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Brasileira de
ASTRO
NOMIA
Produzida pela Sociedade
Astronômica Brasileira
Ano 1 | Número 4
A busca por
NOVOS MUNDOS
A Astronomia no século XXI
Uma galáxia com órbitas ressonantes
A Missão Geodésica e a forma da Terra
Editorial
Esta quarta edição da Revista Brasileira de Astronomia celebra a busca
por novos mundos. É apropriado falar sobre o assunto quando
acabamos de receber a notícia de que Michel Mayor e Didier Queloz, os
descobridores do primeiro exoplaneta orbitando uma estrela “normal”,
receberam o Prêmio Nobel de Física de 2019. O prêmio foi oferecido
também ao cosmólogo James Peebles por suas importantes
contribuições ao campo da Cosmologia Observacional. É o
reconhecimento do desenvolvimento tecnológico e teórico da
Astrofísica das últimas décadas.
Esquerda
Detalhe da Nebulosa Cabeça da Bruxa, nome popular de IC 2118
(Crédito: DSS/Utkarsh Mishra).
Capa
Representação artística de um exoplaneta (Crédito: Pixabay).
Contra-Capa
Observatório de Haute-Provence, onde foram feitas as observações
que levaram à descoberta do planeta de 51 Pegasi por Michel Mayor e
Didier Queloz (Crédito: Acervo pessoal de José Dias do Nascimento).
ÍNDICE E EXPEDIENTE
Revista
Brasileira 4 A Missão Geodésica
do século XVIII
de Astronomia Sandro Rembold narra a apaixonante
produzida pela aventura dos cientistas que se dedicaram
Sociedade Astronômica Brasileira a medir a forma da Terra.
12
Conselho Editorial Alan Alves Brito,
Reinaldo Ramos de Carvalho, Lucimara
Martins, Ramachrisna Teixeira, Astronomia do Fu-
turo
Thiago Signorini Gonçalves
Editor Helio J. Rocha-Pinto
Equipe de colaboradores Hélio Dotto
Perottoni, Mylena Larrubia, Matheus Bernini Reinaldo Rosa expõe o provável cenário
Peron, Douglas Brambila dos de intensa computação que o século XXI
Santos, Maria Luiza Ubaldo de Melo
reserva para a Astronomia.
Contato secsab@sab-astro.org.br
22 Ressonâncias na
Para anunciar Fale com Rosana no email
acima ou ligue (11) 3091-8684,
28 50 anos do Projeto
LION
Presidente
Reinaldo Ramos de Carvalho A história de como astrônomos
Vice-Presidente brasileiros colaboraram com a missão
Helio J. Rocha-Pinto
Apollo é contada por Nelson Travnik.
Secretário-Geral
Ramachrisna Teixeira
32 Amundos
busca por novos
Secretário
Alan Alves Brito
Tesoureira
Lucimara Martins
Endereço
Sociedade Astronômica Brasileira José Dias do Nascimento traça um
Rua do Matão, 1226
interessante histórico acerca das
05508-090 São Paulo – SP
http://www.sab-astro.org.br especulações e da busca por outros mun-
dos.
T
ecnologia de ponta. Essa xilia a expandir nosso conheci-
expressão quase sempre mento sobre as propriedades fí-
acompanha a pesquisa ci- sicas e químicas dos corpos ce-
entífica conduzida atual- lestes e da estrutura e origem do
mente no mundo inteiro Universo. Essa característica, po-
— e isso vale para as ciências rém, é recente. Séculos atrás, as
naturais de forma geral e para a ferramentas utilizadas no estudo
Astronomia em particular. Teles- do céu eram muito mais simples.
cópios espaciais, sondas interpla- Da mesma forma, as questões le-
netárias, detectores de ondas gra- vantadas pela comunidade cien-
vitacionais: todo um arsenal de tífica eram outras, mais simples
equipamentos modernos nos au- mas não menos importantes. E as
Acima
realizar tais medidas deveria, pre- tais recursos não foi difícil, uma Louis Godin, primeiro à
ferencialmente, deslocar-se para vez que a expedição também faria esquerda, foi o idealizador
regiões extremas — o mais pró- medições das latitudes e longitu- da Missão Geodésica, na
ximo possível tanto do equador des locais nas regiões a serem ex- qual foi acompanhado por
Bouger (no meio) e
quanto de um dos polos geográ- ploradas, gerando melhorias nos Condamine (à direita).
