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O PAPEL DA VIOLÊNCIA NA HISlóRl,A

F. ENGELS

Consideremos, contudo, um pouco mais de perto, essa "vio-


lência" toda-poderosa do Sr. Dühring, Robinson subjugou Sexta-
-Feira "de espada em punho". De onde lhe veio a espada? Mesmo
nas ilhas imaginárias das robinsonadas, as espadas não crescem nas
árvores, e o Sr. Dühring deixa esta pergunta sem resposta. Se Ro-
binson conseguiu arranjar uma espada, igualmente podemos admitir
que Sexta-Feira surja uma bela manhã com um revólver carregado
na mão - e então toda a relação de "violência" se inverte: Sexta-
-Feira manda e Robinson é forçado a desdobrar-se até à exaustão.
Que o leitor nos desculpe se voltamos com tanta insistência à his-
tória de Robinson e Sexta-Feira, a qual, na verdade, é do domínio
do jardim de infância e não da ciência. Mas que havemos de fazer?.
Somos obrigados a aplicar com toda a consciência o método axio-
mático do Sr. Dühring e não é culpa nossa se, tal método de afir-
mações gratuitas, nos conduz continuamente ao domínio da pura
infantilidade. Portanto, o revólver vence a espada, e mesmo o mais
pueril amador de axiomas compreenderá sem dúvida que a violência
não é um simples ato de- vontade, antes exige para o seu uso con-
dições prévias muito reais, particularmente instrumentos, dos quais
o mais perfeito vence o menos perfeito; compreenderá, além disso,
que- esses instrumentos têm de ser produzidos, o que significa tam-
bém que o produtor de instrumentos de violência mais perfeitos
(em termos grosseiros: de armas) vence o produtor dos menos per-
feitos - numa palavra, que a vitória da violência fundamenta-se

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na produção de armas, e esta, por sua vez, na produção em geral, •
logo. . . no "poder econômico", no "estado econômico" , nos meios
materiais que são postos à disposição da violência.
A violência é hoje o exército e a marinha de guerra, e ambos,
como todos o sabemos, custam "um dinheiro louco", Mas a vio-
lência não pode fazer dinheiro, quando muito pode saquear o que
já está feito - e mesmo isso não serve para grande coisa como,
uma vez mais à nossa. custa, aprendemos com os bilhões da França .
No fim de contas, portanto, o dinheiro tem que ser fornecido por
meio da produção econômica; a violência, uma vez mais, é portanto
determinada pelo estado econômico, • que lhe fornece os meios de
se armar e de conservar as suas armas. Mas isso rião basta . Nada
depende mais das condições econômicas prévias do que precisamen-
te o exército e a marinha. Armamento, composição, organização,
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tática e estratégia dependem, antes de mais nada, do nível atingido ,/

em cada caso pela produção, bem como pelas comunicações . Não


foram as "livres criações da inteligência" dos generais de gênio que
tiveram nesta matéria um efeito revolucionador, mas sim a inven-
ção de armas melhores e a modificação do material hu.mano, do
soldado; na melhor das hipóteses, a influência dos generais de gênio
limita-se a adaptar o método de combate às novas armas e aos no-
vos combatentes.
No começo do século XIV, a pólvora de canhão foi transmi-
tida pelos Árabes aos Europeus ocidentais e, como todos sabem,
revolucionou toda a arte da guerra. Mas, a introdução da pólvora
e das armas de fogo não era de modo algum um ato de violência;
era um progresso industrial, logo econômico. A indústria é a in-
dústria, dedique-se ela à produção ou à destruição de objetos . E a
introdução das armas de fogo revolucionou não só a própria con-
dução da guerra, mas também as relações políticas, relações de
dorr,inação e de sujeição . Para ter pólvora e armas de fogo, era
preciso indústria e dinheiro - e uma e outra coisa pertenciam aos
burgueses das cidades. Por isso foram as armas de fogci desde o
início as armas das cidades e da monarquia ascendente (apoiada nas
cidades) contra a nobreza feudal. As muralhas até aí inexpugnáveis

