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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

CENTRO DE TECNOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA QUÍMICA
DOUTORADO EM ENGENHARIA QUÍMICA

CAMILA BRASIL DA PAZ

ANÁLISE ESTRUTURAL POR DIFRAÇÃO DE RAIOS-X PARA A AMOSTRA 34

FORTALEZA-CE

2023
1 INTRODUÇÃO
A difração de raios-X foi confirmada por Laue (1914) durante um experimento.
Laue emitiu feixes de raios-X em um cristal. Ele observou que por meio de uma chapa
fotográfica colocada atrás do cristal formou-se um padrão de difração. Desse modo,
Laue confirmou a natureza ondulatória dos raios-X.
Portanto, os autores Cullity e Stock (2014) afirmam que ao incidir raios-x sobre
um cristal, o feixe é difratado por planos cristalográficos e, posteriormente, sofrerá
interferência diante dos diferentes caminhos do feixe. Bragg constatou que o ângulo
entre o raio incidente com o plano cristalográfico é o mesmo que o raio difratado forma
com o plano, e a interferência construtiva das ondas espalhadas podem ser confirmadas
por meio da equação de Bragg.

nλ=2 dsenθ (1)

Em que, n é a ordem de difração, λ indica o comprimento de onda, d representa a


distância interplanar, θ corresponde ao ângulo de Bragg

Figura 1 – Esquema representativo da geometria de Bragg (interferência entre


raios a nível planar)

Fonte: Adaptado de Maia (2022)


Com base na contribuição de Bragg, observa-se que a distância L (metade da
diferença dos caminhos entre os feixes de raios-X) corresponde a dsenθ e que 2L = nλ e
que n é igual a 1 (primeira ordem de reflexão). Logo, a equação de Bragg pode ser
representada por:
λ=2 dsenθ (2)
Com isso, é possível calcular a distância interplanar sabendo que o ângulo e o
comprimento de onda é conhecido. O detector do difratômetro recebe a intensidade do
feixe, assim, produz-se um difratograma relacionando os pontos de intensidade em
função de 2θ. A partir dos dados obtidos pelo difratograma do sólido, faz-se um ajuste

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de parâmetros da estrutura cristalina. O método de Rietveld (1988) consiste em refinar
os parâmetros estruturais de modo a obter a melhor concordância possível do padrão de
difração teórico com o experimental.
Outros parâmetros podem ser calculados, tais como o tamanho do cristalito (D) e
a microdeformação (ε) dos cristais. Scherrer (1918) propôs o cálculo do tamanho do
cristalito por meio da fórmula, conhecida como equação de Scherrer (eq.3).

D= (3)
β D cosθ
Em que, βD representa a largura a meia altura do pico considerando o tamanho do
cristalito. Portanto, a equação de Scherrer só é válida para cristais pequenos e
imperfeitos, conforme Cullity e Stock (2014). Geralmente, os cristais sofrem
deformações nas redes cristalinos, diante disso é importante considerar as
microdeformações presentes.
Dessa forma, entende-se que o perfil do pico de difração é a convolução das
funções de distribuição gaussiana e lorentziana, na qual considera-se βD, a largura
relacionada ao tamanho do cristalito e βε, a largura relacionada a microdeformação.
Williamson-Hall assumiu que a β (largura total) é convolução lorentziana, ou
seja, a soma de βD e βε. Assim, modelos isotrópicos sugerem equações para estimar
valores do tamanho do cristalito e mirodeformação dos cristais por meio de ajustes
lineares. Dentre esses modelos, se destacam o modelo de Williamson-Hall (UDM -
Uniform Deformation Model), Halber-Wagner (considera convolução lorentziana e
gaussiana) e Size-Strain considera apenas convolução gaussiana). As equações de cada
modelo são representadas, respectivamente, por:
βcosθ k 4 senθ
= +ε (4 )
λ D λ

( )
¿2 ¿
β k β
=
d
¿2
D ¿¿

( )
2 2 2 2
D β cos θ k 2 2
2
= 2 d +2 π < ε ¿rms (6)
λ D

Em que,
¿ 1 2 senθ
d= = (7)
d λ

2
e

¿ β cosθ
β= (8)
λ

No método Size-Strain, calcula-se uma microdeformação rms, baseado no valor


médio rms de uma função gaussiana. Logo, a microdeformação (ε) é calculado por:

¿ ε > ¿rms =ε
√ 2
π
(9)¿

No entanto, por meio de ajustes lineares obté-se os valores de D e ε, considerando


conhecidos os valores de β, 2θ, λ, d (MANIAMMAL, 2017).

