Você está na página 1de 24

5 DE MARÇO DE 2024

ANO XXXIV Nº318 GRATUITO PERIÓDICO


DIRETORA ANA FILIPA PAZ
EDITORAS EXECUTIVAS DANIELA FAZENDEIRO E CLARA NETO

somos as mulheres
guerrilheiras
as mulheres

fomos escravas meigas


como os homens
nos quiseram

fomos sementeiras
como os homens
nos fizeram

mas em nós tudo mudou


e agora não
já lutamos com as nossas
mãos

recusamos o repouso do guerreiro


construiremos
o mundo por inteiro
02 ENSINO SUPERIOR 5 de março de 2024

32.260 dias até à primeira mulher


presidente da AAC e 10.228 desde a última
“Sofri misoginia”, revela antiga vice-presidente da DG/AAC. Falta de
participação de mulheres em posições hierarquicamente elevadas
preocupa segunda dirigente da Casa.
- POR SOLANGE FRANCISCO E LILIANA MARTINS -

E
m 136 anos de existência, a Associação A antiga estudante sublinha a necessidade de “Existe misoginia internalizada
Académica de Coimbra (AAC) viu ape- haver mulheres em posições hierárquicas mais nas estruturas do ES”
nas três mulheres chegarem à sua pre- elevadas. “Acho que as mulheres são tão capa- Mariana Rodrigues estudou Direito na
sidência. Conscientes desta realidade, Mariana zes como os homens e têm um tipo de gover- Universidade de Coimbra (UC) e, atualmente,
Rodrigues e Ana Paula Barros, antigas diri- nação diferente e muito necessário”, explicita. trabalha como jurista em Lisboa. O seu per-
gentes, e Sofia Duarte, atual vice-presidente Para Ana Paula Barros, “a liderança precisa de curso universitário ficou marcado pelo man-
da Direção-Geral da AAC (DG/AAC), refletem ser exercida por pessoas diferentes para não dato que exerceu, entre 2017 e 2018, enquanto
sobre a escassez de representatividade e de li- ser viciante”. A ex-presidente, que hoje traba- vice-presidente da DG/AAC, ao lado do então
derança feminina nos órgãos gerentes da aca- lha como jurista em Macau, relembra a altura presidente Alexandre Amado. Em 2018 enca-
demia coimbrã. em que presidiu a AAC como uma “experiên- beçou a Lista P - “Atitude Preto no Branco”,
cia extraordinária”. Destaca ainda que “com 23 candidata à presidência da DG/AAC, mas os
“As mulheres são tão capazes anos tinha a responsabilidade de ter 68 funcio- estudantes deram a vitória a Daniel Azenha,
como os homens” nários a quem tinha de pagar ordenados”. um dos seus adversários.
Clara Crabbé Rocha foi a primeira mulher Ana Paula Barros recorda que, enquanto di- A antiga vice-presidente recorda algumas si-
eleita presidente da Casa, em 1976, 89 anos após rigente, ajudou a preparar a lei que deu à Rádio tuações de discriminação que viveu aquando
a sua fundação. Com uma liderança de curta Universidade de Coimbra a possibilidade de da corrida eleitoral. “Sofri misoginia, não dos
duração, a ex-presidente demitiu-se do cargo se candidatar e ter uma frequência de rádio. meus opositores, mas de estudantes e de pessoas
ao fim de poucos meses por considerar que uma Relembra ainda que a autonomia das univer- com alguma responsabilidade nas estruturas da
medida aprovada em Assembleia Magna não sidades foi aprovada durante as suas funções Casa”, conta. Mariana Rodrigues acredita que
correspondia aos desejos da maioria dos estu- na DG/AAC. “existe misoginia internalizada nas estruturas
dantes. Em causa esteve uma moção aprovada A jurista realça que está fora de Portugal há do ES” e acrescenta que “Coimbra é, por si, uma
graças à União de Estudantes Comunistas que quase seis anos e que já não convive com a rea- cidade conservadora”, referindo-se à AAC como
tinha em vista o apoio ao Movimento Popular lidade política do país e ainda menos com a da uma “instituição eminentemente patriarcal”.
de Libertação de Angola. Mais tarde, acabou academia. Por isso, quando questionada sobre “Desde comentários pequenos, mandar-me
por ser convidada a integrar a lista de deputa- a escassez de representatividade e liderança sorrir ou dizer em debates que eu era bruta
dos da Assembleia da República pelo Partido feminina na AAC, declarou: “o que me parece em vez de assertiva, foram coisas que eu vivi”,
Socialista, mas a carreira como professora uni- é que, se uma mulher pode fugir de um con- confessa a antiga vice-presidente. Nunca de-
versitária impossibilitou-a de desempenhar fronto, não entra num”. Contudo, sublinha sistiu, mas percebe que nem todas estejam
essas funções. que esta falta de participação feminina “não dispostas a colocar-se numa posição de repre-
Doze anos depois, Ana Paula Barros deu con- é positiva”. Ana Paula Barros está convencida sentação estudantil “com receio dos ataques
tinuidade ao legado de liderança feminina dei- que se o trabalho for bem feito, uma mulher que podem sofrer por racismo ou LGBTfobia”,
xado na academia por Clara Rocha e assumiu candidata à presidência da DG/AAC tem tanta além da misoginia.
a presidência da DG/AAC em 1988. Na altu- facilidade em vencer como um homem. “Nada Quanto às razões que podem justificar a es-
ra, apoiada pelo projeto da Juventude Social se faz sem trabalho e é preciso uma equipa cassa representação feminina na liderança do
Democrata, era a única mulher a candidatar-se muito boa”, enfatiza. órgão executivo da AAC, Mariana Rodrigues
ao cargo. Não esquece que “o maior medo era se Zita Henriques foi, até à data, a última presi- destaca o “viés de género” e a pressão social.
a Casa estaria preparada para que uma mulher dente mulher da Casa e, por imprevistos pes- Considera que é necessário dedicar muito
fosse sua presidente”. soais, não lhe foi possível dar entrevista ao tempo às estruturas da Casa, o que pode impli-
A ex-dirigente refere ter sido bem aceite pela Jornal Universitário de Coimbra - A Cabra. car o atraso de um ano na conclusão do curso.
comunidade académica. Enquanto exerceu o Em 1995 teve o seu primeiro mandato preen- Assim, devido à pressão para entrar no merca-
seu mandato, acreditava que “as mulheres eram chido por uma luta interna contra a propina do de trabalho e constituir família colocada nas
iguais aos homens e que tinham as mesmas e a favor da melhoria da qualidade do Ensino mulheres pela sociedade, estas tendem a não
oportunidades”, uma realidade que percebeu Superior (ES), da política educativa e do aumen- participar tanto em atividades extracurricula-
não ser verdadeira quando entrou para o mer- to da Ação Social. A terceira líder feminina da res. Além disso, a antiga vice-presidente culpa
cado de trabalho. Ainda assim, defende que a DG/AAC licenciou-se em Engenharia Química as disparidades socioeconómicas. “Só garan-
igualdade “mais crucial” é entre o género femi- e trabalhou como assessora do presidente do tindo um ES universal, gratuito e democrático
nino e o masculino, e que “todas as igualdades Conselho de Avaliação. Mais tarde, foi direto- é que conseguimos assegurar que existe repre-
vão ser precárias” se esta não for atingida. ra executiva da Fundação das Universidades sentação na presidência da DG/AAC”, conclui.
Portuguesas. Desempenhou também a função A ex-estudante tem memória de ver muitos
de adjunta do ministro da Educação, assessora colegas a não conseguirem entrar no ES por in-
da reitora da Universidade de Aveiro e vereado- capacidade financeira. Por isto, fez “tudo o que
ra da Câmara Municipal de Penacova. podia para democratizar o setor”. A sua passa-
gem pela DG/AAC “vai ficar para sempre [con-
sigo] e não vai haver outra experiência tão gra-
- Com colaboração de Matilde Mendes - tificante como essa”.
5 de março de 2024 ENSINO SUPERIOR 03

“Os votantes não veem nas var nesses cargos e assumem que não são para dirigentes femininas em comparação a líde-
mulheres a garra que é necessária” elas”, assevera. res masculinos. “Quando uma mulher falha,
Sofia Duarte estuda na Faculdade de Direito A par deste panorama, a estudante realça que, é muito mais fácil descredibilizar o seu traba-
da UC e é vice-presidente da atual DG/AAC. A “muitas vezes, as mulheres são vistas como o lho”, defende Sofia Duarte. A confiança acaba
integrante do projeto vencedor das eleições género mais frágil que, numa situação de pres- por ser “naturalmente posta num homem, por-
de novembro de 2023, a Lista P - “Por Ti, Pela são, vai fraquejar”. Sofia Duarte acredita que, que os votantes não veem nas mulheres a garra
Académica”, assume funções ao lado do presi- como consequência desta visão, “acaba por ser que é necessária”, constata.
dente Renato Daniel. O seu percurso no asso- mais confortável para um homem apresentar Sobre a facilidade de uma mulher conseguir
ciativismo inclui também uma passagem pelo a sua candidatura”. Ainda assim, a dirigente vencer uma eleição disputada, a vice-presiden-
Núcleo de Estudantes de Direito da AAC. menciona ter atingido “um grau de maturida- te sublinha o impacto da conotação sexual. Na
A vice-presidente, que encara a Académica de emocional” que lhe permite lidar com esse sua opinião, “a sexualidade, quase quantificada
como um “espelho da sociedade”, reconhece tipo de preconceito. dentro da mulher, é um entrave muito grande”.
que o facto de apenas três mulheres terem al- A vice-presidente considera que “um homem À semelhança de Mariana Rodrigues, acredita
cançado a presidência do órgão executivo da tem muito mais ferramentas e está muito mais que a Casa não está preparada para uma mu-
Casa é “chocante” e um “problema estrutu- camuflado porque a sociedade já o assume como lher presidente. Para Sofia Duarte, a maior pro-
ral”. Sofia Duarte defende ainda que se vive, líder”, ao contrário das mulheres. A seu ver, blemática é a falta de candidaturas por parte de
nos dias de hoje, um cenário de “descredibili- numa eleição disputada, “uma mulher absor- mulheres como cabeças de lista, porque o pro-
zação e desacreditação” da mulher em papéis ve coisas que ninguém devia ter de absorver”. blema “não é o facto de ir e perder, é a falta de
de liderança. “Por não ser algo incutido desde Ademais, reflete sobre a diferença de expec- posicionamento”.
cedo, as mulheres acabam por não se obser- tativas do eleitorado face ao desempenho de
04 ENSINO SUPERIOR 5 de março de 2024

ENGENDER ambiciona colmatar


ausência de questões feministas no ES
Coordenadora acredita que entendimento dos EMGF fornece “ferramentas
para lidar com situações em que indivíduos possam estar a ser explorados,
minimizados, desvalorizados e desrespeitados”. Iniciativa pensa que
inclusão de questões de género é possível em todas as áreas.
- POR MAFALDA ADÃO E DANIELA FAZENDEIRO -

O
ENGENDER, que teve início a 25 de tes. Além disso, foram levadas a cabo pesqui- dimento dos EMGF fornece “ferramentas para
março de 2021, pretende perceber sas nas principais bases de dados – a Scopus lidar com situações em que os indivíduos pos-
a forma como os Estudos sobre as e a Web of Science – e foram organizados sam estar a ser explorados, minimizados, des-
Mulheres, de Género e Feministas (EMGF) estão ‘workshops’ e seminários. valorizados e desrespeitados”.
enquadrados nos currículos e nas práticas pe- Após um levantamento dos autores mais es- Virgínia Ferreira aponta que 80% das disci-
dagógicas das Instituições de Ensino Superior tudados, o ENGENDER constatou que este pa- plinas que abordam os EMGF são facultativas
(IES) públicas e privadas. De acordo com a coor- drão ocorre até em unidades curriculares que e quem opta por elas “são pessoas que já têm
denadora, Virgínia Ferreira, a iniciativa surgiu têm como foco os EMGF. Virgínia Ferreira dá algum conhecimento e que o querem apro-
após a equipa perceber que a maioria das unida- como exemplo Bourdieu, autor muito citado fundar”. Deste modo, um dos objetivos do
des curriculares lecionadas nas IES não men- na Sociologia, cuja obra “A dominação mas- ENGENDER é a integração, em todos os cursos
cionam questões de género e, por isso, os alunos culina”, publicada nos finais dos anos 90 do do ES, de uma unidade curricular obrigatória
não têm formação específica na área. Com o ter- século passado, não contém qualquer referên- onde são trabalhados estes temas. O processo
ceiro aniversário do projeto a aproximar-se, o cia a estudos anteriores feitos nesta área. A so- de integração dos EMGF já tem vindo a rea-
grupo defende que as questões de género estão cióloga revela que, no sentido de incluir mais lizar-se em algumas IES, na medida em que
“muito ausentes” no ES. obras escritas por mulheres, alguns docentes existem quatro mestrados e três doutoramen-
Nesse sentido, a também socióloga e docen- decidiram rever as bibliografias das suas dis- tos a nível nacional. Alguns exemplos são o
te aposentada da Faculdade de Economia da ciplinas, para que a contribuição feminina nas Doutoramento em Estudos Feministas na UC
Universidade de Coimbra, pensa que “o que áreas científicas não fosse esquecida. e o Doutoramento em Estudos de Género na
poderia ser um bom nível [de integração dos Para Virgínia Ferreira, esta área de estudos é Universidade de Lisboa.
EMGF] está longe de ser alcançado”. O facto de de extrema importância, porque permite com- O financiamento para este trabalho, sob a al-
as bibliografias das unidades curriculares serem preender “a normalidade atribuída ao género”, çada do Centro de Estudos Sociais da UC, par-
compostas na sua maioria por autores masculi- a sua influência na trajetória de vida de cada tiu da Fundação para a Ciência e a Tecnologia
nos foi outra conclusão do ENGENDER. Nessa um e de que modo o género pode constituir um (FCT), que permitiu o prolongamento do pro-
linha de raciocínio, Virgínia Ferreira defende desafio no futuro, a nível pessoal e profissio- jeto até 24 de junho de 2024, embora a data
que “a pouca visibilidade” que as mulheres têm nal. Pelo contrário, o desconhecimento pode de conclusão prevista fosse 24 de março do
enquanto autoras e cientistas “cria o estereóti- levar as pessoas a serem “mais facilmente ma- mesmo ano. Com a aproximação da conclusão
po de que a ciência é uma coisa de homens”. A nipuladas e menos conscientes do tipo de rela- do ENGENDER, a equipa pretende continuar
seu ver, a inclusão de questões de género é possí- ções sociais em que estão envolvidas”, explica. a produzir e publicar artigos, que, segundo a
vel em todas as áreas, “desde as artes e humani- Ademais, o ENGENDER pretende alertar as IES coordenadora, têm obtido boas avaliações. Nos
dades, passando pelas ciências sociais e exatas, para a importância do “acesso a um conheci- próximos três meses, o grupo vai gravar ví-
até às engenharias”. mento sistematizado, fundamentado e rigo- deos, que vão estar disponíveis no site do CES,
No sentido de compreender a dimensão real roso” para “as pessoas perceberem o que está e organizar um seminário final. Além disso,
da integração dos EMGF, a equipa realizou in- em causa”. Segundo a coordenadora, o enten- estão a trabalhar na produção de ferramentas
vestigações nas quais que contribuam para
aplicaram diversos a capacitação dos do-
métodos científicos, centes na integração
como estudos biblio- das perspetivas de gé-
métricos, entrevistas nero no ES, como um
e grupos de foco com manual orientador
estudantes e docen- e ações de formação
para docentes.

