Você está na página 1de 36

Política africana no Brasil

Fernando Augusto Albuquerque Mourão


Henrique Altemani de Oliveira

Da ruptura à retomada das relações com o continente africano

O Brasil, um país sem passado colonialista, está desde longos séculos ligado
à África, continente que forneceu grande parte da sua população. As relações de pessoas
e bens entre os dois continentes foram contudo interrompidas no século XIX,quando
ocorreu uma ruptura de relações históricas entre os dois. É curioso assinalar que o
“primeiro soberano a reconhecer a independência brasileira” foi o Obá Osemwede do
Benin(Silva, 1989:26),além de registrarmos que “missões dos reis do Abomey,de Onin
e de Porto Novo tinham sido freqüentes durante o período colonial, pois era através da
Bahia, do Rio de Janeiro e do Recife que o Governo português mantinha o grosso de
suas relações não apenas com os Estados africanos, mas também com Angola”.(Silva,
1989:26).
O Tratado de Reconhecimento da Independência do Brasil por Portugal,
mediado pela Inglaterra,em 29 de agosto de 1825,que não permitia a adesão das colônias
portuguesas ao Brasil e a Convenção entre o Brasil e a Inglaterra (assinada em 23/11/
1826),que dava aos navios ingleses“o direito de visita aos barcos brasileiros e permitia
o apresamento daqueles que se dedicassem ao tráfico, sendo seus armadores
considerados piratas”(Silva, 1989:30), além de outros textos, como o Bill Aberdeen
de 1845,limitaram a ação brasileira no Atlântico Sul. No artigo 3.° do Tratado de Paz e
Aliança Luso-Brasileiro, lê-se “Sua Magestade Imperial promete não aceitar as
proposições de quaisquer colônias portuguesas para se reunirem ao Império do Brasil”.
A criação de consulados brasileiros em África foi também uma ação penosa.
“Ainda em 1850,Paulino José Soares de Souza, Ministro dos Negócios Estrangeiros,
reclamava contra os obstáculos que o governo português punha à admissão de agentes
consulares do Brasil nos portos de suas possessões ultramarinas abertos ao comércio

Centro de Estudos Africanos/ USP

309
o desafio geoestratégico

estrangeiro pela lei de 5 de junho de 1844”(Silva, 1989:52), problema que só veio a


ser parcialmente resolvido em 17 de março de 1854, embora sem maiores resultados
práticos.
A criação do Brazilian Quarter, em Lagos e do Quartier Brésil, em Ajuda,
são expressões de uma presença brasileira em terras de África, através da volta de ex-
escravos, que acabaram por tomar-se o núcleo inicial da burguesia yombana de Lagos
e do Dahomey.Do nosso ponto de vista, o comércio e a reprodução do modo de trabalho
foi fundamental para dar concretude ao segmento social dos brasileiros no espaço social
nigeriano(Mourão, 1987).
O Brasil, a seguir à independência, passa a tratar prioritariamente os
problemas de fronteiras, “(...) os interesses brasileiros se deslocaram,com nitidez, do
Oceano Atlântico para a Bacia do Prata e a política externa se regionaliza”(SILVA,
1989:32). Segue-se um longo período em que o Brasil passa a concentrar sua atenção
no campo da política exterior no processo de fixação de fronteiras, atendo-se ao princípio
da intangibilidade das fronteiras ao tempo colonial, princípio que, anos mais tarde,já
em nosso século, a Organização da Unidade Africana, em sua carta de maio de 1963,
adota. O Brasil, por sua vez,deu várias provas do seu pleno respeito ao princípio do uti
possidetisjuris, chegando mesmo a recusar proposta de anexação de territórios, como
por exemplo o Leste da Bolívia, quando do chamado conflito de Chiquitos.
A mptura do eixo Atlântico Sul,quer em relação a Angola,quer em relação
à chamada Costa da Mina,durou mais de um século e a reaproximação só vem a ocorrer
cerca de um século depois. Nesse período o Brasil, um país de população
predominantemente africana, passa a receber milhões de imigrantes europeus vindos
de vários países.
Antes da reaproximação emblemática que se deve a Jânio Quadros,cabe pôr
em relevo alguns fatos: no Governo de Getúlio Vargas foi assinado o Tratado de Amizade
e Consulta com Portugal, 1953, articulado por João Neves da Fontoura.
No Governo de Juscelino Kubitschek a África só aparece em função do
interesse pelo Norte de África, uma região estratégica no contexto da Segunda Guerra
Mundial.Em Tanger, desde os idos de 1861,já funcionava um consulado brasileiro. A
independência de mais de uma quinzena de países afncanos nào provocou gesto algum
por parte do Brasil, mais voltado para a Operação Pan-americana. Nesse período o Brasil
concorda com as teses francesas em relação à Argélia,que a considera como um território
ultramarino francês e não como uma colônia. A latinidade, aliada à política ocidental,
levou o Brasil a se abster, quando da votação do assunto. A Resolução n.® 1.573(XV
Sessão da ONU, 19 de dezembro de 1960), adotada por 63 votos contra oito, contou
com o Brasil entre as abstenções, 27. Esta resolução tratava do direito dos argelinos à
autodeterminação. A política de apoio à França prossegue na XVI Sessão da ONU(20
de dezembro de 1961),quando o Brasil se abstém novamentejuntamente com 37 países

310
Fernando Augusto A. Mourao /Henrique Aliemani de Oliveira

na votação da Resolução n.° i .724. que trata de uma solução negociada que levasse o
povo argelino à autodeterminação e independência e que obteve 62 votos a zero.
O Brasil vota favoravelmente aos textos relativos ao anti-colonialismo. mas
quando se trata de interesses de Portugal e da França é levado, pelo menos, a se abster,
em função das relações especiais com Portugal, consignadas no Tratado de Amizade e
Consulta, assinado em 1953 e complementado por seis acordos regulamentares,
subscritos pelo presidente Juscelino Kubitschek,em 1960. Já a Resolução n." 1.514(XV
Sessão da ONU, 14 de dezembro de 1960), que trata da Declaração de Outorga de
Independência aos Países e Povos Coloniais, obteve o voto favorável do Brasil, que
mostra assim a sua posição anti-colonialista. Vota também favoravelmente à Resolução
n.“ 1.541 que diz respeito à obrigação de oferecer informações por parte dos países
membros relativos aos territórios sem governo próprio, segundo o artigo 73 da Carta
das nações Unidas. Contudo, quando a resolução diz respeito às colônias portuguesas,
como no caso da Resolução n.® 1.542(15 de dezembro de 1960), que trata da obrigação
de Portugal fornecer informações sobre suas colônias, vota contra. O Brasil também
não só participou na elaboração de várias resoluções,como votou favoravelmente, numa
linha de inteira coerência, no que diz respeito à política de desenvolvimento para os
países subdesenvolvidos. Nossa posição na Comissão Econômica e Social foi sempre
presidida por uma linha de total coerência, desde a Resolução n.® 520(VI Sessão da
ONU, 12 de janeiro de 1952), até à atualidade. O Brasil tomou parte praticamente em
todas as medidas no sentido de encontrar soluções para o subdesenvolvimento,quer no
plano da América Latina, quer em relação ao mundo africano e asiático, fazendo
distinção entre medidas contra o subdesenvolvimento e posições terceiro-mundistas, que
envolviam a variável de luta anti-imperialista. No que toca à segregação, do ponto de
vista da raça, cor e religião, o Brasil, através do discurso do chanceler Horácio Lafer,
quando da abertura da XV Assembléia Geral das Nações Unidas (1960), solicitou a
inclusão do tema entre os assuntos a serem debatidos na XV Assembléia Geral. No plano
continental, a atenção do presidente Juscelino Kubilscheck estava virada para o
desenvolvimento do continente, através de vários mecanismos, tais como a Operação
Pan-americana - OPA.
Em dezembro de 1960,o imperador da Etiópia. Hailé Selassié,fez uma visita
ao Brasil. Para alguns autores, como Guy Martinière, essa visita “(...) dévait consacrer
le point de départ d’une poliíique africaine du Brésil, couronnant les premières initiatives
de la diplomatie brésilienne prise par le fondateur de Brasilia en direction du continent
noir, avaní de connaitre une impulsion véritable grâce aux initiatives de M. Quadros”.
(Martiniere, s.d.: 1 lObis).
Com o curto Governo de Jânio Quadros surge uma estratégia política global
para África. Jânio, que já havia abordado o problema das relações com África durante
a sua campanha eleitoral, afirma em 31 de janeiro de 1961: “Atravessamos horas das

311
o desafio geoestratégico

mais conturbadas que a humanidade já conlieceu. O colonialismo agoniza,envergonhado


de si mesmo, incapaz de salvar os dramas e as contradições que engendrou”(Voz do
Brasil). Segundo Afonso Arinos,deve-se a Jânio a mudança política externa brasileira.
No discurso de posse como chanceler, Afonso Arinos declarou: “O Brasil se encontra
em situação especialmente favorável para servir de elo ou de traço de união entre o mundo
afro-asiático e as grandes potências ocidentais(...)Portanto,o exercício legítimo de nossa
soberania nos levará, na política internacional, a apoiar sinceramente os esforços do
mundo afro-asiático pela democracia e liberdade”(Discurso, Ministério das relações
Exteriores, s.d.: 11-2).
Em relação ao continente africano, Jânio afirmava: “Com relação à África,
podemos afirmar que, hoje, esse reconhecimento representa uma nova dimensão da
política brasileira. Estamos ligados ao mundo africano por nossas raízes étnicas e
culturais, além de coincidir-mos no desejo de tomar possível assumirmos uma posição
independente no mundo atual”(Quadros, 1978: 75).
Jânio Quadros, a quem se deve a abertura das embaixadas em Acra (Gana),
Lagos(Nigéria), Nairobi(Quênia)e Dakar(Senegal),além de outras medidas de caráter
prático, como o da concessão de bolsas de estudo a estudantes africanos e o início de
estudos visando ao estabelecimento de rotas marítimas para o continente africano, foi,
sem dúvida, o responsável pelo estabelecimento de um novo perfil nas relações
diplomáticas com África. Já em março de 1961,0 chanceler Afonso Arinos entregava
ao Presidente Quadros um relatório referente à nova política brasileira com relação ao
continente africano. No que toca ao café, em que os países e colônias africanas eram
apresentados sistematicamente como concorrentes, constatamos que, a partir da
Declaração do Rio de Janeiro(julho de 1961)-uma convenção celebrada entre o Brasil
e a Organização Interafricana do Café em matéria de estabilização dc preços interna
cionais -,cstabeleceram-se politicas de cooperação,principalmente em matéria de preços
básicos. O navio escola “Custódio de Melo” chegou a abrigar uma exposição de produtos
brasileiros que foram dados à mostra em vários portos africanos.
Jânio Quadros pautou-se por duas orientações políticas; “a orientação de
nosso país decorre, de um lado, da fimie posição anticolonialista do Governo,e, de outro,
dos compromissos internacionais e dos vinculos de natureza especialíssima que unem
0 Brasil a Portugal”(Apud Rodrigues, 1982:406), o que leva o Brasil a uma política de
abstenções nas Nações Unidas em relação ao problema das colônias portuguesas. Note-
se que a viagem do chanceler Afonso Arinos a Lisboa(abril de 1961)compreendia uma
viagem a Dakar, num quadro que acreditamos revelaruma política de aproximação com
os estados africanos já independentes, concomitantemente com as relações especiais
com Portugal. A abertura com África deu-se fimdamentalmente em relação aos países
já com independência declarada, como que aguardando o compasso de espera no que
toca às colônias portuguesas. Note-se que entre os primeiros bolsistas africanos trazidos

