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Afasias: Considerações acerca do processo de reabilitação

Leisen Ferreira da Silva1


Ariella Fornachari Ribeiro Belan2

Resumo
A Afasia é um distúrbio de linguagem que afeta as habilidades de compreensão e emissão oral
e /ou gráfica. Este distúrbio afeta não apenas a comunicação do sujeito acometido, mas
também seu estado psíquico. Portanto, a reabilitação deve contemplar uma equipe
multidisciplinar, que atenda o indivíduo em todos os âmbitos de sua vida. Diante disso, esta
revisão de literatura tem como objetivo apresentar uma caracterização global da afasia e
discutir os aspectos principais dos componentes envolvidos no processo de reabilitação. A
análise dos estudos demonstrou que um tratamento precoce, juntamente com uma equipe
multidisciplinar é de suma importância para a reabilitação desse paciente, que visa recuperar a
fala ou parte dela, recuperar parte de suas atividades de vida diária, bem como recupera-se
emocionalmente, de modo que o paciente posso ser inserido novamente no seu meio social.

Palavras-chave: Afasia; linguagem; reabilitação.

___________________________________________________________________________
1
Psicóloga, Pós-graduanda do curso de pós graduação em Neuropsicologia do Censupeg (Centro
nacional de ensino superior, pesquisa, extensão, graduação e pós graduação.
2
Fonoaudióloga, especialização em Neurolinguística pela USP, doutorado em neurologia pela USP,
pós doutorado em neuropsiquiatria pela USP.
1. INTRODUÇÃO
A linguagem pode ser definida como um sistema convencional de símbolos que são
ajustados de modo sistemático para registrar e trocar informações (DUARTE et al., 2011).
Essa função mental possibilita a comunicação e a interação entre indivíduos, permitindo uma
atividade cognitiva e uma ação comunicativa que garantem às pessoas um papel ativo da
sociedade. Portanto, quando um indivíduo apresenta um distúrbio ou uma patologia que afeta
a linguagem, esta dificuldade pode acarretar prejuízos em sua vida social, profissional,
emocional e pessoal. (SILVA; CINTRA, 2010).
Entre as patologias que podem afetar a linguagem, destaca-se a afasia. A afasia é uma
alteração de linguagem, decorrente de um dano neurológico, gerando aos indivíduos
acometidos consequências social, emocionais e pessoais. O déficit de linguagem gera um
isolamento do sujeito afásico diante de sua família e da sociedade. Consequentemente, este
indivíduo dificilmente retoma as relações sociais que tinha antes da doença (NASCIMENTO,
2015).
GONDIM et al. (2012) ressaltam que esta patologia é considerada uma das disfunções
neurológicas mais comuns, após lesão focal adquirida no sistema nervoso central (SNC), em
áreas relacionadas à linguagem. Em crianças, são causadas principalmente por traumas
cranioencefálicos (TCE) e, em adultos por acidente vascular encefálico (AVE). Em 20% dos
casos, não há explicação do ponto de vista anatomoclínico.
Visto que os processos linguísticos são construídos através das relações socioculturais
e que o fortalecimento da autoconfiança e autoestima está associado ao modo que o indivíduo
interpreta as coisas ao seu redor, a qualidade das interações mantidas pelos afásicos fazem
grande diferença em seu processo de reabilitação linguística e de reinserção social
(PANHOCA; PUPO, 2010).
Com a afasia, perde-se um importante instrumento da subjetividade humana, a
linguagem. Tendo em vista que a linguagem é a forma de comunicação mais eficiente, sua
perda ocasiona no indivíduo uma limitação, não apenas na sua capacidade de compreender ou
de se expressar, mas também em seu estado psíquico. Logo, no tratamento do afásico, de
caráter interdisciplinar, a neuropsicologia possui um papel importante na reabilitação deste
sujeito. Nesse contexto, esta revisão de literatura tem como objetivo apresentar uma
caracterização global da afasia, principalmente no âmbito da reabilitação do paciente.
Para isso, foi realizado um levantamento bibliográfico, nas bases de dados da
Scientific Electronic Library Online (SciELO), Medline, Google Acadêmico e Literatura
Latino – Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), selecionando as
publicações dos últimos 10 anos (período de 2006 a 2016). Foram selecionados os artigos que
continham o assunto voltado para temática estudada, ou seja, que focavam a reabilitação do
paciente afásico ou apresentavam algum método de intervenção da linguagem oral em
pacientes afásicos. Foram excluídas pesquisas referentes à reabilitação de linguagem em
crianças; em bilíngues; em outras patologias que não as afasias expressivas e; estudos
referentes à terapia não cognitiva, tais como tratamento medicamentoso, intervenção
neurocirúrgica e de estimulação transcraniana.

