INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO COMO ESPAÇO PARA O ENSINO
DA CULTURA SURDA E SEUS ARTEFATOS
FEDERAL EDUCATION INSTITUTE AS A SPACE FOR TEACHING DEAF
CULTURE AND ITS ARTIFACTS
Primeiro Autor, Kamilla Fonseca Lemes
Instituto Federal de Goiás, Departamento de Áreas Acadêmicas Jataí – Goiás http://lattes.cnpq.br/2368033371586359 Segundo Autor, Thábio de Almeida Silva Universidade Federal de Goiás, Curso de Letras Português Jataí – Goiás http://lattes.cnpq.br/4039607675575606 Terceiro Autor, Érica Ferreira Melo Universidade Federal de Goiás, Curso de Letras Português Jataí – Goiás http://lattes.cnpq.br/2245955440992963
Data de submissão: 04/11/2019
RESUMO: A Língua de Sinais Brasileira – Libras, cuja modalidade linguística é
espaço-visual, proporciona as pessoas surdas um jeito peculiar de agir, questionar, expressar e entender o mundo dentro da sociedade. Portanto, os surdos possuem uma cultura diferente dos ouvintes, pois interage e compreendem o mundo através de suas experiencias visuais, entretanto, a existência dessa cultura surda ainda é desconhecida até mesmo, pelos próprios surdos, que muitas das vezes são desprovidos de informação devido as barreiras comunicativas. Assim, esse estudo teve como objetivo, fortalecer a cultura e a identidade surda, com a formação de sujeitos conhecedores e engajados em contribuir com o desenvolvimento linguístico e cultural dos surdos. Para isto, utilizamos como aporte teórico, os artefatos culturais de Strobel, 2008. Contudo, para oferecer um ambiente favorável ao ensino da cultura surda, foi ofertado um projeto de extensão cadastrado em parceria entre o Instituto Federal de Educação de Goiás - IFG e a Universidade Federal de Goiás – UFG, da cidade de Jataí. Assim, estão participando 20 cursistas, 4 alunos ouvintes e 16 alunos surdos. As são ministradas por 7 professores fluentes em Libras, proporcionando um ambiente de interação exclusivamente em língua de sinais. Nossos objetivos estão sendo alcançados, pois conseguimos discutir de forma clara a respeito da cultura e identidade surda. Neste mesmo período, o IFG e a UFG proporcionaram um evento em comemoração ao dia nacional dos surdos, e assim, os alunos puderam explorar os aprendizados acerca de sua cultura com apresentação teatral envolvendo a literatura surda. Contudo, espera-se, que o referido trabalho ofereça subsídios necessários para que os surdos sejam capazes de contribuir para o fortalecimento de sua cultura e identidade, tornando-os cidadãos críticos e consequentemente se organizem e lutem a favor da preservação e expressão da cultura surda, bem como a garantia de seus direitos, expressos em Lei. PALAVRAS-CHAVE: Cultura surda. Surdos. Língua de Sinais. Artefatos Culturais.
ABSTRACT: The Brazilian Sign Language - Libras, whose linguistic modality is
space-visual, provides deaf people with a peculiar way of acting, questioning, expressing and understanding the world within society. Therefore, the deaf have a different culture from the listeners, because they interact and understand the world through their visual experiences. However, the existence of this deaf culture is still unknown even by the deaf themselves, who are often lacking in information due to communicative barriers. Thus, this study aimed to strengthen the culture and deaf identity, with the formation of knowledgeable subjects engaged in contributing to the linguistic and cultural development of the deaf. For this, we used as theoretical contribution the cultural artifacts of Strobel, 2008. However, to offer a favorable environment for the teaching of deaf culture, an extension project registered in partnership between the Federal Institute of Education of Goiás - IFG and the Federal University of Goiás - UFG, from the city of Jataí. Thus, 20 students, 4 hearing students and 16 deaf students are participating. The are taught by 7 fluent teachers in Libras, providing an environment of interaction exclusively in sign language. Our goals are being met because we can clearly discuss the deaf culture and identity. During this same period, IFG and UFG provided an event to commemorate the national day of the deaf, so students could explore the learning about their culture with theatrical performance involving deaf literature. However, it is hoped that this work will provide the necessary subsidies for the deaf to be able to contribute to the strengthening of their culture and identity, making them critical citizens and consequently organizing and fighting for the preservation and expression of deaf culture, as well as the guarantee of their rights, expressed in Law. KEYWORDS: Deaf culture. Deaf. Sign language. Cultural Artifacts.