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dos castelos dos nobres tombaram sob os tiros dos canhões dos
burgueses; as balas dos arcabuzes burgueses trespassaram as arma-
duras dos cavaleiros. Com a cavalaria couraçada da nobreza, des-
moronou-se também a dominação da nobreza; com o desenvolvi-
mento da burguesia, a infantaria e a artilharia tornaram-se cada. vez
mais as armas decisivas; sob a pressão da artilharia, o ofício da
guerra teve que anexar uma nova subdivisão perfeitamente indus-
trial: o corpo de engenheiros.
O desenvolvimento das armas de fogo foi muito lento. Ape-
sar de numerosas invenções de pormenor, o canhão continuava a
ser pesado e o arcabuz, grosseiro. Foram precisos mais de trezen-
tos anos para fabricar uma arma própria para equipar toda a infan-
taria. Só no princípio do século XVIII é que a espingarda de
pederneira com baioneta suplanta definitivamente a lança no arma-
mento da infantaria. Nessa época, a infa~taria era' composta por
mercenários ao serviço dos príncipes, que nos exercícios ostentavam
um belo porte, mas que eram muito pouco seguros e cujo único
meio de coesão .era a lança; o seu recrutamento fazia-se entre os
elementos mais depravados da sociedade e, muitas vezes, entre os
prisioneiros de guerra inimigos arregimentados à força. A única
forma de combate em que estes soldados podiam utilizar o novo
fusil era a tática de linha, que atingiu a perfeição supréma com Fre-
derico ·n. Toda a infantaria do exército era disposto em três fi-
leiras num quadrilátero oco muito extenso e que, em ordem de ba-
talha, se movia como um bloco; quando muito, autorizava-se uma
das duas alas a avançar ou a recuar um pouco. Esta massa desa-
jeita:da só podia movimentar-se em ordem num terreno perfeita-
mente plano e mesmo aí em cadência lenta (75 passos por minuto);
era impossível alterar a ordem de batalha durante a ação e, uma
vez aberto o fogo pela infantaria, a vitória ou a derrota decidiam-se
muito rapidamente, de um só golpe.
Estas linhas pouco flexíveis encontraram pela frente, na guerra
de independência americana, bandos de rebeldes que, se não tinham
grande instrução militar, não deixavam de saber atirar, e bem, com
as suas carabinas estriadas; combatiam pelos seus próprios interes-

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ses e, portanto, não desertavam como as tropas mercenanas, alem
de que não tinham a gentileza de enfrentar os ingleses dispondo-se
como eles em linha e em terreno descoberto, antes se apresentavam
em grupos de atiradores dispersos e de grande mobilidade, cobertos
pelas florestas. A linha tornava-se aqui impotente e sucumbia pe-
rante os seus adversários invisíveis e inacessíveis . Redescobria-se
a disposição de atiradores: método de combate novo devido a um
material humano modificado.
Também no campo militar a Revolução Francesa completou o
que a revolução americana iniciara. Aos bem treinados exércitos
mercenários da coligação também ela só podia opor massas pouco
exercitadas, mas numerosas - o levante em massa de toda a na-
ção . Mas com essas massas era preciso proteger Paris, portanto,
cobrir uma zona determinada, e isso só era possível com uma vi-
tória numa batalha de massas a descoberto. O simples combate de
atiradores não bastava: era preciso encontrar uma formação para a
utilização das massas, e assim surgiu a coluna. A formação em coluna
permitia, mesmo a tropas pouco treinadas, movimentar-se com bas-
tante ordem, e mesmo com maior velocidade de marcha (100 pas-
sos ou mais por minuto); permitia romper as formações rígidas da
velha disposição em linha, combater em todos os terrenos - e, por
conseguinte, mesmo naqueles que eram mais desfavoráveis à linha
- , agrupar as tropas da maneira mais conveniente consoante as
necessidades, e, em ligação com o combate de atiradores dispersos,
reter, ocupar e fatigar as linhas inimigas até chegar o momento de
as romper no ponto decisivo da posição com as massas de reserva.
Por conseqüência, se este novo método de combate - que se ba-
seava na combinação de atiradores e colunas e na distribuição do
exército em divisões ou em corpos autônomos que integravam todas
as armas, e que atingiu o auge da perfeição, tanto no aspecto tático
como no estratégico, com Napoleão - se tinha tornado necessário,
era sobretudo por causa da modificação do material humano, o sol-
dado da Revolução francesa. Mas havia ainda no domínio técnico
duas condições prévias de grande importância: em primeiro lugar,

