóstico de HIV, podendo-se acentuarem por um
período prolongado em casos de não enfrentamento por parte de pacientes mediante ajuda de
um psicólogo.
É, igualmente, nossa opinião que a seropositividade não supõe um impacto negativo na vida
mental do indivíduo se este apresentar recursos psicológicos e de apoio social para lidar com a
situação. Desta forma, é necessário o aconselhamento psicológico para lidar com questões de
saúde mental e, principalmente, para superar ares de ansiedade e stress antes, durante e depois
do teste, incluindo no momento de início do tratamento, tendo em vista assegurar que o
paciente compreenda o diagnóstico e a necessidade de iniciar o tratamento antiretroviral.
Como podemos ver no gráfico abaixo, o abandono do TARV ocorreu por diversos factores.
Através da análise das entrevistas individuais foi possível agrupar as causas de abandono ao
tratamento em 6 categorias, nomeadamente factores relacionados: com a pessoa, com a
doença vs o tratamento, com o tratamento, com o serviço de saúde, socioculturais e sócio-
demográficos.
Factores sócio-demográficos
29%
Factores relacionados com os serviços de saúde
Em cada uma das seis categorias sobre os factores que ocasionam o abandono do tratamento
antiretroviral foram encontrados certos indicadores de abandono.
Há que salientar que os entrevistados afirmaram que estas reacções face à seropositividade
deveram-se ao facto de no momento do diagnóstico não terem nenhum sinal aparente que
pudesse justificar a existência da doença e pela mesma razão não iniciaram a medicação.
Esta ideia é sustentada pelo Faustino (2006) apud Brasil (2008: 19) ao referir que “a não-
aceitação da seropositividade é indicado como condição associada à adesão insuficiente e ao
abandono ao tratamento em pessoas vivendo com HIV, pois, tomar os remédios significa
reconhecer que a infecção pelo HIV é uma realidade”.
Há que referir que os efeitos colaterais estiveram presentes em quase todos os pacientes
entrevistados no início do tratamento. A diferença é que noutros casos formam concebidos
como passageiros, segundo atestam os depoimentos à seguir:
“No primeiro mês, só dormia na madrugada depois de passar por pesadelos; tinha
pesadelos horríveis, que pareciam tão reais, não conseguia dormir, yuh! Passei muito
mal”(E13).
“Não foi fácil no início, os medicamentos me criavam nojo e vómitos, ficava sem
força e não conseguia fazer meus os afazeres, mas depois de um tempo passou” (E5)
Neste sentido, entendemos que os pacientes que abandonaram o tratamento não tinham
concebido os efeitos colaterais como passageiros. Desta feita, é necessário que os usuários
sejam previamente informados sobre a eventual possibilidade da ocorrência dos efeitos
colaterais, do seu efeito passageiro, devendo os clínicos fazerem o monitoramento, para no
caso de serem persistentes poderem intervir no sentido de atenuar.
Esta associação é percebida nos relatos dos pacientes ao afirmarem que o grande embaraço
em se adaptar ao tratamento circunscrevia-se no facto de ao tomarem os medicamentos
ficarem doentes (efeitos colaterais) numa situação em que não possuíam nenhum sintoma ou
dor.
Esta ideia é corroborada pelo Caraciolo, tal como fizemos referência no ponto 1.4.48 (pág. 26)
que nas pessoas sem sintomas a doença parece uma realidade abstracta e, nesta fase quando o
paciente ingere os medicamentos e ocorrem os efeitos adversos que lhe criam desconforto
recusa ou interrompe a ingestão dos medicamentos.
Neste sentido, julgamos que o assunto sobre a possibilidade de ocorrência de efeitos colaterais
deve ser previamente discutido com o usuário, para que este tenha a consciência sobre o que
se espera com o tratamento e desenvolver-se habilidades cognitivas – a auto-eficácia – para
lidar com os efeitos colaterais.
Para tal, torna-se necessária uma minuciosa atenção por parte dos provedores de saúde para
proporcionar uma abordagem adequada dos efeitos colaterais, o mais precoce possível,
evitando, por conseguinte, a baixa adesão ou abandono ao tratamento antiretroviral.
“Quando amigos falassem sobre HIV, me sentia muito mal, era como se falassem de
mim (…); fiquei com medo de ser vista no hospital a levantar medicamentos; sabe! as
pessoas te tratam mal quando sabem que você tem HIV” (E10)
“Ficava aterrorizado por pensar que as pessoas soubessem que tenho HIV, mas na
verdade ninguém soube antes de eu contar; até cheguei de contratar alguém para
passar a levantar medicamentos só para não ser visto que tenho HIV (E8)”.