3 OBJETIVOS

3.1 Objetivo geral

Caracterizar por difração de raios-X a amostra desconhecida.

3.1 Objetivos específicos

 Identificar as fases cristalinas presentes no material;


 Obter os parâmetros de rede, densidade e volume da célula unitária, índices de
Miller;
 Calcular o tamanho do cristalino e microdeformação pelos modelos isotrópicos.

2 MATERIAIS E MÉTODOS

A amostra inicialmente desconhecida de aspecto escuro em forma de pó foi


colocada no porta-amostra de teflon distribuída de forma homogênea. O porta-amostra
foi colocado no suporte que comporta até 15 amostras. A análise foi realizada no
Laboratório de Raios-X da Universidade Federal do Ceará (UFC) em um equipamento
Panalytical de modelo X’Pert Pro (MDP).
No difratômetro foi utilizado um tubo de raios-X de Co (λkα1 = 1,789 Å) sob
tensão de aceleração de 40 kV e corrente 40mA. O padrão de difração ocorreu em uma
faixa de 10-100o para 2θ. A Figura 2 exibe uma representação da análise de DRX para a
amostra 34.

3
Figura 2 – Esquema representativo da análise de DRX para a amostra 34

Inicialmente, as fases cristalinas foram identificadas no programa HighScore


Plus. As microfichas ICSD (Inorganic Crystal Structure Database) referente as fases
encontradas foram baixadas do site de Base de Estrutura cristalina. Feito isso, a amostra
foi refinada pelo método de Rietveld no programa GSAS II (Generalized Structure
Analysis System).
Nesse estudo utilizou-se o padrão LaB6 como instrumental para o refinamento no
GSAS II. Primeiramente importou-se a medida da amostra em estudo e o padrão
instrumental LaB6. Para tanto, refinou-se a célula unitária, tamanho, microdeformação,
fração em cada fase. Refinou-se também o x para cada átomo em cada fase e o
deslocamento da amostra.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

A amostra inicialmente desconhecida foi caracterizada pela técnica de difração


de raios-X, na qual foi identificada as fases cristalinas pelo programa do HighScore
Plus. As fases encontradas foram α-Fe2O3 (correspondente ao mineral hematita) e V2O5
referentes as microfichas ICSD 015840 e 085152, respectivamente.
A fase α-Fe2O3 apresenta sistema cristalino romboédrico com grupo espacial R3c
e a fase V2O5 de sistema cristalino ortorrômbico pertence ao grupo funcional Pmmn. Os
parâmetros de rede da microficha para a fase de α-Fe2O3 são a = b = 5,038 Å e c =
13,772 Å, ângulos α = β = 90o e γ= 120o, volume da célula 0,0302 Å3, densidade 5,6
g.cm-3.
Conforme a microficha para a fase V2O5, os parâmetros de rede são a = 11,544
Å, b =3,571 Å e c = 4,383 Å, ângulos α = β = γ = 90 o, volume da célula 0,0002 Å 3,

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densidade 3,34 g.cm-3. A Figura 3 apresenta o difratograma que relaciona 2θ com a
intensidade indexada a microficha encontrada pelo programa HighScore Plus.
Figura 3 - Difratograma da amostra indexada a fase padrão identificada pelo
programa HighScore Plus

