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7 DE MARÇO DE 2023

ANO XXXIII Nº312 GRATUITO PERIÓDICO


DIRETORA JOANA CARVALHO
EDITORES EXECUTIVOS LUÍSA MACEDO MENDONÇA E FÁBIO TORRES

ACADEMIA DE MULHERES
JOÃO CASEIRO JOÃO CASEIRO / CESÁRIO SILVA JOÃO ASSUNÇÃO
2022/23 2021/22 2020/21

RENATO DANIEL DANIEL ARAGÃO RENATO DANIEL


PEDRO MONTEIRO JOÃO DIOGO ANA RITA JESUS
TOMÁS VIDAL DIOGO TOMÁZIO PEDRO MARQUES DIAS

DANIEL AZENHA DANIEL AZENHA ALEXANDRE AMADO


2019/20 2018/19 2017/18

JOÃO ASSUNÇÃO JOÃO ASSUNÇÃO DANIEL AZENHA


MARIANA FELÍCIO JOÃO FIGUEIREDO MARIANA GASPAR
JOÃO FIGUEIREDO RAQUEL MARTINS ANA FERNANDES

ALEXANDRE AMADO JOSÉ DIAS BRUNO MATIAS


2016/17 2015/16 2014/15

DANIEL AZENHA ALEXANDRE AMADO JOÃO CAROCHA


PEDRO GOUVEIA GONÇALO BENTO JOSÉ DIAS
ELISABETE SANTOS LEONARDO MARTINS
LUIS MONIZ
Legenda: Os presidentes e os seus vice-presidentes da DG/AAC nos últimos anos DANIEL REIS NUNES

- PÁG. 2-5 - - PÁG. 6-8 - - PÁG. 9-10 - - PÁG. 11 & 14-15 - - PÁG. 16-18 -
ENSINO CULTURA DESPORTO CIÊNCIA CIDADE
Repúblicos enfrentam “Sempre fui verdadeira Num mundo em que Inteligência Aritifical pode O lado menos conhecido da
problemas como inflação comigo própria e não me desporto é sinónimo de ser auxiliar para o estudo. prisão: a educação e for-
do preço de alimentos, submeti a qualquer situ- homens, as mulheres da Apesar de avanços, inves- mação profissional como
degradação dos imóveis e ação que cortasse os meus Académica lutam pelo tigadores avisam que os medida de reintegração
possíveis despejos. direitos como mulher e destaque no futsal. modelos não são perfeitos. dos reclusos na sociedade.
como profissional” - Lúcia
Moniz
02 ENSINO SUPERIOR 7 de março de 2023

CR preocupado com
sustentabilidade das casas Por Sam Martins

CR expõe adversidades de manutenção e sustentabilidade das casas. CMC considera


repúblicas uma entidade de interesse, mas “não age como tal”, declara representante
dos Paços da República Baco.
- POR SAM MARTINS E MARIJÚ TAVARES -

D
esde o século XIV, as repúblicas são “demonstração da atividade das repúblicas e da acondicionamento dos alimentos e os produtos
parte integrante da comunidade co- sua resiliência face às adversidades”. Sobretudo, com a validade a caducar”. Ana Pereira também
nimbricense. Consideradas património tencionam mostrar aos outros estudantes pre- aponta para o facto de o plafom dos serviços
histórico e cultural da cidade, existem agora 25 sentes que “há consciência dos problemas por continuar “a ser insuficiente” e que “não se sabe
repúblicas ativas, das mais de cem, desde o sé- parte das repúblicas, que os estão a manifestar”. se vai aumentar, devido à falta de respostas por
culo XIX. Os repúblicos, moradores das casas, Quando questionado sobre o documento, Pedro parte dos SASUC”.
têm vindo a reivindicar melhores condições Costa sublinha a necessidade de que “a mensa- De acordo com a representante dos Galifões,
de alojamento: procuram autonomia dos se- gem seja partilhada e ouvida”, mas “da escuta à também a reitoria da UC tarda em responder,
nhorios e também fazer frente às adversidades ação ainda vai um bocado”. “Esses comunicados “mesmo àquelas das quais é proprietária”, como
que encontram, tanto em questões logísticas, já foram feitos antes em vários momentos”, ga- a República das Marias do Loureiro e os Paços
financeiras, ou burocráticas. rante. No entanto, segundo o mesmo, a resposta da República Baco. Nestas duas casas são neces-
A burocracia apresentada aos estudantes parece ser a mesma com o passar dos anos: “Há sárias obras, uma vez que “as condições muitas
no momento de pedido de apoios à Câmara tendência para ignorar as repúblicas, porque vezes chegam a ser insalubres”, expõe.
Municipal de Coimbra (CMC) compromete a não representam uma fonte óbvia de lucro”, O porta-voz dos Fantasmas revela que a CMC
sua capacidade de negociação. “As casas são declara. Esta é uma realidade contra a qual as “considera as repúblicas como uma entidade
feitas pelos repúblicos e muitos não sabem casas tentam agir, sendo que “neste tempo de de interesse histórico, cultural e social, mas
como proceder”, confessa Ricardo Gomes, crise, surgem como uma alternativa face à insu- não age como tal”. Este reconhecimento não é
repúblico dos Fantasmas. Acrescenta ainda ficiência de alojamento para os estudantes mais sentido pelos moradores, visto que o município
que, apesar de os residentes terem “priorida- carenciados”, reitera. Além disso, o estudante “apresenta desculpas de enquadramento legal,
de na compra dos imóveis”, o Novo Regime de acredita que as repúblicas “fazem parte da iden- que fazem sentido, mas não são uma resposta
Arrendamento Urbano causa o “agravamento tidade da cidade e da Universidade de Coimbra concreta”. Acrescenta que a instituição camará-
da situação”. O estudante expõe a necessidade (UC)”. Por isso, considera que a atual situação ria não dá apoio monetário, ainda que pudesse
das repúblicas adquirirem as casas, sob pena de inflação económica é “incomportável” e que conceder “isenção de imposto de selo na trans-
de serem despejados. Contudo, “os preços são as casas estão preparadas para agir. missão de imóveis às repúblicas”, assim como
exorbitantes”, lamenta A carta é direcionada também aos Serviços a “isenção de IMI e AIMI”, após a sua obtenção.
O Conselho das Repúblicas (CR) deu o seu pa- de Ação Social da UC (SASUC), que fazem a dis- Os quatro porta-vozes do CR terminam por
recer sobre a situação da desejada compra dos tribuição de bens alimentares às repúblicas, informar que ainda não existe uma data para
imóveis da Real República dos Fantasmas e da mas que têm demonstrado “alguma deficiência a compra oficial dos imóveis que se dispõem a
Real República Rápo-táxo, por exemplo. Ricardo de serviço”, menciona Ana Pereira, residente fazê-lo. Não obstante, há “esperança de que seja
Gomes revela “uma intenção geral dos senhorios da República dos Galifões. “A distribuição de ainda durante o segundo semestre”. Conclui
de vender [os imóveis] a alojamentos locais”. alimentos, que era semanal, agora é quinzenal ao relembrar que “é importante manter uma
O CR apresentou em Assembleia Magna uma devido à ausência de motoristas e carrinhas fri- comunicação ativa com todas as partes”.
carta aberta que, de acordo com Pedro Costa, goríficas por parte dos SASUC", explica a porta-
representante dos Paços da República Baco, é a voz. Refere ainda a “falta de variedade, o mau
7 de março de 2023 ENSINO SUPERIOR 03

Estudantes em situação de emergência


por razões humanitárias: uma realidade
diferente
Iniciativas de integração e apoio pela UC e SNS consideradas insuficientes. Reda
Chihab destaca esforço de professores na integração linguística.

- POR ANDREÍNA DE FREITAS E SOFIA MOREIRA -

A
crise migratória na Europa é reco- de estudantes em situação de emergência por a dar a conhecer as secções culturais e a convi-
nhecida como uma situação huma- razões humanitárias aumentou. Esta crise in- ver com outros alunos”. A atividade iria servir
nitária grave que, de acordo com o tensificou-se “sobretudo com os conflitos na para “criar uma rede de apoio mútuo” e “expor
Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Síria e na Ucrânia”, disse ao Jornal A CABRA a AAC como um espaço que conta com diferen-
Refugiados (ACNUR), atingiu níveis críticos em Dan Klajnberg, aluno de mestrado de Relações tes apoios, pedagógicos ou sociais”, explicou.
2015. Com oaumento de migrantes a tentar che- Internacionais na Faculdade de Economia da UC No entanto, a resposta das secções culturais foi
gar à Europa, deu-se o maior movimento de pes- (FEUC) e responsável pelo pelouro de Relações escassa "para a importância e a complexidade
soas em busca de proteção internacional desde Internacionais da Direção-Geral da Associação do projeto”, destacou o estudante da FEUC.
a Segunda Guerra Mundial. O vice-presidente Académica de Coimbra (DG/AAC). Em relação a combater a xenofobia que estes
da Comissão Europeia, Frans Timmermans, Segundo o estudante da FEUC, a UC abriga estudantes podem enfrentar na UC, Dan
apresenta as guerras, conflitos internos, fome 68 estudantes refugiados, dos quais 17 são ni- Klajnberg considerou tratar-se de “uma si-
e perseguição religiosa como razões para a che- gerianos, dez são ucranianos, outros dez são tuação complicada”, mas julgou que o primei-
gada destas pessoas vindas da África, Médio marroquinos, oito são paquistaneses, outros ro passo é criar atividades “onde possa haver
Oriente e da Europa de Leste. oito são sírios e um é venezuelano. Reda Chihab, uma partilha de experiências”. Por outro lado,
Foram enviados 1440 pedidos de asilo a aluno do Departamento de Arquitetura da UC Reda Chihab mencionou não ter passado por
Portugal no ano de 2021, a maioria dos quais, (DARQ), está na cidade há um semestre, prove- nenhuma situação xenófoba desde que che-
segundo o ACNUR, vieram do Afeganistão, de niente de Marrocos. O estudante demonstrou gou à faculdade. Realçou ainda a amabilidade
Marrocos e da Índia. No entanto, Portugal foi satisfação em relação ao seu processo de adap- dos seus professores, que tentam diminuir a
um dos países que menos recebeu refugiados tação ao ambiente universitário português. Por barreira linguística.
da União Europeia, com uma taxa de recusa outro lado, Dan Klajnberg revelou que o senti- Segundo o estudante do DARQ, a responsabi-
próxima aos 40 por cento, de acordo com o mento não é partilhado por todos os alunos na lidade de prestar apoio psicológico aos discentes
Relatório Estatístico do Asilo 2022, elaborado mesma situação. refugiados é do Serviço Nacional de Saúde (SNS),
pelo Observatório das Migrações. Apesar de reconhecer como “notórios” os es- que, a partir de 2020, começou a disponibilizar
O mais recente conflito bélico, que provocou a forços da UC na integração desta comunidade linhas de apoio psicológico em inglês. Ainda
deslocação de milhares de pessoas, foi a guerra estudantil, Dan Klajnberg comentou que “ainda assim, estes serviços do SNS e da UC “estão bas-
Rússia-Ucrânia, que se iniciou em fevereiro de são substanciais as dificuldades dos refugiados tante lotados", destacou o membro da DG/AAC,
2022. Desde então, estima-se que haja 14 milhões na UC”. Aponta também que “o maior obstáculo o que significa que “vários estudantes saem pre-
de nacionais ucranianos deslocados. Como re- que eles enfrentam é a língua”, e Reda Chihab judicados pela falta de disponibilidade”.
sultado, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras concordou. Segundo o estudante marroqui- Por último, Dan Klajnberg fez um pedido de
(SEF) relata que Portugal outorgou cerca de 53 no, o idioma tem sido o maior obstáculo no seu aproximação a todos os membros da comunida-
mil proteções temporárias a estes cidadãos. processo de adaptação, pois nem todos os seus de académica aos estudantes refugiados, pois
Informa ainda que os pedidos de proteção de colegas sabem exprimir-se em inglês. “passam por uma situação particular e pre-
menores representam cerca de 25 por cento do Como forma de facilitar a inclusão destes es- cisam de apoio”. O responsável reforçou que
total das requisições. tudantes, o membro da DG/AAC pensou na rea- estes “são ainda marginalizados” e que “um
Esta realidade tem também atingido a lização de uma atividade que consistia “numa simples convite ou um contato fazem uma
Universidade de Coimbra (UC), cujo número visita guiada ao edifício-sede da AAC, de forma diferença absurda”.