ficos. Em cada locação, deveria mapas de navegação. O planeja-
definir um percurso na direção mento da expedição foi realizado
norte–sul que se estendesse por ao longo de 1734 e se converteu
vários quilômetros em latitude, e em um par de expedições: uma
comparar a movimentação apa- missão secundária, franco-sueca,
rente do céu entre os dois extre- até a fronteira entre a Finlândia e
mos desse percurso. Essa movi- a Suécia, chamada missão polar, e
mentação aparente celeste pode- uma missão principal para a A-
ria ser medida através da diferen- mérica do Sul, na região da então
ça nas alturas máximas de uma Audiência de Quito, o atual Equa-
mesma estrela entre as duas lati- dor — a chamada Missão Geodé-
tudes. Finalmente, restaria medir sica. Uma vez que a Audiência de
a distância em Terra entre os dois Quito era território espanhol, a
pontos extremos de observação. Missão Geodésica se converteu em
Tudo isso estava na cabeça do uma missão conjunta franco-es-
astrônomo francês Louis Godin panhola. A equipe da Missão
quando, em dezembro de 1733, Geodésica foi composta pelos as-
propôs à Academia de Ciências trônomos Louis Godin e Pierre
Francesa uma expedição à Amé- Bouguer, o geógrafo e matemáti-
rica do Sul visando estimar o raio co Charles Marie de La Condami-
de curvatura terrestre naquela re- ne, além de instrumentadores e
gião. A Academia aprovou a expe- geógrafos franceses e espanhóis,
dição e se dedicou a angariar fun- carregando uma carga conside-
dos para financiá-la. Conseguir rável em telescópios e outros ins-
Acima
ram Quito de Cuenca. Para medir tremo, as alturas extremas dos pi-
Um pequeno trecho da
as posições relativas das monta- cos escolhidos submeteram os região explorada pela
nhas, os membros da equipe ins- membros da equipe à baixa oxi- Missão Geodésica,
talavam bandeiras, fogueiras ou genação sanguínea, um fenômeno mostrando algumas das
montanhas que foram
quaisquer outros elementos de que até então desconheciam. Le-
usadas para a triangulação
destaque, e mediam a direção em tárgicos, estavam ainda sujeitos da distância entre Quito e
que esse elemento deveria ser ob- às frequentes chuvas e neblina Cuenca.
servado a partir de outras monta- que encobriam as montanhas e
nhas. A equipe acreditava que, na atrasavam a realização das ob-
ausência de contratempos, esse servações, além da destruição re-
trabalho estaria completo em a- alizada pelos fortes ventos e pe-
penas alguns meses — mas os los animais selvagens sobre os
contratempos, particularmente pontos de fumaça utilizados co-
em uma missão tão complexa e mo marcadores das posições de
audaciosa como esta, logo come- referência ideais nas diferentes
çaram a aparecer. Além de expos- montanhas. Todos esses proble-
tos a diversas doenças tropicais, mas produziram um enorme a-
como a malária, seus gastos finan- traso no cronograma original: as
ceiros se mostraram muito supe- medidas somente foram concluí-
riores aos estimados no início da das em 1739, quatro anos após o
Missão, de forma que os fundos começo da expedição.
se esgotaram rapidamente, obri- Finda essa etapa, bastava deter-
gando os astrônomos a investi- minar as latitudes relativas dos
rem seus próprios recursos. Gran- dois extremos da linha — Quito e
de parte do trabalho era executa- Cuenca. Então, novos problemas
do nas montanhas, durante vários passaram a assombrar a equipe.
dias consecutivos; além do frio ex- No mesmo ano, se inicia a Guer-
Astronomia do Futuro
Ciência de Dados e Tecnologia da Informação
Cada vez mais as grandes descobertas em Astronomia requerem manipular e
analisar gigantescos cubos de dados (Data Cubes), o que implica uma nova
forma de fazer ciência.
D
e acordo com alguns im- dos (trata-se do quarto paradig-
portantes cientistas con- ma reconhecido pela comunida-
temporâneos, a ciência no de científica como Data-Intensive
Século XXI está vivenci- Scientific Discovery ou, simples-
ando uma nova mudan- mente, Data Science).