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a montagem das peças de campanha em carretas mais ligeiras (aper-
fetçoada por Gribeauva), sem a qual não seria possível o movimento
mais rápido que agora se lhes exigia; em segundo lugar, a curva-
tura da coronha da espingarda, que até então era um prolongamento
do cano em linha reta (introduzida na Frana em 1777, esta modifi-
cação, tirada dos fusis • de caça, permitia fazer pontaria sobre um
adversário isolado com grandes possibilidades de o atingir). Sem
este progresso, com a. arma antiga, não teria sido possível o com-
bate de atiradores.
O sistema revolucionário que era o armamento de todo o povo
em breve foi limitado à conscrição (que os ricos podiam evitar, pa-
gando uma compensação) e adotado sob essa forma na maioria dos
grandes Estados do continente. Só a Prússia, com o seu sistema
de Landwehr, pretendeu recorrer em maior escala à força militar
do povo. A Prússia foi, além disso, o primeiro Estado que -
depois do papel sem futuro desempenhado pela velha espingarda
estriada de carregar pela boca, aperfeiçoada entre 1830 e 1860 -
equipou toda a sua infantaria com a arma mais moderna, a espin-
garda estriada de carregar pela culatra. A estas duas medidas deve
os seus êxitos de 1866.
Na guerra franco-alemã enfrentaram-se pela primeira vez dois
exércitos que dispunham ambos da espingarda estriada de carregar
pela culatra, mas que conservavam formações táticas essencialmente
idênticas às do tempo da velha espingarda de pederneira e de cano
liso, com a reserva da introdução da coluna de companhia com que
os Prussianos tinham tentado encontrar uma forma de combate mais
apropriada ao novo armamento. Mas, a 18 de Agosto, em Saint-
-Privat, quando a guarda prussiana pretendeu fazer um ensaio a
sério da coluna de companhia, os cinco regimentos mais empenha-
dos na ação perderam, em duas horas, no máximo, mais de um terço
dos seus efetivos (17 6 oficiais e 5114 homens). A partir desse dia,
a coluna de companhia foi desaprovada como formação de combate ,
/\
como havia ocorrido à coluna de batalhão e à linha. Renunciou-se
a qualquer tentativa ck, no futuro, expor ao fogo do inimigo qual-
quer tipo de formação cerrada, e do lado alemão deixou-se de com-

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bater sem esses grupos densos de atiradores em que até então,
sob a chuva de balas certeiras, a coluna já normalmente se decom- •
pusera por si mesma, mas aos quais os altos escalões sempre se
haviam oposto por os considerar contrários à disciplina; de igual
modo, o passo de corrida passou a ser a única forma de deslocação
dentro do campo de tiro do inimigo. Uma vez mais, o soldado fora
mais esperto que o oficial: instintivamente, descobrira a única forma
de combate que até hoje passou pela prova do fogo da espingarda
de carregar pela culatra - e impô-la com êxito , mau grado a resis-
tência do comando.
A guerra franco-alemã marcou uma reviravolta muito mais sig-
nificativa do que todas as anteriores . Para começar, as armas estão
tão aperfeiçoadas que já não é possível um novo progresso capaz
de ter qualquer influência radical. Quando se têm canhões com os
quais · é possível atingir um batalhão tão longe quanto a vista o
distingue e espingardas que fazem o mesmo em relação ao homem
isolado, e em que o tempo de carga é menor que o de apontar -
•quaisquer posteriores inovações são mais ou menos indiferentes para
a guerra em campo raso. Quanto a este aspecto, portanto, a era
do desenvolvimento, no essencial, terminou. Mas, em segundo lu-
gar, esta guerra obrigou os grandes Estados continentais a introdu-
zir reforçando-o, o sistema do exército de reserva Landwehr prus-
siano e, por via disso, a impor-se um encargo militar que os levará
fo{çosamente à ruína em poucos anos. O exército tornou-se o fim
principal do Estado (um fim em si: os povos só existem para for-
necer soldados e alimentá-los. O militarismo domina e devora a
Europa. Mas esse militarismo traz também em si o germe da sua
própria ruína. A concorrência dos diversos Estados entre si obri-
ga-os, por um lado, a gastar mais dinheiro todos os anos com o
exército; a armada, os canhões, etc., acelerando cada vez mais a
derrocada financeira; por outro lado, a tomar cada vez _mais a sério
o serviço militar obrigatório e, no fim de contas, a familiarizar todo
o povo com o manejo das armas, tornando-o capaz de, em deter-
minado momento, fazer triunfar a sua vontade contra a prepotência
do comando militar. E esse momento chega logo que a massa do