Por Simão Moura


04 ENSINO SUPERIOR 7 de março de 2023

“A AAC é de todos, mas não é para todos”


Condições do edifício-sede condicionam estudantes de mobilidade reduzida.
Administrador da DG/AAC sugere criação de sala de reuniões no piso zero e, a longo
prazo, concurso de projeto para adaptação do edifício-sede.
- POR MATILDE DIAS -

N
o dia 20 de outubro de 2022, na pri- atividade nas estruturas da casa. Para além das pósito de resolver o problema de forma tem-
meira Assembleia Magna (AM) do ano escadas, a seccionista indica as condições do porária. “A acessibilidade a outros pisos, pelo
letivo, o presidente da Pró-Secção de próprio chão como um entrave para estudantes menos até ao segundo, já seria uma evolução
Boccia da Associação Académica de Coimbra de mobilidade reduzida, “sobretudo estudantes tremenda”, refere o estudante. Quando questio-
(AAC), Bernardo Lopes, chama à atenção para de cadeira de rodas”, que precisam de “pisos nado sobre a comunicação para a resolução dos
a dificuldade de acesso a certos locais da cidade, planos”. Ciente da presença de uma rampa na problemas entre dirigentes e estudantes com
onde se insere a AAC. Alguns dos problemas que entrada virada para os Jardins da AAC, a asso- mobilidade reduzida, o administrador manteve
os estudantes que se encontram nesta situa- ciada relembra que esta, “por causa da chuva e que a direção da casa se pauta pela “proximida-
ção expõem de forma consensual são a falta de do frio”, já foi fechada. "Se não está a ser utili- de, quando se reúnem os fatores necessários e
rampas no edifício-sede, o piso acidentado, e a zada, não se pode sequer considerar que temos os estudantes o permitem”.
diferença de tratamento espelhada por alguns uma rampa”, lamenta. “A Académica é de todos, Em relação às propostas da criação do cargo
funcionários da Académica. mas não é para todos” conclui a estudante. de provedor do estudante com deficiência e de
Na consequência destes entraves, Bernardo Francisca Tralhão, estudante de Jornalismo um grupo de trabalho para melhorar a acessibi-
Lopes elaborou um projeto em que elenca uma e Comunicação na Faculdade de Letras da UC, lidade em Coimbra, apresentadas por Bernardo
série de fotografias do que considera edifícios fala também das condições do acesso ao edifício Lopes, o administrador afirmou que “garantir
“bem adaptados”, como exemplos de possíveis através dos Jardins, que as descreve como “um que esses estudantes sejam defendidos é um dos
soluções. Informa ainda que o envia todos os bocado vergonhosas”, devido às mesmas ra- objetivos”. No entanto, revela que este processo
anos à Direção-Geral da AAC (DG/AAC), e, até zões. Outra questão que aponta é a forma como é está “de momento, em pausa” devido à passagem
agora, “não resultou em nenhuma ação signifi- abordada pelos funcionários da Académica: “as de pasta para uma nova equipa reitoral. Ainda
cativa”. Na AM acima referida, sugeriu a criação pessoas têm tendência para pensar que, se al- assim, Diogo Tomázio acredita que a DG/AAC
do cargo de provedor do estudante com defi- guém tem um problema, deve ser tratada como vai voltar a procurar soluções em breve, a co-
ciência (separado do cargo de provedor do estu- se tivesse cinco anos, e eu tenho 25”. meçar com a nomeação de um novo provedor do
dante, já existente) e de um grupo de trabalho De forma a dar resposta a estas questões, o estudante. Para o administrador, alargar as fun-
dedicado a melhorar a acessibilidade de diversos administrador da DG/AAC, Diogo Tomázio, deu ções do cargo para englobar toda a comunidade
locais da cidade. Apesar de ambas as propostas a conhecer um concurso em que vai ser possível académica com dificuldade motora, de modo
terem sido aprovadas, o dirigente afirma que, apresentar projetos para melhorar a acessibi- a incluir funcionários e docentes empregados
até ao momento, ainda não recebeu “nenhuma lidade do edifício. Apesar de não haver datas pela UC, é uma das possibilidades.
informação” sobre estas questões. delineadas para o início, o membro da DG/AAC
Juliana Azevedo, membro da Seção de Defesa declarou que a intenção é “ter esse projeto a fun- Com Luísa Macedo Mendonça, Simão
dos Direitos Humanos (SDDH/AAC), faz suas cionar até ao final do ano letivo”. Até lá, Diogo Moura e Maria Inês Pinela
as palavras de Bernardo Lopes quando explica Tomázio mencionou a possibilidade da criação
como a acessibilidade do edifício impactou a sua de uma sala de reuniões no piso zero com o pro-

Por Simão Moura


7 de março de 2023 CULTURA 05

Por Simão Mota

Uma utopia musical no feminino


O Coro das Mulheres da Fábrica afina pelo mesmo tom: o coletivo, a música popular, a
igualdade e uma cumplicidade feminina.

- POR SIMÃO MOTA -

R
eunidas em roda, num ambiente de co- A ideia do coletivo parece ser a mais impor- fessa Vânia Couto. Para a música, o trabalho de
munhão, de braços no ar e sorrisos na tante e todas fazem questão de salientar esse recolha e de escolha de repertório está intima-
cara, trocam olhares de cumplicida- motivo recorrente. Apesar desta filosofia, a mente ligado com a filosofia do coro: “eu estive
de. O ensaio, de duas horas, começou por volta presença de Vânia Couto é a que todas pare- em casa de uma senhora nas aldeias do xisto a
das 20h30, com uns aquecimentos vocais. Num cem reconhecer como a que mais sobressai. No fazer recolhas e trouxe esta canção... quando
altar improvisado, o piano dedilhado por Neli entanto, a coordenadora tenta contrariar esta eu sinto que esta gente está a cantar a canção
Beloti, uma das coordenadoras, de 58 anos, se- ideia: “existe uma espécie de anarquia orgâni- que essa senhora me ensinou, choro. Isto é uma
gura a afinação para os primeiros exercícios. ca - todas decidem, votam, sabem quais são os homenagem a todas as pessoas que nos dão o
A coordenadora, que organiza e estrutura os ‘cachets’, quem ganha o quê, o que se faz e as património musical que herdámos”.
arranjos do coro, interrompe uma e outra vez decisões surgem de forma natural”. Apesar de A vontade de fazer parte de um coletivo mu-
os aquecimentos, em busca de uma voz que, es- rejeitar o título de líder, reconhece que “um co- sical feminino, com um repertório de música
condida pelo grupo, se desviou do tom. A reação letivo é utópico”, mas acredita na possibilidade popular, ligou pessoas de áreas distintas como
do coro não é de embaraço, mas de tranquili- de “um coletivo em que todas podem decidir”. Cláudia Morais, responsável de comunicação,
dade. A harmonia e a cumplicidade são os tons A coordenação dos assuntos correntes está de Sofia Coelho, atriz, e Katrin Pieper, doutoran-
que ligam os diversos naipes. “Normalmente há tal forma assegurada pelas equipas de gestão da. “Era mesmo disto que o grupo precisava,
três vozes... nós chamamos baixas às contral- que, durante os ensaios, Vânia e Neli podem sentia-se a falta de um espaço como este, um
tos, as rasas são as mezzo-sopranos e as ribas dedicar-se ao trabalho musical. coletivo só de mulheres e com música tradicio-
são as sopranos”, diz Neli com um sorriso. Embora só tenha iniciado a sua atividade em nal portuguesa”, diz Cláudia Morais. Apesar
Depois de voltar a afinar no tom certo, o coro outubro do ano passado e ter estreia prevista da exigência dos ensaios, Catherine confessa:
retoma os aquecimentos. Em meia-lua, as mu- para novembro deste ano, o coro tem aprovei- “faz-me muito bem vir cá e sentir o espírito do
lheres levantam os braços, gargarejam e ba- tado uma grande divulgação mediática e uma grupo. Durante a semana toda fico ansiosa pela
loiçam ao ritmo do exercício. Vão testando se- onda de apoios. O trabalho em torno do tema próxima quarta-feira”.
gundas e terceiras vozes, ao mesmo tempo que popular “Desenrola o Teu Cabelo” foi motivo Quanto ao futuro, segundo Vânia Couto, os
se distribuem pela sala do Atelier A Fábrica - o de interesse por parte de Tiago Pereira, dire- planos são “fazer concertos em salas, auditórios
espaço cultural, situado na baixa da cidade, que tor do projeto A Música Portuguesa a Gostar e apresentar um espetáculo performativo com
recebe o coro todas as quartas feiras. Os movi- Dela Própria, que decidiu gravar o grupo em encenação própria, movimento, texto, ilustra-
mentos de baloiço vão-se tornando circulares janeiro deste ano. ção, totalmente concebido e executado pelas
e, aos poucos, forma-se uma grande roda que si- Durante o ensaio, este tema volta a ser tra- mulheres do coro”. No final do ensaio arrumam-
mula o trabalho no campo. As rédeas do ensaio balhado e parece estar mais assente, passadas se os materiais, organizam-se os transportes e
são, nesta altura, entregues a Vânia Couto, mú- duas repetições. Depois de um demorado esfor- fazem-se as despedidas. Ficou a imagem singu-
sica profissional e outra das impulsionadoras ço por uma passagem de um tom maior para lar de que n´A Fábrica, onde ensaia o Coro das
do coro. Desta vez, ao alternar entre viola e um menor, surgem os aplausos espontâneos... Mulheres, as máquinas são afinal vozes, o ruído
adufe, o trabalho intensifica-se, com uma de- “Às vezes tenho vontade de chorar, fico muito é harmonia e as operárias constroem, com o seu
morada análise de cada parte do coro. Os naipes emocionada. Fico mesmo feliz ao saber que sen- canto, uma utopia no feminino.
têm que estar bem conjugados e em sintonia. tiram união e beleza naquele momento”, con-
06 CULTURA 7 de março de 2023

As multitudes artísticas de uma mulher:


a carreira de Lúcia Moniz
Artista compartilha maiores desafios enquanto mulher no seio da indústria artística
em Portugal. “É preciso acreditar que tem de haver igualdade: não só nas artes, mas
em todas as profissões”, defende.
- POR RAQUEL LUCAS E ANA FILIPA PAZ -

T
em-se destacado em diferentes no espetáculo. Isto aconteceu logo a seguir ao eu ainda não tentei fazer, mas também não
ramos artísticos. Sente que ficou Festival da Canção, tinha 19 anos. Aí comecei diria que sou capaz de tudo. Se me chegasse um
alguma coisa por fazer? a ter um envolvimento diferente com o teatro, desafio que não estava nada à espera, eu iria
Quando achar que já fiz tudo não é bom sinal. mais presente, vivo. Durante os ensaios o ence- querer analisar de forma a perceber se é para
Eu não faço uma 'checklist' do que já fiz ou não. nador escreveu-me um texto e criou uma perso- mim ou não. Para já, não gosto de prever isso.
Considero-me uma pessoa privilegiada no meu nagem para mim. Tudo isso foi novo, mas tive
percurso profissional, tenho sempre conse- imenso prazer e foi aí que comecei a ponderar Tem alguma colaboração de sonho?
guido seguir as minhas aptidões no mundo seguir o ramo da representação. Tenho colegas atores, atrizes e até realiza-
das artes e concretizar projetos que as envol- dores, que admiro muito e com quem gosta-
vem, tanto na música, como na representação. Em 2003 recebeu um convite para participar ria muito de trabalhar. Às vezes cruzamo-nos
Com a escrita não arrisco tanto, gosto mais no filme britânico ”Love Actually”, estrean- em encontros de artistas e fica no ar a ideia de
de ler do que escrever. do-se a nível internacional. Também foi pre- uma colaboração, não é algo que idealize ou
miada com a longa metragem “Listen”. Como um objetivo. São coisas que eu gostaria muito
Alguma vez pensou em seguir outro tipo de foi fazer este salto para fora do país? que acontecessem, mas acho que não tem de ser
percurso profissional? Fiz o ‘casting’ para o “Love Actually” em forçado ou influenciado.
Não. Quando era pequenina queria ser baila- Portugal, que foi depois enviado para Madrid
rina. No meu oitavo ano queria ser ‘designer’ e daí para Inglaterra. Foi a minha primeira ex- Como foi a experiência de sair do 'spotlight'
e foi o que estudei na faculdade por dois anos. periência de ‘casting’ de cinema, e ajudou-me e encenar a peça infantil "João Sem Medo"?
Lá está, tudo rondava as artes. Já tive vários a perceber o que queria daí para a frente, além Isso foi outro desafio! Foi algo proposto pelo
sonhos de outras facetas, mas sempre no seio da música. A oportunidade surgiu porque fazia Marco Medeiros que é um encenador da compa-
artístico, porque cresci nesse meio. Não só os pequenos trabalhos como atriz. Quando me vi nhia Palco13. Ele propôs-me: "gostava muito que
meus pais, como também as pessoas que fre- naquele meio, a lidar com aquele nível de traba- encenasses as aventuras do João Sem Medo". Eu
quentavam a minha casa, que conviviam com lho, apercebi-me de que, se eu quisesse seguir nunca tinha dirigido uma peça na vida e ainda
eles… tive um contacto muito direto com artis- cinema, estava na altura de o levar mais a sério. lhe disse "és maluco" (risos). Lá está, uma coisa
tas. No meu caso, foi algo natural. Foi então que comecei a fazer mais 'workshops' que eu se calhar diria “nunca vou fazer”. Fiquei
e formações que me dessem ferramentas para assim a pairar um bocado e a pensar "faço ou
Diria que ter crescido com pais músicos in- enfrentar outros desafios desta área. não faço?”. Então, desafiei o meu irmão, porque
fluenciou a sua relação com a música? não me sentia ainda preparada para pôr um
Sim, sem dúvida. O meu avô era pianista e Qual foi o convite mais irrecusável da sua espetáculo de pé sozinha. Isso foi fantástico, já
o meu bisavô era maestro de orquestra e vio- carreira? E qual o mais desafiante? tinha visto peças produzidas pelo meu irmão
linista. Está-me no sangue. Também cresci a Em relação aos desafios, gosto sempre de en- e acabámos por trabalhar juntos. Ele foi o meu
ouvir música, fiz muitas tournées pelo país na carar aquele com que estou a trabalhar no mo- assistente, mas, na verdade, acabou por ser um
barriga da minha mãe. Estudei no conserva- mento como principal. Há, sem dúvida, pro- trabalho em conjunto. Foi a primeira vez que
tório, portanto também tenho essa formação jetos que me marcam e que vão marcar o meu dirigi atores, tive imenso prazer em fazê-lo, até
musical de escrever e ler música, o que é sempre percurso para sempre. Por exemplo, lembro- mesmo de perceber como é que eu gostaria que
um bónus. Esse foi um percurso muito natu- me que li uma das primeiras páginas do guião a história fosse apresentada a nível estético. Foi
ral. A representação é que já foi fora do espe- do “Listen” e deu-me alguma coisa… sei lá... um espetáculo muito bonito que vou sempre
rado, mas, mesmo assim, não está totalmente quis ligar à realizadora a dizer-lhe "eu quero recordar com muito amor.
fora do meu ADN. fazer isto!". Sabes quando não queres perder
mais tempo porque achas que um segundo de- Qual a área a que tem dedicado mais tempo?
Como é que surgiu a representação na sua pois já é tarde demais? Disse-lhe: "só estou nas Neste momento, na ilha Terceira, eu e o
vida? primeiras páginas, mas já percebi que quero meu irmão vamos dar aulas de teatro, que é o
A minha avó materna foi a primeira funcio- fazer parte desta mensagem, desta causa que que vou fazer daqui a bocadinho. Temos um
nária pública e a primeira mulher a fazer rádio estás a abraçar a partir da tua expressão ar- grupo de 28 jovens no qual abordamos todas
na ilha Terceira, onde chegou a criar uma per- tística, portanto conta comigo!", e foi assim. as técnicas teatrais e exercícios de improvi-
sonagem. Pode ter sido daí que herdei o meu Não me desiludi, de todo. Foi muito especial. sação, bem como tudo o que possa acontecer
jeito para teatro e gosto pela representação, A nível de desafio mais recente como atriz, a a partir daí... É uma forma de nos desinibir-
mas era algo que estava muito longe daquilo série Santiago, que estreou na Opto, foi uma mos, discutir assuntos, ter um espaço de-
que eu projetava no ramo profissional. Estava grande montanha russa. mocrático para exprimir opiniões e perce-
muito focada na música, mas tive a oportunida- bermos quais são as nossas inseguranças e
de de compor para uma peça de teatro e, no de- O que nunca se imaginaria a fazer? vencê-las. O teatro tem todas essas capacidades!
correr dos ensaios, chamaram-me para cantar Não sei. Não quero dizer não a uma coisa que Est á a s er um des a f io es pet ac u la r.
7 de março de 2023 CULTURA 07