ça de paradigma. Este no- A emergência deste novo para-
vo paradigma sugere que as pró- digma foi anunciada, por volta
ximas mais importantes desco- de 2010, por James Nicholas Gray,
bertas científicas estão (e estarão cientista da computação laurea-
cada vez mais) fortemente condi- do com o prêmio Alan Turing, um
cionadas ao uso intensivo de da- dos mais importantes da área. A
Reinaldo Rosa
Inst. Nac. de Pesquisas Espaciais
reinaldo.rosa@inpe.br
As ressonâncias
e o fascinante caso da galáxia NGC 7020
As ressonâncias são responsáveis pelo aparecimento de curiosos e,
frequentemente, inusitados fenômenos orbitais. Na Astronomia, elas são
encontradas desde escalas subplanetárias até galácticas.
A
natureza mostra oscila- ça externa, que tem uma frequê-
ções e vibrações em todos ncia regular, interage com a fre-
os níveis e dimensões. quência elástica, interna, restituti-
As copas das arvores os- va de um objeto para causar uma
cilam sob a ação dos ven- falha. O exemplo clássico disso é
tos. Estruturas que parecem rígi- o copo de cristal que se quebra
das, como prédios e pontes, têm quando o canto atinge sua fre-
frequências próprias de oscilação quência ressonante. As duas auto-
que podem ser ativadas em cir- frequências interagem e podem
cunstâncias especiais por ventos causar uma deformação plástica
ou outras perturbações. Quando is- permanente.
to acontece se diz que o sistema Filmes e livros de física de am-
entrou em ressonância. pla difusão citam o caso da ponte
A ressonância é um fenômeno pênsil de Tacoma Narrows, no
físico que ocorre quando uma for- Estado de Washington, USA, que
Rubén Díaz
Gemini Observatory
rdiaz@gemini.edu
O
Programa LION — "Lu- ciam na superfície do nosso saté-
nar International Ob- lite. A justificativa para tais ob-
servers Network” — do servaçõs era óbvia: os astronau-
JPL/NASA e Smithsonian tas, quando em solo lunar, não
Institute, foi criado em poderiam correr risco de depa-
1968, em apoio ao Projeto Apol- rar-se com eventuais e inespera-
lo, quando a Dr.a Barbara Mid- dos fenômenos, cuja causa sequer
dlehurst, da Universidade do Ari- tinha à época uma explicação sa-
zona, visitou vários países soli- tisfatória. Isso ficou patente quan-
citando colaboração para obser- do, em julho de 1968, a NASA pu-
vações durante o Projeto Apollo blicou o excelente Chronological
dos chamados TLPs, “Transient Catalog of Reported Lunar Events
Lunar Phenomena”, que aconte- da própria Barbara Middlehurst,
negativa. Se confirmássemos a o-
corrência de algum TLP, a obser-
vação seria relatada como posi-
tiva. O modelo dos gabaritos de
observação fornecidos pela NASA
eram preenchidos e a ela envia-
dos. Todas as observações brasi-
leiras de TLPs como de outros pa-
íses foram publicadas pelo Smith-
sonian Institution Center for Short-
-lived Phenomena. O exame des-
sas publicações mostrou que na
participação de 13 países, o Bra-
sil ao lado dos Estados Unidos, foi
o país com o maior número de
observadores e registro de TLP.
Resultados
Ao final do Programa, no dia
Acima registros concentrou-se em aci- 18/11/1971, o coordenador, Ro-
Imagem da Lua, com
dentes que apresentaram brilho naldo Mourão, enviou oficio ao
destaque para os três sítios
onde ocorreram os anormal, sugerindo a presença de Observatório Astronômico Flam-
principais eventos lunares materiais luminescentes ou fosfo- marion de Matias Barbosa, MG, a
observados pelos rescentes. As normas estabeleci- mim dirigido, solicitando a elabo-
brasileiros membros do
das no Programa LION era que as ração de um levantamento e re-
Programa LION.
observações dos acidentes sele- latório das três observações mais
cionados contivessem um relato importantes que tínhamos feito.
minucioso da observação. No ca- Juntamente com meu colega Ser-
so de nada ser constatado, era gio Vianna, empreendemos a difícil
preciso relatar como observação tarefa de compilar os resultados
Os eventos lunares
nos dias atuais
Passada a euforia da
conquista lunar e o encer-
ramento do Programa LION,
as observações lunares de-
cresceram bastante. Contu-
do, nos últimos anos, face
o interesse das grandes na-
ções em instalar bases lu-
nares, o monitoramento de
nosso satélite foi retomado, espe- mente, um clarão enorme de um Acima
cialmente devido ao grande nú- impacto na Lua sugeriu que o me- Região da superfície lunar
que destaca as crateras
mero de impactos de meteorói- teoróide poderia ter algo ao redor
Alphonsus, Ptolemaeus e Al-
des que vem sendo registrados. de 400 quilos; o que seria mais do bategnius. A cratera
Nos anos 2011 e 2012, somente a que suficiente para destruir uma Alphonsus, além de chamar
NASA flagrou 61 impactos. Astrô- base lunar! • a atenção por ter uma base
bastante fraturada, é
nomos amadores utilizando lon- famosa por apresentar
gas filmagens com câmeras com Nelson Travnik
fenômenos lunares
sensores CCD, têm conseguido Observ. Astron. de Piracicaba transientes. (Crédito: LRO/
nelson-travnik@hotmail.com NASA).
