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Catequese Evangelizadora

Manual de catequética fundamental


Emilio Alberich

Catequese Evangelizadora
Manual de catequética fundamental

Adaptação para o Brasil e a América Latina:


Pe. Dr. Luiz Alves de Lima.
2004 © Emilio Alberich

Revisão: Zeneida Cereja da Silva


Diagramação: Ivy Timo.

Todos os direitos reservados:

EDITORA DOM BOSCO


SHCS CR Quadra 506 Bloco B
Sala 65 Asa Sul 70350-525
Brasília (DF)
Tel.: (61) 3214-2300
www.edbbrasil.org.br
Sumário

Siglas e abreviaturas........................................................................................................................................15

Apresentação da edição brasileira................................................................................................................17

Prólogo...............................................................................................................................................................19

Introdução..........................................................................................................................................................23

A catequética como disciplina..........................................................................................................................23


A catequética, identidade e divisões.....................................................................................................................25
As duas almas da catequética: a teológica e a pedagógica...................................................................................26
A catequética, disciplina teológica..................................................................................................................26
A catequética, disciplina pedagógica.... ..........................................................................................................27
Equilíbrio das tensões.....................................................................................................................................29
Originalidade e especificidade do ato catequético...............................................................................................30
O nosso tratado....................................................................................................................................................31

Capítulo 1
Novos desafios à catequese hoje..................................................................................................................35

1. LUZES E SOMBRAS DA CATEQUESE HOJE.............................................................................................35


1.1 A virada do Concílio.................................................................................................................................35
1.2 A situação: fatos positivos.........................................................................................................................37
1.3 Um sistema em crise..................................................................................................................................37
1.3.1 Crise e falência do processo tradicional de iniciação cristã e da socialização
religiosa na família e na escola. ..............................................................................................................38
1.3.2 Crise da pastoral sacramental..........................................................................................................39
1.3.3 Precariedade da catequese para adultos...........................................................................................39
1.3.4 Separação entre fé e cultura e crise da linguagem catequética...........................................................40
1.3.5 Formação insuficiente dos catequistas, dos agentes pastorais, dos sacerdotes...................................40
2. EM BUSCA DOS PORQUÊS..........................................................................................................................41
2.1 Fatores socioculturais, políticos, econômicos............................................................................................41
2.2 Transformações e ambiguidades do fato religioso....................................................................................42
2.2.1 Em uma sociedade secularizada: a religião como realidade desprezada............................................43
2.2.2 Numa sociedade pluralista: a religião, uma opção entre muitas........................................................44
2.2.3 Diante da crise das instituições e das Igrejas: a religião oficial com pouca credibilidade...................45
2.2.4 Na cultura pós-moderna: a religião, experiência efêmera .................................................................46
2.2.5 Separação entre fé e vida, fé e cultura: religião insignificante ..........................................................46
2.2.6 Na sociedade midiática: a religião, realidade fluida, virtual, fragmentária, realidade-espetáculo......48
3. RESPOSTAS PASTORAIS.............................................................................................................................49
3.1 Algumas palavras de ordem.....................................................................................................................49
3.2 Atitudes pastorais inadequadas...............................................................................................................50
3.2.1 Distância cultural e rotina pastoral..............................................................................................50
3.2.2 Demonização do mundo e da cultura................................................................................................50
3.3 Por uma pastoral aberta ao futuro.................................................................................................................51
SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS.....................................................................................................................52

Capítulo 2
A catequese em um renovado projeto pastoral de evangelização.........................................................55

1. UM QUADRO ARTICULADO DE AÇÃO PASTORAL..............................................................................55


1.1 O compromisso fundamental e objetivo final da ação eclesial:
no mundo para o mundo, a serviço do Reino de De (primeiro nível) .............................................58
1.2 Funções ou mediações eclesiais a serviço do Reino de Deus: os inai evangelizadores
( ) (segundo nível) ........................................................................ .......59
1. Formas e âmbitos principais do processo evangelizador:
ação missionária, ação catecumenal, ação pastoral , presença e ação no mundo (terceiro nível)........ ....64
1. Agentes e condicionamentos pessoais e institucionais da práxis eclesial:
ministérios, estruturas, instituições (quarto nível) .......................................................................................66
2. UM ESTILO OPERATIVO SEM FUTURO: A PASTORAL TRADICIONAL ............................ .........67
2.1 Primado da atividade devocional e sacramental.......................................................................................68
2.2 Retorno à pastoral intraeclesial e centrípeta.............................................................................................68
2.3 Polarização clerical e peso institucional..... ..............................................................................................69
2.4 Eclesiocentrismo e autossuficiência...........................................................................................................70
3. RUMO A UM PROJETO PASTORAL CENTRADO NA EVANGELIZAÇÃO...........................................71
3.1 No mundo e para o mundo a serviço do Reino (superação do viés eclesiocêntrico) ................................72
3.2 Reequilíbrio dos sinais evangelizadores (superação da polarização sacramental e devocional).........73
3.2.1 A diaconia eclesial como sinal que deve ser privilegiado....................................................................73
3.2.2 Rumo a uma Igreja-comunhão numa comunhão de Igrejas.................................................................74
3.2.3 Diálogo cultural no anúncio e na celebração.....................................................................................74
3.3 Restabelecimento da integridade do processo evangelizador
(superação da concentração intraeclesial) ....................................................................................................75
3.4 Predomínio na Igreja da dimensão carismática sobre a institucional
e desejo de reforma (superação do clericalismo e do peso institucional) ....................................................76
SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS.....................................................................................................................78

Capítulo 3
A catequese hoje: identidade, significado, tendências.............................................................................81
1. A CATEQUESE EM BUSCA DE SUA IDENTIDADE..................................................................................81
1.1 Na idade moderna: o ensino do catecismo................................................................................................81
1.2 Movimento catequético pré-conciliar: do catecismo à catequese ....................................................82
1.2.1 Impacto pedagógico..........................................................................................................................83
1.2.2 Impacto litúrgico...............................................................................................................................84
1.2.3 Impacto teológico-pastoral................................................................................................................84
1.3 A virada do Vaticano II: revisão global da catequese...............................................................................85
1.4 Contribuição do magistério catequético....................................................................................................86
1.5 Necessidade de um esclarecimento............................................................................................................86
2. A CATEQUESE NO PROCESSO DE EVANGELIZAÇÃO:
IDENTIDADE E PERSPECTIVAS....................................................................................................................87
2.1 Evangelização: sentido de um termo.........................................................................................................87
2.1.1 No Novo Testamento........................................................................................................................88
2.1.2 No Concílio Vaticano II....................................................................................................................88
2.1.3 No pós-concílio.................................................................................................................................89
2.2 A catequese no ministério da palavra.......................................................................................................90
2.2.1 As diversas formas do ministério da palavra......................................................................................90
2.2.2 Testemunho bíblico e histórico..........................................................................................................91
2.3 Identidade da catequese............................................................................................................................92
2.3.1 Que vem a ser a catequese? ............................................................................................................93
2.3.2 Algumas distinções e opções prioritárias...........................................................................................94
3. ELUCIDAÇÃO TERMINOLÓGICA............................................................................................................96
3.1 Terminologia relativa à catequese (de katechein : fazer ressoar) .....................................................96
3.2 Terminologia relativa à f ....................................................................................................................97
3.3 Terminologia relativa à religião : catequese e educação religiosa..........................................................97
4. O SIGNIFICADO DA OPÇÃO PELA CATEQUESE PARA O FUTURO DA IGREJA..............................99
SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS...................................................................................................................101

Capítulo 4
A catequese, serviço da palavra, anúncio de Cristo................................................................................103

1. CATEQUESE E MINISTÉRIO DA PALAVRA: PROBLEMAS EM ABERTO.........................................103


1.1 Catequese e palavra de Deus...................................................................................................................103
1.2 Catequese antropológica, situacional? ...................................................................................................104
1.3 Catequese inculturada...........................................................................................................................105
1.4 O imperativo da verdade na catequese...................................................................................................105
1.5 Catequese experiencial............................................................................................................................106
2. A PALAVRA DE DEUS REVELADA EM JESUS CRISTO
NO CORAÇÃO DA CATEQUESE...................................................................................................................107
2.1 Jesus Cristo, palavra encarnada de Deus,
centro e vértice da revelação (dimensão cristocêntrica e pessoal da palavra de Deus) .......................108
2.1.1 Jesus Cristo, palavra suprema e significativa................................................................................108
2.1.2 O anúncio de Cristo na catequese.......................................................................................................109
2.2 A palavra de Deus, mensagem de salvação para o ser humano
(caráter significativo e libertador da palavra de Deus) ...............................................................................112
2.2.1 Propte no homine ..................................................................................................................113
2.2.2 Catequese significativa....................................................................................................................114
2.3 A palavra de Deus, encarnada na história
(dimensão narrativa e dialogal da palavra de Deus) ...................................................................................116
2.3.1 Palavra como história.....................................................................................................................116
2.3.2 Catequese narrativa........................................................................................................................117
2.4 A palavra de Deus, dom do Espírito de Cristo
(dimensão carismática e profética da palavra de Deus)....................................................................................118
2.4.1 O Espírito e a Palavra.....................................................................................................................120
2.4.2 Catequese no Espírito......................................................................................................................118
2.5 A palavra de Deus, palavra dada e prometida
(A tensão escatológica da palavra de Deus) .................................................................................................122
2.5.1 A palavra de Deus encontra em Cristo seu cumprimento definitivo...................................................122
2.5.2 A palavra de Deus espera a manifestação final da verdade..............................................................122
2.5.3 Catequese das certezas e dos problemas..........................................................................................123
3. CATEQUESE E INCULTURAÇÃO.............................................................................................................125
3.1 Por uma catequese inculturada...............................................................................................................125
3.2 Palavra de Deus e cultura........................................................................................................................127
3.3 A difícil tarefa da inculturação da fé.......................................................................................................129
3.4 Catequese, lugar e instrumento de enculturação....................................................................................131
4. A EXPERIÊNCIA RELIGIOSA, LUGAR DA PALAVRA
E ELEMENTO CENTRAL DA COMUNICAÇÃO CATEQUÉTICA................................................................134
4.1 Sobre o conceito de experiência...............................................................................................................135
4.2 A experiência religiosa............................................................................................................................137
4.3 A experiência cristã.................................................................................................................................139
4.4 A catequese, comunicação da palavra na experiência de fé: alguns modelos inadequados.....................140
4.5 A catequese: aprofundamento-identificação
da própria experiência com as experiências cristãs.......................................................................................143
5. CATEQUESE FIEL A DEUS, À PESSOA HUMANA E À IGREJA............................................................145
5.1 As fontes da catequese.............................................................................................................................146
5.2 O problema da linguagem.......................................................................................................................147
5.3 Pluralismo e realismo metodológico........................................................................................................148
SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS...................................................................................................................149

Capítulo 5
A catequese, iniciação à fé e educação da fé............................................................................................153

1. INICIAR E EDUCAR PARA A FÉ HOJE: IDEAL E REALIDADE...........................................................153


1.1É possível iniciar e educar para a fé? ..............................................................................................154
1.2 Iniciação à fé na sociedade atual.............................................................................................................155
1.3 Catequese da conversão, das atitudes, rumo à maturidade....................................................................155
2. A FACE RENOVADA DA FÉ.......................................................................................................................156
2.1 A fé, resposta à palavra interpelante de Deus.........................................................................................156
2.2 A fé, entrega confiante a Deus.................................................................................................................157
2.3 A fé, dom e graça.....................................................................................................................................158
2.4 Aspectos complementares do ato de fé....................................................................................................159
3. O DINAMISMO DA FÉ.................................................................................................................................160
3.1 Dinamismo da fé: indicações bíblico-teológicas......................................................................................160
3.2 Dinamismo da fé: abordagem psicoantropológica..................................................................................162
3.2.1 O dinamismo da fé como processo iniciático....................................................................................162
3.2.2 O dinamismo da fé como interiorização de atitudes..........................................................................164
3.3 Dinamismo da fé: a perspectiva evolutiva...............................................................................................167
3.4. A meta da maturidade religiosa.............................................................................................................169
3.4.1 Maturidade da fé como atitude global..............................................................................................170
3.4.2 Maturidade da fé na dimensão cognitiva..........................................................................................171
3.4.3 Maturidade da fé na dimensão afetiva..............................................................................................172
3.4.4 Maturidade da fé na dimensão comportamental...............................................................................174
3.5 Ser adulto na fé hoje: em busca de um novo modelo de crente...............................................................174
3.5.1 Uma identidade religiosa personalizada e livre................................................................................175
3.5.2 Fé encarnada na cultura.................................................................................................................175
3.5.3 Sensus ecclesiae mas de forma adulta.................................................................... ....................176
3.5.4 Espírito Comunitário.......................................................................................................................176
3.5.5 Compromisso com o mundo e forte consciência ética.......................................................................176
3.5.6 Abertura e diálogo intercultural e inter-religioso.............................................................................177
4. A CATEQUESE, INICIAÇÃO À FÉ E EDUCAÇÃO DA FÉ: IDENTIDADE E TAREFAS......................177
4.1 Mas é possível educar a fé? ....................................................................................................................177
4.1.1 A catequese, verdadeira educação...................................................................................................178
4.1.2 Por uma genuína ação educativa.....................................................................................................179
4.2 Objetivos e tarefas da catequese..............................................................................................................181
4.2.1 É tarefa da catequese favorecer e despertar a conversão..................................................................181
4.2.2 É tarefa da catequese promover e fortalecer as atitudes de fé...............................................................182
4.2.3 É tarefa da catequese levar à consciência plena da mensagem cristã...................................................184
4.2.4 É tarefa da catequese educar para o agir cristão..................................................................................187
4.3 Algumas consequências e aplicações concretas.......................................................................................189
5. UM PROBLEMA PARTICULAR: EDUCAÇÃO DA FÉ E PLURALISMO RELIGIOSO........................189
5.1 Catequese e religiosidade popular...........................................................................................................190
5.2 Os novos movimentos religiosos..............................................................................................................192
5.3 O mundo das grandes religiões................................................................................................................193
SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS...................................................................................................................195

Capítulo 6
A catequese, ação eclesial e educação para o sentido da Igreja...........................................................199

1. A DIMENSÃO ECLESIAL DA CATEQUESE: LUZES E SOMBRAS.......................................................199


2. PALAVRA DE DEUS, IGREJA E CATEQUESE.........................................................................................200
2.1 A Igreja depende totalmente da palavra de Deus...................................................................................201
2.2 A palavra de Deus se encarna e vive na Igreja........................................................................................201
2.2.1 Toda a Igreja é palavra...................................................................................................................202
2.2.2. No ministério da Igreja está presente e operante a palavra de Deus................................................202
2.2.3 Somente na Igreja a palavra de Deus é devidamente ouvida e interpretada......................................203
2.3 A catequese, ação eclesial........................................................................................................................203
2.3.1 A Igreja faz a catequese (a Igreja como sujeito da catequese) .....................................................203
2.3.2 A catequese faz a Igreja (a Igreja como objeto e meta da catequese) ...........................................204
3. CATEQUESE E NOVAS PERSPECTIVAS ECLESIOLÓGICAS..............................................................205
3.1 A mudança eclesiológica do Vaticano II..................................................................................................205
3.1.1 O modelo eclesiológico predominantemente institucional e jurídico.................................................206
3.1.2 A mudança conciliar: eclesiologia de comunhão e de serviço ..........................................................208
3.2 Desenvolvimentos eclesiológicos pós-conciliares.....................................................................................210
3.2.1 O anelo da koinonia........................................................................................................................210
3.2.2 A Igreja a serviço do mundo............................................................................................................214
3.3 Novas perspectivas para a catequese.......................................................................................................214
3.3.1 A catequese no modelo eclesiológico tem um viés predominantemente institucional e jurídico..........215
3.3.2 Na nova perspectiva eclesiológica...................................................................................................215
4. A CATEQUESE, AÇÃO DE IGREJA ( A Igreja faz a catequese ) ............................................................216
4.1 Os lugares eclesiais da catequese.............................................................................................................216
4.1.1 A centralidade da Igreja particular..................................................................................................217
4.1.2 A paróquia, lugar de catequese........................................................................................................217
4.1.3 Os âmbitos regional, nacional, universal.........................................................................................218
4.2 A catequese eclesial: serviço único e diferenciado (DGC n. 219) ...........................................................219
4.2.1 O primeiro catequista: a comunidade eclesial..................................................................................219
4.2.2 A missão catequética dos pastores...................................................................................................220
4.2.3 O ministério dos catequistas............................................................................................................221
4.2.4 A tarefa catequética da família........................................................................................................222
4.2.5 A contribuição dos religiosos...........................................................................................................223
4.2.6 O profetismo carismático particular................................................................................................224
5. A IGREJA, OBJETIVO DA CATEQUESE ( A CATEQUESE FAZ A IGREJA ) ...................................225
5.1 Rumo à comunhão completa: a catequese ecumênica.............................................................................225
5.1.1 Finalidade e objetivos de uma catequese ecumênica.........................................................................226
5.1.2 Fontes, conteúdos e métodos de uma catequese ecumênica...............................................................226
5.2 Por um projeto renovado de Igreja.........................................................................................................228
5.2.1 Catequese para construir a Igreja, não para conservar a Igreja.......................................................229
5.2.2 Catequese para um projeto renovado e convincente de Igreja..........................................................229
6. A CATEQUESE ECLESIAL: POR UMA PALAVRA AUTÊNTICA E DIGNA DE FÉ...............................230
6.1 A autenticidade da palavra: critérios de discernimento..............................................................................230
6.1.1 No modelo pré-conciliar: conformidade com o magistério...............................................................231
6.1.2 Na eclesiologia renovada: fidelidade a Cristo, ao Espírito, à comunhão eclesial..............................231
6.2 A busca da credibilidade.........................................................................................................................233
6.2.1 Os principais sinais de credibilidade da palavra eclesial...................................................................233
6.2.2 Os critérios intrínsecos à palavra eclesial........................................................................................234
SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS...................................................................................................................235

Capítulo 7
Catequese e compromisso sociocaritativo................................................................................................239

1. EVANGELIZAÇÃO, CATEQUESE E DIACONIA: ASPECTOS DO PROBLEMA....................................239


1.1 Separação entre catequese e compromisso sociocaritativo.....................................................................239
1.2 Identificação da catequese com o compromisso sociopolítico.................................................................240
1.3 Relação estreita entre e diaconia eclesial, manifesta em sua distinção...................................................240
2. NOVAS PERSPECTIVAS DO SERVIÇO E DA CARIDADE NA IGREJA
(o aspecto renovado do sinal da diaconia) ........................................................................................................241
2.1 Um olhar para o passado: o exercício da caridade na tradição da Igreja...............................................241
2.2 A nova consciência eclesial do significado da diaconia...........................................................................242
2.3 A nova face da diaconia eclesial..............................................................................................................245
2.3.1 Horizonte universal.........................................................................................................................245
2.3.2 Estilo evangélico e inspiração cristã................................................................................................245
2.3.3 Corresponsabilidade comunitária....................................................................................................246
2.3.4 Qualificação pastoral plena e evangelização do sinal da diaconia....................................................246
2.3.5 Critério de autenticidade evangelizadora.........................................................................................246
3. CATEQUESE E DIACONIA ECLESIAL:
DIMENSÃO DE COMPROMISSO E PROMOCIONAL DA CATEQUESE..................................................247
3.1 Catequese voltada para a promoção.....................................................................................................248
3.2 Catequese e educação para o serviço sociocaritativo............................................................................249
3.3 A diaconia no âmago do ato catequético...............................................................................................250
3.4 Diaconia e atenção aos últimos.............................................................................................................250
3.5 Diaconia e revisão dos conteúdos catequéticos.....................................................................................252
3.6 Diaconia e método catequético..............................................................................................................253
4. UM PROBLEMA PARTICULAR: CATEQUESE E POLÍTICA................................................................253
4.1 Ação política e mentalidade contemporânea...........................................................................................254
4.2 Fé cristã e opções políticas.......................................................................................................................256
4.3 Comunidade cristã e ação política...........................................................................................................258
4.4 Catequese e ação política.........................................................................................................................259
4.4.1 Dimensão política da catequese.......................................................................................................259
4.4.2 A educação para a política, tarefa da catequese...............................................................................259
4.4.3 A catequese, reflexão política à luz da fé... ......................................................................................260
SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS....................................................................................................................261

Capítulo 8
Catequese e comunidade..............................................................................................................................265

1. A DIMENSÃO COMUNITÁRIA DA CATEQUESE: ESPERANÇAS E PROBLEMAS..............................265


2. O MOVIMENTO COMUNITÁRIO NA IGREJA DE HOJE
(Novas perspectivas do sinal da koinonia) ........................................................................................................266
2.1 Raízes socioculturais do movimento comunitário...................................................................................266
2.2 Raízes teológico-pastorais do movimento comunitário...........................................................................267
2.3 Refazer o tecido comunitário: as pequenas comunidades.......................................................................269
2.4 Critérios de autenticidade e sintomas patológicos dos grupos e comunidades eclesiais.............. ........271
2.4.1 O Evangelho como fato fundador.....................................................................................................271
2.4.2 O critério da comunhão eclesial......................................................................................................271
2.4.3 O critério da globalidade das funções eclesiais................................................................................272
2.4.4 O critério da ministerialidade..........................................................................................................272
2.4.5 O critério da fecundidade................................................................................................................272
2.4.6 A conciliação dos conflitos..............................................................................................................273
3. DIMENSÃO COMUNITÁRIA DA CATEQUESE.......................................................................................273
3.1 A opção comunitária na pastoral catequética.........................................................................................273
3.1.1 A comunidade, condição necessária para a catequese......................................................................274
3.1.2 Comunidade, lugar natural da catequese.........................................................................................275
3.1.3 A comunidade, o próprio sujeito da catequese......................................................................................275
3.1.4 A comunidade, destinatário último da catequese.. ...........................................................................276
3.1.5 A comunidade, objetivo e meta da catequese....................................................................................277
3.2 Catequese comunitária: características e perspectivas...........................................................................277
3.2.1 O papel do grupo e das pequenas comunidades....................................................................................277
3.2.2 Catequese comunitária: uma mudança qualitativa...........................................................................280
3.2.3 Catequese comunitária: uma nova abordagem da mensagem cristã..................................................281
3.2.4 Uma metodologia de caráter comunitário........................................................................................282
3.2.5 O novo perfil do catequista-animador..............................................................................................282
4. CATEQUESE E ESCOLA.............................................................................................................................283
4.1 A religião na escola: uma realidade em movimento................................................................................283
4.1.1 Um olhar para o passado: o ensino da religião (ER) como catequese escolar .............................284
4.1.2 Um sistema em crise........................................................................................................................286
4.1.3 O fundamento pedagógico-escolar do ER........................................................................................287
4.1.4 Distinção e complementaridade entre ER e catequese eclesial..........................................................289
4.2 Novas perspectivas para o ensino da religião na escola..........................................................................290
4.2.1 Objetivos e tarefas do ER................................................................................................................290
4.2.2 Conteúdos do ER escolar.................................................................................................................291
4.3 As questões em aberto. O problema do confessionalidade......................................................................291
4.3.1 As duas almas do ER escolar.......................................................................................................292
4.3.2 Por um ER pluralista e interdisciplinar............................................................................................294
4.3.3 O professor de religião: profissionalismo e autenticidade................................................................296
4.4 Catequese e ER na escola católica...........................................................................................................297
CONCLUSÃO: UMA NOVA VISÃO PASTORAL..........................................................................................298
SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS...................................................................................................................299

Capítulo 9
Catequese e liturgia.......................................................................................................................................305

1. LITURGIA E CATEQUESE: DIÁLOGO E TENSÃO.................................................................................305


1.1. Insatisfações no campo litúrgico.............................................................................................................305
1.2. Insatisfações no âmbito catequético.......................................................................................................306
1.3. A questão em aberto da pastoral sacramental.......................................................................................307
1.4. A crise do processo de iniciação cristã...................................................................................................307
2. NOVAS PERSPECTIVAS DA LITURGIA ECLESIAL
(A face renovada do sinal da liturgia) ...............................................................................................................308
2.1. O impacto conciliar................................................................................................................................308
2.2. A liturgia, lugar da palavra e sinal da fé................................................................................................309
2.3. A revolução cristã do culto como liturgia da ida .............................................................................310
2.4. A tarefa aberta da pastoral litúrgica...................................................................................................312
3. EVANGELIZAÇÃO, CATEQUESE E LITURGIA......................................................................................313
3.1. Unidade profunda entre liturgia, caminho de fé e vida cristã................................................................313
3.2. Dimensão evangelizadora e catequética da liturgia................................................................................315
3.3. A catequese litúrgica (a liturgia tem necessidade da catequese) ...........................................................317
3.4. A liturgia, referência essencial para a catequese (a catequese tem necessidade da liturgia) ................318
3.4.1. O contexto litúrgico da catequese...................................................................................................319
3.4.2. O símbolo e a celebração, formas privilegiadas de linguagem religiosa..........................................320
3.4.3. Celebração e educação da fé..........................................................................................................322
SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS...................................................................................................................323

Capítulo 10
Rumo à catequese em ato, a perspectiva metodológica.........................................................................325

1. O PROBLEMA DO MÉTODO CATEQUÉTICO........................................................................................325


1.1. A banalização do problema do método..................................................................................................325
1.2. A contraposição entre conteúdo e método..............................................................................................326
1.3. A radicalização da originalidade do método catequético...................................................................327
2. A DIMENSÃO METODOLÓGICA NO CENTRO DA CATEQUESE........................................................327
2.1. Para um esclarecimento do conceito de mé odo catequético..............................................................328
2.2. Caráter metodológico da abordagem catequética..................................................................................329
2.3. Pela superação da tensão conteúdo-m odo ......................................................................................330
2.4. Pedagogia divina e catequese..................................................................................................................331
3. QUE MÉTODO USAR NA CATEQUESE? .................................................................................................331
3.1. O itinerário global do planejamento catequético...................................................................................332
3.1.1. A passagem do empirismo à racionalidade.....................................................................................332
3.1.2. A passagem do programa (ou do texto) à programação...................................................................332
3.1.3. O itinerário do planejamento e programação da catequese............................................................334
3.2. A escolha do modelo ou método catequético global...............................................................................335
3.3. A escolha e a organização das intervenções operativas..............................................................................336
3.4. Técnicas, instrumentos e subsídios na catequese.........................................................................................337
3.5. O catecismo como subsídio catequético: significado e limites................................................................337
3.5.1. Mas ainda é tempo de catecismo ? ..................................................................................................338
3.5.2. Algumas lições da história do movimento catequético.........................................................................339
3.5.3. Significado do catecismo hoje...........................................................................................................339
3.5.4. O Catecismo da Igreja Católica ........................................................................................................340
3.6. Em termos concretos: que métodos usar na catequese moderna?.............................................................341
SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS..........................................................................................................................343

Capítulo 11
O catequista, identidade e formação..........................................................................................................345

1. PERFIL DO CATEQUISTA OU ANIMADOR..................................................................................................345


1.1. Os diversos níveis de responsabilidade catequética....................................................................................345
1.1.1 Os catequistas de base............................................................................................................................346
1.1.2. Os agentes intermediários.....................................................................................................................346
1.1.3. Especialistas e responsáveis superiores................................................................................................347
1.2. Os agentes da catequese: competência unitária e diferenciada.................................................................347
1.3. As competências do animador ou catequista: ser, saber, saber fazer.......................................................348
1.3.1. O ser do catequista: sua fisionomia humana e cristã.......................................................................348
1.3.2. O sabe do catequista: sua bagagem intelectual..............................................................................350
1.3.3. O saber fazer do catequista: sua competência operativa.................................................................350
2. A FORMAÇÃO......................................................................................................................................................351
2.1. Um olhar sobre a situação: luzes e sombras................................................................................................351
2.1.1. O nível de base: catequista e professores de religião...........................................................................352
2.1.2. Os agentes intermediários: animadores, coordenadores, formadores.................................................353
2.1.3. O nível superior: bispos, sacerdotes, responsáveis, especialistas, docentes........................................354
2.2. As exigências da formação (cf DGC, V parte, cap. II; CAL cap. 10) ....................................................354
2.2.1. Planejar e investir na formação............................................................................................................354
2.2.2. A pastoral dos catequista (DGC n. 233).........................................................................................355
2.2.3. A pedagogia da formação......................................................................................................................356
SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS..........................................................................................................................358

Conclusão:
a fisionomia da catequese renovada..........................................................................................................363

Uma nova orientação de base: catequese evangelizadora.......................................................................................363


Uma nova identificação dos sujeitos e dos objetivos da catequese.........................................................................364
Uma nova visão do conteúdo da catequese...............................................................................................................365
Uma nova perspectiva pedagógica............................................................................................................................366
O surgimento de novos lugares e novos campos para a catequese........................................................................366
Uma nova fisionomia do catequista e de sua formação...........................................................................................366
Um novo significado da catequese na Igreja e na sociedade...................................................................................367

Bibliografia geral.............................................................................................................................................369
Siglas e abreviaturas

Documentos conciliares e do magistério pontifício

AA = Apostolicam Actuositatem (Apostolado dos leigos, 18/11/1965).


AG = Ad Gentes (Atividade missionária da Igreja, 7/12/1965).
CaIC = Catecismo da Igreja Católica (1992)
CD = Christus Dominus (Ministério pastoral dos bispos, 28/10/1965).
ChL = Christifideles Laici (Cristãos leigos, 30/12/1988).
CT = Catechesi Tradendae (Catequese hoje, 16/10/1979).
DH = Dignitatis Humanae (Liberdade religiosa, 7/12/1965).
DV = Dei Verbum (Revelação divina, 1965).
EN = Evangelii Nuntiandi (Anúncio evangélico, 1975).
GE = Gravissimum Educationis (Educação cristã, 1965).
GS = Gaudium et Spes (A Igreja no mundo atual, 1965).
LG = Lumen Gentium (Igreja, 1964).
NA = Nostra Aetate (A Igreja e as religiões não cristãs, 1965).
RM = Redemptoris Missio (Missão redentora da Igreja, 1990).
SC = Sacrosanctum Concilium (Sagrada liturgia, 1963).
UR = Unitatis Redintegratio (Ecumenismo, 1964).

Outras abreviaturas

Alemanha KWK = Das katechetische Wirken der Kirche. Ein Arbeitspapier der Sachkommission
I der gemeinsamen Synode der Bistümer in der Bundesrepublik Deustschland , in: L.Bertsch
et al. (eds.), Gemeinsame Synode der Bistümer in der Bundesrepublik Deustschland.
Ergänzungsband. Offizielle Gesamtausgabe II. Friburgo/ Basileia/ Viena, Herder, 1978, p. 31-97.
Alemanha = SINODO NAZIONALE DELLE DIOCESI DELLA GERMANIA FEDERALE,
Scuola e insegnamento della religione. Leumann (Turim), Elledici, 1977.
América Latina ERE = CONSEJO EPISCOPAL LATINOAMERICANO-DEPARTAMENTO DE
EDUCACIÓN, Orientaciones generales para la Educación Religiosa Escolar en América Latina y em
el Caribe. Santafé de Bogotá, Consejo Episcopal Latinoamericano (Celam) - Departamento de
Educación (DEC), 1999.
Ásia (Cingapura 1995) = A enewed atechesis for sia owards the ear 2000 and beyond.
Statement of the Pan Asian Conference on Catechesis. Singapore 23 October 1995 , in: F.-J. Eilers
(ed.), For all the peoples of Asia. Federation of Asian Bishops´ Conferences. Documents from 1992
to 1996. Vol. 2. Quezon City, Claretian Publications, 1997, p. 27-35.
Brasil CR = Catequese renovada: orientações e conteúdo. Documento aprovado pelos Bispos do
Brasil. Coleção Estudos da CNBB, n. 26. 34a ed. São Paulo, Paulinas, 2003. (A primeira edição é de
maio de 1983.)

15
CAL = , La catequesis en América Latina. Orientaciones comunes a la luz del
Directorio eneral para la atequesis. Santafé de Bogotá, Centro de Publicaciones del Celam, 1999.
DCG = SAGRADA CONGREGAÇÃO PARA O CLERO, Diretório geral catequético. Petrópolis,
Vozes, 1971.
DGC = CONGREGAÇÃO PARA O CLERO, Diretório geral para a catequese. 3a ed. São Paulo,
Paulinas, 2002.
Diz.Cat. = ISTITUTO DE CATECHETICA (FACOLTÀ DI SCIENZE DELL´EDUCAZIONE)
DELL´UNIVERSITÀ SALESIANA DI ROMA, Dizionario di catechetica. Sob a responsabilidade
editorial de Joseph Gevaert. Leumann (Turim), Elledici/LAS/SEI, 1997.Esta obra está traduzida em
castelhano: Dicionario de catequética. Madri, Editorial CCS, 1987.
Diz.Sc.Ed. = FACOLTÀ DI SCIENZE DELL´EDUCAZIONE - UNIVERSITÀ PONTIFICIA
SALESIANA, Dizionario di scienze dell´educazione. Sob a responsabilidade editorial de José Manuel
Prellezo (coord.), Carlo Nanni Guglielmo Malizia. Leumann/Turim/Roma, Elledici/LAS/SEI, 1997.
Espanha CC = COMISION EPISCOPAL DE ENSEÑANZA Y CATEQUESIS, La catequesis de la
comunidad: orientaciones pastorales para la catequesis en España hoy. Madri, Edice, 1983.
Espanha = COMISION EPISCOPAL DE ENSEÑANZA Y CATEQUESIS, Orientaciones
pastorales sobre la enseñanza religiosa escolar. Madri, PPC, 1979.
França (Texte de référence) = CONFERÊNCIA EPISCOPAL FRANCESA, Direttive per l´iniziazione
cristiana dei fanciulli dagli 8 ai 12 anni. Testo base per gli autori di pubblicazioni catechistiche e i
responsabili della pastorale. Leumann (Turim), Elledici, 1981.
Inglaterra (Conerstone) = K.Nichols, Guidelines for Religious Education. I. Cornestone. Middlegreen,
Slough, St. Paul Publ., 1978.
Itália ERE = Insegnare religione cattolica oggi. Nota pastorale della Cei sull´insegnamento della religione
cattolica nelle scuole pubbliche [24.5.1991]. Roma, Paoline, 1991.
Medellín = Documentos de Medellín: A Igreja na atual transformação da América Latina à luz do
Concílio. Conclusões de Medellín. 6ª ed. Petrópolis, Vozes, 1977.
Mensagem do Sínodo de 1977 = Mensagem ao povo de Deus. A catequese no nosso tempo,
especialmente para as crianças e os jovens. São Paulo, Paulinas, 1977 (Coleção Voz do papa 87).
Publicado também em REB 37 (1977), p. 767-775.
México GP = COMISION EPISCOPAL DE EVANGELIZACION Y CATEQUESIS, Guía Pastoral
para la catequesis de México: un rostro nuevo para la catequesis. México, 1992.
Nuevo Dic. Catequesis = V. M. Pedrosa Ares et al. (eds.), Nuevo iccionario de atequética. 2 vols.
Madri, San Pablo, 1999. Em breve será publicado em português pela Paulus.
Puebla = Puebla. A evangelização no presente e no futuro da América Latina. Puebla: conclusões. São
Paulo, Loyola, 1979.
RdC = CONFERENZA EPISCOPALE ITALIANA, Il rinnovamento della catechesi. Roma, Fondazione di
Religione Santi Francesco di Assisi e Caterina da Siena, 1988.
Religio = Z. Trenti et al. (eds.), Religio. Enciclopedia tematica dell´educazione religiosa. Casale
Monferrato, Piemme, 1998.
S. Domingo = Nova evangelização, promoção humana, cultura cristã. Jesus Cristo ontem, hoje e
sempre. Santo Domingo: conclusões. Texto oficial. São Paulo, Loyola, 1992.
USA (NCD) = Condividere la luce della fede. Direttorio catechetico nazionale dei cattolici degli
Stati Uniti. Leumann (Turim), Elledici, 1981.

16
Apresentação
da edição brasileira.
COM PRAZER e satisfação saúdo a publicação deste manual de
catequética a serviço da formação dos agentes e responsáveis pela
atividade catequética em nossas Igrejas. Ele vem à luz vinte anos
depois do aparecimento do seu antecessor (A catequese na Igreja
hoje, São Paulo, Editora Salesiana, 1983), em relação ao qual se
apresenta atualizado e revisto à luz dos mais recentes documentos
eclesiais e como resposta aos novos desafios que a sociedade de
hoje lança à catequese. Por isso mesmo, optou-se por mudar o título
para Catequese evangelizadora manifestando assim a nota mais
característica que assume a atual renovação catequética.
O novo manual insere-se num contexto, o da Igreja brasileira
atual, particularmente viva e rica de perspectivas catequéticas.
A celebração da Segunda Semana Brasileira de Catequese
( Com adultos, catequese adulta , Itaici, 8 a 12 de outubro de
2001) e a preparação do novo Diretório acional de atequese são
expressão de uma vontade pastoral de renovação que faz olhar
com confiança para o futuro da atividade catequética no Brasil,
sobretudo no mundo dos adultos e para uma revisão corajosa de
todo o processo da iniciação cristã.
Faço votos de que a nova publicação, num momento tão complexo e
de tanta responsabilidade para toda a ação pastoral da Igreja, possa
ser um instrumento útil de formação e, deste modo, contribuir para
o incremento e qualificação da catequese na sociedade de hoje.

Emilio Alberich

17
Prólogo

HÁ VINTE ANOS a Editora Salesiana publicava a obra A


catequese na Igreja de hoje, do Pe. Emilio Alberich, certamente
o lançamento mais importante de seu longo catálogo catequético.
Vivia-se, então, na Igreja do Brasil, a euforia e o entusiasmo pela
recente aprovação, por parte do episcopado brasileiro, do
documento Catequese Renovada: orientações e conteúdo (doc.
26). O livro do Pe. E. Alberich, em suas versões italiana e
espanhola, tinha prestado uma significativa colaboração para
quantos haviam trabalhado na redação do importante documento
que marcou a caminhada da catequese no Brasil nestes vinte
anos. A publicação da mesma obra em português auxiliou muito
na compreensão e aprofundamento das orientações
catequéticas de Catequese Renovada.
Em 1992 o autor fez uma segunda edição, bastante
reformulada, com o título A catequese na Igreja. Ela foi
traduzida, porém, não chegou a ser publicada. Agora, passados
vinte anos, E. Alberich nos presenteia com uma nova obra
intitulada Catequese evangelizadora, monumental manual de
catequética. Neste livro reflete-se a renovação catequética
mundial destes últimos anos, marcado, sobretudo, pela
publicação do Diretório Geral para a Catequese, por parte da Sé
Apostólica. A Editora , ao oferecer esta nova obra,
um verdadeiro tratado de catequética, teve o cuidado de fazer
uma grande adaptação para a realidade brasileira e
latino-americana.

19
Ao apresentar o livro d Alberich, em 1983, o
Pe. Ralfy Mendes de Oliveira dizia:
(...) o leitor atento percebe que não se trata de um livro europeu,
mas universal, ou melhor, de cunho bem latino-americano. Com
efeito, o autor, espanhol de origem e radicado em Roma (onde
leciona na Universidade Pontifícia Salesiana) sempre manteve as
atenções voltadas para a catequese do nosso Continente, procurando
conhecer de perto nossos problemas, aspirações e lutas. Pode-se
dizer que é alguém que está ao nosso lado na caminhada catequética
que estamos empreendendo.

A este testemunho posso acrescentar que o Pe. Emilio


Alberich esteve nestes últimos dez anos várias vezes presente na
América Latina, tanto em congressos e cursos em Buenos Aires,
como na Segunda Semana Latino-Americana de Catequese, em
Caracas (1992), e sobretudo em nossa Segunda Semana
Brasileira de Catequese (outubro de 2001), em Itaici, que teve
como tema a catequese com adultos, aliás, uma sua
especialização.
Às abundantes referências aos documentos latino-americanos
e brasileiros, eu pude acrescentar, num minucioso trabalho de
atualização e adaptação, muitos textos, referências, notas e
bibliografia mais pormenorizadamente brasileiras. Assim, a
presente obra está em sintonia também com o que de mais atual
se produz na reflexão catequética brasileira.
A obra recebeu o significativo título de Catequese
evangelizadora, que em si já traduz as novas perspectivas em
que se coloca a atual atividade de educação da fé. A preocupação
pela Evangelização, pelo anúncio jubiloso da salvação em Cristo
Jesus, veio tomando conta de toda a Igreja desde 1974 com a
célebre carta Evangelii Nuntiandi e permeia hoje vitalmente
todas as grandes iniciativas da atividade eclesial. A catequese,
que estritamente significaria o aprofundamento dos
conhecimentos da fé, agora se reveste também do dinamismo e
da mística que a proclamação do Evangelho sempre suscitou na
Igreja.