2. AFASIAS
Conforme o Ministério da Saúde (2012, p.37):
As afasias são distúrbios que afetam os aspectos de conteúdo, forma e
uso da linguagem oral e escrita, em relação à sua expressão e/ ou
compreensão, como consequência de uma lesão cerebral; envolve os
processos centrais de significação, seleção de palavras e formulação
de mensagens. Este distúrbio é observado na expressão de símbolos
por meio da comunicação oral, escrita (dislexias e agrafias
adquiridas) ou gestual, tratando-se de uma dificuldade do paciente
em lidar com elementos linguísticos.

As afasias podem ser classificadas de acordo com alguns critérios.


DUARTE et al. (2011) classificam as afasias como: i) corticais (Broca, Wernicke,
condução, transcorticais sensorial e motora, anômica e global) e; ii) sub corticais (afasias
capsulares anterior, posterior e global e talâmica), conforme a tabela 1.
Tabela 1 – Tipos de afasias
Tipos de Afasias Fluência Compreensão Nomeação Repetição
Wernicke Fluente Alterada Alterada Alterada
Transcortical Fluente Alterada Alterada Normal
sensorial
Condução Fluente Normal Alterada Alterada
Anómica Fluente Normal Alterada Normal
Global Não fluente Alterada Alterada Alterada
Broca Não fluente Normal Alterada Alterada
Transcortical Não fluente Normal Alterada Normal
motora
Fonte: Adaptado de DUARTE et al. (2011).

Para GONDIM et al. (2012), a afasia é classificada de acordo com a área cerebral
relacionada à linguagem: área de Wernicke (parte posterior do sulco lateral (Sylvius), área de
Heschl (giro temporal transverso anterior) e área de Broca (giro frontal inferior).
Já SOUSA (2010), aponta três categorias essenciais de afasias: não-fluentes, fluentes e
global.
As afasias mais conhecidas, no âmbito multidisciplinar, são a afasia de Broca e afasia
de Wernicke.
A afasia de Broca é uma afasia emissiva, onde ocorre uma falha nos centros
neurológicos vinculados à coordenação dos movimentos responsáveis pela emissão dos sons
para comunicação. Sendo assim, o paciente é impossibilitado de executar tais movimentos.
Além disso, a utilização da linguagem é limitada, devido ao vocabulário reduzido, o indivíduo
possui dificuldade de forma frases gramaticalmente corretas, utiliza jargões e a fala pode ser
telegráfica, com predominância de morfemas lexicais. A escrita também é comprometida,
embora esse sujeito seja capaz de efetuar a leitura silenciosa, e a realização de cálculos torna-
se uma atividade difícil (AGUIAR; ACIOLE; MELO, 2007).
Na afasia de Wernicke, a fluência não está prejudicada, mas existe problemas na
compreensão e na repetição de palavras. Ressalta-se também que as parafasias verbais e
neologismos são frequentes (GONDIM et al., 2012).
O diagnóstico da Afasia é realizado a partir da aplicação de testes formais
padronizados com o intuito de avaliar o distúrbio da linguagem e questionários que sejam
hábeis a recolher informações de familiares, dados médicos e outros dados que sejam
pertinentes para um correto diagnóstico e prognóstico do caso (SOUSA, 2010). Entre os testes
presentes na avaliação estão: nomeação, fluência do discurso, compreensão auditiva de
material verbal e repetição.
Os principais protocolos citados para avaliação das afasias são: a Western Aphasia
Battery (KERTEZ, 1982), a Boston Diagnostic Aphasia Examination (KAPLAN, 1983),
Bateria de Avaliação da Afasia de Lisboa (BAAL) (DAMÁSIO,1973) e A Bateria Montreal-
Toulouse de Avaliação da Linguagem (Bateria MTL-BR) (FONSECA el al., 2016). A
Bateria MTL-BR é o instrumento mais recente, adaptado e amplamente revisado e
reformulado do Francês para o Português Brasileiro para avaliar o funcionamento de
diferentes componentes de linguagem oral e escrita, de praxias e de calculias, após lesão
cerebral.