Já estamos no terceiro ano e todos os anos en- recordei uma história, que me chocou e me fez interventiva, que queira dar voz a quem não
cenamos um espetáculo com eles. perceber a minha condição de mulher. Na altu- a tem devido à opressão. Este livro deu-me
ra do "Love Actually", em 2003, antes do filme força para falar. A literatura e, em especial,
Aproximando-se o Dia Internacional da sair, encontrei uma agente inglesa - porque o esta obra, foi e é um grande exemplo de mani-
Mulher, qual a sua figura feminina de filme ia sair e ia ser exibido no mundo inteiro festação pela arte, por ter conseguido fazer o
referência? - e íamos começar a trabalhar. Entretanto en- chão tremer. A arte tem essa força de provocar
Ahh! Isso é... uff... Não consigo nomear uma fi- gravidei e liguei-lhe, estava super feliz quando quem não quer ser provocado.
gura! Posso falar de três mulheres. Estou agora lhe disse: "estou grávida, vou estar um bocadi-
a trabalhar nas "Novas Cartas Portuguesas", nho mais condicionada, a barriga vai crescer! Que mensagem gostava de passar a uma mu-
obra literária da Maria Isabel Barreno, da Queria que soubesses disto". Ela disse-me: "vais lher que está agora a iniciar um percurso
Maria Teresa Horta e da Maria Velho da ter de escolher, porque estás numa altura da nas artes em Portugal?
Costa. Nestes últimos meses têm sido as mi- tua carreira em que tens todas as oportunida- Eu nunca tive jeito para fazer esse tipo de coi-
nhas grandes referências femininas. Estou a des à tua frente. Portanto, ou és mãe ou segues sas, não arrisco. No meu percurso comunico
organizar uma espécie de maratona de leitura a tua carreira". O pior é que foi uma mulher a com outras mulheres, já servi de apoio a algu-
com a obra para assinalar o Dia Internacional fazer-me isto, o que é mais grave. Aquilo bateu- mas e fui apoiada por outras. Uma coisa que eu
da Mulher. Portanto, estas três mulheres são, me... pff sei lá! Eu fiquei congelada. Fiquei cho- possa dizer concreta, não sei. Que horror! Posso
sem dúvida nenhuma, uma referência enorme cadíssima, triste, foi muito chocante. Só conse- dizer que aquilo que fiz no meu percurso foi ser
de resistência, coragem e luta pelos direitos da gui descrever o que senti anos mais tarde. Na verdadeira comigo própria e não me submeter
mulher através da arte. altura ela diz-me aquilo - escolhe. Eu disse, "ok, a qualquer situação que sinta que é um cortar
já escolhi, vou ser mãe"! E foi o que aconteceu. dos meus direitos como mulher e como profis-
Que dificuldades é que sentiu enquanto Não hesitei, porque não tinha sequer dúvidas. sional. É preciso acreditar que tem de haver
mulher no seio da indústria artística em Agora, ser posta nesta situação é muito grave. igualdade: não só nas artes, mas em todas as
Portugal? profissões, as mulheres e homens podem exer-
Umas de forma mais direta, outras menos, Como é que a arte pode servir de forma de cer todo o tipo de funções.
porque o sistema funciona assim… Só pelo contestação em prol da luta feminista?
facto de sabermos que há mais papéis para ho- As "Novas Cartas Portuguesas" são um gran- Com Marília Lemos
mens do que para mulheres. Há pouco tempo de exemplo, o que é transversal a toda a arte

Por Duarte Nunes


8 CULTURA 7 de março de 2023

Rodrigues e Mota: o renascer das cordas


de Paredes
Peças inéditas de Artur Paredes gravadas por trio de guitarristas. Contacto com
familiares e amigos do músico permitiu “acesso a um outro lado do artista, muito mais
pessoal”.
- POR BRUNA PASSAS - COM MARÍLIA LEMOS E ANA FILIPA PAZ -

E
mpregado bancário e músico nos tem- souros”. O guitarrista caracteriza Artur Paredes continuidade e sucesso do projeto: “tivemos a
pos livres, Artur Paredes tornou-se um como perfecionista: “chegou a tirar o seu traba- sorte de ser acarinhados e quase apadrinhados”
dos principais nomes de referência da lho do mercado por sentir que não estava bom durante todo o processo. Uma destas pessoas é
guitarra de Coimbra. Fez da música popular o suficiente”, relata. a compositora Luísa Amaro, que trabalhou com
e da canção coimbrã aliados, tendo consegui- A sonoridade específica do pai da guitarra de Carlos Paredes, herdeiro do legado de Artur
do revolucionar a arte da qual já era mestre. Coimbra deve-se a uma técnica própria: “o de- Paredes. A também guitarrista proporcionou
Criou a sua própria técnica de mão direita, que dilhar da guitarra portuguesa toca-se com o ao trio “uma viagem fantástica”, ao partilhar
manteve para si, até mesmo quando tocava em indicador para dentro e fora e o polegar para um espólio de fotos da família Paredes, relata
público. Hoje, as “variações” de Artur Paredes dentro”. Através de gravações e algumas foto- Simão. Ao terem acesso a retratos privados, o
fazem-se ouvir pelas mãos de Tiago Rodrigues, grafias antigas, “percebeu-se que Artur Paredes trio conseguiu retroceder no tempo e ter “acesso
acompanhado por Simão Mota, na guitarra, e usa o dedo anelar e às vezes o médio”, explica a um outro lado de Artur Paredes, muito mais
Vasco Rodrigues, na viola. Simão Mota. Foi necessária uma escuta “atenta pessoal”, confidencia o membro do grupo.
Tiago Rodrigues e Simão Mota contam que e demorada” das gravações, por parte de Tiago Para Tiago, Simão e Vasco, a importância
a vontade de fazer um estudo dos temas de Rodrigues, cuja qualidade estava comprometi- deste projeto passa por divulgar as peças nunca
Paredes surgiu quando Jorge Gomes, profes- da pela tecnologia rudimentar da altura. Este antes ouvidas, com o maior número de pes-
sor de guitarra na Secção de Fado da Associação trabalho minucioso acabava por “ser recom- soas possível. O trio estreou-se no Convento
Académica de Coimbra, e Jorge Serra, colecio- pensado pela descoberta”, ao mesmo tempo São Francisco e fez outra atuação no Museu
nador do trabalho do músico, lhes mostraram que validava aquilo que o membro do grupo Nacional da Música. Neste momento, os três
“gravações inéditas de espetáculos ao vivo e tinha escrito, confessa. músicos estão a gravar um disco e a preparar
programas de rádio”. Tiago ficou responsável Segundo Simão Mota, o grupo regista a impor- uma apresentação no Palácio de Monserrate
por decifrar as peças, que interpreta como “te- tância fundamental de algumas pessoas para a em abril.

CERAMICAR-TE: novo espaço para criar


“Colocar a mão na massa e experimentar” é lema do atelier. Projeto conta com cursos de
três modalidades diferentes.

- POR JORGE CORREIA -

N
o dia 24 de fevereiro o CERAMICAR- tinha de conciliar o gosto pela arte de trabalhar de maior duração e com material incluído; e a
TE abriu as portas à cidade. O ate- o barro com a sua vida profissional. Só quando “Ceramicando na Roda”, a longo prazo, para
lier surge com o objetivo de promo- chegou a Portugal lhe foi possível dedicar-se iniciantes que queiram trabalhar com a roda
ver um maior contacto dos habitantes locais apenas à cerâmica e fazer um curso na área. de oleiro. Todas estas atividades acarretam
com a cerâmica. O espaço está localizado Terminada a formação, a artista e uma colega um custo associado.
no Lufapo Hub, um centro que impulsiona decidiram iniciar o seu próprio projeto. Juliana refere ainda que, apesar da sua “forte
a aceleração de projetos artísticos aliados Quando a iniciativa arrancou, abrir um ate- trajetória” na cultura portuguesa, a arte de
a indústrias criativas. lier no centro da cidade não era uma opção, por trabalhar o barro “não está na rua” e as pes-
Segundo a proprietária do CERAMICAR-TE, motivos financeiros. Além disso, a necessidade soas não a experimentam, pelo que a missão
Juliana Marcondes, a inauguração foi um su- de adquirir materiais - como o forno e a roda de do CERAMICAR-TE é contrariar esse rumo. “A
cesso e o público “gostou bastante do espaço e oleiro - acabou por pesar na decisão de descen- cerâmica devia ser mais valorizada enquanto
do que viu”. A ceramista refere que, nesse dia, tralizar o espaço. No entanto, Juliana conside- arte e não apenas como algo utilitário”, decla-
foram deixados pedaços de barro espalhados ra a existência de um espaço de contacto com a ra. O atelier pretende, assim, aproximar as pes-
pelo local e as pessoas passaram a maior parte cerâmica como “algo revolucionário”. soas à produção de cerâmica e adota como lema
do tempo a moldá-los. Juntaram-se a este buf- A ceramista enfatiza “a necessidade de as pes- “colocar a mão na massa e experimentar”. No
fet artístico a música e a poesia, algo que a pro- soas virem experimentar” o processo de traba- futuro, Juliana Marcondes ambiciona tornar
prietária anseia repetir. lhar o barro até à formação das peças. Para tal, o CERAMICAR-TE num “centro multicultu-
A paixão de Juliana Marcondes pela cerâmica o atelier dinamiza oficinas de cerâmica em três ral, que possa abarcar diversos tipos de arte,
não é algo recente. Começou a frequentar aulas modalidades: a “Ceramicar”, que proporciona para que as pessoas possam, não só ver, mas
num atelier há sete anos, no Brasil, pelo que uma experiência pontual; a “Ceramicando”, também fazer”.
7 de março de 2023 DESPORTO 09

Futsal feminino dignifica nome da


Académica Por Marta Tavares

Equipa federada da AAC alcançou objetivo de chegar à primeira divisão. Para jogadora
da equipa, é um projeto em evolução que merece “outras considerações”.

- POR LUCÍLIA ANJOS E MARTA TAVARES -

A
Secção de Futsal da Associação nua a ser frequente no desporto, com o futsal in- Fontes refere que a casa “pode fazer mais para
Académica de Coimbra (SF/AAC) é a cluído. Isa Fontes, jogadora da equipa sénior de ajudar”, ao ter em conta que “a equipa se encon-
casa da equipa de futsal, onde reina futsal feminino, acredita que “as mulheres têm tra numa primeira divisão e está a dignificar o
a união e se trabalha sempre para ter resulta- de provar de forma habitual que sabem fazer nome da Académica na elite do futsal nacional”.
dos de topo. Quatro jogadoras do futsal sénior tão bem ou melhor que os homens para conse- Já Mariana Rodrigues menciona que “jogam
feminino da AAC deram o seu testemunho, guir ter o mesmo impacto no público”. A equi- por adorarem o símbolo que levam ao peito e o
bem como o treinador, João Soares, da paixão pa, apesar de ter alguma divulgação, como no que ele significa”. Acrescenta ainda “o bom ca-
comum que sentem por este desporto. Canal 11, consideram que “não é a suficiente”. minho em que está o futsal”, com a esperança
A equipa subiu à primeira divisão após um ano Bruna Dias, outra jogadora, reforça que nas de que a comunidade comece a “perceber que o
agarrada à segunda. O treinador, há sete anos modalidades desportivas masculinas nota-se futsal feminino também pode dar muitas ale-
no cargo, confessa que “o segredo foi nunca ter uma visibilidade muito maior: “nem precisam grias aos portugueses e ao mundo em geral”.
desistido e acreditar no valor” que o grupo tem, de pedir que a modalidade seja transmitida”. Todas as jogadoras reconhecem o facto de ser
bem como “sentir que estava no caminho certo” Já a colega Mariana Rodrigues menciona que difícil a conciliação da vida pessoal, académi-
e que a subida ia acontecer. O treinador refere “igualar os géneros” é um desafio e um objetivo ca ou profissional com a vida desportiva, o que
que “ano após ano, a equipa conquistou todos “difícil de se conseguir”. leva a ser “precisa uma gestão de tempo gran-
os troféus a nível distrital” e a taça nacional A equipa sénior de futsal feminino apurou-se de”, mas “quando se gosta, arranja-se sempre
era também uma meta. Acrescenta que sempre o ano passado para o Campeonato do Mundo forma de o fazer”. Joana Dinis comenta que,
houve a ambição e o sonho da equipa subir para de Futsal. As jogadoras sentem, no entanto, para quem quer começar a fazer desporto, basta
a primeira divisão. que não estão a receber a devida divulgação. “estabelecer prioridades e objetivos”.
No final de cada época, segundo João Soares, Mariana Rodrigues revela que, apesar do apu- João Soares revela que os objetivos para o fu-
o objetivo passa por “apetrechar a equipa com ramento, continuam “a aparecer em pequenos turo são “os quatro jogos que ainda faltam este
mais soluções, com mais qualidade e quantida- cortes de jornais, em rodapés ou em cantos”. ano”. O mesmo constata que a equipa “tem sido
de”. Tudo aconteceu de forma natural e nada Quanto ao apoio dado por parte da AAC, as jo- muito mais competitiva”. O plano vai passar
programado, visto que o mais importante foi gadoras federadas acreditam de forma unânime por “tentar encurtar a distância que já têm de
“o grupo manter-se junto, coeso e procurar ser que não lhes é oferecido o apoio necessário para cinco pontos para o topo”. Conclui que “querem
cada vez mais forte”, explica. O treinador refor- alcançar mais títulos e terem as devidas condi- aproximar-se das melhores [do país] para que
ça com a frase incentivadora: “insiste, persiste ções para treinar. Joana Dinis adiciona que “é o nome da Académica seja visto como um ele-
e não desiste”. um projeto que está a evoluir e que precisa de mento forte do futsal feminino”.
No entanto, a desigualdade de género conti- outras considerações”. Para complementar, Isa
10 DESPORTO 7 de março de 2023

RYHEALTH e a promoção de hábitos


saudáveis
Projeto europeu coordenado pela UC visa promover atividade física entre jovens.
Iniciativa começa em Coimbra com olhos postos no resto do mundo.