8
O inicio do TARV na fase assintomático do HIV aliado ao aparecimento de efeitos colaterais e sua relação com
abandono ao TARV
43
infecção pelo HIV. Este medo consolida-se pela não-revelação do seroestado, tal como
podemos constatar neste estudo, que a descoberta da infecção por parte destes participantes
esteve ligada à busca de auxílio médico devido a problemas de saúde e não por iniciativa
própria de busca do conhecimento sobre o estado serológico. Por isso, no momento da
descoberta não revelaram a ninguém o seroestado, tendo preferido manterem em segredo para
não levantar suspeitas da sua seropositividade do HIV nos parceiros/as, vizinhos e familiares
e, pela mesma razão, prefiram não levantar os medicamentos na US.
Por isso, assumimos que a questão do abandono ao tratamento está intimamente ligada ao
medo de estigma e descriminação que prevalece na sociedade, uma vez que a doença expõe a
pessoa a julgamentos e estigmas sociais. É, por receio destas reacções, que o indivíduo que
abstém-se do tratamento.
Esta ideia é corroborada pelo ggleton (2001:29) ao afirmar que “o medo do estigma e da
discriminação dentro de casa e da comunidade local impede que as pessoas com HIV a
procurem o tratamento. Isto, ocorre porque as pessoas têm medo de serem descobertas como
portadores de vírus pela família e pela comunidade”.
Neste contexto, afirmamos que a vergonha ou receio de ser visto como seropositivo no bairro,
na família e no Hospital, uma manifestação de estigma interiorizado, impede as pessoas de
procurar informações sobre a doença, afectando na adesão aos cuidados e tratamento. Desta
feita, é necessário que se desenvolva no paciente as habilidades de ajustamento emocional e
social a partir de apoio afectivo e/ou psicológico, desmistificando o estigma interiorizado.
No que tange aos factores sócio-demográficos a falta de renda que ocasiona a falta de dinheiro
de transporte e insuficiência de alimentação foi mencionado como motivo de abandono ao
tratamento por 1 (7%) paciente.
O paciente refere que não possuía renda mensal e vivia numa região onde a deslocação para
US requer o uso de dinheiro para o transporte. Como se não bastasse, o entrevistado admitiu
que não conseguia ter alimentos suficientes para aguentar com a demanda alimentar que os
medicamentos provocam, uma vez que não tinha dinheiro para comprar.
para consultas e/ou levantar os medicamentos, além de que por falta de renda, também não
conseguia dinheiro para comprar alimentos suficientes capazes de responderem às
necessidades que os medicamentos provocam.
É nesta perspectiva que Bonoloetal., (2007: 65), afirmam que “existe uma rela ão entre o
abandono ao tratamento antiretroviral e renda pessoal menor que ½ e 3 salários mínimos,
sendo que a associa ão é ainda mais forte quando o paciente não possui renda”. Por seu turno,
Almeida (2013: 32) diz que “a distância longa entre a casa do paciente e o local de
atendimento, assim como a insuficiência de alimentação é observado como sendo factor de
maior risco para abandono”.
Sendo assim, antes do início do tratamento, é imperioso fazer-se a avaliação das condições
sociodemográficas do paciente com enfoque na condição da renda pessoal para uma possível
intervenção, que pode consistir em reforçar no paciente a necessidade de ter rede uma de
apoio familiar ou de estar nos grupos de apoio à adesão comunitária para no caso de enfrentar
problemas de transporte ou outros relacionados com o tratamento possa ter ajuda, por um
lado.
Por outro lado, é necessário que o paciente seja consciencializado para consumir qualquer tipo
de alimento, não esperando por alimentos que possivelmente são adquiridos no mercado
como: arroz, carne, etc.
Sobre os factores relacionados com o serviço de saúde, o mau atendimento e mau acolhimento
foi indicado como motivo de abandono ao tratamento por 1 (7%) paciente. O paciente teria
sido maltratado pelos provedores de saúde por alegada chegada tardia à unidade sanitária.
“Nesse dia cheguei tarde porque passei pela escola atender um assunto de meu filho,
o que vi foi pior, insultaram-me como se tivesse comprado esta doença e daí desisti”
(E2)
Neste depoimento percebe-se que os maus tratos aos pacientes em tratamento antiretroviral
são seguramente um dos motivos do abandono ao tratamento, pois, desmotiva-os na procura
deos serviços especializados na US.
tal como fizemos referência no ponto 1.4.19, (pág. 23) adverte que a relação profissional-
paciente deve ser de ajuda e o profissional precisa ter tempo para escutar e compreender o
doente no que concerne as suas crenças e suas dificuldades, de modo a garantir-se a confiança
no provedor de saúde e, por conseguinte, a adesão ao TARV.
Questionados os pacientes, sobre o que gostariam que a unidade sanitária fizesse para evitar
que eles e seus companheiros, que acabam de iniciar o tratamento não o abandonem, as
respostas foram distintas; sendo que nos 14 pacientes, 10 (71%) responderam uniformemente
que gostariam que o atendimento fosse sadio, uma vez que tem sido o contrário; 4 (29%)
responderam que os mesmos serviços de saúde deveriam continuar a fazer buscas consentidas
e visitas domiciliares visando dar apoio aos doentes.