também registrar muitos impac-
tos. Esses registros estão intima-
mente ligados à segurança das
futuras bases e já vem sendo so-
licitados pelas agências espaciais
dos países envolvidos. Recente-
Exoplanetas
e a busca por novos mundos
Já há séculos a humanidade vem especulando acerca da existência de outros
mundos. Atualmente, estamos vivendo a era em que eles enfim começam a ser
descobertos!
planeta em sua órbita, essa mas- mais de 150000 estrelas, e foi ca-
sa adicional aumenta a amplia- paz de detectar mundos do ta-
ção do brilho de maneira reve- manho da Terra em órbita nas
ladora. zonas habitáveis de estrelas do tipo
O método de trânsito, outra téc- solar. O sucessor do Kepler foi o
nica popular, procura pela dimi- satélite TESS (Transiting Exoplanet
nuição periódica no brilho de uma Survey Satellite).
estrela quando um planeta pas- TESS foi lançado em 18 de abril
sa em órbita à frente da estrela, de 2018 no topo de um foguete
eclipsando-a quando vista a par- Falcon. Este satélite é, também,
tir da Terra. Ao medir o tempo um telescópio espacial e faz parte
entre dois eclipses, podemos esti- do programa Explorers, da NASA.
mar as órbitas e as massas de Foi projetado para procurar exo-
seus planetas, além da tempera- planetas usando o método de trân-
tura da superfície. sito em uma área 400 vezes maior
Alguns satélites espe- que a coberta pela missão Kepler.
cializados foram construí- Os principais alvos da missão
dos para operar esta téc- TESS são as estrelas mais bri-
nica. Entre 2006 e 2013, lhantes, que também são as mais
o satélite CoRoT obser- próximas da Terra. TESS é lidera-
vou milhares de estre- do pelo Massachusetts Institute of
las. CoRoT (sigla em fran- Technology (MIT) e conta com
cês para Convecção, Ro- financiamento inicial da Google.
tação e Trânsito) foi u- Seus dados nos permitirão saber
ma missão baseada em mais sobre massa, tamanho, den-
um telescópio espacial sidade e órbita de um grande nú-
com dois objetivos: pro- mero de pequenos planetas, in-
curar por planetas ex- cluindo uma amostra de planetas
trassolares com períodos rochosos nas zonas habitáveis de
orbitais curtos, particu- suas estrelas hospedeiras. Ele
larmente os de tamanho também indicará quais são as es-
terrestre, e realizar me- trelas mais interessantes para uma
dições sobre oscilações posterior caracterização detalha-
Acima estelares. Essa missão foi lidera- da das atmosferas de seus exopla-
Primeira página da edição da pela Agência Espacial Francesa netas descobertos, que será reali-
de 1701 do livro de Bernard
(CNES), em conjunto com a Agência zada pelo Telescópio Espacial Ja-
le Bovier de Fontenelle
Entretiens sur pluralité des Espacial Europeia (ESA), além de mes Webb, bem como por outros
mondes. outros parceiros internacionais, grandes telescópios terrestres e es-
entre os quais o Brasil. Em 2009, paciais do futuro.
a missão Kepler da NASA usou o Para a próxima década, os eu-
método de trânsito para encon- ropeus preparam a missão PLATO
trar exoplanetas. Ela monitorou (PLAnetary Transits and Oscillat-
Ao lado
Representação artística do
telescópio TESS em órbita
da Terra (Crédito: NASA).
Acima à direita
NGC 248, a "Nebulosa Papai
Noel" (Crédito: NASA, ESA,
STScI, K. Sandstrom e
SMIDGE team).
Acima
Aglomerado aberto M 44,
conhecido desde a
antiguidade como o
"Presépio" (Crédito: DSS2/
Giuseppe Donatiello).
GALERIA
Alguns objetos astronômicos foram popularmente nomeados com referências natalinas
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