- POR TOMÁS BARROS -

A
Universidade de Coimbra (UC) vai coor- A iniciativa, que se encontra ainda numa fase “começar a intervir o mais rápido possível”, e
denar um projeto europeu, denomina- embrionária, ambiciona que os próprios jovens, adianta ainda que, primeiro, algumas escolas
do RYHEALTH. Este Tem como princi- numa segunda instância, levem até casa novas do distrito de Coimbra vão servir de estudo pi-
pal objetivo incentivar a atividade física junto rotinas e dinâmicas que desafiem os próprios loto para a aplicação do projeto. Foram estabe-
de crianças entre os seis e os 16 anos. A respon- encarregados de educação a aderir a estilos de lecidos protocolos com escolas de Vilarinho do
sável pela iniciativa, Paula Tavares, também vida mais benéficos para a saúde. “Uma criança Bairro e da Sertã, o que no entender de Paula
docente da Faculdade de Ciências do Desporto e que faz exercício de forma regular vai ser mais Tavares é importante porque, mesmo den-
Educação Física da UC (FCDEFUC), defende que seletiva e vai procurar alimentos mais saudá- tro da cidade, existem realidades e contextos
o exercício físico pode ser o catalisador que os veis”, assim defende Paula Tavares. sociais distintos.
jovens precisam para adotar hábitos saudáveis Esta iniciativa vai tentar deixar uma marca
sem que estes lhos sejam impostos. Nome de origem inglesa, mas com um sig- significativa até 2025, data em que finda, naque-
O projeto alicerça-se em quatro pilares: edu- nificado transversal le que Paula Tavares afirma ser um “programa
cação física, alimentação saudável, alegria e Paula Tavares admite que ainda não foi con- mais abrangente” que outros do mesmo âmbito.
sustentabilidade. Com este último como pano seguida uma tradução “muito boa para portu- Por esta razão, o objetivo não é ficar por aqui,
de fundo, a coordenadora considera que é fun- guês” de RYHEALTH. Esta sigla, que simboliza mas sim estender a ideia pelo resto da Europa,
damental “ter um planeta limpo e bem con- uma abordagem mais abrangente para a pro- uma vez que conta com a colaboração de insti-
servado para ser possível manter os outros pi- moção de uma vida saudável, pode ser resumida tuições espanholas e alemãs para esse mesmo
lares”. Paula Tavares deixa claro que o que se pela possibilidade de se ser saudável e de se ter efeito.
pretende é que “os hábitos não sejam impostos liberdade de escolha, explica..
pelo exterior, mas que sejam intrínsecos”. A docente vinca que o RYHEALTH almeja

Andebol da Académica continua na


batalha pela manutenção
Treinador aponta para necessidade de investimento na Secção de Andebol. Académica
conta com oito jogos para garantir objetivo.

- POR GUSTAVO ELER -

A
Secção de Andebol da Associação tudantes que ingressaram na Universidade de financeiro: “para subir à primeira [divisão], é
Académica de Coimbra (SA/AAC) Coimbra. Ao mesmo tempo, têm elementos que preciso profissionalizar a equipa muito mais”.
ocupa o décimo terceiro lugar da subiram pelas camadas jovens, ou pessoas que Acima de tudo, “é importante haverem mais jo-
Zona 2 da Segunda Divisão do campeonato se mudaram para a cidade em trabalho e prati- vens em formação, para daqui a uns anos a equipa
nacional. Com esta classificação, a equipa en- cam o desporto por gosto. conquistar troféus”, ressalta.
contra-se nos lugares de despromoção e luta Segundo o treinador da equipa, o “desempe- Não é apenas a SA/AAC que sofre destes pro-
pela permanência na liga. Com 25 pontos, a nho não é o ideal” e acreditava ser possível “con- blemas. De acordo com o técnico, o problema é
equipa masculina de andebol está a quatro seguir a manutenção um pouco mais cedo do nacional: “as pessoas só veem futebol, pelo que
pontos da ADC Benavente. que o esperado”. Sandro Gomes aponta para a o andebol não tem tanta transmissão na comu-
Sandro Gomes assumiu o cargo de treina- falta de investimento na secção, pois “todas as nicação portuguesa”. Nas palavras de Sandro
dor da equipa no ano passado, durante a época outras equipas [do campeonato] têm-no supe- Gomes, a falta de visibilidade do desporto gera
2021/2022. No dia 28 de fevereiro, a AAC sofreu, rior ao da SA/AAC e estão muito mais fortes”. desinteresse também por parte de possíveis in-
nas palavras do mister, uma “derrota complica- Contudo, salienta que “não é necessário grande vestidores e empresas, o que atrasa as melho-
da” contra o Estarreja FC. Não obstante Sandro investimento financeiro, pois é mais uma ques- rias necessárias.
Gomes garante que o plantel continua com o tão de apoio e de protocolos”. De momento, faltam à Académica oito jogos a
“trabalho árduo para atingir o objetivo” desta Na presente temporada, os atletas da disputar. O próximo acontece dia 18 de março,
temporada, que tem sido, tal como no ano pas- Académica contam com três vitórias, um contra o Sport Clube Horta, que se encontra em
sado, garantir a manutenção. empate e 15 derrotas. Para Sandro Gomes, terceiro lugar, com mais 19 pontos.
A equipa conta com jogadores vindos de vá- a base para uma melhoria no desempe-
rias zonas do país. Parte dos membros são es- nho é o investimento, mas não apenas o
7 de março de 2023 CIÊNCIA E TECNOLOGIA 11

Quando for grande quero ser Engenheira


Áreas de tecnologia e engenharia com menos de trinta por cento de feminização.
Coordenadora do IPN defende data de “afirmação” do Dia Internacional da Mulher.

- POR EDUARDO NEVES E SOFIA RAMOS -

O
número de empregados na área da Percentagem de mulheres empregadas por setor

tecnologia a tempo inteiro chegou


aos 62 milhões no início deste ano, se-
gundo a plataforma Statista. De acordo com
a mesma fonte, profissionais no campo são
“dos mais requisitados a nível mundial”. O Primário

European Institute for Gender Equality afir- Secundário


Terciário

ma que há ainda uma “proporção baixa" de mu-


lheres nas áreas STEM - ‘Science Technology
Engineering and Mathematics’.
Seg undo dados da Direção- Geral de
Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC), as Por Eduardo Neves

mulheres lideraram na finalização de ciclos de


estudo no Ensino Superior em 2020. A maior o curso. “Não é muito comum haver mulheres no concelho. Coimbra foi escolhida também
parte destas estudantes forma-se, na sua gene- em tecnologia” e admite que, quando entrou, como sede de outras empresas na área, como
ralidade, nas áreas de Direito e da Saúde. No tinha apenas duas colegas mulheres da área. a The Loop Co., onde Maria Cação se encontra
gráfico 1 pode-se reparar a relação entre estu- Apesar da discrepância de números, garan- empregada, e a Bettertech, com edifícios na
dantes do género feminino e todos os inscritos te que apenas sentiu diferenças significativas Praça do Comércio.
em cursos do Ensino Superior. As áreas repre- durante a licenciatura. Em 2015, a Organização das Nações Unidas
sentadas são referentes aos dois campos mais “Não é bem discriminação por saber menos (ONU) introduziu a comemoração do Dia
escolhidos pelas mulheres universitárias e a como mulher, mas sermos sexualizadas”, a an- Internacional das Mulheres e Raparigas na
Tecnologia e Engenharia. Estes últimos são os tiga estudante partilha. Afirma que “às vezes Ciência, celebrado a 11 de fevereiro. Esta data
menos feminizados de entre as dez principais ouvia coisas bastante desagradáveis” e con- foi criada como forma de promover o acesso
categorias, com cerca de 17 e 28 por cento de fessa que isto afetou as suas interações sociais destes grupos à educação, formação e inves-
taxa de feminização, de forma respectiva. dentro do curso. Mariana Cação testemunha tigação científica. Segundo a sua plataforma
Ana Brito, coordenadora de projetos que mesmo professores demonstravam atitu- online, a igualdade de género sempre foi um
no Instituto Pedro Nunes, é formada em des discriminatórias, como “apenas chamar dos objetivos principais para a ONU, em parte
Engenharia Biomédica, o que afirma ser uma raparigas ao quadro” e subvalorizar a partici- para alcançar os objetivos da 2030 Agenda for
“engenharia diferente”. Admite que, duran- pação das mesmas em trabalhos de grupo com Sustainable Development.
te o seu percurso, se sentiu “privilegiada”, membros masculinos. Em relação às mulheres já empregadas em
em parte devido à área de formação, mas que A coordenadora Ana Brito escolheu Coimbra Ciência e Tecnologia, Portugal tem uma pro-
noutras engenharias pode haver algum estig- e o IPN como seu local de trabalho, onde atua porção maior face aos homens. Segundo a
ma na contratação de mulheres. Remata que desde julho do ano passado. O motivo foi por Eurostat, a região lusitana conta com cerca de
o seu percurso “não reflete o que vejo noutras gosto, apesar de considerar a cidade “difícil”, já 53 por cento de feminização, face a 52 por cento
mulheres no meio”. que “não tem muitas oportunidades”. Destaca, médio na União Europeia no ano de 2021. A en-
Mariana Cação, antiga estudante de enge- por outro lado, o seu local de trabalho como tidade estatística confirmou também que, no
nharia informática no Instituto Superior de uma “gema” no panorama da cidade, em espe- mesmo ano, mais de metade dos cientistas entre
Engenharia de Coimbra (ISEC), partilha que cial na área da tecnologia. Este instituto foi casa as idades de 25 a 34 eram mulheres.
durante o seu estágio final foi convidada a de uma das empresas a expandir para fora de “Há muito para mudar, um homem ou uma
ficar na empresa, mesmo sem ter terminado Portugal, a Critical Software, ainda com sede mulher são iguais, não é por poder ter filhos que
se tem menos valor ou se é menos produtiva”,
enfatiza Mariana Cação. Conta como sempre
foi incentivada a seguir a área da saúde e, como
inicialmente os pais ficaram “muito chocados”
e questionaram o porquê da decisão. A profis-
sional acredita que “oferecer um carrinho a um
menino e a uma menina uma boneca” influen-
cia o percurso dos mesmos. “Em casa ninguém
me perguntou se queria ser engenheira infor-
mática”, frisa.
Ana Brito defende a existência do Dia
Internacional das Mulheres e afirma que esta
é uma data de “afirmação”, não de “divertimen-
to”. “Não se deve olhar para mulheres ou ho-
mens, na engenharia tem de se de olhar para
Mulheres Total Por Eduardo Neves pessoas”, remata a coordenadora.
12 CENTRAL 7 de março de 2023

Conselho Feminino: a outra metade da


História
“A realidade é esta: elas estão aqui. No entanto, ainda ninguém as viu…”. A história do
órgão que tentou incluir mulheres na AAC nas décadas de 50 e 60.