Por Mafalda Adão


5 de março de 2024 ENSINO SUPERIOR 05

Um pequeno pedaço de tecido,


um grande passo para as mulheres
Do hábito talar à capa e batina, tradição tenta espelhar sociedade.
Membros da comunidade académica consideram que discussão sobre
inclusão de calças na capa e batina feminina não está terminada.
- POR FRANCISCA COSTA
E JÉSSICA SOARES -

N
o século XVI, quando surge o traje aca-
démico em Coimbra, este espelhava
diferenças entre classes sociais e tinha
uma forte ligação à religião, daí a sua designa-
ção antiga “hábito talar”, explica Disa Palma,
proponente da moção de 2021 pela possibilidade
de uso de calças na capa e batina feminina. Por
sua vez, o traje feminino tem origem no tailleur
(fato saia e casaco). “Nos anos 40 era impensá-
vel uma mulher vestir calças”, defende a alumni
da Universidade de Coimbra (UC). A remoção
do colete, imposta pelo Magnum Consilium
Veteranorum (MCV), em 2007, foi a mais recen-
te alteração ao traje feminino.
Disa Palma aponta que, aquando da apre-
sentação da proposta, os proponentes aperce-
beram-se que “o que a Comissão Permanente
do Conselho de Veteranos colocou em cima da
mesa estabelecia a opção de colocar saia no traje
masculino e calças no feminino”, uma con-
traproposta que não ia ao encontro da moção Por Francisca Costa
inicial. A alumni garante que os proponentes
foram “sempre a favor de retirar o género da que uma mulher para usar calças tem de usar a posta, em 2021, o cenário foi “desastroso e um
capa e batina”. Contudo, conta que a proposta capa e batina masculina, porque é considerada atropelo democrático enorme”. Ainda assim
foi elaborada de modo a que não tivessem tudo a neutra”. espera que, quando o tema voltar a surgir, este
contra eles, porque sabiam que estavam peran- Dentro da Secção de Fado da Associação possa ter “uma melhor recetividade”.
te um público “mais conservador”. Sublinha Académica de Coimbra (SF/AAC), “seccionistas Quando questionado sobre o seu parecer re-
ainda que, além do uso do argumento da des- feministas propuseram o uso de calças com a lativamente à última moção apresentada, o
caracterização da capa e batina, foram profe- capa e batina e essa proposta foi chumbada em MCV argumenta que “a retirada do ex libris do
ridas frases como: "o que um homem gosta é de plenário”, refere o presidente do organismo, modelo feminino - a saia - desvirtua e apaga a
um rabo de saia". Diogo Ferreira. Apesar disso, argumenta que a história da capa e batina feminina”. Dado que,
A antiga estudante recorda, ainda, ouvir, SF/AAC “não vê a tradição como algo intransi- quando surgiu, o uso da saia teve por objetivo
em plenário do MCV, comentários “desinfor- gível”, pelo que "tem interesse numa discussão “efetivar um choque na sociedade da altura”,
mados”, como: "se as raparigas podem vestir aberta sobre a temática com outros organismos explica. Apresenta a questão como um “valor
calças, os rapazes podem vestir calções”, o que da Casa”. Admite a possibilidade da SF/AAC se basilar do uso da capa e batina” e salienta que
aconteceu no século XVIII. A proposta de Disa coligar a movimentos que promovam a mudan- a proposta “entra em conflito com outros trâ-
Palma não foi a única na missão de incluir cal- ça, que “mas não vai criá-los”. Defende ainda mites presentes na praxe académica coimbrã,
ças na capa e batina feminina. Existem registos que “os estudantes devem fazer o que faz sen- nomeadamente na identificação e separação de
de uma moção elaborada nos anos 90 que não tido para eles, sem desrespeitar o que foi feito sexos para efeitos de mobilização de caloiros”.
teve sucesso, porque “quem tem o poder de de- pelos anteriores”. Deliberado por maioria, o MCV determinou
cisão” argumentou que “há coisas mais priori- Joana Carvalho, estudante da UC que usa cal- que “existem dois modelos tradicionalmente
tárias”, salienta a alumni. Sobre esta questão, ças com a capa e batina feminina, acredita que reconhecidos na praxe, um com batina e calça e
alerta que “daqui a 40 anos vai haver outro “o academismo português nasceu e cresceu em outro de casaco e saia”. Sendo assim, “qualquer
tema prioritário”, que vai atrasar a discussão. Coimbra, sendo importante que a AAC acom- estudante pode escolher entre um dos mode-
Miguel Vitorino, proponente da mesma panhe a evolução dos tempos”. Para a também los”. No entanto, “qualquer variação não passa
moção, reforça que se pretendia, também, neu- seccionista, o objetivo é aproximar comuni- de uma veleidade pessoal”, de acordo com o
tralizar o traje casaco e saia, tornando a capa dades e religiões, mostrando que a tradição novo Código de Praxe. O MCV adverte que “não
e batina num “porto seguro para uma pessoa e a academia são para todos. “Com a semente se prevê num futuro próximo uma nova revi-
não-binária, uma vez que não seria obrigada deixada por outros colegas, tenho intenções são” devido à edição recente deste código fina-
a estabelecer-se num dos pólos”. Denuncia, de trazer o debate de novo”, revela. Considera lizada em 2022.
ainda, o que considera ser uma falta de prepa- ainda que, de acordo com relatos de pessoas
ração de quem pertence ao MCV: “não sabiam que estiveram presentes na discussão da pro-
06 CULTURA 5 de março de 2024

Leonor Teles: Balada de uma


realizadora em trânsito
Artista expõe adversidades correntes na produção cinematográfica em
Portugal. “No meio de um mundo tão desigual, descaracterizado e fortemente
centrado no capitalismo, cultura tem um papel fundamental”, expressa.
- POR IRIS JESUS -

O
que te fez seguir cinema? que o filme tinha sido selecionado para Em 2019 lançaste a curta-metragem
Quando estava no secundário gosta- o festival. O que é que essa nomeação “Cães que Ladram aos Pássaros”,
va muito de fotografia. Nesse período, significou para ti? num projeto que te junta a duas
percebi que queria seguir a área e comecei a in- Foi o início de tudo. De repente, faço um filme realizadoras, Sofia Bost e Mariana
vestigar cursos em zonas próximas. Foi assim que é posto no mapa. Depois de estar seleciona- Gaivão. Como surgiu a ideia de
que encontrei o curso de cinema na Escola do no Berlinale, entrou em circulação e, sem colaborarem as três?
Superior de Teatro e Cinema, onde me podia essa seleção, isso não seria possível. O filme Eu e a Sofia estamos associadas à mesma pro-
formar em Imagem. Foi durante o primeiro viajou internacionalmente, o que não costu- dutora, que já tinha algum interesse em lançar
ano que percebi que queria mesmo trabalhar ma acontecer com obras do cinema português, as curtas-metragens em conjunto. Na altura,
na área. ainda mais se estivermos a falar de uma curta- fizemos o convite à Mariana porque considerá-
metragem. O caminho destas produções come- mos que o seu projeto fazia sentido dentro da
Sentes que as tuas expectativas face ça e acaba em Portugal. abordagem que queríamos seguir. Assim, con-
à produção cinematográfica em seguimos organizar um programa dedicado ao
Portugal mudaram desde o início do teu Como vês o facto de apenas em dois trabalho de três realizadoras.
percurso académico? debates eleitorais para as
Sim. Não diria que as expectativas se altera- Legislativas ter sido mencionado O que é que consideras que pode
ram devido à produção em si, acho que se deve o setor da Cultura? reforçar o cinema feminino em
muito mais ao funcionamento sistémico do Vejo isso como um sintoma da falta de valo- Portugal?
país. Quando comecei a trabalhar tinha uma rização da Cultura no nosso país. A Cultura é o Acho que o cinema feminino tem de ser re-
ideia mais esperançosa e idealista relativamen- que permite sonhar, arriscar, adquirir conhe- forçado no geral, a maneira de o fazer tem de
te ao que era fazer Cinema. É bom que os apoios cimento e aceder a outras realidades. No meio mudar. Se pensarmos na minha profissão,
tenham aumentado e que haja mais pessoas a de um mundo tão desigual, descaracterizado e vemos muito poucas mulheres como diretoras
fazer filmes. No entanto, não sinto que exista fortemente centrado no capitalismo, a Cultura de fotografia. Acho que, mais do que contar
um público que consuma cinema português, os tem um papel fundamental. Tudo isto espelha histórias sobre a mulher, devemos perceber
filmes saem e é muito difícil mantê-los em exi- bem a ideia geral que as pessoas têm da arte e a pouca quantidade de cinema que é feito por
bição. Os exibidores não estão interessados nas do seu papel na entidade do povo. mulheres. Este é um tema que deve ser discu-
obras e os públicos não se educam para consu- tido na política e abranger toda a comunidade,
mir o nosso cinema, por isso, os números que se Uma das reivindicações partidárias é imperativo que as pessoas comecem a refletir
fazem são baixos. Acho que é preciso repensar mais discutidas é a atribuição de sobre o mundo em que estão inseridas. É muito
o modo de distribuição, é bastante triste tra- 1% do Orçamento de Estado para importante que se fomentem espaços de diálo-
balhar durante anos num filme que é exibido financiamento cultural. Subscreves go para que se reflita sobre estas questões
durante apenas duas semanas. esta medida?
Seria bom, mas acho que também é neces- Dirias que o apagamento de vozes
Numa entrevista para a Rádio sário apostar na formação de público para as femininas no cinema português é
Comercial, disseste que as pessoas artes. Nas escolas já existe o Plano Nacional um problema que provém da falta de
devem cultivar o seu gosto apostando de Cinema, mas devia-se apostar em torná-lo realizadoras em Portugal?
na educação para a Cultura. Como é que mais acessível, levar os alunos ao cinema em Não acho que seja essa a questão, acho que já
te instruíste para a arte produzida no vez de ser o cinema a ir às escolas. Fomentar, há muitas mulheres realizadoras. No entanto,
nosso país? ainda, a ida aos teatros e às exposições. não devemos ter apenas isso em consideração.
Eu leio muito, vejo muitos filmes, vou à Os filmes são feitos por todo um coletivo de pes-
Cinemateca. Estou em Lisboa, que tem uma O teu novo filme, Baan, fala sobre o soas e é a isso que me refiro quando digo que as
oferta cultural bastante mais elevada do que fenómeno da gentrificação em Lisboa. equipas são constituídas maioritariamente por
o resto do país, isso faz alguma diferença. Em várias entrevistas contas que, homens. Acho que é necessário torná-las mais
Também troco muitas sugestões de filmes durante as filmagens, ficaste sem casa. diversificadas.
com colegas, assim como falo e leio sobre eles. Este acontecimento refletiu-se no
É muito importante ir ao cinema, se é o meu pendor político da longa-metragem? Quando venceste o prémio de “Melhor
trabalho, tenho de o fazer. Não. O filme por si só já considerava o pano- Fotografia” no Festival Caminhos
rama social, porque é algo que eu vi a aconte- do Cinema Português, deixaste uma
Disseste na mesma entrevista que, cer. No entanto, é uma situação que vejo com mensagem sobre a falta de mulheres e
há oito anos, quando venceste o Urso ironia: estava a gravar um filme sobre pessoas de minorias nas direções de fotografia
de Ouro do Berlinale, o momento de que ficam sem casa e, de repente, fico sem casa. de filmes em Portugal. Consideras
maior felicidade foi quando soubeste que estas carreiras possam não
5 de março de 2024 CULTURA 07

ser apetecíveis a essas camadas da assunto. Antigamente, os únicos modelos de Num artigo recente do jornal PÚBLICO
sociedade? relação que tínhamos eram os que víamos em sobre as disparidades de género no
Não, acho que há falta de oportunidades. Em casa e isso está a mudar radicalmente. As ge- cinema e na televisão em Portugal
primeiro lugar, porque o cinema não é o meio rações que aí vêm já têm outra mentalidade. consta que, do total de mulheres
mais fácil em termos de acessibilidade e empre- trabalhadoras na área, "41.6% foram
gabilidade. Em segundo lugar, porque não há Em entrevista à RUC mencionaste vítimas de discriminação de género,
oportunidades para pessoas novas, oriundas duas realizadoras de que gostas 37,6% sofreram assédio no local
de estratos sociais distintos. bastante, a Lucrecia Martel e a Andrea de trabalho e/ou no desempenho
Arnold. O que é que te apaixona no de funções, 7,5% foram vítimas de
O teu novo filme explora a sexualidade cinema destas mulheres? xenofobia e 1,4% de racismo". Como
como algo fluído. Na tua opinião, A Martel tem uma forma de pensar o cine- encaras estes dados?
já vivemos numa realidade em que ma inigualável, ela pensa os filmes a partir do São percentagens horríveis. Acho que essas
mulheres têm a liberdade para explorar som e isso é atípico. Tem um trabalho muito questões recaem na responsabilidade de cada
livremente a sua sexualidade? interessante e eu gosto dos universos femi- produtora. É necessário que as pessoas que
Acho que as gerações que aí vêm estão muito ninos que ela cria, que mantêm sempre car- estão no poder, que reúnem as equipas e que
mais livres, ao contrário das mais velhas, que gas dramáticas muito potentes. No caso da fazem as escolhas, tenham em mente estes
estão agora a perceber que há formas de se re- Andrea Arnold, gosto do facto de ela se focar dados. O que nós queremos são ‘sets’ e locais de
lacionar diferentes das tradicionais. A sexua- em histórias de personagens femininas e de trabalho seguros e, talvez pelo facto de o meio
lidade é algo que depende do crescimento in- ter filmes com uma estética muito forte, com ser tão pequeno, as pessoas têm medo de per-
dividual de cada um, bem como do lugar onde temas muito atuais. Por isso mesmo, acho que der o seu trabalho. Nestes ambientes, as pes-
se nasce. A sua exploração só é possível quan- seria de extrema relevância que essas obras soas nem sempre estão protegidas a trabalhar.
do se está num sítio seguro, onde se tem aces- chegassem até nós e fossem mais acessíveis.
so a referências e se fala abertamente sobre o
08 REPORTAGEM 5 de março de 2024

