Uma (re)visão historiográfica: da gênese aos novos
paradigmas. Santa Maria: EdUFSM, 2004.
2.5.5 Divisão Regional de Delgado de Carvalho 1913
Delgado de Carvalho marcou uma nova etapa na evolução do ensino de
Geografia no Brasil com sua obra “Geografia do Brasil”. Em vez do estudo feito até então pelas unidades políticas isoladas, eram estas agrupadas e, dentro de cada quadro regional, passava a ser estudada tanto a Geografia Física quanto a Geografia Humana. (p. 85) O autor aceitou, em parte, a divisão de Said Ali e deu-lhe a seguinte distribuição, estabelecendo cinco regiões, a saber: I. Brasil Setentrional ou Amazônico (AC, AM e PA); II. Brasil Norte-Oriental (MA, PI, CE, RN, PB, PE e AL); III. Brasil Oriental (SE, BA, ES, RJ, DF e MG); IV. Brasil Meridional (SP, PR, SC e RS); V. Brasil Central ou Ocidental (GO e MT). (p. 85) É também uma divisão prática, para fins didáticos, e, por isso, as unidades políticas tiveram de ser consideradas por inteiro, conforme explica o autor. Baseou-se, porém, em uma divisão em regiões naturais, pela reunião dos Estados que apresentavam certa unidade deidentificação. (p. 85) A divisão de Delgado de Carvalho representa o resultado de uma evolução das regionalizações de André Rebouças, Elisée Reclus e Said Ali (principalmente). (p. 85) Sua divisão baseou-se no quadro natural. Nesse sentido, ao estudar a Região Sul, por exemplo, observa-se, primeiro, o seu quadro natural por meio de seus componentes básicos (morfológicos, climáticos, hidrológicos, etc), pois seriam esses componentes que dariam a “real” unidade regional a essa porção do território brasileiro. (p. 85)
2.5.10.8 Divisão Regional segundo o Conselho Nacional de Geografia 1941
O Conselho Nacional de Geografia, em 1941, fixou a primeira divisão regional
do país para fins práticos. Esse esquema serviu de base para a subdivisão em unidades de escalas distintas, que seria oficializada pela Assembléia Geral daquele órgão em 1945, quando estabeleceu cinco Grandes Regiões, 30 Regiões, 79 Sub- Regiões e 228 Zonas Fisiográficas. (p. 91) Segundo Galvão & Faissol (1969, p. 181), a divisão regional da década de 1940 representou o primeiro esforço organizado da sistematização de uma divisão regional do Brasil e teve como premissas básicas: (1) A de que havia uma consciência de diferenciações regionais no país ... para que fossem feitos estudos dos problemas brasileiros, por regiões e para que se divulgassem estatísticas, segundo estas mesmas unidades regionais; (2) A de que uma divisão regional deveria ser estável e permanente ... pois tal divisão permitiria a comparatividade dos dados estatísticos em diferentes épocas; (3) A de que devendo ser estável, o melhor critério a adotar seria o das regiões naturais, cuja evolução não sofreu alterações bruscas, fornecendo base conveniente para a comparação no tempo; (4) E a de que, como sistema em que se apoia as Divisões Regionais daquela época era o baseado no princípio da divisão, ela deveria partir de um todo – o Brasil – subdividindo-o, sucessivamente, em unidades menores [...]. (p. 91) Esta divisão do Brasil, em regiões naturais, surgiu o conceito clássico da análise das influências mútuas dos diferentes fatores físicos, principalmente clima, vegetação e relevo. Mas, dadas as dificuldades de informação na época e à não- coincidência perfeita entre os diferentes fatores físicos, usou-se, para caracterizar a região natural, a noção do fator dominante, a chamada nota característica da região. (p. 91) [...] uma divisão regional estruturada em função de regiões naturais, pelo fato de ser mais estável e, portanto, por melhor satisfazer a comparação dos dados estatísticos e, diferentes épocas, parte de um pressuposto pouco científico: o de que a homogeneidade dos espaços físicos seja significativa para o propósito de análise dos aspectos humanos e econômicos da área considerada. (p. 92) Desse modo, foram definidas as cinco grandes regiões brasileiras que passaram a vigoras em 1945: I. Região Norte (AM, PA, e território do Acre); II. Região Nordeste (MA, Pi, CE, RN, PB, PE e AL); III. Região Leste (SE, BA, MG, ES, RJ e DF); IV. Região Sul (SP, PR, SC e RS); V. Região Centro-Oeste (MT e GO). (p. 92) Entre as muitas divisões regionais do Brasil proposta até 1941, destacam-se a divisão regional de Delgado de Carvalho, baseada mas regiões naturais, a qual enfatizou, sobretudo, os fatos ligados à Geografia Física; foi adotada nos programas de ensino secundário da Geografia. Enfatiza-se, também, a divisão regional feita pelo Conselho Nacional de Geografia e 1941 