- POR ANA CARDOSO, LENA HERTEL E DISA PALMA -

E
m 1947, surgia numa Via Latina (VL): “A Contudo, a sua participação na AAC - secções, tinha conhecimento deste e, ao notar a sua re-
realidade é esta: elas estão aqui. Aqui organismos autónomos e Assembleias Magnas duzida expressão, almejou dinamizá-lo.
e nas outras universidades. No entan- (AM) - continuava a ser escassa. A presidente do “Ou os comunistas ou nós”
to, ainda ninguém as viu…”. Este artigo afir- CF em 1960/1961, Eliana Gersão, refere que esta No mesmo ano, em maio, começou um clima
ma que a nova Direção-Geral da Associação ausência se devia à falta de atividades e também de mudança. Uma lista de esquerda, represen-
Académica de Coimbra (DG/AAC) prevê a cria- “à imagem da mulher recatada, que tinha de tante do Conselho de Repúblicas (CR), vence
ção de uma Comissão Feminina e realça a ne- ter cuidado com os meios que frequentava e ser as eleições para a DG/AAC. A vitória de Carlos
cessidade de pensar os problemas “culturais bem comportada”. Candal surpreendeu a Academia, já que “per-
e especificamente femininos” para a rapa- Apesar da visão conservadora do CF e da sua diam sempre as eleições”, conta Eliana Gersão.
riga “cumprir a missão que traz”. Assim, em desvalorização, as estudantes eleitas procu- A nova equipa promoveu novas atividades e sec-
1948, os Estatutos da AAC incluem o Conselho ravam que as raparigas “tivessem o seu lugar ções. Eliana revela “um certo deslumbramento
Feminino (CF) e, em 1949, acontece a primei- dentro da Academia”, como se lê num artigo por conhecer novas pessoas, novas atividades e
ra eleição para o órgão. Composto por uma re- publicado na VL, em 1955. Manuela Cruzeiro novos sítios”, tal como aconteceu a “centenas de
presentante de cada Faculdade e Escola, cria- refere que “só nos anos 50 é que elas começam raparigas e rapazes”. Este ambiente fez-se sen-
va atividades “mais apropriadas e do interesse a entrar no ambiente académico”. Acrescenta tir no CF. Mantiveram as atividades anteriores,
do público feminino”. que estudar era uma “mera adição à natureza da mas fizeram outras, como a criação de sessões
“A mulher é principalmente mulher ou es- essência feminina”, que não era suposto mudar. de educação sexual disfarçadas, que tiveram
tudante?” (Revista FLAMA, 1954) O mesmo artigo relata um conjunto de inicia- “muito sucesso”.
Manuela Cruzeiro, investigadora do Centro tivas desportivas e “femininas” organizadas Devido a estas alterações, começou a inten-
de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e termina com um apelo à participação: "É às sificar-se a oposição de setores conservadores
(UC), analisou a participação das mulheres nos raparigas, a todas nós, afinal, que compete rea- face à DG/AAC, uma vez que não aceitavam uma
movimentos associativos. Na sua perspetiva, gir contra a apatia e lutar para que não volte a atitude tão favorável a uma direção de esquer-
“a evolução do CF refletiu as contradições, os perder-se o terreno conquistado”. As lamenta- da. Assim, para Eliana Gersão, a maneira que
avanços e os recuos no que respeita à partici- ções “surgem muitas vezes quando a inércia e se arranjou para fragilizar a AAC foi “atacar
pação das mulheres”. Explica que, no início, o comodismo nos invadem”, conclui. as raparigas”. Os dois meses que se seguiram
era um “grupo de jovens destinadas à missão Todavia, a proatividade destas estudantes foram “verdadeiramente infernais”.
de mães, esposas, fadas do lar”. Registos na VL não era a norma. “Notava o choque que tinham Com o intuito de fortalecer a cooperação entre
sobre a sua atividade - como costura ou culiná- as meninas que vinham sobretudo do interior as academias de Lisboa, Porto e Coimbra, em fe-
ria - corroboram esta afirmação. “Era um órgão e dos colégios de freiras”, conta-nos a vice vereiro de 1961 organizou-se um convívio Inter-
pouco valorizado, tanto que funcionava numa -presidente do CF em 1962, Isabel de Alarcão. Academias com atividades sobre os problemas
cozinha, o que indica para onde as raparigas “Vinham de um mundo muito conservador, estudantis, bailes e conversas. Contudo, “a ci-
eram remetidas”, continuou. muito fechado”, relembra. É neste contexto que dade [surgiu] coberta de panfletos” anónimos
O número de mulheres na UC aumentava. Eliana entra para o CF, em 1960. Na altura, não que insinuavam supostas “imoralidades” co-

Por Lena Hertel Por Ana Cardoso Por Joana Carvalho

Da esquerda para a direita: Eliana Gersão, Manuela Cruzeiro e Isabel de Alarcão


7 de março de 2023 CENTRAL 13

Cedida por Eliana Gersão

Tomada de Posse do Conselho Feminino para o mandato 1960/1961, onde se pode ver Eliana Gersão e Carlos Candal a assinar o livro de atas.

metidas pelas raparigas, como dormirem em Segundo a antiga estudante, a carta apresenta o aumento da presença das estudantes na AAC
repúblicas, vistas como casas de boémia apenas “uma certa sensualidade para a época”. e a “avalanche de acontecimentos” ao longo
frequentadas por rapazes, relata Eliana. Para Isabel de Alarcão, a Carta surge na altura da década de 60, o seu trabalho “foi engoli-
Perante estas críticas, o CF apoiou a posição em que “a água começava a ferver”. Acrescenta do”. Aliás, Isabel de Alarcão tomou posse em
da DG/AAC e lançou um comunicado no qual ainda que, “subjacente, está sempre a ideia de 1962 e recorda-se de ter organizado uma ativi-
repudiava “as injúrias e mentiras” dos panfle- que para chegar à liberdade é preciso a liberta- dade com pouca adesão das estudantes. Tudo
tos. Isto valeu-lhes um voto de louvor da AM, ção”. Já Eliana considera que “foi inoportuna isto leva a que o CF perca relevância e deixe
que manifestou “a sua alegria pelo progressi- porque se estavam a preparar as eleições para de fazer sentido.
vo interesse das raparigas nas iniciativas aca- o ano seguinte”. Especula que o facto de a cen- Em 1964, já havia vontade de acabar com o
démicas”. Todavia, em resposta a este voto de sura ter autorizado a sua publicação pode ter órgão, mas o seu caráter estatutário dificultava
louvor, foi convocada uma Assembleia Geral de sido “uma armadilha para fragilizar todo o o procedimento. Em 68, começa a ser repensa-
Raparigas, por estudantes sobretudo dos lares movimento associativo”. do, como consta no programa eleitoral da DG/
católicos, que aprovaram um voto de censura Deste modo, o CF volta a uma situação compli- AAC eleita, pois “o rapaz e a rapariga têm os
“pelo modo independente como [o CF] atuou”. cada. Não podiam tomar uma posição a favor, mesmos problemas”. No âmbito de uma proble-
Eliana conta ainda que foi obrigada a esco- porque também representavam as estudantes mática estudantil “não nos parece lícito estar
lher entre “os comunistas” ou permanecer na conservadoras. Por outro lado, não podiam a distinguir”. A propósito, Manuela Cruzeiro
Juventude Universitária Católica Feminina. tomar uma posição contra, visto que “isso seria conta que “a discriminação positiva não esta-
“Na AAC ninguém me perguntou se ia à missa, trair a Associação Académica”. Eliana conta que va plenamente assumida” e que ”as bandeiras
se acreditava em Deus”, revela. Para a entre- com a ajuda do Padre Miguel Pereira, professor do feminismo não tinham sido ainda postas às
vistada, era “evidente que nunca iria deixar a de Filosofia ligado a um setor progressista, es- claras”. As relações íntimas eram ”matéria do
AAC”. Porém, foi uma “rutura difícil porque, creveu um comunicado “que dá tanto para um foro pessoal”, adiciona. Refere ainda o “grande
de certo modo, era cortar com uma etapa” da lado como para o outro”. cuidado” nas demonstrações de afeto em públi-
sua vida, explica. “Houve muitas pessoas que Ao reler a Carta anos depois, Isabel de Alarcão co, pois, ainda que fossem aceites entre alguns
deixaram de me falar e cumprimentar, assim e Eliana concordam que tinha um tom paterna- estudantes, "seriam penalizadas se fossem ban-
como à minha família”, expõe. lista. Eliana diz que isso pode ter contribuído deiras assumidas publicamente".
“Separa-nos um muro alto e espesso” para irritar algumas raparigas. Contudo, refe- Assim, a luta da mulher era abafada pelas
Em 19 de abril de 1961, após os ânimos acal- re que, numa época em que os “comportamen- lutas sociais e políticas. Elas colocavam os in-
marem, surgiu publicada na VL aquilo que tos sexuais entre jovens eram muito conser- teresses do país e o combate às desigualdades
Isabel de Alarcão denomina “uma pedrada no vadores, a Carta foi um marco onde as coisas sociais como prioridades. No entanto, o de-
charco”: a “Carta a uma jovem portuguesa”. começaram a mudar”. saparecimento do CF era previsto por Eliana
Por Artur Marinha de Campos, mas assinada “Significa que a jovem e o jovem trabalham em 1961, num artigo escrito para a VL: “não
anonimamente, ousou defender o amor livre, finalmente lado a lado” (VL, 1961) significa que os seus interesses foram esque-
denunciou a existência de um muro entre ra- Segundo Manuela Cruzeiro, o CF começou a cidos, significa que [a estudante] tomou final-
pazes e raparigas, e a condição subalterna a que fragmentar-se quando Eliana Gersão e Maria mente consciência do papel que lhe pertence
era submetida. Este artigo suscitou “uma rea- da Glória (vice-presidente) ficaram sozinhas, dentro da AAC”
ção muito grande, sobretudo do setor católico”. devido aos episódios relatados. Todavia, com
14 CIÊNCIA E TECNOLOGIA 7 de março de 2023

Portugal, um país de inventoras


Percentagem ultrapassa média europeia. UC dispõe de iniciativa de promoção de
igualdade de género na investigação.

- POR LUÍSA RODRIGUES -

O
Instituto Europeu de Patentes (IEP) tido, destaca que, no seu campo, não “tem a de recrutamento, formação e comunicação in-
realizou um estudo designado de perceção de existirem desigualdades”. Porém, clusivos”. Além disso, com o propósito de pro-
“Participação das mulheres na ativida- acredita que, noutras áreas, “deve haver um mover o trabalho de investigadoras, foi cria-
de inventiva”, no qual Portugal foi considerado esforço para se verificar mais igualdade e atra- da uma rubrica designada “Mulheres da UC
o segundo país com mais mulheres inventoras tividade de oportunidades”. na Ciência”. Este projeto publica, a cada mês,
na Europa. A percentagem encontra-se nos 27 A antropóloga, quando questionada acerca o trabalho profissional de uma investigadora,
por cento, o que é mais do dobro da média eu- da promoção da Mulher na ciência, refere que como consta no site oficial.
ropeia, de 13,2 por cento. Este estudo, que foi o existem “cada vez mais esforços” nesse senti- Em Portugal, quer as instituições públicas de
primeiro da IEP, analisou todos os pedidos de do por parte da Universidade de Coimbra (UC). ensino superior, quer as de investigação, são
patentes submetidos entre 1978 e 2019 pelos paí- Daniela Rodrigues menciona a existência de as que integram o maior número de mulheres
ses que pertencem a esta entidade. De todas as “atividades para investigadoras e divulga- inventoras, com o número a fixar-se nos 36 por
regiões europeias, o Alentejo foi a que registou ções de iniciativas externas relativas à ciência cento. Por outro lado, nas empresas privadas
a maior percentagem de mulheres inventoras. para o sexo feminino”. registam-se apenas 19,4 por cento de pedidos de
Daniela Rodrigues, investigadora do Centro Segundo a página oficial da universidade, patentes submetidos por mulheres. Em relação
de Investigação em Antropologia e Saúde através da iniciativa Gender@UC, existe a in- às áreas de investigação, a química é a área com
da Faculdade de Ciências e Tecnologia da tenção de promover a igualdade de género dos mais mulheres inventoras e a engenharia me-
Universidade de Coimbra, salienta que a sua projetos dentro da instituição. Destaca-se tam- cânica é a que regista a percentagem inferior.
área é composta, na sua maioria, por alunas bém o objetivo de promover a “diversidade nas
e investigadoras do sexo feminino. Neste sen- equipas de investigação científica, processos

Prevenir para não remediar:


Especialistas alertam para a necessidade
de preparação para terramotos no país
Portugal está inserido numa zona de fronteira de placas tectónicas. Investigador
Fernando Carlos Lopes prima foco pela prevenção de sismos.

- POR EDUARDO NEVES -

U
m mês passou desde que a Turquia e tónicas ou entre falhas rochosas. Outros sismos ao registado na Turquia. São exemplos o de
a Síria registaram um terramoto de podem ocorrer por atividade vulcânica ou des- Benavente, em 1909, e o de Lisboa, em 1531, este
magnitude 7.8 na escala de Richter. O locamento de gases. último com dezenas de milhares de mortes. O
desastre registou mais de 170 mil vítimas, entre Fernando Carlos Lopes acrescenta que “há mais destrutivo em Portugal foi o terramoto
o abalo e as sequelas da destruição causada. O tremores de terra diários, mas que não são de Lisboa de 1755. Com o epicentro no oceano
terramoto foi o quinto mais mortífero do século sentidos”. Este é o caso de Portugal, visto que atlântico, ao abalo seguiu um maremoto, que
XXI. Fernando Carlos Lopes, docente e inves- se encontra num local de fronteira de placas afetou toda a região sul de Portugal.
tigador no Departamento de Ciências da Terra tectónicas, o que contribui para uma zona "sís- O docente remete para a capacidade das in-
da Universidade de Coimbra, afirma que a in- mica ativa”, como afirma o docente. O país está fraestruturas como um ponto importante para
tensidade foi “bastante elevada”. Explica tam- inserido na placa euroasiática e tem um regi- evitar repercussões neste tipo de catástrofes.
bém que a quantidade elevada de estragos foi me divergente com a placa americana, assim Lamenta “não haver preocupação por parte
devida a falhas “estruturais”. como um complexo com a placa africana. Em das autoridades” para o assunto dos sismos.
Os terramotos são formados por acumulação concreto, a nação encontra-se na micropla- Explica que estas entidades pecam na falta de
de energia em estruturas geológicas, o que leva ca da Península Ibérica, em conjunto com ordenamento de território e acredita que, na
à fragmentação destas rochas. Estes processos Espanha. Por outro lado, as ilhas das Flores e eventualidade de um terramoto, o país pode
são fruto de movimentos na crosta terrestre do Corvo encontram-se já na placa americana, e ficar “bloqueado”. O investigador afirma que
e são definidos como fenómenos de vibração a Madeira na africana. “a previsão é difícil” e, portanto, deve haver
brusca da superfície terrestre. A maioria deste Na sua história, o país já registou mais de foco na prevenção.
tipo de terramotos ocorre perto de bordas tec- cinco abalos com uma magnitude superior
7 de março de 2023 CIÊNCIA E TECNOLOGIA 15

Escreve-me aí a tese, se faz favor


A utilização de ferramentas como ‘ChatGPT’ chega ao contexto académico.
Tecnologias atuais de Inteligência Artificial criam sistemas cada vez mais autónomos.