Então mas agora


as mulheres já
cantam o Fado?
Interesse e participação feminina no
Fado de Coimbra é cada vez maior e
tem-se revelado “um enorme sucesso”,
segundo ex-presidente da SF/AAC. No
entanto, escritor da Balada da Despedida
do 5º Ano Jurídico de 1988/1989 teme
perda da singularidade do género
musical através da “descaracterização”
causada por essa inclusão.
- POR FREDERICO CARDOSO - Por Frederico Cardoso

É
cada vez mais notória a presença femi- Outra mulher que hoje se dedica ao estudo e à Porém, na perspetiva de Jorge Cravo, o bri-
nina, com um papel ativo, no Fado e na prática do género musical é Constança Peixoto, lho do género musical vem “da interpretação”
Canção de Coimbra. Sem medo de repre- estudante da Licenciatura em Matemática e não da sua tonalidade. “Despido da técnica”,
sálias ou de contestação por parte de um público na Faculdade de Ciências e Tecnologia da o canto de Coimbra é “frio e vazio”, por muito
“mais aberto e tolerante”, João Afonso Sousa, Universidade de Coimbra. Apesar de já conhe- “melhor ou afinada” que seja a voz, realça.
ex-presidente da Secção de Fado da Associação cer diversos temas, a sua motivação apenas sur- Quando os seus alunos lhe indicam temas que
Académica de Coimbra (SF/AAC), vê “com or- giu ao ouvir uma amiga sua a cantá-los. Hoje, tencionam aprender, ouve com eles a respetiva
gulho” esta evolução para o paradigma atual. alegra-se em saber que o seu “passo em frente” gravação original, para que “a essência da ma-
Para Jorge Cravo, professor de interpretação já motivou uma outra colega, “detentora de triz coimbrã” não se perca com a interpretação
da Canção de Coimbra na mesma estrutura, uma voz incrível”, a tomar a mesma iniciativa. do aprendiz, seja este homem ou mulher.
estas são mulheres “seduzidas” pela guitarra Constança Peixoto está convicta de que, Grande parte das mulheres interessadas
e pela sonoridade coimbrã. Muito mais do que desta partilha de experiências e da “postura não são desprovidas de experiência musical.
uma “revolução de género”, o que as move é o igualitária” da SF/AAC, vão surgir novas Tal como Beatriz Villar, também Constança
“respeito e interesse pelo estudo da Canção de intérpretes que “nem sabiam que lhes era Peixoto teve a sua formação num conserva-
Coimbra”. No entanto, estes passos têm de ser possível cantar Fado”. Tal como Beatriz Villar, tório. Os ensinamentos retidos dessa fase da
dados com “muito cuidado” e apenas na direção também a estudante toma Luiz Goes como a sua vida “criaram as bases necessárias” para
do “fortalecimento do género musical”. Quem sua maior inspiração. começar a cantar e a interpretar a Canção de
o explica é João Paulo Sousa, um dos escritores Coimbra, explica. Em adição, toma as aulas do
da Balada da Despedida do 5º Ano Jurídico de “Tem de ser mantido todo seu professor, Jorge Cravo, como fundamen-
1988/1989. Embora defenda que à mulher não o rigor técnico e histórico, tais para a constante evolução da sua técnica.
deve ser vedado, de forma alguma, o acesso ao
não apenas para mostrarem
estudo e ao exercício do Fado e da Canção de Afinal, o que é isso de “matriz
Coimbra, o mesmo teme “a perda da sua singu-
os Louboutins vermelhos coimbrã”?
laridade”, ou até a sua “prática pública com fins e o vestido Versace.” As aulas de Jorge Cravo seguem um concei-
meramente comerciais”. to diferente do habitual. Como não se asseve-
E têm voz para isso? ra um professor de canto, “mas sim de inter-
Elas gostam de Fado, sequer? Edmundo Bettencourt, reconhecido cantor pretação”, o mesmo esclarece que a “essência
Beatriz Villar, nome artístico de Beatriz Dias, e intérprete da Canção de Coimbra, é relem- da matriz coimbrã se encontra bem assente”
revela o seu gosto em cantar, adquirido aos 11 brado pelo seu notável timbre agudo. Por essa nos registos originais. “É por aí que se tem
anos. Com essa idade entrou no coro e, ape- razão, na opinião de João Afonso Sousa, as mu- de pegar”. A própria sonoridade dos temas de
sar de ter ingressado num curso de teatro em lheres podem cantar e explorar as suas obras, Coimbra, em relação aos de Lisboa, difere na
Coimbra, a possibilidade de transmitir as suas sem alterações de tom. Já para o seu pai, João “forma de cantar”, no tipo de acompanhamen-
mensagens e emoções através da sua voz, leva- Paulo Sousa, a inclusão da mulher no género to da viola e até na “suspensão das notas mais
ram-na a perseguir outra vocação. musical suscita um “problema complicado”. agudas”, algo que tenta sempre transmitir aos
Concorrente da edição de 2022 do progra- A alteração da tonalidade “normal” da gui- seus alunos.
ma televisivo Got Talent Portugal, Beatriz tarra para a afinação de Coimbra não foi cau- Porém, para João Paulo Sousa, essa “essên-
desdobra que, no seu primeiro ano do Ensino sada apenas “pela busca de outra morfologia e cia” presente nesses temas que, “de forma
Superior, se “perdeu de amores” por Coimbra sonoridade do instrumento”, mas também de tradicional e histórica”, eram cantados por
e pela sua musicalidade tradicional, a qual car- forma a “tornar os acompanhamentos mais homens, é fundamental para que o género
rega para todas as suas atuações. Desde então confortáveis em função do tipo de cantor, por musical se mantenha “único e autónomo”. A
que estuda, de modo “diário e afincado”, a mé- norma, homem”, assegura o guitarrista. A voz “alteração abrupta” da sonoridade vocal cons-
trica e a pronúncia de autores como Luiz Goes feminina, reitera, tem “características muito titui um fenómeno que pode levar a que se per-
e Zeca Afonso. diferentes”, o que vai importar toda uma “mu- cam “os sinais distintivos” que permitem in-
dança significativa no ambiente sonoro e nos dividualizar o Fado de Coimbra, “que sempre
arranjos já formulados”. foi inconfundível”, receia.
5 de março de 2024 REPORTAGEM 09
As raízes da exclusividade masculina no canto bora não entenda “a quebra” em continuar inspiração e uma força” para outras mulheres.
deste género musical, segundo o guitarrista, re- com essas tentativas. João Afonso Sousa men- Com lotações esgotadas por onde passa, clarifi-
montam para a segunda metade do século XIX. ciona, com “algum desagrado”, que a popula- ca que não o faz para “provar um ponto”, mas
No contexto académico, “as mulheres existiam ção de Coimbra sempre se mostrou “muito re- por si própria, e que vê uma “enorme” aceita-
num número muito reduzido”, o que não favo- ticente” a novas experiências. Nessa mesma ção por parte “de todas as faixas etárias”.
recia a sua participação. “Não deveria ter sido década, exemplifica, a meio de uma Serenata O ex-dirigente da SF/AAC garante que, à se-
assim, mas a verdade é que foi”. Dado esse fator, Monumental, foram proferidas algumas pala- melhança da última noite da passada QF, as ati-
considera que a identidade do Fado de Coimbra vras ao microfone, ato que, na altura, foi con- vidades que foram organizadas nesse ano leti-
se define, hoje, “por esse aspeto etnográfico, siderado “escandaloso”, pois nestas ocasiões vo, com mulheres a cantar, “foram todas um
que deve continuar a ser respeitado”. apenas se tocava e cantava sucesso”. As pessoas “expandiram os seus ho-

E a Secção de Fado, o que vai fazer?


No passado ano letivo, a última noite da
Queima das Fitas de Coimbra (QF) foi presen-
teada com uma “novidade inédita”, relem-
bra João Afonso Sousa. Pela primeira vez,
no Parque da Canção, aquando da atuação do
Grupo de Fados e Guitarradas da SF/AAC, tam-
bém algumas mulheres subiram a palco para
cantar, algo “nunca antes feito”. Não como um
“prémio ou consolação”, mas por demonstra-
rem ter a qualidade necessária para atuar pela
SF/AAC, o que, para o seu ex-presidente, “é a
única coisa que importa”.
Apenas o futuro “vai ditar o rumo e a pro-
porção deste movimento”, indica João Afonso
Sousa. A estrutura que presidiu não se posicio-
Por Frederico Cardoso
na contra qualquer indivíduo que por ela quei-
ra cantar, desde que “garanta a qualidade que
sempre foi exigida”, prossegue. Quanto a even- “A verdadeira essência da matriz coimbrã encontra-se na
tuais grupos de Fado e da Canção de Coimbra interpretação dos temas e não no género de quem os canta.”
formados, de modo exclusivo, por mulheres,
estes vão ser submetidos “aos habituais proces- A verdade é que, para João Paulo Sousa, “o rizontes e, hoje em dia, já querem ouvir” mais
sos de ingresso na secção”. eco” destas várias tentativas não foi suficiente interpretações na voz feminina, esclarece João
A postura da SF/AAC de facultar, a qualquer para a sua aceitação. “Foram ideias que não Afonso Sousa.
um, o acesso à aprendizagem e à prática, pegaram, discos esporádicos, pelas quais o
é “muito vantajosa”, divulga o antigo público nunca manifestou interesse”. Embora Não se vai arruinar o futuro do
seccionista João Paulo Sousa. No entanto, se mostre recetivo “ao que possa vir a acon- Fado de Coimbra?
duvida que “apenas por ser feita esta inclusão tecer”, não acredita que esta manifestação no Não obstante a sua perspetiva, João Paulo
da voz feminina” se esteja “a beneficiar ou feminino vá tornar o género musical “mais Sousa salienta que vê, com “muito bons olhos”,
a promover” o Fado e a Canção de Coimbra. popular” ou que aumente o seu público. No a “enorme quantidade” de pessoas a tocar e a
Acima de tudo, alerta que não se pode permitir final de contas, “pertence apenas a quem ouve cantar. “Venha o que vier”, ressalva que “tem
uma “apropriação indevida do género musical e a quem pratica a justificação da mudança de de ser mantido todo o rigor técnico e histórico”,
através dessa descaracterização”. paradigma”, afirma. de forma a não incutir nas pessoas uma “ideia
O furor da voz de Beatriz Villar na aclamada errada” sobre o que é o Fado de Coimbra. A so-
Mas lembraram-se agora, foi? competição a que concorreu no ano transato, brevivência da singularidade do género musi-
Nos anos 90 já tinham surgido algumas a cantar temas desta natureza, é, para si, “um cal vai estar em risco se, além do antes dito, as
atuações de grupos compostos apenas por mu- sinal de mudança dos tempos”. Ainda assim, intérpretes “se apresentarem em público ape-
lheres a tocar temas de Zeca Afonso, recorda o que mais a satisfaz, para lá de todos os “elo- nas para mostrar os Louboutins vermelhos e o
Jorge Cravo. Estes foram bem recebidos, em- gios recebidos”, é a sensação de poder ser “uma vestido Versace”, avisa.
Jorge Cravo sublinha que “cabe-lhes a elas
decidir o rumo e a proporção deste movimen-
to, desde que não se desvie da matriz coimb-
rã”. Para Constança Peixoto e Beatriz Villar,
passo a passo se começa a traçar o caminho
para que seja possível à mulher “cantar e tocar
em Serenatas Monumentais”, tal como defen-
de João Afonso Sousa. Apesar da escassez de
novos temas originais, alude ainda que o Fado
de Coimbra se mantém vivo, não pelo género
do seu intérprete, mas sim pelas “notas de es-
perança” transmitidas através do sentimento.

Por Daniel Oliveira


010 CULTURA 5 de março de 2024

XXVI Semana Cultural da UC:


unir as vozes da liberdade
Delfim Leão considera que iniciativa tem potencial para “reforçar
ou alterar decisões de voto” em época de eleições legislativas.
Vice-reitor apela a maior investimento estatal na Cultura.

- POR AFONSO VASCONCELOS -

E
ntre os dias 1 e 15 de março decorre a Em relação ao impacto social do evento,
XXVI Semana Cultural da Universidade Delfim Leão aponta a “partilha das vivências
de Coimbra (UC), que conta com mais de dos que presenciaram a Revolução com os que
50 atividades por entre diversas vertentes ar- apenas a estudaram”, caso dos universitários
tísticas. Com base no tema “Voz”, estão pre- de hoje. “Podem estudar e celebrar o 25 de
vistos espetáculos de música, teatro, cinema e abril, mas não o sentiram, pois já cresceram
dança, exposições e até mesmo eventos dirigi- em democracia”, destaca, lembrando a impor-
dos aos mais novos. tância destes diálogos intergeracionais.
Segundo o vice-reitor para a Cultura, O vice-reitor reforça que a influência da ini-
Comunicação e Ciência Aberta da UC, Delfim ciativa se estende à ideia coletiva de democra-
Leão, o projeto procura “mobilizar a cidade” cia, que “deve ser posta em causa e não inte-
a partir da presença multipolar em vários riorizada como um dado adquirido”. Assim,
espaços e “aproximar as pessoas através da invoca um “sentimento de vigilância” e de
Cultura”. Além disso, pretende promover uma “preservação dos aspetos essenciais conquis-
“reflexão alargada sobre a temática da voz, in- tados com a Revolução”. Assume ainda que, em
terligada com a celebração dos 50 anos do 25 época de eleições legislativas, a XXVI Semana
de abril”. Cultural da UC pode “reforçar ou alterar deci-
A apresentação do evento decorreu em con- sões de voto” por ter o poder de “interpelar os
ferência de imprensa na manhã do dia 23 de intervenientes dentro das propostas artísticas
fevereiro, no Departamento de Matemática e reflexões levadas a cabo”.
da Faculdade de Ciências e Tecnologia da UC.
Delfim Leão destacou a “valente carga simbó-
lica” deste espaço para a Revolução dos Cravos
A promoção da permeabilidade
e fez uma síntese do programa. Das 58 inicia-
entre Coimbra e a UC é uma
tivas, 41 são atividades performativas e as das “causas nobres do evento”,
restantes são debates que procuram “expan- pois “a cidade não existe sem os
dir a reflexão à volta do fenómeno artístico”. estudantes”, que representam
Desta forma, compõem um cartaz “mais com- um “grande peso na sua
pleto em relação a anos anteriores”, declara o atividade cultural”, ressalva.
vice-reitor.
Apesar de a Semana Cultural da UC ser pro-
Por Raquel Lucas
movida pela Universidade, Delfim Leão su- Segundo Delfim Leão, a “forte presença fe-
blinha que a iniciativa não se restringe à ins- minina nas várias propostas apresentadas” é
tituição. “O projeto convoca toda a academia também uma temática conducente do evento, O vice-reitor incentiva à participação por
a associar-se, pelo que a cidade é um palco”, uma vez que se aproxima o Dia da Mulher, a parte dos estudantes na XXVI Semana Cultural
realça. A promoção da permeabilidade entre 8 de março. Por isso, chama a atenção para a da UC, ao ressalvar o “grande esforço feito pela
Coimbra e a UC é uma das “causas nobres do exposição “50 anos de Ciência no Feminino: instituição para financiar as atividades”. Desta
evento”, pois “a cidade não existe sem os estu- A Voz das Mulheres na UC” e para o concer- forma, sublinha a “versatilidade de propostas
dantes”, que representam um “grande peso na to ‘Baixa, Rasa, Riba!’, que encerra a semana artísticas” programadas ao longo dos quinze
sua atividade cultural”, ressalva. No que toca com canções tradicionais da polifonia femini- dias. Apela ainda à “sensibilidade pela mensa-
à importância das entidades artísticas envolvi- na popular. gem do evento, norteada pelo tema da Voz” e
das, o vice-reitor garante que “cada uma espe- A emancipação da mulher no meio universi- ressalva a importância de os jovens da acade-
lha a sua própria sensibilidade”, pelo que todas tário, na opinião do vice-reitor, é “acompanha- mia “assegurarem a permanência dos ideais de
foram submetidas a um processo de seleção in- da por estes 50 anos de Revolução”, pelo que, abril” através da sua palavra.
dependente da sua tipologia. atualmente, admite existir “uma percentagem
O dirigente da UC destacou a importância maioritária feminina no tecido académico”.
da expressão artística: “a Cultura é comum a Nesse sentido, o dirigente revela que essa pre-
todos, apesar dos nossos interesses”. Assim, sença “se projeta em todo o tipo de iniciativas”.
apela a um maior apoio financeiro por parte do
Estado à arte, pois acredita que “mais recursos
vão atrair mais artistas” e, por consequência,
uma maior diversidade de obras.
5 de março de 2024 DESPORTO 011

