SENADORES DA PB E RN: REPRESENTANTES OU HERDEIROS?
Quando são considerados os estudos disponíveis sobre a democracia, do seu
princípio à contemporaneidade, é possível constatar que há diversas formas de compreensão do seu real sentido teórico, de expressão de seus conceitos na prática e de configuração de modelos institucionais.
Tais entendimentos sobre o sentido da democracia e suas aplicações variam
conforme o tempo e o espaço, o contexto, a constituição formal por meio da qual materializam-se as suas leis e regras e o governo de plantão que as aplica. E, deste modo, o experimento democrático vivenciado pelos cidadãos poderá variar das formas mais amplas, que tentam aproximar-se do ideal de democracia direta, às formas mais restritas de participação política, chegando às fronteiras com o seu principal regime antagônico, qual seja, o autoritarismo.
Especialmente quando consideramos a contemporaneidade, um tema central e
recorrente ao se desenvolver pesquisas sobre a democracia, é a lógica da representação política. Conforme reforçado por Monteiro (2016):
A democracia se tornou um dos temas centrais da teoria política contemporânea
e indiretamente as agendas referentes às eleições, processos decisórios, elites, participação. Agendas como participação, eleição e constituição de elites são pertinentes à democracia desde o experimento grego. Algo que se constata nas democracias contemporâneas, e que, portanto, não se constituíam na experiência grega clássica, é “o parlamento como colégio de representantes e o processo eleitoral” (MIGUEL, 2014, p.12, apud Monteiro, 2016, pág. 561)
Teoricamente, por meio do voto, os representados escolhem os representantes para
estes debaterem e tomarem decisões que lhes sejam favoráveis ou, no mínimo, levem em consideração os seus anseios.
Mas, na prática das democracias realmente existentes, o que se observa é que a
maioria dessas decisões são tomadas sem sequer ouvir àqueles que serão impactados em suas próprias vidas por tais decisões. Sobre essa discussão, Miguel (2019) assinala que o grande desafio é compatibilizar a vontade de democracia para além do campo procedimental, com o que ele reconhece como necessidade de representação, e o motivo seria: porque os representantes são estimulados a prestar contas prioritariamente a detentores de recursos importantes (financiadores de campanha, meios de comunicação), em vez de prestá-las aos seus eleitores. (MIGUEL, 2019)
Tal situação se agrava quando se considera a circunscrição destes representantes
ao universo de suas próprias famílias. Seriam estes, então, representantes de quem? A quem, em um primeiro momento, teriam que prestar contas ou dar satisfação? Ora, se os processos de recrutamento eleitoral já se demonstram excludentes por natureza, expressando as desigualdades e assimetrias sociais nas lutas políticas, o que dizer quando o mecanismo da escolha e da manipulação das opções disponíveis para o voto se dão dentre opções tão restritas como é o caso de núcleos familiares? Sabe-se que as redes de poder no Brasil, as famílias e as redes de parentesco, se conectam às instituições pelos caminhos da política e da economia. O Senado, objeto deste estudo comparativo, é uma das instituições centrais da República para se compreender as teias formadas por essas relações. Nesse contexto, pode-se perguntar: o Senado Federal é a casa da representação de cada Estado brasileiro, ou das famílias do poder de cada Estado?
Qual foi o impacto do capital político familiar, nas composições dos
representantes das bancadas dos estados da Paraíba e do Rio Grande do Norte desde a fundação do Senado, no Império, às eleições de 2018? O preenchimento destes espaços, obedeceram à lógica da representação política dos estados ou da transmissão de herança política?
REFERÊNCIAS
MONTEIRO, J. M. Parentesco e representação política: a força do capital político
familiar na 54ª legislatura no Congresso Nacional. REVISTA NEP, Curitiba, v.2, n.2, p. 561-579, maio 2016. ISSN 2447-5548
MIGUEL, L.F. Democracia: crise e possibilidades. Com Ciência, 4 de setembro de 2019.
Disponível em: http://www.comciencia.br/democracia-crise-e-possibilidades/. Acesso em setembro de 2020.
MIGUEL, L.F. Representação política em 3-D: Elementos para uma teoria ampliada da representação política. RBCS, 18 (51), 2003b.