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“O uso de armas biológicas não é nada recente na História da humanidade.

A novidade que encontrei foi seu uso por, digamos, outros. Eu achava que já tinha
visto de tudo. Até aquele dia.
Era um tranqüilo domingo. Eu descansava depois de uma árdua semana de
experiências e equações no laboratório, quando tocou o telefone: era um aluno,
dizendo que havia encontrado algo instigante no seu sítio, e queria me mostrar.
Aceitei, conjeturando que certamente ele havia visto algum animal estranho e
erroneamente considerado que ele não era catalogado. Ninguém está livre de
escolhas erradas.
O aluno se chamava Roberto. Cheguei ao sítio e ele me conduziu até uma
funda e pequena cratera, enegrecida por dentro. Dentro, uma pesada máquina com
aspecto de escavadeira. Sabendo que sou especialista em biorobótica, Roberto me
pede que analise os circuitos do estranho artefato. Primeiramente, achei que meu
aluno fosse só mais um ingênuo ufólogo adepto da teoria da Panspermia Cósmica
caçando uma adesão importante às suas convicções. Mas mudei de opinião ao
chegar ao fundo da cratera: a máquina parecia saída de um filme de ficção científica.
Embora já estivessem bastante destruídos, os circuitos internos possuíam algo de
familiar. Roberto permitiu que eu levasse fragmentos dos circuitos para estudos mais
detalhados no laboratório, exigindo apenas meu silêncio absoluto e ser mantido
informado sobre todos os detalhes da pesquisa.
Entusiasmado com a descoberta daquela tecnologia simultaneamente
insólita e familiar, nem reparei em como Roberto estava estranho. Escolhas erradas
causam arrependimento. As análises laboratoriais se mostraram surpreendentes: a
tecnologia do artefato parecia ter servido de alicerce para os avanços da
nanorobótica, estando alguns passos à frente do que há de mais avançado na área.
Mas as surpresas, trazendo consigo as escolhas, continuaram: havia indícios de vida
orgânica naquela máquina. Com perspicácia e ajuda do microscópio eletrônico,
descobri tratar-se de vírus! Sim, mas como um vírus, composto por um capsídio
protéico e ácido nucléico, poderia sobreviver em uma máquina? Depois de horas,
veio a resposta: não era um vírus comum. Era um vírus aperfeiçoado
ciberneticamente, o que não me pareceu tão absurdo diante da descoberta daquela...
bem, não me parece adequado chamá-la simplesmente de máquina, portanto a
denominarei cyberunidade. E o mecanismo cibernético era surpreendentemente
simples: um nanochip comandava o processo de transformação dos vírus ativos em
vírions, espécie de estado cristalizado do vírus que leva alguns a discutirem sua
condição de seres vivos, e vice-versa. Assim esse engenhoso cyberorganismo se
protegia de condições adversas e garantia a sua permanência perpétua no corpo do
hospedeiro, cristalizando-se dentro de seu organismo e impedindo-o de destruí-lo.
Mas não era só isso: no nanochip também estava presente um software capaz de
desestruturar qualquer interface, ou seja, um vírus de computador. Entretanto, havia
algo intrigante. O cybervírus estava programado para reconhecer o padrão
cibernético de seu hospedeiro e não mais infectar qualquer máquina similar. Talvez
uma tentativa de evitar uma eventual cura por troca de peças, especulo eu. Dessa
forma, se uma cyberunidade retirasse uma peça infectada, mesmo implantando-a em
outra, não ficaria livre do vírus, pois novos viríons seriam ativados automaticamente
na cyberunidade original diante do não reconhecimento do padrão cibernético da
máquina em que foi colocada a peça infectada. É apenas uma teoria. O curioso é que
isto reduz bastante o poder de infecção, como que para mantê-lo absolutamente sob
controle, impedindo que o vírus se espalhe, e restringindo a infecção a casos onde o
agente viral entra em contato com o hospedeiro logo após ter saído do laboratório
onde foi produzido. Muito engenhoso.
Provavelmente esse "vírus de infecção dupla" destruiu a cyberunidade em
que se alojava ao impedir a comunicação entre esta e seu usuário. Fascinante. Sem
dúvida, tratava-se de um organismo alienígena. Talvez por isso eu o tenha
substimado. Havia mais uma função do implante cibernético que detectei tarde
demais.
A especificidade de um vírus é determinada pelas proteínas presentes em
seu capsídio. Tais proteínas devem ser capazes de se ligar a substâncias presentes na
célula a ser infectada. Entretanto, o cybervírus possuía uma espécie de chave-
mestra: era capaz de, ciberneticamente, simular qualquer proteína, tornando-se capaz
de infectar qualquer organismo. E como o meu organismo não era nada parecido
com a cyberunidade, fui infectado.
Surpresas trazem escolhas.”
Diário do Dr. Augusto Martins