20
Constituída de onze capítulos, com uma introdução e
conclusão, a obra trata de todos os grandes temas referentes à
prática da educação da fé no mundo de hoje. Após uma
exposição dos principais desafios e problemas para a catequese
no contexto cultural de hoje, o autor situa a catequese no quadro
maior da evangelização (e nisto se inspira o título do livro) e da
pastoral. Só então discute a identidade, o significado e as
tendências da catequese contemporânea. Apresenta-a como
autêntico serviço da Palavra de Deus, anúncio de Cristo, bebendo
nas fontes da teologia renovada da revelação, onde encontramos
a verdadeira fundamentação para a tarefa catequética. Suas
características essenciais de iniciação e educação na fé são
propostas numa perspectiva teológica e pedagógica. Três
capítulos centrais tratam de dimensões muito arraigadas e
apreciadas pela nossa recente tradição catequética brasileira, ou
seja: as dimensões eclesial, transformadora e comunitária. Num
capítulo especial é discutido um aspecto que toma cada vez mais
vulto na reflexão e prática catequética de hoje: a relação
profunda entre a educação da fé e a celebração do mistério
cristão, ou seja, catequese e liturgia. Fundamenta-se então aquilo
que tanto o Diretório Geral como o nosso Diretório acional de
atequese pedem com insistência: que toda a catequese assuma
as feições do processo catecumenal. Por fim aborda-se a questão
metodológica e o importantíssimo tema da identidade e formação
do catequista.
É muito significativo que este manual de catequética
fundamental ou geral esteja sendo lançado no momento em que
os bispos, catequetas, coordenadores de catequese, catequistas,
pastoralistas, biblistas, teólogos, liturgistas e outros estudiosos
estão debruçados sobre o estudo do novo Diretório acional de
atequese.

21
Assim como o livro do Pe. Alberich esteve presente no
nascimento, desenvolvimento e operacionalização de
Catequese Renovada (1983), esperamos que esta sua nova
produção, totalmente revista, atualizada e adaptada ao Brasil,
venha a ser uma luz não só para a elaboração do nosso Diretório
acional de atequese (2004-2005), mas principalmente para
a prática e vivência da educação da fé de nossos adultos, jovens
e crianças, atividade sempre perene em toda a Igreja.

São Paulo, 1º de janeiro de 2004


Solenidade de Maria, Mãe de Deus
Pe. Dr. Luiz Alves de Lima, sdb

Nota bibliográfica

As obras são citadas:


na tradução brasileira, quando existente;
em espanhol, italiano ou francês, por serem mais conhecidas entre nós;
na própria língua original quando não há tradução em línguas neolatinas.

22
Introdução
Este livro apresenta-se como um manual de catequética
fundamental ou geral, a serviço da formação de catequistas e
outros responsáveis pela atividade catequética. Impõe-se, desde
o início, uma explicação dos termos e um esclarecimento do que
está em jogo, mesmo porque, no ambiente eclesial, nem sempre
a nossa disciplina é adequadamente compreendida e apreciada.

A CATEQUÉTICA COMO DISCIPLINA

A catequética ou ciência catequética é a disciplina que se ocupa da catequese, no


contexto da práxis pastoral da Igreja. Sua existência e legitimidade constituem fato já
consolidado no âmbito da reflexão e da prática eclesial. É uma disciplina relativamente
recente porque, se é verdade que a catequese é uma atividade tão antiga quanto a própria
Igreja, certamente não se pode dizer o mesmo da catequética, que surgiu e se configurou no
curso dos últimos dois séculos.1
Ao longo de sua história, a Igreja soube realizar e organizar de muitas formas a
atividade catequética, mas são poucas as ocasiões de reflexão explícita sobre seus
conteúdos e métodos. Costuma-se citar, no que se refere à época patrística, o famoso
pequeno tratado de Santo Agostinho De catechizandis rudibus (do ano 399) e, no fim da
Idade Média, a obra de Giovanni Gersone, Tractatus de parvulis trahendis ad Christum
(1406),2 mas nem mesmo nesses casos se pode ainda falar de reflexão científica sobre a
catequese ou considerar tais escritos como obras propriamente catequéticas.
O início da nossa disciplina remonta ao ano 1774 quando, por disposição da imperatriz
Maria Teresa da Áustria e, segundo o projeto preparado pelo abade beneditino
Rautenstrauch, foi introduzido nas escolas de teologia do império austro-húngaro o ensino da
catequética, como disciplina particular ou como parte da teologia pastoral.3

1
Cf. GRUPPO ITALIANO CATECHETI, La catechetica: identità e compiti. Udine, Segreteria del Gruppo
Italiano Catecheti, 1977; G. Stachael, Catechetica . Diz. Cat. p. 110-111: G. Adler et al., La compétence
catéchétique: suite aux travaux du Congrès de l Équipe Européenne de Catéchèse à Gazzada (Italie) en mai
a
1988. Paris, Desclée, 1989. J. Gevaert, Studiare catechetica. 4 ed. Roma, UPS, FSE, Istituto di Catechetica,
1999.
2
Para uma informação, ainda que breve, ver os verbetes referentes a Agostino e Gersone

23
Mas, na realidade, começará a desenvolver-se com certa amplitude e rigor somente
pelo fim do século XIX, a partir do nascimento e desenvolvimento do denominado
movimento catequético, isto é, do rico florescimento de ideias e esforços que, do fim do
século XIX até o Concílio Vaticano II, procurará renovar a teoria e a prática da catequese sob
a influência de novas correntes culturais, especialmente de ordem pedagógica e psicológica.4
Por isso, a catequética, nascida no contexto teológico da reflexão pastoral, logo recebeu a
influência das jovens ciências psicológicas e pedagógicas, de modo que, em alguns países,
como na Alemanha, prefere-se chamá-la pedagogia religiosa (Religionspädagogik).
Pode-se dizer que, no seu desenvolvimento, a reflexão catequética apresentou sempre
um duplo ponto de referência: teológico e pedagógico; predominando ora um, ora outro.
Mais pedagógico nas primeiras décadas do século XX, dominado pela preocupação
metodológica e didática, mais teológico na fase denominada querigmática do movimento
catequético, caracterizada pela renovação do conteúdo da catequese.5
Essa dúplice pertença e essa contínua oscilação são testemunhadas pelas vicissitudes e
pelas alternâncias dos dois termos, pedagogia religiosa e catequética, para designar a nossa
disciplina, juntamente com várias outras expressões de significado idêntico ou semelhante:
pedagogia catequética, pastoral catequética, pedagogia do catecismo, pedagogia cristã,
metodologia catequética, doutrina do método do ensinamento religioso, catequética pastoral
etc.6 É uma oscilação que constitui de mesma um sinal da riqueza e complexidade do
ato catequético, mas, ao mesmo tempo, constitui uma fonte constante de tensão e de possível
discordância no desenvolvimento da disciplina.
A partir do Vaticano II, a catequética conheceu um período de relativa fecundidade e
expansão, determinado pelo novo clima de revisão global da práxis eclesial e pelo
desenvolvimento da reflexão epistemológica. A existência de diversos centros e institutos de
catequética, a multiplicação de publicações e pesquisas nesse campo, bem como a presença
institucionalizada da catequética (ou da pedagogia religiosa) no âmbito acadêmico garantem
a consolidação e o crescimento da nova disciplina.

3
Cf. P.Braido, Lineamenti di storia della catechesi e dei catechismi: dal tempo delle riforme
all età degli imperialismi (1450-1870). Leumann (Turim), Elledici, 1991, p. 323-39.
4
Cf. U. Gianetto, Movimento catechistico , in: Diz. Cat., p. 448-50.
5
Cf. E. Alberich, Kerygmatica (Catechesi) , in: Diz. Cat., p. 374-76.
6
Cf. U. Gianetto, Catechetica (Manuali di) , in: Diz. Cat., p. 111-13.
24
A CATEQUÉTICA, IDENTIDADE E DIVISÕES

A identidade da catequética resulta primeiramente do próprio objeto de que se ocupa,


isto é, da catequese, na variedade das suas manifestações: ensino, reflexão comunitária,
iniciação sacramental, itinerário organizado de fé etc. A catequética é, concretamente, a
reflexão sistemática e científica sobre a catequese, com o objetivo de compreender,
aprofundar e direcionar essa importante ação educativa e pastoral.
A complexidade e a amplitude do objeto estudado explicam por que a catequética
admite em seu seio divisões e modalidades diversas, condicionadas pela história e pelos
diferentes contextos teológicos e culturais em que se realiza. Assim, por exemplo, alguns
autores costumam fazer distinção entre catequética fundamental, material e formal. 7 Por
catequética fundamental entende-se não apenas o estudo das condições e dos pressupostos de
base da ação catequética, mas também da sua identidade e dimensões fundamentais. A
catequética material teria como objeto os conteúdos da comunicação catequética: estrutura e
articulação da mensagem, temas a serem tratados, critérios de escolha, fontes do conteúdo
etc. Já a catequética formal trata dos aspectos propriamente metodológicos e pedagógicos da
transmissão ou mediação catequética: métodos, estruturas, agentes, linguagens, programação.
Outros autores distinguem simplesmente entre catequética fundamental ou geral e
catequética especial ou diferencial; esta última relativa aos diferentes destinatários da
catequese, segundo a idade ou a condição: crianças, jovens, adultos, pessoas com
necessidades especiais, pais etc. ou aos diversos âmbitos ou lugares da catequese: família,
escola, paróquia, associação.8
Nossa disciplina caracteriza-se, além disso, pelo método utilizado no seu
desenvolvimento. Esse método responde às diversas dimensões e aspectos que a catequese
apresenta, como processo e como ato. Antes, devemos falar de uma pluralidade de métodos:
técnicas de conhecimento e de análise da realidade (psicológicas, sociológicas, históricas);
instrumentos hermenêuticos de interpretação e de discernimento (sobretudo teológicos e
filosóficos); métodos de planejamento e de organização catequética (metodologia pastoral,
pedagógica, didática); técnicas de expressão, comunicação, interação, animação de grupos;
sistemas de avaliação e de replanejamento operativo etc. Pode-se dizer, portanto, que a
disciplina catequética configura-se como um saber necessariamente multidisciplinar, uma
vez que recorre a uma grande variedade de métodos e de procedimentos científicos. Mais:
hoje julga-se necessário orientar a catequese para uma autêntica interdisciplinaridade, a fim
de que haja interação e diálogo entre os diversos processos disciplinares envolvidos na
reflexão catequética.

7
É a divisão muitas vezes usada pelos autores alemães. Cf., por exemplo: W. Nastainczyk,
Formalkatechetik, Friburgo, Seelsorge Verlag, 1969.
8
Cf. J. J. Rodríguez Medina, Pedagogia de la fe. Salamanca, Sigueme, 1972, p. 32-34.
25
AS DUAS ALMAS DA CATEQUÉTICA: A TEOLÓGICA E A PEDAGÓGICA

O estatuto epistemológico da catequética torna-se mais preciso se se reporta ao


conjunto das ciências, de alguma maneira, afins. (Ver o diagrama da p. 28). Nesse sentido,
ela aparece vinculada especialmente a duas constelações epistemológicas: a das ciências
teológicas e a das ciências pedagógicas. Por isso, a catequética, na sua realização histórica,
sempre se reportou a esse duplo ponto de referência, dando maior ênfase, ora às ciências
teológicas, ora às ciências pedagógicas. E segundo a dimensão dominante, aparecerá
fundamentalmente como disciplina teológica ou como matéria pedagógica. 9

A catequética, disciplina teológica

A pertença da catequética ao âmbito da reflexão teológica deriva da própria natureza


do ato catequético, que se insere no contexto das atividades pastorais e se qualifica como
serviço da palavra eclesial para a educação da fé. É verdade que, por muito tempo, essa
pertença foi de fato concebida em termos de pura e simples subordinação da catequese à
teologia sistemática e a seus cânones interpretativos. Hoje, porém, essa visão é, com razão,
considerada superada, uma vez que reduz a catequética simples derivação ou extensão da
teologia sistemática.

9
Cf. E. Alberich, La catequética entre pedagogía y teología: ambivalencia de una disciplina en búsqueda de
reconocimiento . In: J. M. Prelezzo (ed.), L impegno dell educare: studi in onore di Pietro Braido promossi
dalla Facoltà di Scienze dell Educazione dell Università Pontificia Salesiana. Roma, LAS, 1991, p. 221-30.
26
A natureza teológica da catequética deve, em vez disso, ser repensada no quadro da
teologia pastoral ou prática. Nascida no seio desta última, a catequética está, desde o início,
necessariamente vinculada à teologia pastoral, como parte do todo, pelo fato de seu objeto, a
catequese, pertencer ao âmbito da ação pastoral da Igreja. Inserida nesse contexto, a
catequética deve, evidentemente, definir sua identidade em relação às outras disciplinas ou
setores afins, como a homilética ou ciência da pregação, a pastoral litúrgica, a pastoral da
juventude, a pastoral do ensino religioso na escola (ERE) etc. Nem sempre é fácil estabelecer
seus limites, porque muitas vezes a catequese se desenvolve, com pleno direito, em estreita
relação com outras atividades pastorais, como a liturgia, a pastoral da juventude, a
religiosidade popular, as atividades escolares etc. Impõe-se, pois, um critério de distinção
bastante flexível e, sobretudo, a necessidade do diálogo e da interação entre esses diversos
âmbitos de ação e de reflexão disciplinar.

A catequética, disciplina pedagógica

Por outro lado, a catequética apresenta também características de uma verdadeira


disciplina pedagógica e, como tal, encontra sua sistematização no âmbito das ciências da
educação. Na reflexão pastoral, assume hoje uma importância particular o conjunto,
enormemente desenvolvido, das ciências humanas em geral, e em particular das ciências da
educação.10 A virada antropológica típica da nossa cultura obriga a uma renovada atenção ao
sujeito, ao ser humano na sua situação, à dimensão histórica e cultural de toda ação e de toda
reflexão. Daí deriva o interesse por todas as contribuições capazes de iluminar a obra
pastoral: antropologia cultural, sociologia, psicologia, ciências da religião, ciências da
comunicação etc.
O caráter pedagógico da pesquisa catequética se evidencia quando se considera um
duplo aspecto da catequese: como processo educativo de amadurecimento na fé e como
atividade que se insere necessariamente no dinamismo global do crescimento e do
amadurecimento da pessoa. Por isso, a catequética pode e deve ser chamada ciência
pedagógica, sem prejuízo do seu vínculo com o campo da teologia, em seu aspecto pastoral
ou prático.

10
Cf. C. Nanni, Scienze dell educazione , in: Diz. Sc. Educ., p. 974-76.
27
CATEQUESE E CATEQUÉTICA
NO QUADRO EPISTEMÓLOGICO DAS CIÊNCIAS TEOLÓGICAS E PEDAGÓGICAS

CIÊNCIAS TEÓLOGICAS CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO


Teologia Histórica Teologia Históricas Empírico- experimentais
Sistemática Teologia Teóricas Metodológicas -
prática Tecnológicas
Nível da
reflexão
científica
TEOLOGIA PEDAGOGIA
PASTORAL RELIGIOSA
OU PRÁTICA CATEQUÉTICA

PRÁXIS ECLESIAL PRÁXIS EDUCATIVA

Nível da MINISTÉRIO PEDAGOGIA


ação DA PALAVRA RELIGIOSA
CATEQUESE

28
Equilíbrio das tensões

À luz dessas considerações, é possível distinguir alguns aspectos característicos de uma


disciplina jovem que, em certo sentido, vive e se desenvolve num terreno semeado de
antinomias ou tensões dialéticas.
Tensão entre fidelidade a Deus e fidelidade ao homem. É a conhecida lei
estrutural do método catequético que, difundida sobretudo por J. Colomb, já se
integrou oficialmente à consciência catequética da Igreja (RdC n. 160; CT n.55;
DGC n.145). Na verdade, o princípio da dupla fidelidade traduz-se muitas vezes em
fonte de exigências contrapostas e em campo de batalha entre os defensores da
fidelidade a Deus e os fautores da fidelidade ao homem.
Tensão entre pedagogia divina e pedagogia humana. Muitas vezes o
componente pedagógico da catequese submete-se aos ditames da pedagogia divina,
mas em termos tais que concretamente torna inútil qualquer recurso à pedagogia
profana ou às ciências da educação.
Tensão entre maturidade cristã e maturidade humana. No horizonte dos
objetivos da ação catequética encontra-se a clássica discussão sobre o ideal de
maturidade que se deve preestabelecer, e, pois, sobre as relações existentes entre
maturidade cristã e maturidade humana. É claro que toda implicação do crescimento
em humanidade no caminho do amadurecimento da fé tem evidentes reflexos na
tarefa catequética.
Tensão entre conteúdo e método. Talvez seja essa a forma mais clássica e
recorrente de tensão decorrente da complexidade epistemológica da ciência
catequética. No campo da catequese, há uma constante contraposição entre
conteúdo e método, entre a competência teológica, que fixa os conteúdos, e as
exigências pedagógicas relativas à mediação metodológica. Tudo isso tem como
pano de fundo, explícito ou inconsciente, o primado do conteúdo sobre o método. Na
realidade, uma compreensão correta da relação conteúdo-método permite superar tais
conflitos.

29
Tensão entre as dimensões teológica e pedagógica da catequese, que situa a
disciplina catequética no ponto de encontro dessas duas áreas disciplinares. A
pertença à área teológica garante a fidelidade da catequese à sua identidade eclesial de
práxis pastoral para a educação da fé. Como ciência pedagógica, contém os critérios e
os elementos necessários para atender às exigências próprias de qualquer processo
educativo. Essa dupla pertença constitui para a catequética uma riqueza indiscutível,
mas também, como testemunha a história, uma fonte contínua de tensões e de
incompreensões.
Tensão entre caráter científico e sapiencial da catequética, entre ciência e arte da
catequese. Nenhum dos dois aspectos pode ser ignorado ou subestimado: trata-se de
conjugar a dupla exigência, levando progressivamente a arte da catequese ao nível
mais elevado possível de racionalidade e sistematização.
Tensão entre teoria e práxis, entre reflexão e ação, entre nível empírico e
científico do planejamento e da realização da catequese. Também neste caso deve
haver o equilíbrio: um processo metodológico corretamente entendido deve
garantir a dialética sempre fecunda entre uma prática controlada e guiada pela teoria,
e uma teoria continuamente confrontada com a verificação e com o estímulo
decorrente da prática.
A existência de tais antinomias ou tensões dentro da reflexão catequética requer e
justifica o estudo e o aprofundamento que o nosso manual pretende oferecer.

ORIGINALIDADE E ESPECIFICIDADE DO ATO CATEQUÉTICO

Como se vê, a discussão catequética aponta para a necessidade de salvaguardar a


originalidade da catequese, muitas vezes concebida como divulgação popular de conteúdos
teológicos. Toda a idade moderna, a época do catecismo , assistiu à prática desse tipo de
relação de forma habitual: muitos catecismos tiveram teólogos como autores ou inspiradores,
foram concebidos como sínteses teológicas para efeito de divulgação e, por conseq ência,
toda a catequese foi entendida como ensino dessa doutrina aos fiéis cristãos.
Não há dúvida de que a teologia terá sempre uma tarefa de máxima importância com
respeito à catequese.

30
efeito, como reflexão sistemática sobre dados da fé e sobre a práxis da Igreja,
desempenha uma função de aprofundamento, sistematização e ligação com a tradição, que
não pode ser ignorada na obra catequética de educação da fé. Mas, por outro lado, não se
deve esquecer a distinção entre as duas funções eclesiais, que têm motivações e tarefas
diversas. A teologia, especialmente a sistemática, atende à necessidade de proporcionar base,
sistematização e aprofundamento científico à vida da fé e da práxis eclesial, ao passo que a
catequese põe-se a serviço do crescimento da fé de pessoas e grupos concretos, através de um
caminho de integração da mensagem cristã com suas exigências, problemas e expectativas.
São duas lógicas diferentes: a primeira mais intelectual, a segunda mais comunicativa.
Podemos dizer, como Coudreau, que a teologia é sobretudo estudo e reflexão sobre a palavra
de Deus, ao passo que a catequese é principalmente atualização e comunicação da palavra;
que o teólogo reflete sobre a palavra de Deus descoberta na fé, fides quaerens intellectum, ao
passo que o catequista propõe a palavra a fim de alimentar, desenvolver e educar a fé no
homem; a teologia é uma escola de reflexão, a catequese é uma escola de conversão.11

O NOSSO TRATADO

O que até agora foi dito permite-nos situar o presente manual em suas coordenadas
interpretativas. Ele se apresenta como um ensaio de catequética fundamental ou geral, vale
dizer, como uma tentativa de reflexão sistemática sobre a identidade e as condições gerais de
desenvolvimento da obra catequética. Pretende ser um esforço para esclarecer e aprofundar a
natureza e as tarefas da catequese hoje, no âmbito da consciência eclesial e diante de
situações e problemas do nosso tempo. Por isso, no centro da atenção se encontra a
identidade da função catequética, o seu significado na práxis pastoral da Igreja, os traços que
caracterizam sua nova face na reflexão atual.

11
Cf. F. Coudreau, Si può insegnare la fede? Leumann (Turim), Elledici, 1978, p. 32, Espanha CC p.72-75; A.
Fossion, La catéchèse dans le champ de la communication: ses enjeux pour l inculturation de la foi, Paris, Cerf,
1990, p. 495-96; Gruppo Italiano Catecheti, Teologia e catechesi in dialogo. Bolonha, Dehoniane, 1979, com
ampla biografia (p. 369-71). Convém lembrar a famosa expressão de Jungmann: Das Dogma sollen wir
kennen, verkünden müssen wir das Kerygma [ Devemos conhecer o dogma, mas é o querigma que
devemos anunciar ]: J. A. Jungmann, Die Frohbotschaft und unsere Glaubensverkündigung. Regensburg,
Pustet, 1936, p. 60.
31
Nem sempre as considerações que aqui fazemos poderão traduzir-se imediatamente em
prática pastoral (outras mediações e outros desenvolvimentos serão necessários). Sua função
seria sobretudo garantir a mentalidade de base do catequista ou do responsável pela
catequese, fornecer elementos claros e articulados para poder responder às perguntas
essenciais a respeito da prática catequética: o que é a catequese, que finalidade se propõe,
que papel desenvolve na comunidade eclesial, que características apresenta hoje etc.
Dividido em onze capítulos, articula-se essencialmente em quatro momentos
(ou aproximações) da identidade da catequese.
Num primeiro momento tenta-se uma dupla contextualização da catequese:
primeiro, no contexto pastoral e sociocultural do nosso tempo (cap. 1: Novos desafios
à catequese hoje ); em seguida, no quadro geral da práxis eclesial, como parte de
um todo no qual se insere organicamente e do qual recebe significado (cap. 2: A
catequese em um renovado projeto pastoral de evangelização ). Depois, à luz desse
quadro, apresenta-se uma primeira abordagem da identidade da catequese, vista
sobretudo em sua relação com a opção evangelizadora e no contexto das diversas
modalidades do ministério da palavra da Igreja (cap.3: A catequese hoje: identidade,
significado, tendências ).
Num segundo momento, o mais importante e central, são aprofundadas a tarefa e a
natureza da catequese em referência às três realidades ou categorias de base que lhe
dão o suporte essencial: a Palavra de Deus, a fé como resposta, e a Igreja como
ambiente e sujeito. Assim, fala-se da catequese como ministério profético ou da palavra
(cap. 4: A catequese, serviço da palavra, anúncio de Cristo ); como comunicação e
educação da fé (cap. 5: A catequese, iniciação à fé e educação da fé ) e como
mediação e experiência eclesial (cap. 6: A catequese, ação eclesial e educação para o
sentido da Igreja ).
O terceiro momento, que se liga ao precedente à maneira de um círculo
concêntrico mais amplo, aprofunda o significado da catequese em relação a outros
momentos que caracterizam o agir pastoral da Igreja: o serviço da caridade, a vida
comunitária, a ação litúrgica. Fala-se assim da tarefa da catequese na sua relação vital
com a diaconia eclesial (cap. 7: Catequese e compromisso sociocaritativo ), com o
exercício da koinonia (cap. 8: Catequese e comunidade ), e com o mundo dos
sacramentos e celebrações da Igreja (cap. 9: Catequese e liturgia ).

32
Os dois últimos capítulos abordam, nos seus termos fundamentais, o problema do
método ou métodos da catequese, abrindo destarte caminho para exposições
metodológicas específicas (cap. 10: Rumo catequese em ato: a
perspectiva metodológica ) e o tema, sempre atual, do perfil e da formação do
catequista ou animador da catequese (cap. 11: O catequista: identidade e formação ).
No seu conjunto, a abordagem que aqui apresentamos não é certamente exaustiva, mas
responde substancialmente às questões mais fundamentais da realidade catequética e
apresenta os traços significativos da nova face da catequese renovada depois do Concílio.
Algumas questões mais específicas foram abordadas no corpo dos capítulos, como, por
exemplo: o conceito de evangelização, a relação entre catequese e cultura, entre catequese e
religiosidade popular, a dimensão ecumênica da catequese, a relação entre catequese e ação
política, a questão do ensino religioso na escola (ERE). Outros aspectos e problemas são
apenas lembrados. Para um aprofundamento posterior, apresentamos, após cada capítulo e no
fim do volume, sugestões bibliográficas como guia e estímulo para o estudo.

33
34
Capítulo 1

Novos desafios à catequese hoje


O problema catequético no contexto cultural e pastoral
do nosso tempo
É muito natural que uma reflexão sobre a identidade e as
tarefas da catequese hoje parta da observação atenta da situação
concreta em que se encontra a própria catequese no contexto do
mundo atual e da práxis pastoral dos nossos dias. E isso para
evitar que a reflexão fique no abstrato, alheia aos problemas e
desafios que de fato são lançados à ação pastoral da Igreja
pelas mudanças ocorridas em nossa sociedade.

1. LUZES E SOMBRAS DA CATEQUESE HOJE

Há quase quarenta anos da conclusão do Concílio Vaticano II (1962-1965), podemos


nos perguntar: em que ponto se encontra a renovação da catequese promovida primeiro pelo
movimento catequético, depois pelo Concílio e pelos esforços e reflexões pós-conciliares?
Produziu frutos a desejada renovação, ou se deve talvez admitir que muitas expectativas se
frustraram? A catequese funciona hoje? Para onde está indo? Há um futuro para a catequese
da Igreja?

1.1 A virada do Concílio

O Concílio Vaticano II foi certamente o evento eclesial mais importante do século XX.
Conquanto muito pouco tenha dito explicitamente sobre o tema da catequese, seu impacto
real no campo catequético foi determinante e profundo. Trata-se de uma influência de certo
modo indireta, uma vez que no Concílio não foi possível abordar o tema da catequese. Nem
por isso foi menos determinante, se considerarmos todo o conjunto do pensamento conciliar,
sobretudo por haver incidido, de forma decisiva, nas realidades que se acham na base da
identidade da catequese,1 isto é, seu objeto ou conteúdo (a palavra de Deus, sendo a
catequese anúncio e serviço da palavra), seu sujeito (o ser humano crente, pois a catequese se
define como educação da fé) e o polo institucional (a Igreja, dado que a catequese é obra e
expressão da Igreja). Basta pensar nos grandes documentos conciliares que se referem a essas
três realidades fundamentais: a palavra, a fé e a Igreja.

1
Cf. G. Adler - G. Vogeleisen, Un siècle de catéchèse en France, 1893-1980 istoire -
éplacements - njeux. Paris, Beauchesne, 1981, cap. 9.
35
Pode-se dizer que o Concílio, sem dúvida, trouxe consigo um modo novo de
compreender a catequese e sua orientação.2 De certo modo, ele marca o fim de um longo
período da história da catequese, no curso da idade moderna, caracterizado pelo uso
preponderante dos catecismos e pela importância dada à memorização das fórmulas
catequéticas. O Concílio convida a reconduzir a catequese à primeira fonte da palavra de
Deus, redescoberta principalmente na Bíblia, a repensá-la tendo em vista a educação da fé
como atitude existencial e global da pessoa, e a recolocá-la num projeto de Igreja mais
comunial e diaconal. Mas o pós-concílio, sobretudo, é que irá desenvolver estas e outras
orientações.
O período pós-conciliar, pelo menos até os anos 80, foi um tempo muito fecundo e rico
em pesquisas no campo catequético. Sob o impulso das ideias conciliares, nasceu todo um
conjunto de iniciativas, de revisões e de crises cujo resultado é difícil de avaliar, dada a
complexidade e riqueza de aspectos instigantes da situação. Pôde-se, assim, delinear a nova
face da catequese pós-conciliar, com os traços característicos que dominaram, ao longo
dessas décadas, a reflexão catequética: primado da evangelização, emergência da Bíblia,
dimensão antropológica, sensibilidade sociopolítica, prioridade para os adultos, centralidade
da comunidade, valorização da mídia e das linguagens não verbais etc.3 Um mundo, pois,
permeado de novas exigências, em busca de respostas mais adequadas aos novos desafios
presentes numa sociedade profundamente mudada.4
Na Itália, o período pós-conciliar caracterizou-se pelo lançamento de um projeto
catequético, rico e articulado, cujo momento alto foi a publicação do documento de base
(RdC) e dos catecismos da Conferência Episcopal (CEI) para a vida cristã.5
Hoje, contudo, nos vem, naturalmente, a pergunta: em que ponto nos encontramos?
Todos esses esforços de renovação deram frutos? Um olhar amplo para o panorama da práxis
catequética hoje, faz ver uma realidade muito rica e complexa, na qual é possível distinguir
luzes e sombras, fatos positivos e aspectos negativos.

2
Cf E. Alberich, A catequese no contexto do Concílio Vaticano II e o pós-concílio , Revista de
Catequese (1993), n. 61, p. 15-26.
3
Cf. E. Alberich, loc. cit.
4
Cf. a rica documentação recolhida por J. Gevaert, Studiare catechetica, 4ª ed. Roma, UPS-FSE- Istituto di
Catechetica, 1999.
5
Sobre o projeto catequético da Igreja italiana, cf. L. Guglielmoni (ed.), Il rinnovamento catechistico in Italia a
25 anni dal Documento Base . Leumann (Turim), Elledici, 1995; G. Ronzoni, Il progetto catechistico italiano.
Identità e sviluppo dal Concilio Vaticano II agli anni 90. Leumann (Turim), Elledici, 1997.
36
1.2 A situação: fatos positivos

No panorama pastoral e catequético de nossos dias há decerto luzes, no sentido de que


não faltam experiências positivas, promissoras, plenas de futuro. O Diretório geral para a
catequese (DGC 29) destaca os seguintes aspectos positivos na situação atual: o grande
número de pessoas que se dedicam à catequese, o caráter missionário e catecumenal da ação
catequética, o incremento da catequese para adultos, a maior densidade e profundidade do
pensamento catequético.
Podem-se acrescentar outros fatos animadores: o grande aumento do número de
catequistas leigos, o florescimento de novas formas de comunidade, o despertar dos
ministérios leigos, a crescente exigência de formação religiosa, novas formas de redescoberta
e de leitura popular da Bíblia, o crescimento impressionante de itinerários catecumenais, o
grande avanço no reconhecimento do protagonismo da mulher, experiências promissoras de
catequese familiar, novas iniciativas de diálogo intercultural e inter-religioso. São muitos os
motivos de esperança e os sinais anunciadores de uma nova Igreja que cresce
silenciosamente a partir da base.

1.3 Um sistema em crise

Mas é preciso reconhecer que, na sua forma mais global e tradicional, a catequese
eclesial mostra sinais evidentes de uma grave crise.6 Na situação atual pode-se constatar a
presença de não poucos sintomas de um mal-estar e de uma insatisfação que sugerem uma
crise generalizada. Pode-se dizer, em termos gerais, que o sistema tradicional da catequese
já não funciona, não produz os frutos esperados, pelo menos se e tiverem presentes alguns
fatos e problemas bem evidentes.7 Por exemplo:

6
R. Viola, Salud y enfermidad de la catequesis , Medellín 23 (1997), n. 89, p. 69-74. Cf. também A. Fossion,
Dieu toujours recommencé: essai sur la catéchèse contemporaine. Bruxelas, Lumen Vitae/Novalis/Cerf/Labor
et Fides, 1997, p. 7-8.
7
Para uma visão da realidade catequética brasileira, pode-se consultar: L. Alves de Lima, Análise da realidade
catequética , Revista de Catequese 20 (1997), n. 80, p. 24-30; publicado também in CNBB- Linha 3, O hoje de
Deus em nosso chão. São Paulo, Paulus, 1998, p. 7-23 (Estudos da CNBB 78). Para análise mais ampla, pode-
se ver as lúcidas considerações de J. Martin Velasco, El malestar religioso de nuestra cultura. Madri, Paulinas,
1993; Id., La transmission de la fe en la sociedad contemporanea. Santander, Sal Terrae, 2002.

37
1.3.1 Crise e falência do processo tradicional de iniciação cristã e da socialização
religiosa na família e na escola

É uma constatação muito preocupante: a catequese de iniciação na realidade não


inicia mas, paradoxalmente, conclui . É a falência do processo tradicional de iniciação
cristã. Sabe-se que frequentemente o sacramento da confirmação (que alguns chamam o
sacramento do adeus , é o último dos sacramentos ) marca também para muitos jovens o
fim da prática religiosa, e talvez também da fé cristã. Eis o paradoxo e a falência: o processo
de iniciação cristã tornou-se na realidade processo de conclusão da vida cristã.
No fundo, estamos diante de um caso particular de uma crise mais geral, a do processo
de socialização educativa, em geral, e religiosa, em particular. Num contexto generalizado de
negligência na educação por parte de muitos adultos hoje, constata-se um vazio assustador
de propostas e de eficácia educativa. Emperraram os mecanismos de transmissão das crenças
e dos valores nos tradicionais agentes da educação. Se antes tais agentes família, escola,
Igreja tinham uma influência aproximada de 30% cada um, hoje essa influência talvez não
vá além de 10%. Por sua vez, a cultura ambiental e os meios de comunicação social,
principalmente, assumem a dianteira como agentes de socialização. Em particular, a
comunicação religiosa mostra-se emperrada e deficiente.8 Todo o dinamismo da socialização
religiosa sofre as consequências: o patrimônio de convicções e atitudes religiosas já não
passa de uma geração à outra.9

8
Cf., por exemplo, F. Garelli, Forza della religione debolezza della fede. Bolonha, Il Mulino, 1996; E. Feifel -
W. Kasper (orgs.), Tradierrungskrise des Glaubens. Munique, Kösel, 1987; Instituto Superior de Pastoral, La
trasmisión de la fe en la sociedad actual. Estella (Navarra), Verbo Divino,1991.
9
Cf. D. Hervieu-Léger, Tendenze e contraddizioni della modernità europea . In: D. Hervieu-Léger et al. La
religione degli europei: fede, cultura religiosa e modernità in Francia, Italia, Spagna, Gran Bretagna,
Germania e Ungheria. Turim, Fundação Giovanni Agnelli, 1992, p. 7-8.

38
1.3.2 Crise da pastoral sacramental

Também a pastoral sacramental, tomada no seu conjunto, suscita perplexidades.


Batismos, matrimônios, funerais, aniversários: muitas vezes encontramo-nos diante de
cerimônias e ritos sagrados nos quais parece não existir a expressão de uma atitude autêntica
de fé cristã. Se os sacramentos cristãos são por natureza sacramentos da fé , os responsáveis
pela pastoral sabem quão difícil é querer oferecer sacramentos a quem, no fundo, pede um
rito de passagem ou a satisfação de uma exigência social.10 Há tamanha desproporção entre
demanda e oferta nessa negociação sagrada que, muitas vezes, ela deixa um
sentimento de amargura e frustração. E, como se sabe, a pastoral sacramental está
estreitamente vinculada ao exercício da catequese.

1.3.3 Precariedade da catequese para adultos

Ainda hoje, a catequese, na maioria das nossas comunidades, é, sobretudo, catequese


infantil. Há muitos anos se insiste na urgência e no primado da catequese para adultos e na
necessidade de a catequese favorecer o crescimento de uma fé adulta numa Igreja adulta.
Mas a realidade encontra-se ainda muito longe dessas proclamações solenes. A catequese
para adultos nunca consegue tomar impulso, enquanto se despende a maior parte dos
esforços catequéticos na catequese das crianças e dos adolescentes.11 Explica-se, destarte, o
caráter muitas vezes infantilizante da práxis catequética, ainda distante das exigências e
características de uma fé adulta no mundo de hoje. Além disso, cumpre reconhecer também
que são muitas as pessoas, tanto pastores como fiéis, que no fundo têm medo da maturidade
e, assim, preferem refugiar-se numa religiosidade dócil e infantil, muito cômoda para todos.

10
Cf. I. M. Pignatiello, Comunicare la fede: saggi di teologia pastorale. Cinisello Balsamo (Milão), San
Paolo, 1996, p. 391.
11
Cf. E. Alberich - A. Binz, Catequese com adultos: elementos de metodologia. São Paulo, Salesiana,
2001, p. 39-44.
39
1.3.4 Separação entre fé e cultura e crise da linguagem catequética

A linguagem e a significatividade da nossa catequese ainda constituem problema.12


Não se desenvolveu a capacidade de apresentar a mensagem cristã de forma inteligível e
significativa para os nossos contemporâneos. É preciso reconhecer que a catequese
tradicional, de diversos pontos de vista, não é significativa e não comunica. Um documento
catequético latino-americano diz isso, de forma paradoxal:

Na Igreja existe um grande mal-estar, porque sua forma de comunicar o Evangelho é em geral
pobre e precária. Muitas vezes tem-se a impressão de que emprega linguagens que ninguém
compreende, dirige-se a um público que já não existe e responde a perguntas que ninguém se
propõe ou a problemas que ninguém vive (CAL n. 131).

É o problema não resolvido da linguagem e da significatividade da nossa catequese.


Muitas vezes a catequese torna-se ineficaz porque não comunica uma mensagem
compreensível e significativa para os homens e as mulheres do nosso tempo. Podemos
constatá-lo muitas vezes, por exemplo, no vasto mundo da literatura catequética e dos
catecismos, mesmo oficiais. Não faltam certamente esforços iluminados e até bons
resultados. Contudo cumpre reconhecer que muitos instrumentos catequéticos são, sim, obras
talvez bem cuidadas do ponto de vista bíblico e teológico, mas muito deficientes e ineficazes
do ponto de vista catequético.

1.3.5 Formação insuficiente dos catequistas, dos agentes pastorais, dos sacerdotes

É verdade que são muitos os esforços e as experiências positivas no campo da


formação, mas, falando em termos gerais, deve-se admitir que todo o âmbito da pastoral
sofre por insuficiência e inadequação da obra de formação.13 O problema torna-se
particularmente preocupante no caso dos sacerdotes e dos seminaristas, que sofrem de uma
falta crônica de preparação adequada no âmbito pastoral em geral e catequético em
particular.14 Mas também a formação dos catequistas, não obstante louváveis esforços, deixa
muito a desejar e se revela muito distante de poder responder às exigências atuais.15

12
Cf. F. Merlos, Hablar de Dios con palabras humanas . In: Sociedad de Catequetas Latinoamericanos
(Scala): encrucijadas de la catequesis a la luz del directorio general para la catequesis. San Jose, Costa Rica,
Conec, 1999, p. 34-35.
13
Cf. CNBB, Formação de catequistas: critérios pastorais (Estudos da CNBB 59), 1990; R. Viola, Salud y
enfermidad de la catequesis, p. 71-72.
14
Cf. L. M. Pignatello, Comunicare la fede, p. 51-52.
15
Cf. F. Merlos, Catequesis latinoamericana. Las tentaciones de un ministerio .,Medellín 20 (1994), n. 80, p.
607-16; Id. Características atuais da catequese na América Latina , Revista de Catequese 21 (1998), n. 83, p.
6-13.
40
2. EM BUSCA DOS PORQUÊS

Diante de uma situação tão problemática, perguntamo-nos: por que tudo isso? Por que
o sistema catequético funciona tão mal? De quem é a culpa?
As respostas, naturalmente, podem ser muitas. Muitos veem a causa de tudo na cultura
e no mundo de hoje. O mundo, a sociedade, extraordinariamente mudados, é que criam
problemas e são os verdadeiros responsáveis pelo fracasso. Ou então coloca-se a
responsabilidade nos destinatários da obra catequética, jovens e famílias que não se mostram
receptivos nem realmente interessados na vida de fé.
Para outros, a causa deve estar no interior da realidade eclesial e pastoral. É culpa da
Igreja, dos padres, da pastoral, da catequese. Não faltam os que culpam precisamente a
renovação catequética pós-conciliar, responsável pelo abandono do estilo tradicional da
catequese doutrinal.
Cremos não ser sensato dar respostas tão simples e categóricas. E no que tange à
atividade catequética, parece legítimo perguntar: mas o problema é somente catequético ,
ou envolve muitos outros aspectos e setores da pastoral da Igreja?
Isso leva a concluir que a situação é de fato bem complexa. Não se pode atribuir a crise
da catequese apenas à própria catequese. Certamente ela faz parte de uma crise muito mais
ampla, que diz respeito à religião, às Igrejas, ao cristianismo como um todo. Nesse sentido
será necessário um esforço adicional de análise e interpretação. É verdade, por um lado, que
o contexto, o campo do mundo (DGC n. 17-23), encontra-se enormemente mudado em
relação ao passado, com muitas transformações de ordem sociocultural, política e econômica
que condicionam fortemente os processos de socialização religiosa. Mas também o fato
religioso, em suas várias manifestações, sofreu profundas transformações. Daí a necessidade
de um exame cuidadoso dos fatores em jogo.

2.1 Fatores socioculturais, políticos, econômicos

Nesses vários âmbitos, nossa sociedade se caracteriza por um conjunto de


condicionamentos e situações que revelam não apenas a existência de profundas mudanças,
mas também um dinamismo acelerado, difícil de administrar e de controlar. Algumas
manifestações de mudanças são bem conhecidas, e bastará aqui citá-las: o vasto fenômeno da
globalização, o caráter complexo e plural da sociedade, o rico mundo da comunicação
midiática, as profundas mudanças na família, o desenvolvimento científico e tecnológico, a
explosão dos nacionalismos e dos fundamentalismos, as muitas e variadas formas de
intolerância, a des ordem econômica internacional.