312
Fernando Augusto A. Mourão /Henrique Altemani de Oliveira

para o Brasil pelo presidente Quadros figuravam alguns refugiados políticos em Dakar,
provenientes da Guiné e de Cabo Verde, entre eles Fidelis Cabral de Almada que,com
a independência da Guiné-Bissau passou a ocupar diversas posições ministeriais em seu
país. Quadros parecia acreditar na possibilidade de uma mudança de posição portuguesa
ou na possibilidade de a influenciar, procurando, ao mesmo tempo, expandir o seu
relacionamento com a África independente.
No período Jânio Quadros se registram ainda algumas pequenas missões de
prospecção, como a do deputado Coelho de Souza, que visitou vários países: Guiné,
Costa do Marfim, Gana, Nigéria e Camerum. Desta viagem resultou um volumoso
relatório que foi encaminhado ao chanceler.
A nova política externa de Jânio Quadros, principalmeníe no que toca às
relações com Cuba e países socialistas, levou ao surgimento de uma forte reação
conservadora no plano interno, ao que se acrescenta a tomada de posição da colônia
portuguesa no Brasil, estabelecendo uma série de alianças destinadas a neutralizar as
iniciativas no que se refere às colônias portuguesas em África. O posicionamento em
relação ao conflito ideológico Leste-Oeste acarretou críticas no plano das relações com
0 continente africano. “As condições de permissibilidade da política externa
independente nao eram, no entanto, consideráveis. No campo estratégico-mililar, os
limites eram dados por uma ordem mundial, naquela época ainda muito condicionada
pelas relações leste/oeste’'(Lafer, 1988:61). No âmbito das Nações Unidas se registram,
comojá vimos, as abstenções no caso da Argélia e de Angola. No campo econômico o
Brasil continua a manifestar posições coerentes no que toca a preços de produtos de
base, industrializados e de medidas em geral contra o subdesenvolvimento, quer no
âmbito das nações Unidas, quer no de fóruns especiais.
O apoio à emancipação dos territórios não autônomos, qualquer que seja a
fórmula utilizada em relação à dependência das metrópoles, segundo Santiago Dantas,
era um dos pontos da chamada Política Externa Independente. Santiago Dantas fez
esforços no sentido de convencer as autoridades de Lisboa a mudarem de posição em
relação às colônias e a encontrar uma via de solução pacífica,com a qual o Brasil podería
colaborar. O Brasil,em pleno regime parlamentar, vota nas nações Unidas em favor do
projeto de Resolução n.® 1.742(30 de Janeiro de 1962), com ressalvas, que prevê a
criação de um Comitê para obter informações sobre a situação dos territórios sob a
administração de Lisboa, caso Portugal não obedecesse ao estipulado na Resolução n.®
1,542. Santiago Dantas, no decurso de uma viagem à Europa, passou por Lisboa, onde
o Ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, Franco Nogueira, lhe fez saber do
interesse de Portugal em alargar o Tratado de Amizade e Consulta às colônias, permitindo
a abertura de portas comerciais para os produtos brasileiros em África. Santiago Dantas
teria permanecido fiel à tese de que o Brasil nao abandonaria seus princípios antico-
lonialistas, embora admitisse a manutenção da iniluência portuguesa em relação aos

313
o desafio geoestratégico

territórios coloniais. Apesar de alguns votos favoráveis a Portugal a nível da Assembléia


Gerai das nações Unidas, o Brasil toma uma posição firme no plano do Conselho de
Segurança, votando a favor da Resolução S/5380, a qual considerava a política
portuguesa uma ameaça à paz e à segurança no continente africano,solicitando a Portugal
conferir o direito à independência das colônias.
É curioso assinalar as divergências de texto nas duas versões da Mensagem
ao Congresso Nacional, enviadas por João Goulart, quando da abertura da Sessão
Legislativa de 1963, em cuja primeira versão lê-se: Temos reconhecido e
continuaremos a reconhecer o direito à independência de todos os povos coloniais e a
obrigação das Potências administrantes de acelerarem os preparativos para a
autodeterminação e a independência, inclusive de Angola e demais territórios
ultramarinos de Portugal bem como do Sudoeste Africano Na segunda versão, a
pedido do chanceler Hennes de Lima(Abreu, 1988: 29), foi omitida a parte relativa às
colônias portuguesas e ao Sudoeste Africano. Segundo José Honório Rodrigues, “A
fraqueza do ministro, muito influenciado pelo Embaixador Negrão de Lima e muito
sensível aos seus laços portugueses(?), provocou o maior entusiasmo em Portugal,onde
se noticiou em manchetes que a frase hostil introduzida abusivamente provocara uma
explicação do Governo brasileiro”(Rodrigues, 1982; 424).
“Em concluso,o Biasil apaixonou-se pela liberdade africana, pensou em estar
a seu lado nesta hora, imaginou uma política africana de cooperação e amizade e o
Presidente Jânio Quadros teve os primeiros gestos, as primeiras palavras, as primeiras
iniciativas. O Ministro Afonso Arinos acreditou numa vocação africana do Brasil, que
servisse de elo entre o Ocidente e a África,e pôs à disposição desta obra a sua inteligência
e combatividade; enfrentou, com dignidade, a crítica violenta, injusta, impiedosa, e
ajudou a formular, com o presidente, as primeiras linhas desta política. Na Mensagem
de Jânio Quadros,que teve a sua colaboração, a primeira e única que realmente esboçou
um pequeno plano de ação, reconheceu-se que o Brasil tinha uma irrecusável dívida
com o povo africano e que, além dessa razão moral, uma África próspera e estável era
condição essencial para a segurança e desenvolvimento do Brasil. Os sete meses de
ambos não deram oportunidade para mais. Sua fraqueza consistiu na vacilação no caso
de Angola e na consulta a Lisboa. A força do Ministro Santiago Dantas foi exatamente
ter tomado a decisão de não acompanhar mais a política africana de Portugal, nem buscar
0 conselho de Lisboa,e coube a Afonso Arinos, então nas Nações Unidas,executar suas
instruções”(Rodrigues, 1982:427-8).
Embora concordemos em linhas gerais com José Honório Rodrigues e
também com a sua idéia de que o Brasil, tendo em vista a composição racial de sua
população, estaria bem situado para desenvolver a Política Externa Independente,
parece-nos que temos de ver a Política Externa mais como um processo lento que reflete
não só as condições internacionais como as condições internas. É necessário levar em

314
Fernando Augusto A. Mourão /Henrique Ahemani de Oliveira

conta que o Brasil se afastara do continente africano por mais de um século e que o
conhecimento da realidade africana, de suas culturas, é relativamente recente no Brasil,
bastando para tanto recorrer à evolução da bibliografia afro-brasileira. Os estudos sobre
0 negro brasileiro só se iniciam no princípio do nosso século e as referências ao mundo
cultural africano, à sociedade africana,são recentíssimas. Não havia, portanto, um clima
de conhecimento sobre África. Com a entrada de milhões de imigrantes europeus, na
segunda metade do século XIX, reforçou-se a idéia de que o Brasil era um país
essencialmente ocidental, tanto que o presidente Jânio Quadros, pelo Decreto n.° 54.465,
de 14 de abril de 1961, criou o Instituto Brasileiro de Estudos Afro-Asiáticos(IBEAA),
com o objetivo de estudar as realidades e de editar obras sobre o mundo afro-asiático.
além de reunir intelectuais brasileiros interessados no assunto. Esse instituto, que cessa
as suas atividades em 1964, chegou a editar 34 obras, além de numerosas publicações
avulsas,tendo organizado vários seminários e debates. Em 1959 surge na Bahia o Centro
de Estudos Afro-Orientais(CEAO): em 1963 surge em São Paulo o Centro de Estudos
e Cultura Africana(CECA), transformado em 1968 em Centro de Estudos Africanos
(CEA),integrado à Universidade de São Paulo e,finalmente,em 1973, é criado no Rio
de Janeiro o Centro de Estudos Afro-Asiáticos(CEAA).Como vemos,o interesse pelos
estudos africanos é de recente data no Brasil.
O embaixador Saraiva Guerreiro, em entrevista que nos concedeu, admitiu
que 0 conhecimento de África entre os diplomatas decorreu,em boa parte, do convívio
com diplomatas africanos nas nações Unidas.
A sociedade brasileira estava e, de certo modo, está ainda distanciada do
continente africano sob os mais variados pontos de vista, o que leva, como é natural, a
não revelar um interesse claro. Na verdade, a aproximação com África, ou melhor, a
reaproximaçào deu-se ao longo de um processo, com momentos emblemáticos, como
foi 0 caso do período da presidência Jânio Quadros. O período da chamada Política
Externa Independente cobre abusivamente, a nosso ver. um período(janeiro de 1961 a
março de 1964), durante o qual surgiram estilos diferentes na condução da política
exterior. Se a Política Externa Independente aproximou o Brasil das teses terceiro-
mundistas,sem que o Brasil tivesse uma postura terceiro-mundista, mas sim de um país
englobado no Terceiro Mundo, a política exterior articulada pelo embaixador João
Augusto de Araújo Castro, a política dos 3 D (desarmamento, desenvolvimento e
descolonização, XVII Assembléia Geral da ONU),permitiu um aprofundamento global
a nível do sistema internacional, na perspectiva da emergência de um mundo multipolar,
em que o Brasil podería fazer parte de um novo centro, aumentando suas responsabili
dades internacionais. Por exemplo, no campo do desenvolvimento, o Brasil tomou
posições claras e extremamente coerentes que o aproximaram da África, da Ásia e
reforçaram a aproximação no plano sul-americano. O Brasil tende a apresentar-se como
uma potência média no cenário internacional, reflexo do seu desenvolvimento e do desejo

315
o desafio geoestratégico

de ter uma posição internacional mais nítida(Selcher, 1974).Por oposição,surgem outras


teses como a do sub-imperialismo, que atrelam o Brasil aos EUA, e que o tempo se
encarregou de desmentir. A primeira tese aproxima-se, de certo modo, com algumas
posições da geoestratégia.
Aproximando-se da concepção do multipolarismo,podemos pensar o Brasil
como um país ocidental que procura uma certa margem de autonomia na formulação
de sua política externa, dentro dos limites da margem de segurança do sistema ocidental
(Peixoto, 1985), ao que nos permitimos acrescentar a sua inserção no Terceiro Mundo
e forte influência africana nas origens de sua população.
A tese do sub-imperialismo aponta para o econômico,como motor das novas
aproximações,quando,na verdade,a aproximação com os novos estados africanos foi,
sem dúvida, um ato mais de natureza política.
“L’attitude brésilienne à 1’égard de TAfrique est ainsi trés intéressante à
examiner. Elle montre comment une politique spécifique en direction d’une partie du
monde peut être utilisée pour affirmer I'indépendance politique et améliorer la position
internationale du pays qui la pratique, en plus de renforcer le processus interne de
développement”(Abreu, 1988:5).
Comojá tivemos ocasião de verificar, a aproximação com o continente afri
cano ocorreu por etapas. Apesar das origens africanas do Brasil, a interrupção de relações
com o continente africano durante um século aproximadamente e a fixação dos interesses
brasileiros em outras áreas, nomeadamente na Bacia do Prata, levou, de certo modo. a
uma ruptura. A reaproximaçâo,que ocorreu num contexto de dificuldades, quer internas,
quer externas, deu-se a partir de países africanos de expressão inglesa e francesa, o que
permitiu um certo aprendizado na condução dessas relações, até que, finalmente,
abrangeu os países de expressão portuguesa,

Período 1964-1990

Em decorrência do golpe militar de março de 1964 e com o advento do


governo do Marechal Castello Branco, a política externa brasileira sofreu profundas
modificações. A perspectiva multipolar é abandonada em favor de uma visão bipolar
do sistema internacional, dando-se ênfase à interdependência. Ao tratar do item “a
política de independência”, no discurso pronunciado em 1964, no Itamaraty, quando
da fonnatura dos novos diplomatas,o Marechal Castello Branco afirmou:“Trata-se de
um objetivo c não de um método. No presente contexto de uma confrontação do poder
bipolar, com radicai divórcio político-idcológico entre os dois respectivos centros, a
preservação da independência pressupõe a aceitação de um certo grau de interdepen
dência, quer no campo militar, quer no econômico, quer no político”(Castello Branco,

316
Fernando Augusto A. Mourão /Henrique Alíemani de Oliveira

1964). No que toca aos Objetivos Nacionais, continuava Castello Branco “(●●●) A
consistência entre todos os objetivos nacionais só pode ocorrer se houver
autodeterminação (...) sem interferência externa, qualquer que seja sua posição geo
gráfica em relação aos atuais centros de poder e ideologia”. Em relação ao mundo
Ocidental, o presidente afirmava: “No caso brasileiro, a política externa não pode
esquecer que fizemos uma opção básica, da qual decorre uma fidelidade cultural e
política ao sistema democrático (...) o interesse do Brasil coincide, em muitos casos,
em círculos concêntricos, com o da América Latina, do Continente Americano e da
comunidade ocidental”. Em relação ao neutralismo, acusava-o de passividade,
indeterminação, emotividade imatura, extorsão internacional e como uma fuga à
realidade. A diplomacia, para Castello Branco, “(...) deve ser também um instrumento
destinado a caixear recursos para o nosso desenvolvimento econômico e social como
meio de fortalecimento do poder nacional”.
Embora o Marechal Castello Branco tenha, de certo modo, criticado o colo
nialismo, principalmente no que se refere à necessidade do “desaparecimento de
situações de exploração econômica de certas matérias-primas pelas metrópoles, colo
cando-nos em desvantagem no mercado mundial”, levava em linha de conta que a “nossa
política aníicolonial se defronta com o problema dos laços afetivos e políticos que nos
unem a Portugal.” Castello Branco chegou a defender a idéia da constituição de uma
comunidade Aífo-Luso-Brasileira, “talvez a solução residisse na formação gradual de
uma comunidade Affo-Luso-brasileira, em que a presença brasileira fortificasse econo
micamente o sistema.” E acrescentou: “Qualquer política realista de descolonização não
pode desconhecer nem o problema específico de Portugal, nem os perigos de um desen-
gajamento prematuro do Ocidente.”
Mantiveram-se relações normais com os novos países africanos, mas a política
em prol de Portugal levantou algumas críticas por parte do presidente Senghor, do
Senegal, quando de sua visita ao Brasil em setembro de 1964; ele considerava pouco
realistas as posições de Castello Branco. Senghor chegou a propor a mediação brasileira
entre Portugal e as colônias.
Apesar das boas relações com a África do Sul, do incremento de trocas
comerciais que ocorreu, o Brasil vota a favor da Resolução 2202A (XIX Assembléia
Geral da ONU), que previa o desencorajamento do estabelecimento de relações
econômicas e financeiras com esse país.
Durante o mandato de Castello Branco foram realizadas duas missões de
promoção comercial no continente africano, respectivamente em 1965 e 1966.
A política externa brasileira dos governos militares, no que toca ao continente
africano, sofreu modificações apesar de, como afirma Oliveiros Ferreira, “A política
externa brasileira nunca fugiu, nos dez anos de Castello a Geisel, de algumas constantes
básicas. Sua origem é comum: militar: sua fonte, comum: seguramente os estudos do