Projeto de futebol feminino da AAC


em situação frágil
Presidente da SFutebol/AAC considera necessário melhorar condição
da equipa feminina. Atletas pedem maior apoio da direção.

- POR PEDRO CRUZ E INÊS REIS -

A
equipa feminina da Secção de Futebol Reavaliação do futuro O treinador teme o encerramento da equipa
da Associação Académica de Coimbra O presidente da SFutebol/AAC, Filipe Preces, devido ao desempenho desportivo e ao estado
(SFutebol/AAC) conta, na época de esclarece que no fim da época vai ser feita uma financeiro. Este cenário situação constituiria,
2023/2024, com uma taxa de derrotas de 87%. ponderação entre custos e receitas, a fim de nas palavras de Jorge Gonçalves, uma “regres-
Em 15 jogos, divididos entre o Campeonato autorizar a manutenção da atividade de cada são prejudicial para a AAC”. Acrescenta ainda
Nacional Feminino III Divisão, Taça de Futebol equipa. O dirigente realça que uma das princi- que esta ação iria criar uma “lacuna muito
Feminino e Taça de Promoção Feminino, a pais dificuldades do plantel feminino, desde a grave na história da Académica”. Algumas atle-
equipa soma uma vitória, um empate e 13 der- sua criação, é o facto de muitos patrocínios aca- tas apontam que receberam a informação por
rotas. Tanto o treinador, Jorge Gonçalves, barem por não se concretizar. O treinador tam- intermédio do treinador e confessam que não
como as atletas, consideram que os resultados bém aponta este aspeto como uma dificulda- foi bem vista.
não correspondem às expectativas devido a de: “sabemos que os patrocinadores não estão As jogadoras consideram que são julgadas
problemas como o elevado número de lesões. mentalizados para o futebol feminino, pois há muito depressa e que a equipa está sob uma
uma discrepância neste sentido”. grande pressão por parte da coordenação, o
O início da equipa feminina Apesar de caracterizar a realidade do futebol que também afeta a obtenção de melhores re-
e a sua valorização feminino como “exigente a nível financeiro”, o sultados. Mesmo ao encarar o potencial encer-
A história da SFutebol/AAC começou em 1887. presidente deseja “manter a equipa de um ponto ramento da equipa como uma possibilidade,
Em 2020 foi inscrita a primeira equipa feminina de vista efetivo”. Nesse sentido, Filipe Preces Leonor Rodrigues partilha que o bom ambiente
nas provas nacionais federadas para competir assegura que é necessário procurar meios para do balneário mantém as jogadoras motivadas
na III Divisão. Jorge Gonçalves, que se conside- melhorar a condição do grupo e cumprir os ob- e que prevalece a “paixão pelo futebol”. Jorge
ra “amante da Académica”, defende que a repre- jetivos financeiros e competitivos. Para “não Gonçalves partilha a ambição de que a sua equi-
sentação feminina no desporto e na SFutebol/ degradar a imagem da Académica”, o dirigente pa seja “um sustento de equidade no futebol fe-
AAC é “uma questão de equidade, não de igual- admite a possibilidade de ter uma equipa femi- minino no futuro”.
dade”. Nesse sentido, ressalta que a Académica nina “com configuração lúdica”.
“fez o que devia ter feito” ao criar este grupo.
Acrescenta que, apesar de o futebol feminino
ter evoluído, é necessário continuar a lutar pela
conquista de espaço, porque ainda se regista
uma diferença de apoio entre categorias.
Para as jogadoras, a existência de uma equi-
pa onde possam praticar a modalidade é fun-
damental, sobretudo porque sentem que o fu-
tebol feminino não é tão valorizado quanto o
masculino. A capitã, Alícia Pina, diz sentir-se
integrada na sociedade graças ao desporto. Por
sua vez, as suas colegas Maria Carlos e Leonor
Rodrigues veem-no como uma forma de es-
capar à rotina. Catarina Santos, membro da
equipa desde a sua criação, evidencia que mui-
tos consideram esta categoria como “demasia-
do amadora”. A avançada Laura Pereira sente
que, apesar do aumento da visibilidade, ainda
há muito trabalho a fazer.
As estudantes admitem que não estão no
mesmo patamar que a equipa masculina. No
entanto, realçam não terem as mesmas condi-
ções, o que pode justificar os resultados menos
positivos. Alícia Pina considera que a equipa
consegue fazer muito com o pouco que tem e
apela a um maior apoio por parte da direção.
Leonor Rodrigues categoriza a falta de comuni-
cação e de empatia dos dirigentes como “inad-
missível”,sublinhando a ausência dos superio-
Por Inês Reis
res nas atividades da equipa.
012 CENTRAL 5 de março de 2024

O ciclo entre “o medo e a esperança” da


violência doméstica
Dados da APAV espelham mulheres
como principais vítimas de violên-
cia doméstica em Coimbra. Há cir-
cunstâncias que dificultam in-
tervenção da associação, sendo
necessária ajuda de outras ins-
tituições, por sua vez, limita-
da por compassos de espera.

- POR BRUNA FONTAINE, CAMILA LUÍS


E LEONOR VIEGAS -

Por Bruna Fontaine

E
m 2023, a Associação Portuguesa de CMC, Ana Cortez Vaz, esclarece que, apesar de Segundo a gestora, o contexto social no qual
Apoio à Vítima (APAV) registou 93 254 ainda serem considerados dados anteriores, no a vítima cresce é um fator que influencia a
atendimentos. Estes são mais 9932 que primeiro semestre de 2023 já são conhecidos 93 maneira como vai interpretar uma realidade
em 2022 e mais 26 846 quando comparados aos processos. Dos processos referidos, “77% são abusiva, pois “os comportamentos de violência
dados de 2020. Em Coimbra, foram assinalados relativos a agressões a mulheres” e “86% dos estão normalizados” nesses ambientes. Além
1306 crimes, entre outras formas de violência. agressores são do sexo masculino”, sublinha disso, “tentar que as vítimas percebam o mais
Destes, 82,4% são crimes de violência domésti- a edil. No entanto, explica que a situação em rapidamente possível o que está a acontecer”
ca, como confirmam as estatísticas da Câmara Coimbra está “mais ou menos estável”. é uma das tarefas da APAV. Uma intervenção
Municipal de Coimbra (CMC). Num crime que “A violência pode ser psicológica ou sexual, desde cedo é um passo para a consciencializa-
vê o seu número de vítimas a aumentar a nível não precisa de ser física”, clarifica Natália ção das injuriadas de modo a detetarem um
nacional, “76 a 80% das pessoas que entraram Cardoso. A jurista assume que, por norma, “comportamento padrão”. Contudo, Natália
em contacto com a APAV são do sexo feminino”, “quando há violência física, há psicológica”. Cardoso admite que tal “nem sempre se con-
revela Natália Cardoso, jurista e gestora do ga- Sobre esta última, sublinha que é “mais difícil segue, porque as pessoas mudam e os traços
binete da associação de Coimbra. de identificar e que requer uma maior cons- podem não ser visíveis”.
Os números de há dois anos são os mais recen- ciencialização da vítima”. Por sua vez, Ana A jurista acredita que há uma série de ativis-
tes descritores da evolução da violência domés- Cortez Vaz, exalta que “a relação de proximi- mos que consciencializam as pessoas a pedir
tica na cidade. A vereadora pela Ação Social da dade, afetiva ou familiar, entre o agressor e a ajuda, mas realça alguns entraves enfrenta-
vítima” reforça a dificuldade de mentalização. dos. “Há uma manipulação pela pessoa agres-
Além de uma maioria feminina, 48,7% sora, que acrescenta culpa à vítima”, esclarece.
dos casos nacionais ocorrem em residência Já Ana Cortez Vaz salienta a vulnerabilidade
comum, segundo os dados da APAV de 2023. social e económica das lesadas que, muitas
A pesquisa revelou, então, que 92% dos epi- vezes, “por falta de recursos financeiros, con-
sódios criminosos ocorrem no “local onde as tinuam a submeter-se à violência”. Realça que
pessoas se deviam sentir mais seguras e con- essa dependência financeira, além de constran-
fortáveis”, aponta a vereadora. Sobre o per- ger a denúncia, faz com que recaia sobre a ví-
fil das vítimas, Natália Cardoso explica que tima “não só ultrapassar todo o trauma, mas
tendem a ser “mulheres casadas, em união também adaptar-se a novos territórios, vidas
de facto ou que se separaram há pouco tempo e dinâmicas”. Acrescenta que muitas delas se
e sofrem de violência física e psicológica por fazem acompanhar dos filhos.
parte dos seus companheiros”.
5 de março de 2024 CENTRAL 013
A sociedade e a cultura também são fatores
destacados. “As vítimas do sexo feminino têm Dados Concelhios - Coimbra (2022)
enraizada a ideia de que o amor cura tudo”,
reflete a coordenadora da APAV. Elucida que Ligação entre denunciados(as) e as
a fase de ataque violento é seguida de um mo- Vítimas de violência doméstica
mento de pacificação, o que acarreta “um ciclo
entre o medo e a esperança, e enfraquece a per-
ceção completa da vítima”. Sobre o meio social,
Ana Cortez Vaz segue a mesma ideia: “ainda vi-
vemos numa sociedade masculinizada e, talvez
isso, dificulte a descida destes números”.
A coordenadora da APAV constatou que “as
situações são mais complexas” e que a violên-
cia doméstica é uma problemática no meio de
“muitos casos associados”. Esta teia de circuns-
tâncias dificulta a intervenção da associação,
visto que implica “trabalhar a situação por vá-
rios prismas”. O serviço de outras instituições,
como de apoio psicológico, passa a ser necessá-
rio, o que implica “algum compasso de espera”,
devido a limitações de recursos humanos.
Natália Cardoso considera que os jovens já
têm “um posicionamento mais crítico” em
relação aos problemas associados à violência
doméstica. No entanto, acredita que existem
“muitos estudantes nestas circunstâncias que
não procuram ajuda”. Aponta que os alunos
deslocados, que não conhecem os meios de
apoio, “são mais suscetíveis a estas situações”.
O contacto com a APAV pode ser feito por cha-
mada telefónica local, e-mail, ou através de Fonte: APAV – Estatísticas 2022 – Gabinete de Apoio à Vítima Coimbra

uma linha nacional. O acompanhamento pode


ser realizado por videochamada, nos casos em a mediação com os vários serviços de justiça. nenhuma medida de proteção para idosos ou
que a pessoa afetada não possa dirigir-se ao ga- Apenas se for evidente que existe perigo de pessoas com algum tipo de incapactidade. Ou
binete. A associação presta apoio jurídico, so- vida, pode haver a necessidade de “abrir uma seja, pode ter de se entrar em contacto com
cial e psicológico a “todas as pessoas que sejam exceção à confidencialidade”, assume Natália uma entidade de extração social.
vítimas de um crime”, não apenas em caso de Cardoso. A sinalização de casos de violência Ana Cortez Vaz informa que o papel da autar-
violência doméstica, relembra a coordenadora. doméstica à associação também pode ser feita quia é encaminhar as vítimas às instituições
A primeira abordagem é realizada por volun- por outras pessoas que tenham conhecimento competentes. Indica que existe um centro de
tários que dão algumas informações e ajudam a das agressões. acolhimento de emergência noturno direcio-
preencher qualquer requerimento necessário. Parte do trabalho da APAV concentra-se em nado a pessoas em situação de sem-abrigo, que
Nesta fase, a APAV procura perceber qual é a dar resposta às “carências sociais que decor- também está aberto a quem necessitar. Estão,
situação de crime em que a vítima se encontra rem da prática do crime”, como a necessidade ainda, a ser promovidos dois centros de acolhi-
para, depois, ser encaminhada para serviços de cuidados psicológicos ou de alimentação, mento temporários, em Taveiro e Souselas.
mais especializados ou a outras instituições. ilustra a responsável. A associação avalia ainda No seio da Associação Académica de Coimbra
O contacto é anónimo e não é necessário que a existência de crianças, idosos ou outras pes- (AAC), foi criada uma unidade de apoio à vítima
a vítima tenha denunciado o caso às autorida- soas vulneráveis envolvidas. No caso dos mais que permite marcar consultas com médicos do
des. Caso queira avançar com o processo-cri- novos, o caso pode ser apresentado à Comissão Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra
me, a associação também procura informar a de Proteção de Crianças e Jovens. No entanto, ou com profissionais voluntários. Sofia Duarte,
denunciante acerca dos seus direitos e facilitar os mecanismos da instituição não contemplam vice-presidente da Direção-Geral da AAC, es-
clarece que tem de ser a vítima a fazer a marca-
ção, mas que apenas os médicos têm acesso aos
respetivos dados. As competências deste ser-
viço estendem-se entre a violência no namoro,
sexual ou doméstica e a casos de perseguição.
Neste momento, a APAV ainda não tem “nú-
meros fiáveis” que possa fornecer em relação
aos casos reportados de violência doméstica
em Coimbra no início de 2024, clarifica Natália
Cardoso. Considera que os últimos anos têm
sido marcados por oscilações, mas acredita
que, em comparação a 2022, a quantidade de
novos processos vai diminuir. Já o número de
atendimentos “aumentou substancialmente”,
acrescenta. Por outro lado, Ana Cortez Vaz de-
clara que a diminuição destes números é um
processo contínuo e complicado, mas “é para
isso que se trabalha”.
014 CIÊNCIA E TECNOLOGIA 5 de março de 2024