O organismo citado no relato do Dr. Augusto é um vírus tecnorgânico


extraterrestre, de mínimo poder de infecção e muito perigoso. Foi desenvolvido por
Traktorianos, uma das raças alieníginas do romance Espada da Galáxia e do RPG
Invasão, com o objetivo de destruir unidades cibernéticas (na qual os traktorianos se
abrigam, pois são seres que possuem apenas um cérebro e necessitam de um corpo)
de outros traktorianos. Esse vírus foi criado para ser utilizado contra seres fugitivos
do planeta, criminosos e traidores da raça de Traktor.
O mecanismo da chave-mestra foi criado para garantir que o vírus possa
permanecer atuando mesmo que seja induzido eletronicamente a acreditar que está
em um organismo diferente. Isso foi feito quando se descobriu que alguns
criminosos traktorianos enganavam os chips dos vírus ao simular que suas máquinas
eram constituídas por proteínas orgânicas, enganando o sistema cibernético do vírus.
Entretanto, esse mecanismo permitiu que o vírus infectasse o Dr. Augusto,
provocando os mais inesperados efeitos, já que se encontra em um organismo
totalmente diferente de uma máquina...
Efetivamente, o Dr. Augusto adquiriu uma infecção parecida com a do
personagem Cable, da Marvel Comics. Mas há algumas diferenças fundamentais. A
infecção do Dr. Augusto é bastante mais amena, e não o prejudicará. Na verdade, o
vírus irá se reproduzir no sangue de uma forma parecida com o Nanometal (Dragão
Brasil nº 14 e 32), entretanto as conseqüências serão bastante diferentes (considere
que a semelhança se deve ao fato de que o Nanometal constitui um avanço
conquistado em parte pela presença da tecnologia traktoriana na Terra).
Ter o vírus é uma vantagem de no mínimo 95 pontos. A potência e o NH da
perícia psíquica CyberPsi irão alterar esse custo em pontos.

Vantagens e desvantagens:

Corpo Metálico x6: DP 2, RD 6, não ferroso, não cristalino, não desativável


(65 pontos); Pontos de Vida extra x5 (15 pontos)
Mais tarde, o Dr. Augusto descobrirá que a porção logo abaixo de sua
epiderme está se tornando metálica, devido à reprodução do vírus. Seu corpo não
parece ter porções metálicas, a menos que sofra um ferimento grave, deixando a
mostra a camada que está abaixo. Essa camada lhe confere Resistência a Dano e
Defesa Passiva.

Tolerância à Temperatura (10 pontos)


Como o corpo do Dr. Augusto possui menos água a ser evaporada, ele é
menos atingido por mudanças de temperatura.

Força Multiplicada x1 (50 pontos)


A força também é ampliada, devido às mudanças fisiológicas ocorridas no
corpo. O Dr. Augusto passa a ter a força de dois homens!

Gula (-5 pontos)


A presença do vírus exige um aumento na quantidade de alimentação,
especialmente alimentos muito ferrosos e protéicos, como feijão e carne.

Envelhecimento Acelerado x2 (-40 pts)


O resultado da atividade metabólica do vírus é a liberação de grande
quantidade de toxinas que aceleram a velocidade do envelhecimento.