317
o desafio geoestratégico

Conselho de Segurança Nacional: seus fins, os mesmos: construir, com a aceleração


possível, um Poder Nacional que faça do Brasil uma potência ouvida no concerto dos
fortes e respeitada naquele dos fracos (Ferreira, 1974). A posição de Oliveiros
Ferreira é criticada por Carlos Estevam Martins,que defende a idéia de que “no período
Castello Branco a política externa tem como seu principal fundamento os interesses
virtuais da burguesia internacionalizada (...) no período Costa e Silva a política externa
tem como seu principal fundamento os interesses virtuais da burguesia nacional (...) no
período Médice a política externa tem como seu principal fundamento os interesses
virtuais da burguesia estatal (...).”(Martins, 1975: 57-8).
Já no Governo Costa e Silva a perspectiva do bipolarismo, graças à evolução
do sistema internacional, é bastante atenuada. O tema do desenvolvimento, aliado ao
da segurança, passa a ser incrementado. As relações Sul-Sul passam,igualmente,a fazer
parte dos projetos. O Brasil reage contra “a dominação econômica e o monopólio da
técnica”(discurso de abertura da XXIV Assembléia Geral das nações Unidas, 1969).
O desejo de se incrementar novas relações com os países africanos já
independentes levou à abertura de uma embaixada em Abidjan (Costa do Marfim) e
outra em Kinshasa (Zaire), aumentando a presença diplomática no continente africano.
A chamada “diplomacia da prosperidade” contribuiu igualmente para o aumento do
comércio entre o Brasil e os países africanos, inclusive com a África do Sul, além do
estabelecimento,por parte da companhia aérea da África do Sul,a South África Airways,
de uma linha semanal. O ministro sul-africano das relações exteriores, Muller, que
participou do vôo inaugural dessa linha lançou, no Rio de Janeiro, a idéia de um “Pacto
de Defesa do Atlântico Sul”, demonstrando uma certa inquietude com a presença de
barcos soviéticos no Atlântico Sul. Esta proposta foi também apoiada por Portugal. O
presidente Costa e Silva, apesar da sua simpatia por Portugal, não deu seguimento oficial
à proposta. Guy Martinière, um cientista político francês que estudou as relações entre
0 Brasil e a África, afirma: “Ainsi les relations militaires et économiques de Brasilia
avaient été toutes dux poussés jusq’au point le plus avancé qui lui permeltaient leurs
sympathies communes dans le cadre de la ‘securité’ et du ‘développement’ du monde
occidentale sans intégrer intièrement le Brésil à la cause défendue par le Portugal et
TAfrique du Sud. Car le Brésil se gardait bien d'un engagement trop exclusifsusceptible
de provoquer une rupture avec cette Afrique nouvelle dont les espérances tiers-mondistes
avaient trouvé ses fondements dans la décolonisation et la lutte contre le racisme.”
(Martiniere, s.d.: 344-5).
As relações com Portugal são pontuadas com a visita do primeiro ministro
português. Marcello Caetano, ao Brasil, entre 8 e 12 de julho de 1969 e pela viagem do
chanceler brasileiro Magalhães Pinto, em 10 de outubro de 1969, ocasiões em que foram
tratados vários assuntos no quadro da amizade luso-brasileira. Marcello Caetano,quando
de sua visita, relançou a idéia de um Pacto de Defesa do Atlântico Sul, sugerindo; um

318
Fernando Augusto A. Mourão /Henrique Alíemani de Oliveira

oceano afro-luso-americano”. Propôs, ainda, uma série de colaborações, não só do


domínio cultural, mas também no campo econômico,financeiro e comercial. No plano
do comércio, uma missão brasileira chegou a visitar a África do Sul e Moçambique.
Durante a gesto do presidente Costa e Silva foram assinados dois tratados com países
africanos, enquanto que o antecessor, Castello Branco, assinou quatro.
A par de uma política que privilegiava as relações com Portugal, no quadro
da comunidade luso-brasileira, Costa e Silva manteve o relacionamento diplomático com
asjovens nações africanas, continuando a dar ênfase à África Austral,seguindo a política
do presidente anterior a este respeito. Países africanos acreditados em Brasília, por seu
turno, fizeram pressão sobre o governo brasileiro, como quando, por exemplo, os
embaixadores da Argélia, do Senegal, de Gana e o encarregado de negócios da R.A.U.
(Egito), logo em seguida à visita de Costa e Silva a Lisboa, Fizeram uma visita conjunta
ao Itamaraty a fim de demonstrar seu desagrado face ao problema das colônias
portuguesas e de possíveis acordos assinados ou a serem assinados com Portugal.
Durante a gesto de Magalhães Pinto, pela portaria num.282,de 8 de dezembro
de 1969, foi executada uma reforma dos órgãos de administração do Itamaraty, sendo
criado um Secretariado Geral Adjunto para Assuntos da África e Oriente Próximo, di
vidido em duas divisões: a Divisão da África e a Divisão do Oriente Próximo (Castro,
1983: 469), desdobrada da antiga Secretaria Geral Adjunta para Assuntos da Europa
Ocidental e da África, que contemplava uma Divisão para África(DAF)(Castro, 1983:
430).
No Governo do general Emílio Garrastazu Médici, o presidente,falando na
cerimônia da entrega de diplomas do Instituto Rio Branco, abril de 1970, enfatizou o
lado “independente” da política exterior. Os elevados índices de crescimento nacional
permitiram,de certo modo,seguir uma “diplomacia do interesse nacional”. No período
do general Médici foram assinados cerca de 30 tratados com países africanos, número
superior aos tratados assinados no período Geisel, cerca de 22. Contudo, as relações
privilegiadas com Portugal foram mantidas,assim como os fluxos comerciais em relação
à África do Sul,embora o Brasil tenha continuado a posicionar-se contra o “apartheid”.
Em relação à Rodésia, sob o regime de lan Smith - os brancos haviam proclamado a
independência unilateral em relação à Inglaterra, mostrando que os interesses do país
colonizador nem sempre coincidem com os dos colonizadores-,o Brasil seguiu a política
dos países afícanosjá independentes,considerando, também,esse regime como ilegal.
A mesma política foi seguida em relação ao problema do Sudoeste Africano(Namíbia).
A par das elevadas taxas de comércio, o Brasil recebeu também capitais
privados da África do Sul. Para o chanceler Gibson Barbosa, a suspensão do comércio
com a África do Sul iria contribuir para o “agravamento e endurecimento do apartheid”.
Em relação à África portuguesa, registra-se a posição do Ministério da
Fazenda,quando Ministro Delfim Neto.O encarregado dos assuntos internacionais de seu

319
o desafio geoeslratégico

ministério, Villar de Queiroz,defendia que as medidas tomadas em acordo comPortugal


destinavam-se a conduzir a uma presença brasileira na África portuguesa. Segundo Guy
Martinière “(...)aux yeux de la diplomatie brésilienne qui préparait activement,pour cette
même fin de 1’année 1972,le voyage de M. Barbosa en Afrique Noire Occidentale, une
semblable analyse ne présentait aucune contradiction: Ia pénétration de 1'influence
politique économique et culturelle du Brésil sur le continent africainpassait d'abord par
Luanda et Lourenço Marques.”(Martiniere, 1978: 15). Do ponto de vista de Carlos
Estevam Martins, o fato citado apresentava outra interpretação: “Entre os obstáculos
internos a uma maior aproximação com os países africanos cabe mencionar,por um lado,
a resistência oferecida pelas empresas estrangeiras inclinadas a tratar os mercados da
África como reservas de suas respectivas matrizes e, por outro lado, o difícil dilema
surgido no interior da burocracia, por volta de 1970,sobre a questão das prioridades no
processo de penetração brasileira, uma vez que o Ministério da Fazenda inclinava-se pela
África portuguesa e o Itamaraty, cujas teses acabaram por prevalecer, pelos países
independentes da região.”(Martins, 1975:95). O ministro Delfim Neto chegou a assinar
um acordo com o ministro português Dias Rosas com o objetivo de instalar entrepostos
comerciais brasileiros não só em Lisboa,como nos territórios africanos: Luanda,Lobito,
Beira e Lourenço Marques(Maputo),complementando o acordo assinado em Lisboa a
17 de julho de 1970, pelo ministro Gibson Barbosa, que previa a possibilidade de
investimentos brasileiros nos territórios coloniais de Portugal. Nas Nações Unidas, no
decorrer da XXVI Assembléia Geral,o Brasil apoia Portugal no caso da Resolução votada
em 14 de novembro de 1972 que considerava como autênticos representantes os
movimentos de libertação de Angola,Guiné-Bissau e Moçambique.
Em 1971 surgiu um fato de grande importância no campo das relações entre
Portugal e o Brasil. Trata-se da assinatura, pelo chanceler Gibson Barbosa,em setembro
desse mesmo ano, de uma convenção alargando os direitos civis e políticos, em termos
de igualdade, dos cidadãos de ambos os países.
A chamada política diplomática das “mãos livres” assentava no discurso
presidencial de 20 de abril de 1970 que, segundo Gibson Barbosa (Jornal do Brasil de
15 de outubro de 1972) previa:
1) “O Brasil pleiteia a mudança das regras de convivência internacional, é contra a
cristalização de posições de poder e “se recusa a crer que a história se desenrole
necessariamente em benefício de uns e em prejuízo de outros” países;
2) à medida que um país cresce, aumentam as dimensões de seus interesses externos e,
em conseqüência, sua participação e suas responsabilidades nas relações
internacionais;
3) cabe-nos, assim, dentro da comunidade internacional, parcela de decisão cada vez
maior e não devemos deixar de usá-la em favor dos povos que,como o nosso,aspiram
ao progresso;

320
Fernando Augusto A. Mourão /Henrique Altemani de Oliveira

4) a verdadeira paz não pode ser identificada como a simples manutenção do status
quo,como resultante do equilíbrio do poder, nem ser “instrumento da ampliação da
distância que separa as nações ricas das nações pobres”, implica, ao contrário,
mudanças das regras do comércio internacional e alteração do mecanismo de
distribuição mundial do progresso científico e tecnológico: não há verdadeira paz
sem desenvolvimento;
5) nossa posição é, portanto, “de ativa solidariedade com os países em desenvolvi
mento”,competindo “à nossa diplomacia estreitar o entendimento com os povos que
travam conosco a dura batalha” do progresso;
6) nossa política externa deve ser globalista e de íntima cooperação com os países em
desenvolvimento e de intenso diálogo com os países desenvolvidos; deve estar à
altura do momento histórico que vive o Brasil e das profundas transformações
ocorridas nos últimos 25 anos no panorama mundial,com o surgimento de numerosos
Estados, que conferiram “nova dimensão à comunidade internacional”, pois,“em
nossos dias, pela primeira vez na evolução humana, vê-se que a História não mais
se faz em continentes ou áreas estanques, mas se projeta, ao contrário, como a
realização coletiva de toda a humanidade”
Com o objetivo de consolidar as relações com asjovens nações africanas, o
chanceler Gibson Barbosa, acompanhado dc uma grande comitiva de que faziam parte
entre outros Wladimir Murtinho (Departamento de África e Oriente Próximo), Paulo
Tarso Flexa de Lima(Promoção Comercial), Ronaldo Costa(Assuntos Econômicos),
André Teixeira de Mesquita (Protocolo), Rubens Ricupero (Departamento Cultural).
Alarico da Silveira(Imprensa), Alberto da Costa e Silva, entre outros, de 25 de outubro
a 22 de novembro de 1972, visitou nove países africanos da costa Ocidental: Costa do
Marfim, Gana, Nigéria, Gabão, Camerum, Dahomey,Togo, Zaire e Senegal, país em
que terminou a visita, coincidindo com a presença de uma ‘comissão mista Brasil-
Senegal,que tratava das relações culturais. Esta viagem,que cobriu mais de 20.000 km,
tendo 0 chanceler Gibson Barbosa pronunciado cerca de 80 discursos, passou a ser citada
emblematicamente como um momento de aproximação com os países africanos
francofones e anglofones da Costa Ocidental e ainda o Zaire, vizinho de Angola, onde
havia sido estabelecida uma nova embaixada. A esta viagem seguiu-se, em 1973, uma
missão comercial organizada pela Câmara de Comércio Afro-brasileira, que visitou nove
países.
A viagem de Gibson Barbosa abria um intenso diálogo com os países
africanos, mas “le nouveau dialogue avec TAfrique indépendent s’ouvrait sous une
condition expresse: le Brésil ne remetíait pas en cause son alliance privilégiée avec
Lisbonne. Si le Brésil ne classait plus lesjeunes nations d’Afrique soutenant peu ou prou
les forces de libération des territoires portugais parmi les éléments révolutionaires d’un
tiers-monde potentiellement destructeur du monde Occidental comme il avait eu tendence