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povo - operanos da cidade e dos campos e camponeses - tenha
uma vontade. Nessa altura, o exército dinástico converte-se em
exército do povo; a máquina recusa-se a funcionar , o militarismo
perece pela dialética do seu próprio desenvolvimento. O que a
democracia burguesa de 1848 não pôde realizar precisamente porque
era burguesa e não proletária - o ato de dar às massas trabalha-
doras uma vontade cujo conteúdo correspondesse à sua situação de
classe - realizá-lo-á)nfalivelmente o socialismo . E isso significa a
destruição do militarismo por dentro e, com ele, de todos os exér-
citos permanentes.
Esta é a primeira moral da nossa história da infantaria mo-
derna. A segunda, que nos traz de volta ao Sr. Dühring, é que
toda a organização e o método de combate dos exércitos, e por-
tanto, a vitória e a derrota, se mostram dependentes das condições
materiais, ou seja, econômicas, do material humano e do armamen-
to, portanto, da qualidade e da quantidade da população bem como
da técnic'a, Só um povo de caçadores como os Americanos podia
redescobrir o combate de atiradores - e se eram caçadores, eram-no
por razões puramente econômicas, como continua a ser por razões
puramente econô~icas que os mesmos yankees dos antigos Estados
se transformam hoje em camponeses, industriais, marinheiros e ne-
gociantes que andam aos tiros, não pelas florestas virgens, mas an-
tes, e com mais proveito, no terreno da especulação, onde também
levaram muito longe a utilização das massas. Só uma revolução
como a Revolução francesa, q1;1e emancipou economicamente os bur-
gueses e em particular os camponeses, é que podia descobrir os
exércitos ,d e massas, ao mesmo tempo que as livres formas de mo-
vimento que quebraram as velhas linhas rígidas - imagens mili-
tares do absolutismo por 9ue lutavam. Vimos, caso por caso, como
os progressos da técnica, quando aplicáveis e aplicados no domínio
militar obrigavam de imediato, e quase pela força, a alterações e
mesmo a transformações radicais no método de combate - e, mais
ainda, muitas vezes contra a ~ontaqe do comando do exército. De
resto, qualquer suboficial zeloso é hoje capaz de explicar ao Sr.
Dühring como a condução da guerra depende da produtividade e

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dos meios de comunicação da retaguarda, tanto como daquele do
teatro das operações. Em suma, sempre e em toda a parte, são
as condições e os meios de poder econômico que ajudam a "violên-
cia" a alcançar a vitória, sem o que deixa de ser violência - e
aquele que, segundo os princípios do Sr. Dühring, quisesse reformar
a arte militar partindo do ponto de vista oposto só conseguiria
colher derrotas* .
Se passarmos agora da terra para o mar, os últimos vinte anos,
por si sós, oferecem-nos uma transformação ainda mais radical. O
barco de combate da guerra da Criméia tinha duas outras pontes
de madeira com 60 a 100 canhões e era ainda normalmente um
barco à vela, com uma pequena máquina a vapor de recurso. Havia
sobretudo peças de 32 com um corpo de canhão de cerca de 50
quintais (de 100 libras), e só algumas peças de 68 que pesavam
95 quintais. Para a guerra surgiram baterias flutuantes blindadas,
monstros pesadíssimos, quase imóveis, más invulneráveis para a
artilharia da época. Dentro em breve a blindagem de aço seria
aplicada também nos barcos de linha; delgada no início , uma es-
·pessura de quatro polegadas passava já :por ser uma blindagem ex-
tremamente pesada. Mas o progresso da artilharia rapidamente su-
perou a blindagem; para cada espessura de blindagem utilizada,
havia sempre uma nova peça mais pesada que a trespassava com
facilidade. Assim chegamos , por um lado, a espessuras de 10, 12,
14, 24 polegadas (a Itália vai mandar construir um , navio com uma
blindagem de 3 pés de espessura); por outro lado, a canhões es-
triados que pesam 25, 35, 80 e mesmo 100 toneladas (de 20 quin-
tais) e que lançam a distâncias nunca vistas projéteis de 300, 400,
1700 e 2000 libras. O vaso de guerra atual é um gigantesco vapor
blindado de hélice que desloca 8 a 9000 toneladas com uma potên-
cia de 6 a 8000 cavalos, com torres giratórias e 4 ou , no máximo,

• No Estado-Maior General Prussiano sabe-se muito bem isso. "O


fundamento das coisas militares é, em primeira linha, a forma de vida
econômica dos povos em geral", diz o Sr. Max Jaehns. capitão do Es-
tado-Maior General, ·numa conferência científica. (Koelnische Zeitung,
20 de Abril de 1876, p. 3) .