41
A todos esses elementos acrescentem-se os condicionamentos e as transformações
culturais que caracterizam o nosso tempo, ligados às exigências da modernidade, da pós-
modernidade e da sociedade midiática.16
tre as exigências e os valores da modernidade, lembramos: secularização,
domínio da racionalidade científica, destaque do indivíduo, sentido da democracia,
desejo de participação e de comunicação.
entalidade pós-moderna traz consigo traços característicos: crise das
ideologias e da metafísica, o chamado pensamento fraco , difusão de
identidade e de pertenças efêmeras, de valores fugazes, nova percepção do tempo,
primado da fragmentação e da dispersão.
or fim, a influência decisiva da sociedade midiática, com toda a sua força de
comunicação e de transformações culturais.
É no quadro de todos esses fatores que se situam as atuais transformações do fato
religioso.

2.2 Transformações e ambiguidades do fato religioso

A situação religiosa no mundo de hoje apresenta-se de maneira bem complexa,


interessante, problemática. Há de um lado a crise evidente das instituições religiosas, das
religiões tradicionais. Em especial, cumpre registrar, sobretudo na Europa, uma profunda
crise do cristianismo.
Não faltam, a propósito, diagnósticos preocupados, alarmantes. Alguns descrevem a
situação como crise profunda (J. Martín Velasco, J. L. Ruiz de la Peña), crise da Igreja,
verdadeira catástrofe (E. Biser), crise de Deus (Gotteskrise: J. B. Metz). Recorre-se às
imagens do eclipse, do inverno, da demolição. Compara-se o cristianismo a pontes que
serviram à construção da cultura ocidental, mas que agora se tornaram inúteis. Ou então a um
conjunto de belas ruínas para serem admiradas num museu, ou utilizadas como
elementos ornamentais.17

16
Cf. J. Gevaert, Catechesi e cultura contemporanea: l insegnamento della fede in um mondo
secolarizzato. Leumann (Turim), Elledici, 1993; A. Fossion, Dieu toujours recommencé; J. Martin Velasco, El
malestar religioso de nuestra cultura. Madri, Paulinas, 1993.
17
Vejam-se, por exemplo, as descrições de J. Martin Velasco, El malestar religioso de nuestra cultura,
p. 11-15; L. Gonzalez-Carvajal, Evangelizar en un mundo poscristiano. Santander, Sal Terrae, 1993.
42
Por outro lado, no entanto, constata-se certa capacidade de resistência retorno da
religião, e também o surgimento de novas formas e movimentos religiosos. Por isso, em vez
de recorrer a categorias interpretativas negativas e totalizantes, como secularização ,
descristianização , eclipse do sagrado e semelhantes, parece mais objetivo falar
simplesmente de transformação do fato religioso, de transição religiosa , de religião
difusa .18
É possível uma tentativa de caracterização da atual situação religiosa, sobretudo nos
países de antiga tradição cristã, se se fizer referência a alguns aspectos típicos da nossa
sociedade. Desta maneira:

2.2.1 Em uma sociedade secularizada: a religião como realidade desprezada

Servindo-nos de uma imagem comercial, poderíamos dizer que a religião e a fé cristãs,


por muito tempo consideradas um valor fundamental para a vida, apresentam-se hoje como
um produto desprezado, não mais significativo aos olhos de muitos. Viver de fé e viver a fé
são coisas que, no fundo, podemos dispensar sem graves inconvenientes. A solução dos
problemas concretos da vida deve ser procurada em outro campo. São tantos hoje, a começar
por muitos adolescentes, que fazem uma descoberta de certa maneira assombrosa: que é
possível abandonar a fé e a prática religiosa sem que nada aconteça, sem sentir todas as
consequências negativas que em tese deveriam seguir-se a um passo tão grave. Essa é uma
experiência de muitos contemporâneos nossos. Não acontece nada: a fé é vista como algo de
que se pode prescindir. E não se sabe como responder a perguntas fundamentais como estas:
por que ser cristão? Que necessidade se tem disso? Vale a pena?
As saídas diante dessa dificuldade são, muitas vezes, formas mais ou menos explícitas
de abandono, de distância em relação às convicções e comportamentos cristãos.
Concretamente assumidas, podem se manifestar:
cusa explícita, expressa na negação ateia ou na irreligiosidade declarada. Não
é a forma mais frequente. Em geral, os levantamentos sociológicos indicam
uma porcentagem reduzida (da ordem de 5%) dos que se declaram
explicitamente pertencentes a tais categorias.
ito mais frequente é a indiferença religiosa de quem simplesmente prescinde da
religião, organizando a própria vida à margem de qualquer preocupação ou
sensibilidade pelo assunto.

18
Cf. F. Garelli, Religione e Chiesa in Italia. Bolonha. Il Mulino, 1991, p. 33-38; R. Cipriani, La religione
diffusa. Roma, Borla, 1988; R. Diaz-Salazar, La transición religiosa de los españoles . In R. Diaz-Salazar - S.
Giner (eds.), Religión y sociedad en España. Madri, CIS, 1993.
43
2.2.2 Numa sociedade pluralista: religião, uma opção entre muitas

O pluralismo e a complexidade são características da nossa sociedade. Também no


mercado religioso apresentam-se muitos produtos, velhos e novos, de grande variedade e
plenos de ambiguidade. A fé cristã aparece como um produto entre muitos outros em
concorrência com tantas outras propostas alternativas, e não mais na situação de
monopólio que de algum modo a tornava necessária no passado. A opção cristã não é mais
a única possível nem se apresenta sempre como a melhor na percepção de muitos homens e
mulheres de hoje.
Ora, o pluralismo não somente introduz uma grande variedade de opções possíveis,
mesmo de tipo religioso, mas em muitas pessoas gera até uma situação de confusão, de
perplexidade, dado que todas as ofertas culturais parecem merecer igual credibilidade. Elas
se refugiam então em formas diversas de agnosticismo: talvez percebam a importância do
problema da fé, mas ficam bloqueadas pela impossibilidade de dar uma resposta convincente
ao problema, permanecendo completamente no escuro. No caso da maioria, essa situação é
vista como perplexidade, isto é, como incap cidade de tomar posição diante da enorme
variedade de respostas possíveis ao problema e à complexidade do tema.
A situação de pluralismo certamente também comporta aspectos positivos. O primeiro
deles é a liberdade religiosa. A religião apresenta-se hoje como o espaço por excelência da
liberdade,19 e, assim, abre-se a todos a possibilidade, ou antes o dever e o direito de se
colocar diante das opções religiosas de forma pessoal e livre. E é uma situação que também
convida a todos ao realismo e à humildade.

19
A. Fossion, Dieu toujours recommencé, p. 14-16.
44
2.2.3 Diante da crise das instituições e das Igrejas: a religião oficial com pouca
credibilidade

Na situação atual, a crise dos sistemas e das instituições, as religiosas inclusive, faz
com que suas mensagens se mostrem pouco críveis, desacreditadas. A religião
institucionalizada é vista por muitos como um produto mal divulgado e mal administrado.
Mesmo no âmbito cristão, particularmente entre os jovens, a Igreja não goza de muita estima
e credibilidade, sobretudo em vários de seus aspectos institucionais e manifestações
concretas. Isso acarreta grande dano à opção de fé hoje: pode ser possível dizer que, embora
o produto oferecido seja bom em si (o Evangelho, a fé cristã), não o é a firma ou a
sociedade que o administra (a Igreja), da maneira como é percebida. E como a fé cristã se
acha estreitamente ligada à realidade eclesial, pelo menos na sua forma mais clássica e
tradicional, muitos encontram obstruído o caminho para uma redescoberta convincente dos
valores cristãos.
Essa crise explica também a disseminação de uma religiosidade selvagem, não ligada
às instituições, às Igrejas oficiais. E ainda que não poucos permaneçam ancorados
na pertença eclesial e integrados oficialmente à fé cristã, esta é vivida de forma
fortemente subjetiva. Não se sentem vinculados pelas crenças, doutrinas ou declarações do
magistério eclesiástico, mas decidem pessoalmente que elementos e normas irão aceitar ou
rejeitar. É a posição de muitos crentes, mesmo no círculo dos fiéis praticantes, que vivem
subjetivamente, e apenas em parte, tanto os pontos de fé e as manifestações da prática
religiosa (frequência à missa, sacramentos, prescrições rituais etc.), quanto, e
principalmente, as normas relativas ao

Outros, hoje também relativamente numerosos, adotam posições sincréticas de


aceitação de formas religiosas não cristãs, sobretudo no âmbito dos novos movimentos
religiosos, em que se misturam elementos propriamente cristãos com outros de origem
diversa (seitas cristãs ou pseudocristãs, formas religiosas orientais, movimentos esotéricos
etc.).21
Mas também nessa situação podem-se ressaltar alguns elementos e aspectos positivos.
Com efeito, essa crise obriga as Igrejas a um sério exame de consciência e a uma vontade
decidida de renovação e reforma. Os fiéis, por outro lado, veem-se estimulados a um olhar
mais crítico e mais adulto no que se refere à sua pertença religiosa.

20
Cf. F. Garelli, Forza della religione debolezza della fede. Bolonha, Il Mulino 1996; R. Mion, Domanda di
valori e di religione nei giovani dell Europa dell Est e dell Ovest , Salesianum 57 (1995), p.305-57.
21
Cf. M. Introvigne, Il sacro postmoderno: Chiesa, relativismo e nuova religiosità. Milão, Gribaudi, 1996.
45
2.2.4 Na cultura pós-moderna: religião, experiência efêmera

Numa sociedade dominada em muitos setores pelo fragmentário e pela crise dos
valores fortes, a própria religião corre o risco de ser rebaixada a produto descartável. Com
efeito, são frequentes as adesões e convicções parciais, provisórias, fragmentárias. Tem-se
medo dos compromissos de longo prazo, das verdades e valores definitivos.
Prefere-se a opção provisória, a experimentação, a adesão parcial.
Daí resulta uma acentuada subjetivização da própria religiosidade. Muitos, conquanto
ligados ao mundo da religião e da fé, vivem essas dificuldades numa atitude de aceitação
parcial e condicional, fazendo uma escolha e uma seleção da vida religiosa, filtrando-a
através da própria subjetividade. O sujeito é que decide as coisas que irá aceitar ou
abandonar, segundo a própria sensibilidade e as próprias necessidades. Vive-se uma espécie
de religião à la carte , de religião do faça você mesmo , religião patch-work , na qual
cada um prepara a própria sopa religiosa ,22 de uma maneira fragmentária, desorganizada,
muitas vezes contraditória. Aqui e acolá desponta uma busca do espiritual que não
coincide necessariamente com o religioso.
Também aqui não faltam aspectos positivos: superação de certos absolutismos e
dogmatismos, personalização da fé, revalorização da experiência, conexão com pessoas
significativas e grupos de referência etc.

2.2.5 Separação entre fé e vida, fé e cultura: religião in significante

Talvez a maior causa da crise e de perplexidade para as pessoas do nosso tempo resulte
da separação ou do divórcio, que muitas experimentam, entre fé e vida, entre fé e cultura. A
fé parece estranha, distante, muitas vezes em contradição com as exigências e valores
da cultura e da vida. É um entrave ligado frequentemente ao tipo de educação religiosa
recebida, ou ao modo concreto como se vive a fé tradicionalmente, modo que a torna
marginal à vida, sem significado e sem valor para a existência.

22
Cf. R. Mion, Domanda di valori.
46
É assim que muitos se apegam às referências cristãs ou às formas tradicionais da
religiosidade popular como a uma religião do cenário ,23 como a uma espécie de pano de
fundo ou referência última que, entretanto, não influi de modo algum nas opções concretas e
significativas da própria vida. Ou então o mundo da fé, vivido e expresso em termos
culturalmente distantes, aparece como algo existencialmente vazio, eticamente irrelevante, e
culturalmente estranho e estéril.24
Nessa situação, muitos julgam dever escolher a vida e a cultura, abandonando a fé. Mas
há também outros tantos cristãos desejosos de permanecer fiéis a uma tradição religiosa que
consideram importante para eles, mas que não conseguem integrar de maneira convincente a
seu universo vital e cultural. Vivem, por isso, a fé cristã de forma idealista, marginal, paralela
à própria existência, experimentando talvez uma espécie de esquizofrenia religiosa. Sentem-
se pertencentes a dois mundos diferentes: o da fé e o do mundo e da cultura de hoje, mundos
muito distantes entre si, sem ligação nem diálogo, mundos que simplesmente coexistem. Tal
situação pode ser vivida:
de forma aparentemente tranquila, quando as pessoas evitam qualquer
confronto e diálogo entre fé e vida, entre a própria religiosidade e as exigências da
mentalidade e da cultura de hoje. A vida transcorre em estradas paralelas, justapostas,
sem ligação. E muitas vezes vive-se essa situação sem problemas, ou evitando-se
criá-los, mesmo que objetivamente os comportamentos se tornem contraditórios e
as posições inconciliáveis com uma autêntica visão de fé;
ou, ao contrário, sente-se a profunda insatisfação de uma situação inaceitável,
sofrendo a tensão e o mal-estar de uma dilaceração interior e de uma dupla pertença,
que se torna intolerável ou profundamente insatisfatória. O resultado é muitas vezes o
abandono da fé ou a sua subjetivação.
Mas também nesse caso se trata de um desafio que pode ter não poucos efeitos
positivos: o que está em jogo é tão importante que deveria levar à busca apaixonada de
significatividade, à ativação do diálogo com as culturas, à correlação entre fé e vida. Então,
todo o conjunto da experiência religiosa e cristã será transformado, porque se trata, no fundo,
de realizar (como veremos detalhadamente mais adiante) um novo modelo de cristão, uma
nova forma de comunidade cristã, um projeto renovado de Igreja.

23
Cf. F. Garelli, La religione dello scenario: la persistenza della religione tra i lavoratori. Bolonha, Il Mulino,
1986.
24
J. Martin Velasco, Presencia evangelizadora y compromiso de los cristianos , Teologia y catequesis
(1987), n. 23/24, p. 539; cf. A. Torres Queiroga, Creer de outra manera. Madri, PPC, 1999; Id. Fim do
cristianismo pré-moderno. São Paulo, Paulus, 2003.
47
2.2.6 Na sociedade midiática: religião, realidade fluida, virtual, fragmentária, realidade-
espetáculo

No mundo da comunicação social e dos novos meios eletrônicos e informáticos, a fé


cristã vê-se muitas vezes reduzida ao papel de proposta contracultural ineficaz, produto
perdido, esmagado pela poderosíssima máquina socializante e iniciática, diante da qual a
experiência religiosa se afigura insignificante, inteiramente marginal. A religião revela-se aos
olhos de muitos como uma realidade que não goza de boa imagem. Ou então, no grande e
mutante mercado das ofertas culturais mais variadas, o fenômeno religioso corre o risco de
parecer um produto vistoso e efêmero, algo que por um momento se torna espetáculo.
Por outro lado, os meios de comunicação são portadores de nova mentalidade e de
nova cultura carregadas de riscos relacionados à tarefa de formação:

Pensados para a promoção do homem, eles podem tornar-se instrumentos de condicionamento,


à medida que nivelam as médias de apreço, deformam a realidade, eliminam a identidade
cultural dos vários grupos étnicos ou sociais. Promotores de uma cultura da emotividade que
tende a empanar o sentido crítico do indivíduo, se colocados a serviço das exigências
comerciais da demanda e da oferta, eles se tornam crônica do que sucede no mundo, sem
deixar espaço à reflexão, e terminam, assim, por induzir comportamentos sociais como o
conformismo, o desinteresse, o indiferentismo.25

A cultura oferecida pela mídia é em grande parte uma cultura da fragmentação e da


superficialidade: é verdade não o que é verdade, mas o que é mostrado, as coisas acontecem
apenas no momento em que a mídia fala delas, com o grave risco de que a verdade e a
profundidade dos problemas enfrentados fiquem comprometidos.26

25
P. C. Rivoltella, Communicazione . In: M. Midali - R. Tonelli (eds.), Dizionario di Pastorale Giovanile.
Supplemento alla prima edizione. Leumann (Turim), Elledici, 1992, p. 42.
26
P. C. Rivoltella, Comunicazione, p. 46.
48
Tal cultura pode reforçar, em alguns de seus promotores, uma mentalidade prêt-à-
porter , que se traduz em produtos de consumo também para a fé. Basta pensar no que foi
feito nas Igrejas eletrônicas dos Estados Unidos e em algumas seitas. Isso pode ser
favorecido pelo caráter evanescente, próprio da mídia, na qual, por exemplo, uma
transmissão de rádio ou de televisão faz esquecer a precedente e o que nela foi dito.

Esta descrição da situação religiosa no nosso tempo, embora exija maior complementação e
detalhes, permite medir o alcance dos desafios que o mundo atual lança à ação pastoral e à
comunicação da fé. Não faltam, como vimos, aspectos positivos, mas os elementos
problemáticos nos causam viva impressão. As respostas pastorais não poderão ser fáceis nem
passíveis de previsão.

3. RESPOSTAS PASTORAIS

Numa primeira abordagem, veremos que respostas a Igreja, instada pela situação, está
oferecendo ao mundo de hoje, para continuar sua missão de anúncio e realização do
Evangelho.

3.1 Algumas palavras de ordem

Na consciência eclesial dos dias de hoje, as respostas pastorais aos novos desafios
concentram-se em torno de algumas opções expressas mediante termos que se tornaram
comuns. Vamos simplesmente enumerá-las, já que serão cuidadosamente examinadas no
decorrer das nossas reflexões sobre a catequese:
evangelização (ou nova evangelização ), como opção pastoral prioritária;
pastoral missionária, descrita também como passagem de uma pastoral
conservadora para uma pastoral evangelizadora, missionária;
inculturação, para a superação da separação entre fé e cultura;
personalização da fé, como resposta a um cristianismo sociológico e formal;
comunidades, pequenas comunidades, como sujeito eclesial e ponto de
referência;
planejamento pastoral, para superar a improvisação e o empirismo.
Essas palavras de ordem apontam um novo caminho para a ação pastoral. No centro
encontramos a opção evangelizadora como linha dominante da nova visão. Será importante
não perdê-la de vista, para podermos situar o problema da catequese hoje. Mas se essas
coisas constituírem alguns dos conteúdos fundamentais do planejamento pastoral, interessa-
nos também chamar a atenção para o espírito com que se abordam atualmente os grandes
temas da evangelização e da catequese.

49
3.2 Atitudes pastorais inadequadas

Ante a gravidade e complexidade dos problemas que mencionamos, não faltam atitudes
e respostas pastorais que parecem de todo inadequadas. G. Adler resume-as assim:

A condenação inapelável de uma cultura de morte , a restauração, a redução horizontalista, a


fuga na pura interioridade. Tais soluções têm o grave defeito, seja de rejeitar a
modernidade, seja de contorná-la, seja de fundir-se nela sem espírito crítico, impelindo a
religião para a esfera do privado.27

Eis aí, em síntese, duas posições insatisfatórias bastante frequentes.

3.2.1 Distância cultural e rotina pastoral

É o que acontece com os agentes pastorais quando a situação cultural é simplesmente


ignorada, quando não se compreendem as mudanças e se desenvolve a prática pastoral
habitual sem nenhum esforço de análise e interpretação. Faltam totalmente o diálogo cultural,
a avaliação e o planejamento. A pastoral segue as linhas de sempre, tradicionais, não
obstante as contradições, e a catequese continua seu curso de sempre com o costumeiro tom
doutrinal e sistemático.

3.2.2 Demonização do mundo e da cultura

É o que fazem aqueles que põem toda a culpa na cultura e no mundo de hoje. A
situação atual é condenada, demonizada, e diante do mundo considerado como perdido
assumem-se posições fundamentalistas, integristas, inspiradas no saudosismo e na rigidez
doutrinal. As saídas possíveis, em geral, são duas:
espírito de cruzada e de contraposição, para converter o mundo e reconquistar o
espaço perdido;
ou então a fuga do mundo, considerado irrecuperável, para refugiar-se no ninho
seguro do grupo, do movimento, da seita.

27
G. Adler, L avenir de l enseignement religieux?. In: R. Brodeur - G. Routhier (eds.), L enseignement
religieux: questions actuelles. Ottawa/ Paris/ Bruxelas. Novalis/ Le Cerf/ Lumen Vitae, 1996, p. 144.
50
Essas atitudes, embora muito frequentes, aprofundam o fosso de desconfiança
recíproca entre Igreja e mundo moderno, e constituem um verdadeiro obstáculo para os
esforços de evangelização:

Se a imagem da Igreja não atrai a simpatia, isso pode estar relacionado ao fato de que ela
muitas vezes oferece ao mundo uma imagem muito negativa de si mesma. Desse ponto de
vista, a falta de simpatia do mundo para com a Igreja parece corresponder perfeitamente à falta
de simpatia da Igreja para com o mundo.28

3.3 Por uma pastoral aberta ao futuro

Pensamos que deva prevalecer hoje uma atitude confiante e positiva diante da cultura,
do mundo atual, da missão evangelizadora da Igreja. Essa confiança se baseia em duas teses
ou convicções de base, referentes à situação complexa já descrita:

, sobretudo, de ordem cultural. O que se acha em crise não é tanto o


cristianismo em si, mas

A segunda convicção é a de que, não obstante tantos esforços e boa vontade, a práxis
pastoral das comunidades cristãs não acompanhou o ritmo dos tempos, permanecendo efetiva
e afetivamente ligada à situação já secular da cristandade. É uma práxis pastoral paralisada
de certo modo pela inércia operativa, que se encontra deslocada diante dos desafios do
mundo atual. Parece necessário difundir uma nova mentalidade e conceber um renovado
projeto pastoral.30

28
A. Fossion, La catéchèse dans le champ de la communication: ses enjeux pour l inculturation de la foi. Paris,
Cerf, 1990, p. 341.
29
É a tese, por exemplo, de J. Martin Velasco, El malestar religioso de nuestra cultura, e de M. Kehl, Wohin
geht die Kirche? Eine Zeitdiagnose. 4ª ed. Friburgo/ Basil ia/ Viena, Herder, 1996.
30
L. M. Pignatiello, Comunicare la fede, p. 379-99.
51
A atitude confiante e positiva que almejamos inspira-se também numa convicção de fé no amor
que Deus tem pelo mundo: Deus tanto amou o mundo... (Jo 3,16). E sabemos que Deus ama
também este mundo, e que a nossa época não é melhor nem pior que as outras, mas é simplesmente
diferente. Não tem sentido pensar que o mundo atual, com sua cultura e seus problemas, esteja mais
distante do Evangelho que as outras épocas.
É assim que, com espírito e atitude fundamentais para enfrentar os problemas da evangelização e
da catequese, recomendamos algumas condições e convicções, que mais adiante retomaremos:
simpatia e abertura ante a cultura e o mundo de hoje;31
proposta corajosa e vontade de diálogo intercultural e inter-religioso;
inculturação e contextualização da fé no mundo de hoje;
evangelização como opção prioritária na Igreja;
catequese renovada, no contexto da opção evangelizadora, a serviço de uma fé personalizada
e madura, tendo em vista um novo tipo de cristão, um novo estilo de comunidade, um projeto
renovado de Igreja.

SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS

Para uma visão crítica e global da situação da pastoral e da catequese, cf.:


ALBERICH, E. La catechesi alla fine di um secolo: crisi e speranze , Orientamenti Pedagogici 46
(1999), n. 6, p. 1.097-108.
FALLICCO, A. Le cinque piaghe della parrocchia italiana tra diagnosi e terapia. Catania, Edizioni
Chiesa-Mondo, 1995.
. Pedagogia pastorale questa sconosciuta. Itinerario di formazione per operatori
pastorali presbiteri, religiosi e laici. Catania, Chiesa-Mondo, 2000.
FOSSION, A. Dieu toujours recommencé: essai sur la catéchèse contemporaine. Bruxelas, Lumen
Vitae/ Novalis/ Cerf/ Labor et Fides, 1997.
PIGNATIELLO, L. M. Comunicare la fede. Saggi di teologia pastorale. Cinisello Balsamo
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prospectivas. São Paulo, Paulinas, 2003.
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Dieter Emeis. Friburgo/Basileia/Viena, Herder, 1998.

Sobre a situação cultural e religiosa atual e a tarefa da evangelização no mundo de hoje,


indicamos:
ALVES DE LIMA, L. A transmissão da fé e a nova evangelização na perspectiva da América
Latina e Caribe . In: FISICHELLA, Rino (org.). Il Vaticano II: recezione e attualità alla luce
de giubileo. San Paolo, Roma, 2001, p. 138-49; publicado também REB 60 (2000), fasc. 239,
setembro, p. 578-90; Catecheticum 3 (2000), p. 119-28.

31
Cf. A. Fossion, La catéchèse dans le champ de la communication, p. 341.
52
BENEDETTI, L.R. O ´novo clero´: arcaico ou moderno? , REB 59 (1999), p. 88-126.
BERZOSA MARTÍNEZ, R. Nuova religiosidad emergente , Nuevo Dic. Cat., p. 1.641-53.

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Catequese 25 (2002), n. 98, p. 5-21.
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COMBLIN, J. Os ´movimentos´ e a pastoral latino-americana , REB 43 (1983), n. 170, p. 227-
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DAMACENA, - FERNANDES, S R. A. Dinâmicas do catolicismo contemporâneo: leitura a
partir das crenças e motivações , Revista de Catequese 24 (2001), n. 94, p. 27-43.
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trajetórias, diagnósticos, prospectivas. São Paulo, Paulinas, 2003, p. 211-71 (com ampla
bibliografia).

54
Capítulo 2

A catequese
em um renovado projeto pastoral
de evangelização

Diante dos novos desafios à catequese hoje, é importante


colocá-la, antes de tudo, no contexto de um projeto pastoral
corajoso e aberto, numa perspectiva de evangelização e de
diálogo cultural. Isto, seja para evitar que a catequese fique
isolada no conjunto da ação pastoral, seja para ressaltar a
urgência de uma ação programática e global a serviço de um
projeto pastoral bem elaborado. Somente desse modo a
catequese poderá dar uma contribuição válida à obra da
evangelização.

1. UM QUADRO ARTICULADO DE AÇÃO PASTORAL

A realidade de hoje obriga a repensar a missão evangelizadora da Igreja e a determinar


suas opções prioritárias num projeto pastoral renovado. Perguntamos: como definir
adequadamente a tarefa da Igreja no mundo de hoje? Como ordenar e reduzir a um projeto
unitário suas várias atividades? Que projeto pastoral adotar, se quisermos de fato superar a
crise de credibilidade do cristianismo e ter bom êxito na obra de evangelização?
No cerne desses problemas encontra-se a necessidade de reformular a própria
identidade, como Igreja e como experiência de fé numa sociedade em transformação. Os
cristãos de hoje devem esclarecer para si próprios a especificidade e o alcance da própria
missão, como pessoas e como comunidade. E há ainda a perspectiva quanto ao futuro: para
que Igreja nos devemos encaminhar? Que projeto global de Igreja deve orientar os esforços
dos que trabalham no âmbito catequético e pastoral? O Vaticano II convidou-nos a ler os
sinais dos tempos, isto é, os sinais que de alguma maneira prefiguram o futuro da Igreja e da
sua presença no mundo.
Começamos o nosso itinerário com uma tentativa de descrever globalmente o quadro
articulado da ação evangelizadora da Igreja (ver diagrama na página seguinte). Falamos de
ação evangelizadora no sentido global indicado na Evangelii Nuntiandi (n.14), tomando-o
também em perspectiva catequética: Os agentes da evangelização devem saber agir com
uma visão global desta, integrada ao todo da missão da Igreja (DGC n. 46).
Queremos considerar todo o conjunto da ação pastoral, ou melhor, eclesial , evitando
o perigo de polarização clerical que, durante séculos, concentrou a missão da Igreja nas mãos
dos pastores (bispos, sacerdotes, religiosos). Temos presente aqui a ação e o testemunho de
todos os cristãos como Igreja, embora respeitando a diversidade dos ministérios e das
articulações do corpo eclesial.

55
ARTICULAÇÕES ESSENCIAIS DA AÇÃO EVANGELIZADORA
DA IGREJA COMO SACRAMENTO UNIVERSAL DE SALVAÇÃO
(CONVOCAÇÃO COMUNHÃO MISSÃO)

NO MUNDO PARA O MUNDO A SERVIÇO


1) COMPROMISSO
FUNDAMENTAL E DO REINO DE DEUS
OBJETIVO FINAL
da ação eclesial
O REINO DE DEUS NA SUA VISIBILIDADE ECLESIAL

é realizado é vivido é proclamado no é celebrado


no sinal da no sinal da sinal da no sinal da
2) FUNÇÕES E
MEDIAÇÕES
DIACONIA KOINONIA LITURGIA
ECLESIAIS ( Sinais MARTYRIA
evangelizadores) Amor caridade Comunhão Eucarística
Serviço Primeiro anúncio
Fraternidade Testemunho Sacramentos
Promoção Reconciliação Celebração
Educação Profecia
Unidade Festas
Libertação Comunicação Devoções
Solidariedade Pregação
3) FORMAS
ÂMBITOS
E Partilha Oração

PRINCIPAIS da ação
eclesial (Processo
evangelizador )

AÇÃO AÇÃO PRESENÇA


MISSIONÁRIA CATECUMENTAL [ ad intra ] NO MUNDO
[ ] Acolhida Culto celebração Testemunho
Presença Serviço Acompanhamento Pregação Vida Promoção
4) AGENTES E Diálogo Catequese Iniciação comunitária Participação
CONDICIONAMENT OS Testemunho Mistagogia Caridade-serviço Ação cultural e
INSTITUCIONAIS da Primeiro an ncio Sociopolítica
ação eclesial

MINISTÉRIOS ESTRUTURAS - INSTITUIÇÕES

56
E temos diante de nós a visão da Igreja como sacramento universal de salvação ,
segundo a expressão significativa, que de certa forma resume a concepção eclesiológica do
Vaticano II (cf. LG n. 48), que se reporta ao dinamismo de base caracterizado pelos
momentos: convocação comunhão missão. A Igreja, com efeito, é, em primeiro lugar,
convocação, isto é, ekklesia (reunião de convocados); depois configura-se essencialmente
como comunhão, e está a serviço de uma missão, como povo messiânico, como apostolado.
Convocação, comunhão e missão são os momentos de um contínuo dinamismo à maneira
de sístole e diástole que leva a Igreja a recolher-se para difundir-se, a reunir-se para sentir-
se continuamente lançada no mundo, a encontrar-se para perder-se no testemunho humilde
do Reino, do qual é germe e primícia.1
Pois bem, a articulação da tarefa eclesial leva a distinguir, em primeiro lugar, diversos
níveis de importância da ação da Igreja, conforme o grau de proximidade e de
significatividade quanto ao fim último da própria Igreja. Pode-se assim distinguir quatro
níveis operativos:
1. nível do compromisso fundamental e objetivo final da ação eclesial: No mundo,
para o mundo, a serviço do Reino de Deus ;
2. nível das funções ou mediações eclesiais a serviço do Reino de Deus: os sinais
evangelizadores: diaconia, koinonia, martyria, liturgia;
3. nível das formas e âmbitos principais do processo evangelizador (cf. DGC n.
49): ação missionária, ação catecumenal, ação pastoral, presença e ação no mundo;
4. nível inferior dos agentes e condicionamentos pessoais e institucionais da práxis
eclesial: ministérios, estruturas, instituições.

1
Cf. D. Emeis - K. H. Schmitt, Handbuch der Gemeindekatechese. Friburgo/ Basileia/ Viena, Herder,
1986, p. 48 ( Spannung zwischen Sammlung und Sendung ).
57
1.1 Compromisso fundamental e objetivo final da ação eclesial: no mundo, para o
mundo, a serviço do Reino de Deus (primeiro nível)

Esta primeira e essencial caracterização destaca o fato de que a Igreja não existe para si
mesma, mas a serviço de um projeto divino que vai muito além dos limites eclesiais: o
projeto do Reino de Deus. Esse projeto, que recebe também outros nomes na tradição bíblica
e eclesial (plano universal de salvação, recapitulação de todas as coisas em Cristo,
construção do Corpo de Cristo, libertação dos filhos de Deus, unidade do gênero humano,
paz messiânica, vida em plenitude etc.), é o plano grandioso de Deus para a humanidade que,
em Cristo e por meio do Espírito, se realiza na história e além da história. É o plano divino
de promoção e libertação integral dos seres humanos, promessa de sucesso e felicidade numa
humanidade reconciliada e unida. É a realização dos grandes valores com que sonham os
seres humanos de todos os tempos: reino de verdade e de vida, reino de santidade e de
graça, reino de justiça, de amor e de paz .2 O advento do Reino de Deus, esta utopia do
coração humano ,3 constitui o anseio supremo e o ponto de referência de toda atividade na
Igreja.
A Igreja, como sacramento universal de salvação (LG n. 48), sacramento do Reino,
não se identifica com o Reino de Deus, mas constitui na terra seu germe e início . 4 Ela é
sacramento ou sinal e instrumento da íntima união com Deus e da unidade de todo o gênero
humano (LG n. 1), é, pois, sinal e, portanto, anúncio e presença germinal, do grande projeto
de Deus para a humanidade, que chamamos Reino de Deus .5

2
Missal romano: prefácio da festa de Cristo Rei.
3 a
Cf. L. Boff, Jesus Cristo libertador: ensaio de cristologia crítica para o nosso tempo. 12 ed. Petrópolis,
Vozes, 1988.
4
LG n. 48; RM n. 18-20. Cf. Puebla n. 226 e Espanha CC n. 19.
5
Ela é o sinal do Reino. Nela se manifesta de maneira visível o que Deus está realizando
silenciosamente no mundo inteiro : Puebla n. 227.
58
A Igreja a serviço desse projeto universal representa sua mediação histórica providencial,
querida por Deus. Não no sentido de encerrar em suas fronteiras a realização do projeto, mas
como povo messiânico , povo testemunha, que proclama no mundo o advento e a
promessa do Reino, ao mesmo tempo em que vem a ser primícia deste. A Igreja, como
lembrava K. Rahner, é o sacramento da salvação para um mundo, que, na verdade, na sua
maior parte, é salvo pela graça de Deus fora das instituições da Igreja .6
Deriva daí uma primeira e fundamental indicação para a práxis eclesial: ela não tem
como fim a própria Igreja ou a sua afirmação no mundo, mas se projeta inteira para um plano
que a transcende e lhe determina o sentido: o advento do Reino e seu crescimento na história.
Aqui a comunidade cristã encontra o significado último dos próprios esforços, ao ver avançar
os valores do Reino: a fraternidade, a unidade, a liberdade, a paz, a felicidade, a vida.
No mundo para o mundo : esta perspectiva supõe uma visão renovada da relação
Igreja-mundo. O mundo, isto é, a humanidade histórica, não é mais concebida como estranha
ou oposta ao projeto do Reino, nem sequer como simples campo de aplicação da salvação da
Igreja, mas como verdadeiro lugar de realização do Reino, à medida que secunda o impulso
do Espírito. A Igreja, como porção de mundo a serviço do mundo, declara-se serva da
humanidade 7 e caminha juntamente com a humanidade inteira. Experimenta com o mundo
a mesma sorte terrena; é como que o fermento e a alma da sociedade humana, destinada a ser
renovada em Cristo e a transformar-se na família de Deus (GS n. 40).
No que concerne à sua ação pastoral, isso quer dizer que a Igreja não deve se preocupar
tanto em conservar e ampliar a si mesma, mas antes, buscar estimular o crescimento do
mundo segundo o plano de Deus, para tornar o mundo mais humano e mais conforme ao
projeto libertador do Reino. Desempenha esse seu papel sacramental , instrumental, em
profunda unidade de intentos e esforços com quantos, crentes ou não, se empenham no
mundo pela promoção dos valores do Reino.

1.2 Funções ou mediações eclesiais a serviço do Reino de Deus: sinais


evangelizadores (diaconia, koinonia, martyria, liturgia) (segundo nível)

O compromisso da Igreja a serviço do Reino não é apenas o de colaborar com as pessoas


de boa vontade no esforço comum de transformação da humanidade. Ela tem consciência de
ser depositária do mistério revelado por Deus em Cristo, e de ter a missão específica de
iluminar, guiar e estimular a história da humanidade, para que possa tornar-se, de maneira
formal e consciente, lugar de realização do Reino de Deus.

6
K. Rahner, Trasformazione struturale della Chiesa come compito e come chance. Brescia,
1973, p. 77.
7
Paulo VI, Discurso de encerramento do Concílio, 7 de dezembro de 1965.
59
Nesse sentido, a Igreja tem uma missão específica, uma mediação histórica que realiza
sua sacramentalidade, mediante suas funções ou mediações fundamentais.8
Tradicionalmente, tanto a teologia pastoral como a práxis eclesial, e o próprio
Concílio, dividiram as funções eclesiais segundo o esquema do tríplice ministério de Cristo:
sacerdote, profeta e rei, distinguindo assim um tríplice ministério na Igreja: litúrgico,
profético e real.9 Não parece, porém, que se possa dizer que essa divisão possui um
fundamento totalmente convincente,10 nem que seja adequada às articulações reais do agir
eclesial.11
Parece-nos mais adequada e convincente uma divisão quadripartida que pode se basear
na natureza sacramental da Igreja enquanto sinal e instrumento do Reino de Deus.12 O ideal
do Reino faz-se presente no mundo em quatro formas fundamentais de visibilidade eclesial:
como Reino realizado no amor e no serviço fraterno (sinal da diaconia);
como Reino vivido na fraternidade e na comunhão (sinal da koinonia);

8
Para tratar mais detalhadamente desta articulação, cf. P. F. Schmid, Im Anfang ist Gemeinschaft.
Personzentrierte Gruppenarbeit in Seelsorge und Praktischer Theologie. Beitrag zu einer Theologie der
Gruppe. Stuttgart/Berlim/Colônia, W. Kohlhammer, 1998, p. 93-97.
9
Cf., p. ex.: C. Floristan - M. Useros, Teologia dell azione pastorale. Roma, Paulinas, 1970, p. 357-72
(ministério profético, litúrgico e odegético). D. Emeis - K. H. Schmitt, op. cit., p. 47 (Martyria, Liturgia,
Diaconia). Outras expressões: K. Lehmann, art. cit. (martyria, liturgia, diaconia). W. Kasper, Elemente
einer Theologie der Gemeinde , Lebendige Seelsorge 26 (1976), n. 5, p. 296 (Verkündigung [anúncio],
Liturgie, Diakonie) etc.
10
Cf. a propósito a pesquisa histórica de J. Fuchs, Origines d une trilogie écclésiologique à l époque
rationaliste de la théologie , Rev. Science, Philos. Et Théol. 53 (1969), p. 186-211, e de L. Schick, Das
dreifache Amt Christi und der Kirche. Zur Entstehung und Entwicklung der Trilogien. Frankfurt-Berna,
1982. Congar também vê a relatividade da divisão típlice: cf. Y. Congar, Ministeri e comunione ecclesiale.
Bolonha, Dehoniane, 1973, p. 15. K. Rahner Premessa teologica e pastorale . In: V. Schurr et al., Funzioni
della Chiesa. Roma-Brescia, Herder-Morcelliana, 1971, p. 7-11) enumera seis funções fundamentais da Igreja:
evangelização, culto, administração dos sacramentos, vida jurídica, vida cristã e ação caritativa (p. 7), que,
porém, podem reagrupar-se em três grandes conjuntos: anúncio da palavra, eucaristia, vida do amor (p. 11). O
documento latino-americano CAL (n. 98) distingue cinco momentos: anúncio (kerigma), didascalia (catequese),
celebração, diaconia, testemunho de vida.
11
V. também a crítica de S. Lanza, L insegnamento della teologia pastorale . In: N. Ciola (ed.), Servire
Ecclesiae iscellanea in onore di Mons. Pino Scabini. Bolonha, Dehoniane, 1998, p. 403-06.
12
São muitos os autores que adotam essa quádrupla divisão: cf. P.F. Schmid, Im Anfang ist Gemeinschaft, p.
96-97; C. Floristan, Teología práctica. Teoría y praxis de la acción pastoral. Salamanca, Sígueme 1991, p.
215-26. Similarmente, B. Seveso: martyria , liturgia , koinonia ,
diaconia são, pois, os pilares do agir da Igreja e da comunidade, que costumam ser sugeridos, ainda que com
variações, na literatura pastoral ; B. Seveso, La parrochia e la teologia . In: G. Ambrosio et al., Chiesa e
parrochia. Leumann (Turim), Elledici, 1989, p. 43.

60
como Reino proclamado no anúncio salvífico do Evangelho (sinal da martyria);
como Reino celebrado nos ritos festivos e libertadores das celebrações cristãs (sinal
da liturgia).
Dessa maneira, a Igreja quer ser no mundo o lugar por excelência do serviço, da
fraternidade, do anúncio e da festa, em analogia com quatro categorias antropológicas de
base: a ação, a relação, o pensamento e a celebração. São quatro sinais ou mediações
eclesiais que não delimitam, em sentido estrito, âmbitos operativos distintos, mas significam
também aspectos ou dimensões presentes na globalidade do agir eclesial. Chamamo-los
sinais ou mediações , que podem ser entendidos como quatro formas de ser no mundo
sacramento do Reino.13

Diaconia. O sinal da diaconia eclesial, com sua função evangelizadora e a variedade


das suas manifestações (amor, caridade, serviço, promoção, educação, libertação,
solidariedade), responde à profunda necessidade humana de encontrar uma alternativa à
lógica da prepotência e do egoísmo que envenena a convivência. A comunidade cristã é
chamada a testemunhar um modo novo de amar e de servir, uma tal capacidade de doação e
de dedicação aos outros que torna crível o anúncio evangélico do Deus do amor e do Reino
do amor. O sinal da diaconia encarna de tal modo no coração o projeto do Reino, que se
constitui no mais decisivo e importante (cf. Mt 25,31-46), verdadeiro teste de autenticidade
para todos os outros.