321
o desafio geoestraiégico

à le faire de 1964 a 1969, les pays de TAfrique devaient bien comprendre, en échange,
que Tamitié luso-brésilienne ne soufrait aucune contestation”(Abreu, 1988: 57). Para
Guy Martinière, “en dépit de divergences aigues qu’il ne cacahait d'ailleurs pas,
notamment à propos de 1’attitude du Brésil envers la politique coloniale du Portugal, le
ministre brésilien des Relations Extérieures aspirait à trouver une langage commun avec
TAfrique (...) Comme le Brésil n’aspirait aucunement à remettre en cause les liens
privilégies de 1’Afrique et des anciennes métropoles européennes qui retlétaient les
formes de sa propre intégration à la communauté Internationale, les pays de T Afrique
ne devaient pas non plus chercher à remettre en cause l’amitié luso-brésilienne et le
dialogue alors, mais alors seulement, pourrait être effectivement fécond.”(Martiniere,
1978: 22). Por sua vez Wayne A. Selcher afirma: “The year 1972 was picked for a
decisive campaign to win a share of African market for Brazilian manufactures, utilizing
trade missions and an official tour by Foreign Minister Gibson Barbosa and a highranking
commercial retinue to West África and Zaire to propose facilities,fmances,and technical
aid. The govemment expects Afro-Asian acceptance of its compaign.”(Selcher, 1974:
95).
Do nosso ponto de vista, os autores precedentes descartaram a motivação
política brasileira de se aproximar do continente africano, com conseqüências externas
e internas. Do ponto de vista externo, o chanceler Gibson Barbosa ouviu da parte de
numerosos estadistas africanos uma solicitação para que o Brasil abandonasse a sua
tradicional posição de privilegiar as relações com Lisboa,o que do ponto de vista interno
foi importante no sentido dessa modificação, ou melhor, de se criar um clima favorável
às mudanças que vieram mais tarde. A Nigéria, Gana,o Senegal, o Camerum e mesmo
o Zaire,entre outros,fizeram saber ao chanceler Gibson Barbosa das dificuldades com
que viam o Brasil face à sua posição em relação às colônias portuguesas. Por outro lado,
0Brasil passa a melhor conhecer a África e as suas aspirações, fortalecendo um contato
diplomático direto com as novas nações africanas.
Cerca de 17 acordos bilaterais foram assinados entre o Brasil e os 9 países
visitados pelo chanceler Gibson Barbosa, nos campos da cooperação técnica, comercial
e cultural. Só com a Costa do Marfim foram negociados quatro acordos. O Brasil também
passou a participar do Banco Africano de Desenvolvimento(BAD). Assinou,também,
acordos com a Algéria, no campo do petróleo e contratos com a Líbia.
As portas estavam abertas a uma maior aproximação entre o Brasil e asjovens
nações africanas, “mais le grand dessein de M. Gibson Barbosa, réconcilicr le tiers-
monde avec 1’occident pour assurer au Brésil une place importante dans une nouvelle
politique mondiale, ne pouvait certainement pas se réalizer avec la seule affínnation
d'une ‘neutralité active’.”(Abreu, 1988: 60).
Finalmente,com o Governo do presidente Ernesto Geisel, as relações com o
continente africano sofreram um aprofundamento, principalmente no que toca ao

322
Fernando Augusto A. Mourão /Henrique Altemani de Oliveira

problema das colônias portuguesas. O chefe do Departamento de África, Ásia e Oceania,


embaixador Ítalo Zappa, visitou o continente africano, onde se encontrou com vários
líderes dos movimentos nacionalistas das colônias portuguesas. Essas conversações
foram, de certo modo, a primeira porta para uma aproximação entre os atores. O
reconhecimento da Guiné-Bissau, em 18 de julho de 1974,foi o primeiro ato dessa nova
política, 0 que causou um ceito mal estar em Lisboa.
O reconhecimento da independência da Guiné-Bissau, antecipando-se a um
possível gesto de Portugal em “conceder” independência àquela antiga colônia em
África, praticado pelo Brasil, provocou algumas reações. O chanceler português, Mário
Soares, em entrevista aojornalista Hermano Alves, correspondente de “O Estado de S.
Paulo”, depois de afirmar que como ministro de Estado compreende “plenamente a
posição brasileira”, Mário Soares acrescentou: “Lamento, apenas,que à luz do Tratado
de Amizade e Consulta,em vigor,o governo brasileiro não tenha dado uma infonnação
prévia ao governo português. Mas creio que tal fato não tem gravidade extraordinária.”
(OESP, 27/7/74).
O chanceler Antonio Francisco Azeredo da Silveira visitou Dakar, onde
manteve importantes conversações com o governo do Senegal, reforçando as
Aproximações com a África Ocidental.
No discurso de Geisel de 30 de dezembro de 1974, o presidente da República
deu ênfase à necessidade de reajustamentos imperativos na política externa brasileira.
Abria-se uma nova política com as “nações irmãs do continente africano”,
dando-se início a uma série de atividades diplomáticas em relação à África Austral. No
contexto geral, a crise do petróleo de 1973 havia impulsionado o Brasil a uma aproxi
mação com os países árabes que, por sua vez, se aproximaram dos países africanos,
surgindo uma ameaça de boicote à exportação de petróleo para a África do Sul,inclusive
a Portugal,face à sua política colonialista. As críticas ao Brasil surgiam através de atos
concretos,como,por exemplo,o apoio dado pelos africanos à Argentina na disputa rela
tiva ao projeto de Itaipu e a inclusão do Brasil no rol de países que deveríam sofrer
sanções econômicas, medida proposta por um grupo de países afrícanos da África Central
e Oriental.
É nesta perspectiva que surge uma política emblematicamente designada de
pragmatismo responsável e ecumênico.Do nosso ponto de vista, preferimos analisar as
mudanças numa perspectiva de processo mais amplo ao longo do tempo. Para nós, a
aproximação com os países africanos já independentes foi o primeiro passo desse
processo, que culminou com a aproximação em relação à África Austral, ou melhor,
uma mudança de sinal em relação a esta.
As viagens do chanceler Azeredo da Silveira a Dakar e a Lisboa,assim como
do chefe do Departamento de África, Ásia e Oceania, ítalo Zappa, à Tanzânia,Zâmbia
e Etiópia, abriram novos canais de conversações.

323
o desafio geoestratégico

Em relação a Angola, o Brasil enviou o ministro Ovídio de Melo a fim de


estudar a situação e apreciar o papel dos três movimentos nacionalistas angolanos, O
MPLA(Movimento Popular para a Libertação de Angola), a UNITA(União Nacional
para a Independência Total de Angola), a FNLA (Frente Nacional para a Libertação de
Angola), respectivamente chefiados por Agostinho Neto, Jonas Savimbi e Holden
Roberto. O representante brasileiro manteve contatos com os representantes dos três
movimentos, possibilitando as conversações que os líderes nacionalistas tiveram poste-
riorment com ítalo Zappa.“O ministro das relações Exteriores, embaixador Azeredo
da Silveira, mostrou-se mais disposto a iniciar sondagens e enviar representantes
brasileiros que ajudassem a decidir a posição brasileira. A Representação de Ovídio de
Melo e a Missão de ítalo Zappa resultaram dessa ação. Mas, na verdade, o presidente
Geisel exercia a inteira direção, como cabe nos regimes presidenciais, e assumia a
responsabilidade da mudança de rumo do Brasil em relação à África e os países árabes.”
(Rodrigues, 1982:524). Segundo o embaixador Ovídio de Melo, no decorrer deste
período se fizeram sentir várias pressões para o encerramento da Missão Especial.
Em seu depoimento o embaixador Ovídio de Melo afirma que‘Tendo obtido
de todos eles o assentimento para que o Brasil estivesse em Angola desde o primeiro
momento com uma representação diplomática credenciada perante os três movimentos
participantes do governo de transição, eu,em Março,então, sediei-me em Angola para
estar em contato permanente com esses três movimentos(...) Asinstruções que o govenio
brasileiro me dera (e foi o que expus aos três presidentes dos três movimentos),
pressupunham absoluta isenção de ânimo,absoluta igualdade,isto é,sem favorecimentos
a qualquer um dos partidos, pois o Brasil queria apenas ter relações com Angola
independente a 11 de novembro.” Em relação à caracterização dos três partidos, afirma:
”(...) enquanto o MPLA era um movimento amplíssimo, que abrangia correntes
ideológicas do mais variado matiz, os outros eram fundados em tribo, em tradições
africanas (...)” e em relação à UNITA,afirmava ainda que “(...) buscava, numa posição
pendular, oferecer participações no poder ora ao MPLA, ora a Holden Roberto e à
FNLA.” A situação em Angola evoluía,“emjulho a situaçãojá estava definida. O MPLA
já havia, na prática, tomado o poder e era o único governo, o único movimento que
participava do governo de transição (...) a situação mudou completamente porque, se
antes tínhamos uma guerra civil com infiltração de tropas estrangeiras ou de mercenários
estrangeiros, a partir de julho começamos a ter invasões estrangeiras declaradas.”
Graças aos traballios da Missão Especial e ao fato de ter sido o primeiro país
ocidental a reconhecer a independência de Angola, proclamada à zero hora de 11 de
novembro de 1975, o Brasil passou a obter um relacionamento mais significativo com
aquele país. O fato de ter sido o primeiro país ocidental a ter uma embaixada em Luanda
foi também de fundamental importância no campo dos contatos com o mundo ocidental,
além da abertura que dava ao Brasil.

324
Fernando Augusto A. Mourão /Henrique Allemani de Oliveira

Em relação a Moçambique não se seguiram as relações especiais conseguidas


com Angola,uma vez que a FRELIMO,ressentida com a falta de apoio brasileiro durante
as fases da luta pela independência, preferiu aguardar a independência para o
estabelecimento de relações normais.
As relações com a África Austral e Oriental foram reforçadas em várias
ocasiões, como por exemplo, quando da visita dos chanceleres do Quênia e da Zâmbia
a Brasília,respectivamente em abril e setembro de 1975. As relações bilaterais com esses
países facilitava “la réiníroduction de Brasília dans le monde de TAfrique australe”
(Tviartiniere, s.d.: 500). A ação diplomática brasileira fazia-se sentirem outras áreas do
continente africano,como é o caso da viagem do chanceler Azeredo da Silveira à Costa
do Marfim, em junho de 1975, quando tratou do problema das colônias portuguesas e
da evolução desse processo.Em outubro de 1975, o presidente Ornar Bongo,do Gabão,
visita Brasília. O Gabão, país da África Ocidental e vizinho de Angola, havia apoiado
os esforços do CLSTP(Comitê de Libertação de São Tomé e Príncipe), que vem a obter
a sua independência em 12 de julho de 1975.
O reconliecimento de Angola, conduzida pelo MPLA, um movimento que
se previa que tivesse possibilidades de garantir a unidade territorial do país, ao que
acresce o fato de que seus líderes se expressavam em português, o que era importante
do ponto de vista da manutenção da língua portuguesa,foi um ato de grande importância,
não só em relação a Angola, como em relação ao conjunto dos países de expressão
portuguesa. “La reconnaissance de Tindépendence de TAngola le 11 novembro 1975.
dirigée à Luanda par le MPLA(Mouvement Populaire pour la Libération d’Angola)de
Agostinho Neto, constitua la preuve de cette restructuration de la politique africaine du
Brésil. En effect, seul parmi les pays occidentaux, le Brésil maintint des relations avec
un régime violentemment contesté même par les pays afrícains modérés.”(ABREU,
1988:75).
O reconhecimento de Angola pelo Brasil foi seguido depois pela Suécia, país
que já vinha dando apoio à luta pela independência nacional no quadro das colônias
portuguesas. O Conselho Mundial das Igrejas também reconheceu o governo de
Agostinho Neto. De acordo com Guy Martinière, “selon Brasília, il demeurait três
importam de ne pas couper définitivement tous les ponts entre Luanda et les pays
occidentaux: le MPLA ne constituait pas um parti aussi monolithique que des
observateurs superficiels raffírmaient et bien des tendences existaient en son sein.
désireuses de se démarquer de Moscou ou même de Cuba aussitôt que la - détente - se
confirmerait. Les abandonner constituerait donc une grave erreur.”(Martiniere, 1978:
49-50).
O Brasil, de certo modo.continuava a praticar a sua política de “segurança e
desenvolvimento”, prevendo que a sua política de cooperação poderia frutificar e
oferecer novas opções para Angola. Graças ao trabalho da Missão Especial, o Alto