1. INTRODUÇÃO
Este trabalho apresenta à comunidade acadêmica, bem como à
comunidade surda de jataí, o projeto de extensão que tem como objetivo fortalecer a cultura e a identidade surda, com a formação de sujeitos conhecedores e engajados em contribuir com o desenvolvimento linguístico e cultural da Comunidade Surda Brasileira. A cultura nada mais é do que uma ferramenta de transformação, de modo a diferenciar grupos ao mesmo tempo em que faz emergir as diferenças e suas especificidades, sendo que os elementos mais importantes são as habilidades dos sujeitos para construir sua identidade a partir da linguagem (STROBEL, 2008). Ainda para a autora Strobel (2008), a linguagem e a identidade, são elementos fundamentais de uma Cultura. Assim, as pessoas surdas têm o seu jeito de agir, questionar, expressar e entender o mundo dentro da sociedade a qual pertence, mas de uma maneira diferente dos demais cidadãos ouvintes, pois neste cenário, a interação acontece por meio da sua língua natural, a Libras - Língua Brasileira de Sinais, cuja modalidade linguística é espaço-visual. Por esta via, segundo Canedo (2009), é possível afirmar que a cultura de um país ou estado está relacionado as suas crenças, costumes, língua e tradições. De igual modo, a cultura surda é a expressão de valores dos surdos, suas crenças, costumes, língua e hábitos de um povo surdo e de sua particularidade de entender o mundo por meio de suas experiências visuais. Portanto para Strobel (2008), a cultura transforma a percepção do sujeito que nela está inserido, começa a enxergar a diferença, por meio da vida social, molda o jeito de ser, de fazer, de compreender e de explicar. Entretanto, a existência de uma cultura surda, bem como, dos artefatos culturais dos surdos, é algo ainda desconhecido por muitos surdos, e este quadro se agrava ainda mais entre as pessoas ouvintes. A comunidade surda de Jataí, vem crescendo a cada dia. Atualmente, essa comunidade constitui em quase trinta surdos, um número muito pequeno em relação as oitocentas e vinte pessoas com grande dificuldade auditiva da cidade de Jataí (IBGE, 2010). Contudo, Jataí ainda não possui uma associação de surdos, que para Monteiro (2006),
São organizações filantrópicas sem fins lucrativos que desenvolvem
atividades políticas e educacionais, lutando pelos direitos culturais, linguísticos, educacionais e sociais dos surdos do Brasil. São entidades preocupadas com a integração entre os surdos (MONTEIRO, 2006, p.297). Assim, os surdos de Jataí ficam prejudicados enquanto informações acerca de sua própria cultura, movimentos linguísticos e sociais. Entretanto, mesmo sem conhecer os artefatos culturais, bem como, entender que, como sujeitos surdos, estão inseridos em um cultura diferente dos demais ouvintes, estes surdos sem perceber, reproduzem ações voltadas para cultura surda, como: casar com surdos; gostar de festas, não para dançar, mas para conversar com os amigos surdos em língua de sinais; conversar por horas sem ter noção do tempo; gostar de reunir somente com outros surdos e fazer isto sistematicamente. No caso específico da cultura surda, os artefatos culturais se referem aos materiais produzidos pelas próprias pessoas pertencentes a esta referida cultura, além das formas de ver, compreender e transformar o mundo em sua volta (STROBEL, 2008). Assim, a partir da falta de conhecimento acerca da cultura surda e sues artefatos, esse trabalho tem ainda como objetivo, entender e divulgar a cultura surda focando os artefatos culturais. Este objetivo torna-se pertinente pelo fato de que o surdo na sociedade, muitas vezes, é desprovido de informação e comunicação até mesmo