A divisão quádrupla tem a vantagem de salientar, com razão, o caráter sacramental (enquanto sinal do Reino),
e não meramente funcional, do sinal da koinonia. Nos planejamentos pastorais da Igreja no Brasil, até 1994,
usava-se o esquema adotado desde o Plano pastoral de conjunto (1966), baseado em seis linhas de ação que, por
sua vez, eram reflexos dos documentos do Concílio: dimensão comunitária, missionária, catequética (que
depois passou a ser bíblico-catequética), litúrgica, ecumênica e profético-transformadora: cf. CNBB,
. São Paulo, Paulinas, 1995, n.
35ss (Documentos da CNBB n. 54. A partir de 1995, sob o signo da evangelização inculturada, o
episcopado brasileiro optou por um outro esquema, agora dividido em quatro exigências de ação
evangelizadora : A evangelização é uma realidade complexa que inclui exigências irrenunciáveis. Desde o
Novo Testamento se destacam serviço (diaconia), diálogo, anúncio ( ), testemunho ) da
comunhão eclesial (koinonia). No processo da evangelização, essas exigências podem representar etapas,
mas na comunidade eclesial madura e vital, devem estar todas presentes e integradas (cf. id., p. 97, n.
173-174 e todo o cap. IV). Neste esquema a catequese pertence ao testemunho da comunhão eclesial
(koinonia: cf. ibid.., nn. 253, 257). As Diretrizes gerais 2003-2006 mantêm esta divisão: Estas novas
Diretrizes gerais da ação evangelizadora continuam ressaltando quatro exigências intrínsecas da
evangelização: o serviço, o diálogo, o anúncio e o testemunho de comunhão : CNBB, Diretrizes gerais da
ação evangelizadora da Igreja no Brasil 2003-2006. São Paulo, Paulinas, 2003, n. 15 (Documentos da CNBB
71). Atente-se particularmente para a nota 4 deste número, onde se diz: a apresentação das exigências da
evangelização acentua o aspecto missionário da vida da Igreja. A organização pastoral, segundo as seis
linhas ou dimensões, tem caráter mais prático e pode se mantida onde continua funcional! ).
13
De certa forma, o quádruplo sinal já foi mencionado no conhecido resumo de Lucas (At 2,42-47) sobre a
vida da comunidade cristã primitiva.

61
Koinonia. O sinal da koinonia eclesial (comunhão, fraternidade, reconciliação,
partilha) responde ao anseio de fraternidade e de paz dos seres humanos de todos os tempos.
É sinal evangelizador quando manifesta um modo novo de conviver e de estar junto, anúncio
da possibilidade de viver como irmãos reconciliados e unidos, no acolhimento de todas as
pessoas e no respeito da liberdade e da originalidade de todos. Num mundo dilacerado por
divisões, discriminações e egoísmos, os cristãos são chamados a testemunhar a utopia do
Reino da fraternidade e da união, oferecendo espaços de liberdade e compreensão, de amor
sincero e respeito a todos.

Martyria. O sinal da martyria ou função profética (primeiro anúncio, testemunho,


catequese, pregação, reflexão teológica) deve aparecer no mundo como palavra libertadora e
como chave de interpretação da vida e da história. Diante da necessidade de sentido e da
experiência do mal, que leva tantas pessoas ao fatalismo e ao desespero, os cristãos são
chamados a ser no mundo portadores de esperança, adversários do absurdo, profetas do
significado ,14 mediante o anúncio de Jesus de Nazaré, que revela o amor do Pai e inaugura o
advento do Reino.

Liturgia. O sinal da liturgia, nos seus diversos momentos (eucaristia, sacramentos,


culto, devoções, oração), abrange o conjunto dos ritos, símbolos e momentos de celebração
da experiência cristã como anúncio e dom de salvação. Responde à necessidade,
profundamente radicada no coração do ser humano, de celebrar a vida, de acolher e expressar
no símbolo o dom da salvação e o mistério da existência resgatada e transformada. Diante
das limitações mortificantes da racionalidade e da falta de sentido, a comunidade cristã é
chamada a oferecer espaços em que a vida e a história, resgatadas de sua opacidade, sejam
celebradas, exaltadas, retomadas como projeto e como lugar de realização do Reino. Na
eucaristia, nos sacramentos, nas festas e nas variadas comemorações que compõem a
experiência de fé, as comunidades cristãs devem testemunhar e celebrar, com alegria e
reconhecimento, a plenitude libertadora do Reino que se manifestou em Cristo.

14
Cf. P.Ricoeur, I compiti della comunità ecclesiale nel mondo moderno . In: R.Aubert et al., Teologia
del rinnovamento. Assis, Cittadella, 1969, p. 166.
62
Esses sinais evangelizadores especificam a missão da Igreja no mundo: tornar presentes entre
os seres humanos, como sinal e primícia do grande projeto de Deus, quatro grandes dons de
que é portadora: um novo modo de amor universal, uma nova forma de convivência fraterna,
uma palavra e um testemunho carregados de esperança, um conjunto de celebrações que
manifestam uma vida em plenitude. É sobretudo através desses sinais do Reino que a Igreja
deve cumprir sua missão na história e dar sua contribuição específica e insubstituível ao
advento do Reino de Deus.

Eis algumas indicações a propósito dessa articulação dos sinais ou mediações eclesiais:
As quatro funções eclesiais não se devem separar como realidades distintas, porque
cada uma delas participa, em maior ou menor grau, da natureza das outras. Antes, é
preciso dizer que as quatro funções eclesiais são constitutiva e intimamente ligadas
entre si, e que nenhuma garante a sua autenticidade e transparência, se isolada do
contexto das outras.
O conjunto dos sinais ou mediações eclesiais constitui um todo orgânico, que
manifesta a experiência cristã eclesial na sua totalidade. A presença harmônica das
diversas funções pode constituir um critério de discernimento da autenticidade eclesial
de experiências concretas de atividades e de vida cristã.
É possível estabelecer uma hierarquia ou ordem de importância entre as
diversas funções eclesiais? Se se adotar como critério de avaliação a relação com o
ideal do Reino, pode-se dizer que os sinais da diaconia e da koinonia merecem um
lugar de primazia, pois exprimem diretamente os valores fundamentais do projeto de
Deus: o amor e a comunhão.15 Em sua função de sinal, seria possível dizer que
eles contêm já em forma proeminente a res sacramenti, a realidade significada,
ao passo que o ministério profético da palavra e a liturgia podem ser mais
facilmente falseados, degenerando em retórica e em ritualismo. Isso quer dizer que a
Igreja se distingue no mundo como anúncio do Reino de Deus mais por aquilo que
faz e é, no espírito do amor e da fraternidade, do que por aquilo que diz e celebra.

15
Schmid fala de pericoresi entre as funções eclesiais, com o primado da diaconia: P.F.SCHMID, Im
Anfang ist Gemeinschaft, 95-96. Nos planos pastorais da CNBB, muito influenciados pelos documentos
de Medellín, sempre prevaleceu o sinal da diaconia ou serviço e esta foi, principalmente nos anos 60 até fins
da década de 80, a grande marca da pastoral brasileira. Nas Diretrizes gerais 2003-2006, porém,
encontramos esta afirmação: A ordem serviço-diálogo-anúncio-comunhão expressa uma sequência
pedagógica das exigências todas elas essenciais da evangelização. Do ponto de vista da finalidade ou dos
valores, porém, o anúncio do Evangelho deve ter primado e prioridade permanente. É para ele que se volta a
evangelização ou missão (cf. CNBB, Diretrizes gerais 2003-2006, n. 16. Cf. também o que se diz sobre o
ministério da caridade nos n. 38-41 e sobretudo nos n. 83-85).
63
Poderia ser o caso de objetar que na realidade o primado cabe à função litúrgica,
proclamada no Concílio ápice para o qual tende a ação da Igreja e, ao mesmo tempo, fonte
donde emana toda a sua força (SC n. 10). Isso, porém, significa que é da natureza da liturgia
ser vértice e fonte de todo o conjunto da experiência eclesial, vivida na sua integralidade de
serviço, comunhão, anúncio e celebração. Sem a base fundamental da liturgia da vida ,
exercício substancial do sacerdócio real dos cristãos (que consiste sobretudo na prática do
amor), os ritos litúrgicos, os sacramentos e a própria eucaristia, reduzem-se bem depressa a
gestos retóricos e vazios.16
Para além das distinções entre os sinais evangelizadores, é importante afirmar a
profunda inter-relação e complementaridade que os une. Se se pensa na união indissolúvel
existente entre palavra e história, entre liturgia e vida, entre palavra e sacramento, entre
anúncio, celebração e compromisso, logo se percebe a necessidade de garantir, na práxis
eclesial, o desenvolvimento harmônico de todas as mediações, superando unilateralismos e
polarizações, para um testemunho mais transparente do projeto divino do Reino.

1.3 Formas e âmbitos principais do processo evangelizador: ação missionária, ação


catecumenal, ação pastoral, presença e ação no mundo (terceiro nível)

A tarefa evangelizadora da Igreja realiza-se concretamente em algumas formas ou


âmbitos que destacam o dinamismo da sua atividade. São os diversos momentos do que o
DGC chama processo evangelizador .

O processo evangelizador, por consequência, é estruturado em etapas ou momentos


essenciais : a ação missionária para os não crentes e para os que vivem na indiferença
religiosa; a ação catequético-iniciática para os que optam pelo Evangelho e os que
necessitam completar ou reestruturar sua iniciação; e a ação pastoral para os fiéis cristãos já
maduros, no seio da comunidade cristã (DGC n. 49).

Temos aí, pois, uma enumeração que, somada à presença e ação no mundo , descreve
e define o dinamismo ideal do agir eclesial na sua concretude operativa e histórica.

16
Disso trataremos de forma mais aprofundada no capítulo 9: Catequese e liturgia .
64
Ação missionária. É o primeiro passo no processo da evangelização. Dirige-se aos não
crentes ou a quantos vivem na indiferença religiosa (DGC n. 49), e assume diversas formas:
presença, serviço, diálogo, testemunho, até o primeiro anúncio explícito do Evangelho. O
DGC descreve-o da seguinte maneira:

[a Igreja] impulsionada pela caridade, impregna e transforma toda a ordem temporal,


assumindo e renovando as culturas; dá testemunho, entre os povos, do novo modo de ser e de
viver que caracteriza os cristãos; proclama explicitamente o Evangelho, por meio do primeiro
anúncio , chamando à conversão (DGC n. 48).

Ação catecumenal. Compreende todo o conjunto de atividades dirigidas a quantos se


interessam pela fé e querem ser ou voltar a ser cristãos, seguindo o percurso da iniciação
cristã: acolhida, acompanhamento, catequese de iniciação, ritos e sacramentos de iniciação,
mistagogia. A ação catecumenal é uma função essencial da vida da Igreja, expressão da sua
maternidade (cf. DGC n. 48).

Ação pastoral. É o âmbito tradicional do agir ad intra da comunidade eclesial, no


exercício das bem conhecidas funções: culto, celebrações, sacramentos, pregação, catequese,
vida comunitária, serviço de caridade etc.

Presença e ação no mundo. Merece atenção particular, também porque muitas vezes
preterido, esse desembocar do agir eclesial nas diversas formas de testemunho evangélico na
sociedade: promoção humana, ação social e política, ação educativa e cultural, promoção da
paz, atuação em prol da ecologia. São âmbitos de presença nos quais a Igreja é chamada a
sair do seu recinto interno para colocar-se decididamente a serviço do Reino de Deus no
mundo.
Como é fácil constatar, é comum a esses momentos do processo evangelizador a
copresença ainda que em diferentes graus dos quatro sinais evangelizadores
(serviço, comunhão, palavra, celebração) e a orientação para o grande projeto salvífico do
Reino de Deus, razão de ser de toda a missão eclesial. E podemos compreender que seja
justamente essa copresença dos sinais evangelizadores e essa orientação para o Reino
que dão qualidade e significado a todo o dinamismo da ação eclesial.

65
1.4 Agentes e condicionamentos pessoais e institucionais da práxis eclesial:
ministérios, estruturas, instituições (quarto nível)

Este último nível diz respeito ao aspecto institucional do agir eclesial e indica tudo que
se requer em termos de agentes, estruturas, organizações etc., que são necessárias ou
convenientes para que a Igreja possa cumprir sua missão. Encontramos aqui as diversas
atividades e problemas referentes a pessoas e estruturas envolvidas no agir da Igreja, como,
por ex.: a formação do clero e dos agentes pastorais, a pastoral vocacional, a organização das
Igrejas particulares, a vida dos órgãos colegiais, a instalação das cúrias, os procedimentos
para a escolha dos pastores, a reforma das instituições etc. São problemas e atividades,
pertencentes ao âmbito da práxis eclesial, que têm grande influência no significado global do
agir da Igreja enquanto serviço do Reino de Deus no mundo.
No quadro geral da ação eclesial, é importante insistir em que este quarto nível existe
em função dos outros: só tem razão de ser por tornar possível o exercício da missão eclesial
e, em definitivo, o serviço do Reino. Se faltar esta referência essencial, a organização
institucional da Igreja pode tornar-se obstáculo e contratestemunho naquilo que se refere à
evangelização. Com efeito, todo processo de institucionalização, por sua própria natureza,
tende a cristalizar e a aumentar o peso dos aspectos estruturais e jurídicos, 17 em prejuízo da
missão. Cabe, portanto, à natureza evangélica da Igreja, verificar e reformar sua organização
institucional conquanto sempre necessária a fim de manter aquela flexibilidade e
disponibilidade de testemunho que corresponde à sua identidade íntima de sacramento do
Reino.18 Na sua inspiração original, a Igreja de Cristo tem bem poucos elementos
institucionais essenciais e imutáveis: é tarefa dos cristãos, em cada época histórica, rever tais
aspectos organizacionais e estruturais para adaptá-los corajosamente às exigências reais da
missão a serviço do Reino.

17
Sobre esse tema, ver: G. Milanesi - J. Bajzek, Sociologia della religione. Leumann (Turim), Elledici,
1990, p. 17-34 ( I processi de istituzionalizzazione dell´esperienza religiosa ).
18
Cf. J. Mateos, Cristiani in festa. Bolonha, Dehoniane, 1981, p. 230-34 ( La struttura ); G. Grasso, La Chiesa
come istituzione: annotazioni teologiche e pastorali . In: Il gruppo di Catechesi : la Chiesa è di tutti.
Leumann (Turim), Elledici, 1978, p. 140-48.
66
2 UM ESTILO OPERATIVO SEM FUTURO: A PASTORAL TRADICIONAL

O quadro que apresentamos reflete um esquema orgânico que, nas diversas épocas e
situações culturais, assume contornos diversificados, privilegiando certos aspectos e dando
conteúdo preciso às suas partes. É, pois, um esquema que varia no tempo e nos lugares,
prestando-se a diversas encarnações culturais e históricas.
Ora, se olharmos a realidade pastoral das nossas Igrejas de antiga tradição cristã, é
possível identificar e descrever esquematicamente os traços típicos de um estilo pastoral a
que convencionalmente chamamos de tradicional ou de cristandade .19

PASTORAL DE CRISTANDADE

Catequese Caridade

Comunidade CULTO
SACRAMENTOS
DEVOÇÕES

Ação Presença no
missionária mundo
& catecumenal

AÇÃO PASTORAL AD INTRA

INSTITUIÇÕES ESTRUTURAS OBRAS

19
O quadro ilustrativo é intencionalmente esquemático, quase caricatural, mas permite apreender os traços que
caracterizam um estilo pastoral ainda presente na realidade eclesial.
67
2.1 Primado da atividade devocional e sacramental

Na visão pastoral que estamos comentando, o momento litúrgico-devocional tem


um primado indiscutível no concerto da ação eclesial. As missas dominicais, a administração
dos sacramentos, as devoções e as festas, a religiosidade popular absorvem grande parte
da atividade pastoral. Procura-se, sobretudo, estimular a prática religiosa dos fiéis, ter muitos
fiéis praticantes . Não se pensa tanto na questão da personalização da fé e no mister
da evangelização, porque se pressupõe a adesão de fé. Não é necessário despertar a vontade de
ser cristão: já se é cristão, trata-se simplesmente de fazer com que todos se tornem bons
cristãos , mesmo que se constate que muitos são os sacramentalizados, mas poucos
os
Em torno dessa orientação basilar movem-se as demais funções pastorais:
A martyria ou ministério da palavra é exercida quase exclusivamente em âmbito
intraeclesial, como catequese infantil, tendo em vista os sacramentos, ou como
pregação aos fiéis, quase sempre no contexto dos atos de culto. Pouco destaque têm a
primeira evangelização e o diálogo com a cultura e com os não crentes.
A koinonia fica sufocada pelas estruturas organizacionais da paróquia. Esta, o mais
das vezes, se apresenta como uma agência de serviços religiosos e como uma estrutura
associativa orientada predominantemente para atividades de tipo devocional-litúrgico
ou para o exercício da beneficência.
A diaconia é exercida principalmente como forma de caridade individual, de
beneficência e de assistência, ou mediante obras e organizações muitas vezes
dominadas pelo aspecto institucional e burocrático. Não poucas obras assistenciais ou
promocionais são pensadas tendo em vista a prática litúrgico- sacramental.

2.2 Retorno à pastoral intraeclesial e centrípeta

A pastoral tradicional ignora a lógica e a dinâmica do processo de evangelização.


Parte-se do princípio de que o povo já é cristão e de que a evangelização só tem sentido em
regiões afastadas e entre os povos pagãos. Por conseguinte:

20
Cf. J. Lopez, España, país de misión. Madri, PPC, 1979.
68
A ação missionária ad extra praticamente inexiste. Pressupõe-se uma escolha de fé e
um sentido de pertença cristã que na realidade se revelam mais formais que
substanciais, comprometendo seriamente a autenticidade do processo de iniciação e de
toda a pastoral sacramental.
A ação catecumenal está igualmente ausente, já que não existem como se diz
candidatos adultos ao batismo, e toda a iniciação cristã é realizada como ação pastoral
dentro da comunidade cristã.
A ação pastoral ad intra ocupa todo o espaço do agir eclesial, concentrado na vida e
na prática religiosa da comunidade que permaneceu fiel. Em certo sentido
subverte-se a lógica da parábola evangélica da ovelha perdida: dá-se atenção à
única ovelha que permaneceu no ovil, descuidando-se das noventa e nove que estão
perdidas. Não faltam mas sempre na lógica dessa perspectiva intraeclesial
algumas iniciativas esporádicas no sentido de fazer voltar à prática cristã os chamados
afastados , como é o caso das missões populares.
A presença e ação no mundo são condicionadas pela polarização cultual e
clerical desse tipo de ação pastoral. Uma visão espiritualizante e dualista da tarefa da
comunidade cristã impede que esta exerça uma influência significativa sobre o social e
sobre o político, e também que contribua para a transformação da sociedade.

2.3 Polarização clerical e peso institucional

No que se refere ao nível dos condicionamentos institucionais, esse estilo de ação


mostra-se fortemente clerical, concentrado praticamente nas mãos do clero (bispo,
sacerdotes, religiosos), ou incluindo também alguns leigos, com funções subordinadas e
puramente executivas. A crise de vocações e a consequente falta de sacerdotes é vivida como
a mais grave ameaça à manutenção da ação pastoral. Por outro lado, as Igrejas ficam
sobrecarregadas por um complicado sistema de hierarquias, circunscrições, regulamentos,
obras e associações, que absorvem em grande parte a atenção e o trabalho dos responsáveis.
O agir eclesial acaba dominado pelos aspectos institucionais, jurídicos e econômicos, e isto
muitas vezes obscurece e invalida o testemunho evangélico e a eficácia evangelizadora.

69
2.4 Eclesiocentrismo e autossuficiência

Nessa visão pastoral, a Igreja sente-se no centro da sociedade, detentora única da


verdade e da salvação, identificada praticamente com o Reino de Deus no mundo. Ela pensa
que deve cumprir a própria missão fortalecendo-se, procurando ganhar o maior número
possível de adeptos, conquistando espaços de poder e de influência. Alguns aspectos típicos
dessa concepção eclesiocêntrica são:

maior preocupação com o bem da Igreja e a defesa dos seus interesses do que com o
bem da sociedade e dos homens em geral;
atitude de desconfiança e de censura para com os não católicos, os não cristãos, os
não crentes. A causa ecumênica é onsiderada como algo marginal, secundário;
atitude de oposição e de defesa diante do mundo e da cultura moderna, com o
relativo retorno clerical da cultura eclesiástica e o drama da separação fé- cultura
(cf. EN n. 20);
fortalecimento e defesa das próprias instituições e obras, muitas vezes em
concorrência e paralelismo com as instituições da sociedade civil.

O quadro esboçado é, sem dúvida, esquemático, quase caricatural. Mas denuncia, nos seus
traços característicos, um tipo de pastoral que não tem futuro. É um estilo de atuação
inadequado à nossa época e condenado à falência, incapaz de responder aos desafios que o
mundo atual lança à missão das Igrejas. É verdade como se viu no primeiro capítulo que
a situação é muito complexa, e que a crise do sistema pastoral tem diversas causas e
condicionantes. Mas não se pode excluir a responsabilidade do próprio sistema, que já não
responde às condições de hoje. Não tem sentido ficar preso a essa pastoral tradicional , que
busca antes de tudo a manutenção ou a restauração : ela deve ser repensada em
profundidade, para que se transforme numa pastoral de renovação e de evangelização.

70
3 RUMO A UM PROJETO PASTORAL CENTRADO NA EVANGELIZAÇÃO

Se tentamos agora esboçar um quadro, ainda que esquemático e aproximativo, das


principais opções pastorais que hoje parecem mais urgentes, como uma espécie de projeto
pastoral para uma Igreja evangelizadora, logo nos damos conta da dificuldade da tarefa,
ainda mais quando se considera que cada região, cada Igreja particular, deve construir um
projeto pastoral próprio, único, nas circunstâncias concretas em que deve atuar.
Parece-nos conveniente, porém, apontar algumas urgências e imperativos mais sentidos
na Igreja do nosso tempo. Tendo sempre presente, como quadro de referência, o esquema de
articulação da ação eclesial apresentado antes, eis algumas exigências prioritárias desse
projeto pastoral centrado na evangelização .

PASTORAL EVANGELIZADORA

No mundo para o mundo


a serviço do reino

Diaconia Liturgia

Ação Ação
missionária catecu- Ação pastoral Presença
menal no
mundo

Estruturas - Instituições

71
3.1 No mundo e para o mundo a serviço do Reino (superação do viés eclesiocêntrico)

A revisão da missão da Igreja em termos de sacramento do Reino e a nova visão da


relação Igreja-mundo exigem hoje dos cristãos uma mudança radical na orientação global de
sua ação. O projeto do Reino, e, pois, o destino de toda a humanidade, devem constituir a
paixão dominante de toda presença eclesial. Deve-se superar, por isso, a obsessão
eclesiocêntrica (Igreja preocupada consigo mesma, com sua conservação e expansão), para
assumir uma orientação missionária, própria do povo messiânico que se sente enviado ao
coração do mundo para testemunhar e servir. O mundo de hoje, com seus problemas e com
os seus anseios mais profundos, deve constituir o programa operativo de base, a ordem do
dia das urgências eclesiais.
Essa não é uma tarefa fácil, porque a comunidade cristã tem dificuldade de sair da
situação de cristandade que por séculos caracterizou sua presença em muitas regiões, e
permanece presa às velhas certezas, aos privilégios de que desfrutou, ao papel determinante
que sempre desempenhou na sociedade. Não se decide, por isso, a abandonar, como Abraão, a
própria terra e a parentela, e caminhar para um futuro aberto e novo, num mundo
desconcertante e difícil. Eis alguns aspectos e consequências desta opção fundamental:
maior disponibilidade das Igrejas para salvação e serviço de todas as pessoas com as
quais trava contato, independentemente de religião, raça e condição;
adoção de um critério evangélico (busca dos valores do Reino) para avaliar a
situação cultural, as realidades sociais e econômicas, os regimes e os ordenamentos
jurídicos, superando o critério eclesiocêntrico da defesa dos próprios interesses;
diante das realidades seculares, uma atitude inspirada no respeito de sua
legítima autonomia (GS n. 36), no diálogo e na colaboração, com liberdade e
independência evangélicas, visando à superação das posições tradicionais
dualistas (como a suplência, a ingerência, a tutela, o paralelismo, o espírito de
cruzada etc.);
reexame corajoso das próprias instituições confessionais (escolas, universidades,
hospitais, sindicatos, partidos etc.), que muitas vezes surgiram ou se conservaram
como defesa do próprio âmbito institucional diante da progressiva autonomia das
instituições seculares;
promoção mais decidida da causa ecumênica, superando o apego cristalizado à sua
pretensa identidade e abrindo-se com sinceridade e coragem para o advento da Una
Sancta.

72
3.2 Reequilíbrio dos sinais evangelizadores (superação da polarização sacramental e
devocional)

Para a realização das funções eclesiais de base (diaconia, koinonia, e liturgia)


impõe-se uma revisão global que supere o primado tradicional do momento
celebrativo- devocional e dê o devido destaque à virtude evangelizadora do serviço e da
fraternidade.
3.2.1 A Diaconia eclesial como sinal que deve ser privilegiado

Somos hoje particularmente sensíveis à urgência da evangelização a partir dos pobres,


buscando a promoção e libertação integral de todos. Desloca-se a ênfase do primado da
atividade religioso-cultual para a urgência do testemunho de serviço e de fraternidade, na
solidariedade para com o mundo dos pobres. Dentro desse imperativo pastoral podem-se
destacar as seguintes exigências:
A opção pelos pobres21 e pelos marginalizados encontra-se hoje no centro de um
testemunho convincente do Evangelho. Não no sentido de uma atenção aos pobres que
leve à promoção de algumas atividades em favor deles, mas como um reconhecer-se
e um reconhecer neles os sujeitos privilegiados da presença eclesial.
A renúncia ao poder torna-se também imperativo de fidelidade ao sentido
evangélico da diaconia eclesial. Abandona-se a ideia de que o poder pode ser usado
para o bem , dada a impossibilidade prática, moral e histórica de converter o poder,
que é sempre um instrumento de dominação, em meio de serviço e humanização.

21 A opção preferencial pelos pobres , muitas vezes reafirmada em Puebla (n. 382, 707, 733, 769, 1134,
1217) foi adotada também em âmbito de Igreja universal no Sínodo de 1985. Cf. W. Casper (ed.), Il
futuro dalla forza del Concilio. Sinodo straordinario dei vescovi 1985. Brescia, Queriniana, 1986, p. 39-
40. Cf. R. E. Facci, Opção preferencial pelos pobres . Revista de Catequese 4 (1981), n. 14, p. 33-46; R.
Mendes de Oliveira. Catequese e opção pelos pobres , Revista de Catequese 8 (1985), n. 29, p. 18-
26; M. Sousa, Catequese memorial e cultura popular (I e II), Revista de Catequese 10 (1987), n.
38, p. 18-26 e 10 (1987), n. 39, p. 27-36; VV. AA. A esperança dos pobres vive: coletânea em homenagem
aos 80 anos de José Comblin. São Paulo, Paulus, 2003; A. Mejía Pereda, Pobres, opción preferencial
por los , Nuevo Dic. Cat., p. 1.849-63. A opção preferencial pelos pobres sempre foi também uma
marca da pastoral brasileira. Nas Diretrizes gerais 2003-2006, tal opção aparece clara no objetivo geral
( evangelizar... à luz da evangélica opção pelos pobres, promovendo a dignidade humana... (cf. n. 152-
85). Para uma avaliação do rigor da opção pelos pobres no contexto da reflexão teológica, pode-se
consultar os vários trabalhos publicados em Wagner Lopes Sanches (org.), Cristianismo
América Latina e no Caribe: trajetórias, diagnósticos, prospectivas. São Paulo, Paulinas, 2003.
73
A ação dos cristãos deve colocar-se a serviço da promoção e libertação integral de
todos. De certo modo, esse compromisso constitui hoje uma prova da autenticidade
evangélica de todo o agir eclesial e critério decisivo de uma nova orientação
pastoral.22

3.2.2 Rumo a uma Igreja-comunhão numa comunhão de Igrejas

Também o sinal eclesial da koinonia busca hoje novas formas de realização e de


visibilidade, como transparência dos valores de fraternidade e comunhão entre as pessoas.
Há, antes de tudo, a busca da koinonia ecumênica, para superar o escândalo da divisão entre
cristãos. Tal compromisso não deve mais ser considerado como algo secundário ou
acessório: não é apenas um apêndice qualquer que se acrescenta à atividade tradicional da
Igreja. Ao contrário, ele pertence organicamente à sua vida e à sua ação .23
Há também a busca de uma Igreja-comunhão em novas formas de unidade, comunidade
e igualdade, com a relativa superação do clericalismo, do infantilismo e de toda forma de
discriminação. A Igreja apresenta-se hoje, sobretudo como corpo fortemente organizado,
eficientemente estruturado, mas nem sempre como espaço de comunhão e fraternidade
vivida. Por isso, sente-se o anseio de novas formas de comunidade, preferencialmente
pequenas, na medida da pessoa humana, e a necessidade de realizar o conceito conciliar da
Igreja como fraternidade , sendo que a igualdade e a mesma dignidade de todos os
membros (LG n. 32) prevaleçam sobre a distinção dos ofícios e ministérios.24

3.2.3 Diálogo cultural no anúncio e na celebração

Falaremos oportunamente sobre o necessário reexame dos sinais da martyria e da


liturgia. Mas nesta revisão global da missão eclesial parece-nos importante assinalar a
necessidade de uma revisão em profundidade destas duas funções pastorais, buscando sua
transparência e autenticidade para um testemunho evangelizador. E é sobretudo no que se
refere a elas que se impõe o imperativo urgente da inculturação, como processo de
encarnação da fé cristã no contexto das diversas culturas. Como disse Paulo VI, a ruptura
entre o Evangelho e a cultura é, sem dúvida, o drama da nossa época, como o foi também de
outras épocas (EN n. 20).
Na mesma ordem de ideias encontra-se também a aceitação do pluralismo cultural e
religioso, para manter uma atitude de diálogo construtivo e desinteressado com todos,
sempre a serviço dos valores do Reino e na busca de modos culturalmente significativos de
anunciar e celebrar o Evangelho. Por isso, como consequência lógica, a Igreja renuncia ao
exercício do controle social e ao papel determinante de guia nos países de antiga tradição
cristã, ao mesmo tempo em que rompe o isolacionismo e o medo de contaminação nos
lugares em que se encontra imersa em tradições culturais e religiosas diferentes das suas.

22
Sobre o significado da diaconia e sua relação com a catequese se falará de forma mais aprofundada no
capítulo 7.
23
João Paulo II, Encíclica Ut num int (25/5/1995), n. 20.
24
As exigências de uma visão renovada da Igreja enquanto comunhão serão tratadas especificamente nos
capítulos 6 e 8.
74
3.3 Restabelecimento da integridade do processo evangelizador (superação da
concentração intraeclesial)

As diversas áreas e momentos do processo evangelizador (ação missionária, ação


catecumenal, ação pastoral, presença e ação no mundo) devem ser encaradas com seriedade.
A percepção da necessidade urgente da evangelização põe em xeque o estilo tradicional da
pastoral intraeclesial. Abre-se o vasto mundo da missão, pois é muito flagrante o divórcio
entre fé e vida e a desproporção entre a massa dos fiéis oficialmente cristãos e a verdadeira
dimensão da comunidade cristã. Cresce a consciência da essência missionária da Igreja e a
necessidade de novas orientações básicas na práxis eclesial.
É importante promover a ação missionária ad extra, como realização da
essência evangelizadora da Igreja. O campo é muito vasto: formas várias de presença e
de serviço, iniciativas de diálogo cultural e religioso; experiências de primeiro anúncio,
com vistas à conversão. É todo um espaço de atividade a que não estamos habituados,
mas que hoje reclama atenção especial, como primeiro passo para um autêntico
processo de evangelização.
Também a ação catecumenal deve ser redescoberta e valorizada em sua função
fundamental dentro do processo evangelizador. E, antes de tudo, deve-se retomar
a prática do catecumenato, cuja importância não deriva tanto do número dos
adultos que atinge quanto da sua função significativa no conjunto da práxis eclesial.
Sua retomada no planejamento pastoral constitui hoje um teste de vitalidade e uma
ocasião providencial de renovação eclesial.

75
A práxis tradicional da iniciação cristã a partir das crianças com certeza precisa ser
repensada e renovada à luz do modelo catecumenal, devendo retomar seu papel
normativo e inspirador. Se é verdade que o catecumenato dos adultos constitui o
modelo de todo processo de iniciação cristã,25 é fácil compreender a amplitude das
transformações necessárias hoje no desempenho da pastoral tradicional.
O primado da evangelização leva também a um reexame corajoso da ação
pastoral ad intra, que deve privilegiar não mais o ideal do fiel praticante , mas a meta
do amadurecimento da fé e do testemunho de fé, isto é, da promoção do crente e da
fé personalizada.
Finalmente, um projeto pastoral centrado na evangelização deve tornar efetiva e
convincente a presença e a atuação dos cristãos no mundo. O novo modelo de crente
deverá ser sensível à dimensão social da fé, e, por conseguinte, sentir-se
comprometido, presente na sociedade, no mundo do trabalho, da cultura, da política,
para testemunhar e promover os valores do Reino. É um tipo de cristão cuja identidade
deve revelar-se mais na cidade do que no templo, mais na ação transformadora do que
na frequência às práticas religiosas.

3.4 Predomínio na Igreja da dimensão carismática sobre a institucional e desejo de


reforma (superação do clericalismo e do peso institucional)

No nível dos condicionamentos estruturais e institucionais, a práxis eclesial mostra-se


hoje sufocada por um aparato jurídico-institucional e por uma mentalidade clerical que, em
grande medida, lhe comprometem a transparência e a credibilidade. Impõe-se, desse modo, um
corajoso esforço de revisão e de volta ao essencial, uma reabilitação efetiva da dimensão
profética e carismática da dinâmica eclesial, sem reducionismos unilaterais, mas com sincera
atenção aos sinais dos tempos e aos estímulos do Espírito. Nessa perspectiva, devem ser
considerados os seguintes imperativos:
A reforma institucional da Igreja, que envolve pessoas e estruturas, órgãos e
instituições, ordenamentos jurídicos e modalidades de ação. Em particular deve-se
lembrar necessidade urgente da descentralização estrutural e organizacional, a
concretização efetiva da colegialidade episcopal nos seus diversos níveis, a
transformação evangélica do exercício da autoridade, a institucionalização da mudança
etc.

25 Le catéchuménat des adultes est le modèle de toute initiation chrétienne: le catéchuménat , Spiritus n.
134 (1994), p. 141.
76
A promoção e o reconhecimento dos ministérios e carismas presentes no povo de
Deus. O discernimento dos carismas e ministérios, mas também o imperativo de
não suprimir o Espírito, deve conduzir hoje a Igreja a um novo tipo de acolhimento e
respeito aos dons livremente dados por Deus aos membros do corpo eclesial. Isso
implica, como oportunamente veremos, a promoção dos ministérios a partir de baixo,
com a relativa valorização das Igrejas particulares.
A coragem e a abertura ao futuro também são imperativos do agir eclesial na
situação atual. Numa época de grandes transformações, a Igreja, os cristãos, devem
pensar mais no futuro do que na conservação e na nostalgia do passado. No agir
eclesial deve ser mais importante atrair os jovens e os construtores do futuro do que
satisfazer, sempre e antes de tudo, às exigências dos conservadores e dos
saudosistas. Num mundo cada vez mais dinâmico, já não se pode caminhar olhando
p ra trás,26 mas impõe-se a coragem de assumir riscos, a prudência da audácia, o que
foi chamado tuciorismo da ousadia . 27

Como se vê, evidencia-se, nas circunstâncias atuais, a necessidade de uma orientação


pastoral profunda e corajosamente nova, sem saudade da cristandade , sem desejos de
desforra ou de reconquista, voltada para um futuro aberto ao serviço desinteressado do Reino
de Deus, na fidelidade à missão evangelizadora. Desponta no horizonte um novo modelo de
cristão, um novo tipo de comunidade cristã, um projeto renovado de Igreja. A catequese deve
ser repensada hoje, tendo em vista essa nova orientação pastoral, para a promoção dos
novos modelos de cristão, de comunidade, de Igreja.

26
É a imagem sugestiva de G. Casalis, evocada por Louis Rétif: Em síntese, pode-se dizer que, na maior parte
do tempo, as Igrejas entraram no futuro de costas, porque mantinham os olhos fitos no passado, desejando ter
certeza de se manterem fiéis a este. Quando as coisas progrediam lentamente, isso não constituía um
problema. Mas hoje as transformações se sucedem em ritmo acelerado: quando se procura acompanhá-las
andando de costas, tropeça-se continuamente (Georges Casalis) : L. Rétif, Ho visto nascere la Chiesa di
domani. Milão, Jaca Book, 1972, p. 272.
27 Era a visão profética de Karl Rahner: A Igreja vive hoje em uma época em que simplesmente é necessário
andar com coragem, até o limite máximo, rumo ao novo e inexplorado, até o ponto em que não se veja mais
possibilidade de ir mais além, de forma clara e indiscutível, em nome de uma doutrina cristã ou de uma
consciência cristã. O único tuciorismo permitido hoje na vida da Igreja é o tuciorismo da empresa ousada
[Tutiorismus des Wagnisses] : K. Rahner - N. Greinacher, Die Gegenwart der Kirche . In: F. X. Arnold et
al. (eds.), Handbuch der Pastoraltheologie, vol. II/1. Friburgo i. Br., Herder, 1966, p. 275.
77
SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS

O capítulo se baseia nas concepções da ação pastoral no mundo de hoje. Para uma
visão de conjunto, indicamos:
ALVES DE LIMA, Luiz. Teología y catequesis . In: 1a Jornada catequética nacional: ología y
catequesis un diálogo imprescindible en perspectiva latinoamericana. Publicaciones ISCA,
Cordoba, Trejo Ediciones, 2000, p. 36-76.
BORSATO, B. Le sfide alla pastorale oggi. Vivere la fede e la Chiesa in modo adulto. Bolonha,
Dehoniane, 1994.
CATÃO, F. Falar de Deus: considerações teológicas sob e os fundamentos da reflexão cristã.
Iniciação teológica. São Paulo, Paulinas, 2001.
CELAM. El tercer milenio como desafio pastoral . Informe CELAM 2000. Santafé de Bogotá,
1999 (Colección documentos CELAM 154).
FALLICO, A. Pedagogia pastorale questa sconosciuta. Itinerario di formazione per operatori
pastorali presbiteri, religiosi e laici. Catania, Chiesa-Mondo, 2000.
FLORISTAN, C. Teología práctica. Teoría y praxis de la acción pastoral. Salamanca, Sígueme,
1991.
GARITANO LASKURAIN, F. Acción pastoral . Nuevo Dic. Cat. p. 59-68.
GONZALEZ-CARVAJAL SANTABÁRBARA, L. Los cristianos de siglo XXI. nterrogantes y
retos pastorales ante el tercer milenio. Santander, Sal Terrae, 2000.
LANZA, S. Introduzione alla teologia pastorale. 1. Teologia dell a ione ecclesiale. Brescia,
Queriniana, 1989.
MERLOS, Francisco (org.). Iglesia, comunidad, ministérios. Mexico, Departamento de
publicaciones Universidad Pontificia de Mexico, 2000.
MIDALI, M. Teologia pratica. Attuali modelli e percorsi contestuali di evangelizzazione. Roma,
LAS, 2000.
NIÑO, Francisco. La Iglesia en la ciudad l fenómeno de las grandes ciudades en América
Latina, como problema teológico y como desafio pastoral. Roma, Editrice Pontificia Università
Gregoriana, 1996.
PIGNATIELLO, L. M. Comunicare la fede. Saggi di teologia pastorale. Cinisello Balsamo
(Milão), San Paolo, 1996.
PINTOR, S. L omo via della Chiesa lementi di teologia pastorale. Bolonha, Dehoniane, 1992.
RAMOS GUERREIRA, J. A. Teología pastoral, Madri, BAC, 1995.
REYMOND B.- SORDET, J. M. (eds.), La théologie pratique: statut, méthodes, perspectives
d avenir. Paris, Beauchesne, 1993.
VANZAN, P. (ed.) La teologia pastorale, Roma, A.V.E., 1993.
ZULEHNER, P. M. Teologia pastorale. Vol. 1. Pastorale fondamentale a chiesa fra compito e
attesa. Brescia, Queriniana, 1992.
. Teologia pastorale. Vol. 4. Futurologia pastorale: la chiesa in cammino verso
la società di domani. Brescia, Queriniana, 1992.

Para o tema da Igreja e da virada eclesiológica do Vaticano II, ver o capítulo 6, sobre a
dimensão eclesial da catequese.