325
o desafio geoesíralégico

Comissário Português, assim como os ministros do governo de transição, com


representantes dos três partidos nacionalistas, convidaram o Brasil, através de um
telegrama enviado ao presidente Geisel, para estar presente às cerimônias da
independência de Angola, em 11 de novembro de 1975. No momento da posse do
governo provisório de Angola, em 31 de janeiro de 1975, o presidente Ernesto Geisel
enviou telegramas às autoridades de Lisboa, cujo governo era à altura presidido pelo
general Costa Gomes, a Agostinho Neto, do MPLA, a Jonas Savimbi, da UNITA e a
Holden Roberto, da FNLA, congratulando-se pela posse do governo provisório. Em
agosto do mesmo ano o MPLA expulsa os dois partidos rivais de Luanda, a FNLA e a
UNITA,e assume o poder,fortificando igualmente suas posições nos principais centros
urbanos do país. A posse de Luanda era considerada chave pelo MPLA.“Alors puisque
le MPLA apparaissait aux yeux de ITtamaraty comme le garant de toute ‘balkanisation’
de r Angola,Tessentiel était donc d’éviter toute niplure avec lui et,à terme,de reconnaitre
sa prépondérance.”{Martiniere, s.d.: 517). Agostinho Neto proclama a independência
de Angola à zero hora de 11 de novembro, enquanto Holden Roberto, depois de ter
criado, com a UNITA,um Conselho da Revolução, proclama o nascimento da “Repú
blica Popular e Democrática com base em Ambriz, uma pequena cidade ao norte de
Luanda, a par do governo que se havia instalado em Nova Lisboa, atual Huambo,cidade
que foi mais tarde retomada pelo MPLA,em 8 de fevereiro do ano seguinte.
A atitude do Brasil perante Angola permitiu o estabelecimento de relações
diplomáticas com Moçambique em 15 de novembro, concretizando as declarações de
Joaquim Chissano, ministro das relações Exteriores de Moçambique,em fms de setembro
de 1975,de que o estabelecimento de relações diplomáticas com o Brasil seria para breve.
“C’était sans aucun doute une victoire des positions de ITtamaraty. On pourrait, de cette
façon, réduire la méfíance des leaders africains à 1’égard du Brésil, condition préalable
au reforcement des liens avec les pays du continent noir.”(Abreu, 1988: 78).
Apesar de o Brasil continuar a manter relações comerciais e diplomáticas com
a África do Sul, tendo mesmo elevado a Delegação brasileira a nível de Embaixada, o
chanceler Azeredo da Silveira,em seu discurso na XXIX Assembléia das nações Unidas,
condenou veementemente a discriminação racial, a dominação cultural e econômica,
posição que foi endossada pelo presidente Ernesto Geisel na sua Mensagem à Nação e
ao Congresso. Note-se que as relações econômicas com Angola ultrapassaram o nível
de comércio com a África do Sul. Por outro lado, as relações com a África anglofone e
francofone foram estimuladas e aprofundadas.
Azeredo da Silveira dizia que a posição brasileira no domínio internacional
passava por três linhas de ação; a coincidência, a negociação e a divergência, linhas
com as quais deveria haver uma sincronização da política global brasileira. Do nosso
ponto de vista a política externa do presidente Ernesto Geisel situa-se como um momento
de um processo em que se deu a inserção definitiva do Brasil na África Austral. A sua

326
Fernando Augusto A. MourÕo /Henrique Altemani de Oliveira

política e a de seu chanceler Azeredo da Silveira é normalmente designada de pragmática,


responsável e ecumênica,uma politica de resultados. Na perspectiva do processo é pre
ciso não perder de vista que as mudanças políticas levadas a cabo em Portugal e o avanço
político dos movimentos de libertação nacional das colônias foram igualmente impor
tantes, aclarando o quadro das possibilidades. O Brasil busca uma variável universal,
inserindo e aprofundando o campo das relações internacionais, considerando-se ao
mesmo tempo um país integrante do Ocidente e do Terceiro Mundo,numa perspectiva
de globalização. Trata-se de uma politica exterior se projetando nas mais variadas
direções, tal como afirmava o chanceler Azeredo da Silveira.
O Brasil surgia como uma potência intermediária(Lafer. 1984), tendo, por
tanto, Condições de utilizar vários “graus de liberdade suplementar” no contexto
internacional. A teoria do pentagrama de Henry Kissinger pode ser lida no sentido de
um mundo mais multipolar, onde surgiam novas oportunidads para as chamadas
potências intermediárias, desejosas de ter um papel mais ativo no contexto das relações
internacionais. As áreas de coincidência com o Terceiro Mundo, a par das tradicionais
relações com o Ocidente e conseqüentes coincidências,ficaram muito mais claras. Por
outro lado há que pôr em relevo que a fase de aprendizado nas relações com os países
africanos estavajá superada. O Itamaraty passava a contar com uma massa crítica conhe-
cedora dos assuntos africanos, o que lhe permitia avanços nesse campo. A sociedade,
apesar das críticas da imprensa conservadora às atitudes do Itamaraty. passa,
relativamente, a conhecer e ter mais interesse pelos assuntos africanos, ao que acresce
o aumento dos fluxos comerciais com esses países, nomeadamente com Angola, que
ultrapassa o comércio com a África do Sul.
Uma certa independência em relação aos Estados Unidos - note-se que foi
durante o Governo do presidente Ernesto Geisel que ocorreu a ruptura do acordo militar
entre o Brasil e os Estados Unidos, assinado em 1952- também favoreceu uma maior
autonomia no campo das relações internacionais, nomeadamente com os países do
Terceiro Mundo e com África. Ressalte-se o fato de que o Brasil jamais tomou uma
posição terceiro-mundista contra o Ocidente. A distinção entre uma política virada ao
Terceiro Mundo e uma politica terceiro-mundista,com implicações várias, entre as quais
a do não alinliamento. parece-nos fundamental.
No Governo do presidente João Figueiredo registra-se a primeira visita
presidencial de um chefe de governo brasileiro ao continente africano. O presidente
Figueiredo visitou, em 1983, entre 14 e 21 de novembro, a Nigéria, Senegal, Guiné-
Bissau, Cabo Verde e a Argélia, envolvendo portanto países lusofones, francofones e
anglofones. Essa viagem que, na altura, sofreu críticas da imprensa brasileira que não
via maiores resultados nesse périplo, foi de fundamental importância, pois a nosso ver
constituiu-se no coroamento de uma política para África, em termos de um aval
presidencial e, diante dos países africanos, mostrou claramente o interesse brasileiro

327
o desafio geoestraiégico

em manter boas relações com eles. No período do presidente João Baptista Figueiredo
foram também assinados cerca de 25 tratados com países africanos, aprofundando,
portanto, uma relação importante da diplomacia brasileira.
Na Mensagem do presidente João Figueiredo ao Congresso Nacional na
abertura da Sessão Legislativa,em 1° de março de 1980,lê-se:“No tocante ao continente
africano, cujos povos têm com os brasileiros tantas e tão importantes afinidades, está-
se abrindo nova etapa de nossas relações. Estão retomados os contatos e foijados vínculos
de confiança com as nações africanas. Agora, devemos rapidamente operacionalÍ2ar
nosso relacionamento. Especialmente com as nações de língua comum - Angola,Cabo
Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe - estamos passando a uma
fase mais produtiva, como evidencia a aceleração de contatos, visitas, entendimentos,
verificada nos últimos doze meses. O Brasil manteve firme posição no que diz respeito
aos problemas da instalação de um verdadeiro regime de maioria no Zimbábue e na
autodeterminação e independência da Namíbia.”{Resenha de Política Exterior do Brasil,
MRE,num.24,janeiro, fevereiro e março de 1980, p. 4).
A fala presidencial faz referência a uma característica da diplomacia desse
período, a confiabilidade no Brasil por parte dos outros atores, nomeadamente dos
africanos, ponto posto em evidência em várias falas do chanceler Ramiro Elysio Saraiva
Guerreiro. O Brasil deveria alinhar ao princípio da soberania nacional o princípio da
credibilidade, de país confiável. O aprofundamento das relações com o continente
africano e a sua operacionalização levaram em conta estes princípios fundamentais do
relacionamento. Por outro lado, face à crise internacional, “(...) la carence brésilienne
en ressources devait être compensée par une presence plus qualitalive sur la scène
internationale.”(Abreu, 1988: 92).
O aprofundamento das Relações com os países do continente africano é posto
em evidência por vários autores que estudaram o período Figueiredo:“Do ponto de vista
político, as relações do Brasil com África durante o período Figueiredo foram aprofun
dadas dentro da linha de aproximação encetada no Governo Geisel. São testemunho disso
as posições brasileiras sobre as questões africanas e internacionais de interesse comum
(marcadas pela proximidade com aquelas tomadas pela OU A), a viagem do Presidente
Figueiredo à África - precedida pelas operosas toumées do chanceler Saraiva Guerreiro
- e as visitas ao nosso país de seis chefes de Estado africano.”(Pereira, 1985: 95-6).
As visitas do chanceler Saraiva Guen^eiro a países africanos, nomeadamente
aos países da chamada Linha de Frente, em 1980,foram fundamentais para o aprofun
damento qualitativo das relações do Brasil com África.Em entrevista que nos concedeu,
0 embaixador Saraiva Guerreiro pôs em evidência que a política exterior do governo
Figueiredo foi uma continuação da política externa de Geisel, um “aprofundamento”,
uma “adaptação”. Segundo ele, as relações foram preponderantemenle políticas e não
econômicas, daí uma certa dificuldade de explicar as aproximações com África.

328
Fernando Augusto A. Mourão /Henrique Attemani de Oliveira

Durante a visita que o chanceler Saraiva Guerreiro fez, em junho de 1980, a


cinco países africanos da chamada Linha de Frente: Tanzânia, Zâmbia, Moçambique,
Zimbábue e Angola, evidencia-se, nos comunicados conjuntos com esses países, uma
posição firme do Brasil em relação aos principais problemas da região. No comunicado
conjunto Brasil-Angola (11 de junho de 1980): “A delegação brasileira condenou
energicamente os inadimissíveis atos de agressão do regime sul-africano contra a
soberania e integridade territorial da República Popular de Angola e repudiou os mas
sacres praticados contra a população civil, bem como a deliberada destruição de centros
econômicos com o objetivo de desestabilizar o país.”{Resenha de Política Exterior do
BrasiL MRE,n.° 25, abril, maio ejunho de 1980, p. 113). Nesse mesmo comunicado o
apartheid foi considerado “uma ameaça à paz e á segurança internacionais.”
Numa entrevista coletiva à imprensa, a 23 de maio de 1980, antes da visita
aos países da Linha de Frente, perguntado se “não havería algum negócio,algum interesse
específico do Brasil quejustificasse a sua ida”, o chanceler Saraiva Guerreiro respondeu:
“Não orientamos nossas relações com esses países a partir da ambição de mercados.
Lógico que estamos sempre interessados em ampliar o comércio. Mas,esses são países
também pobres, com dificuldades, numa grande luta pelo seu desenvolvimento,
semelhante à nossa.”{Resenha de Política Exterior do Brasil, MRE,n." 25,abril, maio
e junho de 1980, p. 117).
Nesse mesmo ano. na segunda quinzena de junho, o Brasil recebeu a visita
do presidente da República da Guiné-Bissau, Luiz Cabral, que escutou do presidente
João Figueiredo as seguintes palavras:“O relacionamento do Brasil com a Guiné-Bissau,
e com a África, desenvolve-se num quadro de Cooperação espontânea; de interesse
recíproco; de igualdade e de respeito ás individualidades nacionais.” {Resenha de
Política Exterior do Brasil, n.°25, abril, maio ejunho de 1980, p. 131).
Note-se que neste período o Brasil já vinha sendo afetado pelo problema da
dívida externa, em conseqüência do segundo choque do petróleo, o que colocava
problemas e limitações á cooperação, numa época em que a cooperação Sul-Sul se
desenvolvia e configurava uma relação alternativa ás clássicas relações verticais Norte-
Sul. Uma das soluções encontradas para incrementar o comércio, face ás dificuldades
das balanças de pagamento,foi o recurso aos contratos de countertrade,“Outra novidade
do período estudado é a introdução do countertrade, isto é, a troca de petróleo africano
por mercadorias ou serviços do Brasil. Esta modalidade de comércio, usada
primeiramente com a Nigéria,já está sendo adotada com Angola (na construção das
obras de engenharia da hidrelétrica de Capanda, pela Odebrecht).”(Pereira, 1981; 88).
A cooperação, por sua vez, foi incrementada graças aos esforços brasileiros, cabendo
citar as iniciativas do embaixador Paulo Tarso Flexa de Lima. A criação de um vôo da
VARIG ligando o Rio de Janeiro a Luanda e a Maputo foi um fato importante que se
registrou nessa época, possibilitando uma maior e regular aproximação.

