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ÍNDICE/
c/Pudim de natal
d/Pavão assado
8.AS MÁQUINAS QUE AINDA TENHO DE INVENTAR PARA AS MINHAS COZINHAS 24/25
9.O CÓDEX ROMANOFF DE LEONARDO DA VINCI 26/27
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Pelo Doutor Marino Albinesi, promotor de justiça em Roma e presidente do Circolo Enogastronomico d’Italia.
Causou sempre uma certa estranheza o facto de alguém tão curioso em relação a
tudo (como era o caso de Leonardo da Vinci) ter deixado um espólio tão reduzido
em termos de referências relevantes acerca da comida e da culinária. Isto, num
homem cuja maior e mais conhecida realização pictórica, essa representação de
parcimónia culinária denominada A Última Ceia, em que gastou três anos da sua
vida, abordava tanto questões de comida como valores espirituais. Isto num
homem que no seu testamento deixou uma parcela considerável dos seus bens a um
ser muito particular: a sua cozinheira, Battista de Villanis. Isto num homem
que, durante toda a sua vida, se interessou tanto por alimentação e culinária
como por projectos de pinturas e fortificações, além de investigar inúmeros
outros assuntos que despertavam a sua curiosidade. Realmente, o seu interesse
pela culinária foi mais activo do que em outro domínio qualquer. Teve mesmo de
o ser. Não apenas quando ainda pouco mais era do que um rapazinho e conseguia
algumas dispensas das obrigações que o retinham no estúdio de Verrochio, tra-
balhando, para realizar algum dinheiro de bolso, nas cozinhas de um botequim
florentino; não apenas na altura em que, de parceria com Sandro Boticelli,
tentou abrir o seu próprio botequim; mas, muito especialmente, nas
suas aptidões como mestre das folias e banquetes na corte dos Sforza
– e convém recordar que desempenhou esse cargo durante mais de treze
anos – o que implicava um conhecimento vasto, e muito próximo, dos
assuntos de alimentação. Todavia, o número de referências à comida e
à bebida nos cadernos de apontamentos de Leonardo conhecidos até hoje
é por assim dizer, mínimo – meia dúzia de generalizações e alguns
aforismos, mas nem uma só menção ou receita, depois de todo o tempo
que viveu na corte dos Sforza.
Hoje, numa tentativa para preencher esta lacuna, é-nos apresentado
finalmente aquilo a que um número cada vez maior de pessoas, incluindo
os presentes autores, designam por Codez Romanoff e até a minha velha
amiga, Shelagh Marvin Routh, que, juntamente com o marido Jonathan,
passou muitos anos em busca desta pista culinária de Leonardo, tem
de admitir que não há absolutamente nenhuma forma de de autenticar
como texto genuíno de Leonardo da Vinci esta cópia de um manuscrito
Italiano, que trata quase exclusivamente de comida, e que parece ter
surgido vinda de parte nenhuma.1
Que sentido deveremos atribuir à breve nota que encabeça esse ma-
nuscrito, e que diz: “Este é o texto que eu, Pasquale Pisapia, copiei
por extenso a partir do manuscrito de Leonardo da Vinci, que agora se
encontra no Ermitage, em Leninegrado”? Quem era, ou quem é, Pasquale
Pisapia? Como se explica ser ele a única pessoa a ter tido conhecimento
do manuscrito? E, tendo os funcionários do Ermitage negado que tal
obra de Leonardo existia no seu museu, é tarefa complemente inglória
procurar fundamentar a sua autenticidade, para já não falar da sua
própria existência. (Ainda que não me custe nada reconhecer que, ainda
não há muito tempo, os Russos “negaram” muitas outras coisas).
1. falo aqui em termos metafóricos, mas até ao momento em que aristocrática família do Piemonte
(alegadamente avessa a toda a forma de publicidade e em cuja posse, segundo consta, o dactiloscrito
se encontra desde a última guerra) vier a público fornecer uma explicação satisfatória, “de parte
O que o Meu Senhor Ludovico tem em sua mesa fere a minha vista. Todos os pratos
são monstruosos... é tudo abundância. Assim comiam os bárbaros (DA VINCI, 2005, p. 77).
Essa reprovação aos atos do amigo demonstra como o artista foi influenciado
pelo ideal ciceroniano de virtu, o qual foi retomado no Renascimento. Nesse
momento, assuntos como educação, retórica e conhecimento filosófico passaram
a ser pauta de uma discussão que pretendia estabelecer os principais âmbitos
que deviam compor a instrumentalização de um verdadeiro cavalheiro. A idéia
de que todo homem pode alcançar a excelência impulsionou uma busca contínua
por virtudes que eram consideradas essenciais à vida pública.
Como todo homem é filho de seu tempo, Da Vinci não poderia fugir desse ideal.
Para ele, Sforza, como governante de Milão, deveria ser um homem virtuoso,
com boas maneiras. Suas atitudes à mesa não eram condizentes com a de um ca-
valheiro, o qual deveria ter como objetivo principal de sua vida a busca pela
sabedoria e eloqüência. Da Vinci chegou ao ponto de comparar seu senhor aos
bárbaros, evidenciando, assim, seu horror ao presenciar aquelas cenas que ofen-
diam os valores humanistas, nos quais as boas maneiras à mesa faziam parte de
um conjunto de comportamentos necessários a um governante possuidor da virtu.
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/Uma anchova enrolada sobre uma rodela de nabo, esculpida na forma de uma rã.
/Outraanchova, disposta em espiral à volta de uma erva. /Uma cenoura finalmente
trabalhada. /Um coração de alcachofra. /Duas metade de pepino de conserva por
cima de uma folha de alface. /Um peito de pequena ave canora. /Um ovo de pavão.
/Um testículo de carneiro envolto em natas (frio). /Uma perna de rã sobre uma
folha de dente-de-leão. /Um pé de carneiro cozido e desossado.
Como se pode calcular, Ludovico respondeu a Leonardo da Vinci que aquilo não era
propriamente uma refeição que estava nos seus planos. Explicou laboriosamente a
Leonardo da Vinci que aquele não era o tipo de banquete que os Sforza costumavam
servir aos seus convidados, nem era banquete que se apresentasse a convidados
que teriam de fazer uma cansativa viagem para vir à festa. Graças aos livros
de contas dos Sforza, temos hoje conhecimento de que, em vez daquilo que fora
proposto por Leonardo da Vinci, Ludovico Sforza deu ordens para encomendar:
/600 salsichões com miolos de porco de Bolonho. /300 Zampone (pernas de porco
recheadas) de Modena. /1200 empadas de Ferrara. /200 vitelas, galinhas e pa-
tos. /60 pavões, cisnes e garças. /Maçapão de Siena. /Queijo Gorgonzola com o
selo da Guilda dos Queijeiros. /Carne picada de Monza. /2000 ostras de Veneza.
/Macarrão de Génova. /Esturjão. /Trufas. /Puré de nabo.
Pudim de
mosquito branco
Pavão assado
titulo original
Codex Romanoff
autor
Leonardo Da Vinci
editora
Máquinas do Tempo
Avenida Calouste Gulbenkian
4460-268 Senhora da Hora
Matosinhos, Portugal
direcção de arte/ilustração
Pedro Mota
Revisão
Margarida Azevedo
impressão
Colorshow
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