78
Para a identificação das opções pastorais mais urgentes no nosso tempo seria preciso
poder examinar e confrontar o grande volume de documentação existente:
Em âmbito geral ecumênico: reuniões e assembleias dos organismos ecumênicos
(Conselho Mundial das Igrejas, Fé e Constituição etc.).
Em âmbito de Igreja católica universal: o Concílio Vaticano II com seus documentos e
comentários; as encíclicas e exortações apostólicas pós-conciliares; os Sínodos dos
Bispos.
Em âmbito de Igrejas locais e particulares: declarações e documentos das Conferências
Episcopais nacionais, regionais e continentais; as Assembleias ou Sínodos de
particular importância, como por exemplo: as Assembleias latino-americanas de
Medellín (1968), Puebla (1979) e Santo Domingo (1992). O Sínodo das dioceses
alemãs (1971-1975); o Congresso espanhol sobre a evangelização (1985); as
Assembleias eclesiais italianas de Roma (1976), Loreto (1985) e Palermo (1995); as
Assembleias das Confederações das Conferências Episcopais da Ásia e da África etc.
Para o Brasil é necessário ter presente sobretudo as Diretrizes gerais da ação
evangelizadora da Igreja no Brasil, da CNBB, particularmente em suas últimas
edições. Trata-se da plataforma da ação evangelizadora (até

Em âmbito de reflexão e de estudo: as numerosas obras sobre a situação e


perspectivas da Igreja no nosso tempo. Sobre esse assunto, ver também a documentação
do cap. 6.

79
80
Capítulo 3

A catequese hoje:
identidade, significado, tendências
Com base nas reflexões feitas no quadro global do agir
eclesial, devemos agora concentrar a atenção na catequese,
numa primeira aproximação para precisar-lhe a posição e o
significado dentro dessa nova perspectiva.

1. A CATEQUESE EM BUSCA DA SUA IDENTIDADE

A catequese é uma atividade tão antiga quanto a Igreja. Mas, ao longo da história,
assumiu formas e modalidades bem diversas, razão pela qual a questão de sua natureza
genuína e de sua identidade está sempre em pauta. Em particular, o Vaticano II marcou uma
virada decisiva que modificou tradições radicadas no último e longo período catequético da
história eclesial. Vamos lembrar sinteticamente seu trajeto.

1.1 Na idade moderna: o ensino do catecismo

Todo o período da idade moderna, do século XVI à metade do século XX,


caracterizou-se pela centralidade pedagógica e doutrinal do catecismo , compêndio da
doutrina cristã e instrumento privilegiado de transmissão catequética.
São bem conhecidos o uso e a importância que, ao longo da idade moderna, tiveram os
catecismos tradicionais, desde o do Concílio de Trento até o conhecido catecismo de São Pio
X, passando pelos de Canísio, Belarmino, Astete, Ripalda, Deharbe, bastante difundidos. A
catequese foi por muito tempo concebida como memorização, explicação e aplicação à vida
desses sumários ou compêndios da doutrina cristã, redigidos em estilo claro e sintético,
geralmente na forma de perguntas e respostas, contendo as verdades de fé necessárias para a
salvação, os mandamentos ou normas a serem observados e os meios ou instrumentos
sobrenaturais a serem empregados (graça e sacramentos).

81
A reflexão catequética debruçou-se com particular atenção sobre esse instrumento
privilegiado de catequese e sobre o modelo pedagógico e pastoral que lhe é subjacente. Essa
reflexão reconheceu inegáveis valores e méritos nos catecismos, mas não pôde deixar de
apontar suas muitas limitações: a articulação mais teológica que pedagógica da mensagem, a
abstração da linguagem, a pobreza bíblica e litúrgica, o desenvolvimento apoiado na
dedução, a pedagogia magisterial e depositária etc.1 E não apenas isso: a catequese do
catecismo mostra-se também historicamente ligada a uma época que, em grande parte,
tinha ainda a unidade e a homogeneidade da cristandade . E podemos dizer que, sob muitos
aspectos, a educação religiosa encontrava, na globalidade do ambiente familiar e social,
muitos canais de comunicação e de influência que podiam suprir, em certa medida, as
deficiências do método catequético empregado.
Com o passar do tempo e com a crescente descristianização, aumentam também a
insatisfação e a preocupação, e em toda parte se afirma a necessidade de repensar os diversos
componentes da atividade catequética. Nasce e desenvolve-se, assim, o movimento
catequético .

1.2 Movimento catequético pré-conciliar: do catecismo à catequese

Pelo fim do século XIX desenvolveu-se um vasto movimento de ideias e iniciativas


que visava à renovação e ao incremento da catequese na Igreja. É o que tradicionalmente se
chama movimento catequético .2

1
Ver, a esse respeito, a aguda análise de G. Adler - G. Vogeleisen, Un siècle de catéchèse en France 1893-1980
istoire- éplacements-Enjeux. Paris, Beauchesne, 1981, p. 23-140. Cf. também: Ralfy Mendes de Oliveira, O
movimento catequético no Brasil. São Paulo, Salesiana, 1980; Luiz Alves de Lima, A face brasileira da
catequese: um estudo histórico-pastoral do movimento catequético brasileiro das origens ao documento
Catequese renovada . Tese de doutorado, n. 346. Roma, Universidade Pontifícia Salesiana, 1995, p.146-
147; Id., O recente movimento catequético brasileiro , Revista de Catequese 19 (1996), n. 73, p. 5-24; Id.,
Gênese e significado do documento Catequese renovada: novas perspectivas . In: Mauro Passos, Uma
história no plural: 500 anos do movimento catequético brasileiro. Petrópolis, Vozes, 1999, p. 115-174. E.
Alberich - U. Gianetto (eds.), Il catechismo ieri e oggi: studi sul significato dei catechismi nel passato e nel
presente della Chiesa. Leumann (Turim), Elledici, 1987; A. Fossion, La catéchèse dans le champ de la
communication: ses enjeux pour l´inculturation de la foi. Paris, Cerf, 1990, p. 166-67 ( La contestation du
ª
catéchisme traditionnel ); M. Matos Holgado - V.M Pedrosa Arés, Catecismos y catecismo , Nuevo
Dic. Cat., p. 264-81.
2
Cf. U. Gianetto, Movimento catechistico , Diz.Cat., p. 448-50; L. Alves de Lima, A face brasileira da
catequese, p. 9-11.
82
O aspecto mais oficial do movimento é dado por uma série de estímulos e diretrizes
que, partindo de Roma, encontram eco nas diversas nações e Igrejas locais. Basta recordar a obra
promotora de São Pio X, sobretudo com a encíclica Acerbo Nimis (1905) e os catecismos
que trazem o seu nome (1905 e 1912), o decreto Provido Sane de 1935 e o Congresso
Catequético Internacional de Roma em 1950.3 Merecem ser lembrados os congressos
catequéticos realizados nas diversas nações, os esforços para a elaboração de catecismos em nível
nacional, a obra incansável de diversos promotores da renovação da catequese etc.4
Em um nível mais profundo, o movimento catequético encontrava em algumas nações o
terreno favorável a um reexame substancial da atividade catequética, sob o influxo das novas
correntes teológicas e pedagógicas e o uso de novos instrumentos de análise e interpretação.
Nesse sentido, merecem menção especial a Alemanha, a Áustria e a França. Numa visão de
conjunto do movimento catequético europeu,5 podem-se distinguir, de forma muito
aproximativa, três impactos determinantes: pedagógico, litúrgico, teológico-pastoral.

1.2.1 Impacto pedagógico

Um primeiro impacto (do fim do século XIX até a Segunda Guerra Mundial) é
marcado pela preocupação com o método do ensino religioso e pelo influxo das novas ideias
pedagógicas e psicológicas (O. Willmann, J. F. Herbart, J. Dewey, G. Kerschensteiner, A.
Ferrière etc.).6

3
Cf. G. Frumento, La catechesi nei documenti della S. Sede. Roma, Paoline, 1965; U.Gianetto, Magistero
(XX secolo) , Diz.Cat., p. 397-98.
4 No que se refere ao Brasil, cabe lembrar Ralfy Mendes de Oliveira, O movimento catequético no Brasil. São Paulo,
Salesiana, 1980; Id., O movimento catequético brasileiro saindo das sombras: o impulso do Vaticano II . In: Mauro
Passos, Uma história no plural: 500 anos do movimento catequético brasileiro. Petrópolis, Vozes, 1999, p. 61-
113; L. Mendes de Lima, O recente movimento catequético brasileiro , Revista de Catequese 19 (1996), n. 73, p. 5-
24; Id., Panorámica de la renovación catequística brasileña en los ultimos años , Medellín 18 (1992), n. 72, p. 795-
817; também publicado em Teología e catequeses 45-48 (1993), p. 369-95; Id., Catequese renovada: 20 anos. Notas
históricas . Vida Pastoral XLIV (2003), n. 232, set.-out., p. 3-8; Id., Catecismos doutrinais e o concílio
plenário latino-americano. Notas históricas por ocasião do centenário deste Concílio (1899). Revista de Catequese
22 (1999), n. 87, p. 5-9. Para a América Latina: Roberto Viola et al. Reflexiones catequeticas. Santafé de
Bogotá, Paulinas, 1996; Id., Visages de la catéchèse en Amérique Latine. Paris, Desclée, 1993; L. Alves de Lima, A
catequese na América Latina a partir de Vaticano II , Medellín 23 (1997), n. 89, marzo, p. 5-66; Ricardo Grzona,
Movimiento catequético . In: V. Pedrosa, Nuevo Dic. Catequese, p. 1587-1611; Lauren Fernández, A catequese na
América Latina e no Caribe , Revista de Catequese 26 (2003), n. 101, p. 51-53.
5
Para uma visão de conjunto, cf. Antonio Bollin - Francesco Gasparini, A catequese na vida da Igreja: notas de
história. Paulinas, 1998; José Geeurickx, A catequese na comunidade cristã: pequena história da catequese.
Petrópolis, Vozes, 1991; Israel José Nery, O novo catecismo e a história dos catecismos. Petrópolis, Vozes, 1993; A.
Etchegaray Cruz, História de la catequesis. Santiago del Chile, Paulinas, 1962; U. Gianetto, Movimento
catechistico , p. 448-50; Id., Monaco (Metodo di) , Diz. Cat., p. 440-41; G. Adler - G. Vogeleisen, Um siècle de
catéchèse, p. 141-316; V. M. Pedrosa, Ochenta años de catequesis en la Iglesia de España , Actualidad Catequetica
(1980), n. 100, p. 617-58.
6
Ver os verbetes específicos no Diz. Sc. Educ.
83
No centro da atenção encontra-se o problema do como ensinar melhor o catecismo,
levando-se em conta a condição da criança e a forma como ela aprende. Cumpre lembrar, nesse
sentido, a influência do chamado método de Munique e a obra incansável de muitos
pioneiros da renovação da catequese: H. Stieglitz, A. Weber, W. Pichler, M. Pfliegler, C. Quinet,
M. Fargues, F. Derkenne, M. Montessori, J. M. Dingeon etc.

1.2.2 Impacto litúrgico

Um segundo impacto tem como elemento determinante o movimento litúrgico, sobretudo


na sua versão pastoral (B. Beauduin, Congressos de Malines, 1908, e de Monserrat, 1915),
que introduz na catequese instâncias e recursos próprios da liturgia: canto, celebração, símbolos,
gestos etc.

1.2.3 Impacto teológico-pastoral

O terceiro impacto, entre a Segunda Guerra Mundial e o Vaticano II, caracterizou-se pelo
problema do conteúdo ou mensagem da catequese, e é também chamado
querigmático .7 Denuncia-se a articulação abstrata e escolar do catecismo tradicional e
propugna-se uma volta ao querigma apostólico e à genuína tradição catequética da Igreja.
Redescobre-se o cristocentrismo da catequese, a centralidade da história da salvação, a
dimensão bíblica e litúrgica da mensagem cristã, a concepção da catequese como educação da
fé. Algumas figuras bem conhecidas devem ser lembradas: J. A. Jungmann, F. X. Arnold, G.
Delcuve, J. Colomb, F. Schreibmayr, K. Tilmann, J. Hofinger.8

7
Sobre a renovação querigmática, cf. F. X. Arnold, Al servicio de la fe. Buenos Aires, Herder, 1960; G. B. Guzzetti,
La controversia sulla teologia della predicazione , La Scuola Cattolica 78 (1950), p. 260-82; E. Alberich,
Kerygmatica (Catechesi) , Diz. Cat., p. 374-76; A. Fossion, op. cit., p.165-96.
8
Diversas instituições e iniciativas relacionam-se a esse período fecundo: a fundação do Instituto Catequético de Paris
(Institut Supérieur de Pastorale Catéchétique, 1951) e de Bruxelas (Lumen Vitae, 1957), a Semana Internacional
de Catequese Missionária de Eichstätt, de 1960, o catecismo nacional alemão de 1955, o Diretório Catequético
Francês de 1964 etc.
84
1.3 A virada do Vaticano II: revisão global da catequese

O impacto do Concílio sobre a catequese foi profundo e determinante. Pode-se dizer que
ele marca o fim oficial da época do catecismo e, consequentemente, o início de uma revisão
em profundidade das coordenadas essenciais do fato catequético.9 Conquanto não aborde
diretamente o tema da catequese, toda a obra conciliar teve consequências importantes para
a compreensão do trabalho catequético, sobretudo mediante a revisão de alguns pontos de
referência essenciais à catequese, como a Palavra de Deus, a fé e a Igreja.
Mas a época pós-conciliar, rica e agitada, foi para a catequese, bem como para muitos
outros aspectos da vida eclesial, fecunda problemática. 10 Fecunda pela riqueza de realizações,
pela busca de novos caminhos, pelo elã e pela criatividade: elaboram-se novos catecismos, textos
e subsídios, são criados novos institutos e centros de catequese. Tanto no terreno da práxis como
no da reflexão catequética emergem novos aspectos e dimensões: a
instância antropológica, a centralidade bíblica, a dimensão sociopolítica, a prioridade dos adultos,
a influência da comunicação e dos audiovisuais, a ênfase sobre a comunidade etc. São
estímulos de grande alcance, capazes de dar uma face verdadeiramente nova, e em parte inédita,
à atividade catequética.
Não se pode negar, porém, que foi também um período angustiante e problemático,
marcado por transformações e novidades difíceis de controlar. Muitas vezes viveu-se uma
situação tão dinâmica e problemática que todas as referências da catequese pareciam entrar em
crise: conteúdos, métodos, espaços, destinatários, agentes etc. Momentos houve de conflitos e de
desvios, tensões e contestações, crises pessoais e de instituições. Não faltaram tentativas
desastradas e experiências mais generosas que iluminadas, mas não se deve esquecer que toda
transformação profunda traz consigo inevitáveis riscos e dificuldades: é o preço a pagar por todo
esforço sério de renovação.

9
Sobre a influência conciliar na catequese cf. E. Alberich, La pedagogia catechistica dopo il Concilio ,
Orientamenti Pedagogici 16 (1969), p. 292-325; Id., A catequese no contexto do Concílio Vaticano II e o pós
concílio , Revista de Catequese 16 (1993), n. 61, p. 15-26; Luiz Alves de Lima, A face brasileira da catequese,
principalmente o capítulo IV, p. 175-230; T. Filthaut, Svolte conciliari di una catechesi aggiornata. Leumann
(Turim), Elledici, 1969; M. van Caster, Catéchèse selon l´esprit du Vatican II , Lumen Vitae 21 (1966), p. 11-28; M.
Simon, Vatican II et le mouvement catéchétique , Revue Théologique de Louvain 9 (1978), p. 59-82.
10
Sobre a situação da catequese no período pós-conciliar e nos últimos anos, existe uma vasta bibliografia,
especialmente nas revistas de catequética. Para uma seleção indicativa, remetemos à bibliografia geral, no fim deste
livro.
85
1.4 Contribuição do magistério catequético

Mas o período pós-conciliar, mais que qualquer outro, foi também pródigo em novos
instrumentos e em diretrizes para uma renovação metódica da catequese eclesial. Cumpre
lembrar, antes de tudo, os vários documentos e manifestações que, em termos de Igreja universal,
representam um corpus catequético de notável alcance: o Diretório geral catequético de
1971; a publicação, em 1972, do Ordo initiationis christianae adultorum (Oica ou Rica), os
dois Sínodos de 1974 e 1977, com as respectivas exortações apostólicas conclusivas, Evangelii
Nuntiandi (EN) e Catechesi Tradendae (CT); e, em seguida, a encíclica Redemptoris
Missio (RM) (1990), o Catecismo da Igreja Católica (1992) e o novo Diretório geral para a
catequese (1997).
Ao lado desses eventos maiores da reflexão catequética situam-se outras manifestações e
documentos, nas Igrejas locais e particulares, de menor alcance mas não menos significativos
(por ex.: os documentos latino-americanos de Medellín, Puebla e S. Domingo), que acrescentam
outros elementos válidos à reflexão sobre o papel e a natureza da função catequética na Igreja de
hoje.11

1.5 Necessidade de um esclarecimento

A catequese pertence ao sinal da martyria eclesial, é parte do serviço da palavra ou


ministério profético, juntamente com outros momentos do mesmo ministério, como o anúncio
missionário, a pregação litúrgica, a reflexão teológica etc. Portanto, é dentro da martyria eclesial
que a catequese deve sempre repensar sua identidade. Mas também a emergência da
evangelização requer um esforço de esclarecimento, seja em relação à pastoral como um todo,
seja em relação à catequese, pois há muitos aspectos problemáticos.
O propalado primado da evangelização na missão da Igreja parece obscurecer muitas
funções tradicionais da catequese, ou, pelo menos, exigir uma revisão desta. O binômio
evangelização e catequese é com frequência citado em documentos e programas pastorais, muitas
vezes onde antes se falava simplesmente de catequese. Fala-se também de catequese
evangelizadora,12 de catequese missionária, e não poucas vezes a atividade catequética
parece desaparecer, ou pelo menos perder o vigor, diante da atualidade avassaladora da
opção evangelizadora. Por tudo isso, parece-nos necessário fazer um esforço para esclarecer
essa questão.

11
Cf. a documentação indicada na bibliografia geral no fim deste livro.
12
É a expressão difundida sobretudo na Semana Internacional de Medellín, em agosto de 1968, recolhida depois
pela II Conferência Episcopal Latino-americana (Celam) em setembro de 1968. Cf. Medellín (catequese) n. 9.

86
Uma outra dificuldade decorre do fato de existirem formas muito diversas de catequese
(itinerários catecumenais, preparação para os sacramentos, grupos de reflexão, cursos de
formação, leituras da Bíblia etc.), e de a própria atividade catequética receber nomes também
diversos (instrução religiosa, educação da fé, catequese, catecumenato, ensino religioso,
formação religiosa etc.). E não apenas isso: muitas vezes se fala de catequese com referência a
atividades eclesiais muito variadas: celebrações litúrgicas, oração e contemplação, grupos de
espiritualidade, de convivência, associações e movimentos etc. Como se vê, a catequese corre o
risco de estar em toda parte e de ser tudo, e assim perder significado e identidade no concerto das
funções da comunidade cristã. Também is o exige uma tentativa de elucidação e aprofundamento.

2. A CATEQUESE NO PROCESSO DA EVANGELIZAÇÃO:


IDENTIDADE E PERSPECTIVAS

Entende-se a natureza e o significado da catequese, antes de tudo, no contexto de que


falamos nos capítulos anteriores, da opção evangelizadora e dentro da função eclesial do
ministério da palavra (martyria).

2.1 Evangelização: sentido de um termo

O termo evangelização ,13 que ainda no Vaticano II aparece de forma não


determinante, tornou-se, no pós-concílio, sobretudo nos anos 70, extremamente atual.
Bastaria recordar a grande quantidade de documentos, congressos e programas pastorais
que, de alguma maneira, levaram ao Sínodo dos Bispos de 1974 e à posterior exortação
apostólica de Paulo VI, Evangelii Nuntiandi (1975). Nos anos 80 e 90 difundiu-se a expressão
nova evangelização , referindo-se especialmente à situação da Europa e no contexto do
quinto centenário da evangelização da América.14

13
Cf. D. Grasso, Evangelizzazione: senso di un termine . In: M. Dhavamony (ed.), Evangelisation. Roma,
Univ. Gregoriana, 1975, p. 21-47.
14
Esta expressão, nova evangelização , surgida sobretudo em relação com a situação europeia e como o quinto
centenário da evangelização da América, recebe frequentemente sentidos diversos. Gevaert distingue pelo menos
cinco sentidos: Primera evangelización: aspectos catequéticos. Madri, CCS, 1992, p. 8-11. Mas, no fundo, a
exigência mais importante continua sendo, na verdade, uma opção efetivamente evangelizadora.
87
Uma importante mudança de rumos: a evangelização, que por muito tempo era considerada
tarefa de fronteira, nas chamadas terras de missão , foi reconhecida missão essencial de toda a
Igreja:

Foi com alegria e alívio que nós ouvimos, no final da grande assembleia de outubro de 1974, estas
luminosas palavras: Nós queremos confirmar, mais uma vez, que a tarefa de evangelizar todos os
homens constitui a missão essencial da Igreja , tarefa e missão, que as amplas e profundas
mudanças da sociedade atual tornam ainda mais urgentes. Evangelizar constitui, de fato, a graça e
a vocação própria da Igreja, a sua mais profunda identidade (EN n. 14).

O termo evangelização jamais teve um sentido totalmente unívoco.

2.1.1 No Novo Testamento

Já no NT aparece a oscilação de sentido do verbo evangelizar (euanguelìzesthai). Às


vezes indica a proclamação do querigma em sentido estrito, isto é, o anúncio público e solene
da salvação de Deus, oferecida a todos os seres humanos em Jesus Cristo, morto e ressuscitado.
Outras vezes refere-se a toda a atividade da Igreja, que com a palavra e a vida anuncia e torna
operante a salvação.15 No coração da evangelização está sempre o Evangelho , que é ao mesmo
tempo a Boa Nova da salvação, a proclamação de que chegou o Reino de Deus, a revelação do
mistério escondido em Deus, o anúncio da Páscoa de Cristo, revelação suprema de Deus e
do seu plano na história. 16

2.1.2 No Concílio Vaticano II

Nos documentos conciliares, o termo evangelização passa de um significado restrito,


como anúncio do Evangelho aos não crentes com vistas à conversão, a significados mais amplos,
que identificam a evangelização com todo o conjunto da atividade profética da Igreja ou
precisamente com todo o agir eclesial enquanto atividade missionária. Grasso resume assim seu
estudo do termo evangelização nos documentos conciliares:

15
R. Fabris, Evangelizzazione . In: J. B. Bauer - C. Molari (eds.), Dizionario teologico. Assis, Cittadella, 1974, p.
245.
16
Cf. A. M. Henry, La forza del Vangelo. Assis, Cittadella, 1969, p. 13.
88
Podemos concluir que o exame do termo evangelização nos documentos conciliares nos
permite distinguir nele uma tríplice acepção: ou apenas a pregação missionária (Ad Gentes n.6,
26), ou todo o ministério da palavra (Lumen Gentium n. 35, 18; Christus Dominus n. 6,10;
Gaudium et Spes n. 44, 13; Apostolicam Actuositatem n. 2, 20 etc.), ou toda a atividade missionária
17
da Igreja (Ad Gentes 23,6; 27,15 etc.).

2.1.3 No pós-concílio

Os trabalhos do Sínodo de 1974 sobre a evangelização orientaram-se claramente no sentido


de não a restringir ao anúncio missionário em sentido estrito, dirigido aos não crentes, mas
de entendê-la como sendo toda a atividade missionária da Igreja, como quer que seja exercida. 18
A Evangelii Nuntiandi confirmou depois o sentido amplo do termo, explicitando sua
complexidade (n. 17) e riqueza de dimensões (n.18-24):

Como dissemos, a evangelização é um processo complexo, composto de elementos vários:


renovação da humanidade, testemunho, anúncio explícito, adesão do coração, ingresso na
comunidade, acolhimento dos sinais, iniciativas de apostolado (EN 24).

Esta acepção ampla do termo foi adotada também no Diretório geral para a catequese:

Anúncio, testemunho, ensino, sacramentos, amor ao próximo, fazer discípulos: esses aspectos
todos são caminhos e meios para a transmissão do único Evangelho e constituem os
elementos da evangelização [...] Os agentes da evangelização devem saber agir com uma
visão global desta e identificá-la com o conjunto da missão da Igreja (DGC n. 46).

Em conformidade com isso, é preciso conceber a evangelização como o processo através do qual a
Igreja, movida pelo Espírito, anuncia e difunde o Evangelho em todo o mundo (DGC n. 48).

Portanto, pode-se concluir que, na consciência atual da Igreja, a evangelização pode ser
definida como o anúncio e o testemunho do Evangelho por parte da Igreja, através de tudo o
que ela diz, faz e é.19

17
D. Grasso, loc. cit., p. 29-30.
18
Cf D. Grasso, loc. cit., p. 42. Ver também a exposição bastante clara de J. Gevaert, op. cit., p. 12-14.
19
Cf. Espanha CC, n. 24-29; Puebla, n. 272.
89
A evangelização encerra, assim, todo o agir eclesial, mas enquanto direcionado para
anunciar e testemunhar o Evangelho do Reino. Isso não acontece de forma automática, como se
bastasse a vida ordinária da Igreja, vivida de qualquer maneira, para evangelizar. Não é assim: é
preciso uma verdadeira transformação da presença cristã, uma vez que a atividade eclesial não
evangeliza, não adquire todo o seu sentido senão quando se torna testemunho, provoca a
admiração e a conversão, se faz pregação e anúncio da Boa Nova (EN n. 15).
Essas elucidações sobre o significado da evangelização ajudam-nos agora a precisar a
identidade da catequese, dentro do ministério da palavra.

2.2 Catequese no ministério da palavra

Ao dinamismo global da evangelização, e constituindo o elemento fundamental desta


(DGC n. 50), pertence aquilo que, desde os tempos apostólicos, se chama diaconia (ou serviço,
ministério) da palavra (At 6,2-4). É o conjunto das manifestações do sinal eclesial da martyria
ou função profética. A catequese faz parte desse ministério.

2.2.1 Diversas formas do ministério da palavra

Uma divisão tradicional distingue três formas principais do serviço da palavra: o anúncio
missionário (ou querigma, ou primeira evangelização), a catequese e a pregação litúrgica (ou
homilia, ou pregação de comunidade).20 Essa divisão refere-se tanto à diversidade dos
destinatários (não crentes, catecúmenos, fiéis) quanto à inserção progressiva na economia
sacramental (conversão, batismo, Eucaristia) e às etapas principais do dinamismo da fé
(aderir à fé, aprofundar a fé, viver a fé). Às vezes o esquema é modificado21 ou ampliado, como
no DGC (n. 51), que distingue cinco formas: a convocação e o chamado à fé, a iniciação, a
educação permanente da fé, a função litúrgica e a função teológica.

20
Cf. por ex.: D. Grasso, L´annuncio della salvezza. Nápoles, D´Auria, 1965, p. 325-28; C. Floristan - M. Useros,
Teologia dell´azione pastorale. Roma, Paoline, 1970, p. 435-38; V. Schurr et al., Funzioni della Chiesa.
Roma/Brescia, Herder-Morcelliana, 1971.
21 C. Floristan distingue estas três formas: evangelização (kerigma), catequização (didaskalia) e interpretação
teológica (krisis); Teología práctica. Teoría y práxis de la acción pastoral. Salamanca, Sígueme, 1991, p. 225.
90
2.2.2 Testemunho bíblico e histórico

Observamos nas Igrejas apostólicas um exercício muito variado e não cristalizado do


ministério da palavra. A comunidade cristã, nascida da resposta de fé ao anúncio do Evangelho,
desenvolve e aprofunda de formas diversas a palavra que edifica a comunidade e a torna
testemunha diante de todos. Algumas formas mais típicas em geral são assim descritas:
A evangelização, isto é, o primeiro anúncio da mensagem, a fim de suscitar a adesão
em quem ainda não tem fé; a instrução ou doutrina, isto é, o aprofundamento, que tem a
finalidade de fazer compreender mais a fundo, e de depreender, do cerne da mensagem, todas as
implicações para a vida; a profecia, que leva a comunidade a discernir a vontade de Deus na
história; o testemunho, que visa a ilustrar e garantir e convencer; a exortação, que visa a corrigir e
infundir entusiasmo.23
Em todas essas manifestações da palavra é a vida concreta das comunidades que se torna
critério de articulação, na fidelidade à mensagem da salvação que tudo unifica. Mas na oscilação
terminológica do NT, pode-se constatar certa distinção básica entre um primeiro momento de
lançamento da mensagem, por intermédio de verbos como gritar (krazein), anunciar (keryssein),
evangelizar (euanguelìzein), testemunhar (martyrein), e um segundo momento de explicitação e
aprofundamento, revelado pelos verbos ensinar (didaskein), catequizar (katechein), pregar
(homilein), transmitir (paradidonai) e semelhantes. É nesse segundo momento de explicitação e
aprofundamento que encontramos o termo consagrado katechein:

Há uma tensão semântica entre keryssein e katechein. Keryssein indica a primeira vez, o impacto
fundamental de uma Palavra, de uma mensagem, com respeito ao eco que depois lhe prolonga o
24
efeito, a compreensão.

22
O DGC n. 52 o reconhece, e prova disso é também a diversidade de significados dados pelos vários autores aos
termos: pregação, querigma, anúncio, evangelização, catequese etc. Cf. D. Grasso, Evangelizzazione, Catechesi,
Omilia, Gregorianum 42 (1961), n. p. 242-67.
23
B. Maggioni, Le funzioni di parola nell´esperienza delle comunità neotestamentarie , Servizio della Parola
(1976), n. 81, p. 33-34. Cf. Espanha CC, n. 68-74.
24
G. Laiti, La catechesi nel catecumenato antico . In: G. Cavallotto (ed.), Iniciazione cristiana e Catecumenato:
divenire cristiani per essere battezzati. Bolonha, Dehoniane, 1996, p. 65.
91
Com o termo katechein, que constitui uma novidade no NT, ressalta-se a originalidade da
catequese, que consiste no fazer eco a uma Palavra que está mais acima, indisponível,
soberana. 25 Literalmente significa ressoar, fazer ressoar , com o sentido de: instruir, ensinar
oralmente, contar (cf. Lc 1,44; At 18,25; 21, 21; Rm 2,18; 1Cor 14,19; Gl 6,6).
No período pós-apostólico e patrístico, a catequese receberá um sentido mais preciso de
ensino fundamental da fé cristã no interior e no contexto do catecumenato. Na época medieval
desaparece praticamente o termo catequese , e surgem outros como catechismus, instructio, que,
muitas vezes, se referem às perguntas e respostas previstas no início do rito batismal. Na idade
moderna (séculos XVI a XIX) volta a florescer a atividade catequética com outros
instrumentos (difusão dos catecismos impressos) e outros nomes: catecismo, doutrina, instrução
religiosa, ensino religioso etc. Somente com o desenvolvimento do movimento catequético do
século 20 se retomará o termo tradicional catequese , com o objetivo de redescobrir seu sentido
genuíno original e de reinterpretá-lo à luz das transformações históricas e culturais.26

2.3 Identidade da catequese

Como se vê, a tradição da Igreja mostra notável variedade de atividades designadas


com o termo catequese ou equivalentes. Em certas épocas, esses termos se referem a atividades
bem precisas, e muitas vezes institucionalizadas, como o catecumenato antigo, a iniciação
sacramental, a instrução religiosa das crianças ou dos adultos, o ensino da religião na escola etc.
Mas para além desse uso particular do termo, reservado a formas historicamente condicionadas, a
catequese é entendida hoje em sua acepção mais ampla e autêntica, em geral adotada na reflexão
catequética e no magistério eclesial da catequese.

25
P. Mourlon Beernaert, Le verbe grec katêchein dans le N.T. , Lumen Vitae 44 (1989), n. 3, p. 377-87.
26
Cf. E. Alberich, Catechesi , Diz.Cat., p. 104-08; A. Liégé, Que quiere decir catequesis? : ensayo de aclaración .
In: P. A. Liégé et al., Que és la catequesis?. Madri/Asunción, Marova-Claf, 1968, p. 13-21. Em A. Exeler (Wesen
und Aufgabe der Katechese. Friburgo, Herder, 1966, p. 221-32) encontra-se uma síntese da história dos significados
do termo catequese .
92
2.3.1 Que vem a ser a catequese?

Existem de fato muitas definições de catequese.27 Algumas, que se encontram em


documentos oficiais do magistério, são bastante citadas e utilizadas. Assim, por exemplo, a
expressão conciliar que fala da catechetica institutio, que tem por fim entre os homens, tornar a
fé viva, consciente e operosa, por meio de uma instrução apropriada ,28 ou a definição, não
menos citada, do Sínodo de 1977: Esta [...] consiste na metódica e progressiva educação
da fé, unida a um constante processo de maturação da mesma fé .29
Cumpre lembrar também a definição que se encontra no Diretório geral catequético, de
1971: No âmbito da atividade pastoral, a catequese é a ação eclesial que conduz as comunidades
e cada cristão à maturidade da fé (DCG [1971] n. 21).
O novo DGC define a catequese como período no qual se estrutura a conversão a
Jesus Cristo (n. 63), função que assenta os alicerces do edifício da fé (n. 64), iniciação
ordenada e sistemática na revelação (n. 66). Em particular, é descrita a catequese de
iniciação como formação orgânica e sistemática da fé (n. 67), que vai muito além do
ensino tradicional:
Essa formação orgânica é mais que um ensino: é um aprendizado de toda a vida cristã, uma
iniciação cristã integral , que favorece um autêntico seguimento de Cristo, centrado em sua pessoa.
Trata-se, com efeito, de educar para o conhecimento e para a vida de fé, de tal modo que todo o
homem, nas suas experiências mais profundas, se sinta fecundado pela Palavra de Deus (DGC n.
67).

Mesmo na variedade das expressões, pode-se falar de um certo consenso, na Igreja atual, em
definir a identidade da catequese em torno de três polos essenciais de referência: a palavra de
Deus, a fé e a Igreja:

27
Cf. por exemplo, V. M. Pedrosa - R. Lázaro Recalde, Catequesis , Nuevo Dic. Cat., p.295-316; F. Coudreau,
Es posible enseñar la fé? Reflexiones y orientaciones para una pedagogía de la fé. Madri, Marova, 1976; p.
157-58; E. German, 2000 ans d´éducation de la foi. Paris, Desclée, 1983, p. 162-63; E. Alberich, Catechesi, p. 106-
107.
28
CD n. 14. Cf. nesse sentido DCG (1971), n. 17 e RdC n. 37.
29
Mensagem do Sínodo de 1977, n. 1. Cf. Puebla n. 977, Brasil CR n. 72.
93
a catequese é antes de tudo ministério da palavra, e, portanto, serviço ao
Evangelho, comunicação da mensagem cristã e anúncio de Cristo;
a catequese é educação da fé, mediação eclesial para favorecer o nascimento e o
crescimento da fé nas pessoas e nas comunidades;
a catequese é ação de Igreja, expressão da realidade eclesial e momento
essencial da sua missão.
Em síntese, se temos presentes os dados da tradição e a reflexão atual, podemos chamar de
catequese toda forma de serviço eclesial da palavra de Deus orientada para fazer amadurecer, na fé
cristã, as pessoas e as comunidades. E em torno do tríplice polo da palavra, da fé e da Igreja,
procuraremos aprofundar a compreensão de sua natureza e tarefa.

2.3.2 Algumas distinções e opções prioritárias

Já este primeiro contato com o sentido da catequese permite-nos precisar alguns


pontos e sugerir algumas opções:
A catequese constitui um momento significativo dentro do processo global de
evangelização. Se esta encerra, na realidade, todo o conjunto do anúncio e testemunho
dados pela Igreja ao Evangelho, cumpre dizer que a catequese é sempre uma forma de
evangelização: a catequese, inserida na missão evangelizadora da Igreja como seu
momento essencial, recebe da evangelização um dinamismo missionário que a
fecunda interiormente e a configura na sua identidade (DGC n.59; cf. CT n. 18) .
A catequese, por sua natureza, constitui um momento diverso e posterior ao primeiro
anúncio ou primeira evangelização (DGC n. 61; CAL n. 97). Ela pressupõe este primeiro
momento querigmático, orientado para suscitar a conversão inicial. Não é sempre possível,
porém, traçar os limites entre esses dois momentos, e um dos deveres da catequese é a
conversão ou o apelo à conversão, lá onde esta ainda não ocorreu (DGC n. 62). A situação
pastoral de hoje leva a catequese a incrementar sua função missionária, sobretudo nas
Igrejas de antiga tradição cristã, onde a pertença sociológica ao cristianismo muitas
vezes não implica a adesão pessoal de fé.30
Por consequência, ganha especial relevo, no campo da atividade catequética, a
catequese de iniciação em suas diversas formas, como formação orgânica e fundamental da fé
(DGC n. 67). Cabe-lhe uma função única no processo da evangelização:

30
Cf. CT n. 19, Puebla n. 998, Espanha CC n. 47-50, CAL n. 97.
94
A catequese de iniciação é, pois, o elo necessário entre a ação missionária, que chama à fé, e a
ação pastoral, que alimenta continuamente a comunidade cristã. Não é, portanto, uma ação
facultativa, mas uma ação basilar e fundamental para a construção tanto da personalidade do
discípulo, quanto da comunidade (DGC n. 64).

Nesse contexto justifica-se também a preferência pela catequese dos adultos, segundo
uma opção amadurecida já no primeiro pós-concílio e confirmada em toda a parte:31
Lembrem-se também [os pastores] de que a catequese dos adultos, pelo fato de ser dirigida a
pessoas capazes de uma adesão e de uma atuação verdadeiramente responsável, deve ser
considerada como a forma principal de catequese, à qual todas as demais, nem por isso
menos necessárias, se subordinam (DCG [1971] n. 20).

A função catequética da Igreja é muito vasta, e se realiza de formas bem


diversas: privadas e públicas, espontâneas e institucionalizadas, ocasionais e
sistemáticas. Assume diversas formas: ensino, exortação, debate, testemunho,
reflexão etc. Realiza-se por meio de uma grande variedade de atividades
concretas: itinerários catecumenais, preparação para os sacramentos, cursos de
formação religiosa, reflexão comunitária, pregação litúrgica, comunicação
midiática etc. (cf. DGC n. 71).
Essa dispersão da função catequética em tantas e diversas formas não deve
levar à sua perda de identidade, que deriva de sua natureza de serviço da
palavra para o amadurecimento da fé. No conjunto das atividades eclesiais, a
catequese se define pelo seu caráter de aprofundamento (relativamente à fé
inicial) e de iniciação ou introdução (às diversas manifestações da vida
cristã: oração, liturgia, compromisso, testemunho etc.). 32 Nem por isso tudo
deve se chamar catequese na vida da Igreja, muito embora se possa dizer
que todo o conjunto do agir eclesial contém sempre em si um aspecto ou uma
dimensão catequética.

31
Para uma visão histórica de conjunto, cf. E. Alberich - A. Binz, Catequese com adultos: elementos de
metodologia. 2
32
Uma atividade se revela catequética pelo seu caráter de introdução, de iniciação e de acompanhamento. Cabe à
catequese, por exemplo, a iniciação à liturgia e a introdução à oração. A própria realização, a celebração e a
oração, não são catequese. Ainda que permaneçam sendo vitais, dependem sempre, de algum modo, da
catequese : Alemanha KWK, A 3.6.
95
3. ELUCIDAÇÃO TERMINOLÓGICA

A catequese recebe nomes diversos nas diversas áreas culturais, e nem sempre se
distinguem com facilidade os limites precisos entre as várias denominações, que em parte são
sinônimas e em parte podem indicar realidades mais ou menos diferenciadas. Parece-nos útil
uma tentativa de esclarecimento.33
A terminologia catequética moderna pode ser reunida em torno de três núcleos
semânticos principais: catequese , fé e religião .

3.1 Terminologia relativa à catequese (de katechein: fazer ressoar)

Pensemos nos termos tradicionais derivados do verbo katechein, e que constituem a


família terminológica mais clássica na tradição da Igreja:
Catequese, catequístico, catequético,34 catecismo. São os termos mais
apropriados e mais fundados na tradição para indicar o conjunto e as
modalidades da função catequética da Igreja, tal como definida anteriormente.
Eles conservam sua validade e importância, ainda que as conotações negativas
adquiridas por alguns deles obriguem, em alguns lugares, a uma reavaliação
semântica do termo ou à devida substituição.
Catecumenato, catecúmeno, catecumenal: têm origem na antiga instituição para
os candidatos ao batismo e à inserção na Igreja. Hoje se fala de catecumenato e
de catecumenal, seja em sentido próprio, a propósito de itinerários de
preparação ao batismo, 35 seja para indicar atividades catequéticas de cunho
evangelizador.

33
Para uma visão mais detalhada, cf. E. Alberich L´educazione religiosa oggi: verso um chiarimento
concettuale e terminologico , Orientamenti Pedagogici 44 (1997), n. 2, p. 311-33; publicado também em
castelhano: La educación religiosa hoy: havia una clarificatión conceptual y terminológica , Catecheticum 1
(1998), p. 45-64.
34
Em si mesmos, os dois adjetivos catequístico e catequético se referem respectivamente à ação da catequese
(atividade catequística) e à reflexão científica sobre a catequese (atividade catequética ). Na prática, porém,
são usados com sinônimos, com nítida preferência pelo termo catequético , que tende a substituir o outro, por
demais carregado de conotações negativas e infantilizantes.
35
Por exemplo: as diversas formas de restauração do catecumenato dos adultos, as comunidades
neocatecumenais etc. Cf. E. Alberich - A. Binz, Formas e modelos de catequese com adultos: panorama
internacional. São Paulo, Salesiana, 2001, p. 27-48. Cf. España CC n. 83-105; J. Lópes Sáez, Catecumenato e
inspiración catecumenal , Nuevo Dic. Cat., p. 281-95.
96
3.2 Terminologia relativa à fé

É uma terminologia que floresceu sobretudo no movimento catequético do século XX,


especialmente na fase chamada querigmática ,36 e serviu para superar a concepção
intelectualista da catequese e a reencontrar na visão renovada da fé seu verdadeiro objetivo.
A expressão mais recorrente é educação da fé (cf. CT n. 18; DGC nn. 69-71) (ou educação
para a fé, ou educação na fé), juntamente com outras semelhantes: ensino da fé
(Glaubensunterweisung), transmissão da fé (transmission de la foi), comunicação da fé,
itinerários de fé etc.
Esse tipo de terminologia, como veremos mais adiante, encerra alguns problemas de
definição teológica, pois é preciso esclarecer em que sentido e até que ponto a fé pode ser
educada, ensinada, transmitida etc. Entendidas, porém, em sentido teologicamente correto,
são expressões válidas para indicar a função da catequese, e como tais são hoje amplamente
acolhidas na práxis e na reflexão catequética, especialmente na forma mais generalizada de
educação da fé.