329
o desafio geoesiratégico

A especificidade do tratamento nas relações com o continente africano foram


abordadas pelo chanceler Saraiva Guerreiro numa conferência que proferiu na Escola
Superior de Guerra, em 5 de setembro de 1980: “Por certos elementos que nos unem
culturalmente aos africanos, não devemos fazer simplificações sobre a África, muito
menos impor aos países e conflitos esquemas e interpretações reducionistas, que pouco
têm a ver com o que acontece (...) E erro grave tomar por determinantes essenciais
situações contingentes, episódios de processos complexos, embora tenham influência
no comportamento desses países. Isso só levaria à frustração, à incompreensão, à
impossibilidade de uma aproximação autêntica com os países africanos.”{Resenha de
Política Exterior do Brasil, MRE,edição suplementar,setembro de 1984, p.23-24).

\ Nova República

Com o advento da Nova República, a política externa brasileira manteve os


seus rumos, nomeadamente no que toca ao continente africano, sendo que o problema
da dívida externa se agravou com consequências econômicas, que se transformaram num
entrave à política de cooperação. No plano internacional, ou melhor, em relação às
instituições internacionais, surge a “tendência de os organismos internacionais
privilegiarem os investidores em suas operações de crédito”(Mourão, 1987: 59).
No discurso de posse como secretário geral das relações exteriores, o embai
xador Paulo Tarso Flexa de Lima pôs em evidência que “A política de nossos dias é
uma política global, a exigir, como querem alguns diversos níveis de leitura, diversas
modalidades de discurso e um sem número de formas de atuação.”(Resenha de Política
Exterior do Brasil, MRE,n.°45, março, abril, maio ejunho de 1985, p. 22).
Na abertura da XL Sessão da Assembléia Geral da ONU,o presidente José
Samey reiterou “solenemente a nossa total condenação do apartheid e nosso apoio sem
reservas à emancipação imediata da Namíbia,sob a égide das nações Unidas (...) Como
Presidente de meu pais, renovei há poucas semanas a proibição de exportar petróleo e
derivados, armas e munições, licenças e patentes para a África do Sul, bem como
suspendí as atividades de intercâmbio cultural, artístico ou desportivo com o Governo
de Pretória.” E no seu discurso de 23 de setembro de 1985, o presidente acrescentou:
“O racismo, um colonialismo diferente, amoral e per\'erso, não pode manchar a página
de ouro da descolonização.”{Resenha de Política Exterior do Brasil, MRE,n."46,julho,
agosto e setembro de 1985, p. 6).
O presidente José Sarney visitou Cabo Verde em maio de 1986 e mais tarde
Angola, de 26 a 28 de fevereiro de 1989, contribuindo assim para o estreitamento de
laços com os dois países irmãos. Em Cabo Verde, onde teve uma acolhida calorosa, o
presidente José Samey afirmou: “Cabo Verde sempre teve para nós, brasileiros, um

330
Fernando Augusto A. Mourão/Henrique Altemani de Oliveira

significado especial, por sua vocação de elo entre os três continentes, de enlace entre
povos. E São Vicente, por sua posição privilegiada dentro deste arquipélago, destacou-
se sempre nessa tradição, tomando-se o porto por excelência na rota entre o Brasil e a
Europa.”{Resenha de Política Exterior do Brasil, MRE,n.° 49, abril, maio ejunho de
1986, p. 38).Em Angola,onde foi igualmente significativamente recebido,o presidente
teve ocasião de reafirmar as posições brasileiras em relação à África Austral. Na ocasião,
uma ampla comissão, coordenada pelo chefe do Departamento de África, embaixador
Carlos Coutinho Peres, aprofundou, com os representantes de Angola, os acordos já
assinados com esse país.
Durante o período do presidente Samey,o Brasil recebeu significativas visitas
de chefes de Estado africanos, entre os quais o presidente da Argélia, Chaddli Benjedid,
em outubro de 1986,o presidente do Zaire, Mobuto Sesse Seko N'gbengu Wa Za Banga,
em fevereiro de 1987,a visita do presidente Aristides Pereira, de Cabo Verde,em abril
de 1987. Um ano depois, em abril de 1988, éa vez de recebera visita do presidente de
Moçambique, Joaquim Chissano, ocasião em que o presidente José Samey, em seu
discurso de boas vindas, em 8 de abril, teve a oportunidade de voltar a condenar a África
do Sul; “(...) a persistência do regime cruel e anacrônico do apartheid na África do Sul
(...)”. Por sua vez, o presidente moçambicano teve a oportunidade de afirmar em seu
discurso:“Saudamos o Brasil pelas suas posições corretas e corajosas no que concerne
à solidariedade para com os países da África Austral e em especial pela condenação do
apartheid (...)”{Resenha de Política Exterior do Brasil, MRE,n.“ 57,abril, maio ejunho
de 1988, p. 8).
Uma visita que merece destaque foi a do presidente da Organização do Povo
do Sudoeste Africano, Sam Nujoma, em março de 1987. José Samey afirmou, perante
o presidente da SWAPO, que “não há razões aceitáveis que impeçam o Governo sul-
africano de aplicar a Resolução 435 do Conselho de Segurança das nações Unidas para
a solução do problema”{Resenha de Política Exterior do Brasil, MRE,n.° 52,janeiro,
fevereiro e março de 1987, p. 55). Na ocasião, o presidente Samey pôs também em evi
dência o gesto simbólico do Brasil, ao receber, dois dias antes, 25 estudantes namibeanos
num curso intensivo de língua portuguesa.
Um ato de vontade da diplomacia brasileira foi sem dúvida a Resolução das
nações Unidas 41/11, de 27 de outubro de 1986, que trata da criação da Zona de Paz e
Cooperação no Atlântico Sul. um primeiro ordenamento de um processo em marcha no
campo da paz e da cooperação,aproximando os países ribeirinhos do Atlântico Sul.Este
documento pôs fim às especulações relativas à criação de um pacto do Atlântico Sul.
“O título da declaração repousa,de um lado, num conceito geográfico- o Atlântico Sul
-, algo de concreto e real, isto é, na acepção de hidroespaço, conceito recente, e, por
outro, numa possibilidade real e substantiva de aproximação através do desenvolvimento
de um mecanismo de cooperação entre os intervenientes”(Mourão, 1988:49).

331
o desafio geoestratégico

A Resolução 41/11, que deu atenção à necessidade de se alcançar a paz na


África Austral, previa a desmilitarização do Atlântico Sul, numa época em que o
bipolarismo ainda caracterizava o sistema internacional. A Resolução 41/11 envolve
24 países(hoje 25 com a independência da Namíbia),com uma população de cerca de
400 milhões de pessoas, falando várias línguas oficiais, e em estágios diferentes de
desenvolvimento e graus variáveis de dependência, A busca de uma identidade própria
do Atlântico Sul como região,uma identidade política, é um dos primeiros passos a ser
tomado.“A resposta do ministro das relações Exteriores ao Secretário-Geral das nações
Unidas referente à implantação da Declaração sobre a Zona de Paz e Cooperação do
Atlântico Sul mostra claramente que não se está tratando de criar um organismo regional,
mas, preferencialmente, de se ‘promover,intensificar e ampliar os elos de entendimento
político e cooperação existentes entre eles, com vistas ao seu desenvolvimento econô
mico e social, à proteção do meio ambiente, à conservação dos recursos e à preservação
da paz e da segurança de toda a região’.”(Mourão, 1988: 56).
Cabe destacar que, se por um lado, nos últimos anos, em decorrência de
problemas econômicos e financeiros,assistimos a uma diminuição dos fluxos comerciais
e de serviços em relação a certos países africanos, por outro assistimos a um aprofun
damento das relações de natureza política que, certamente, dará seus fmtos no futuro.

Relações Econômicas

Depois de termos analisado o período em questão do ponto de vista político


e de certo modo estratégico-militar, dos valores, passemos agora ao campo das relações
econômicas.
Todos estes aspectos têm de ser entendidos mais como um processo em
andamento num acrescer de convergências, o qual se insere num quadro mais global,
ainda facetado por divergências. No plano interno, do nosso ponto de vista, a formulação
da ação diplomática deve-se mais ao executivo,com ênfase para o Ministério das relações
Exteriores, do que à contribuição da sociedade civil. Ao invés de falarmos num projeto
africano preferimos amplamente falar de um processo ao longo do tempo,durante o qual,
com mais ou menos ênfase, foi-se formulando uma ação política e uma ação diplomática,
registrando-se uma breve interrupção parcial no período do presidente Castello Branco.
A ação diplomática se aprofundou em decorrência de uma visão do mundo, a que não
eram estranhas, do ponto de vista interno, a formação da própria cultura brasileira,
tridimensional por excelência. Acreditamos estar mais perante um processo difuso, mas
continuado, do que perante uma extrema racionalidade.
O âmbito econômico comercial da diversificação da política externa brasileira
foi. em parte, decorrente do crescimento do parque industrial, por um lado; de outro.

332
Fernando Augusto A. Mourão /Henrique Altemani de Oliveira

possibilitado pela expansão da economia mundial e por sua maior internacionalização


e, igualmente, pela integração crescente do Brasil à economia mundial.
No entanto, em decorrência do processo de desenvolvimento econômico,
consubstanciado no plano externo pela necessidade de manutenção de fornecedores de
insumos básicos e, na mesma intensidade, de mercados consumidores de produtos
manufaturados brasileiros, procurou-se diversificar as alianças políticas, de forma a
garantir a continuidade e êxito do modelo de desenvolvimento implantado. Assim, o
distanciamento dos Estados Unidos, a diminuição da importância dos produtos básicos,
como por exemplo, o café, o conseqüente crescimento dos produtos manufaturados na
pauta de exportação e a maior integração ao sistema mundial são fases do processo de
redefinição da posição ocupada pelo país no contexto internacional.
Em termos estritamente comerciais, os manufaturados brasileiros não
poderíam, entretanto, competir em condições de igualdade com os dos países mais
desenvolvidos. Consequentemente, a ênfase no relacionamento com os países do Sul
mostrou-se uma alternativa pertinente por, de um lado, constituir-se num mercado amplo
e receptivo aos produtos brasileiros e, de outro, ser uma forma de contornar as barreiras
protecionistas dos países desenvolvidos.
Neste contexto, depreende-se da análise da política externa brasileira, a partir
dos anos 60, que:

a. o Estado brasileiro procurou redefinir sua inserção no sistema internacional;


b. dentro desse processo de inserção no sistema internacional, reservou-se um papel
privilegiado ao continente africano, e
c. as relações comerciais desenvolvidas entre Brasil e África e decorrentes do papel
reservado ao continente africano coixespondem a uma vertente da estratégia de
inserção do país no sistema mundial, com características tanto políticas quanto
econômico-comerciais.