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6 peças pesadas de grande calibre, e cuja proa termina, abaixo d a
linha de flutuação, por un1 esporão destinado a afundar os navios
inimigos: é uma máquina colossal única, na qual o vapor efetua
não só a propulsão rápida, mas também as manobras de pilotagem,
o lançamento da âncora, a rotação das torres, a pontaria e o carrega-
mento dos canhões, a bombagem da água, o içar e arriar dos esca-
lares, eles próprios em parte movidos a vapor, etc. E a corrida
entre a bfü1dagem e a eficácia 90 tiro ainda está tão longe do fim
que, de um modo quase geral, um navio hoje já não responde ao
que dele se exige e já está ultrapassado antes de lançado à água.
O moderno navio de guerra é não só um produto, mas, ao mesmo
tempo, um espécie da grande indústria moderna, uma fábrica flu-
tuante - que, no entanto, produz sobretudo esbanjamento de di-
nheiro. O país em que a grande indústria está mais desenvolvida
tem quase o monopólio da construção destes navios. Todos os
couraçados turcos, quase todos os couraçados russos, a maior parte
dos. alemães são construídos na Inglaterra; as placas de blindagem,
qualquer que seja a sua utilização, são feitas quase exclusivamente
em Sheffield; das três grandes fábricas metalúrgicas aptas a forne-
cer as peças de artilharia mais pesadas, duas (Woolwich e Elswick)
pertencem à Inglaterra, e a terceira (Krupp) à Alemanha. Por aqui
se vê de forma mais palpável como "a violência política imediata",
que para o Sr . Dühring é a "causa decisiva do estado econômico",
está, pelo contrário, inteiramente à mercê do estado econômico;
como não só a produção, mas também o próprio manejo do instru-
mento da violência no mar, o vaso de guerra, se tornou um ramo
da grande indústria moderna. E ninguém fica mais contrariado com
esse estado de coisas do que a própria violência, ou seja, o Estado,
a quem um barco custa hoje tanto como outrora toda uma pequena
armada, que tem de rcsigrar-se a ver esses caríssimos navios já
velhos, e portanto depreciados, antes mesmo de erem lançados ao
mar e que, seguramente, não tem menos pena que o Sr. Dühring
ao verificar que o homem da "violência imediata, o capitão. Nós,
pelo contrário, não temos razão alguma para ficarmos contrariados

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ao vermos que, nesta concorrência entre a couraça e o canhão, o
navio de guerra se aperfeiçoa até ao cúmulo do requinte , o que o
torna tão caro como impróprio para a guerra'' - e ao vermos que
essa luta revela, até no domínio da guerra naval, essas leis internas
do movimento , essas leis dialéticas segundo as quais o militarismo,
como qualquer outro fenômeno histórico, perece em conseqüência
do seu próprio desenvolvimento.
Também aqui , portanto, vemos com clareza que é perfeitamen-
te falso que
"o fator original deve ser procurado na violência política ime-
diata e não, em primeiro lugar, num poder econômico indi-
reto ."
Pelo contrário . Que é que precisamente surge como "elemen-
to inicial" da própria violência? O poder econômico, o fato de
dispor da"s meios de poder da grande indústria . A violência polí-
tica no mar, baseada nos navios de guerra modernos , mostra não
ser de forma alguma imediata, mas precisamente devida à mediação
do p_oder econômico, do enorme desenvolvimento da metalurgia,
da autoridade exercida sobre técnicos hábeis e minas de carvão
abundantes .
Mas para quê tudo isto? Confie-se ao Sr . Dühring o comando
supremo na próxima guerra naval e ele reduzirá a nada todas as 1
frotas blindadas escravas do estado econômico, sem torpedos nem h
outros artifícios: apenas com a virtude da sua "violência irr,ediata".

• O aperfeiço<1 mento do último produto da grande indústria para a


guerra naval , o torpedo de propulsão automática, parece votado a rea-
lizar esse efeito : nessas condições, o menor torpedeiro seria superior ao
mais poderoso couraçado . (Recorde-se que isto foi escrito em 1878) .

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