3.3 Terminologia relativa à religião : catequese e educação religiosa

Educação religiosa, formação religiosa, ensino religioso, instrução religiosa, cultura


religiosa etc.: são denominações várias que somente um exame mais atento dos diversos
contextos culturais permite apreender em sua exata identidade e, portanto, determinar
também se pertencem ou não ao âmbito da atividade catequética. Muitas vezes são
denominações inseridas no contexto das instituições civis, do discurso pedagógico geral, do
tecido cultural e social.
Algumas dessas expressões indicam às vezes, de forma concreta, o ensino da religião
na escola (ensino religioso, aula de religião, Religionsunterricht, enseñanza religiosa,
eligious ducation),37 cuja identidade e cujo relacionamento com a catequese devem ser
indicados com precisão, como veremos oportunamente.

36
Basta lembrar dois títulos clássicos: F.X. Arnold, Dienst am Glauben. Friburgo, Herder, 1948 (Il ministero
della fede. Alba, Paoline, 1953); J. A. Jungmann, Glaubensverkündigung im Lichte der Frohbotschaft.
Innsbruck, Tyrolia, 1963 (La predicazione alla luce del Vangelo. Alba, Paoline, 1965). Cf. E. Alberich,
Educazione della fede , Diz.Cat., p. 235-36.
37
A França é uma exceção, pois lá enseignement religieux indica a atividade catequética, em geral extra-
escolar, como se vê no nome do departamento nacional de catequese: Centre National de l´Enseignement
Religieux (CNER).
97
Mais difíceis de precisar são as denominações educação religiosa (Religiöse Erziehung,
Religious Education), e formação religiosa (formation religieuse, religiöse Bildung), de
largo uso internacional, tanto no terreno científico como no operativo-prático.
Se os termos religião e religioso se referem de modo particular às diversas
confissões religiosas (católicos, protestantes, judeus, muçulmanos etc.), a
educação (ou formação) religiosa indica ou o processo de socialização religiosa
de cada Igreja ou comunidade em relação aos próprios membros (e neste
sentido equivale de fato a catequese, se em âmbito cristão), ou então uma
abordagem mais ampla do fato religioso nas suas concretizações
históricas.38
Em muitas regiões ou instituições cristãs, religião e religioso correspondem
concretamente aos conteúdos da fé e às diversas manifestações da experiência
eclesial (sacramentos, oração, compromisso ético etc.): neste sentido, educação
religiosa ou formação religiosa traduzem claramente momentos de
aprofundamento da fé que, com razão, recebem o nome de catequese.39
Se, em vez disso, se fala de religião para indicar a dimensão mais profunda e
transcendente da existência humana, onde emergem os problemas radicais de
sentido, a educação religiosa diz respeito ao processo de desenvolvimento
dessa dimensão religiosa da vida, como habilitação para assumir séria e
responsavelmente a problemática religiosa da existência.40
Falando em termos gerais, hoje a expressão educação religiosa assumiu um sentido
muito amplo, como categoria global capaz de abranger uma grande variedade de práticas e
atividades.41 Ela tende a exprimir de forma compreensiva o conjunto dos processos
educativos que dizem respeito à dimensão e aos fenômenos religiosos, como são, por
exemplo:

38
Como é o caso, por exemplo, do projeto catequético nacional inglês: cf. J. Gallagher, Guidelines. Londres,
Collins, 1986, p. 12.
39
Pode-se tomar como exemplo o Instituto Catequético Lumen Vitae de Bruxelas, que por muitos anos teve
o nome de Centre International d´Études de la Formation Religieuse . Em outros casos, com o termo
educação ou formação , sugere-se a diferença de objetivo e de conteúdos em relação à catequese
propriamente dita: cf. Inglaterra (Cornerstone) n.16; R. Comte, Quels objectifs? . Catéchèse 82 (1981), p. 69
77.
40
Cf. E. Feifel et al. (eds.), Handbuch der Religionspädagogik, vol. I. Gütersloh-Zurique, Gerd Mohn-Benziger,
1973; Inglaterra, Cornerstone, p. 16-19; A. P. Purnell, Our faith story. Londres, Collins, 1985, p. 73; W. Simon,
Religione-religiosità , Diz. Cat., p. 535-37.
41
Cf. E. Alberich, L´educazione religiosa oggi, p. 321-24.
98
a catequese das comunidades e das Igrejas, como aprofundamento da fé;
os processos de iniciação e socialização cristã de crianças, jovens e adultos;
o ensino religioso nas escolas (ERE), considerado hoje sobretudo como abordagem
educativa e cultural do fato religioso, e, pois, diferente da catequese;
a educação religiosa na família, nas diversas formas de testemunho, experiência, ensino,
exortação etc.
a atividade formadora de associações e movimentos, sobretudo para jovens;
diversas formas de ação pastoral (pastoral da juventude, pastoral escolar, pastoral
familiar etc.) com propósito educativo em relação à dimensão religiosa;
a ação da mídia e de todo o vasto mundo da comunicação social de conteúdo ou de
cunho religioso;
as intervenções da política cultural sobre os processos e condutas religiosas.

Isso significa que a educação religiosa abrange geralmente um campo mais vasto do
que o da catequese. Na prática, a afinidade real entre educação religiosa e catequese
dependerá, em última análise, da vinculação efetiva dos conteúdos e dos objetivos da
experiência cristã ao processo educativo e, no que tange à teoria, do modo de conceber a
relação entre fé e educação, entre ciências da educação e ciências teológicas.42
Esses esclarecimentos permitem situar no seu contexto semântico, e compreender
melhor no seu significado, o que, ao longo das páginas que se seguirão, será em geral
chamado de catequese.

4. O SIGNIFICADO DA OPÇÃO PELA CATEQUESE PARA O FUTURO DA IGREJA

No fim deste primeiro contato com a identidade da catequese, convém destacar o lugar
e o alcance da tarefa catequética no contexto atual da vida cristã e eclesial.
Cumpre lembrar que, se a evangelização foi redescoberta como a missão essencial da
Igreja , a graça e a vocação própria da Igreja, sua identidade mais profunda (EN n. 14), a
catequese participa da mesma dignidade e importância, como momento vinculado, de forma
essencial, ao dinamismo da evangelização. Sendo anúncio e aprofundamento da mensagem
evangélica para o amadurecimento da fé, a catequese encontra-se no próprio coração da
missão eclesial, instrumento da existência da Igreja como sacramento do Reino.
Se uma política educativa adequada é fator essencial de renovação e de transformação
para qualquer sociedade, pode-se afirmar que a ação catequética, enquanto educação e
promoção da vida de fé, é também elemento fundamental da renovação da Igreja segundo as
novas perspectivas que se abrem nos dias de hoje.
É fácil, pois, entrever o alcance de uma opção pastoral que proclama a prioridade da
catequese, tal como foi solenemente incutida em diversos momentos do magistério eclesial:

42
Cf. E. Feifel, Glaube und Bildung . In E. Feifel et al. (eds.), op. cit., vol. III, p. 25-41; G. Groppo,
Educazione cristiana , Diz.Cat., p. 233-35; Id., Teologia dell´educazione: origine, identità, compiti. Roma, LAS,
1991; H. Schillig, Teologia e scienze dell´educazione. Roma, Armando, 1974.

99
A Igreja, neste século XX que caminha para o fim, é convidada por Deus e pelos
acontecimentos que são apelos da parte de Deus a renovar sua confiança na ação
catequética como tarefa absolutamente primordial da sua missão. Ela é chamada a
consagrar à catequese seus melhores recursos de homens e de energias, sem poupar
esforços, fadigas e meios materiais, para melhor organizá-la e para formar um pessoal
qualificado. Não se trata de um simples cálculo humano, mas de uma atitude de fé (CT n.
15).

Nesta nova situação carente de evangelização, o anúncio missionário e a catequese,


sobretudo para jovens e adultos, constituem uma prioridade indiscutível (DGC n. 26).

Já se afirmou que, assim como a Igreja sentiu a necessidade, no Concílio de Trento, de dar
um impulso decisivo à formação do clero, com a criação dos seminários, hoje está empenhada
em empreender, de forma totalmente nova, a tarefa da formação religiosa de todo o povo
cristão.43
Talvez seja incalculável o efeito benéfico de uma renovação da ação catequética, desde
que não seja concebida em estágio conservador (tentação fácil num momento de perda
progressiva de relevância social da Igreja), mas em uma perspectiva promocional e
transformadora, aberta à criação de novas experiências cristãs no mundo de hoje. O que está
em jogo é algo grandioso, assim como grande também é o desafio lançado aos cristãos da
nossa sociedade. Vista na sua identidade mais profunda, a função catequética constitui um
momento essencial, fundamental, na vida da Igreja (DGC n. 64; CAL n. 99).

43
W. Gruen, Atos dos apóstolos, atos dos/as catequistas , Segunda Semana Brasileira de Catequese: com
adultos catequese adulta. São Paulo, Paulus, 2002, p. 535 (Estudos da CNBB n. 84).
100
SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS

Para mais aprofundar o tema da evangelização e do sentido da opção evangelizadora, há uma


vasta bibliografia. A título de orientação, indicamos os seguintes trabalhos:
ALBERICH, E. Um novo paradigma para a catequese , Revista de Catequese 26
(2003), n. 101, p. 34-41.
ALVES DE LIMA, L. Elementos fundamentais de catequese renovada. São
Paulo, Salesiana, 1986.
ANTHONY, F.-V. Evangelization: growing understanding of a complex process ,
Salesianum 61 (1999), p. 17-35.
CADAVID DUQUE, L. A. Hacer creíble el anuncio cristiano en América Latina. Santafé
de Bogotá, Celam, 1997.
DHAVAMONY, M. (ed.). Evangelisation. Roma, Universidade Gregoriana, 1975.
FLORISTAN, C. Para comprender la evangelización. Estella, Verbo Divino, 1993.
GASTALDI, Í. Educar e evangelizar na pós-modernidade. 4a ed. São Paulo,

GEVAERT, J. Prima evangelizzazione spetti catechetici. Leumann (Turim), Elledici, 1990.


GONZALEZ-CARVAJAL, L. Evangelizar en un mundo postcristiano. Santander, Sal
Terrae, 1993.
GUITERAS VILANOVA, J. Evangelización , Nuevo Dic. Cat., p. 855-64.
LES ÉVÊQUES DE FRANCE. Proposer la foi dans la societé actuelle. III. Lettre aux
catholiques de France. Paris, Cerf, 1997 (trad. ital. Proporre la fede nella società attuale:
lettera dei vescovi di Francia ai cattolici. Turim, Leumann [Turim], Elledici, 1998).
MARTÍN VELASCO, J. El malestar religioso de nuestra cultura. Madri, Paulinas, 1993.
MERLOS, A. F. Fundamentos teológicos de catequese latino-americana Revista
de Catequese 6 (1983), n. 21, p. 17-21.
PONTIFICIA UNIVERSITÀ URBANIANA (ed.). L annuncio del Vangelo oggi: commento
all Esortazione Apostolica di Paolo VI Evangelii Nuntiandi . Roma, Pont. Univ.
Urbaniana, 1977.
SAVAGNONE, G. Evangelizzare nella post-modernità. Leumann (Turim), Elledici, 1997.

Para as relações entre catequese, primeira evangelização e pregação litúrgica, e


também para o esclarecimento dos termos relativos à catequese, podem-se consultar os
documentos e as obras gerais de catequética e especialmente os dicionários (v. bibliografia
no fim do livro). Em especial sugerimos:
ADLER, G. - VOGELEISEN, G. Un siècle de catéchèse en France 1893-1980 istoire
- éplacements - Enjeux. Paris, Beauchesne, 1981.
ALBERICH, E. L educazione religiosa oggi: verso un chiarimento concettuale
e terminologico Orientamenti Pedagogici 44 (1997), n. 2, p. 311-33.
. Formas e modelos de catequese com adultos: panorama internacional. São
Paulo, Salesiana, 2001, p. 27-48.
. Motivações para a catequese dos adultos Revista de Catequese 4 (1981), n. 16, p.
5-15.
ANTONIAZZI, A. Catequese de adultos: um desafio que não pode esperar Revista
de Catequese 8 (1985), n. 30, p. 18-25.
. Formação de cristãos adultos: desafios e respostas . In: CNBB - Dimensão
Bíblico-Catequética O itinerário da fé na iniciação cristã de adultos. São Paulo, Paulus, 2001,
p. 225-71.
AUDINET, J. Catechesi, catechismo, catechetica . In: K. Rahner (ed.). Enciclopedia
Teologica Sacramentum mundi. Brescia, Morcelliana, 1974, p. 71-82.

101
BOHN, A. F. Catequese e pluralismo religioso Revista de Catequese 13 (1990), n. 49, p.
18- 30.
BROSHUIS, I. Catequese de adultos na comunidade cristã (Coincat): uma leitura
brasileira Revista de catequese 14 (1991), n. 55, p.24-27.
CNBB. Dimensão bíblico-catequética, com adultos catequese adulta: texto-base por ocasião
da Segunda Semana Brasileira de Catequese. São Paulo, Paulus, 2001 (Estudos da
CNBB n. 80).
CONSELHO INTERNACIONAL PARA A CATEQUESE. A catequese de adultos
na comunidade cristã: algumas linhas e orientações , Revista de Catequese 14 (1991), n.
54, p. 27-39.
. Catequese para viver num mundo pluralista e secularizado , Revista de
Catequese 15 (1992), n. 59, p. 59-63.
FERRARO, B. Jesus, o formador de adultos Revista de Catequese 24 (2001), n. 96, p.
51-62.
GOLLARTE, P. Catequese com adultos: preocupação eclesial Revista de Catequese 24
(2001), n. 94, p. 51-56.
GRASSO, D. Evangelizzazione, Catechesi, Omilia , Gregorianum 42 (1961), p. 242-67.
GROOME, T. H. Christian religious education. San Francisco, Harper & Row, 1980.
HATER, R. J. The relationship between evangelization and catechesis. Washington,
USCC, 1981.
HEMEL, U. Probleme religionspädagogischer un katechetiscer Terminologie
internationalen Rahmen: Religionsunterricht, Katechese, Evangelisation ,
Religionsunterricht an höheren Schulen 27 (1984), p. 374-385.
. Zum Verhältnis von Katechese, Evangelisation und schulischem
Religionsunterricht , Theol.-prakt. Quartalschrift 134 (1986), n. 3, p. 237-43. HOFINGER,
J. Evangelization and catechesis. Nova York-Paramus, Paulist Press, 1976.
LIÉGÉ, A. La catéchèse qu est-ce à dire? , Catéchèse esprit et langage. Paris, Fayard-
Mame, 1968, p. 11-19.
. Le ministère de la Parole: du Kérygme à la catéchèse . In: L. Charlier et al.,
La parole de Dieu en Jésus Christ. 2a ed., Tournai, Casterman, 1964, p. 176-90.
MALDONADO, L. A homilia: pregação, liturgia, comunidade. São Paulo, Paulus, 1997.
MENDES DE OLIVEIRA, R. Catequese de adultos , Revista de Catequese 11 (1988), n. 43,
p. 5-16.
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316.
PESSINATTI, N L (org.). A escola do novo milênio. 3a ed. São Paulo, Salesiana,
WARREN, M. Catechesis as an enriching category for religious education
Religious Education 76 (1981), n. 1, p. 115-27.

102
Capítulo 4
A catequese: serviço da palavra,
anúncio de Cristo

A catequese é uma forma peculiar do ministério da palavra na


Igreja, é serviço da palavra. Frequentar a catequese era,
antigamente, audire verbum, ouvir a palavra.1 Depois que o
Concílio Vaticano II resgatou, em certo sentido, a palavra de
Deus do exílio forçado a que ficou relegada por tanto tempo
(cf. DV cap. 6), a catequese recuperou sua identidade mais
profunda, sua nova face, em relação às épocas passadas: passa-se
da doutrina à mensagem , do ensinamento ao anúncio , do
catecismo à catequese .

1. CATEQUESE E MINISTÉRIO DA PALAVRA: PROBLEMAS EM ABERTO

Existem modos diversos de conceber a palavra de Deus; por outro lado, há muitas
dificuldades para o anúncio eficaz da palavra no mundo de hoje. Não faltam, portanto,
pontos problemáticos relativos à teoria e à prática da catequese enquanto serviço da palavra.
Eis alguns dos mais significativos:

1.1 Catequese e palavra de Deus

Pela sua própria natureza, a catequese insere-se na problemática geral relativa ao


ministério da palavra, enquanto acontecimento e enquanto mediação histórica: o que é na
verdade a palavra de Deus? Onde se encontra? Em que condições pode-se fazê-la propagar-
se nos dias de hoje?
As dificuldades provêm, antes de tudo, de uma determinada concepção depositária
da revelação que a reduz a um conjunto bem definido de enunciados, ou de textos bíblicos,
ou a um corpo doutrinal articulado e completo. Nesta perspectiva, imagina-se que basta
transmitir materialmente algumas verdades, ou ler as Escrituras, ou ensinar determinada
doutrina, para que se realize automaticamente o evento da palavra de Deus.

1
Nos primeiros séculos, os candidatos ao batismo no catecumenato eram chamados de [ouvintes],
auditores , pelo fato de que escutam a Palavra : ver, por exemplo: Origene, Hom. in Lev. 6,2; Erma, Il Pastore,
Vis. III, 2,9 e 7.3; Trad. Apostolica de Ippolito, passim.
103
Mas tanto a reflexão teológica como a experiência nos dizem que não se pode reduzir a
mediação eclesial da palavra de Deus a um processo tão automático e quase mecânico.
Por outro lado, é sempre paradoxal que a palavra de Deus careça de mediações
humanas. A palavra de Deus é objeto de comunicação humana ou consiste antes num dom do
alto? Em que sentido e até que ponto a habilidade dos homens condiciona a manifestação da
palavra de Deus na vida dos homens?

1.2 Catequese antropológica situacional?

No cerne da catequese há a necessidade da integração entre fé e vida (CR n. 113-117),2


para superar a freq ente dissociação entre convicções religiosas e realidade da vida, com
seus problemas e situações. Muitas vezes a religiosidade encontra-se numa espécie de setor
marginal ou espaço fechado, separado da vida real, enquanto que a catequese responde a
perguntas que ninguém se faz ou a problemas que ninguém vive (CAL n. 131).
Procurou-se uma resposta para o problema na chamada catequese antropológica (que
também é chamada de indutiva , experiencial , situacional , centrada nos problemas
etc.)3 ou, de qualquer modo, na magnificação da dimensão antropológica. O anúncio cristão
se faz partindo-se das situações e dos problemas da vida, que se tornam o próprio conteúdo
da comunicação religiosa.4 Mas essa estratégia nem sempre logra êxito, seja porque se limita
a uma consideração puramente humana ou horizontalista dos problemas, seja porque não se
dá uma integração efetiva entre o tema antropológico e a mensagem cristã. Daí a
perplexidade que a catequese antropológica suscitou em toda parte, não apenas em virtude
de sua prática concreta, mas também de seu próprio conceito.5 Se é legítimo falar de
catequese antropológica, será necessário esclarecer-lhe o sentido e as condições de sua
aplicação, na fidelidade à comunicação da palavra de Deus.

2
Cf. DGC n. 153; CAL n. 25-26; Espanha CC n. 233; Itália RdC n. 52-55.
3
A denominação situacional é típica da América Latina, principalmente a partir da mudança pastoral da
Conferência de Medellín (1968). A expressão centrada nos problemas , aplicada ao ensino da religião
( Problemorientierter Religionsunterricht ) era muito difundida na Alemanha, no clima da reforma do ensino da
década de 1970.
4
Cf. Medellín (Catequese) 6; Brasil CR n. 68-70; 7374; 93; 101; Itália RdC n. 96. W. Gruen,
Interação

104
1.3 Catequese inculturada

O Sínodo dos bispos de 1977 recolocou na ordem do dia o problema da inculturação da


fé cristã nas diversas situações geográficas e históricas e, portanto, a exigência de que a
catequese se encarne verdadeiramente nas diversas culturas. Se a palavra de Deus se encarna
na história dos homens, é preciso que fique claro em que sentido e em que condições a
palavra revelada se relaciona com as diferentes culturas. Assim, a catequese, enquanto
ministério da palavra, se vê na contingência de ter de aprofundar sua natureza, pois se espera
que seja complementar à fidelidade à tradição e à exigência da inculturação.

1.4 O imperativo da verdade na catequese

A fidelidade da catequese ao seu conteúdo e à sua missão, enquanto serviço da palavra


de Deus, muitas vezes apresenta aspectos problemáticos:

Por fidelidade à verdade revelada, a catequese deve ser completa, ortodoxa,


sistemática, preocupada em transmitir com fidelidade e autenticidade a mensagem
da fé.6 Essa exigência, porém, parece entrar em conflito com outras, não menos
importantes, de ordem pedagógica e pastoral, principalmente no que se refere à idade e
à condição das pessoas.7
Atualmente entende a catequese como um caminho de fé sempre aberto, longe de
uma visão triunfalista com a pretensão de ter respostas prontas e quase pré-fabricadas
para todos os problemas religiosos e humanos. Mas cabe a pergunta: uma catequese fiel
à palavra de Deus deveria transmitir apenas certezas, ou poderia se tornar também
busca e caminho em direção à verdade? Há lugar para a dúvida e para a incerteza? A
palavra de Deus seria compatível com as indecisões e perplexidades do ser humano?

105
Hoje se defende a passagem de uma catequese de assimilação a uma catequese da
criatividade8 que, além da missão de transmitir os documentos da fé , 9 tenha também a
da produção da linguagem da fé .10 Naturalmente, surge a questão: é possível falar de
criatividade na transmissão da palavra de Deus? Não há o risco de reduzir a palavra de
Deus aos frutos da invenção humana?

1.5 Catequese experiencial

Atualmente fala muito de catequese da experiência ou experiencial, de catequese


como aprofundamento e leitura da experiência, como comunicação de experiências de fé etc.
Onde a princípio dominava o ensino doutrinal, hoje privilegia a experiência vivida, as
atitudes diante da vida, em um contexto que sempre parece exaltar o clima emocional e a
fuga para o vago e o irracional. Daí o problema: que relação existe entre experiência e
comunicação da palavra de Deus? É possível uma catequese da experiência que permaneça fiel
à mensagem de Deus em Cristo? A missão da catequese é anunciar o Evangelho ou
aprofundar a experiência?11

Temos aqui uma série de problemas que exigem um aprofundamento da natureza da


catequese enquanto serviço eclesial da palavra de Deus. Essa reflexão permitirá determinar o
conteúdo autêntico e as regras para seu correto funcionamento. Ficará evidente também a
estreita relação que existe entre teologia da revelação e concepção da catequese: a cada visão
teológica sobre a revelação corresponde um modo particular de entender a catequese e de
responder aos problemas por nós destacados.

A. F. Merlos, A caminho de uma catequese criativa Revista de Catequese 21 (1998), n. 84, p. 5-14. Houve um
tempo em que o trabalho catequético podia realizar-se com uma pedagogia de assimilação,

Cf. Mensagem do Sínodo de 1977,9; França (Texte de référence) 2.1.2.


Cf. R. Marlé, Une nouvelle étape de la catéchèse française , Études, outubro de 1980, p. 397.
11
Cf. J. Gevaert, Annunciare Gesù Cristo o parlare dell´uomo? I problemi della catechesi antropologica , in: A.
Amato (ed.), Annuncio cristiano e cultura contemporanea. Roma, LAS, 1978, p. 71-89.

106
2. A palavra de Deus revelada em Jesus Cristo no coração da catequese

Houve uma grande mudança na visão teológica da revelação e da palavra de Deus na


consciência eclesial. Em síntese, pode-se dizer que, superada uma consciência
predominantemente intelectual da revelação (nos moldes da transmissão magisterial de verdade)
hoje se propõe uma visão mais existencial e pessoal, mais cristológica e aberta à história. A
Constituição Dei Verbum do Vaticano II continua sendo um documento significativo e
importante dessa visão renovada, especialmente no n. 2, que constitui uma boa síntese do
conceito de revelação e de suas dimensões mais importantes:12
Praza a Deus, na sua bondade e sapiência, revelar a si mesmo e manifestar o mistério de sua
vontade, mediante o qual os homens, por intermédio de Cristo, Verbo feito carne no Espírito
Santo ascenderam ao Pai e tornaram-se partícipes da natureza divina.

Aqui temos a descrição da origem, do objeto e da finalidade da revelação. Ressalta-se a


iniciativa gratuita de Deus, a natureza salvífica da revelação e o contexto trinitário no qual se
desenvolve e para o qual tende.

Na verdade, com esta revelação, Deus invisível, em seu grande amor, fala aos homens como a
amigos e entretém-se com eles para convidá-los e recebê-los em comunhão Consigo.

Aqui o conceito da simples comunicação verbal ou magisterial é claramente superado


para assumir a profundidade de um encontro pessoal, de uma aliança entre amigos, em vista de
um objetivo totalizante: a comunhão.

Essa economia da revelação se processa com eventos e palavras intimamente relacionadas, de


modo que as obras realizadas por Deus na história da salvação manifestam e reforçam a doutrina
e a realidade significante das palavras, e as palavras afirmam as obras e esclarecem o mistério
desse conteúdo.

Introduz-se, aqui, a dimensão histórica da revelação divina, em seu misterioso


entrelaçamento de fatos e palavras, intimamente ligados entre si.

12
Uma concepção semelhante, apoiada na doutrina de DV, está presente também em: DGC n. 36-41; CAL n. 6-
16; França (Texte de référence), Espanha CC n. 106-139, Brasil CR n. 33-75; México GP n. 56.
107
A profunda verdade, pois, seja de Deus, seja da salvação dos homens, por meio desta
revelação resplende para nós em Cristo, o qual é ao mesmo tempo o mediador e a plenitude de
toda a revelação.

Esta última afirmação consagra o lugar absolutamente central que ocupa o Cristo na
economia da revelação divina, enquanto palavra suprema e definitiva, vértice da
manifestação de Deus e de seu projeto para os homens.

Esta breve síntese conciliar faz emergir a densidade e riqueza do mistério da palavra de Deus
na história humana. Longe de esgotar-se numa simples transmissão de verdade, ainda que
muito importante, a palavra de Deus apresenta-se antes como intervenção divina, potente e
misericordiosa, na qual Deus comunica a si mesmo e seu projeto de comunhão e de salvação
em favor de toda a humanidade. Deste projeto, que tem em seu centro a figura de Cristo, a
catequese eclesial continua a ser anúncio e mediação, neste tempo da Igreja. Portanto,
lembrar algumas dimensões fundamentais do mistério da palavra de Deus permite aprofundar
a natureza e o alcance da ação catequética.13

2.1 Jesus Cristo, palavra encarnada de Deus, centro e vértice da revelação (dimensão
cristocêntrica e pessoal da palavra de Deus)

A catequese, anúncio de Cristo e oferta de comunhão pessoal


No plano global da comunicação de Deus, Cristo representa não uma palavra, mas a
Palavra por excelência de Deus, o vértice da revelação, a suprema manifestação de Deus ao
homem e a suprema revelação do homem ao homem (GS n. 22), o mediador e a plenitude
de toda a revelação (DV n. 2). Cristo é, de fato, o logos, a palavra do Pai (Jo 1,1), a
sapiência de Deus (1Cor 1,24), a imagem do Deus invisível (Cl 1,15), esplendor da glória e
efígie de sua substância (Hb 1,3). Nele, suprema revelação de Deus ao homem, se concentra e
se realiza o projeto de salvação para toda a humanidade.

2.1.1 Jesus Cristo, palavra suprema e significativa

O testemunho bíblico, por meio dos títulos messiânicos (Messias-Cristo, Filho de


Deus, Senhor, Salvador etc.) e outras denominações que procuram evidenciar o alcance
existencial para nós (como: caminho, verdade e vida, luz, água, bom pastor, sabedoria de
Deus etc.), reafirma de mil modos a certeza de que, em Jesus de Nazaré, aconteceu algo de
decisivo para a humanidade, de que nele o ser humano encontra a chave para a interpretação
da vida e a garantia da realização de um projeto renovado de humanidade.

13
Em nossa exposição não está presente a dimensão eclesial e comunitária da revelação, que será objeto do
capítulo 6.

108
Jesus Cristo representa, portanto, para todo aquele que aceita na fé o seu testemunho, o
sim definitivo de Deus às expectativas do ser humano, a confirmação histórica da realização
daqueles valores essenciais (o Reino de Deus), com os quais sonha, em seu íntimo, e pelos
quais aspira. A condição humana de Jesus, e especialmente sua morte-ressurreição, selam
definitivamente a profunda busca de sentido com a qual o ser humano analisa a vida e a
história. Nele, finalmente, se esclarece o sentido do trabalho e do sofrimento, do amor e da
esperança, da vida e da morte, da história e do futuro. Em Jesus Cristo Deus diz ao ser
humano, de forma inteligível e crível, como se vive e por que se vive, qual é o objetivo da
história, para cuja realização os povos se dirigem.
Em Jesus Cristo, palavra de Deus feita condição humana, chega também ao seu
momento culminante um aspecto fundamental da economia da revelação: a dimensão
personalista. Nele a palavra de Deus se faz pessoa viva, na condição humana e histórica que
permite o encontro e a comunhão. O encontro com Jesus Cristo se torna, portanto, o sacramento
por excelência do encontro do ser humano com Deus,14 ao mesmo tempo em que manifesta a
intenção personalista de toda a revelação. Se Deus fala e continua a falar na história, não o
faz principalmente para informar ou para transmitir a verdade, mas antes de tudo para
comunicar a si mesmo, convidar a um diálogo, a um encontro, a uma doação de si que obriga à
doação de si, da parte de Deus e da parte dos seres humanos.

2.1.2 O anúncio de Cristo na catequese

A dimensão cristocêntrica e personalista da revelação deve necessariamente assinalar e


distinguir toda forma de serviço eclesial da palavra de Deus, e portanto, também da
catequese. Eis alguns aspectos especialmente significativos:

14
Pense-se, por exemplo, na obra de E.Schilleebeeckx, Cristo• sacramento do encontro com Deus: estudo teológico
sobre a salvação mediante os sacramentos. Petrópolis, Vozes, 1962.

109
A catequese é comunicação pessoal e iniciação a um encontro pessoal. Dado que a
palavra de Deus, antes de mais nada, é Alguém, a catequese, serviço da palavra, deve
levar principalmente ao encontro com Cristo, antes de transmitir um sistema de verdade
ou um conjunto de acontecimentos:

No próprio centro da catequese encontramos essencialmente uma pessoa: a de Jesus Cristo de


Nazaré [...]. Nesse sentido, o escopo definitivo da catequese é colocar alguém não apenas em
contato, mas também em comunhão, em intimidade com Jesus Cristo (CT n. 5).

Elegendo Cristo como centro vivo, a catequese não pretende propor simplesmente um núcleo
essencial de verdade em que se deve crer; pretende sobretudo fazer aceitar e acolher sua pessoa
viva, na plenitude de sua humanidade e divindade, como Salvador e Chefe da Igreja e de toda a
criação (RdC n. 58).

A dimensão personalista da catequese constitui não apenas um traço essencial, mas


também um aspecto libertador. Ela permite haurir diretamente o espírito e o clima dominante
em todo encontro catequético, ao mesmo tempo em que convida a superar todas as
preocupações unilaterais de completude doutrinal (a necessidade de desenvolver um
programa preestabelecido) e toda a rigidez terminológica (a necessidade de manter imutáveis
determinadas fórmulas catequéticas). A fidelidade a uma pessoa viva é algo infinitamente
mais essencial, mais dinâmico e livre que a fidelidade a um esquema doutrinal.15
A dimensão personalista deve permear os conteúdos da comunicação catequética, expressos em
termos relacionais, como relações entre pessoas, não como coisas ou fatos impessoais.
Pense-se, nessa perspectiva, na apresentação de realidades como a graça, o pecado, a lei
moral, os sacramentos, a escatologia etc.
A catequese é acima de tudo anúncio de Cristo. Jesus Cristo, na plenitude de sua pessoa
e de seu mistério, é o centro indiscutível da comunicação catequética e ponto de
referência de todo o seu conteúdo. É o clássico imperativo do cristocentrismo,
afirmado no curso do movimento catequético16 e reafirmado com absoluta unanimidade
também na consciência eclesial contemporânea:

1
Cf. C. Géffré, La révélation comme histoire: enjeux théologiques pour la catéchèse , Catéchèse (1985), n.
100-101, p. 63-65.
16
Vale lembrar, especialmente, a obra de J. A. Jungmann, Christus als Mittelpunkt religiöser Erziehung,
Friburgo i. B., Herder, 1939), que foi considerada uma espécie de manifesto do cristocentrismo catequético e teve
grande repercussão na renovação da catequese europeia. Este importante texto foi modernamente publicado em
italiano: Cristo como punto centrale dell´educazione religiosa (1938) , Itinerarium Messina 2 (1994), n. 3, p. 167-
205, com uma introdução de Giuseppe Rutta. Cf. também J. Colomb, Al servizio della fede, vol. I. Leumann (Turim),
Elledici, 1969, p. 55-56.

110
O fato de Jesus Cristo ser a plenitude da Revelação é o fundamento do cristocentrismo
da catequese: o mistério de Cristo, na mensagem revelada, não é um elemento a mais, em meio
a outros, mas o centro a partir do qual todos os outros elementos se distribuem
hierarquicamente e se iluminam.17
Os documentos eclesiais ressaltam também que o cristocentrismo na catequese tem
pelo menos um duplo sentido: objetivo, na medida em que Cristo constitui o centro essencial do
anúncio catequético (CT n. 5), e subjetivo, porque Ele é o verdadeiro sujeito agente da
catequese:

Mas o cristocentrismo, na catequese, significa também que, por seu intermédio, não se quer que
cada um transmita a própria doutrina ou a de um outro mestre, mas o ensinamento de Jesus
Cristo, a verdade que ele comunica ou, mais exatamente, a verdade que ele é. É preciso dizer,
portanto, que, na catequese, é Cristo, Verbo Encarnado e Filho de Deus, que está sendo
ensinado, e tudo o mais se reporta a Ele; e que só Cristo ensina, enquanto que todos os outros o
fazem na medida em que se tornam seus porta-vozes, consentindo em que o Cristo fale por sua
boca (CT n. 6; cf. DGC n. 98).

O cristocentrismo da catequese é evangélico e trinitário. Esses dois aspectos são


ressaltados de forma oportuna no DGC. Em primeiro lugar, o caráter central dos
Evangelhos, os quais, dotados de uma estrutura catequética , estão no centro da
mensagem da catequese (DGC n. 98). Em seguida, a abertura do anúncio de Cristo
para a confissão trinitária, uma vez que Cristo remete constantemente ao Pai, de quem
se sabe Filho Único, e ao Espírito Santo, de quem se sabe Ungido (DGC n. 99).
O cristocentrismo da catequese não deve ser entendido num sentido exclusivista, nem
enquanto conteúdo, nem enquanto método. O anúncio de Cristo não é o único conteúdo
da catequese, nem se deve entender o seu primado como itinerário obrigatório no
desenvolvimento concreto de toda catequese. Nem sempre é possível chegar ao anúncio
explícito de Cristo, em razão de circunstâncias particulares dos ambientes ou dos
destinatários.

17
DGC n. 41. Cristocentrismo significa não só que Cristo deve aparecer na catequese como a chave, o centro e o
fim do homem, bem como de toda a humanidade GS n. 10), mas que a adesão à sua pessoa e à sua missão, e não
só a um núcleo de verdades, é a referência central de toda a catequese (cf. EN n. 22). O cristocentrismo também
exige que, na apresentação de temas ou na vivência de experiências particulares, a catequese evidencie sua relação
com o centro de tudo, Cri o CR n. 95-97. Cf. também Mensagem do Sínodo de 1977, n. 7; França (Texte de
référence), 2.2.1.; Puebla, n. 994; Espanha CC n. 123; CAL n. 13.
111
Mas assim como há uma evangelização verdadeira, ainda que incompleta, em todo
testemunho autêntico dos valores evangélicos,18 mesmo que não se fale em Cristo,
também é catequese verdadeira ainda que parcial todo e qualquer passo adiante
num itinerário de fé que, embora não nomeando a Cristo, procura aprofundar
experiências e situações que preparam o seu anúncio. Ela certamente será uma
catequese incompleta,19 da mesma forma que permanece incompleta toda obra de
evangelização que não chega à proclamação explícita da vida e do mistério de Cristo.20

2.2 A palavra de Deus, mensagem de salvação para o ser humano (caráter significativo e
libertador da palavra de Deus

A catequese, iluminação e interpretação da vida


Um outro aspecto fundamental da palavra de Deus, em sua manifestação histórica, é o
seu significado salvífico e antropológico, enquanto palavra dirigida ao ser humano,
mensagem de salvação, de libertação. Explicitemos alguns de seus aspectos característicos.

1
Cf. EN n. 21. O Concílio ensina que já no testemunho da caridade começa a resplandecer o mistério de Cristo, no
qual aparece o homem novo (AG n. 12).
Mas parece pouco chamá-la apenas de pré-catequese, uma vez que já é, de certo modo, parte integrante do
anúncio de Cristo. Cf. J. Le Du, Catéchèse e précatéchèse , Catéchèse 4 (1964), p. 395-414; A. M. Nebreda,
Catequesis fundamental: precatequesis , in: Semana Internacional de Catequesis, Catequesis y promoción humana.
Medellín, 11-18 de agosto de 1968. Salamanca, Sígueme, 1969, p. 43-70; E. Alberich, Precatechesi , Diz.Cat., p.
506-07; J. Gevaert, Prima evangelizzazione: aspetti catechetici. Leumann (Turim), Elledici, 1990, p. 56-62.
•• A evangelização não é verdadeira se o nome, o ensinamento, a vida, as promessas, o Reino, o mistério de
Jesus de Nazaré, Filho de Deus, não são proclamado (EN n. 22).

112
2.2.1 Propter nos homines

A palavra de Deus é mensagem de salvação para o ser humano. Na sua intenção

A palavra de Deus é interpretação e iluminação da existência. Segundo uma lei constante


da economia da revelação, há um entrelaçamento profundo entre palavras e fatos, entre
mensagem e acontecimento: As palavras declaram as obras e esclarecem o mistério desse
conte do (DV n. 2). Podemos falar de revelação-acontecimento e de revelação-palavra,23
para ressaltar a função iluminadora da palavra revelada que interpreta os
acontecimentos, tira-lhes a opacidade e ambiguidade, faz deles uma leitura religiosa, à luz do
projeto salvador de Deus. É sob essa luz que ganha atualidade o papel do profeta, do sábio,
do salmista, na medida em que a palavra de Deus se apresenta sempre como profecia,
sabedoria, leitura religiosa da vida, interpretação da história, promessa de futuro:
O profeta é aquele que sob o emaranhado dos acontecimentos humanos, muitas vezes
escandalosos e sangrentos, procura o fio vermelho da ação secreta divina .24
Esse papel iluminador da palavra tem o seu vértice em Jesus de Nazaré, profeta por
excelência e sapiência encarnada, chave definitiva da interpretação da vida e da história.
Ouvindo fielmente esta palavra iluminadora, a comunidade cristã encontra o significado
profundo da vida, e nela colhe o mistério da salvação e espera da promessa divina o
desenlace positivo dos acontecimentos humanos: O cristão é o adversário do absurdo, o
profeta do significado .25

2
O Deus da Revelação é o Deus de graça, um Deus para os homens, criador de um homem à sua imagem.
Hoje se reconhece que a Revelação é funcional, isto é, que Deus se revela a nós, não em seu em-si, mas naquilo que
ele faz e quer ser para nós : Y. Congar, I compiti della teologia dopo il Vaticano II , in: R. Aubert et al., Teologia
del rinnovamento. Assis, Cittadella, 1969, p. 88.
2
Cf. E. Schillebeeckx, Revelação acontecimento e revelação-palavra , Revelação e teologia. São Paulo, Paulinas,
1968.
2
G. Ravasi, Il racconto del cielo. Milão, Mondadori, 1995, p. 8.
P.Ricoeur, I compiti della comunità ecclesiale nel mondo moderno , in: R. Aubert et al., Teologia del
rinnovamento. Assis, Citadella, 1969, p. 166.

113
A palavra de Deus é também força transformadora e libertadora que convida a um
trabalho de promoção dos valores do Reino, na medida em que este tem um caráter de
eficácia e opera aquilo anuncia: salvação, libertação, comunhão, paz.26 Quem entra
em contato com a palavra de Deus e a recebe na fé não pode permanecer passivo, mas
sente-se responsavelmente envolvido num projeto histórico, em uma missão de realização
existencial e social:

Aquele que assume este ministério da Palavra deve-se imbuir do Reino de Deus. Os riscos de
desvio não são uma desculpa para deixar de lado esta dimensão libertadora da Revelação (CAL
n. 16).