Dessa forma, dentro do contexto mundial marcado, de um lado. por uma


crescente internacionalização das diferentes variáveis e por uma crise econômica
afetando principalmente os países em desenvolvimento e, de outro, pela política externa
brasileira procurando, em todos os níveis, redefinir a sua inserção pela diversificação
de seus parceiros é que se pode enquadrar o relacionamento do Brasil com a África numa
conjugação recíproca de interesses.
É importante ressaltar que diferentes Declarações de africanos confirmam
esse mútuo interesse, considerando a visualização do intercâmbio Brasil-África como
um instrumento passível de satisfação de seus respectivos interesses nacionais. Em outros
termos, o Brasil para a África passa a ser igualmente visualizado como uma alternativa
estratégica passível de consideração face à grande dependência em relação á Europa.
Assim, por exemplo, em outubro de 1968, uma missão argelina propõe a venda de

333
o desafio geoestratégico

petróleo em troca da compra de navios e veículos brasileiros. No caso específico da


Argélia, tem-se que ressalvar o aspecto político presente nas negociações. A Argélia
tinha, há pouco tempo, em maio de 1968, nacionalizado o processo de distribuição de
hidrocarbonetos, com a pesquisa e exploração ainda sob controle francês, e precisava
não só se firmar como distribuidora, mas também provar que tinha capacidade para
assumir intemacionaimente essas tarefas. Assim, a efetivação da colocação de petróleo
argelino no Brasil podería ter essa fiinçào e demonstrar a outros países, consumidores
em potencial, que a Argélia não só tinha Condições de vender mas também de cumprir
os contratos estabelecidos. De outro lado, a proposta argelina para o Brasil tomava-se
ainda mais interessante pois vinha ao encontro de interesses de certos setores
revolucionários no aprimoramento e desenvolvimento do armamento naval brasileiro.
Assim,apesar das tensões políticas existentes entre Brasília e Argel por causa
do papel desempenhado pela Argélia, em nível internacional, de apoio aos diferentes
grupos revolucionários e também por causa do interesse da “diplomacia da prosperidade”
em ampliar o rol dos países com que se estabeleciam relações comerciais apesar das
diferenças ideológicas, a missão comercial argelina apresentou pontos de interesses
mútuos que poderíam impulsionar os contatos.
Selcher aponta que a posição oficial do Brasil era a de não substituir antigas
potências na África e nem mesmo de aplicar suas práticas, o que redundaria num neo-
colonialismo. Por isso, há uma preocupação,até mesmo exagerada,em realçar as afini
dades,0 caráter complementai', a convergência de interesses ou as relações horizontais,
entre outras expressões que definem uma nova terminologia. Da mesma forma evita,
dado suas limitações econômicas,técnicas e financeiras, apresentar-se como uma nação
doadora ou com grande capacidade de ajuda. “Palavras tais como ‘assistência’ e ‘ajuda'
são, por isso, cuidadosamente evitadas, havendo preferência por uma fraseologia de van
tagens mútuas, pela qual dizem que os africanos requisitam os produtos, serviços e
experiências brasileiras, beneficiando-se ambas as partes.”(Selcher, 1984: 63).
Evidentemente que o posicionamento brasileiro não estava unicamente
restrito ao campo econômico,buscando igualmente uma parceira política que reforçasse
sua posição no contexto internacional, não se acatando assim a tentativa de interpretação
da política africana como estritamente vinculada a aspectos econômicos ou mer-
cantilistas.“Como um todo, a política africana do Brasil está em construção.É um novo
horizonte que se abre; e já passamos da fase declaratória para a de negociação concreta.
Se. por um lado, representamos na África uma opção que, embora insuficiente, dilui os
arranjos Norte-Sul que tradicionalmente afetam a posição externa e o desenvolvimento
interno das nações africanas, por outro, as relações com a África, da forma que se vêm
alentando, reforçam o perfil externo do Brasil. Essa vertente africana nos leva a reequa-
cionar a problemática externa e nos dá novos e valiosos elementos de respeito e nego
ciação no jogo diplomático global”(Sardenberg, 1980: 24).

334
Fernando Augusto A. Mourão /Henrique Altemani de Oliveira

Em termos históricos, o Brasil manteve intenso intercâmbio comercial com


a África durante o período colonial, estendendo-se até à abolição do tráfico de escravos
(para uma visão detalhada desse período ver Rodrigues, 1982).
A retomada desse relacionamento coincide com a intensificação do processo
de independência dos Estados Africanos, de um lado,e com a busca pelo Brasil de uma
nova forma de reinserção no cenário internacional.
O departamento de estudos econômicos do Instituto Brasileiro de Estudos
Afro-Asiáticos (IBEAA), na primeira reunião de debates sobre relações econômicas
Brasil-África, enfatiza que “o surgimento da Nova África “abre novas perspectivas para
0 intercâmbio bilateral entre o Brasil e as nações soberanas daquele continente. É
interessante que se tenha em mira tratar-se de política do futuro, no sentido de que algo
substancialmente novo tem que ser tentado.”(IBEAA, 1962; 5). A ênfase do IBEAA
no sentido de que qualquer relacionamento comercial com o continente africano seria
um projeto do futuro advinha do praticamente inexistente comércio com a África.
Da análise das exportações e importações entre Brasil e África no final da
década de 50 e inicio de 60 depreende-se inicialmente: a) o caráter esporádico do
intercâmbio, e b) o fato de as exportações brasileiras serem sensivelmente superiores
às importações.
Assim,apesar de no período Jânio Quadros ter se colocado a intenção de um
maior relacionamento econômico-comercial, sua rápida passagem pelo governo não
permitiu a execução de nenhum projeto real e os problemas internos também não per
mitiram a João Goulart o prosseguimento das intenções anterioimente levantadas.
Dessa forma, no que se refere à probabilidade de intercâmbio comercial com
o continente africano, a maior parte das discussões e análises centram-se no questio
namento de a África ser concorrente ou parceiro comercial.
Artur Cezar Ferreira Reis, por exemplo, considerava coerente que o Brasil,
ao defender a tese de autodeterminação dos povos, procurasse uma maior aproximação
com a África não só nas relações de amizade mas igualmente no campo econômico,
colocando no entanto a ressalva de como promover essa aproximaçao, se os países
africanos são nossos concorrentes e as exportações brasileiras para a África Negra são
insignificantes”(Reis, 1963: 221).
Já Ignácio M. Rangel (Rangel, 1962) defende a idéia de que é como novo
mercado que devemos encarar a África e não como competidor. Mesmo reconhecendo
a possibilidade de ela se tomar um sério concorrente, Rangel acha que está em nosso
poder estabelecer com ela relações econômicas e políticas mutuamente úteis. Enfatiza
que, além de um novo mercado, os países africanos constituem um novo mercado de
países subdesenvolvidos em processo de desenvolvimento. Por este motivo os considera
como candidatos ao consumo de nossos produtos elaborados, especialmente os bens
de equipamento, relembrando o fato de nossos produtos serem igualmente os de uma

335
o desafio geoestratégico

sociedade subdesenvolvida e assim provavelmente mais adequados do que os de países


mais avançados, por serem o resultado de uma experiência de operação numa sociedade
subdesenvolvida.
Estanislau Fischlowitz também defende a idéia de que nas relações brasileiro-
africanas deve ser objeto de análise mais profunda a possibilidade de absorção, pelo
crescente mercado consumidor do continente africano, dos produtos semimanufaturados
e manufaturados da indústria brasileira. Fischlowitz ressalta, no entanto, a existência
de outra crucial concorrência entre o Brasil e a África no que se refere à captação do
capital investidor(Fischlowtz, 1980).
Um outro tema que surge nesse momento e que permanece nos outros
períodos governamentais, como também a questão anterior, diz respeito à forma de
acesso ao continente africano. Adriano Moreira defende a idéia de que o Brasil depende
inteiramente de Portugal para ter acesso à África,em decorrência da garantia que o poder
político português pode-lhe dispensar através de sua permanência na África. Isto é, o
Brasil necessita apoiar a posição de Portugal para poder ter uma via de acesso ao
continente africano (Moreira, 1967).
Apesar das diferentes pressões e mesmo da ambigüidade de que se revestiu
a política africana no Brasil no que tangia à questão das então colônias portuguesas, a
posição preponderante foi a de o Brasil se relacionar diretamente e com um perfil próprio
derivado dos interesses nacionais.
As relações comerciais do Brasil com o continente africano, na realidade,
adquirem maior consistência e continuidade a partir do governo Geisel, atingindo seu
auge no período Figueiredo.
Dessa forma, após o interesse ter se originado na época da “política externa
independente” e de imediato já ter sofrido um vácuo na gesto Castello Branco quando
os interesses, muito influenciados pelas questões de segurança interna e externa,
redirecionam-se para o continente americano e mesmo ter retomado durante governo
de Costa e Silva, é só no período Médici que ações mais concretas começam a ser
empreendidas.
Note-se. destarte, que a ampliação da importância do intercâmbio com a
África está significativamenle localizado, num primeiro momento,após a retomada do
esforço diplomático empreendido inicialmente por Gibson Barbosa quando de seu
périplo aos nove países africanos e, em segundo, na continuidade desenvolvida por
Azeredo da Silveira e esforçada pelo reconhecimento da independência das ex-colônias
portuguesas.
Apesar da evolução positiva do intercâmbio comercial com a África, as
relações comerciais apresentam a característica básica de uma concentração muito
acentuada em poucos países, tendo o comércio com os demais países um caráter muito
mais aleatório do que reflexo de um interesse mútuo.

336
Fernando Augusto A. Mourão / Henrique Altemani de Oliveira

No início do governo Médici, nossas exportações eram basicamente dirigidas


para a África do Norte (Argélia, Líbia e Marrocos) e para a África do Sul, enquanto
que 0 Brasil importava produtos quase que exclusivamente da África do Norte(Argélia
e Líbia), da Nigéria na África Ocidental e da Zâmbia na África Central. Já no período
Geisel, a África do Sul perde totalmente sua importância no que tange às exportações.
Além disso, persiste a concentração na Argélia e Líbia (seja para exportação seja para
importação) e na Nigéria. Gabão, Congo e Angola começam a ter também uma
participação especial,sendo que o Gabão só fornece petróleo ao Brasil, não consumindo
nenhum tipo de produto,enquanto que Angola se destaca mais como comprador e Zaire
como cliente e fornecedor.
A concentração do intercâmbio comercial brasileiro persiste nos demais
períodos governamentais. Assim,as exportações brasileiras dirigem-se basicamente para
a África Ocidental(Nigéria), África do Norte(Argélia e Egito)e África Central(Angola
e Zaire).
A percepção desta concentração é ainda mais nítida quando da análise das
importações. Note-se que somente três países (Argélia, Angola e Nigéria) foram
responsáveis, aproximadamente, por 95% em 1984 e 1985 das importações brasileiras
da África. Nos três últimos anos,com a diminuição de importância da África na balança
comercial brasileira, constata-se o crescimento de participação da África do Sul tanto
na exportação quanto na importação.
Os indicadores até 1981 apontavam o Brasil como uma importante opção para
certos mercados. As taxas negativas de 1982 e 1983, devido ao surgimento de dificul
dades econômicas derivadas da elevação de sua dívida extenia, recessão internacional
e queda do preço de diferentes matérias-primas, no entanto, demonstram a relativa
fragilidade deste relacionamento e que seu objetivo pode ser retardado em decorrência
da crise internacional, ficando o papel do Brasil na África até certo ponto restrito.
Mesmo assim, e apesar das dificuldades decorrentes do endividamento
genérico dos países do Terceiro Mundo,a participação da África na balança comercial
brasileira em 1984 e 1985 apresenta tendência de crescimento. Entretanto, a partir de
1986, tem-se a sensação de que a diminuição da participação da África no comércio
externo do país não é mais decorrente de problemas conjunturais mas reflexo de uma
real tendência negativa.
No plano do comércio total, o início dos anos 80 caracteriza-se por uma
acentuada ampliação do intercâmbio comercial com o Terceiro Mundo, atingindo o
índice de 40% em exportação em 1981 e aproximadamente 60% nas importações dos
anos 1982 e 1983.
No entanto, as dificuldades econômicas no Brasil, no Terceiro Mundo e, da
mesma forma, no sistema internacional propiciam a partir de 1982 uma interrupção da
tendência de crescimento da balança comercial com o Terceiro Mundo, indicando