3. REABILITAÇÃO DAS AFASIAS


Os pacientes com afasias necessitam de uma abordagem multidisciplinar com
profissionais especializados em neurologia, fonoaudiologia, neuropsicologia, fisioterapia e
terapia ocupacional, que promovam um tratamento holístico, integrado e personalizado.
Nos casos em que há predomínio de comprometimento de linguagem, o processo de
reabilitação envolve a presença de um fonoaudiólogo, que visará a recuperação da
comunicação do indivíduo, levando-se em consideração seus limites e sua condição física e
mental (DUARTE, 2011). O terapeuta tem como finalidade proporcionar o acesso à
linguagem de seu paciente. Para isso, “faz-se necessário estar dentro da linguagem, nos seus
usos, na sua questão social e interacional”. Dessa forma, a terapia tem a finalidade de
reconstruir a linguagem do indivíduo (SILVA; CINTRA, 2010).
Sabe-se que a terapia de fala, possui um efeito positivo sobre a recuperação do
paciente. Além disso, autores relatam que, quando o paciente é mais jovem, a recuperação
será mais rápida (DUARTE et al, 2011).
O tratamento psicoterápico é indicado para os pacientes que apresentam
comprometimento emocional e/ou social e os auxiliarão a lidar com sua nova condição de
vida. E a reabilitação neuropsicológica tem o propósito de reabilitar as demais funções
cognitivas (memória, atenção, função executiva e habilidades visuoespaciais), que
frequentemente estão associadas às afasias (PATRICIO; SANTOS, 2009; BONINI, 2010).
FERNANDES (2009) afirma que a reabilitação cognitiva tem permitido a recuperação
dos déficits cognitivos e funcionais do paciente com AVE, visto que essa reabilitação instaura
ações que melhoram a competência do paciente em diferentes situações, promovendo uma
recuperação mais plena.
Adicionalmente, SOUSA (2010) ressalta a importância da neuropsicologia moderna
em “ultrapassar este paradoxo que consiste em, apesar de provas contrárias, haver grandes
resistências ao abandono dos tais esquemas das formas básicas de afasia”. O mesmo autor
afirma que a primeira tarefa da neuropsicologia consistiu em descrever cuidadosamente os
distúrbios de discurso associados a lesões cerebrais locais e em enumerar os sintomas e
fatores presentes.
Cumpre lembrar que a etiologia da afasia é um fator importante para um prognóstico
eficaz, visto que as afasias devido a AVE ou de tumores intracranianos possuem pior
prognóstico, além de acarretar impacto negativo na vida da pessoa, pois além de afetar a
linguagem, pode interferir nos processos relacionados, como a vida prática e as relações
sociais, afetivas, interativas e interpretativas (BAHIA; CHUN, 2014).
SOUSA (2010) relata 8 métodos de terapia da afasia proposto por Howard e Hatfield,
em 1987, descritos no quadro 1:

Quadro 1 - Tipos de terapia da afasia


Métodos Descrição
Método didático A linguagem é re-ensinada com base em métodos práticos
fundamentados no senso comum, na intuição clínica e nos
padrões tradicionais do ensino da leitura, escrita e
gramática nas escolas.
Método de modificação do Baseia-se também na reaprendizagem da linguagem e é
comportamento influenciado pelo Behaviorismo.
Método da estimulação Desenvolvido nos EUA nos anos 40-50 por Wepman e
Schuell. O foco de atenção reside na criação de uma
estimulação adequada que permita ao afásico.
Método de reorganização Fundamenta-se nos modelos de Luria, defendendo que as
funcional faculdades cognitivas dependem de certas unidades semi-
independentes que são desorganizadas por uma lesão
cerebral, perdendo a sua função ou a ligação funcional.
Método pragmático Defende que o tratamento deve basear-se na criação de
alternativas de comunicação.
Método neo-clássico Baseia-se na utilização das capacidades preservadas para
aceder às capacidades linguísticas alteradas e inacessíveis.
Método neurolinguístico Segue o modelo descritivo das alterações gramaticais da
afasia, sobretudo os aspectos lexicais e sintáticos.
Método da Neuropsicologia Centram-se nos desempenhos dos afásicos, interessando-se
Cognitiva mais pelo caso individual que pelo estudo das casuísticas
extensas.
Fonte: SOUSA (2010).

Os resultados da terapia em afásicos, contudo, não são imediatos, podendo demorar


semanas, meses ou anos. Logo, o prognóstico dependerá dos seguintes fatores: fatores
associados à lesão (origem, topografia, extensão), fatores ligados às características da afasia
(cronologia da evolução, tipo de afasia, sintomas) e fatores propensos à doença afásica (idade,
comorbidades) (SOUSA, 2010).
A melhora inicial é, em sua maioria, devida aos processos neurofisiológicos,
principalmente com a atuação do hemisfério direito. As estratégias de exposição à linguagem
e as práticas desenvolvidas pelo paciente são responsáveis por grande parte da recuperação
tardia. A avaliação busca identificar os sintomas linguísticos presentes no paciente, enquanto
a terapia busca auxílio na superação das dificuldades de comunicação, tornando-a funcional e
tendo como metas manter o paciente verbalmente ativo, orientar a família a comunicar-se com
o paciente e administrar estratégias para melhorar a linguagem. As variáveis clínicas e
psicossociais devem ser levadas em consideração durante o tratamento, sendo a localização da
lesão o fator que mais influi no prognóstico de recuperação da afasia (DUARTE et al., 2011).
Nesse sentido, Liechty e Garber (2004 apud SOUSA, 2010, 18) citam três regras
básicas para terapia ter sucesso com indivíduos afásicos:
Fechar a porta – o indivíduo afásico necessita de toda a atenção, não
devendo haver precipitações. É necessário saber ouvir e esperar pela
resposta;
Desligar a televisão – é fulcral que o afásico se concentre na
conversação, visto que tentar decodificar várias mensagens
simultaneamente pode tornar a tarefa ainda mais difícil;
Elogiar as palavras proferidas – para muitos afásicos é uma vitória
dizer uma só palavra, portanto, o elogio pode preencher os espaços
que parecem vazios, no discurso do sujeito.
A família é outro importante aspecto na recuperação e reabilitação do paciente afásico.
Entretanto, na literatura pesquisada, verificou-se que muitos dos sujeitos afásicos evitam
situações de comunicação, pela dificuldade de linguagem, até mesmo com os familiares, visto
que muitos se isolam e este mecanismo de defesa tem como objetivo evitar situações difíceis
para a pessoa.
GIULIO e CHUN (2014) investigaram, na perspectiva de 18 familiares, aspectos da
linguagem e do impacto da afasia nas relações de comunicação entre a pessoa afásica e seu
cuidador/familiar. Os resultados demonstraram que as dificuldades de linguagem influenciam
diretamente na relação com seus familiares e modificam, na maioria das vezes, a rotina do
cuidador. Além disso, muitas vezes são criadas entre os cuidadores e o sujeito afásico formas
próprias de comunicação. Os autores afirmam ainda que os familiares devem se adaptar para
favorecer a comunicação do indivíduo afásico, visto que eles acabam tornando-se um dos
principais interlocutores desse sujeito. Com relação ao cuidador, este muitas vezes, possui o
papel de “intérprete e mediador” entre a pessoa sob seus cuidados e o mundo externo.
No estudo de MATOS (2012), com pessoas com afasia, seus familiares/amigos e
terapeutas da fala, o autor verificou a existência de um consenso entre os 3 grupos em relação
às categorias mais afetadas nos pacientes afásicos: (1) Interações e Relacionamentos Pessoais;
(2) Vida Comunitária Social e Cívica, principalmente nas atividades de Recreação e Lazer;
(3) Áreas Principais da Vida, principalmente Trabalho e Emprego e Vida Econômica. Os
resultados demonstraram que as consequências no nível da comunicação são ressaltadas
apenas pelos os pacientes e os terapeutas da fala. O autor justifica este fato pelo fato dos
familiares/amigos se centrarem na finalidade da comunicação em si, uma vez que terá mais
impacto durante a interação que estabelece com a pessoa com afasia, do que no próprio
processo de comunicar.
RAMOS (2013) afirma que o apoio familiar desempenha um papel determinante para
a participação do indivíduo na comunicação. O autor demonstra no Quadro 2, os estádios da
recuperação e reabilitação dos pacientes afásicos.
Quadro 2 – Estádios
Fase de Aguda Pós-Aguda Crônica
Recuperação
Tempo de Evolução 0 – 4 semanas 1 – 6 meses > 1 ano
6 meses – 1 ano