dentro de sua própria família. Pois, os pais seriam as primeiras pessoas a levarem a informação para o surdo, não conseguem comunicar com seus próprios filhos. Sendo que, segundo Skliar (2001), 95% dos surdos nascem em famílias de pais ouvintes, os quais, em geral, desconhecem ou rejeitam a língua de sinais, no caso específico do Brasil, a Libras. A Libras, foi reconhecida como meio legal de comunicação da pessoa surda, pela Lei nº. 10.436/02 (BRASIL, 2002), e regulamentada pelo Decreto nº 5.626/05 (BRASIL, 2005), e temos visto o avanço das línguas de sinais a cada ano, porém até o momento seja dentro da famílias ou nas escolas, tema como cultura surda não é discutido, os surdos não têm conhecimento dos aspectos culturais que envolvem sua própria língua, ao qual os artefatos culturais são de suma importância para a compreensão de sua identidade surda. Dessa forma, a partir da compreensão desta problemática, que estamos desenvolvendo um curso que leve informações sobre a cultura surda e seus artefatos, para tornar o conhecimento cultural acessível, de forma a proporcionar aos surdos uma formação crítica e com conhecimento de sua própria cultura. 2. DESENVOLVIMENTO
Com o objetivo de fortalecer a cultura e a identidade surda, com a
formação de sujeitos conhecedores e engajados em contribuir com o desenvolvimento linguístico e cultural da Comunidade Surda Brasileira, o curso de extensão citado no item anterior, está sendo oferecido a toda comunidade surda de Jataí e região. Os encontros estão acontecendo todos os sábados, devido muitos surdos trabalharem durante a semana. A duração total do projeto é oitenta horas, perfazendo um período de seis meses, assim, iniciamos no mês de maio de 2019 e encerraremos em dezembro de 2019. As aulas acontecem no miniauditório do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás, Câmpus Jataí, unidade flamboyant.
Figura 1 – Matrícula do curso
Fonte: Elaborado pelos autores.
Vale ressaltar que o curso é ministrado totalmente em Libras, sem o auxílio do profissional intérprete, e com uma metodologia voltada para as especificidades visuais do sujeito surdo, deixando-os assim, a vontade para imergir em seu contexto cultural em meio aos seus pares.
Figura 2 – Interação entre cursista e professor
Fonte: Elaborado pelos autores.
Todos conteúdos trabalhados neste projeto são baseados no livro “As
imagens do outro sobre a cultura surda”, da professora surda Karin Strobel, e atual diretora da mais nova pasta criada no MEC de Políticas de Educação Bilíngue de Surdos. Portanto, nos encontros já foram abordados os seguintes conteúdos: Os surdos têm cultura; Povo Surdo ou Comunidade Surda; Os artefatos culturais do povo surdo; Artefato culturais experiência visual; Artefato culturais linguístico; Artefato culturais familiar; Artefato culturais literatura surda; Artefato culturais vida social e esportiva; e, Artefato culturais artes visuais. Figura 3 – Aula de Artefato culturais artes visuais
Fonte: Elaborado pelos autores.
Ainda está faltando trabalhar dois conteúdos, os: Artefato culturais
política; e, Artefato culturais materiais. Figura 4 – Aula de Artefato culturais literatura surda
Fonte: Elaborado pelos autores.
Como metodologia de explanação dos diversos conteúdos, faremos além
de abordagem teórica, uma relação prática com todos os artefatos, isto se dá pela necessidade de oportunizar cada sujeito surdo construir e imergir dentro de sua própria cultura. Assim, os cursistas surdos poderão criar artes, produzir teatro, piadas e história em Libras, bem como ter um momento de prática esportiva com seus pares, contribuindo assim, para autoafirmação de identidade surda.