A amostra foi refinada pelo método de Rietveld utilizando o programa GSAS II


de modo a obter parâmetros de rede, distância interplanar, largura à meia altura, índices
de Miller, composição de cada fase, dentre outros.
Dentre os parâmetros quantitativos mais significativos que avaliam um bom
ajuste, destacam os fatores de confiança Rw e GoF. Gomes (2005) considerou Rw com
valores próximos a 10% como aceitáveis para um bom ajuste. O autor Young (2002)
avaliou como parâmetro de um refinamento aceitável valores de GoF menor ou igual a
1,3. Portanto, no refinamento da amostra α-Fe2O3/V2O5 obtiveram-se valores de GoF
1,11 e Rw 19,97%. Dessa forma, os valores encontram-se dentro do aceitável pela
literatura como relatados por Gomes (2005) e Young (2002). Observou-se contribuições
de fase majoritária para α-Fe2O3 conferindo 82,4% e apenas 17,6% para a fase V2O5.
A Figura a seguir apresenta o difratograma com a amostra refinada pelo método
de Rietveld, em que é possível observar as duas fases presentes no material, bem como
os principais planos cristalográficos de cada fase.

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Figura 4 - Difratograma da amostra α-Fe2O3/V2O5 refinada no programa GSAS
II

Os principais planos cristalográficos das fases encontradas α-Fe2O3 e V2O5 estão


dispostos no difratograma acima (Figura 4). A partir do refinamento, obteve-se a Tabela
1, em que exibe os parâmetros de rede obtidos no refinamento para cada fase, bem
como os valores dos ângulos, volume e densidade da célula em comparativo com a
literatura.

Tabela 1 – Dados comparativos dos parâmetros de rede, valores dos ângulos,


volume e densidade da célula com os valores encontrados na literatura

Amostra Parâmetro Literatura1,2


a = b = 5,04 Å a = b = 5,04 Å
c = 13,75 Å c = 13,77Å
α = β = 90o α = β = 90o
α-Fe2O3
γ = 120 o γ = 120 o
V = 0,0032 Å3 V = 0,0032 Å3
d = 5,27 g.cm-3 d = 5,26 g.cm-3
a = 11,51 Å a = 11,54 Å
b = 3,57 Å b = 3,57 Å
c = 4,37 Å c = 4,38 Å
V2O5
α = β = γ = 90o α = β = γ = 90o

6
V = 0,0002 Å3 V = 0,0002 Å3
d = 3,37 g.cm-3 d = 3,34 g.cm-3
1,2
ICSD 015840-085152.

De acordo com as informações obtidas pelo refinamento, a fase α-Fe2O3 pertence


ao sistema cristalino romboédrico com grupo espacial R3c e a fase V2O5 ao sistema
cristalino ortorrômbico de grupo funcional Pmmn. De modo geral, os valores
parâmetros de rede foram similares aos encontrados na literatura para ambas as fases. O
volume e densidade da célula estão de acordo com os valores reportados na literatura.
O tamanho do cristalito (D) e a microdeformação (ε) são parâmetros que podem
ser obtidos a partir dos dados do refinamento e, consequentemente, aplicando nos
modelos matemáticos. Todavia, o tamanho do cristalito para cada fase foi obtido pela
equação de Scherrer e pelos modelos isotrópicos (Williamson-Hall, Halber-Wagner e
Size-Strain).
A Tabela a seguir apresenta o tamanho médio do cristalito calculado pelas
contribuições da equação de Scherrer e dos modelos isotrópicos de Williamson-Hall,
Halder-Wagner e Size-Strain. Os efeitos de microdeformação foram calculados a partir
dos modelos isotrópicos.
Tabela 2 – Tamanho do cristalito e microdeformação a partir de modelos isotrópicos. E
comparativo do tamanho médio do cristalito por meio da equação de Scherrer

Williamson-Hall Halder-Wagner Size-Strain


Amostra Scherrer (UDM)
D (nm) D ε R2 D ε R2 D ε R2
(nm) (%) (nm) (%) (nm) (%)
α-Fe2O3 63,6 56,8 - 0,9902 62,1 - 0,9994 57,7 - 0,9999
V2O5 51,7 45,1 - 0,9935 48,8 - 0,9999 50,0 - 0,9997