O estigma da infertilidade Por Sofia Ramos

Idade avançada nas mulheres constitui principal entrave


para engravidar. Docente da FMUC reforça importância da
consciencialização e prevenção para combater atrasos no diagnóstico.
- POR LUÍSA MALVA E BÁRBARA MONTEIRO -

S
egundo a Organização Mundial da Saúde meçou a exercer medicina de fertilidade, havia Teresa Almeida Santos enuncia que há falta de
(OMS), um em cada seis casais é afeta- casais que apenas recorriam aos serviços após dadores de ovócitos e, sobretudo, de esperma.
do pela infertilidade. Por este motivo, é oito anos a tentar engravidar. Contudo, esta si- “Há mulheres solteiras e casais de mulheres que
considerada, pela instituição, um problema de tuação é rara na atualidade devido a uma maior pretendem engravidar e são necessários dado-
saúde pública. Nas mulheres, “o diagnóstico literacia. Ainda assim, Teresa Almeida Santos res de esperma que se voluntariem”, declara. Os
tem aumentado ao longo do tempo e afeta-as a partilha que os mitos relacionados à fertilidade homens, tal como as mulheres, passam por uma
nível físico e mental”, explica Teresa Almeida são muitas vezes adquiridos através das redes avaliação genética e da sua função reprodutiva.
Santos, professora na Faculdade de Medicina sociais. “É necessário dizer aos profissionais de Comparado ao processo de doação por parte
da Universidade de Coimbra (FMUC). As causas saúde que devem informar sobre infertilidade da mulher, a masculina é simples e passa so-
podem ser apenas femininas, masculinas ou de e não somente sobre contraceção em consultas mente pela colheita de esperma, que resulta
ambos os sexos. Porém, o mito acerca de a ferti- de planeamento familiar”, reitera. numa compensação de 509 euros, válida a nível
lidade ser um problema associado, na maioria Segundo a profissional, a doação de óvulos nacional. Após uma avaliação da qualidade es-
das vezes, à mulher prevalece. Em 10% das si- apresenta-se como o último recurso para casais permática, “metade dos candidatos a dadores
tuações a origem é desconhecida, “o que reflete em que as mulheres já não apresentam reserva são recusados, já que não cumprem os valores
a falta de investigação na área”, acrescenta. ovárica. Para Ana Paula Sousa, investigadora mínimos de espermatozoides requeridos”, ex-
Para Teresa Almeida Santos, também coorde- do Centro de Neurociências e Biologia Celular plica a coordenadora.
nadora científica da clínica privada Eugin, a pre- da UC, a maior parte das mulheres que doam “Os parâmetros espermáticos médios são
venção é um fator essencial. Segundo a médica, ovócitos fazem-no por razões “puramente al- 50% inferiores daquilo que eram há 50 anos”,
é necessário fomentar a literacia da população, truístas”. Contudo, atesta que “uma pequena clarifica Teresa Almeida Santos. Elabora que,
especialmente dos jovens, de modo a aumentar porção o realiza pela compensação financeira”, além de comportamentos nocivos, como o con-
a probabilidade de se realizar um diagnóstico equivalente a 1018 euros. sumo generalizado de álcool e de drogas, as in-
precoce. Refere ainda que há um atraso signifi- O procedimento médico para a doação de óvu- fluências ambientais e os tóxicos contidos nos
cativo em alguns diagnósticos, como é o caso da los requer uma sedação e uma intervenção cirúr- alimentos são das principais razões que jus-
endometriose, “uma das causas mais comuns gica. Ana Paula Sousa acredita que é um proces- tificam estes dados. Já na mulher, a idade é o
da infertilidade feminina em idade reproduti- so relativamente seguro. Ainda assim, explica principal fator para o sucesso de uma gravidez,
va”, que “demora cerca de oito anos a detetar”. que, em raros casos, pode resultar em interna- explicita a docente.
O desconhecimento resulta na desvalorização mento devido a uma reação denominada “hi- “A fertilidade diminui de forma assustadora
de certos sintomas, como é o caso de dores for- perestimulação ovárica”. Para João Ramalho- a partir dos 35 anos, mas começa a decrescer
tes durante o período menstrual e em relações Santos, antigo professor do Departamento de a partir dos 25, pico da idade fértil”, elucida
íntimas. Sublinha que existe também uma des- Ciências da Vida da UC, a hiperestimulação a coordenadora. Existe uma tendência para
consideração pelo desconforto da mulher por ovárica “já não se apresenta como um risco”. descredibilizar esta situação, mas isto é “o pior
parte dos próprios médicos. Apesar disso, “deve haver um cuidado rigoro- que se pode fazer”, defende. Teresa Almeida
A docente reconheceu, durante os anos de prá- so” para mulheres que têm síndrome de ovário Santos apela a um cuidado precoce, de forma a
tica medicinal, que os casais procuram ajuda poliquístico, de forma a prevenir um agrava- combater um atraso no diagnóstico e permitir
cada vez mais cedo. Informa que, quando co- mento da estimulação, acrescenta. o tratamento atempado.
5 de março de 2024 CIÊNCIA E TECNOLOGIA 015

Cancro da mama: do diagnóstico à luta


Dirigente da LPCC ilustra importância de dar atenção a lado emocional de doentes
oncológicos. Rastreio e mamografia de rotina possibilitam deteção precoce.

- POR DÉBORA BORGES -

D
e acordo com a Liga Portuguesa Contra faixa etária mais jovem, o presidente salien- Circulação. A nível social, os apoios da LPCC
o Cancro (LPCC), o cancro da mama é ta que são “muito poucos casos” e que, os que englobam “movimentos de auto e entreajuda,
a doença oncológica mais comum nas existem, “por norma, tratam-se de situações bem como ajudas para cabeleiras, soutiens e
mulheres. Contudo, pode também afetar o gé- de hereditariedade e genética”. próteses provisórias”, revela. Além disso, a ins-
nero masculino. Segundo o presidente da di- A altura do diagnóstico é um processo “ex- tituição oferece “serviços de psicooncologia ao
reção do Núcleo Regional do Centro da LPCC, tremamente doloroso e o tratamento reflete- doente e à sua família”. Sublinha ainda que “o
Vítor Rodrigues, é importante “fazer uma ma- se num período emocionalmente brutal”, frisa apoio aos familiares é fundamental”, uma vez
mografia de rastreio, mesmo não apresentan- o dirigente. O stress é um problema que surge que passam também por “momentos muito di-
do qualquer sinal ou sintoma”. Realça ainda nesta fase, uma vez que “a vida normal passa fíceis” que, por vezes, “a sociedade esquece”.
a necessidade de estar "alerta aos sintomas por uma altura disruptiva”, declara. Em re- A LPCC desenvolve programas de sensibiliza-
clássicos”: a tumoração, retração da pele/ma- lação aos efeitos de tratamentos como a mas- ção, nomeadamente caminhadas, que são uma
milo ou alguma mudança de forma da mama. tectomia, a tumorectomia e a quimioterapia, maneira de “olhar sempre pelo lado positivo e
Partilha que “a maioria das situações do cancro estes afetam “a autoimagem da mulher” e, so- não pelo lado negativo” e de incentivar a que
da mama detetam-se através da mamografia de bretudo, o seu estado emocional. “recorram cada vez mais cedo aos cuidados de
rastreio ou de rotina”. Vítor Rodrigues garante que “todo o doen- saúde”, informa Vítor Rodrigues. Relembra
Segundo Vítor Rodrigues, é “cada vez menos te oncológico conta com apoios sociais, fi- ainda que “é necessário apoiar no momento de
frequente encontrar nódulos”, devido à dete- nanceiros e emocionais”. Através da emissão doença ativa” e, posteriormente, ter “forças
ção precoce com o rastreio. Sublinha que “os de um atestado multiusos, o paciente obtém para reassegurar o seu lugar normal e habitual
nódulos que ultimamente surgiram caracteri- um conjunto de benefícios, nomeadamente a na sociedade”.
zam-se como benignos”. No que diz respeito à diminuição do IRS e a isenção do Imposto de

A voz das mulheres nos media


Falta de mulheres em cargos de chefia ainda se faz sentir, considera
jornalista na Rádio Renascença. Docente da FLUC defende que OCS não
devem estar “apenas dependentes de uma perspetiva masculina”.

- POR ANA CARDOSO E EDUARDO NEVES -

A
s questões de género são um tema que e evidencia o peso que “evitar a tendência em concebida de que estas profissionais “não são
tem vindo a ganhar relevância ao se recorrer a fontes masculinas" pode ter. Ao capazes de ir para determinado sítio a partir de
longo dos anos. Desde a década de 70 abordar temáticas feministas, os media contri- certa hora” ou que “não conseguem realizar as
que os media têm um “grande poder de influên- buem para que as problemáticas sejam sinali- tarefas como um homem”, declara. A diretora
cia na maneira como a sociedade pensa”, ex- zadas e combatidas, conclui a docente. defende que, para combater esta questão, é im-
plica Rita Basílio, investigadora no Centro de Quanto à presença feminina nos OCS, a in- portante existir equilíbrio e diversidade den-
Estudos Sociais da Universidade de Coimbra vestigadora menciona que “as redações estão tro das redações, bem como introduzir esses
(UC). Desta maneira, a também docente re- muito feminizadas”. Liliana Carona explica temas no ensino.
lembra o peso que estes meios têm no que toca que esta realidade se reflete desde a formação Como docente da Faculdade de Letras da UC,
à sinalização de problemas sociais como a de- dos profissionais. Contudo, face a este cená- Rita Basílio assegura que, apesar de não haver
sigualdade de género. Por outro lado, verifi- rio, ambas apontam que existe uma falta de unidades curriculares direcionadas para as
cam-se várias disparidades entre mulheres e representatividade feminina em posições de questões de género, há “uma parte do corpo
homens, como constata a diretora do Notícias chefia. Segundo a também jornalista da Rádio docente que se preocupa” com elas. O objetivo
de Gouveia (NG), Liliana Carona. Renascença, um dos motivos é a maternidade: é realçar a persistência das desigualdades para
Rita Basílio salienta a importância de os “a mulher acaba por deixar cair esses cargos que os alunos estejam “preparados para lidar
media integrarem as visões das mulheres e porque não se sente apoiada nas suas opções com isso”. A professora defende, então, um jor-
“não estarem apenas dependentes de uma de vida”. nalismo “responsável e inclusivo, independen-
perspetiva masculina”. Nesse sentido, urge Para Liliana Carona, a “ideia conservadora temente do género”.
para um escrutínio das informações apresen- da mulher jornalista” é uma “herança anterior
tadas nos Órgãos de Comunicação Social (OCS) ao 25 de abril” que ainda paira. Há a visão pré-
016 CIDADE 5 de março de 2024

O que os jovens partidários


esperam para o futuro do país?
Habitação, Emigração, Educação, Ambiente, Economia, Direitos Humanos e par-
ticipação jovem na política foram principais tópicos discutidos. Juventudes
apresentam perspetivas sobre “bolhas ideológicas” na vida partidária.
- POR JOANA ALMEIDA, GUILHERME BORGES E CLARA NETO -