- POR FREDERICO CARDOSO -

A
Inteligência Artificial (IA), como conta
Ernesto Costa, professor catedrático
da Faculdade de Ciências e Tecnologia
da Universidade de Coimbra (FCTUC), tem por
fim o desenvolvimento de programas capazes
de resolver problemas como os resolveriam pes- cérebro, é “a expressão atual mais avançada lacunas”, afirma o investigador. A novembro de
soas reais. Estes sistemas, no fundo, imitam o da IA”. Estes modelos, de acordo com o pró- 2022, é aberto ao público o ‘ChatGPT’, um agen-
raciocínio e os passos formulados no domínio prio, se bem treinados, permitem a um com- te conversacional que, em poucos dias, se tor-
cognitivo humano, aquando da realização de putador “reconhecer, por exemplo, qual o tipo nou uma referência na área. Salienta ainda que
uma nova tarefa, elabora. de animal presente numa imagem, tal como a sua popularidade é notória entre estudantes
O campo surgiu nos anos cinquenta através faria uma pessoa”. que, cada vez mais, utilizam esta ferramenta.
de abordagens simbólicas, “como num jogo de O cérebro humano é uma “imensa rede com- Apesar do elevado desempenho, a sua utili-
xadrez em que, para cada turno, podem existir posta por milhares de milhões de neurónios”, zação deve ser “ponderada”, visto que o mo-
várias jogadas possíveis, cada uma com regras aponta o investigador. Cada um deles é sujeito delo “não é perfeito, mas é convincente nas
bem definidas”, explica o docente. Adiciona a estímulos elétricos e, mediante estes, são pro- suas respostas”, que podem estar erradas,
que, neste momento, os métodos principais pas- vocadas respostas de forma a cumprir um obje- explica Hugo Oliveira. A complexidade do
sam por “entregar um problema ao computador tivo. A AP é baseada nesta teoria, em que cada sistema, indica o investigador, torna “difí-
para ele o aprender e resolver”. neurónio artificial “recebe sinais de entrada cil, ou até mesmo impossível” a compreensão
Assim, graças a esta mudança de paradigma, e, em função destas, produz sinais de saída” e das suas tomadas de decisão. Outro proble-
as máquinas são dotadas de uma “capacidade categoriza o resultado, ministra Ernesto Costa. ma que aponta é o facto de o agente utilizar,
de aprendizagem”, através de dados, experiên- Hugo Oliveira, docente e investigador nas como treino, o conteúdo disponível na inter-
cia e interação com o ambiente, “como faz o ser mesmas instituições que Ernesto Costa, net, que “pode conter opiniões extremistas e
humano desde a nascença”, esclarece Ernesto transmite que o Processamento de Linguagem discriminações raciais ou de género”.
Costa. No entanto, para o professor catedrático, Natural (PLN) abrange a capacidade de um pro- Sobre a sua aplicação no ensino, o docente
que já leciona há 47 anos, estas técnicas, apesar grama informático “compreender, utilizar e apresenta vantagens como “poder orientar um
das soluções que trazem, continuam com mui- responder com a língua humana”. Doutorado estudante que não saiba por onde começar”,
tos problemas “em aberto”. na área, acrescenta que esta não se prende ape- ou o aperfeiçoamento de textos. Em contraste
Ernesto Costa, também investigador nas pela criação de diálogo entre computadores com o motor de busca da ‘Google’, o investiga-
no Centro de Informática e Sistemas da e pessoas, mas também é útil em áreas como a dor avisa que o ‘ChatGPT’ não dá referências
Universidade de Coimbra (CISUC), ilustra criação de imagens artificiais a partir de texto. corretas nas suas respostas, o que torna a in-
ainda, como exemplo destas inovações, os veí- Os primeiros agentes conversacionais sur- formação “menos confiável”.
culos autónomos. “A tecnologia atual já permite giram com “conjuntos de respostas e passos Já Ernesto Costa concorda que esta tecnologia
que não sejam necessários condutores huma- a seguir, consoante as perguntas do utiliza- pode ser um “auxiliar razoável para o estudo”,
nos”, apesar de serem levantados outros pro- dor”, elucida o docente. Porém, os maiores apesar de alertar que, para o desenvolvimento
blemas, como decisões éticas e morais, expressa problemas que existiam nessas máquinas de trabalhos para as disciplinas, este “não co-
o mesmo. Fora essas questões, para o docente, eram a falta de recordação de conversas an- nhece o contexto de ensino”. O professor, que
são já “bastante perfeitos”. teriores e a fraca habilidade de lidar com se vai reformar no final deste semestre, receia
Segundo Ernesto Costa, a Aprendizagem contextos linguísticos, adiciona. a sua “má utilização” e os riscos inerentes ao
Profunda (AP), que desenha os sistemas infor- Com o avanço tecnológico, foram desenvolvi- plágio e à escrita de documentos sem uma au-
máticos de acordo com o funcionamento do dos “agentes melhorados que já suprimem estas toria própria.
16 CIDADE 7 de março de 2023

Experiência da JMJ passa também por


Coimbra
JMJ é uma oportunidade para aprofundar fé das pessoas, segundo coordenador do
Comité Organizador Diocesano de Coimbra. Cidade espera receber 20 mil pessoas na
pré-jornada.
- POR LUÍS GONÇALVES -

N
a semana de 1 a 6 de agosto vai decor- refere que “é aberto a todas as pessoas” e que que a realização da maior parte das atividades
rer, em Lisboa, a Jornada Mundial “todos podem participar, apesar do nível de fé”. da JMJ vai ter lugar no parque Tejo-Trancão,
da Juventude (JMJ). Portugal tem- Acrescenta que é “uma grande oportunidade espaço onde o palco-altar se vai encontrar.
se preparado para receber o Papa e os jo- para falar de várias temáticas e, ainda, acres- Confirmou ainda que outros locais que vão rece-
vens de todo o mundo. A diocese de Coimbra centar uma riqueza multicultural à conversa”. ber atividades são o parque Eduardo VII, Belém
não é exceção, e tem-se organizado atra- Para o bispo auxiliar da Diocese de Lisboa e e o Passeio Marítimo de Algés, onde vai decor-
vés do Comité Organizador Diocesano presidente da associação JMJ 2023, D. Américo rer o encontro do Papa com os voluntários.
(COD) e dos vários Comités Organizadores Aguiar, “o apoio do Estado Português foi decisi- O presidente da associação JMJ 2023 explica
Territoriais (COT’s) da diocese. vo para avançar com a organização da jornada”. que vão ser investidos oito milhões de euros
Hugo Monteiro, coordenador do COD de O bispo adianta que são esperadas cerca de um “para a reabilitação, manutenção e seguran-
Coimbra e também engenheiro civil, explica milhão de pessoas em Lisboa e de cem a 200 mil ça do aterro”. Segundo D. Américo Aguiar, a
que “quem se candidata a uma JMJ é uma dio- jovens na semana anterior nas dioceses. sustentabilidade é uma das temáticas centrais
cese e, neste caso, a que se candidatou foi a de Quando se fala na JMJ de 2023, um dos desta edição, com dinâmicas diferentes nas ca-
Lisboa”. Depois da capital ter sido eleita, as dio- temas que é referido é o palco-altar que vai tequeses, sem livros impressos e com a utiliza-
ceses de Santarém e Setúbal também se junta- ser construído. O primeiro pensamento de ção de garrafas de água recicladas.
ram “de forma a conceder uma maior capacida- Luís Lourenço, de 23 anos, foi o valor inicial Como Hugo Monteiro indica, “Portugal nunca
de logística”, acrescenta. Estas três dioceses são do palco, que estava previsto custar cerca de realizou uma JMJ e poucos portugueses parti-
chamadas de Comité Organizador Local (COL). 4,5 milhões de euros. Já para Carlos Luís, de 84 ciparam [fora do país], pois a primeira edição
O coordenador do COD acrescenta que cada anos, “como o dinheiro não é do governo, mas realizou-se em 1987. Por isso, termina com um
diocese tem a sua equipa de trabalho, com o ob- de todos os cidadãos portugueses, tem de haver apelo a todos os portugueses: “deixem-se aven-
jetivo de preparar o caminho para a JMJ. Além um certo cuidado ao gastá-lo”. Acrescenta tam- turar, desafiem-se e façam da jornada um pri-
disso, também lhe compete a organização dos bém que “agora resta aguardar para ver se o meiro passo de algo incrível, que é transformar
dias nas dioceses. Na semana anterior, de 26 a trabalho foi bom ou não”. a vida de cada um ao encontro do outro”.
31 de julho, vêm milhares de peregrinos, a nível Em relação aos locais, o bispo auxiliar informa
mundial, participar em experiências locais com
o apoio dos COT´s. Hugo Monteiro explica que
“diocese não tem nada que ver com distrito”
e dá o exemplo da diocese de Coimbra, que
“apanha parte dos distritos de Leiria, Aveiro,
Viseu e Santarém”.
Quanto ao envolvimento da diocese de
Coimbra, são esperados por volta de 20 mil
peregrinos, de cerca de 40 nacionalidades, na
pré-jornada. O dirigente incentiva à abertura
da comunidade e hospedagem em famílias de
acolhimento. Para Hugo Monteiro, neste últi-
mo caso, “tem-se uma melhor experiência do
que ficar num pavilhão”. Em relação a dificul-
dades, estas passam pela explicação do evento
e envolvimento de toda a diocese.
A JMJ, além de ser uma oportunidade de fé e
de abertura da comunidade católica, tem tam-
bém uma dimensão cultural e turística. O en-
genheiro civil refere também a vertente eco-
nómica, uma vez que “as unidades hoteleiras
já estão a encher”, tanto para a primeira, como
para a segunda semana.
O Jornal A CABRA saiu à rua para questio-
nar a população conimbricense acerca do as-
sunto. Cecília Figueiredo Meireles, de 27 anos,
acredita que a JMJ é um evento católico “que
junta jovens de todo o mundo”. Apesar de ser Por
PorLuís
Raquel
Gonçalves
Lucas

organizado pela Igreja Católica, Hugo Monteiro


7 de março de 2023 CIDADE 17

A educação vale a “pena”


Reclusos em Portugal têm acesso ao ensino superior. Um dos estudantes declara que se
“devia apostar mais na reinserção social”.

- POR MIGUEL SANTOS E TIAGO PAIVA -

Por Pedro Mendes

vas são remetidas para o EPC e a sua realização ção, pode-se ir à faculdade recolher materiais”,
é acompanhada por um técnico responsável. explica o entrevistado.
Durante o processo, segundo Orlando O aluno declara que “enquanto se está foca-

E
Carvalho, surgem algumas complicações, visto do no curso, não se tem tempo para focar no
ntre os milhares de indivíduos que que “o facto de as pessoas se encontrarem pre- lado mais negro da reclusão”. Considera que
cumprem pena de prisão em Portugal, sas é por si só um constrangimento”. Refere “quando se está a ler um bom livro ou a ver um
cerca de 2700 frequentam aulas desde ainda que, quanto à inscrição no ensino supe- bom filme é como se não se estivesse na prisão”.
o primeiro ciclo até ao ensino superior. Em rior, o aluno é que “manifesta a intenção de se Conclui o raciocínio ao articular a importância
protocolo com diversas instituições de educa- inscrever no curso pretendido, desde que reúna de ter um foco, e refere também Aristóteles:
ção, o Estabelecimento Prisional de Coimbra as qualificações e habilitações para o fazer”. “o pior que pode acontecer a alguém é acordar
(EPC) colabora com a Universidade de Coimbra Caso este se encontre numa fase mais adian- e não ter nada para fazer”. Assumiu-se como
(UC), o Instituto Politécnico de Coimbra (IPC) tada da pena, num regime aberto ao exterior, uma pessoa enérgica, que não se consegue in-
e a Universidade Aberta. O diretor do EPC, o sujeito detido “pode frequentar as aulas pre- serir no estilo de vida de outros reclusos que
Orlando Carvalho, garante que “de 120 indiví- senciais, como qualquer aluno normal”. “andam a deambular pelo estabelecimento,
duos que iniciaram o ano letivo, 20 frequentam Orlando Carvalho menciona ainda que “a a jogar ‘Playstation’ até às quatro da manhã
o ensino superior”. maior parte das pessoas não se encontra ha- e a acordar tarde”.
O principal objetivo do processo para os reclu- bilitada nem interessada em frequentar o A maior dificuldade com a qual o estudante
sos é “adquirir ferramentas úteis e que possibi- ensino superior”. Porém, afirma ser “notó- se deparou foi o acesso aos conteúdos, já que
litem a sua reintegração na sociedade”, explica rio o interesse pela educação, conhecimen- “não há recurso a algo tão simples como a in-
Orlando Carvalho. Para o nível básico de ensi- to e atividade física” demonstrado por cer- ternet, pelo que as aulas práticas são um pro-
no, o EPC possui um acordo entre o Ministério tos reclusos. Um destes, que foi entrevistado blema”. Segundo o mesmo, “devia apostar-se
da Educação e o Ministério da Justiça, que res- pelo Jornal A CABRA, está no terceiro ano da mais na reinserção social”. Declara ainda que
ponde à necessidade inicial do desafio, desde Licenciatura em Turismo em Áreas Rurais e “a prisão é um ambiente complicado, muito di-
o primeiro ciclo até ao ensino complementar. Naturais no IPC. Revela que “está a ser uma ferente do lado de fora”. Além disso, confessa
O diretor destaca que “há casos de alunos que boa experiência”, embora as matérias lhe che- que “ir à rua é um choque”, no entanto, termi-
realizam todo o seu percurso [na prisão] e que guem a “conta-gotas”, através de plataformas na ao destacar o “excelente capital humano”
chegam ainda a frequentar o ensino superior”. que os professores utilizam. que encontrou no EPC.
Acrescenta que o diploma do grau académico é A Técnica de Reeducação Superior, entidade O órgão penitencial procura também pro-
fornecido “pelo instituto de formação profis- responsável pela ponte entre os reclusos e as mover várias atividades formativas e profis-
sional” em que o estudante está matriculado. instituições de ensino superior, é representa- sionais em conjunto com o Centro Protocolar da
As instituições de ensino fornecem os ma- da no EPC por Graça Neto. O seu auxílio só é Justiça. “Além do leque de pessoas e cidades que
teriais de estudo necessários aos reclusos em prestado antes de os reclusos se encontrarem procuram dar resposta”, o diretor do estabele-
formato digital. Além desse modelo, os alunos em regime de precária - ou seja, quando lhes cimento prisional admite que “por mais que o
recebem livros e sebentas de anos anteriores é permitido estar fora da prisão por um certo edifício se encontre isolado da sociedade, é um
para que haja um estudo complementar. As pro- tempo. “Quando os reclusos estão nesta condi- microcosmo que a reflete”.
18 CIDADE 7 de março de 2023

Tipografia Damasceno, uma casa de


memórias
Rui Damasceno partilha momentos marcantes da vida da tipografia. Ator caracteriza
espaço como espelho da passagem de uma época.