Igualmente, deviam continuar a inserir outros pacientes nos GAAC, dado aos benefícios
encontrados nestes grupos porque não tendo dinheiro de transporte conseguem ir à unidade
sanitária buscarem medicamentos graças às contribuições que o grupo faz, sem pôr de lado a
partilha e ajuda nos problemas por parte dos membros do grupo.
Sobre a necessidade que os pacientes têm do atendimento sadio, percebe-se que os provedores
de saúde não humanizam o atendimento, facto que pode desmotivar os pacientes na adesão ao
tratamento.
Segundo Oliveira (2005) apud Carvalho (2008: 72) a humanização da atenção à saúde é
entendida “como um processo de diálogo, que garanta e estimule uma crescente integra ão
entre finalidades técnicas do trabalho e os projectos de vida dos usuários”.
9
A deficiente organização dos serviços de saúde e sua relação com o abandono à TARV
46
Neste sentido, é nossa opinião que todos os profissionais devem ter a postura acolhedora e de
aconselhador devendo escutarem e responderem às diversas necessidades dos pacientes, com
vista a garantir um atendimento humanizado.
Neste sentido, caso o paciente recuse iniciar o tratamento antiretroviral, é imperioso que o
mesmo seja aconselhado sobre os benefícios do início do TARV, até que se sinta preparado
para inicia-lo. Pois, “muitas vezes prorrogar o início do tratamento pode prevenir o
abandono10”.
Esta ideia é corroborada por Brasil (2008: 44) ao referir que “a busca consentida visa o
restabelecimento e o fortalecimento do vínculo do paciente com o serviço de saúde e não
objectiva apenas trazer o paciente de volta ao serviço, mas também conhecer sua situação
actual e trabalhar com ele os factores que estão determinando o abandono”.
Por seu turno, araciolo (2010: 27) considera que “as visitas domiciliares visam apoiar ou
desenvolver acções na residência que estimulem e facilitem a adesão. Além disto, constituem
uma excelente oportunidade de avaliar a adesão e obter informações preciosas sobre
circunstâncias de sua vida e os obstáculos adesão”.
No que concerne à necessidade de inserir os pacientes nos GAAC, a consideramos como uma
estratégia viável para prevenir o abandono ao tratamento, pois, segundo MIS U (2015:21) “o
10
Caraciolo (2007: 69)
47
GAAC visa melhorar a retenção dos doentes em TARV, em situações de difícil acesso a
unidade sanitária”, além disso, no grupo “há compartilha e troca de experiências entre
usuários com vivencias que podem propiciar a vinculação e fortalecimento do apoio social
entre pares” (Brasil, 2008: 98).
De modo geral, o que os pacientes desejam é indispensável, útil e viável, visto que é
implementado pelos serviços de saúde do Hospital Rural de Chicuque, porém, mostra-se
insuficiente para prevenir o abandono ao tratamento antiretroviral, uma vez que o abandono
ainda prevalece naquela unidade sanitária, havendo a necessidade de se desenvolver mais
estratégias para reforçar as já existentes.
48
Conclusão
Após a apresentação, análise e interpretação de dados, concluímos que o abandono ao
tratamento antiretroviralno HRC é um problema grave e complexo, originado por variados
factores, tendo como principais: os socioculturais na ordem de (29%), os relacionados com o
tratamento vs relacionados com a doença com a mesma percentagem de (29%), seguidos
pelos relacionados com (14%), os relacionados com o tratamento com igual percentagem
(14%), os relacionados com os serviços de saúde na ordem de (7%) e por último os sócio-
demográficos, igualmente, com (7%). Esta realidade, exige que se desenvolva acções
interdisciplinares junto dos pacientes, famílias e profissionais de saúde com vista a prevenir o
abandono ao tratamento.
Em relação aos factores relacionados com a deficiência de organização dos serviços de saúde,
o mau atendimento causa o abandono ao tratamento visto que 7% dos pacientes alegam ter
sido mal atendido e, desta forma, fica confirmada a terceira hipótese: a deficiente organização
dos serviços de saúde contribui para o abandono ao tratamento antiretroviral.
Importa referir que ao longo da pesquisa, constatamos outros factores que favorecem o
abandono ao tratamento antiretroviral, nomeadamente: factores relacionados com a pessoa, e
factores relacionados com o tratamento. Nos factores relacionados com a pessoa, a não-
aceitação da doença é referida por 14% dos pacientes como motivo de abandono ao
tratamento antiretroviral, pois, fizeram mais de três testes de HIV depois de terem
conhecimento de que tem HIV porque achavam a doença como uma realidade absurda.
Quanto aos factores relacionados com o tratamento, os efeitos colaterais como tonturas,
náusea, vertigens, perturbações de sono, dificuldade de concentração são referidas por 14%
dos pacientes como motivos do abandono ao tratamento antiretroviral.
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