D
e modo a compreender o lugar dos jo- Segundo Mariana Rodrigues, “deve haver dis- Pelo contrário, Emanuel Candeias diz que o
vens no futuro do país, o Jornal A tinção entre as reivindicações dos jovens e as desinteresse dos jovens na política “é claro”,
CABRA conversou com os representan- de outras faixas etárias", contudo não devem o que se traduz na elevada abstenção. Bruno
tes de cada grupo jovem dos partidos com as- haver separações dentro do partido. Nesse Pedrosa admite que pode haver uma apatia
sento parlamentar. Foram entrevistados Inês sentido, Celso Monteiro acredita que estas es- geral, mas garante que o LIVRE “tenta estar
Guerreiro (Juventude Comunista Portuguesa truturas “são uma forma de distinguir a ‘mesa próximo da juventude”. João Antunes julga
- JCP), Mariana Rodrigues (Bloco de Esquerda dos pequenos’, onde os jovens não têm impac- que este problema “era maior há uns anos”,
- BE), Bruno Pedrosa (LIVRE), Daniel Azenha to direto nas políticas do partido, da ‘mesa dos pelo que, agora, os jovens têm vontade de se
(Juventude Socialista - JS), Carolina Rojais grandes’, onde se sentam aqueles que já estão mover “dos partidos principais, como o PS e o
(Juventude Social Democrata - JSD), Emanuel na Assembleia da República (AR)”. PSD, para novas forças de mudança”. Já a JCP
Candeias (Pessoas-Animais-Natureza - PAN), e a JS consideram que não existe uma redução
Celso Monteiro (Iniciativa Liberal - IL) e João Relação entre juventudes e partidos do entusiasmo por parte dos jovens na vida po-
Antunes (CHEGA). Todos os núcleos partidários juvenis de lítica, uma vez que continuam ativos.
Coimbra referem que a sua relação com os Para o PAN, a solução para a falta de interesse
Pertencer a juventudes partidárias: os dois partidos é de cooperação. Mariana Rodrigues, pode passar por um envolvimento desde cedo
lados da moeda Inês Guerreiro e Bruno Pedrosa asseguram na política, através da inserção de literacia po-
Daniel Azenha, da JS, acredita ser importante que, nos seus partidos, os jovens são coloca- lítica no ensino. Mariana Rodrigues entende
para os jovens compreender o que é feito pelos dos em pé de igualdade na discussão política. que a resposta está numa alteração estrutural
partidos e a função destes para a democracia. Daniel Azenha explica que a JS tem assento da visão partidária sobre os jovens, que sente
Para isso, defende como essencial a capacida- na Comissão Política Federativa e faz parte ser “infantilizada”.
de de “nos inserirmos” na atividade política. dos órgãos do PS, pertencendo “às listas, não
Para Inês Guerreiro, pertencer à JCP permite- só nas Legislativas, como nas Autárquicas”. A E os políticos, interessam-se pelos jovens?
lhe partilhar com outras pessoas a vontade de JSD possui uma estrutura autónoma, mas esta- Apesar de reconhecer que ainda há um cami-
lutar “contra injustiças”. Carolina Rojais valo- belece “uma estreita colaboração com o parti- nho a ser feito, Carolina Rojais defende que a
riza o espaço que a JSD proporciona para os jo- do”, declara Carolina Rojais. Nessa lógica, João voz dos jovens já é mais considerada pelos po-
vens apresentarem as suas ideias e “sentirem Antunes enfatiza a união nacional que existe líticos, como diz acontecer com as listas do PSD
que a sua voz é ouvida”. Emanuel Candeias, do entre o CHEGA e a sua juventude, “ao contrá- Coimbra. Daniel Azenha partilha da mesma
PAN, defende que as juventudes partidárias são rio do que se possa pensar”. Emanuel Candeias opinião, pelo que também os encara como po-
meios essenciais para “estabelecer uma ponte e Celso Monteiro sublinham o valor da auto- líticos e reconhece a sua posição na AR. João
de compreensão intergeracional”. Por sua vez, nomia nas juventudes para fazerem chegar as Antunes confia que o CHEGA “tem feito um ex-
João Antunes, do CHEGA, acusa as principais suas ideias aos órgãos nacionais. celente trabalho” nesse sentido, ao servir-se do
juventudes de serem, “fundamentalmente, exemplo da deputada Rita Matias.
máquinas de criação política e elevação indi- Os jovens interessam-se pela política? Noutro ponto de vista, Celso Monteiro crê
vidual”. Contudo, descreve a própria estrutura De acordo com a IL, o BE e a JSD, existe um de- que “90% dos políticos não se interessam pelos
como “um local onde os jovens podem trocar sinteresse na vida partidária e não na política. jovens”, apontando que “a idade avançada dos
ideias em prol do país e não de si próprios”. Mariana Rodrigues presume que isto aconte- políticos reduz a sua ligação com estes”. Para
Por outro lado, o LIVRE, o BE e a IL não têm ce pois “os jovens sentem que deixaram de ser Inês Guerreiro, “os últimos governos e a direita
juventudes partidárias. Bruno Pedrosa consi- ouvidos e tidos em conta”. Contudo, Carolina não têm mostrado muito interesse em ouvir os
dera que “criar uma estrutura à parte, só para Rojais reforça que “os jovens se movem, cada jovens, caso contrário, incluíam-nos nas suas
os jovens, não faz sentido”, ao indicar que no vez mais, por causas, o que mostra que conti- políticas”. Já Emanuel Candeias julga que há
LIVRE “todas as vozes são ouvidas por igual”. nuam interessados na política”. um interesse que acaba por diminuir pois “não
5 de março de 2024 CIDADE 017
é estimulado”. refere que é através do encontro com as pes- portes públicos”.
Negando que essa ideia se aplica à realida- soas que “passamos a conhecer os seus proble- Mariana Rodrigues: “os jovens têm pressa de
de bloquista, Mariana Rodrigues reitera que mas e conseguimos sair dessa bolha”. Já João ter autonomia fora da casa dos pais e acesso à
“existe uma tentativa de remeter as questões Antunes admite que “é melhor isso do que não habitação. Têm pressa de estudar sem que as
dos jovens para segundo plano”. Bruno Pedrosa haver ideais comuns que nos guiem”. propinas os empatem num ES democrático.
critica a média de idade na AR, que ilustra “uma Por outro lado, a JS, o LIVRE, a JCP e a IL Querem uma vida digna, com direitos plenos e
falta de representatividade jovem”. não veem esta visão refletida nos seus par- salários assegurados ao fim do mês que não sir-
tidos, considerando que há abertura para vam apenas para pagar a renda. Querem viver
Medidas que “caem no esquecimento” novas ideias. Inês Guerreiro reconhece que sem o tormento da misoginia, do racismo, da
A JSD e o PAN destacam a ciência como um posições firmes dentro do partido são uma LGBTfobia. Querem um planeta habitável que
dos temas mais esquecidos no panorama políti- forma de evitar a neutralidade. Embora veja não seja um caixote de lixo público dos produ-
co nacional. “Temos imensa qualidade nos qua- que a JSD é definida por ações pautadas, tores nem uma mina descartável do capital. É
dros de investigação científica que formamos Carolina Rojais pensa que a sua juventude é necessário garantir a manutenção dos direitos
que não são devidamente valorizados pelo re- aberta a novas sugestões. que fomos adquirindo, democratizar e desco-
gime das bolsas”, situação que Carolina Rojais lonizar o ensino. Sem discutir estes temas e ter
quer colmatar com as propostas da Aliança Como combater a “fuga” dos jovens um plano coeso que atue já no dia 11 de Março
Democrática. O BE, a JS, o PAN e o LIVRE argu- Segundo o PAN, “o mal não é a emigração em vai ser muito difícil fixar jovens em Portugal e
mentam que a cultura é outro tema que deve ser si, pois um jovem pode querer ir para outro garantir que seja um país com futuro”.
mais discutido. Nesse sentido, Daniel Azenha país, o mal é ser obrigado a isso”. Mariana Bruno Pedrosa: “mais participação, vonta-
propõe: “temos de garantir que o setor alcança Rodrigues acredita que os baixos salários são de de transformar e oportunidades. A pro-
a capacidade financeira para se desenvolver”. um dos principais motivos para “50% dos jo- posta da herança social, que consiste em
Bruno Pedrosa sente que tem sido pouco de- vens” ponderarem sair de Portugal. Para o BE, criar uma conta poupança à nascença, por
batida a necessidade de “uma transição ecoló- a JS e a JCP, a questão salarial deve ser revista, volta dos cinco mil euros, através de um im-
gica”. Emanuel Candeias defende a promoção propondo um aumento destas remunerações posto sobre as grandes fortunas, acima de um
de uma “economia verde”, pois há partidos que para fixar os jovens. Estes “não se reveem na milhão de euros”.
“ainda negam a crise climática”. Em concor- forma como o mercado está e em como o ren- Daniel Azenha: “um grande compromis-
dância, Mariana Rodrigues propõe a “transição dimento não é suficiente para as despesas bá- so. Acima de tudo, temos de cumprir o nosso
para uma economia de alto valor acrescentado sicas”, aponta Carolina Rojais. Daniel Azenha plano - um ambicioso Orçamento de Estado -
que tenha em conta a sustentabilidade ambien- acredita num “choque salarial” em detrimento que prova a nossa prioridade: os jovens”.
tal”. Daniel Azenha acredita que o combate à de um “choque fiscal” no setor financeiro, de- Carolina Rojais: “que seja um país onde os
crise climática deve ser uma missão de “todos fendido pelo CHEGA, que propõe uma “dimi- jovens, ao entrarem no mercado de trabalho,
os partidos”. O BE, o PAN e o LIVRE salientam, nuição forte da carga fiscal”. consigam ter uma menor carga fiscal, maiores
ainda, que a luta contra o racismo, xenofobia, A JS e o BE apostam na resolução da crise ha- rendimentos e melhores condições na garantia
violência de género e discriminação em todas bitacional e na melhoria do acesso à educação de habitação própria. Que consigam ter acesso
as suas formas precisa de ser mais discutida. para evitar que os jovens abandonem o país. a serviços básicos como a saúde”.
Além disso, Emanuel Candeias destaca a falta Daniel Azenha sublinha a necessidade de foco Emanuel Candeias: “que os jovens tenham
de uma conversa mais abrangente sobre pes- no setor laboral, enquanto Bruno Pedrosa pro- mais habitação e melhor acesso a residên-
soas com deficiência. põe a semana de quatro dias de trabalho. Para cias em Coimbra. Temos de aumentar este
Uma das grandes bandeiras da IL é a “refor- a IL, os problemas “não se resolvem aos gritos número e devemos valorizar as repúblicas,
ma eleitoral”, dado que, em 2022, “cerca de nem com populismos ou demagogias”, apelan- características da nossa cidade. É importan-
700 mil votos foram para o lixo", refere Celso do a uma maior participação jovem como reso- te preservá-las”.
Monteiro. Já João Antunes desenha um para- lução a esta problemática. Celso Monteiro: “não consigo viver num país
lelismo entre “a imigração descontrolada” e a em que se diz que está tudo bem, quando vemos
“falta de segurança no país”. Inês Guerreiro O que anseias para a próxima legislatura? tantos jovens a emigrar. Espero que haja uma
sente que se devem criar espaços “onde as pes- Inês Guerreiro: “o aumento dos salários, o diminuição do imposto sobre as empresas que,
soas possam debater e participar” no processo combate à precariedade, a defesa da contra- desta forma, vão querer pagar melhor”.
de transformação política. tação coletiva e dos direitos dos jovens tra- João Antunes: “que ganhe a verdadeira direi-
balhadores. Também o direito à habitação, o ta. Os jovens têm de ser vistos como pessoas que
O mito das bolhas ideológicas controlo das rendas e dos despejos e a respon- têm algo a dar a Portugal e o país precisa de mu-
De acordo com os representantes do BE, do sabilização da banca pelo aumento das taxas de danças profundas para retribuir aos jovens”.
PAN e do CHEGA, as juventudes incentivam juro. Um maior investimento e menores bar-
bolhas ideológicas. Mariana Rodrigues acredi- reiras de acesso ao Ensino Superior (ES) para - Com colaboração de Raquel
ta que “as juventudes partidárias só discutem combater as desigualdades. Defesa e preserva- Chaves e Raquel Lucas -
certos temas e não estão envolvidos na vida po- ção do ambiente, através do direito à mobilida-
lítico-partidária do país”. Emanuel Candeias de e do desenvolvimento da ferrovia e trans-

Fotografias por Joana


Almeida, Guiherme Borges,
Raquel Chaves, Clara
Neto e Luísa Rodrigues
018 REPORTAGEM 5 de março de 2024

Pressionadas até à exaustão:


o burnout no feminino
Relatos de Isabela Silva (nome fictício), Ariana Rodrigues
e Joana Alves mostram impacto da síndrome de burnout
nas estudantes do Ensino Superior. Maior exigência
profissional, assédio moral e expectativas sociais
apontados como fatores de agravamento da doença.
- POR DANIELA FAZENDEIRO -

O
relatório Women in the Workplace passar por um episódio de burnout em feverei- e mal-humorada”, e, no pior momento, fez com
de 2021, realizado pela empresa de ro de 2023. Após meses ininterruptos de estudo que se isolasse durante um mês. “Não aguentava
consultoria McKinsey em conjunto para os exames, começou a sentir os efeitos do mais, precisava de ajuda”, são as palavras que a
com a organização Lean In, revelou que 42% esgotamento no corpo e na mente. O cansaço jovem usa para retratar o momento em que re-
das mulheres entrevistadas sofriam ou já veio acompanhado de dores corporais e de cabe- definiu a sua saúde mental como prioridade. No
sofreram sintomas de burnout, em comparação ça, aliado à ansiedade que a impedia de dormir. entanto, esclarece que receber acompanhamen-
com 35% dos homens. Este é apenas um dos Para Joana Alves, estudante na Faculdade de to psicológico não está ao alcance de todos, pois
estudos que evidenciam que as mulheres são Letras da UC, a exaustão que sentia deixou de requer “uma boa situação financeira”. Optou
mais suscetíveis a sofrerem com a síndrome ser suportável em julho de 2022. Um semestre pelas consultas de psicologia cedidas pela UC,
de burnout do que os homens. Quais são os repleto de nove unidades curriculares por rea- mas a longa lista de espera deixou-a igualmente
motivos para esta discrepância? lizar, a pressão para completar a licenciatura desamparada. O que restou foi o apoio incondi-
Anabela Vitorino Costa, psicóloga clínica, e um estado mental já deteriorado levaram-na cional dos amigos e familiares.
acredita que a realidade atual do mercado la- ao seu limite. A ansiedade constante e o cansa- “Foi falhanço, atrás de falhanço”, é a descri-
boral é a culpada. A seu ver, as mulheres são ço extremo deixaram-na num estado vulnerá- ção que Joana Alves faz sobre o período do seu
mais suscetíveis de sofrer episódios de bur- vel em que não conseguia sequer lidar com o esgotamento. O cansaço obrigava-a a dormir
nout devido a três fatores principais. A exi- pensamento de estudar. muitas horas, mas não acordava descansada.
gência acrescida que sentem para alcançarem Isabela Silva, estudante conimbricense na O stress e a pressão que sentia fizeram com
o mesmo lugar na hierarquia profissional que Universidade do Minho, foi diagnosticada com que adotasse comportamentos de autossabo-
um colega do sexo masculino, o assédio moral síndrome de burnout no início de 2023. Apesar tagem, como faltar às aulas ou refugiar-se na
e a expetativa imposta pela sociedade que a mu- de ter sido a própria a mencionar a doença à sua comida para ignorar a situação em que estava.
lher deve equilibrar todas as áreas da sua vida. psicóloga, descartou a hipótese porque tinha Durante o auge da doença, a jovem pensava que
Contudo, lembra que a última questão referida uma ideia pré-concebida que não se aplica- nunca iria conseguir recuperar o seu bem-es-
não é considerada quando se realiza o diagnós- va a como se sentia no seu dia a dia. Sentia-se tar mental. Embora já fosse acompanhada por
tico da doença. “bem e realizada”, além de ter muita energia, uma psicóloga, não mencionou a possibilidade
A Organização Mundial da Saúde define o bur- mas sentia também imenso cansaço, algo que de burnout durante as consultas, porque, se-
nout como uma síndrome resultante de stress a jovem não sabia que podia coexistir. Segundo gundo a própria, só se apercebeu da gravidade
crónico causado pelo trabalho que não foi ge- a sua psicóloga, o burnout de Isabela Silva é da situação meses depois. Assim como Ariana
rido com sucesso. A doença, incluída na lista acompanhado de um elevado grau de satisfa- Rodrigues, foi muito apoiada por familiares e
internacional de doenças ocupacionais a 27 de ção profissional e académica. pelo namorado.
maio de 2019, possui três dimensões: sentimen- Embora possua diagnóstico, Isabela Silva não
tos de exaustão, sentimentos de negativismo ou “Sinto-me cansada, mas se sente restringida pelo mesmo, pois afirma
cinismo na relação com o trabalho e sensação não consigo parar” não estar incapaz de desempenhar as tarefas a
de ineficácia e falta de realização pessoal. Anabela Vitorino Costa declara que as que se propõe. Na sua ótica, a maior parte das
consequências desta doença são muito pessoas sofre episódios de burnout devido a fa-
Esgotadas impactantes nos indivíduos. “Numa primeira tores externos, como as vidas atarefadas e stres-
Isabela Silva (nome fictício), Joana Alves e fase a pessoa não atende aos sintomas e continua santes que caracterizam as sociedades moder-
Ariana Rodrigues são três jovens mulheres a trabalhar até ficar esgotada”, menciona. nas. No seu caso, sente-se a maior responsável
marcadas por esta síndrome. O cansaço físi- Quando falamos de mulheres, a psicóloga por acreditar que se colocou nas situações que
co e mental extremo e a ansiedade constante acredita que as consequências são ainda mais a levaram a ter um esgotamento: o trabalho, o
foram os principais sintomas que assombra- nefastas na relação consigo mesmas e com os curso de inglês e a licenciatura na universida-
ram as suas rotinas durante meses. Sintomas que as rodeiam. “Põe em causa a sua relação de. “Sinto-me cansada, mas não consigo parar”,
que Anabela Vitorino Costa refere serem co- com a família, com o meio profissional, afeta a acrescenta. “Houve uma altura em que dormia
muns em pessoas esgotadas. sua autoestima e a sua capacidade de lidar com 12 a 16 horas seguidas”, partilha a estudante.
Ariana Rodrigues, licenciada em Direito tarefas diárias”, reitera. Tanto para Ariana Rodrigues como para
pela Faculdade de Direito da Universidade de Ariana Rodrigues garante que o esgotamento Joana Alves, o esgotamento teve como conse-
Coimbra (FDUC), apercebeu-se que estava a a levou ao seu limite máximo, deixou-a “apática quência a incapacidade de completar as uni-
5 de março de 2024 REPORTAGEM 019