Participação social e
consolidação

Terapia específica centrada na


deficiência

Terapia de
ativação
Aconselhamento familiar > Grupos de ajuda
Comunicação aumentativa e alternativa e Tecnologia de apoio
Fonte: RAMOS (2013).

É importante ainda analisar o ambiente na qual está inserido o paciente, visto que as
crenças e atitudes dos familiares são fatores que podem influenciar na terapia. As ações dos
familiares devem ser observadas e relatadas em todas as fases de vida da pessoa com afasia,
uma vez que, “novas mudanças surgem à medida que estes lidam com a evolução do quadro
de afasia, se adaptam ao viver com afasia e se deparam com outros contextos comunicativos”
(RAMOS, 2013, p. 18).
Vale ressaltar que esta temática ainda é pouco conhecida. Nesse sentido, com pouco
conhecimento dos familiares e cuidadores sobre tal tema, a reabilitação do paciente com
afasia pode ser dificultada.
Na pesquisa de NASCIMENTO (2012), em que verificaram o conhecimento da
população do município de Florianópolis sobre as Afasias, os resultados demonstraram que
dos 200 entrevistados, somente 17 (8,5%) pessoas já tinham ouvido falar sobre “Afasia”. A
pesquisa foi realizada em locais de grande circulação, como praças, feiras, centros comerciais
e farmácias. Esses dados indicam que os familiares ou cuidadores de pacientes afásicos vão
necessitar, igualmente, de uma assistência integral e contínua.
SILVA e PATRÍCIO (2010) entrevistaram 07 cuidadores informais de pessoas com
afasia. Estes cuidadores consideraram pertinente a sua participação no processo de
habilitação/reabilitação do seu familiar, em terapia, tendo em conta o impacto da afasia em
suas vidas. Os autores verificaram que antes dos entrevistados participarem da terapia, a
qualidade de vida dos mesmos diminuiu, ocorrendo alterações nos padrões de comunicação,
nos papéis desempenhados e nos seus relacionamentos. Após a inclusão dos mesmos na
terapia, observou-se que os cuidadores passaram a sentir mais motivados para participar no
processo de reabilitação, uma vez que são chamados a colaborar.
CARVALHO et al. (2012) ressaltam ainda que o afásico acaba assumindo uma
posição de incapacidade, logo no processo de reabilitação, portanto, não se deve destacar os
fracassos interlocutivos, mas reconhecer e valorizar as conquistas adquiridas na interação
linguística. Nesse sentido, o profissional deve identificar a forma pela qual ele organizou e
estruturou seus recursos expressivos ou os mecanismos alternativos utilizados para suprir suas
dificuldades.
Portanto, a reabilitação do sujeito afásico deve englobar não só a reabilitação de
linguagem, mas também maximizar a comunicação, independentemente da forma como é
realizada, promovendo a autoestima, autonomia e bem-estar do paciente e principalmente, sua
qualidade de vida e inserção novamente no seu meio social (RAMOS, 2009). Neste sentido, o
psicólogo atua diretamente com o afásico e também com seus familiares, com orientação e
terapia, visando a melhora na qualidade de vida do paciente que, juntamente ao distúrbio
comunicativo, apresenta dificuldades funcionais, ocupacionais, cognitivas e sociais que
limitam sua vida familiar, social, afetiva e profissional.