337
o desafio geoestraíégico

conseqüentemente uma ligeira tendência decrescente e colocando inclusive em dúvida


as perspectivas das vantagens do relacionamento com os países do hemisfério Sul.
Assim,as exportações brasileiras para o continente africano apresentam cres
cimento significativo até o governo Figueiredo.Porém,a partir da Nova República,a ten
dência positiva não só é interrompida como também retroage aos níveis anteriores a 1980.
Essa queda da participação da África nas exportações brasileiras pode ser
interpretada, de um lado, como prova da desaceleração dos esforços desenvolvidos para
ampliar o intercâmbio comercial e, de outro,como sinal de uma alteração nas estratégias
até então desenvolvidas.
Quanto às importações, o relacionamento já não é tão linear, apresentando
maiores oscilações em decorrência da maior ou menor demanda de petróleo, mesmo
assim, a tendência no plano genérico foi de crescimento até 1985(com o maior índice
relativo de 13.2%)e de queda acentuada a partir de 1986. Note-se que a diminuição de
importância do período Sarney em relação a Figueiredo não é tão perceptível devido
ao recorde em 1985. Se se excluir os dados desse ano, a participação da África nas
importações brasileiras cai de 5.5% para 3.8%.
As relações comerciais do Brasil coma África, não só em termos de amplia
ção, mas também de diversificação regional, esbarraram inicialmente nas relações
privilegiadas mantidas pelos países africanos com suas ex-metrópoles. Enquanto o Brasil
precisa comerciar bilateralmenle com cada país e, em princípio, não tem necessidade
da maior parte dos produtos agrícolas para os quais os europeus conferem preferências,
a Comunidade Econômica Européia(CEE)tem seu relacionamento comercial com a
África institucionalizado através do Convênio de Lomé. Dessa forma, os acordos
preferenciais agem no sentido de ser muito mais fácil para os africanos terem um
intercâmbio equilibrado com a CEE do que com o Brasil.
De outro lado, o próprio governo brasileiro parece estar alterando substan
cialmente sua orientação em relação à África. Como todo o discurso oficial favorável a
um maior estreitamento com o continente africano, oriundo do Estado, parece não ter
sensibilizado suficientemente e eficazmente a sociedade civil e temendo-se um descrédito
do interesse brasileiro, a ênfase parece estar se deslocando do relacionamento comercial
para outras esferas.
O fato real. incontestável, entretanto, é que, apesar da aparente fragilidade
do relacionamento comercial afro-brasileiro, o continente africano,com o conjunto do
Terceiro Mundo,detém uma posição significativa na balança comercial brasileira. Assim,
África e Terceiro Mundo apresentam-se como alternativas significantes e viáveis dentro
do projeto diplomático de redefinição da posição ocupada pelo país no sistema
internacional.
Caso persistam os entraves, estruturais e conjunturais, impeditivos de uma
maior ampliação do relacionamento comercial, os laços já estabelecidos e reforçados

338
Fernando Augusto A. Mourão /Henrique Aliemani de Oliveira

pela vontade política reiteradamente explicitada pelo lado brasileiro e igualmente por
diferentes Estados Africanos poderão propiciar o desenvolvimento de alternativas
estratégicas, fundamentadas nos respectivos interesses.

Participação das exportações para a África no total Brasil


(Em US$ 1000 Fob)
%
Governo Jânio/Joâo Goulart 1.0
Governo Castello/Costa e Silva 1.7
Governo Médici 2.4
Governo Geisel 4.9
Governo Figueiredo 6.7
Governo Sarney 4.4
Governo Collor(1990) 2.8

Exportações
Ano Total Variação África Part. Variação
US$1000 % US$1Q00 % %
1979 15.244.377 +20.4 692.882 4.5 + 4.5
1980 20.132.401 +32.1 1.313.199 6.5 +89.5
1981 23.293.037 +15.7 1.953.339 8.4 +48.7
1982 20.175.071 -13.2 1.384.927 6.9 -29.1
1983 21.899.333 + 8.5 1.237.855 5.7 -10.6
1984 27.005.336 +23.3 1.976.342 7.3 +59.7
1985 25.639.001 - 5.1 2.021.698 7.9 + 2.3
1986 22.393.401 -12.7 945.123 4.2 -53.3
1987 26.225.115 +17.1 1.059.088 4.0 +12.1
1988 33.786.532 +28.8 1.098.135 3.3 + 3.7
1989 31.390.429 - 7.1 1.012.721 3.2 - 7.8
1990 34.382.620 + 9.5 965.867 2.8 - 4.6
Fonte: Brasil, Banco do Brasil, Cacex.

339
o desafio geoestratégico

Participação no Comércio Exterior Brasileiro


{Em US$1000 Fob)
Ano Desenvolvidos Subdesenvolvidos Leste Europeu
Export. Import. Export. Import. Export. Import.
% % % % % %
1960 83.9 71.2 10.5 23.3 5.6 5.5
1965 79.7 67.4 14.1 27.5 6.2 5.1
1970 77.7 78.7 17.8 19.3 4.5 2.0
1975 62.2 67.9 29.0 30.5 8.8 1.6
1979 63.1 48.5 30.5 50.2 6.4 1.3
1980 55.7 43.9 37.8 55.0 6.5 1.1
1981 54.1 40.0 39.4 58.9 7.3 1.1
1982 58.6 38.4 35.6 59.0 5.8 2.4
1983 61.0 37.2 32.4 59.5 6.6 3.3
1984 62.3 38.8 32.7 58.2 5.0 3.0
1985 65.5 44.7 30.6 52.8 3.9 2.5
1986 67.0 59.5 29.1 37.7 3.9 2.8
1987 65.2 56.2 29.7 41.2 5.1 2.6
1988 65.4 57.2 31.4 40.1 3.2 2.7
1989 66.8 56.2 30.0 42.0 3.2 1.8
1990 67.0 54.5 30.8 43.8 2.2 1.7
Fonte: Brasil, Banco do Brasil, Cacex.

Exportações do Brasil para África-Participações


(EmUSSIOOOFob)
Ano A. Norte A. Ocid. A. Centr. A. Orient. A. Sul
% % % % %
1960 40.3 0.8 0.6 2.9 55.4
1965 26.2 26.9 0.6 7.5 38.8
1970 57.1 7.2 0.9 7.5 27.3
1975 66.3 21.7 2.1 1.0 8.9
1980 36.0 28.2 20.8 7.1 7.9
1981 31.5 43.9 15.2 2.6 6.8
1982 28.0 32.7 22.1 9.8 7.4
1983 33.1 28.1 17.0 10.7 11.2
1984 29.9 44.0 12.1 7.4 6.6
1985 22.3 58.0 14.8 2.2 2.6
1986 36.3 36.5 18.6 2.9 5.1
1987 30.3 31.6 26.5 3.1 8.5
1988 38.3 21.0 21.0 4.4 15.3
1989 41.6 21.6 15.6 3.6 17.6
1990 40.7 25.1 12.3 5.4 16.5
Fonte; Brasil, Banco do Brasil, Cacex.

340
Fernando Augusto A. Mourão /Henrique Altemani de Oliveira

Importações Brasileiras da África-Participações


(Em US$1000 Fob)
Ano A. Norte A. Ocid. A. Centr. A. Orient. A. Sui
% % % % %
1960 11.0 0.8 29.9 52.0 6.3
1965 5.2 31.6 31.2 33.9
1970 47.9 31.5 3.6 14.4 2.6
1975 60.9 0.5 27.7 5.7 5.2
1980 23.4 8.1 50.4 0.4 17.7
1981 32.8 36.8 25.2 0.6 4.6
1982 43.6 20,0 28.3 1.9 6.6
1983 41.1 13.1 43.7 2.1
1984 10.2 74.8 11,5 0.2 3.3
1985 11.3 77.9 9.7 0.1 1.1
1986 17.7 53.0 21.0 0.2 7.5
1987 29.0 39.5 19.8 0.2 11.5
1988 20.0 21.1 48.0 10.9
1989 40.2 25.5 18.9 0.2 15.2
1990 47.8 12.3 17.0 0.2 12.7
Fonte: Brasil, Banco do Brasil, Cacex.

Participação no Intercâmbio Brasil-África


Ano Exportação Importação
Argel Niger Angola Total Argel Niger Angola Total
% % % ■% % % % %
1980 12.7 20.7 9.0 42.4 7.3 7.8 9.8 24.9
1981 13.7 39.4 5.5 58.6 14.6 36.7 7.9 59.2
1982 9.0 17.6 6.2 32.8 15.1 19.6 8.6 43.3
1983 12.1 15.8 3.8 31.7 24.0 13.0 33.7 70.7
1984 12.1 33.1 4.6 49.8 9.4 74.7 9.8 93.9
1985 6.7 45.2 6.4 58.3 11.2 77.8 8.5 97.5
1986 13.9 26.2 9.9 50.0 13.5 53.0 16.4 83.9
1987 11.2 20.5 19.5 51.2 19.0 38.9 18.7 76.6
1988 9.0 13.4 15.9 38.3 12.3 20.9 30.6 63.8
1989 7.2 13.0 12.0 32.2 34.1 24.0 9.5 67.6
1990 4.5 17.8 8.2 30.5 37.9 10.4 19.1 67.4
Fonte: Brasil, Banco do Brasil, Cacex.

341
o desafio geoestraiégico

Bibliografía

ABREU. Bernardo José Marroni de. L 'évolution de la politique dii Brésil. Mémoire D.A.E.,
Université Panthéon - Sorboniie (Paris I), novembro 1988.
CASTELLO BRANCO,Humberto de Alencar..,4 Diplomacia da Revolução Brasileira. Brasília,
Ministério das relações Exteriores, 1964.
CASTRO, Flávio Mendes de Oliveira. História da Organização do Ministério das relações
Exteriores. Brasília, Editora da Universidade de Brasília, 1983,(Temas Brasileiros).
FERREIRA, Oliveiros S. “A política externa a serviço de uma idéia messiânica”. O ESTADO
DES.PAULO, 31/3/74,p. 29.
FISCHLOWITZ. Estanislau. Subsídios para a doutrina africana do Brasil. REVISTA
BRASILEIRA DE POLÍTICA INTERNACIONAL,Rio de Janeiro, 9:82-95, março 1960.
LAFER,Celso. O Brasil e a crise mundial Paz, poder e política externa. Sào Paulo, Perspectiva,
1984.
Participação no encontro África-Brasii. Anti-comemoraçào da Abolição. REVISTA DO
PMDB, Brasília, 12:59-65. nov. dc 1988.
MARTINIERE, Guy. Le Brésil et l Afrique: Ics nouvelles fonnes des relations intcrnationales
des Amériques Latines. s.d., mim.
Le Brésil et I Afrique: les nouvellesformes des relations internationales des Amériques
Latines. Paris, Audier.^Presses FondationNat. des Sciences Politiques, 1979.
“La politique africaine au Brésil(1970-1976)”.PROBLEMES D’AMÉRIQUE LATINE,
Paris, XLVIII(474):7-64, 1978.
MARTINS, Carlos Estevam. “A evolução da política externa brasileira na década dc 64/74”.
ESTUDOS DO CEBRAP.Sào Paulo, num. 12, 3o. trimestre 1975.
MOREIRA, Adriano. Aspectos negativos da imagem reciproca de Portugal-Brasil. AMÉRICA
LATINA, Riode Janeiro, 10(l):49-64, 1967.
MOURÃO,Fernando Augusto Albuquerque. A cooperação internacional e as Relações entre os
países. CONTEXTO INTERNACIONAL, Rio de Janeiro, 3(6):53-6ü,julho-dezembro de
1987.
Da senzala ao sobrado: sentidos e metamorfoses de uma migração atlântica. REVISTA
DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO,São Paulo, 5:79-89,junho dc 1987.
Zona de paz e cooperação no Atlântico Sul. Política e estratégia, São Paulo, VI(1):49-
60,jan./mar. 1988.
PEREIRA,José Maria Nunes.“Brasü-África no governo Figueiredo: um balanço”. CONTEXTO
INTERNACIONAL,Rio dc Janeiro, ano 1,2:81-104,julho-dezembro 1985.
PEIXOTO, Antonio Carlos c SORJ. Bernardo. “Le Brésil dans le systèmc intemational”.
PROBLEMES D’AMÉRJQUE LATINE, Paris, 78:85-86,4cme trimestre 1985.
QUADROS,Jânio.“A nova política externa brasileira”. Relações Internacionais, Brasília,I(3):73-
77,1978.(Versão portuguesa do artigo escrito para a revista Foreign Ajfairs).
RANGEL,Ignácio M.“A África c outros novos mercados. Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro,
I(2):81-102, dezembro 1962.
REIS, Arthur Cczar Pereira. “África e Brasil: Relações e competições econômicas”. Revista
Brasileira dc Política Internacional, Rio de Janeiro, 6(22):209-224,junho 1963.

342
Fernando Augusto A. Moiirão /Henrique Aliemani de Oliveira

RODRIGUES, José Honório. Brasil e África. Outro Horizonte. 3. ed. Rio de Janeiro, Nova
Fronteira, 1982.
I REUNIÃO dc Debates sobre Relações Econômicas Brasil-África. Instituto Brasileiro de Estudos
Afro-Asiáticos, Rio de Janeiro, ano 11(8):1-34, abril de 1962.
SARDENBERG, Ronaldo Mota. A evolução da política externa do Brasil nas duas últimas
décadas. Brasília,julho de 1980. 27. mm.
SELCHER, Wayne A. The Afro-Asian dimension ofBrazilian foreign policy 1956-1972.
Gainsville, The University Presses of Florida, 1974.
. “Dilemas politicos nas relações Brasil-África”. ESTUDOS AFRO-ASIÀTlCOS, Rio
de Janeiro, 10:55-71,julho 1974.
SILVA, Alberto da Costa e. O Vicio da África e outros vícios. Lisboa: João Sá da Costa, 1989.

343
I

Você também pode gostar