Por Daniela Fazendeiro

dades curriculares em que estavam inscritas. lugar. Atualmente, a jovem acredita que o bur- burnout é comum, segundo Anabela Vitorino
“Recuperar de um estado de burnout e voltar nout não a afeta tanto, mas ainda sente “o re- Costa. Tal deve-se ao facto de serem “pessoas
à rotina é complicado”, confessa a antiga estu- verso da moeda”, em particular, quando sente com elevado nível de desempenho nas suas pro-
dante da FDUC. Critica ainda a UC por não ser culpa por querer cumprir os seus objetivos e o fissões” e, quando começam a experienciar “sin-
capaz de proporcionar serviços de saúde men- desgaste não a deixa. tomas de incapacidade e aversão” ao seu traba-
tal que consigam satisfazer as necessidades dos As três jovens acreditam que existe uma falta lho, não conseguem lidar com a possibilidade
seus estudantes. Contudo, a jovem acredita de consciencialização e discussão em torno da de um esgotamento. Explica que os indivíduos
que o burnout lhe proporcionou “uma lição de doença, o que leva as pessoas a acreditarem que estão a ocupar cada vez mais horas do seu dia
vida” sobre como encarar as tarefas com mais só afeta “quem não quer trabalhar e é preguiço- no trabalho e que o equilíbrio entre a vida fami-
calma e priorizar-se. Neste momento, anseia so” ou a ignorarem os sinais de que estão a so- liar e a profissional é fundamental para preve-
por ver o que o futuro lhe reserva. frer um esgotamento. “A mentalidade de uma nir um esgotamento. “O tratamento passa por
pessoa matar-se a trabalhar é um motivo de ajudar a pessoa a tomar consciência e a aceitar
Falta de consciencialização orgulho para as gerações mais velhas”, refor- o que está a sentir, com o objetivo de recuperar
em torno da doença ça Joana. A estudante sente que a credibilidade a autoconfiança e o bem-estar”, assevera.
Joana Alves vê o esgotamento como o mo- do cansaço e a estabilidade mental das gerações A dificuldade de acesso a cuidados de saúde
mento de uma mudança radical na sua vida, mais novas é olhada de lado. criticada por Ariana Rodrigues, é um fator
pois levou-a a permanecer na cidade dos estu- “A saúde mental não é só um jargão político” que Anabela Vitorino Costa acredita que pode
dantes mais um ano e a entrar no mercado de Anabela Vitorino Costa considera que os afastar a procura por um diagnóstico e acom-
trabalho pela primeira vez. Decidiu adotar há- últimos anos, em particular desde a pandemia panhamento psicológico. “A saúde mental não
bitos de gratidão para contrariar o espaço men- de Covid-19 que assolou o mundo, foram é só um jargão político, é preciso promovê-la
tal negativo em que vivia. “Escrever as partes cruciais para o maior conhecimento desta efetivamente para que os profissionais e os es-
boas do meu dia fez-me começar a apreciar as doença por parte da população, fenómeno que tudantes se sintam felizes nas atividades que
coisas que me deixam feliz”, assevera. acredita ter sido impulsionado pelos órgãos realizam”, proclama a psicóloga clínica. Numa
O diagnóstico de Isabela Silva permitiu-lhe de comunicação social. A psicóloga clínica nota final, Joana Alves quer dar esperança às
assumir uma maior conscientização quanto defende que a prevenção tem de começar nas companheiras impactadas por esta doença: “a
aos comportamentos que a esgotavam, sobre organizações, que devem assumir a promoção negatividade leva-nos a aceitar a exaustão e o
a necessidade de estabelecer limites e a impor- do bem-estar. “Não é assim tão difícil perceber mau estado de saúde mental, mas mais cedo ou
tância do descanso. Admite que estas tarefas, como as pessoas se estão a sentir no seu local de mais tarde as coisas vão melhorar”.
por vezes, revelam-se difíceis, mas esforça-se trabalho”, reforça.
para pôr o seu bem-estar mental em primeiro A resistência em aceitar um diagnóstico de
020 SOLTAS 5 de março de 2024

CARTAS À DIRETORA
‘Xora diretora,

Se podemos demonstrar a rutura da socieda- Quando nos debruçamos sobre o feminismo, E ainda perante todo o nosso passado histó-
de entre papéis de raça, classe e género, então as preocupações principais não são piadas mi- rico, haverá sempre um homem que, a meio
qual será o papel da mulher? É em resposta a sóginas como as feitas sobre o filme “Barbie” de publicações do Facebook e comentários
esta pergunta, que a história carrega feminicí- nos Óscares. Nós atentamos, ou pelo menos de- soltos em rodas de conversa, ainda diz: “Mas,
dios, violência de género e a misoginia estrutu- vemos atentar, às 133 mulheres que são vítimas então, porque não existe o dia dos homens?
ral da sociedade, tudo isto opressões incitadas de homicídio cometido pelo parceiro ou fami- Merecemos o mesmo tanto!”. E já responden-
pelo simples ódio à mulher, pela mesma ser liar diariamente (dados publicados pela ONU), do à pergunta, mesmo que ignorante e imbecil.
uma mulher. ao nosso país, com os maiores números de vio- Não, não merecem.
Como Simone de Beauvoir já disse: “Ninguém lência doméstica na UE, e à violência sexual Isto é, feminismo não se trata de uma com-
nasce mulher, torna-se mulher” (citação reti- que afeta cerca de 94% das mulheres em con- petição com homens por quem mais merece re-
rada de “O Segundo Sexo”). A ideia geral de ser flitos armados. São nestes casos que também galias ou privilégios, mas sim uma guerra para
uma mulher não surge apenas da construção devemos dar atenção às pautas raciais e pautas assegurar os direitos humanos. É neste conflito
social de género que nós presenciamos diaria- da comunidade LGBTQIAP+, uma vez que a ob- que, tudo o que ameaça a organização estrutu-
mente, mas sim da nossa resposta a este papel jetificação em prática machista tem uma abor- ral racista e misógina em que vivemos, se pode
social, da nossa luta contra a misoginia, ma- dagem diferente para mulheres negras, muçul- considerar como luta de género. Informação e
chismo, transfobia e aos estereótipos que per- manas, brancas, indígenas e transexuais. estudo é luta, reflexões são luta e a difusão de
petuam e legitimam a violência de género. vivência é luta.

- BÁRBARA NEVES

‘ Xora diretora,
No início de fevereiro descobrimos que para salas à força (por iniciativa dos seguranças, Neste momento a AAC já cedeu mais que ape-
aceder aos pisos superiores da AAC o nosso sem ordens da Administração) e vimos crescer nas uma sala. Hoje sabemos que a livre circu-
nome terá de estar numa lista. Isto, durante este fetiche securitário em torno do edifício da lação no edifício (a sede de uma associação que
o período noturno e de forma a controlar um AAC. Em grande parte, fruto do clima vivido se orgulha em dizer que tem um edifico aber-
desgoverno que impera na Académica entre a na altura, que era propício a tudo isto. to todo o ano, 24/7) tem um preço. O preço da
meia-noite e o nascer do sol. Apenas quem está 2. Hoje temos um problema com a seguran- renda pago por um negócio privado. Mesmo
na lista tem o privilégio de usufruir de quatro ça dos estudantes que se divertem/trabalham que crie constrangimentos aos estudantes.
pisos de um dos edifícios mais emblemáticos no edifício e sobretudo com a sua manutenção 4. Cabe então aos dirigentes fazer esta ponde-
de Coimbra. (Jardins inclusive). Mas falar deste problema ração. Estamos dispostos a entregar a fiscaliza-
Antes de continuar, devo dizer que era pre- sem falar dos moldes em que funciona o Bar da ção de entradas e saídas a seguranças privados?
ciso estar desligado da realidade para não re- AAC seria ignorar o elefante que divide a sala Quem são estas pessoas que têm na mão a lista
conhecer que existem problemas com o livre connosco. Irei dispensar-me de uma análise his- de quem pode entrar no Edifício Sede da AAC?
acesso ao edifício. Para não correr o risco de tórica rigorosa, relembro apenas que este modo Trata-se de uma concessão ou de uma capitu-
parecer hipócrita, confirmo que este que vos de operação é relativamente recente. Sempre lação a interesses financeiros? Será que a lista
escreve pode ser encontrado neste espaço, houve diversão noturna na Académica e sem- vai ser respeitada por todos? Um seccionista
entre a meia-noite e o nascer do sol. pre haverá. No entanto, aquilo que temos hoje não pode levar quem entender à sua secção, à
Ainda assim, deixar a análise por aqui pare- é uma discoteca privada a funcionar no Piso 0. hora que desejar? Se não, porquê? O bem-estar
ce-me ingénuo. Para muitos é a única realidade que conhecem. do edifício e dos seccionistas vale menos que a
1. Devemos primeiro compreender que esta Albergar uma discoteca tem custos. Tem o renda? Dos vários modelos de funcionamento
não é uma questão nova, quem frequenta o custo da deterioração do espaço onde ela está, que o Bar já teve, este é o melhor para a AAC?
edifício sabe. É uma discussão que leva dé- a deterioração do espaço envolvente (Jardins Vale a pena gerir as consequências invés de
cadas. Um debate que já assistiu a medidas e restante Edifício) e a necessidade de garantir lidar com a causa?
como esta e a vários avanços e recuos. No en- a segurança dos clientes, como em qualquer Digo isto com plena consciência de que este
tanto, esta discussão intensificou-se durante outro bar. Ao trazer um negócio como este para não é um problema simples. Também sei que
a pandemia. Nesse período bizarro tivemos a nossa casa, importámos tudo isto (deteriora- iniciativas idênticas a esta foram morrendo ao
seguranças privados a criar, pela sua própria ção do espaço e insegurança). longo dos anos. Algumas à nascença, outras
iniciativa, listas que ditavam quem tinha di- 3. Não foi a troco de nada. A renda paga pelo ainda jovens. Ainda assim, fica a dúvida: Afinal
reito a entrar no edifício (não apenas a subir Bar é importante para a saúde financeira da entre Bar, Segurança e os Estudantes, quem é
aos pisos superiores). Nesse mesmo período AAC. Parece-me, no entanto, que a troca esta- o senhorio?
assistimos a estudantes verem o seu acesso belecida entre as duas entidades não pode ser
ao edifício negado, vimos violência por parte vista como uma mera concessão de espaço.
de alguns destes seguranças para com seccio-
nistas, estudantes a serem retirados das suas

- BRUNO LOPES OLIVEIRA


5 de março de 2024 SOLTAS 021

CABRA DA PESTE

- POR DUARTE NUNES -

CRÓNICAS DO TRODA
- POR ORXESTRA PITAGÓRICA -

C
omo é que é FAMS? na na mesa da Magna, contudo, ao final do dia prato e, também, a opção Tezenis e companhia
Já há algum tempo que não vos co- na AAC são sempre os Boys a vestir as calças. E para celebrar o empoderamento feminino da
municávamos, porém ouvimos dizer como somos um grupo com piada, e as mulhe- melhor maneira. Ou então, esperem até dia
que era para comemorar o Dia da Mulher com res no Fado, o que acham? Mais um funeral? Já 21 de Março para levarem as vossas queridas
A CABRA. não chegava os “Última luz – Fado, Funerais e a passear a Lisboa, já que a AAC vai pagar os
Tentámos entrar em contacto com as companhia LDA”? transportes. Quem não gosta de uma viagem
Mondeguinas (tuna feminina associada da Ainda sobre as mulheres no tacho dentro e suada, da capital até Lisboa?
APAV), mas elas estavam mais ocupadas a ar- fora da AAC, gostávamos de dizer que somos Com esta nos despedimos. Já sabem que os
ranjar uma maneira da boicotar o arraial de um grupo que aprecia e apoia muito a amizade nossos ensaios são às Terças e Quintas às 21h30
tunas femininas da DG. Também tentámos e, como tal, queremos dar os parabéns à Ana na Tó Nogueira, debaixo da sala de Estudo da
falar com a linha de denúncias da AAC, mas Cavilhas (antiga Presidente da FAP) e ao Caseiro AAC. Se alguma menina estiver interessada
o número do Troda estava bloqueado. Ainda por terem feito as pazes e estarem a apoiar o em pertencer à Orxestra Pitagórica está mais
pensámos em ligar para o SOS Estudante, mas mesmo projeto político. Viva a amizade! que convidada, pois, somos um grupo misto e
achámos melhor não (anda aí uma conver- Agora o que realmente importa, como faze- a favor da igualdade, e por isso temos sempre
sa que esta só serve para “xular” e enganar a rem as vossas namoradas ou amantes felizes. uma fralda para usarem como a nossa caloira-
malta). Bem, desde logo não enamorem as meninas de da. Beijinhos molhados e feliz dia do cartão de
Acabámos, portanto, nós a escrever este gran- Direito, o Troda ouviu dizer que por lá as orais crédito.
de artigo. Vamos falar sobre variados assuntos estão para acabar. No entanto, se tiverem um P.S. Queremos deixar um agradecimento es-
como, as mulheres na academia, as mulheres cartão de crédito ou de débito podem sempre pecial aos nossos amigos da FAN-Farra por nos
no tacho da academia e noutros tachos e ainda aproveitar as promoções das floristas, que in- terem alugado o serviço de net e computador
como fazerem as vossas namoradas felizes. flacionam os preços na semana anterior, para por apenas 250€. Só assim foi possível entregar
Sobre a mulher na academia, há muito a dizer. dar aquela rosa cansada às vossas concubinas. estes Lusíadas a tempo do impresso.
Começando pela utilização das calças na capa Ainda, têm sempre a opção de jantar do Dia
e batina e acabando na representação femini- da Mulher onde elas comem sempre sem sujar
022 SOLTAS 5 de março de 2024