- POR DANIELA FAZENDEIRO -

PorDaniela Fazendeiro

O
45B da Rua Montarroio alberga uma Rui Damasceno recorda com orgulho a memó- a tipografia era “a alavanca do mundo que fazia
casa com mais de 50 anos de história - a ria da sua mãe, Odete Paixão. Explica que esta as ideias andarem”, reitera.
Tipografia Damasceno. Ao entrar, o vi- foi, durante muitos anos, a única composito- Rui Damasceno acredita que a passagem da
sitante é presenteado com uma visão que quase ra na Gráfica de Coimbra, devido à proibição gravura por tipo de chumbo, muito utilizada
permite uma viagem ao passado. A coleção de imposta às mulheres de exercerem a profissão: nas décadas de 1980 e 1990, para a impressão
máquinas - entre elas, um prelo do século XIX, “considero a minha mãe como uma das grandes digital foi um momento que as artes gráficas
uma máquina de braços e uma pedaleira - trans- fundadoras desta casa”. não conseguiram acompanhar. Nesse sentido,
mite a lembrança de uma era. Ao som de música O ator relata também as passagens do seu pai, posiciona a revolução informática como a cul-
clássica, o ator e atual proprietário do espaço, João Damasceno, pela Fortaleza de Peniche e pada pelo “descalabro da arte tipográfica”.
Rui Damasceno, partilha memórias passadas pela prisão de Caxias, motivadas pela sua mili- Os tempos áureos em que era possível empre-
dentro e fora daquelas quatro paredes. tância comunista. Emocionado, condena a atua- gar 11 trabalhadores não foram esquecidos
Fernando Rui da Silva Damasceno de ção do empregador da sua mãe, o padre Assis, ao pelo tipógrafo. Hoje em dia, está reduzido “ao
Albuquerque, mais conhecido por Rui despedi-la “na altura mais difícil da vida dela”. Fernando, ao Rui, ao Silva, ao Damasceno e ao
Damasceno, nasceu a 10 de março de 1957. Tirou Relembra assim as palavras proferidas pelo pá- Albuquerque”, diz em tom de brincadeira. No
o curso complementar de eletrotecnia na Escola roco: “agora tu já não és a Odete Paixão, tu és entanto, acredita que a tipografia tem futuro,
Secundária de Avelar Brotero. No entanto, a mulher de um comunista. Portanto, vamos pois ainda existem entusiastas pela arte, o que
nunca usufruiu deste, pois começou a trabalhar fazer contas e rua”. Rui Damasceno reforça o impede o seu desaparecimento. Quanto ao seu
na tipografia no ano da sua fundação, em 1969, seu relato com uma reflexão sobre os tempos sucessor, confessa que esse tópico não o preocu-
quando tinha apenas 12 anos. Antes desse mo- da ditadura, pois considera que “as pessoas pa. “Há pessoas interessadas em trabalhar aqui
mento, passou pela Imprensa da Universidade falam dos presos políticos, mas não falam quando eu fechar a pestana”, admite.
de Coimbra, onde, como conta o próprio, aos das suas famílias”. Rui Damasceno atribui a sobrevivência do
dez anos aprendeu “a caixa e as marotices O tipógrafo descreve um “episódio curioso” negócio à impressão de livros de faturas e li-
todas dos tipógrafos”. ocorrido em 1971, se não lhe falha a memória. Já vros de pequena tiragem, entre cem a 200
Odete Paixão e João Damasceno, fundadores em liberdade, o seu pai imprimia peças que não exemplares. No entanto, confessa que é um
do histórico espaço, eram tipógrafos e compo- eram visadas pela censura. Desta vez, foram trabalho moroso, uma vez que todos os livros
sitores de profissão, que trabalharam em di- uns prospetos para o Dia da Mulher, que lhe são cosidos à mão.
versas imprensas coimbrãs. Rui Damasceno concederam uma visita da PIDE. Quando o seu O ator termina por realçar a importância da
conta que a passagem dos seus pais pela antiga pai se apercebeu, mandou-os para um caixote e casa como um símbolo da mudança dos tempos,
Tipografia Progresso foi a alavanca decisiva colocou aparas por cima. Rui Damasceno men- já que qualquer pessoa que a visite tem ao seu
para a construção de um negócio familiar. O ciona que um deles estava tão perto de os desco- dispor a história que a sustenta. As paredes,
sítio, localizado no Pátio da Inquisição, chegou brir que “estavam mesmo quase a queimá-lo”. decoradas com quadros artísticos e objetos de
a conhecer outro nome: Damasceno, Santos e No entanto, a busca não deu em nada. militância comunista, refletem o passado e o
Batista Lda. No entanto, João Damasceno ficou À frente do negócio desde 1989, o ator considera presente desta tipografia, que fez parte da re-
“farto da sociedade” e comprou uma tipografia que o espaço tem uma “importância imensa” sistência portuguesa ao Estado Novo.
em Lorvão, que forneceu os materiais necessá- devido à “história incomensurável” que possui.
rios para a tão conhecida casa conimbricense. Antes do aparecimento das novas tecnologias,
7 de março
CABRAde 2023
DA PESTE 19

CABRA DA PESTE
- POR PEDRO MENDES -

O EPISÓDIO DO BONÉ
- PELO CONSELHO DE VETERANOS DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA - MAGNUM CONSILIUM VETERANORUM -

"
Nas últimas semanas a Academia e a cida- No entanto, na tarde de 27 de Maio, um Ao desgraçado tenente."
de foram confrontadas com a alteração do Tenente da GNR foi visto a almoçar num res-
Cortejo da Queima das Fitas para terça-fei- taurante da Alta. Sebastião Fernandes, um Tamanhos foram os tumultos e a humilhação
ra. Contrariamente ao repetido ad infinitum estudante madeirense, apercebendo-se que o sentida que a 29 de Maio, o Intendente da Polícia
nas caixas de comentários das redes sociais, Tenente tinha deixado o boné num bengaleiro, acedeu a colocar todos os Estudantes presos
o Cortejo nem sempre foi à terça-feira. Até subrepticiamente se apoderou dele. A aclama- na manifestação em liberdade. O Episódio do
meados dos anos 50, o Cortejo acontecia em ção Académica não tardou a vir. Por todo o dia Boné foi celebrado por todas as gerações vin-
dia fixo a 27 de Maio, irrelevantemente do dia seguinte, os Estudantes fizeram troça da GNR douras de Estudantes, tendo sido fixado o dia 27
da semana. Tal dia era celebrado como o dia do com gritos de "Olha o boné!" e "Oh Floro, dá o de Maio como sendo o dia oficial para o Cortejo
Cortejo devido, ao famoso episódio do Boné. O boné ao Tenente!" para gáudio da populaça e da Queima das Fitas. "
episódio do Boné foram vários acontecimen- vingança dos Académicos. Em pouco tempo
tos, que culminaram com o roubo do boné de apareceu também a seguinte canção afixada
um Tenente da GNR no dia 27 de Maio de 1913. pela cidade:
Um Comissário, de nome Floro Henriques,
tinha imposto grossas limitações às festas "O tal tenente da guarda
Académicas visto que estas causavam grande Nem já pensa no banzé,
incómodo à cidade. No dia 24 de Maio, aquan- Anda a ver se deita a garra
do duma manifestação contra estas medidas, Ao larápio do boné.
o Comissário ordenou carga policial sobre os Ó Floro, ó comissário
Estudantes que se viram vencidos e muitos Não sejas tão inclemente,
foram colocados sob prisão. Entrega o boné roubado ESPAÇO PATROCINADO PELO MCV
20 SOLTAS 7 de março de 2023

CRÓNICAS DO TRODA
- POR ORXESTRA PITAGÓRICA -

que se preocupam com a UC, mas o que importa


mesmo é manter o tachinho.
Agora vamos falar de assuntos sérios… então
não é que os nossos líderes já não arranjam cer-
veja para a malta? Se havia coisa que nunca fa-
lhava na nossa academia eram os barris! Sabem
se no Fórum Internúcleos os barris faltaram?
Se calhar ficaram na carrinha da AAC…
Por falar em cerveja, então não é que o Carlitos
o tio Zé Manel mudaram o cortejo para terça-
feira? Por nós tudo bem, há menos mitras a rou-
bar latas ao pessoal.
Não se esqueçam é que é preciso pedir justifi-
cação de falta ao Carlitos.

C
Beiji nhos mol hados dos vos s os
omo é que estamos suas gostosas? Estão do da chuva. Os grelhados recebiam convívios, marotos preferidos
com saudades nossas? agora são o novo muro de Berlim.
Pois é, na última edição da Cabra a Mas não se preocupem… isto agora é que
internet no edifício da AAC não funcionou e vai! O Pedrinho assumiu as rédeas do disci-
não conseguimos enviar o nosso texto para plinar e vai por todos na linha, exceto quan-
a senhora diretora. Nada temam, no ISCAC a do tem que voltar a ser afilhado de praxe de
internet não falha. um alentejano qualquer…
Desde a última vez que conversámos muita Achavam que nos tínhamos esquecido dos
coisa mudou… O edifício da AAC estava a cair de nossos melhores amigos? Nunca!
podre, agora já empobreceu. As cantinas azuis Temos que dar os parabéns ao tio Amílcar e
não serviam carne de vaca e agora também não ao primo Matias. Depois de vencerem as suas
servem para fumar um cigarro cá fora abriga- eleições vão passar mais uns aninhos a dizer

ÉXTÉGUES DA ISABEL

A cidade apercebe-se
que um concerto é
mais importante do que
A luta de classes está
na rua... os desfavo-
recidos e mal remedia-
P or entre o frio da
manhã ouvem-se os
pássaros chilreando cha-
aqueles que a alimen- dos "não ganham tudo mando a Primavera.
tam há séculos. mas têm de ganhar al-
guma coisa" para que a #hávidanestacidade
#hávidanestacidade paz social continue, e o
capitalismo sabe disso.

#hávidanestepaís

cabreando por aí...


7 de março de 2023 SOLTAS 21

Lítio: Solução ou
Greenwashing?
- POR JESSICA SÁ - GRUPO ECOLÓGICO DA ASSOCIAÇÃO ACADÉMICA DE COIMBRA -

A
apropriação pelo grande capital das eficaz no setor automóvel? logo o artigo 66º da Constituição da Républica
alterações climáticas e do anseio da O lítio tem como base o método extrativo, o Portuguesa. Podemos afirmar que se adotou
população na resolução dos proble- que por si só já é prejudicial para o ambiente. uma estratégia que não protege as populações
mas ambientais, tem como motor o lucro e a No entanto, quando a motivação da extração é locais e o património natural, contribuindo
poluição, paradoxalmente contribuindo ainda a obtenção do máximo lucro possível acabamos gradualmente para a degradação da riqueza
mais para a degradação daquilo que promete por assistir a casos como o de Portugal. Devido natural e a privação das populações.
preservar. Propaga uma narrativa catastrófi- à produção demasiado intensiva são emitidos A degradação ambiental para além de denun-
ca e de urgência, com o objetivo de desviar do altos níveis de CO2 e/ou não são cumpridos os ciada tem de ser unida à luta contra o capita-
espaço mediático a discussão de medidas al- planos de proteção ambientais estipulados, lismo verde e a, já mencionada, estratégia de
ternativas nos setores com soluções duradou- como aconteceu em Covas do Barroso. “lavagem verde”. Assim, são precisas políticas
ras que não sacrifiquem o planeta, as pessoas e Desde o anúncio que as explorações de lítio que deixem os transportes individuais a médio
a economia nacional. são alvo de desagrado, quer pela falta de trans- e longo prazo como função supletiva nas famí-
No setor automóvel assistimos, cada vez mais, parência dos processos, quer pela carência de lias. Como fazer isto?
à expansão dos veículos elétricos aliado ao cres- avaliação sobre os impactos ambientais e so- Implementando políticas públicas que re-
cente aumento do fabrico das baterias de lítio, ciais. Seja, ainda, pelo encobrimento das inten- forcem e invistam em transportes coletivos,
sustentadas numa ótica de solução única para ções das empresas no requerimento das licen- políticas de mobilidade sustentáveis que deem
a mobilidade financiada pelo “greenwashing”. ças e no contrato de concessão ou pela omissão centralidade ao transporte público e assegu-
Em termos práticos, tudo se resume numa subs- de informação às populações e o incumprimen- rem a sua qualidade, alarguem a sua rede e que
tituição de fontes energéticas e tecnologias e to dos direitos humanos, na segurança e nas garantam, numa fase inicial, preços acessíveis
na promoção da compra de carros elétricos, precauções ambientais. Tudo isto numa ótica que apontem para a sua gratuitidade.
isolando a necessidade de uma real aposta na de mercantilização dos recursos naturais, co-
eficiência, reutilização e reciclagem energética. locando o seu valor ecológico e económico ao
Porque não é o l ít io uma solução serviço de interesses privados, ignorando desde

OBITUÁRIO
- POR CABRA COVEIRA -

Até a chapa abana... ...e a pala cai.