De forma geral, observa-se que os valores de microdeformações não foram


calculados, pois o valor do coeficiente angular para o modelo WH foi negativo e o valor
do coeficiente linear para os modelos HW e SS foram negativos. Os autores Maniammal
(2017) justificam o valor negativo para microdeformação no modelo de WH implica
uma situação em que a microdeformação causa estreitamento das linhas de XRD, o que
é fisicamente impossível. A literatura revela que a inclinação negativa é encontrada com
mais frequência no caso de amostras com tamanhos de cristalitos menores.

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O tamanho do cristalito calculado pela equação de Scherrer são diferentes dos
valores calculados pelos modelos isotrópicos, pois na equação de Scherrer considera-se
apenas βD, já os modelos isotrópicos consideram a largura total onde inclui além da
largura do tamanho do cristalino, o efeito de microdeformação (βD e βε). Mediante as
limitações da equação de Scherrer, espera-se que o tamanho do cristalino seja menor
comparado aos tamanhos obtidos pelos modelos isotrópicos.
Porém, conforme os resultados exibidos na tabela 2 não se observa esse
comportamento. Possivelmente, os modelos utilizados não são adequados para essa
amostra. Seria necessário a utilização de outros modelos matemáticos. Os modelos
anisotrópicos não foram calculados devido à falta de dados em relação as constantes
elásticas.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A amostra 34 foi identificada por duas fases cristalinas com contribuição


majoritária para a fase α-Fe2O3 correspondendo 82,4 % e 17,6 % para a fase V 2O5. As
microfichas encontradas foram baixadas na base de dados com códigos ICSD 015840 e
085152 para α-Fe2O3 e V2O5, respectivamente.
Identificou-se que a fase α-Fe2O3 pertence ao sistema cristalino romboédrico e
grupo espacial R3c e a fase V2O5 apresenta sistema cristalino ortorrômbico pertencente
ao grupo funcional Pmmn. De modo geral, os parâmetros de rede encontrados estão de
acordo com os da literatura, bem como os valores de densidade e volume da célula.
Os valores de microdeformação não foram encontrados devido aos valores
negativos encontrados nos coeficientes das equações lineares dos modelos utilizados,
impossibilitando o cálculo de ε. O tamanho do cristalito encontrado por Scherrer foi de
63,6 nm para a fase α-Fe2O3 e 51,7 nm para V2O5. Além da impossibilidade de encontrar
os valores de ε, o tamanho do cristalito encontrado foi menor que o valores obtido na
fórmula de Scherrer. Esse fato confirma que esses modelos não foram adequados para a
amostra.

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REFERÊNCIAS

CULLITY, B. D.; STOCK, S. R. Elements of X-Ray Diffraction. EUA, 3a edição, 2014.

GOMES, J. A., SOUSA, M. H., TOURINHO, F. A., FILHO, J. M., ITRI, R., DEPEYROT, J.
Rietveld structure refinement of the cation distribution in ferrite fine particles studied by X-
ray powder diffraction. Journal of Magnetism and Magnetic Materials, v. 289, p. 184-187,
2005.

MANIAMMAL, K., MADHU, G., BIJU, V. X-ray diffraction line profile analysis of
nanostructured nickel oxide: Shape factor and convolution of crystallite size and microstrain.
Physica E: Low-dimensional Systems and Nanostructures, v. 85, p. 214-222, 2017.

RIETVELD, H. M. The Rietveld Method - A Historical Perspective. Australian Journal of


Physics, v. 41, n. 2, p. 113-116, 1988.

SCHERRER, P. Bestimmung der Grösse und der inneren Struktur von Kolloidteilchen mittels
Röntgenstrahlen. Kolloidchemie Ein Lehrbuch, Chemische Technologie in
Einzeldarstellungen. Springer, Berlin, Heidelberg, v. 2, p. 98-100, 1918.

YOUNG, R. A. The Rietveld Method. Oxford, 1a edição, 2002.

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