2.2.2 Catequese significativa

Enquanto serviço eclesial da palavra de Deus, a catequese reflete os traços


característicos do dinamismo da palavra revelada. A reflexão catequética incorporou em
larga medida esse imperativo, dando um caráter novo, e de grande alcance, à concepção da
catequese.
A catequese está a serviço do êxito total do homem, e tem uma dimensão
educacional, promocional, humanizadora. Enquanto comunicação da palavra de Deus,
não se deve restringir a um setor religioso da existência, mas impregna a totalidade do
projeto humano de vida, assume um caráter global da boa nova e se configura, portanto,
como uma ajuda para a vida :27
O objetivo mais importante da atividade catequética consiste em ajudar o ser humano a realizar-
se na própria vida, atendendo ao chamado e aos pedidos de Deus. [...] A catequese deve tornar
claro que a fé em Deus e na salvação através de Jesus Cristo oferece a possibilidade de uma vida
plena de sentido. Numa época em que a humanidade do homem encontra-se, em muitos lugares,
ameaçada, o significado existencial das afirmações centrais do Evangelho revela-se-nos cada
28
vez mais importante.

É importante ressaltar essa dimensão existencial e vital da catequese, que muitas vezes
se apresenta desencarnada, segregada, quase deixando de lado os problemas fundamentais do
ser humano e de sua realização individual e social.

2
Cf. EN n. 31; Brasil CR n. 73-74 (citando Medellín), p. 281-287 e toda a IV parte. Dessa dimensão de deduz uma
lei catequética importante: não é possível um anúncio de salvação sem uma experiência de salvação. diante
falaremos mais claramente do papel insubstituível da experiência no processo catequético (cf. item 4 deste capítulo).
2
Glaubenshilfe als Lebenshilfe : D. Emeis - K. H. Schmitt, Handbuch der Gemeindekatechese. Friburgo/ Basileia/
Viena, Herder, 1986, p. 70. Cf. também E. Feifel, Leben lernen - Glauben lernen , Lebendige Katechese 10 (1988),
n. 2, p. 85-89.
••

114
A catequese é profecia que ilumina e interpreta a vida. A dimensão antropológica da
catequese, a sua tarefa profética de leitura em profundidade e interpretação religiosa da
existência fazem parte, há muito tempo, da consciência comum da reflexão
catequética. Prova disso são diversas descrições ou definições da catequese:

Por catequese entendemos o processo de iluminação da existência humana como intervenção


salvífica de Deus, na qual o mistério de Cristo é testemunhado na forma de anúncio da palavra, a
fim de despertar e alimentar a fé e fazer que ela seja uma presença atuante na vida.29

Poder-se-ia dizer que a catequese, deste ponto de vista, pode ser assim definida: a ação pela qual
um grupo humano interpreta sua situação, vive-a e interpreta-a à luz do Evangelho.30

O papel de iluminação da Palavra de Deus em nossa vida é o próprio cerne da catequese.31

Há algo que se destaca, com absoluta clareza: o imperativo de que a catequese fale da
vida e expresse seus anseios, a necessidade de que a palavra de Deus se afigure a cada um

como uma abertura aos seus próprios problemas, uma resposta a suas próprias perguntas,
uma ampliação dos próprios valores e ao mesmo tempo a satisfação das mais profundas
aspirações: em uma palavra, como o sentido da própria existência e o significado da própria
32
vida.

29
Hoger Katechetisch Institut, Linee fondamentali per una nuova catechesi. Leumann (Turim), Elledici, 1969,
p. 40.
30
J. Audinet, La renovación de la catequesis en la situación contemporánea , in: Semana Internacional de
Catequesis, Catequesis y promoción humana. Medellín 11-18 de agosto de 1968. Salamanca, Sígueme, 1969, p.
35.
31
CAL n. 93. Mas podem-se multiplicar as citações: DGC n. 152-153; Brasil CR n. 113; Puebla n. 997; RdC n. 52;
Alemanha KWK A3; Espanha CC n. 113.
32
Card. A. Cicognani, Carta, em nome do Papa, de 23.3.1964, por ocasião do IV Congresso Nacional francês de
ensino religioso . La Documentation catholique 46 (1964), n. 1422, col. 503. Cf. RdC n. 52; A. Fossion, La
catéchèse dans le champ de la communication: ses enjeux pour l´inculturation de la foi. Paris, Cerf, 1990, p.
492.
115
É todo um programa para a catequese, que muitas vezes se fecha em uma linguagem
que não comunica e que não é significativa. No âmago de tudo palpita a convicção de que é
na própria vida que se deve situar a escuta da palavra de Deus, a convicção de que, onde quer
que se fale de fé, o discurso refere-se ao homem e ao seu mundo, não como algo acessório,
mas de forma absolutamente central .33
A catequese é obra de conscientização e de libertação, em vista do empenho por um
mundo mais conforme ao plano de Deus. É o caráter de compromisso e de promoção
da catequese, anúncio de um projeto de libertação total do homem e convite a um
envolvimento responsável no mesmo.34

Esses traços característicos da nova face da catequese são plenos de consequências


operativas. Não são poucos, porém, os problemas que suscitam e que exigem um
discernimento seguro, porque a dimensão antropológica e libertadora da catequese se presta a
interpretações redutoras ou temporalistas que a práxis concreta nem sempre consegue evitar.
Mas nem por isso se deve esquecer ou subestimar tal dimensão, solidamente fundada na
própria natureza da palavra de Deus.

2.3 A palavra de Deus, encarnada na história (dimensão narrativa e dialogal da palavra


de Deus)

A catequese, ritualização e narrativa de uma história significativa


Deste importante aspecto da palavra de Deus ressaltamos dois elementos ricos de
implicações para a compreensão da catequese.

2.3.1 Palavra como história

Deus se revela e fala aos homens na história, em uma história concreta de


acontecimentos e de testemunhos, culminando no acontecimento humano de Jesus de
Nazaré. É o caráter histórico do mistério da salvação, através do qual, na sua função
profética, a Igreja preserva a memória dos acontecimentos salvíficos do passado, narrando-
os (DGC n. 107).

33
Cf. França (Texte de référence) 2.1.1.1.3.
34
Falaremos especificamente desta dimensão catequética no capítulo 7.
116
Em sua historicidade, a palavra de Deus se encarna somente na resposta de adesão por
parte da pessoa crente. A revelação de Deus na história já não se encontra em estado puro,
independentemente dos seres humanos interlocutores da mensagem revelada. A palavra de
Deus chega até nós mediada pela consciência de pessoas e de grupos testemunhas que
revelam a mensagem divina ao mesmo tempo em que a aceitam, dando-lhe uma resposta de fé.
Assim, a palavra de Deus se mescla, indissoluvelmente, com a palavra dos homens.35

2.3.2 Catequese narrativa

Esses aspectos que caracterizam a palavra de Deus se refletem também na concepção


da catequese e nas condições de seu exercício concreto:
A catequese é proclamação de uma palavra encarnada em narrativas históricas e por
isso compreende essencialmente a narração de fatos significativos para a pessoa
humana. É o aspecto de memória , essencial para a catequese. Pelo caráter histórico
da palavra revelada, a catequese deve incluir em sua mensagem a história salvífica do
Antigo Testamento, a vida de Cristo e seu mistério pascal, e a história da Igreja, que
também faz parte do conteúdo da catequese (DGC n. 108). Nesse sentido, o relato
ou melhor, o relato significativo é parte integrante da comunicação catequética:
Toda catequese constitui uma retomada do relato dos acontecimentos através dos quais
Deus se revelou aos homens.36

Todavia, o relato só é porta-voz da Salvação se permitimos que esta se torne a nossa


história.37

A catequese se insere no diálogo revelador e crente entre Deus e o ser humano. Na


longa história do entrelaçamento entre a manifestação da palavra de Deus e a resposta
crente do ser humano insere-se também a catequese da comunidade cristã,
momento de manifestação da mensagem divina e de aceitação da fé pela comunidade.
Assim, a catequese se torna um lugar privilegiado em que a palavra de Deus continua a
ressoar na história, nas diversas formas do ensino, da exortação, da oração, do
testemunho etc.38

35
Cf. C. Géffré, La révélation comme histoire, p. 59-76.
36
França (Texte de référence) 2.2.2.3.
37
Ibid., 2.2.2.1.
38
Infelizmente, é preciso reconhecer que, à luz da história, a dimensão histórica do anúncio cristão quase sempre foi
subestimada frente ao tradicional domínio da estrutura doutrinal e sistemática da comunicação catequética.
117
2.4 A palavra de Deus, dom do Espírito de Cristo
(dimensão carismática e profética da palavra de Deus)

A catequese, ação do Espírito e no Espírito


Em toda a economia da palavra de Deus, o Espírito desempenha um papel de
primeiríssimo plano, sendo por isso indissoluvelmente ligado ao destino da palavra e de sua
transmissão. A encarnação da palavra na história é obra do Espírito: é Ele quem inspira as
Escrituras, é Ele quem fala através dos profetas, é Ele quem realiza a encarnação do Verbo e
que, dado em sua plenitude pelo Cristo ressuscitado, cumula dos dons proféticos a Igreja e os
corações dos fiéis, para neles fazer habitar e crescer a palavra da salvação. É uma presença
misteriosa e poderosa que preside à busca da palavra de Deus.39

2.4.1 O Espírito e a Palavra

No AT o Espírito se apresenta como a força vivificante e transformadora de Deus que


soergue a inércia da carne, transforma a natureza e anima principalmente o espírito do ser
humano, a partir de seu interior, dando-lhe consciência e capacidade novas. As suas
manifestações seguem um processo de progressiva interioridade e perfeição. O Espírito está na
origem das manifestações entusiásticas dos nabis , dos feitos dos juízes, das obras dos reis.
Com o aparecimento do profetismo, o Espírito é fonte interior de renovação moral e de
palavra interpretativa. Nos profetas, o Espírito se faz luz. Os profetas são por excelência
homens e mulheres do Espírito, na medida em que, plenos do Espírito de Deus, estão em
condições de anunciar a palavra (Os 9,7; Mq 2,11; Is 30, 1s; 48,16; Ez 2,2; 3,24; 11,5...), de
comunicar uma mensagem muito maior que eles próprios, fortalecidos pela coragem e pela
certeza do Espírito. A palavra de Deus desce sobre os homens trazida nas asas do Espírito,
que desse modo lhe assegura a eficácia, como a chuva fecundante trazida pelo vento (Is
55,10-11).40 Um tema bíblico sempre recorrente liga intimamente a palavra e o Espírito:
quando o Espírito vem, derrama-se sobre uma pessoa ou nela penetra, esta fala em nome
de Deus (cf. Lc 1,41-42; 1,67; 2,25-32 etc.).

39
A. Rodríguez Magro, Espírito Santo , Nuovo Dic. Cat., p. 802-820. Cf. sobre este tema: J. Guillet Lo Spirito
di Dio , in: Grandi temi biblici. Alba, Paoline, 1960, p. 211-222; P. van Imschoot, Théologie de l´Ancien
Testament, I. Tournai, Desclée, 1954, p. 183-199; Y. Congar, La parola e il soffio. Roma, Borla, 1985.
40
J. Guillet ressaltou que palavra e Espírito representam, na economia da revelação, dois aspectos indissolúveis,
complementares: A palavra se impõe como se do exterior. Ela é sem dúvida penetrante e penetra até a divisão da
alma e do corpo, e das juntas e ligamentos (Hb 4,12), mas seu fio é o do aço, põe tudo a nu. O Espírito, de sua
parte, é fluido, se insinua sem ser visto. A palavra se faz ouvir e conhecer [...], ninguém sabe da vida do Espírito. A
palavra é revelação; o Espírito, transformação interior ( Lo Spirito di Dio , p. 215).
118
O Messias anunciado pelos profetas será o profeta por excelência, pois nele residirá,
em toda a sua plenitude, o Espírito do Senhor. Jesus de Nazaré afirma estar investido do
Espírito para a missão profética (Lc 4, 18-19) e demonstra que, Nele, a presença do Espírito
chega a seu vértice, e Ele próprio é a fonte da qual jorra o Espírito de verdade e de vida sobre
toda a humanidade (Jo 7,39). Tornado Espírito vivificante pela ressurreição dos mortos
(1Cor 15,45), o Senhor glorificado difunde abundantemente o Espírito pentecostal e inspira o
novo povo sacerdotal e profético, que com a unção do Espírito vive também a plenitude da
palavra de Deus. Na Igreja, o Espírito distribui os seus dons, inspira apóstolos e profetas,
orienta os corações para a luz da fé, pela força da palavra. Todas as manifestações da palavra
de Deus se ligam ao movimento do Espírito.
Nessa perspectiva, a palavra de Deus na Igreja assume as feições do Espírito de Deus,
que é sua origem e sua força animadora. Nesse sentido, a palavra se torna dom e graça ,
trazida pelo dom , que é por excelência o Espírito. A palavra se manifesta com a força e a
certeza do Espírito, com a liberdade e franqueza ( parrésia ), acompanhada de sinais e dita
com autoridade. Trazida pelo Espírito, a palavra de Deus imprime na Igreja a marca do
Cristo e é fonte de unidade e de comunhão, de edificação e de paz (EN n. 75).
Suscitada pelo Espírito, a palavra de Deus na Igreja participa apenas da dialética carne-
espírito, própria da vida cristã, e é chamada a seguir a lógica do espírito, não da carne (no
sentido bíblico de lógica mundana , que se opõe à lei de Deus). Nesse contexto, em que
espiritual não se opõe a material mas a carnal ou mundano , a palavra de Deus
encontra uma lei própria, intrínseca, de autenticidade e de eficácia: evitar os riscos da
carnalidade e mundanalidade , de que são expressão a ambição, o egoísmo, a ânsia de
poder etc. No Espírito, a palavra de Deus resplende como boa nova para os pobres, portadora
de paz e de alegria, palavra de reconciliação e de perdão que haure a sua força apenas na
força do Cristo morto e ressuscitado.

119
2.4.2 Catequese no Espírito

Tudo is o permite entrever os muitos aspectos da dimensão espiritual da catequese que,


enquanto ação eclesial pelo crescimento da fé, é, conseq entemente, obra do Espírito Santo,
obra que somente ele pode suscitar e alimentar na Igreja (CT n. 72). Alguns desses aspectos
foram ressaltados no movimento e no magistério catequético.41 Outros ainda esperam ser
valorizados na consciência eclesial, à medida que aumenta o aprofundamento teológico do
papel e da pessoa do Espírito Santo.
A catequese requer um clima de acolhimento e docilidade para o dom do Espírito. O
dinamismo da catequese não pode contar apenas com as leis humanas da
comunicação ou com a eficácia de uma ação educacional bem organizada, nem pode
realizar-se sem o clima espiritual do acolhimento de um dom, diante do qual impõe-se
uma atitude de humildade e docilidade:

Na práxis catequética, nem as técnicas pedagógicas mais avançadas, nem o catequista dotado da
personalidade humana mais cativante, podem substituir a ação silenciosa e discreta do Espírito
Santo. É Ele, na verdade, o protagonista de toda a missão eclesial ; Ele é o principal
catequista; é Ele o mestre interior .42

No exercício de seu ministério, muitas vezes o catequista deverá refugiar-se no


silêncio, na discrição, e sobretudo na oração:

Se aquele que escuta é surdo e indiferente [...] será necessário falar muito a Deus, por ele, mais
que a ele, de Deus.43

Dar lugar a Deus, a Cristo, à Igreja, significa também saber retirar-se no momento oportuno,
saber esperar, respeitar a ação do Espírito Santo. Em muitas ocasiões, o catequista deve ser mais
hábil no calar do que no falar (RdC n. 167).

41
Colomb registrou, de forma sistemática, as consequências práticas de uma catequese fiel ao Espírito: cf. J.
Colomb, Al servizio della fede, vol. I. Leumann (Turim), Elledici, 1969, p. 138-76.
42
DGC n. 288. Brasil CR n. 197-202; 247; 305; 319; Espanha CC n. 110-11; Itália RdC n. 37-40 Cf. também CT
n. 72; EN n. 75; RdC n. 37,40.
43
S. Agostinho, De catechizandis rudibus, 13,18. PL 40, 325. Traduzido em português com o título: Instrução dos
a
catecúmenos: teoria e prática da catequese , in: Fontes da catequese 7. 3 ed. Petrópolis, Vozes, 1984.
120
A catequese exige um ambiente espiritual de oração e de recolhimento. Para superar o
peso carnal da palavra humana não lastreada no Espírito, a catequese deve ser
palavra dita no Espírito, num clima de humildade e oração.44 É necessária, pois, uma
profunda espiritualidade no exercício da catequese, não num sentido descompromissado
ou como renúncia à racionalidade, mas como alegria interior de uma atividade
aberta à renovação no Espírito:

A espiritualidade não deve ser confundida com o refugiar-se no silêncio, com a recusa à
discussão pública ou à atuação pública. Ela deve, antes, fornecer um impulso vital a essas
atividades. A espiritualidade não arrefece, de modo algum, o espírito crítico. Lá onde ela é
alimentada pelo Evangelho e pela ação do Espírito, ela se revela um manancial inesgotável
de renovação na vida dos indivíduos, na Igreja e na sociedade. Ela torna capaz de crítica no
amor.45

A catequese no Espírito deve ser uma palavra dita com autoridade, livre, corajosa,
criativa. São as características do Espírito, que anima a Igreja e nela recria o exercício
da palavra:

O catequista fala com a autoridade do próprio Espírito de Deus. Por um lado, fala com
segurança, com veemência e finalmente com audácia, porque tem consciência de ser enviado por
Deus e sabe que a sua força reside em Deus. Por outro lado, sente para com os homens a própria
46
força do amor de Deus, porque a sua missão é participação neste amor.

Muitas consequências concretas podem derivar desta qualidade da palavra de Deus enquanto
palavra no Espírito de liberdade e de verdade, cuja força procede da força renovadora do
Espírito. A catequese deverá superar muitas formas de imobilismo, de fechamento dentro de
esquemas tradicionais , o medo da novidade e da franqueza.47

44
Cf. J. Colomb, loc. cit., p. 138-180.
45
Alemanha KWK, A 3.2.
46
J. Colomb, loc. cit., p. 142.
47
Outras consequências importantes da dimensão espiritual da catequese dizem respeito a seu horizonte eclesial,
onde uma bem concatenada eclesiologia de comunhão dominada pela presença do Espírito encontra aplicações
insuspeitadas. Mas disto falaremos no capítulo 6, que abordará a relação entre catequese e realidade eclesial.
121
2.5 A palavra de Deus, palavra dada e prometida
(a tensão escatológica da palavra de Deus)

A catequese, anúncio de certezas e caminho aberto para a verdade completa


Como todos os bens da salvação, a palavra de Deus participa da tensão escatológica
entre o já e o ainda não, entre a palavra dada e a palavra prometida, entre a alegria da posse e o
sofrimento da espera. São aspectos complementares que merecem atenção, com consequências
importantes para a compreensão da catequese.

2.5.1 A palavra de Deus encontra em Cristo seu cumprimento definitivo

Visto que é aliança nova e definitiva, a economia cristã não passará nunca, e não se deve esperar
nenhuma revelação pública antes da manifestação gloriosa de Nosso Senhor Jesus Cristo (DV n.
4).
Na revelação de Cristo, Palavra encarnada, revela-se finalmente o projeto ou mistério
de Deus, no sentido de que é revelação definitiva, segura, insuperável. Por isso, o cristão
sabe possuir não uma palavra de salvação, mas a palavra suprema, a chave definitiva de
interpretação da realidade e a certeza absoluta da realização das promessas. É a solidez de
uma mensagem que nunca será negada. Na vida histórica de Jesus de Nazaré aconteceu algo de
definitivo para o destino da humanidade: Deus se comprometeu definitivamente com o ser
humano, e nisto encontra fundamento a esperança do cristão.

2.5.2 A palavra de Deus espera a manifestação final da verdade

Mas o caráter definitivo da palavra de Deus não deve fazer esquecer a outra vertente da
tensão escatológica: o aspecto de verdade prometida e, portanto, ainda não possuída. Jesus
Cristo é, sim, aquele que veio na carne para revelar o plano de Deus, mas também é aquele
que vem e que deve vir. Ele é palavra definitiva e total, mas só na medida em que Deus é
princípio e fim da relação religiosa no plano da salvação,48 enquanto revelação não de um
elemento do plano divino, mas de sua totalidade.

48
Cf. Y. Congar, La Fede e la Teologia. Roma, Desclée & C. 1967, p. 21.
122
Nesse sentido, a revelação deixa em aberto muitos problemas no processo de
iluminação da realidade humana e histórica, no confronto sempre renovado da mensagem
revelada com a realidade da história. Assim, a palavra de Deus se apresenta como um longo
caminho de revelação e de descoberta, de desvelamento e de busca, sob a direção do Espírito.49
Isso quer dizer que o ministério da Igreja não exclui a obscuridade e o dúbio, o sofrimento
diante da verdade e o esforço da busca. Os cristãos não são os felizes possuidores de soluções
prontas e acabadas que os poupam de toda fadiga ou de perplexidades; eles participam, com
todas as pessoas de boa vontade, da contínua busca da verdade.50

2.5.3 Catequese das certezas e dos problemas

Tudo isto se reflete claramente no modo como se entende a catequese. Como a história
bem o demonstra, da concepção da palavra de Deus como verdade dada e possuída deriva
uma visão depositária da catequese, entendida estritamente como transmissão de um
sistema definido de afirmações religiosas, com base no modelo do ensino magisterial.51 Mas é
bem outro o tipo de catequese concebida como serviço da palavra de Deus dada e
prometida, em dinamismo aberto e dialogal. Eis alguns de seus traços característicos:
A catequese é comunicação de certezas, mas também procura aberta. O catecismo
tradicional de perguntas e respostas apresentava-se como um sistema fechado de
respostas certas: achava dever transmitir apenas certezas e considerava tudo como
igualmente certo. Hoje a catequese deve ter também o sentido do provisório, da busca
comum da verdade, a humildade de aceitar o problemático sem ignorar os elementos
certos e definitivos da mensagem cristã. As duas coisas são essenciais: por um lado, a
coragem da verdade, para fortalecer nos cristãos a própria identidade e reagir ao
ambiente de hesitações e de incertezas e de enfraquecimento (CT n. 56); mas
também saber respeitar a incompletude essencial de todos os discursos sobre Deus,
deixar-se guiar pelo Espírito no caminho para a verdade total, e não fazer da fé
cristã uma atitude de imobilismo, mas antes uma marcha para a frente, como a de
Abraão (CT n. 60).

49
Essa dimensão dinâmica e aberta da revelação, e portanto da catequese, é exemplificada de forma lúcida in:
França (Texte de référence) 2.2.2.1-3.
50
A. Fossion ressalta a dificuldade de muitos homens de hoje um cristianismo rígido, cristalizado em
fórmulas e convicções que parecem excluir a busca e o gosto pelo novo: A. Fossion, La catéchèse dans le champ de
la communication, 378.
51
A história dos catecismos mostra até que ponto essa concepção teve o efeito de sacralizar doutrinas discutíveis e
opiniões subjetivas como se fossem a palavra de Deus. Ver, a esse respeito, os testemunhos originais e divertidos
recolhidos por L. Resines, La fe maltratada. Valladolid, 1988.
123
A catequese não é um ato meramente magisterial mas também testemunho e caminho
feito em comunidade. O modelo de catequese de sentido único, como simples
transmissão de conteúdos do catequista aos catecúmenos, está superado. O que na
realidade se faz em toda atividade catequética é pôr-se a caminho, todos juntos,
pequenos e grandes, pastores e fiéis, num itinerário de amadurecimento da fé, que é
também ajuda mútua.52
A catequese deve ser diferenciada. Nem tudo deve ter a mesma importância e o mesmo
grau de certeza. Uma catequese aberta ao dinamismo da palavra não apresenta seu
conteúdo de forma indiferenciada e monolítica, mas sabe fazer a distinção entre o que é
central e o que é periférico, as coisas certas e as coisas incertas, os pontos essenciais e
os elementos secundários. Sabe respeitar a hierarquia das verdades (DGC n. 114).
A catequese deve ser aberta ao diálogo e ao confronto. Numa visão de tipo absoluto
da verdade possuída, a catequese podia se apresentar como processo exclusivo
de uma verdade religiosa que se distinguia, nitidamente, das outras, numa atitude de
autossuficiência e de fechamento. Daí a postura polêmica e falsamente apologética, o
perigo de intolerância e de incompreensão.53 Uma catequese aberta à realização da
verdade na história, estimulada pelo Espírito, não teme o confronto e o diálogo,
abre-se à colaboração, torna-se educação para a paz, para a unidade e para a
convivência pluralista.

52
Cf. Mensagem do Sínodo de 1977, n. 13; França (Texte de référence) 2.1.1.1. ( Il cammino ). Cf. também G.
Adler, Catéchisme de la vérité et verité de la catéchèse , Lumière et Vie 33 (1984), n. 169, p. 87-97.
53
Cf. O. Klineberg et al., Religione e pregiudizio. Roma, Cappelli, 1968; H. Halbfas, Linguaggio ed esperienza
nell´insegnamento della religione. Roma/Brescia, Herder- Morcelliana, 1970, p. 217.

124
A catequese é aprofundamento contínuo, educação permanente da fé (DGC nn. 69-
72). Uma catequese concebida como transmissão de um sistema predefinido poderia
até mesmo fechar-se em determinado ciclo de tempo ou estágio da vida. Uma
catequese aberta, ao contrário, apresenta-se como um dinamismo contínuo de
crescimento, ao longo de todo o arco da existência das pessoas e das comunidades.54
A catequese é não apenas assimilação, mas também criatividade. Não se trata apenas de
receber passivamente um ensinamento autorizado, mas de pôr-se em atitude ativa
de busca e de reexame, no contexto da consciência crente da comunidade cristã e
segundo uma pedagogia da criatividade .

3. CATEQUESE E INCULTURAÇÃO

Duas dimensões essenciais da palavra de Deus merecem uma consideração toda especial,
pela importância de suas consequências catequéticas. Trata-se da relação entre palavra de Deus
e culturas e entre palavra de Deus e experiência. E sobretudo a relação com as culturas.

3.1 Por uma catequese inculturada

O problema da relação entre Evangelho e cultura, ou culturas, já presente no


movimento catequético no que se refere ao problema da linguagem e da adequação, 55
praticamente explodiu nas últimas décadas, principalmente a partir do Sínodo de 1974, sobre a
evangelização,56 e de 1977, sobre a catequese, sob o nome de inculturação ou aculturação
da fé.57 E é justamente no Sínodo de 1977 que encontramos a clara indicação da catequese
como instrumento de inculturação:

54
É fundamental o conceito de catequese como educação permanente (CAL n. 22); Para ser eficaz, a catequese
deve ser permanente, e seria de fato vã se parasse à soleira da idade madura, pois ela se revela não menos necessária
para os adultos, ainda que, naturalmente, em outra forma. (CT n. 43). Em termos semelhantes cf. Puebla n. 998 e
A. Fossion, op. cit. p. 72-73 e p. 302. Cf. R. Mendes de Oliveira, Catequese e educação permanente , Revista de
Catequese 1 (1978), n. 1, p. 25-46; Decat-Celam, Catequese de adultos: processo permanente de
amadurecimento da fé , Revista de Catequese 21 (1998), n. 83, p. 61-62. Para uma visão histórica do problema, cf.
A. Exeler, Wesen und Aufgabe der Katechese. Friburgo, Herder, 1966, p. 67-121.
55
Para uma breve resenha histórica do problema no campo catequético, cf. Marcelo de Carvalho Azevedo,
Comunidades Eclesiais de Base e inculturação da fé: a realidade das CEBs e sua tematização teórica, na
perspectiva de uma evangelização inculturada. São Paulo, Loyola, 1986. Cf. U. Gianetto, Catechesi Tradendae
e metodo catechistico , Catechesi 49 (1980), n. 7, p. 57-60.
56
Para uma visão mais abrangente, muito rica e estimulante, cf. Pedro Arrupe, Catequese e inculturação , Revista
de Catequese 1 (1978), n. 1, p. 86-88; D. Irarrazaval, Inculturação e catequese , Revista de Catequese 12 (1989), n.
48, p. 37-47; L. Alves de Lima, Panorámica de la renovación catequística brasileña de los ultimos años , in: Actas
del Congreso Internacional de Catequesis. Madri, Centro de Estudios teológicos San Damaso , 1993, p. 369-396;
também publicado em Teología y Catequesis 45-48 (1993), p. 369-395 e Medellín 18 (1992), n. 72, p. 795-817.
57
Para uma abordagem mais precisa dos termos, no contexto teológico-pastoral, cf. L. C. Susin, Cultura e
inculturação: conceitos , Revista de Catequese 13 (1990), n. 52, p. 15-21; Id., Evangelho, modernidade e outras
culturas , ibid. 14 (1991), n. 54, p. 14-26; L. Alves de Lima, Catequese e evangelização da cultura e das
culturas , Revista de Catequese 15 (1992), n. 60, p. 3-24. Cf. D. S. Lourdusamy, Incarnazione del messaggio
evangelico nelle culture dei vari popoli , in: Istituto di Catechesi Missionaria della Pont. Univ. Urbaniana (ed.),
Andate e insegnate. Commento all´Esortazione Apostolica Catechesi Tradendae di Giovanni Paolo II. Bolonha,
Ed. Missionaria Italiana, 1980, p. 534, nota 23.
125
Como já ficou expresso pelo Concílio Vaticano II e foi novamente lembrado por Paulo VI na
exortação apostólica , a mensagem cristã deve basear-se na cultura humana,
e deve assumi-la e transformá-la. Nesse sentido é legítimo considerar a catequese um dos
instrumentos de inculturação, isto é, que desenvolve e ao mesmo tempo ilumina, a partir do
interior, as formas de vida daqueles aos quais se dirige.58

Desde então o tema da inculturação esteve sempre presente e vivo em todo âmbito da
reflexão catequética.59 O DGC lhe destina um lugar privilegiado (DGC n. 109; 202-226) e
ressalta a seriedade da tarefa:

A inculturação da fé [...] é um processo profundo e global e um caminho lento. Não é uma


simples adequação externa que, para tornar mais atraente a mensagem cristã, limita-se a revesti-
la com um verniz meramente decorativo e superficial.

Trata-se, ao contrário da penetração do Evangelho nos recessos mais profundos das pessoas e
dos povos, tocando-os ...de forma visceral e profunda, chegando até as raízes de sua
cultura (DGC n. 109).

58
Mensagem do Sínodo de 1977, n. 5.
59
Cf., por exemplo, R. Mendes de Oliveira, Catequese e inculturação , Revista de Catequese 17 (1994),
n. 65 p. 4-10; L. Alves Lima, A face brasileira da catequese, p. 435-442; Rosa de Lima e Terezinha Lumbieri,
Cultura brasileira, catequese e inculturação , Revista de Catequese 10 (1987), n. 40, p. 33-39 e 11 (1988), n. 42, p.
27-31; cf. J. Gevaert, Catechesi e cultura contemporanea. Leumann (Turim), Elledici, 1993; E. García Ahumada,
Dimensión catequética de la inculturación , Medellín 16 (1990), n. 61, p. 17-56; A. Fossion, Dieu toujours
recommencé: essai sur la catéchèse contemporaine. Bruxelas, Lumen Vitae/Novalis/Cerf/Labor et Fides, 1997 (cap.
5); Consejo Episcopal Latinoamericano-Dep. de Catequesis (Decat), Hacia una catequesis inculturada. Memorias de
la II Semana Latinoamericana de Catequesis. Santafé de Bogotá, Consejo Episcopal Latinoamericano- Celam,
1995; CAL n. 100-110.
126
3.2 Palavra de Deus e cultura

Falamos aqui de cultura no sentido amplo que lhe atribuem as ciências antropológicas e
sociológicas,60 sentido em que é usado pela própria Gaudium et Spes:

Com o termo genérico cultura , queremos indicar todos os meios pelos quais o homem
aperfeiçoa e exerce seus múltiplos dons de alma e de corpo; procura submeter ao seu poder o
próprio cosmo, com o conhecimento e o trabalho; torna mais humana a vida social, tanto na
família como em toda a sociedade civil, por meio do progresso dos costumes e das instituições;
enfim, no correr do tempo, exprime, comunica e conserva em suas obras as grandes experiências
e aspirações espirituais, para que possam servir ao progresso de muitos, ou melhor, de todo o
61
gênero humano.

A cultura compreende, portanto, todo o patrimônio de tradições, usos e costumes,


valores e instituições próprias de qualquer coletividade ou grupo. Podemos dizer de forma
sucinta, como Ladrière, que a cultura de uma coletividade pode ser considerada como a
configuração global dos sistemas de representações, dos sistemas normativos, dos sistemas
de expressão e dos sistemas de ação dessa coletividade .62
É em relação a essa realidade, rica e complexa, que se coloca a mensagem cristã e a
obra da evangelização. O profundo entrelaçamento entre palavra de Deus e contexto cultural
pode ser resumido numa série de princípios ratificados pela história cristã e pela consciência
da Igreja:

60
Sobre o conceito de cultura, cf. M. Montani, Filosofia della cultura. Problemi e prospettive. Roma, LAS, 1991, p.
a
37-49; E. Chiavacci, Cultura , in: L. Pacomio et al., Dizionario Teologico Interdisciplinare, vol. I. 2 ed. Turim,
Marietti, 1977; C. Kluckhohn - A. L. Kroeber, Il concetto di cultura. Bolonha, Il Mulino, 1972.
61
GS n. 53. Cf. Puebla n. 386-393. P. Poupard, Evangelizar a cultura , Revista de Catequese 15 (1992), n. 59, p.
38-41; R. Viola, Nova evangelização e catequese: catequizar a partir do coração das culturas , Revista de
Catequese 18 (1995), n. 69, p. 20-29; Dossiê do Sínodo de 1977, Cultura, linguagem e catequese , Revista de
Catequese 4 (1981), n. 14, p. 47-51.
62
J. Ladrière, Les enjeux de la rationalité. Paris, Unesco, 1977, p. 7.
127
a) Princípio da autonomia das culturas.
A fé cristã não se identifica com nenhuma cultura determinada e pode, na verdade,
encarnar-se em todas as culturas. A Igreja, assim como o Evangelho, dirigida a todos os
povos de qualquer época e de qualquer lugar, não se liga de forma exclusiva e indissolúvel a
nenhuma raça ou nação, a nenhum modo particular de vida, a nenhum costume antigo ou
recente .63

b) Princípio de encarnação nas culturas.


A mensagem cristã se encarna necessariamente nas culturas, desde a sua origem, e não
se pode concebê-la em estado puro, desligada de quaisquer mediações culturais. Trata-se não
apenas de uma necessidade histórica inevitável (que ocorre quase como uma contaminação),
mas também de uma condição necessária para que tal mensagem seja vivida, aprofundada e
comunicada: É-se homem na sociedade, crente na Igreja, com os outros. A fé, a sua
celebração, a sua prática, têm, pois, a sua expressão em um certo espaço cultural, em uma
comunidade de cultura, de história e de destino. Assim, a fé é vivida, compreendida e
expressa em uma cultura (EN n. 20).

c) Princípio de aceitação dos aspectos positivos das culturas.


O Evangelho não tem uma função de contestação das culturas mas, encarnando-se
nelas, assume seus valores, fecunda-as e transforma-as. Por isso a evangelização deve fazer
de modo que tudo de bom que se encontra no coração e na mente dos homens ou nos ritos e
culturas próprios dos povos, não apenas seja preservado, mas também purificado, elevado e
aperfeiçoado para a glória de Deus .64

d) Princípio da denúncia profética.


A fé desempenha em relação às culturas uma função crítica de denúncia e de
purificação (cf. DGC n. 109, 133, 204). Com efeito, ela, na força do Evangelho, denuncia e
corrige a presença do pecado nas culturas, purificando e exorcisando os falsos valores (Puebla
n. 405). É o peso profético de uma palavra que, em nome do único Deus vivo, deve
desmascarar toda conivência com o mal, seja individual, seja social, e todo atentado contra a
dignidade transcendente do homem, imagem de Deus:

63
GS n. 58. Cf. EN n. 20; CAL n. 102. É por isto que falar de cultura cristã soa, no mínimo, ambíguo.
64
LG n. 17. O documento de Puebla não hesita em aplicar aqui o conhecido axioma patrístico: O que não
é assumido não é redimido (cf. Puebla n. 400).

128
Para a Igreja, não se trata apenas de pregar o Evangelho em áreas geográficas cada vez mais
vastas ou a um número cada vez maior de pessoas, mas também de alcançar, e praticamente
subverter, com a força do Evangelho, os critérios de julgamento, os valores determinantes, os
focos de interesse, as linhas de pensamento, as fontes inspiradoras e os modos de vida da
humanidade que estejam em desacordo com a Palavra de Deus e com o projeto da salvação (EN
n. 19).

e) Princípio do círculo hermenêutico.


As culturas são também um instrumento necessário para a interpretação e para uma
nova expressão da palavra. É o duplo esforço hermenêutico de interpretar as formulações do
passado, sempre condicionadas pelos contextos culturais, e de repensar as novas coordenadas
de hoje. Tudo is o suscita problemas delicados, seja para a correta compreensão do
patrimônio da tradição, seja para uma formulação atual que não sacrifique nem a
continuidade nem a atualidade, para que todos possam ouvir a mensagem da salvação em sua
própria língua.
Cumpre observar que o diálogo entre Evangelho e cultura não deve se fazer em sentido
único: mesmo a fé tem algo a receber das culturas: A verdadeira encarnação da fé por meio
da catequese supõe o processo do dar , mas também o do receber .65
Não que o Evangelho deva recuar diante das exigências culturais (CT n. 53). São as
encarnações históricas da experiência que encontram nos valores culturais emergentes
categorias interpretativas e critérios hermenêuticos necessários para uma compreensão
renovada da fé.

3.3 A difícil tarefa da inculturação da fé

A ruptura entre Evangelho e cultura é certamente o drama da nossa época, como o foi
também de outras (EN n. 20).
É um fato histórico de grande alcance: no curso dos séculos a fé cristã ligou-se, de forma
efetiva, à cultura a cultura ocidental da Idade Média e da contra reforma que já não é mais
atual nem universal. Daí resulta um duplo estranhamento entre fé e cultura. Por um lado, a
obra missionária nas Igrejas jovens viu-se condicionada ao estreito laço entre fé cristã e cultura
ocidental europeia. Além disso, o Evangelho esteve ligado ao desenvolvimento histórico da
conquista (na América) e da colonização (na Ásia e na África), partilhando, em certa medida,
sua ambig idade e seus aspectos negativos. Também a catequese foi causa e efeito dessa
estranheza cultural.66

65
Mensagem do Sínodo de 1977, n. 5.
66
A. Morin, Memória da inculturação da fé na catequese da América Latina , Revista de Catequese 18 (1995), n.
69, p. 4-19. Cf. E. Alberich, L´inculturazione nella catechesi , in: M. Dhavamony (eds.), Inculturation gospel and
culture. Inculturation Évangile et culture. Roma, Ed. Pont. Univ. Gregoriana, 1995, p. 169-81.
129
Mas também nas Igrejas de antiga tradição cristã, especialmente na Europa, o destino
da evangelização estava comprometido com cristalizações culturais que impediam a fé cristã
de se apresentar como mensagem significativa e crível aos homens do nosso tempo. Como
observa argutamente Congar,

a crise atual deriva, em grande medida, do fato de que a Igreja, tendo criado um maravilhoso
conjunto de expressões da fé no âmbito da cultura latina, ficou por demais ligada a ela:
mesmo nas atividades de sua expressão missionária. A Idade Média e a contra reforma nela se
67
entranharam, e por isso ela ignorou ou recusou novas contribuições .

Tudo isso deixa entrever a extensão dos problemas que se descortinam no campo pastoral
e teológico, no que diz respeito à relação entre Evangelho e cultura,68 assim como o porquê da
necessidade urgente da inculturação. É preciso trabalhar por novas encarnações do
cristianismo nas diversas culturas contemporâneas. O processo diz respeito a todos os aspectos
da experiência cristã: profissão de fé, liturgia, elaboração teológica, disciplina, instituições
etc. É uma operação de grande fôlego, muito delicada e absorvente, não livre de perigos, mas
absolutamente necessária. Para garantir o seu sucesso, parecem indispensáveis algumas
condições operativas:

67
Y. M. Congar, Cristianesimo come fede e come cultura , Il Regno documenti 21 (1976), n. 1, p. 41.
68
Para uma exposição clara das exigências da inculturação, no que se refere à evangelização, cf. A. Torre
Queiruga, Diálogo das religiões. São Paulo, Paulus, 1997; Id., Fim do cristianismo pré-moderno. São Paulo, Paulus,
2003; cf. também J. Martin Velasco, Non credenza ed evvangelizzazione: dalla testimonianza al dialogo. Assis,
Cittadella, 1990, p. 285-307.
130
A realização de uma eclesiologia de comunhão que estimule, na Igreja, a
participação, a criatividade, a abertura de espaços de diálogo e de comunicação. Os
sujeitos da inculturação não são uns poucos especialistas ou autoridades, mas todo o
povo de Deus: A inculturação deve envolver todo o povo de Deus, não apenas alguns
especialistas, pois é sabido que o povo reflete o genuíno sentido da fé que não
podemos perder de vista (RM n.54; DGC n. 206).
A redescoberta e valorização das Igrejas locais, encarnações da Igreja universal nas
diversas zonas culturais, respeitando-lhes a diversidade, mas sem comprometer-lhes a
unidade. A Igreja local é o lugar por excelência da inculturação do Evangelho, sempre
em comunhão com a Igreja universal.69 Critérios que não devem ser esquecidos são a
fidelidade ao Evangelho e a comunhão eclesial.70
Uma atitude de grande respeito ante as diversas culturas, na convicção de que o
Espírito Santo já está presente nelas: não existe cultura que já não esteja tocada, de
algum modo, pelo Espírito, mesmo antes de qualquer evangelização explícita (CAL n.
106). Deve ser um respeito profundo e sincero, longe de todos os julgamentos fáceis
ou de uma atitude de superioridade. Na América Latina essa id ia é formulada de
modo bastante expressivo: Por isso é necessário que os evangelizadores aprendam a se
apresentar em silêncio e de pés descalços. Isto é, com uma mente e um coração
respeitosos dos valores presentes nas diversas culturas, evitando que, em nome do
Espírito, lutemos contra o Espírito (CAL n.110).
A promoção sincera do diálogo com as culturas contemporâneas, com base em um
conhecimento preciso das mesmas (DGC n. 203). O diálogo é feito num clima de
abertura e de acolhimento, no respeito da autonomia e das competências diversas, com
espírito de serviço e não de domínio.