Nova perícia psíquica:

CyberPsi *2
O portador do vírus é capaz de manter comunicação com aparelhos
eletrônicos dotados de capacidade de memória e processamento similar a um
computador (incluindo-se aí relógios de pulso, calculadoras, miras de armas
eletrônicas, controles remotos e similares).
Essa nova perícia é uma espécie de telepatia, e será tratada como tal. É
exclusiva para seu poder, a Eletrocinese (para mais detalhes veja GURPS Psionics).
O nível de potência custa 2 pontos, e é uma habilidade Mental/Difícil para efeitos de
compra do NH. O nível de potência está diretamente relacionado à complexidade da
máquina com a qual se tenta estabelecer interação. A partir da potência 5, já se pode
estabelecer comunicação com máquinas complexas como um computador. O alcance
é reduzido ao contato, ou seja, à distância de fala. Para um NH maior ou igual a 10,
a velocidade de comunicação será 10 vezes a velocidade de uma conversa. Para
propósitos de reação, os computadores terão IQ 4 vezes seu nível de complexidade.
O possuidor deste poder está sujeito a testes de reação se a máquina for capaz de
reagir como ser inteligente (I.A.), usando potência dividida por 4 como bônus no
teste de reação.

Apêndice:
Essa é uma excelente oportunidade de dar poderes a um personagem que vai
se tornar um Super. Assim você pode iniciar uma campanha de Supers com um
pequeno nível de poder (talvez utilizando um outro PC com o Nanometal). Se você
quiser fazer uma campanha com um nível maior de poder, apenas retire as
desvantagens e aumente o nível das vantagens. Outras vantagens possíveis seriam
Regeneração, Recuperação Física e Invulnerabilidade.
Para quem não conhece o romance Espada da Galáxia, o RPG Invasão ou as
avanturas feitas nesse estilo pela Dragão Brasil, recomendo a revista Dragão Brasil
17.
Aqui vai um pequeno resumo para quem não teve nenhum contato com
qualquer dessas fontes:
“Uma guerra está sendo travada entre duas raças extraterrestres. De um
lado, os metalianos. Fortes e majestosos homens-inseto metálicos. (...) De outro
lado, os traktorianos. Robôs metálicos, mas com cérebros de carne e sangue, em
busca constante por corpos cada vez melhores. Sua tecnologia deu-lhes os melhores
corpos que a ciência pode fabricar, mas nada disso compara-se aos riquíssimos
tecidos orgânicos. Eles desejam provar a delícia da carne viva, pele macia e sentidos
saborosos. Esse prêmio supremo está agora ao alcance de suas mãos, e estão
dispostos a tudo para conseguí-lo – até mesmo guerrear com os metalianos, donos
dos corpos mais perfeitos da galáxia conhecida.”
Marcelo Cassaro, Dragão Brasil nº 17

O aluno do Dr. Augusto na verdade está morto. Seu corpo agora pertence a
um traktoriano, que quer descobrir qual foi o problema ocorrido com seu corpo de
metal. Sendo um criminoso, ele teme tentar contatar outros traktorianos e por isso
quer ter a sua máquina consertada o mais rápido possível, para deixar a Terra.
Entretanto, está seduzido pelos sentidos que seu novo corpo lhe proporciona e pode
querer estabelecer vida normal como um terráqueo, e para isso tentará matar o Dr.
Augusto, que obteve indícios do que ele é. Mas poderá ter uma desagradável
surpresa...
Os personagens jogadores podem ser inseridos na história de várias formas.
No caso de não serem Supers, podem ser contratados pelo traktoriano para
investigar o paradeiro do Dr. Augusto, que teria fugido, temeroso de ser assassinado.
Assim, pouco a pouco, entrariam em contato com a verdadeira realidade. Ou podem
ser agentes de uma entidade governamental que descobre as pesquisas do doutor e
decide obrigá-lo a se integrar à equipe paranormal do governo. No caso de uma
campanha de Supers, um PC poderia ser parente de Augusto, e ser infectado com o
vírus, recebendo os poderes. Ou esse vírus poderia cair na mão de vilões que
planejariam criar um exército de superseres, e os PCs devem impedir. Enfim, esse é
um ponto de partida, use sua criatividade.

Fernando Couto Garcia


Agradecimentos a Cláudio da Costa
Dúvidas, pedidos ou sugestões para fcg@gold.com.br

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