Figura 5 – Aula Artefato culturais arte surda
Fonte: Elaborado pelos autores.
Durante o curso, as duas principais instituições de ensino superior pública
de Jataí, o Instituto Federal de Educação de Goiás e a Universidade Federal de Goiás, promoveram o II Encontro Regional em Comemoração ao Dia Nacional dos Surdos. Dessa forma, colocando em prática os aprendizados acerca dos artefatos culturais dos surdos, os alunos apresentaram três peças teatrais em língua de sinais, aplicando o que viram no conteúdo de literatura surda.
Figura 6 – Apresentação teatral
Fonte: Elaborado pelos autores.
As peças tiveram como título: A cadeira; A montanha dos milagres; e, O
hospital. Os alunos também produziram três quadros artísticos para serem entregues aos três palestrantes surdos que compuseram a mesa redonda do evento em comemoração ao dia dos surdos. Figura 6 – Apresentação teatral
Fonte: Elaborado pelos autores.
Assim, é importante salientar que os surdos mesmo desconhecidos,
mesmo nunca se encontrando em toda sua vida, irão partilhar das mesmas necessidades, angustias e assim, um simples encontro, uma simples conversa, irá parecer que se conhecem a anos e, esta condição, segundo a autora Strobel (2008), se dá pelo fato de serem um único povo, o povo surdo, com cultura e identidade própria, diferente da cultura ouvinte. Assim, proporcionar momentos como estes, contribui significativamente para a construção e afirmação dessa cultura.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Concluímos que os objetivos estão sendo alcançados, os surdos estão
conseguindo, dentro de sala, refletir a respeito de sua cultura, além, de produzir ações que estão ligadas diretamente aos artefatos culturais dos surdos, Portanto, esperamos que este trabalho possa divulgar ainda mais a cultura surda, bem como oferecer subsídios necessários para que os surdos compreendam sobre as identidades e os artefatos culturais, capaz de contribuir, para o fortalecimento de sua cultura e identidade, tornando-os cidadãos críticos e conhecedores de sua própria cultura e consequentemente se organizem e lutem a favor da preservação e expressão da cultura surda, bem como, com o rompimento de barreiras que ainda existem por estarem inseridos em uma sociedade majoritariamente ouvinte, ao qual necessitam da garantia de seus direitos, garantidos por lei.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Decreto n. 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Regulamenta a Lei no
10.436, de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais Libras, e o art. 18 da Lei no 10.098, de 19 de dezembro de 2000. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Brasília, DF, 2005.
______. Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002. Dispõe sobre a Língua Brasileira
de Sinais - LIBRAS e dá outras providências. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Brasília, DF, 2002.
CANEDO, D. P.. Cultura é o quê? - reflexões sobre o conceito de cultura e a
atuação dos poderes públicos. In: V Encontro de Estudos Multidisciplinares em Cultura - Enecult, 2009, Salvador. Anais V Enecult, 2009.
INSTITUTO BRASILEIRO DE ESTATÍSTICA – IBGE. Informe sobre o censo
demográfico de 2010. Disponível em: <https://cidades.ibge.gov.br/brasil/go/jatai/pesquisa/23/23612>. Acesso em: 31 outubro 2019.
MONTEIRO, M; S.. História dos Movimentos Surdos e o reconhecimento da
Libras do Brasil. Relato de experiência. Grupos de Estudo e Subjetividades. ETD-Educação e Temática Digital. Campinas. v.7, n.2, p. 292-302, jun. 2006. SKLIAR, C. (Org.). Educação & exclusão: abordagens sócio-antropológicas em educação especial. 3. ed. Porto Alegre: Mediação, 2001.
STROBEL, K.. As imagens do outro sobre a cultura surda. Florianópolis: Ed.