Ainda no processo de reabilitação, a criação de um ambiente facilitador para o afásico
é de suma importância, pois o mesmo traz alguns benefícios importantes para o paciente
(quadro 3).
Quadro 3 – Vantagens de um ambiente facilitador para o afásico
Fomentar o conhecimento A tomada de consciência e a aprendizagem de estratégias
sobre a afasia e o seu comunicativas levam a mudanças de atitude, alterando as
impacto na comunicação crenças que os parceiros de comunicação têm em relação às
competências da pessoa.
Promover a participação e Permite mudança do comportamento comunicativo do parceiro
formação familiar e de de comunicação, ajustando-se às necessidades e competências
outros parceiros de do afásico; a generalização das estratégias de comunicação a
comunicação situações do quotidiano e; a resolução conjunta de problemas.
Desenvolver medidas que Todos os cidadãos devem ter total e igual acesso à informação
promovam a acessibilidade ou a tomar decisões.
comunicativa e o acesso à
informação
Criar políticas e redes de Promovendo o desenvolvimento de uma identidade e
apoio à pessoa com afasia, à responsabilidade individual e conjunta. Pode enquadrar-se,
sua família e parceiros neste âmbito, desde a formação de voluntários que apoiem os
sociais cuidados, até às políticas de mercado de trabalho e redes de
apoio às entidades empregadoras.
Ampliar a prestação de Promove a compreensão e a expressão da mensagem;
serviços em CAA(1) e TA(2) possibilita que a pessoa com afasia tenha um output vocal
tornando o processo mais genuíno e permite solucionar
incapacidades específicas como a evocação de uma palavra ou
a construção de uma frase, levando a uma menor dependência
do parceiro de comunicação.
Legenda: 1. CAA – Comunicação alternativa e ampliada; 2. TA – Tecnologia de apoio.
Fonte: RAMOS (2009).

Diante do exposto, é importante na terapia, que todos envolvidos, paciente-família-


profissional, trabalhem em conjunto e com isso a reabilitação seja um processo construtivo e
com resultados positivos, ressalta-se que fundamental escutar o familiar ou cuidador,
possibilitando o conhecimento de novas informações, que, muitas vezes, não são oferecidas
pelo sujeito focado pela ação terapêutica (SILVA; CINTRA, 2010).
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
No decorrer do trabalho observou-se que a afasia é uma patologia, cuja manifestação
principal é a perda ou deficiência da linguagem expressiva e/ou receptiva, provocando uma
restrição na comunicação do indivíduo com o mundo exterior.
Nesse contexto, conclui-se que a recuperação e a reabilitação desse paciente, engloba
diferentes abordagens terapêuticas (pragmática, psicolinguísticas, funcionais) cujos objetivos
são recuperar as habilidades comprometidas (comunicação, cognição, locomoção, etc), de
modo que o paciente posso ser inserido novamente no seu meio social.
Portanto, é de suma importante do trabalho da equipe multidisciplinar, visando atender
as necessidades do paciente. Adicionalmente, um tratamento precoce e bem realizado é de
fundamental importância para um bom prognostico na recuperação do sujeito afásico.

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