Em democracia, a igualdade será para


todas ou não será para nenhuma
- POR SECÇÃO DE DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS DA ASOCIAÇÃO ACADÉMICA DE COIMBRA -

E
sta semana é comemorado o Dia da dade em cargos de chefia, políticos e na cultura. triarcado, que mostra que a luta pela igualda-
Mulher, a 8 de março, como em todos os Não será, no entanto, o paraíso na terra, con- de não é só uma luta pelas mulheres cisgénero,
outros anos. Porém, agora, estas come- siderando que os movimentos feministas são mas também para mulheres trans, as mulheres
morações têm outro peso. Portugal atravessa tão ou mais populares e relevantes hoje do que não brancas, as mulheres queer, as mulheres
um período eleitoral que, pela primeira vez eram há 50 anos. Se, por um lado, se lutou a fer- não europeias. É uma luta por todas.
desde 1974, coloca grandes questões sobre a ros por um avanço na proteção estatal e na lei, Hoje, temos presente que o desafio é garan-
ascensão abrupta de forças antidemocráticas, na prática existe um claro desfalque, nomea- tir o respeito por todas e todes na sua forma de
que põem exatamente em causa direitos que damente nas áreas da justiça e da saúde. Como ser, disputando os conceitos de papéis de géne-
vimos ser conquistados pelas mulheres e pelos resultado, hoje observamos bem de perto o que ro atribuídos quase como que biologicamente,
movimentos feministas. algumas forças políticas parecem querer fazer numa tentativa vil de nos categorizar a todes,
Nos 50 anos do 25 de abril, ou seja, nos 50 anos na lei e na prática em relação às lutas feminis- conformando-nos numa sociedade ainda muito
de democracia plena em Portugal, é importan- tas e aos direitos das mulheres. marcada pela discriminação, opressão e, con-
te perceber que o progresso feminista, mesmo Com a maturidade crescente da nossa demo- sequentemente, violência sobre as mulheres, a
que atrasado relativamente ao resto da Europa, cracia, o presente exige um novo alargar das população queer e as pessoas trans. A luta femi-
teve o seu grande início. Foi nesta metade de lutas e das exigências, não uma repetição das nista não pode recuar a sua luta para recuperar
século que o país garantiu melhores direitos lutas do passado. Este nosso presente é marca- os 50 anos passados. Tem que impor, agora, uma
reprodutivos, laborais e de segurança, bem do pela era do feminismo interseccional, que discussão alargada, mais inclusiva e mais pre-
como uma melhor posição de representativi- mostra as várias vertentes da opressão do pa- parada para os próximos 50 anos.

SECÇÃO
FILATÉLICA
- POR JOSÉ CURA -

A
bela Inês de Castro, amante de D. Pedro melhadas que ali crescem seriam o seu sangue le Mosteiro, exigindo que todas as classes lhe
I, foi executada a mando de D. Afonso derramado. De acordo com os especialistas, os prestassem homenagem. A transladação fez-
VI. Os encontros entre os amantes rea- laivos de sangue do "colo da garça", que se vis- se num cortejo fúnebre que ficaria na memória
lizavam-se em Santa Clara-a-Velha, perto da lumbram nos líquenes que atapetam a pedra das populações.
Quinta das Lágrimas. do fundo, tomaram a cor devido à presença de Em 2002, os CTT – Correios de Portugal lan-
A 7 de janeiro de 1355, o rei D. Afonso IV cede às uma alga, a Hildenbranthia Rosea. çaram uma emissão filatélica dedicada ao
pressões dos fidalgos da corte, seus conselhei- O príncipe, mal subiu ao trono, logo tratou Património da Humanidade da UNESCO, com
ros, e, aproveitando a ausência do seu filho, en- de capturar o trio de assassinos, refugiados em desenho de José Brandão e Paulo Falardo, com
viou a Coimbra Pêro Coelho, Álvaro Gonçalves Castela. Apenas dois foram encontrados e tive- 8 valores. Um dos selos de 70 cêntimos, retra-
e Diogo Lopes Pacheco para matarem D. Inês de ram uma morte horrível. tando o topo do túmulo de Inês de Castro, teve
Castro, o grande amor de D. Pedro I. D. Pedro I mandou construir, no Mosteiro uma tiragem de 350 mil exemplares. A emissão
Segundo a lenda, as lágrimas derramadas de Alcobaça, túmulos para si e para D. Inês de filatélica dedicou selos ainda ao Mosteiro dos
por Inês teriam criado a Fonte dos Amores na Castro, frente a frente, conduzindo os seus res- Jerónimos, ao Centro Histórico de Guimarães
Quinta das Lágrimas, e algumas algas aver- tos mortais do Convento de Santa Clara àque- e ao Alto Douro Vinhateiro.

ÉXÉTEGUES DA ISABEL
Sorrateiramente alivia- Ou muito me engano ou já Alguém reclama pelo tempo Por aqui, nos Jardins da AAC, é a
se numa reentrância junto estou a circular num dos novos de espera no Centro de música popular espanhola que se
à Câmara Municipal. mini-autocarros dos SMTUC. Saúde. Resposta de uma ouve. Na baixa da cidade são os
Como disse alguém: "parece utente..."agora até no particular turistas espanhóis que passeiam.
pequenino, mas é grande". se espera e é a pagar!".

#hávidasnestacidade #hávidanestesmtuc #hávidasnestacidade #hávidasnestacidade


5 de março de 2024 SOLTAS 023

Entre discussões e referendos -


a História do aborto em Portugal
- POR RITA SOUSA - ARQUIVO DA SECÇÃO DE JORNALISMO DA ASSOCIAÇÃO ACADÉMICA DE COIMBRA -

O
Arquivo da Secção de Jornalismo da abstenções e 50.9% votos contra. Por um lado, Ao longo dos anos, discutiu-se a realização de
Associação Académica de Coimbra a favor, estava o BE, o PCP e o PS, bem como novos referendos. Em 2004, João Mota Amaral,
(quase a prever a polémica que se insta- associações (como a Não te prives) com argu- presidente da AR na altura, apesar das 120 mil
laria nestes dias) recupera a história, registada mentos assentes na recomendação favorável assinaturas entregues e da clara vontade dos
no Jornal A CABRA, da conquista daquele que do Parlamento Europeu pela descriminaliza- portugueses de terem um novo referendo,
é para muitas um direito: a despenalização da ção do aborto, e na constatação de que a crimi- comprovada também pela sondagem da TSF e
Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG). A nalização induzia apenas à prática clandestina do DN, com 71% a favor dos inquiridos, remeteu
partir dos anos 80, iniciaram-se sucessivos de- (em condições perigosas) da IVG, colocando em a decisão para o final do mandato. Finalmente,
bates, na Assembleia da República (AR), sobre perigo principalmente as mulheres mais desfa- em 2007, ganhou o “sim” e, atualmente, é possí-
este assunto que fragmentava a sociedade. A vorecidas. Ainda se defendeu que o direito de vel realizar um aborto legal e seguro.
primeira legislação surgiu em 1984. Nela foi escolha não devia ser punido pelo Estado, com Todavia, a IVG discute-se cada vez mais, pois,
estabelecida a sua descriminalização — deixou referência a algumas das razões que levam al- presentemente, vários hospitais, devido à obje-
de ser um delito, constituindo, não obstante, guém a recorrer à IVG, como condições precá- ção de consciência, têm falta de médicos que rea-
uma contraordenação, podendo ser punível rias e ambiente de violência. No outro lado, en- lizam o procedimento e, consequentemente, não
com coima ou com penas de prisão até 3 anos, contram-se a Igreja, partidos como o CDS-PP oferecem esta alternativa. Contudo, também
para a pessoa que conscientemente abortasse e ou o PSD, e associações como a Associação de nem sempre encaminham para onde exista, vio-
para quem realizasse o aborto, bem como penas Defesa e Apoio da Vida que afirmam que a des- lando a lei para garantir acessibilidade. Porém,
entre 2 a 8 anos para quem forçasse outrem a criminalização do aborto não resolve as difi- Portugal não foi o único a discutir a IVG recente-
abortar. Posteriormente, em 1997, foram feitas culdades apontadas. Além disso, advogam que mente: a França tornou-se na primeira nação a
novas alterações, ao acrescentar exceções. este consiste na “destruição do embrião por ra- consagrar o direito da IVG na Constituição. Já o
O 1.º referendo — “Concorda com a descrimi- zões de conveniência” e uma desvalorização da estado do Alabama considerou que os embriões
nalização da IVG, nas primeiras 10 semanas, em vida. Contudo, há um argumento comum entre congelados para tratamento de fertilidade in
estabelecimentos de saúde legalmente autori- algumas vozes: a necessidade de educação se- vitro são crianças, parando estes tratamentos.
zados?” —, ocorreu em 1998, com quase 69% de xual e planeamento familiar. Que caminho escolherá Portugal?

OBITUÁRIO
- POR CABRA COVEIRA -

Abaixo o taxo viva o taraxo Genocídio? Never heard of


hit
Três antigos tachistas e um liberal fra-
cassado entram num bar. It’s a crossover A raminhas não dizia que queria ouvir o
episode. Tvacas, metam os olhos nisto. pessoal? COLEGAS!!!!! Parem com as bom-
A nova temporada da Casa dos Degredos bas não consigo ouvir os meus COLEGAS!
Júnior promete. So you agree, o tacho exis- Oh, Renato. Aprovamos. LEISRAEL e
te? Eu sabia que devia ter aceitado aquele ORDEM na sala! Começamos pelo quim-
convite em 2018 para ser o 14º suplente do porta: Académica X Benfica. Ainda faltam 6
peloyro de ligação à cidade. Resta-me ten- pontos até chegarmos às criancinhas. Elas
tar o student hub. Se o John Lenine fosse que esperem. Temos relatórios queimados
vivo acabava com os bezerros políticos. para aprovar. Podemos fazer pausa pó nite?
Ou como o Kurt Kokaine, sem miolos.
Têm que ser os repúblicos sem teto a puxar
Enfim, AD ser BElo ILogo se vê. PS: merdas fora da DGlândia. Quando lhes in-
Canja laranja e arco ires sem sal. teressa. Milagres acontecem, até tivemos
taxistas e comunas a votar em bloco. Nesta
terra de paz, já temos um Míssel, só nos
faltam outros assuntos: vão pó car*#$%.
Mais informação disponível em

Editorial
Marias que nunca foram só três
- POR ANA FILIPA PAZ -

N
o ano em que se celebram 50 anos do Com esta edição procurámos recuperar al-
25 de abril, celebram-se também 50 gumas das bandeiras que serviam este mo-
anos do Movimento de Libertação vimento: discutir igualdade de género não é
das Mulheres (MLM), grupo feminista criado um tema de agora, não é uma luta perdida e
no momento que seguiu a leitura da setença de muito menos um assunto resolvido. Discutir
absolvição das “três Marias”, doze dias depois igualdade de oportunidades, de lugar no espa-
da Revolução. Maria Teresa da Horta, Maria ço público, de reconhecimento das diferenças
Isabel Barreno e Maria Velho da Costa foram de cada género, não pode ser um assunto ape-
as três escritoras que deram autoria ao livro nas de mesa de jantar. A primeira página desta
Novas Cartas Portuguesas, berço de contesta- edição é inspirada no cartaz do MLM, que me
ção e denúncia das condições repressivas em emocionou por isso mesmo: a figura feminina
que viviam as Mulheres em Portugal durante está representada como uma força que não tem
o Estado Novo. As duas primeiras fundaram o género. Uma luta que diz respeito a todos. Uma
MLM, e trouxeram para a rua, em cartazes e luta que quer, acima de tudo, uma sociedade
manifestações carregadas de símbolos patriar- Igual, Livre e Segura.
cais, as vozes ensurdecidas de todas as suas Este ano os cravos que levantamos são tam-
companheiras. Jornalistas, poetisas, artistas, bém em homenagem a estas Mulheres. E a
Mulheres do seu século ! Mulheres de todos os todas que, oprimidas, continuam a plantar as A primeira página da Edição Especial do Dia da
tempos, que sempre existiram, mas poucas sementes da mudança. Mulher é inspirada neste cartaz do Movimento de
foram vistas. Libertação das Mulheres, criado a 7 de maio de 1974,
por Maria Teresa da Horta e Maria Isabel Barreno.

FICHA TÉCNICA Diretora Ana Filipa Paz Conselho de Redação Luís Almeida, Francisco Barata,
Tomás Barros, Joana Carvalho, Carina Costa, Inês Duarte,
Jornal Universitário de Coimbra - A CABRA Equipa Editorial Daniela Fazendeiro & Alexandra Filipe Furtado, Leonor Garrido, Hugo Guímaro, Luísa
Depósito Legal nº478319/20 Guimarães (Ensino Superior), Raquel Lucas & Sofia Mendonça, Margarida Mota, Bruno Oliveira, João Diogo
Registo ICS nº116759 Moreira (Cultura), Larissa Britto e Fábio Torres (Desporto), Pimentel, Paulo Sérgio Santos, Pedro Emauz Silva
Propriedade Associação Académica de Coimbra Ana Cardoso & Eduardo Neves & Sofia Ramos (Ciência &
Tecnologia), Clara Neto & Luísa Rodrigues (Cidade), Sofia Fotografia e Ilustração Mafalda Adão, Joana Almeida,
Morada Secção de Jornalismo Ramos (Fotografia) Guilherme Borges, Frederico Cardoso, Raquel Chaves,
Rua Padre António Vieira, 1 Francisca Costa, Daniela Fazendeiro, Bruna Fontaine,
3000-315 Coimbra Colaborou nesta edição Mafalda Adão, Joana Almeida, Raquel Lucas, Clara Neto, Duarte Nunes, Daniel Oliveira,
Débora Borges, Guilherme Borges, Ana Cardoso, Sofia Ramos, Inês Reis, Luísa Rodrigues, Jay
Frederico Cardoso, Raquel Chaves, Francisca Costa,
Pedro Cruz, Daniela Fazendeiro, Bruna Fontaine, Solange Paginação Luís Almeida, Lunna Santana, Fábio Torres e
Francisco, Iris Jesus, Raquel Lucas, Camila Luís, Luísa Lucas Yamamoto
Malva, Liliana Martins, Matilde Mendes, Bárbara Monteiro,
Clara Neto, Eduardo Neves, Inês Reis, Jéssica Soares, Impressão FIG - Indústrias Gráficas, S.A.
Afonso de Vasconcelos, Leonor Viegas Telf.239 499 922, Fax: 239 499 981, e-mail: fig@fig.pt
Produção Secção de Jornalismo da Associação
Académica de Coimbra
Tiragem 2000

Você também pode gostar