´ Tás todo chapado, bro. Oh, milkas, que-
rias instalar um campo de padel na AAC,
dizias, oh atleta. Fáxabor, prende esse cabelo.
O BarAAC tanto abanou que a pala não aguen-
tou. A malta quer apanhar cabras, não trauma-
Enganaste-te a aprovar o projeto, que o teatro tismos ucranianos. Os nossos amigos lá de cima
dizia ACARDÉMICO. Para além de proibir espe- decidiram resolver o problema da oferta, elimi-
táculos, proíbe o que de mais cultural há nesta nando a procura... e o problema dos sem-abrigo.
casa: os convívios! O turismo da UC é tão importante que nos
'Tás todo Trump, bro, mas aqui não há mexi- presentearam com uma arte contemporânea.
canos, só COQFers. É o chamado mercado mági- Infelizmente, foi à hora do chá, não deu para
co (juro por tudo). Eu sei que estamos todos cha- acompanhar com arroz doce. O pagamento on-
teados com os preços dos bilhetes da Queima, line significa pagamento à distância, já que não
mas daí a construir um muro vai um Míssil. dá para entrar.
Tal como Berlim, este muro vai cair, nem Pelo lado positivo: a pró-secção de Boccia pode
que seja pelas infraestruturas. O Gil que vá pó finalmente ir almoçar. Já há acessibilidade para
c******, que as secções estão em lata, visto que a malta de cadeira de rodas: é descer para as
o BarAAC abana. amarelas ou subir para o céu azul.
Pia fininho, ou levas com um belo processo FRANCAMENTE! Que obituário de m****, não
discplinar em cima... morreu ninguém.
22 CARTAS À DIRETORA 7 de março de 2023

CARTAS À DIRETORA
quarta feira, 1 de março de 2023

'
Xora Diretora repetisse os comentários: "E a mensalidade de censurar estudantes descontentes com a situa-
Na seg unda metade de fevereiro, a 700 euros para brasileiros, 10 vezes mais que a ção. Uma instituição de ensino superior que se
Universidade, por meio de uma das suas pá- de um nacional português", "Uma pena terem preza perdeu qualquer moralidade e eticidade
gina no instagram - Universidade de Coimbra apagado meu comentário sobre as propinas in- necessária à discussão académica ao se dimi-
BRASIL - publicitou a entrada de brasileiros fladas para brasileiros. Se não querem que eu nuir à censura covarde, e fica agora em questão
e a aceitação do ENEM como processo seleti- exponha um fato, mudem a posição de vocês" quais são as reais motivações que levam essa
vo. Dois de meus amigos, Isabel e Mateus, bem e finalmente "Quais os planos de igualar a pro- Universidade à frente.
como outros brasileiros, fizeram uso desse es- pina entre os nacionais brasileiros, que pagam Claramente, a de um ensino superior de quali-
paço para dar sua opinião acerca do tratamento 10 vezes mais que os portugueses?". dade, de um espaço aberto ao aprendizado e da
discriminado que recebemos da instituição com É certo que as propinas não condizem mais luta pela liberdade não o são. Uma instituição
as propinas internacionais. Foi minha surpre- com a condição económica brasileira, equi- que lutou contra a censura e contra a ditadura
sa, depois, receber a notícia que a Universidade valendo a aproximadamente 3 vezes o salário é agora a perpetuadora desses mesmos atos.
não apenas apagou os comentários como blo- mínimo. Mas a questão foi muito além disso
queou a conta do Mateus para que o mesmo não quando a Universidade se mostrou disposta a Luiz Eduardo Lopes Paneguini

quarta feira, 1 de março de 2023


Xôra Diretora, com juros. A cobrança a brasileiros de uma pro- mas quando chegamos aqui vemos realmente
Conversando com amigos sobre as propi- pina que vale mais que dois salários mínimos o que somos para essa instituição. O motivo de
nas a que nós, estudantes brasileiros, esta- brasileiros, e que é quase igual ao salário míni- não existir uma página direcionada a nenhum
mos sujeitos na Universidade de Coimbra (UC), mo português atual, é imoral e de um descaso outro país falante de língua portuguesa é que
um deles me mostrou um email que recebeu do imenso com a história que a Universidade de somos nós, os brasileiros, os sacos de dinheiro
reitor, à época João Gabriel Silva, onde dizia Coimbra diz ter, em suas campanhas publici- para essa gente sem escrúpulos. Relatos de xe-
que o estado português era incapaz de financiar tárias, com o Brasil. Principalmente quando nofobia por parte dos próprios colegas e pro-
o estudante internacional, e que a partir dali se trata de sua propaganda em terras brasilei- fessores, de assédio moral e sexual, de maus
estávamos sujeitos ao pagamento integral de ras como uma Universidade gratuita, narrati- tratos, de não aceitarem nossa maneira de falar
nossos custos, que foram estão estimados em va essa sustentada inclusive por famosos in- ou escrever em exames são comuns dia após
700 euros por mês. Entretanto, em acordos fir- fluenciadores da educação, como a Professora dia nos corredores dessa Universidade, que se-
mados bilateralmente entre o Brasil e Portugal, de História Débora Aladim que, através do pa- quer é capaz de tratar-nos como seres huma-
os brasileiros estão sujeitos a um estatuto de trocínio da UC, fez divulgações em suas redes nos iguais. Não há progresso sem mudança, e
igualdade quando residentes em solo portu- sociais como se a faculdade fosse para nós, bra- a Universidade se mostra incapaz de angariar
guês. Ainda assim, a Universidade do Porto, sileiros, isenta de custos. Uma clara tentativa fundos de financiamento de pesquisa por em-
de acordo com o regulamento da CPLP, reduz de emboscar alunos brasileiros para o finan- presas, precisando ainda de nossas propinas,
suas propinas a estudantes provenientes des- ciamento da instituição. Instituição essa que sendo a única que a cobra integralmente a es-
ses países em até 45 por cento, com a propina formou, por séculos, pensadores lusófonos dos tudantes brasileiros. Somos nós que mantemos
total regulada por faculdade. De volta ao email, dois lados do Atlântico, e hoje se mostra inca- essa instituição em pé, e somos nós que atraves-
a principal razão citada pelo antigo reitor é de paz de regular as próprias finanças, sendo de- samos o Atlântico em busca do nosso sonho.
que os brasileiros que vêm a Portugal apenas pendente de remessas de dinheiro enviadas do Somos nós os Lusíadas.
para tirar o curso devem pagar o mesmo por Brasil. É evidente essa dependência quando a
inteiro. Logo, se por cá decidimos residir de- própria Universidade nutre uma página de ins- Anónimo
pois do curso, imagino que a Universidade se tagram separada para estudantes brasileiros,
prontifique em devolver-nos o montante pago onde bandeiras do Brasil são agitadas no Paço,
7 de março de 2023 ARTES FEITAS 23

CINEMA
UMA TRAGÉDIA GRECO-IRANIANA
- POR BRUNO OLIVEIRA -

C
om a urgência de um thriller e o simbo- relação com uma prostituta surda-muda. O são categorias intrínsecas/estabelecidas, ou
lismo e a clareza de uma fábula apare- acaso leva-o a conseguir o papel principal de apenas papéis que desempenhamos quando
ce World War III (Jang-e Jahani). Um um filme, onde representa o ditador alemão surge a oportunidade. No entanto, a natureza
filme simples até se tornar complexo, uma nar- Adolf Hitler. Sem nunca o ter desejado, acaba do enredo e o estilo da produção é suficiente
rativa linear até se distorcer e uma fotogra- por trabalhar à força num emprego de sonho para colocar a obra numa posição de destaque.
fia crua enquanto o espectador não repara em (para muitos daqueles que o rodeiam). O diretor usou uma frase de Hannah Arendt
todas as camadas. Por mais bizarra que a premissa possa pare- para comentar o filme – nas ditaduras tudo
O protagonista Shakib é um trabalhador de cer, não é indicativa das voltas que a narrativa corre bem até quinze minutos antes de tudo
luto pela sua família que faleceu num terra- dá durante duas horas. Os paralelismos com colapsar. O colapso aqui aparece sob forma de
moto. Compreensivelmente desiludido com o o holocausto carregam o filme para uma di- tragédia, no sentido clássico, que custa a des-
mundo, vai sobrevivendo. Arranja trabalho mensão sugestiva, ou até filosófica, levantando cer, mas da qual não queremos desviar o olhar.
onde consegue e tem vindo a desenvolver uma questões como: será que opressor e oprimido

MÚSICA
ESPERAR PELA CHUVA ANTES DA COLHEITA
- POR PEDRO DINIS SILVA -

J
á tinha passado demasiado tempo sem mos um retrato sonoro das suas vontades ta- nacional contemporâneo. Crava nas pedras da
que Francisco Santos, conhecido no lhado no solo fértil que é a MUNNHOUSE, coo- cena portuguesa um grande X: está aqui, sabe
circuito do hip-hop tuga como xtinto, perativa artística da qual o rapper faz parte e que não veio tarde e que “um dia ainda vai ser
nos agraciasse com o seu álbum de estreia. O de onde surgiram os nomes responsáveis pela rei cá”. A sua energia é contagiante, a sua pro-
rapper de Ourém, que surgiu nos radares em cristalina produção do projeto, como Beiro, messa ainda longe de ser consumada. Ora, se
2019 com os EPs “Ventre” e “Inacabado”, bro- Lunn ou benji price. Tal como a capa do álbum for para uma colheita destas, vale com certeza
tou, de imediato, com a maturidade caracterís- sugere, este é um trabalho que flui com agi- a pena de esperar que venha a chuva.
tica de um veterano. O seu arsenal, que trazia lidade entre os vários estados de espírito do
confiança na expressão vocal e um ‘wordplay’ protagonista, evidenciando facetas distintas.
singular, vinha envolto numa promessa efeti- A garra de faixas como “Katrina”, “Pacemaker”
va de grandeza; só carecia um longa-duração ou “Éden” (com benji price) disputam com o
que a comprovasse. coração mole de “Android” ou “Diabo”. A des-
Em 2023, xtinto arregaça enfim as mangas contração de “Tontura” (com Wugori) e “Iglu”
e entrega-nos o seu primeiro disco, apropria- (com Mike El Nite) adversam com o aguerrido
damente batizado de “Latência”. Lançado em foco de “Marfim”, “Carvão” ou “Cadáver”. São
fevereiro, este projeto deixa transparecer, a contrastes que, no entanto, se complementam
partir do seu título, a inércia e procrastinação e que alteiam a escrita imaculada do autor, que
do artista que, nas palavras do próprio, deixam é sua raiz e seu cerne, e que impera sobre qual-
de ser só suas “para passar a ser nossas”. O seu quer outro atributo.
conteúdo, no entanto, revela uma disposição A ilação que se retira deste álbum é simples e
diferente, de maiores proporções, e um carác- clara: se, com projetos anteriores, xtinto trou-
ter resoluto e ambicioso, faminto (e merecedor) xe uma fundação sólida à ainda jovem sonori-
de devido reconhecimento. dade da sua psique, então “Latência” vem edifi-
Na estreia discográfica de xtinto encontra- car o seu estatuto como figura maior do hip-hop
Mais informação disponível em

Editorial
Mulheres sem maneiras
- POR JOANA CARVALHO -

“ Senhores, sou mulher de trabalho, e falo


com poucas maneiras…” Assim começa
a Cantiga Sem Maneiras, música do Grupo
titucional ou a condição da mulher na ciência
merecem a nossa atenção. E muitas outras po-
diam ser enumeradas.
de Ação Cultural, característica do Processo Por que falo eu destas situações? Porque todas
Revolucionário em Curso. Escolhi começar este elas necessitam de uma resposta. E a respos-
editorial com esta passagem, porque muito se ta não pode passar pela boa educação. O ódio
espera do comportamento das mulheres. Que e a agressão machista só conhecerão limites
sejam bem educadas, que sejam dóceis, que te- quando nós começarmos a reclamar as nos-
nham as “boas maneiras” que a cantiga tanto sas próprias vozes e nos insurgirmos contra
critica. No entanto, qual é o verdadeiro peso os mesmos. Temos de conseguir reconhecer
destas expetativas? Não só elas são desiguais que quando nos pedem “boas maneiras”, estão
em relação aos restantes membros da socieda- na realidade a comprar o nosso silêncio. Por
de que reconhecemos enquanto homens, como todas as mulheres e meninas que ainda hoje são
acarretam ainda consequências muito reais na v it imizadas por simplesmente nasce-
vida de imensas mulheres. rem, viverem e serem mulheres: tenhamos
Vem-me agora à memória várias situações poucas maneiras.
da atualidade que ainda revelam que a luta
por uma verdadeira emancipação ainda estão
longe. No final do ano transato, por exemplo,
soube-se que o regime talibã, no Afeganistão,
proibiu raparigas de frequentarem o Ensino
Superior. A esta conjuntura junta-se a si-
tuação no Irão, após o assassinato de Mahsa
Amini, jovem curda, por parte da Polícia da
Moralidade. Também a revogação da decisão
Roe v. Wade, que enquadrava a interrupção
voluntária da gravidez enquanto direito cons-

Diretora Joana Carvalho Conselho de Redação Luís Almeida, Tomás Barros, Inês
FICHA TÉCNICA Duarte, Filipe Furtado, Leonor Garrido, Hugo Guímaro,
Equipa Editorial Luísa Macedo Mendonça & Simão Moura Margarida Mota, Bruno Oliveira, João Diogo Pimentel,
Jornal Universitário de Coimbra - A CABRA (Ensino Superior), Raquel Lucas & Ana Filipa Paz (Cultura), Paulo Sérgio Santos, Pedro Emauz Silva
Depósito Legal nº478319/20 Larissa Britto & Fábio Torres (Desporto), Eduardo Neves &
Registo ICS nº116759 Sofia Ramos (Ciência & Tecnologia), Clara Neto & Daniel Fotografia Ana Cardoso, Joana Carvalho, Daniela
Propriedade Associação Académica de Coimbra Oliveira & Sofia Variz Pereira (Cidade), Gabriela Moore & Fazendeiro, Luís Gonçalves, Lena HertelSam Martins,
Sofia Ramos (Fotografia) Simão Mota, Simão Moura, Marta Tavares
Morada Secção de Jornalismo Colaborou nesta edição Lucília Anjos, Ana Cardoso,
Rua Padre António Vieira, 1 Frederico Cardoso, Matilde Dias, Gustavo Eler, Andreína Paginação Joana Carvalho, Luísa Macedo Mendonça,
300-315 Coimbra de Freitas, Luís Gonçalves, Lena Hertel, Marília Lemos, Fábio Torres
Raquel Lucas, Sam Martins, Luísa Macedo Mendonça,
Sofia Moreira, Simão Moura, Eduardo Neves, Mariana Impressão FIG - Indústrias Gráficas, S.A.
Neves, Bruna Passas, Ana Filipa Paz, Maria Inês Pinela, Telf.239 499 922, Fax: 239 499 981, e-mail: fig@fig.pt
Sofia Ramos, Luísa Rodrigues, Marijú Tavares, Marta Produção Secção de Jornalismo da Associação
Tavares Académica de Coimbra

Tiragem 2000

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