e, posteriormente, adotada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística; foi definida como divisão regional do território brasileiro, a única oficialmente adotada pelo governo central, para ser utilizada pelos diferentes setores da gestão pública; nela, foram definidas as cinco “grandes regiões” brasileiras; foi, posteriormente, substituídas pela divisão de 1968, proposta por aquele mesmo órgão. (p. 92) Outra constatação a ser destacada é a importância da divisão regional de Delgado de Carvalho para os estudos geográficos. Para esse autor, o “natural” servia para explicar o “humano”. Assim, as regiões naturais não devim se restringir só aos fatos da natureza, devendo considerar também as tradições históricas, os hábitos de vida, os fatores econômicos, entre outros. Essa divisão regional marcou, profundamente, o ensino de Geografia brasileira, pois, durante um longo período de tempo, as regiões brasileiras eram estudadas considerando-se três itens básicos: os aspectos naturais, os aspectos humanos e os aspectos econômicos. (p. 93) Merece considerações o fato de ter predominado, por longo tempo, o critério de região natural para as divisões regionais. A esse respeito, há dois aspectos a ser analisados. Inicialmente, ressalta-se que muitos autores defendem a região natural, considerando-o como a melhor base para uma divisão regional prática. Isso porque a região natural tem limites estáveis, o que é vantajoso para fins estatísticos e, especialmente, para uma divisão permanente, que permita a comparação dos dados em diferentes épocas. Por outro lado, aqueles autores criticam as regiões humanas, particularmente as econômicas, pela sua instabilidade, já que fornecem base conveniente para uma comparação no tempo; destacam, entretanto, que essas regiões constituem um bom critério para estudo de um país numa dada época, permitindo comparações entre um espaço e outro. (p. 93) Para Guimarães (1941, p. 341), é relevante salientar o significado da região natural, por entender que: Uma região natural deve ser caracterizada por fenômenos do domínio da geografia física. Dentre os fatos humanos, podem ser utilizados aqueles que resultem do imperativo do meio físico, a título de confirmação, e para solucionar os problemas que ainda se apresentem quanto aos limites. (p. 93-94)
2.6 Considerações parciais sobre o conceito de Região na Geografia Tradicional
A contribuição positivista para o estudo do conceito de região foi muito
significativo na Geografia Tradicional, culminando com o conceito de região natural e região geográfica. (p. 95) Entretanto, para muitos autores, a diversidade de estudos regionais, teve como consequência, a diversidade de conceitos de região. Tal multiplicidade conceitual foi responsável pela ausência de consenso sobre o que constitui uma região ou como se define região. Dessa forma, maior parte dos trabalhos realizados eram direcionados por um naturalismo persuasivo, que tentava definir a região de formas variadas. Assim se percebe frequentemente que as regiões eram definidas tendo como base às características físicas, ou seja, as diferenças fisiográficas foram a base até mesmo para a formação das distintas regiões geográficas humanas. (p. 96) Dessa forma, apesar das deficiências conceituais, deve-se ter em mente que, ao definir região natural e região geográfica, os geógrafos conseguiram estabelecer para a Geografia um conceito-chave da disciplina [...]. Não conseguiram, no entanto, definir com a região, um objeto único de estudo da Geografia Tradicional, pois quando estudado, o conceito de região, muitas vezes, misturava-se ou confundia-se com os estudos paralelos: individualidade dos lugares, diferenciação de áreas, descrição da superfície terrestre e principalmente, relação homem X natureza (p. 96). É importante salientar também que, das duas concepções de região na Geografia Tradicional, ou seja, a de região natural e a de região humana ou região geográfica, a contribuição da primeira é mais restritiva, uma vez que, para a ciência geográfica, somente o ambiente, as condições físicas não são capazes de explicar o todo nem de se caracterizar como o estatuto do conhecimento geográfico. Por outro lado, admite-se que são de maior relevância as regiões geográficas, nas quais, ocorre e se reproduz a ação humana, com sua cultura, suas atividades sua economia. Não há dúvida, pois, de que um recorte espacial deverá expressar as características peculiares do trabalho humano. São essas peculiaridades que definem a região, no sentido verdadeiramente geográfico, priorizando, na dualidade homem X natureza, a ação transformadora do homem. (p. 97).