3.4 Catequese, lugar e instrumento de enculturação

Enquanto serviço da palavra de Deus encarnada nas culturas, a catequese deve repensar a
sua identidade e sua missão. Como já dissemos, ela é considerada um dos instrumentos de
inculturação : ela desenvolve e, ao mesmo tempo, ilumina interiormente as formas de vida
daqueles aos quais se dirige .71 É também através da catequese que a fé deve encarnar-se nas
culturas e, nesse contexto, cumpre assinalar algumas tarefas particulares aos responsáveis
pela atividade catequética:

69
Em EN n. 61-64, encontra-se uma apresentação autorizada dos critérios de equilíbrio entre unidade e
pluralidade.
70
Cf. RM n. 54; CAL n. 104.
71
Mensagem do Sínodo de 1977, n. 5. Cf. também EN n. 63 e CT n. 53.
131
Da catequese, assim como da evangelização em geral, podemos dizer que é chamada a levar a
força do Evangelho ao coração da cultura e das culturas. Por isso, a catequese buscará conhecer
essas culturas e seus componentes essenciais; tomará conhecimento de suas expressões mais
significativas; respeitará seus valores e suas riquezas peculiares. É assim que a catequese
estará em condições de propor a tais culturas o conhecimento do mistério oculto e ajudar a fazer
surgir, da própria tradição viva, expressões originais de vida, de celebrações e de pensamentos
que sejam cristãos (CT n. 53).

Na realidade, os princípios indicados anteriormente para a inculturação da fé se tornam


imperativos também no âmbito da catequese. Eis algumas possibilidades e necessidades mais
urgentes:
A busca de uma linguagem adequada à comunicação da fé, uma vez que a
inculturação da fé é, sob alguns aspectos, uma obra de linguagem (DGC 208). Não
se trata de encontrar uma espécie de roupagem para apresentar de modo compreensível
um conteúdo preexistente. O papel da linguagem é muito mais profundo, envolve a
compreensão e a interpretação da própria mensagem cristã, e por isso exige todo um
esforço de encarnação e de sintonia cultural para poder exprimir a fé de forma
culturalmente interpelante. Muitas vezes a catequese se preocupou mais com a
precisão doutrinal e teológica (instância veritativa ) do que com uma correta
comunicação da fé de modo significativo.
A valorização dos catequistas locais, especialmente os leigos. É muito importante haver
catequistas imbuídos da cultura local, pertencentes ao povo em meio ao qual sua ação
deve se desenvolver (DGC n. 110). Pode-se dizer, também à luz da experiência, que lá
onde estão em ação os catequistas autóctones, que conhecem bem os problemas e
sofrimentos de sua gente, nascem espontaneamente as formas eficazes de catequese
inculturada. Os catequistas, e mais ainda aqueles que os formam, deverão possuir uma
espécie de bilinguismo da fé: por um lado a língua da própria cultura (o seu
dialeto ); por outro, a língua comum (a coiné cristã), para garantir ao mesmo tempo
a encarnação local e a comunhão universal.

132
A elaboração e utilização de materiais e instrumentos locais, verdadeiramente
inculturados. Os catecismos, os textos e os materiais locais podem ser instrumentos
privilegiados de inculturação quando oferecem a mensagem cristã em sintonia com a
sensibilidade e o modo de pensar dos diversos povos. Esta é principal missão dos
catecismos das Igrejas particulares:

Um Catecismo local deve apresentar a síntese da fé em referência à cultura concreta em que


estão imersos os catecúmenos e os catequizandos. Incorporará, portanto, todas as expressões
originais de vida, de celebrações e de pensamentos cristãos que derivam da própria tradição
cultural e são fruto do trabalho e da inculturação da Igreja local (DGC n. 133).

O encontro com a cultura e a religiosidade do povo. Para a inculturação da catequese é


preciso muita atenção à situação cultural da gente simples (culturas indígenas, cultura
popular) e em especial ao fenômeno da religiosidade popular, expressão privilegiada
da inculturação da fé .72 É verdade que nem tudo é positivo na religiosidade popular,
que apresenta muitos aspectos mistificadores e alienantes; mas não devemos nos
esquecer de que a religião do povo é estreitamente ligada à sua cultura, aos seus valores
mais profundos, às suas categorias expressivas e simbólicas.73
Atenção aos riscos de reducionismo e de sincretismo. No esforço para a inculturação da
catequese, pode-se facilmente ceder à tentação do reducionismo, que fere o critério da
integridade e pureza da mensagem cristã (DGC n. 111; CAL n. 105), ou do
sincretismo, que lhe compromete igualmente a autenticidade (DGC n. 202, 205; CAL
n. 108).

A catequese, a serviço da inculturação da palavra de Deus, tem diante de si uma tarefa bastante
absorvente mas muito promissora. Com uma atitude de respeito, de simpatia e de diálogo
sincero com as diversas culturas, a catequese poderá propor a tais culturas o conhecimento do
mistério oculto e ajudar a fazer surgir, da própria tradição viva, expressões originais de vida, de
celebrações e de pensamentos cristãos (CT n. 53).

72
S. Domingo, n. 36. Esse é um tema muito presente na reflexão latino-americana: Celam- Decat, Hacia
una catequesis inculturada: memoria de la II Semana Latioamericana de Catequesis. Santafé de Bogotá,
Celam, 1995, p. 365-409; CAL n. 111-130; México GP 96-99.
73
Falaremos mais especificamente sobre a relação entre catequese e religiosidade popular no capítulo 5.
133
4. EXPERIÊNCIA RELIGIOSA: LUGAR DA PALAVRA E ELEMENTO CENTRAL DA
COMUNICAÇÃO CATEQUÉTICA

Na economia da palavra de Deus, tem um papel de grande importância a experiência


religiosa, como lugar onde a palavra de Deus atinge a consciência dos seres humanos. O
entrelaçamento de acontecimentos e palavras que revelam o plano de Deus não deve ser
entendido em sentido material ou miraculoso, como se acontecimentos e palavras fossem
introduzidos de fora na história dos seres humanos e oferecidos à sua aceitação passiva como
mensagem divina. Ainda que a Escritura fale em termos de intervenção direta de Deus, 74
sabemos que existe uma lei de encarnação que envolve no processo da revelação os
dinamismos da ação e da reflexão do homem e da mulher. A presença de Deus na história é
percebida apenas por meio da palavra interpretativa e na aceitação pela consciência crente do
ser humano.75 E tudo isso se realiza no contexto da experiência religiosa.
Isso quer dizer que a palavra de Deus se manifesta no interior daquela experiência
complexa que leva a comunidade crente primeiro Israel, em seguida a comunidades
apostólicas a ler na própria história, guiada pelo Espírito, os sinais da presença e da ação de
Deus. A palavra de Deus só é percebida através de uma experiência de Deus .76 E é
tamanha a importância dessa dimensão experiencial da palavra que dela se pode derivar uma
lei estrutural básica: sem experiência religiosa não existe comunicação nem se ouve a palavra
de Deus. E is o tem, naturalmente, grande influência na compreensão da missão catequética.

74
Por ex.: Deus se faz ouvir pelos ouvidos do profeta (cf. Is 5,9; 22,14), clama dentro de vós (Ez 9,1.5), põe
suas palavras na boca (Nm 22,38; 23,5.12.16) dirige sua palavra a... (112 vezes na Bíblia).
75
Cf. C. Larcher, La Parole de Dieu en tant que révélation dans l´Ancien Testament , in: La Parole de Dieu en
Jésus-Christ. Tournai, Casterman, 1964, p. 35-67; H. R. Schlette, Epifania come storia. Brescia, Queriniana, 1969,
p. 41-65.
76
Cf. P. Schoonenberg, Expérience et évélation , Verité et Vie 88 (1970), n. 632, p. 5.
134
4.1 Sobre o conceito de experiência

Na vasta reflexão, sobretudo filosófica, relativa à realidade da experiência, cumpre-nos


destacar alguns traços característicos de sua estrutura básica, principalmente na sua
densidade antropológica e em seu significado hermenêutico, isto é, enquanto via de acesso à
compreensão da realidade.77 Está superada a concepção superficial que identifica a experiência
com o tempo transcorrido ou com o conjunto das situações vividas ou das coisas vistas.
Apresentamos aqui, de forma sistemática, os elementos constitutivos da experiência:

Realidade vivida com intensidade e globalmente. Para não ficarmos no superficial, a


realidade objeto de experiência deve ser vivida com uma certa intensidade e de forma
global, isto é, envolvendo a pessoa toda (em seu aspecto intelectual, afetivo, de atuação).
Realidade ponderada e interpretada. Apenas por meio da reflexão e do esforço
interpretativo a realidade experimentada ganha sentido e é devidamente valorizada
e entendida em seu significado, inserida no contexto da vida, relacionada com outros
acontecimentos e experiências:

A interpretação é o elemento constitutivo para que, do contato imediato e vivido se possa


aprender alguma coisa. Aquele que vai ao encontro da realidade sem conceitos, sem linguagem,
sem esquemas interpretativos, sem projeto de trabalho, percebe apenas uma realidade vaga
e indistinta.79

experiência (Erfahrung),80 e, portanto, lição de vida, acesso à realidade, orientação

77
Para uma abordagem mais específica, W. Gruen, Interação entre experiência e mensagem na catequese ,
Revista de Catequese 6 (1983), n. 24, p. 27-36; C. Caliman, Experiência de Deus ontem e hoje , Revista de
Catequese 7 (1984), n. 27, p. 14-23 ; F. Catão, Experiência religiosa: risco ou aventura? , Revista de Catequese 21
(1998), n. 83, p. 20-22; cf. J. Gevaert, La dimensione esperienziale della catechesi. Leumann (Turim),
Elledici, 1984, cap. III. Cf. também: G. Adler - G. Vogeleisen, Un siècle de catéchèse en France 1893-1980
istoire- éplacements- njeux. Paris, Beauchesne, 1981, p. 382-83.
78
A. Fossion, Dieu toujours recommencé, 81.
79
J. Gevaert, La dimensione esperienziale della catechesi, p. 86.
80
Cf. D. Emeis - K. H. Schmitt, Handbuch der Gemeindekatechese, p. 58.
135
Realidade expressa e objetivada. É o momento expressivo no qual o vivido é
expresso, é contado ,81 objetivado em diversas formas de linguagem (palavra, gesto,
rito, conduta etc.) Atente-se para o seguinte: a expressão não é necessária apenas para
comunicar a experiência aos outros, mas se torna mediação necessária para a elaboração
da própria experiência. Também aqui, como no processo geral da revelação, a
palavra interpreta a vida, revelando-lhe o mistério :

Para haver uma experiência, é necessário que existam os meios para exprimi-la; quanto mais
rico for o nosso sistema de expressão e de linguagem, mais sutil, vária e diversificada será a
nossa experiência.82

As experiências religiosas só podem se verificar em pessoas que aprenderam a


linguagem para a interpretação religiosa da realidade. Quem nunca ouviu falar de Deus
tampouco pode vivenciá-las.83

Realidade transformadora. Quanto mais profunda e autêntica a experiência, mais se


traduz em mudança das pessoas, que dela saem transformadas, diferentes. Bem
poucas experiências fazem aqueles que não mudam nunca, assim como é difícil mudar
verdadeiramente de vida quando não se vivem experiências significativas.
Essas características da experiência permitem representá-la esquematicamente como uma
espécie de sonda que imerge no vivido para emergir nas expressões ou objetivações:

VIDA OBJETIVAÇÕES

81
A experiência deve ser contada. Ela se inscreve sempre em uma história. Seu modo de expressão por
excelência é a narração : A. Fossion, Dieu toujours recommencé, 81.
82
G. Lindbeck, The nature of doctrine. Filadélfia, Westminster Press, 1984, p. 37.
83
J. M. Van Der Lans, cit. por J. Bulckens, Opvoeding van jongeren tot religieuze ervaring. De bijdrage
van J.M. van der Lans , Korrel 9 (1984), n. 3, p. 192.
136
4.2 A experiência religiosa

Com base na estrutura fundamental da experiência, em geral, tentamos agora apontar


algumas características próprias da experiência religiosa:
A experiência religiosa não é tanto uma experiência de uma realidade diversa ou
particular, mas antes um modo mais profundo de viver a realidade. Na base a
experiência religiosa não estão a realidade ou situações estranhas à vida, mas a própria
vida em seus momentos fundamentais amor, ódio, esperança, compromisso,
sofrimento, morte etc. percebidas, porém, num nível interpretativo mais profundo
e radical: A experiência religiosa é a experiência humana que conduz uma pessoa a
reconhecer nela uma dimensão de transcendência .84
Na experiência religiosa se dá uma leitura em profundidade do vivido, até o nível do
seu mistério e na abertura para o transcendente. Então a realidade surge no horizonte
da totalidade (significado último, origem e fim último etc.), na radicalidade de sua
problemática (procura de sentido, invocação de salvação, interpelação absoluta) e como
abertura para a dimensão transcendente do totalmente Outro .85
A experiência religiosa é expressa e mediada através das objetivações ou expressões do
religioso: ritos, crenças, narrativas, instituições, símbolos etc. Tais expressões podem ser
verbais ou não verbais, sagradas ou profanas, individuais ou comunitárias. Na estrutura
da experiência religiosa, as objetivações têm um importante e delicado papel de
mediação, visto que devem permitir a passagem para a profundidade do mistério e a
alteridade do transcendente. A experiência religiosa é uma espécie de iceberg, que
mostra apenas uma mínima parte de seu tamanho. Nem todas as linguagens adequam-se
plenamente a esse fim: menos indicadas são a linguagem da informação, as linguagens
racionais e demonstrativas; mais apropriadas são as linguagens de tipo evocativo ou
sacramental : a narrativa, o testemunho, a metáfora, o símbolo, a poesia, a celebração,
o rito etc.86

84
A. Fossion, Dieu toujours recommencé, p. 83.
85
Cf. J. Martin Velasco, A experiência cristã de Deus. São Paulo, Paulinas, 2001.
86
Cf. Ll. Duch, Historia y estructuras religiosas. Madri-Barcelona, Bruño-Edebé, 1978, p. 113-20.
137
De forma esquemática, podemos representar a experiência religiosa com a figura já
conhecida, mas caracterizada pela profundidade da linha que atinge o nível do religioso, ou
do mistério .

OBJETIVAÇÕES
VIDA RELIGIOSAS

NÍVEL RELIGIOSO DO MINISTÉRIO

ABERTURA
PARA O TRANSCEDENTE

Observe-se que as diversas objetivações do religioso (crenças, relatos, ritos etc.) só


podem ser sentidas em profundidade se vistas em relação com as experiências de que
derivam, na medida em que a comunicação religiosa não é da mesma ordem da transmissão
do factual, mas antes, da leitura em profundidade do factual. Por outro lado, a experiência
religiosa, visto que tem a estrutura da linguagem, pode ser comunicada e evocada, não
obstante sua originalidade e inefabilidade . São considerações de grande importância em suas
aplicações à catequese, como veremos a seguir.

138
4.3 A experiência cristã

O que distingue a experiência religiosa cristã? Que características apresenta a


experiência histórica de ouvir a palavra de Deus e da resposta de fé? A respeito de seus
conteúdos específicos, podemos dizer que, do ponto de vista da estrutura formal, também a
tradição cristã pode ser expressa com os esquemas de toda experiência religiosa:87
A Escritura do AT é a configuração literária da experiência religiosa de Israel,
experiência múltipla e sofrida, rica e profunda. Essa experiência histórica foi o lugar da
manifestação da palavra de Deus em seu caminho para a plenitude do Cristo.
O NT é para nós o testemunho e a objetivação da excepcional experiência religiosa
de Jesus de Nazaré e da comunidade apostólica, que nos legou, de forma insuperável, a
profundidade do mistério vivido e a interpretação salvífica que dele fez.
A experiência religiosa da Igreja, continuação da experiência da comunidade
apostólica, expressa-se nos diversos documentos da tradição eclesial: vida e
história da Igreja, liturgia, pensamento dos padres e dos teólogos, magistério, formas
de espiritualidade etc.

87
Mas sabe-se que, por muito tempo e em certa medida ainda hoje a simples referência à experiência como
categoria cristã interpretativa foi vista com desconfiança. F.Coudreau lembra, a propósito, o mérito da obra de J.
Mouroux (L´expérience chrétienne. Paris, Aubier 1952) em refutar as diversas restrições que pesam sobre essa
id ia: cf. F.Coudreau, Si può insegnare la fede? Leumann (Turim), Elledici, 1978, p. 58.
139
Comparado a qualquer outra experiência que pretenda chamar-se cristã, o conjunto da
experiência bíblica representada no quadro tem um caráter fundante, enquanto fonte
obrigatória de interpretação e de apreciação. Mas também a experiência eclesial pós-bíblica
continua a ser um ponto de referência e portanto de união essencial.

Em síntese, existe experiência cristã, ouvindo-se a palavra de Deus, quando uma pessoa ou um
grupo aprofunda e exprime , acolhendo a experiência de Cristo e da
Igreja como fonte de sentido. Dá-se, assim, um processo de identificação dinâmica entre o
próprio itinerário experiencial e as experiências fundantes e eclesiais. Eis a essência da
experiência de fé e o que, do ponto de vista existencial, significa escutar a palavra de Deus e
pô-la em prática.

4.4 Catequese, comunicação da palavra na experiência de fé: alguns modelos


inadequados

A relação estreita entre palavra de Deus e experiência religiosa permite ligar a


catequese, serviço pastoral da palavra, à estrutura fundamental da experiência de fé. Pode-se
dizer que sem experiência religiosa não é possível um processo de comunicação da palavra
de Deus nem um caminho de fé como resposta à palavra: sem experiência religiosa não
existe comunicação religiosa. Atualmente, essa é uma convicção partilhada largamente por
estudiosos e responsáveis pela atividade catequética:

A experiência humana entra no processo catequético por direito próprio. Se hoje a Igreja insiste
no papel da experiência na educação da fé, não é por concessão a uma corrente da pedagogia
geral dos nossos tempos. É a própria natureza da fé cristã e o caminho de seu amadurecimento
que exigem uma atenção particular à experiência no ato catequético. Em outras palavras, pode-
se afirmar que uma catequese da experiência é mais que uma simples modalidade transitória
da pedagogia catequética, é mais que uma metodologia: é uma exigência inerente à transmissão
do Evangelho, para que possa ser recebido como mensagem de salvação.88

88
Espanha CC n. 223; CAL n. 23. Cf. J. Gevaert, Esperienza , Diz.Cat., p. 247-49. Também a Evangelii
Nuntiandi coloca a experiência no centro da transmissão do Evangelho: Por acaso existe uma outra forma de
expor o Evangelho que não transmitindo aos outros a própria experiência de fé? : EN n. 46. Brasil CR n. 68-70 usa
no título a expressão experiência humana , embora no texto, depois não esteja tão claro, a não ser pela citação de
Medellín.
140
A relação da mensagem cristã com a experiência humana não é uma simples questão
metodológica, mas nasce da própria finalidade da catequese (DGC n. 116).

Pois bem, com base nessa sua estrutura experiencial, é possível distinguir alguns modelos
inadequados de catequese, cuja deficiência reside no próprio fato de que tal estrutura
não atende aos requisitos fundamentais:
Catequese como simples transmissão de objetivações religiosas

É a concepção da catequese que predominou por muito tempo como simples


transmissão de objetivações religiosas (verdade, crenças, tradições, ritos, normas morais
etc.), como ensino doutrinal ou de um conjunto de tradições e de normas. Ela se mostra
inadequada pelo próprio fato de considerar as objetivações religiosas como simples
conteúdos a serem transmitidos, sem o devido enraizamento nas experiências religiosas de
que derivam. Muito facilmente elas assumem a forma de doutrinação, de instrução intelectual e
moral, de ensino não integrado à vida.
Catequese como reflexão sobre fatos ou problemas de vida

141
Neste modelo de catequese, que pretende manter a distância entre fé e vida, tomam-se
como conteúdo situações e problemas de vida, mas sem o esforço de aprofundamento que
permite atingir o nível da problemática religiosa e a relação vital com as experiências
fundantes cristãs. Fazem-se, talvez, discursos e reflexões úteis, educativos, mas que não
atingem o nível da comunicação religiosa, e por isso não merecem o nome de catequese.
Catequese como aplicação da doutrina à vida

Neste caso a catequese, concebida sempre como transmissão de objetos religiosos,


procura um vínculo com a realidade existencial sob forma de aplicação à vida . No
encontro catequético se procura, no fim do discurso religioso, descer ao concreto da vida por
meio de aplicações de tipo moral (a boa ação , o sacrifício ) ou ritual, ou devocional etc.
Assim, a vida se mostra reduzida a um campo de aplicação da mensagem religiosa, mas
permanece fora do conteúdo da própria mensagem.
Catequese como passagem da vida à fé

142
É o caso de muitas catequeses ditas antropológicas ou situacionais que partem dos
problemas ou situações humanas e procuram de certa forma fazer a passagem para a
mensagem cristã (Bíblia, sacramentos, magistério etc.), não por meio de aprofundamento da
experiência, mas por simples justaposição ou transição. Isso muitas vezes manifesta uma
verdadeira instrumentalização dos problemas humanos (utilizados como mero ponto de
partida) ou integração frustrada entre vida e fé, em nível de experiência religiosa. O recurso à
passagem revela a falta de um aprofundamento verdadeiro.

4.5 Catequese: aprofundamento-identificação da própria experiência com as


experiências cristãs

A catequese autêntica respeita a estrutura experiencial da comunicação da palavra de


Deus, e se torna aprofundamento da própria experiência no confronto com as experiências
fundantes cristãs: Israel, Cristo e a Igreja. Torna-se, assim, comunicação e relato de uma
experiência histórica oferecida como chave de interpretação e fonte de sentido para a própria
experiência. Ou seja, realiza-se uma identificação global desta última com as experiências
bíblicas e eclesiais (evangelização-conversão) e um progressivo aprofundamento dessa
identificação em relação às diversas situações da vida (catequese-amadurecimento da fé).

143
Esse processo de aprofundamento e de confronto, que acompanha a existência
individual e comunitária, é um encontro que leva a fé a interpretar a vida e a vida a
interpretar a fé, na lógica do círculo hermenêutico.89 É um esforço de reflexão nada fácil,
principalmente nas condições dispersivas da cultura atual:

Para que o encontro com a Presença originante seja possível, a pessoa deve passar da
dispersão à concentração, da superficialidade ao aprofundamento, da multiplicidade à
unificação.90

A catequese, desse ponto de vista, pode ser definida como comunicação experiencial
significativa da fé cristã. Na base está o princípio da correlação 91 (ou integração,92 ou
interação,93 ou reciprocidade) entre situações humanas e mensagem revelada na encarnação
histórica concreta da palavra de Deus.

À luz desses requisitos, é possível ilustrar melhor a tarefa da catequese no que se refere
à experiência. Essa tarefa consiste, no fundo, em comunicar experiências e em ajudar a fazer
experiência. Mais concretamente: no cerne do compromisso catequético encontra-se a
capacidade de estimular e ampliar experiências, aprofundar experiências, comunicar
experiências, exprimir experiências:

Estimular e ampliar experiências: isto é, voltar-se para a área do vivido, convidando a


observar novas realidades, a ouvir testemunhos, a ampliar o âmbito da própria
experiência, seja em extensão, seja em profundidade.
Aprofundar experiências: significa ajudar a superar os níveis superficiais do vivido,
quebrar as aparências de banalidade para revelar o fundo misterioso e problemático das
situações de vida. No contexto da catequese, significa tão-somente reportar-se à
experiência cristã como chave de interpretação. Portanto, o educador deve iniciar na
reflexão, na meditação e ser capaz de fornecer instrumentos de análise e de
aprofundamento das experiências de vida.

89
Desse ponto de vista, a catequese se apresenta como uma hermenêutica dos sinais : A. Fossion, Dieu toujours
recommencé, p. 89. Cf. Ásia (Cingapura 1995) III B.
90
J. Martin Velasco, A experiência cristã de Deus.
91
O princípio da correlação , inspirado em P. Tillich, tem muitas aplicações no campo catequético. Cf. J.
Werbick, Correlazione (principio della) , Diz.Cat., p. 178-81; J. Gevaert, La dimensione esperienziale della
catechesi, p. 59-67; Brasil CR nn. 112-114; Espanha CC n. 223; DGC n. 153.
92
Integração entre fé e vida : RdC n. 52-53.
93
25-26, Brasil CR n. 113-117.Cf. CAL n. 113-117.

144
Comunicar experiências: o processo da catequese é todo ele permeado por um contínuo
intercâmbio de experiências, dentro da grande experiência fundante de Cristo e da
Igreja. É necessário, pois, dominar as linguagens próprias da comunicação experiencial
(o relato, o símbolo, a metáfora, o testemunho etc.), partindo-se do princípio de que as
experiências a serem comunicadas existem de fato, não apenas no passado
(experiência bíblica e eclesial) ou alhures, mas no [aqui e agora] do campo
imediato da experiência.
Exprimir e fazer exprimir experiências: a expressão, a linguagem, as objetivações,
não são apenas meios para comunicar experiências já feitas: são também e sobretudo
instrumentos essenciais para realizar e aprofundar a experiência. Cabe, portanto, à
catequese, fornecer instrumentos de expressão, fazer que a experiência possa ser
contada, favorecer a linguagem e a identificação da própria experiência de vida
com as experiências cristãs fundantes.

5. CATEQUESE FIEL A DEUS, À PESSOA HUMANA E À IGREJA

Ao final desta ampla reflexão sobre a catequese como serviço da palavra de Deus, é
possível precisar alguns aspectos de sua identidade e de sua tarefa, em sintonia com o
princípio tradicional da dupla (ou tripla) fidelidade: a Deus, à pessoa humana (e à Igreja):
Uma lei [...] é fundamental para toda a vida da Igreja: a da fidelidade a Deus e ao homem,
numa atitude única de amor .94

94
CT n. 55; DGC n. 145; J. Colomb, Al servizio della fede; Puebla n. 994-997 (Fidelidade a Deus, à Igreja, à
pessoa latino-americana). Brasil CR n. 79-80.
145
5.1 As fontes da catequese

A fidelidade à palavra de Deus evoca o tema tradicional das fontes da catequese,95 isto
é, a determinação dos lugares e documentos de onde se extrai o conteúdo genuíno da
catequese. Considerando as relações existentes entre as diversas experiências cristãs,
podemos afirmar:
O lugar absolutamente central das Santas Escrituras que, depois de tantos anos de
exílio forçado, podem novamente ocupar o lugar primordial que lhes cabe (DV n.
21; DGC n. 96; 127). A Bíblia é efetivamente a alma e o livro da catequese (RdC
n. 105), o livro por excelência da catequese ,96 muito mais que mera fonte de
subsídios: A explicação da palavra de Deus na catequese [...] tem como fonte
primária as Sagradas Escrituras, que explicadas no contexto da Tradição,
constituem o ponto de partida, o fundamento e a norma do ensinamento
catequético .97
Dentro das Sagradas Escrituras assume uma importância absolutamente excepcional o
testemunho dos Evangelhos que, narrando a vida e o mistério de Jesus, e tendo eles próprios
uma estrutura catequética , ocupam o centro de toda catequese (DGC n. 98).

A Tradição tem uma função insubstituível como fonte da catequese (cf. CT n. 27; DGC
n. 96). A Tradição, no sentido pleno e dinâmico que assume no pensamento conciliar
(cf. DV n. 8), representa para a catequese um ponto de referência essencial,
especialmente nos símbolos de fé , na liturgia e no riquíssimo patrimônio do
pensamento patrístico e da história da Igreja.
Cabe ao magistério dos pastores principalmente enquanto intérprete autêntico da
palavra de Deus escrita ou transmitida (DV n. 10; DGC n. 96) um papel bem
específico. Mas é uma tarefa que não se deve radicalizar, uma vez que o magistério
não é superior à palavra de Deus, mas serve a esta (DV n. 10) e por isso nunca
dispensa o recurso às autênticas fontes da catequese.98 E isso vale também para os
catecismos, sejam universais ou locais, enquanto expressão do magistério a serviço da
catequese:

O Magistério da Igreja [...] está a serviço da Palavra. Por isso, o Magistério não pode manipular
nem amputar a Palavra de Deus. O Magistério deve ser exercido com espírito humilde de
serviço e de comunhão colegial, pois ele próprio está submetido à Palavra divina (CAL n. 45).

As fontes da catequese constituem um conjunto de documentos da fé que


desempenham um papel de primeira ordem no exercício do ministério catequético. A
catequese deve ser tradição viva desses documentos (DGC n. 96).

95
Cf. DGC n. 94-96; E. Alberich, Fonti della catechesi , Diz.Cat., p. 181-83; J. M. Ochoa Martínez de Soria,
Fuente y fuentes de la catequesis , Nuevo Dic. Cat., p. 1.013-28.
96
RdC n. 105; CAL n. 44; Brasil CR n. 154.
97
Pont. Com. Biblica, L´interpretazione della Bibbia nella Chiesa (15.4.1993), IV, C, 3. Cf. C. Bissoli, Bibbia e
catechesi , Orientamenti Pedagogici 38 (1980), n. 4, p. 324-57.
98
Cf. Ch. Wackenheim, Catéchèse, écriture, magistère , Lumière et Vie 53 (1984), n. 169, p. 99-110.
146
5.2 O problema da linguagem

Da natureza da catequese como comunicação experiencial significativa deriva a


importância da linguagem como fator determinante. Como se disse anteriormente, a
linguagem não se reduz a simples roupagem externa de um conteúdo preexistente. Em
termos concretos, no que se refere à catequese, temos que ter presente:
a necessidade de revalorizar as linguagens da comunicação religiosa. Muitas vezes a
catequese lançou mão, em vez disso, das linguagens menos adequadas ao
discurso religioso.99 Atualmente assistimos a uma promissora redescoberta das mais
genuínas formas de comunicação religiosa, como o relato,100 o símbolo,101 a
expressão icônica, gestual, e as linguagens não verbais em geral;
particular atenção recebe atualmente o fenômeno da comunicação midiática e dos
meios de comunicação social. Não se trata apenas do possível uso dos meios de
comunicação de massa na catequese, mas da necessidade de levar a sério a mudança
cultural representada pelo fato da comunicação e de refletir sobre o desafio que ela
lança à tarefa profética da comunidade cristã.102

99
Veja-se, por exemplo, a aguda análise de J. Piveteau, Langages et catéchèse , Catéchèse 21 (1981), n. 82, p.
53-58. Cf. também J. Gevaert, Il linguaggio della catechesi: esigenze di fondo e criteri particolari , Catechesi 48
(1979), n. 11, p. 3-11.
100
Cf. Ralfy Mendes de Oliveira, Algumas ideias sobre catequese narrativa , Revista de Catequese 20 (1997),
n. 77, p. 33-39; S. Lanza, La narrazione in catechesi. Roma, Paoline, 1985; A. Pasquier, Initiation, récit,
catéchèse , Catéchèse 22 (1982, n. 87, p. 71-82; E. J. Korherr, Narrazione , Diz.Cat., p. 454-55.
101
O estudo do símbolo e de sua didática é um tema muito abordado no âmbito da educação religiosa. Cf. por
exemplo: D. Nandi, Símbolo: sua potência e nossos limites , Revista de Catequese 23 (2000), n. 91, p. 53-60;
O. Betz, I simboli. Per comunicare l´esperienza di fede. Milão, Paoline, 1991; V. Hertle - M. Saller - R. Sauer
(eds.), Spuren entdecken. Zum Umgang mit Symbolen. Munique, Kösel, 1987; A. Fossion, L´initiation au
symbolisme en catéchèse: une perspective communicationnelle , Lumen Vitae 49 (1994), n. 4, p. 383-99. Para
uma visão de conjunto: E. Feifel, Simboli religiosi , Diz.Cat., p. 583-86.
102
Cf. Sociedade de catequetas latino-americanos, Linguagens da cultura midiática e catequese. São Paulo,
Salesiana, 2001 (é fruto de várias reuniões internacionais a respeito deste tema); R. Viola, Comunicação e
catequese, visão holística da comunicação no ministério da catequese , Revista de Catequese 20 (1997), n. 78, p.
38-39; D. Biscalquin, O rock na comunicação da juventude , Revista de Catequese 17 (1994), n. 65, p. 1-25; I. e
Oliveira Soares, Os meios de comunicação e a evangelização , Revista de Catequese 4 (1981), n. 14, p. 31-35; T.
M. Lima da Cruz, Comunicação na catequese , Revista de Catequese 12 (1989), n. 45, p. 16-24; P. Spinosa,
Campanha de fraternidade: uma experiência catequética através da comunicação de massa , Revista de Catequese
23 (2000), n. 89, p. 49-63; Nivaldo Luiz Pessinatti, Políticas de comunicação da Igreja católica no Brasil. São
Paulo/ Petrópolis, Unisal, Vozes 1998; Genésio Zeferino Silva Filho, Comunicação e pastoral: como
melhorar a comunicação nas ações e ventos pastorais. 2ª ed. São Paulo, Salesiana, 2003; P. Babin, La catechesi
nell´era della comunicazione. Leumann (Turim), Elledici, 1989; P. Brooks, La comunicazione della fede
nell´età dei media elettronici. Leumann (Turim), Elledici, 1987; F. Lever, Comunicazione , Diz.Cat., p. 160-
63; F. Pasqualetti, Catechesi e nuove tecnologie , Catechesi 65 (1996), n. 5, p. 20-28.

147
5.3 Pluralismo e realismo metodológico

A estrutura experiencial da comunicação catequética faz entrever também a


possibilidade de itinerários metodológicos diferenciados. A segunda área experiencial
escolhida como ponto de partida ou como conteúdo principal do processo catequético
compreende dois tipos ou modelos possíveis de itinerário metodológico.
O mais clássico é o modelo ou itinerário descendente , que parte das expressões ou
documentos da fé, quer de tipo bíblico (catequese bíblica, querigmática,
evangélica etc.), quer de tipo eclesial (catequese patrística, litúrgica, histórica,
doutrinal etc.). Salienta-se nesse caso a função catequética das traditiones (traditio
symboli, traditio Pater),103 ou dos documentos da fé,104 ou a pedagogia dos sinais, ou
a didática dos símbolos da fé etc.
Mas existe também o modelo ou itinerário ascendente (também chamado
indutivo ) ou existencial, que parte dos problemas ou situações humanas (catequese
antropológica, situacional, política, libertadora etc.). Nessa perspectiva, a catequese se
configura como iluminação e interpretação da vida.
Em si mesmos, os dois itinerários são legítimos, desde que não fiquem, porém,
confinados à área experiencial escolhida, mas se abram para as outras e tornem possível o
processo de identificação e de aprofundamento da experiência religiosa que é próprio da
catequese.
No exercício concreto da ação catequética, é preciso levar em conta as exigências e
situações dos sujeitos interessados, não apenas como recurso metodológico, mas por
exigência intrínseca da tarefa da catequese. Para todas as idades, para todas as condições
individuais ou sociais, valorizam-se as reais possibilidades de experiência religiosa,
a esfera do vivido e as capacidades concretas de interiorização. A catequese
não deve fornecer respostas a perguntas não existentes ou não formuladas, não deve
forçar os ritmos de crescimento e de amadurecimento em nome de exigências
doutrinais ou institucionais impostas de fora.

103
Cf. DGC n. 78; CT n. 28; Espanha CC n. 135.
104
Cf. DGC n. 96; França (Texte de référence) 3.1. e 3.1.2.
148
De todas essas considerações, surge um modelo de catequese profundamente renovado, se
comparado aos cânones tradicionais. Os jovens e os adultos de hoje principais participantes
das iniciativas catequéticas são especialmente sensíveis a esses aspectos de uma catequese
adulta e significativa , que se apresenta como anúncio de uma palavra que fala da vida e
dá sentido à vida. Não obstante as dificuldades para a sua realização, o modelo delineado
apresenta boas perspectivas de eficácia e por isso merece todos os esforços para que possa
entrar na mentalidade e na práxis dos agentes pastorais.

SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS

Um primeiro tema a aprofundar, no âmbito deste capítulo, diz respeito à revelação em sua
relação com a catequese. Sobre o assunto, indicamos os seguintes trabalhos:
ANTONIAZZI, A. Revelação e catequese . Revista de Catequese 6 (1983), n. 24, p. 20-26.
EICHER, P. Das Offenbarungsdenken in seiner katechistichen Konsequenz. Ein theologischer
Prospekt . Katechetische Blätter 101 (1976), p. 289-305.
GEFFRÉ, C. La révélation comme histoire: enjeux théologiques pour la catéchèse . Catéchèse
25 (1985), n. 100/101, p. 59-76.
MARLÉ, R. Quelle théologie de la révélation? . Catéchèse 16 (1976), n. 63, p. 171-80.
MENDES DE OLIVEIRA, R. Dimensões da catequese renovada a partir do novo conceito de
revelação . Revista de Catequese 26 (1984), n. 7, p. 4-13.
MORAN, G. Catequese da Revelação. São Paulo, Herder, 1969.
PIÉ I NONOT, S. - OCHOA MARTÍNEZ DE SORIA, J. M. Revelación de Dios . Nuevo Dic.
Cat., p. 1947-68.
SCHILLEBEECKX, E. Revelação e teologia . Revelação e teologia 1. São Paulo, Paulinas, 1968.
VALENTINI, D. Rivelazione . Diz. Cat., p. 548-53.

Interessam também para o nosso tema os estudos sobre a palavra de Deus e sobre
pregação na Igreja. Por exemplo:
BARTH, K. La proclamazione del Vangelo. Turim, Borla, 1964.
BISSOLI, C. Parola di Dio . Diz. Cat., p. 479-80.
BROSHUIS, I. A Bíblia e a catequese . In: Fé adulta. São Paulo, Paulinas, 2002 (Nova série).
. A Bíblia na catequese com os adultos . In: CNBB-GRECAT. Segunda Semana
brasileira de catequese. São Paulo, Paulus, 2002, p. 244-5 (Estudos da CNBB n. 84).
CHARLIER, L. et al. La parole de Dieu en Jésus-Christ. 2a ed. Tournai, Casterman, 1964.
CNBB. Dimensão bíblico-catequética: crescer na leitura bíblica. São Paulo, Paulus, 2003 (Estudos
da CNBB n. 86).

149
CRUZ, T. M. L. da. Boas novas na leitura da Bíblia . Revista de Catequese 17 (1994), n. 66, p.
23-33.
. A leitura da Bíblia no Brasil hoje . Revista de Catequese 17 (1994), n. 65, p. 26-39.
ECHEVERRÍA SERRANO, F. Palabra de Dios . Nuevo Dic. Cat., p. 1730-49.
GONÇALVES, J. L. F. Escola bíblico-catequética . Revista de Catequese 25 (2002), n. 98, p. 31-
38.
GRASSO, D. A mensagem de Cristo: síntese de teologia na perspectiva da história da salvação .
Revelação e Teologia 13. São Paulo, Paulinas, 1970.
GRECAT-GREBI. O uso pastoral da Bíblia: seminário sobre as várias leituras da Bíblia . Revista de
Catequese 15 (1992), n. 59, p. 42-47.

GRUEN, W. Bíblia e Catequese . Revista de Catequese 10 (1987), n. 37, p. 20-39.


. Jesus Cristo, centro da mensagem, é o modelo da catequese inculturada . Revista de
Catequese 17 (1994), n. 67-68, p. 63-89.
. Linguagem da Bíblia, linguagem da catequese . Revista de Catequese 13 (1990), n. 5,
p. 5-10.
. Iniciação à Leitura da Bíblia . Revista de Catequese 5 (1982), n. 19, p. 5-17.
MALDONADO, L. A homilia: pregação, liturgia, comunidade. São Paulo, Paulus, 1997.
RODRIGUEZ MEDINA, J. J. Teologia pastoral de la Palabra de Dios. Madri, PPC, 1978.
SCHLIER, H. La parola di Dio: teologia della predicazione secondo il Nuovo Testamento. Roma,
Paoline, 1963.
SEMMELROTH, O. Teologia della parola. Bari, Paoline, 1968.
SILVA, V. As respostas da Bíblia diante das novas realidades . Revista de Catequese 17 (1994),
n. 67-68, p. 29-35.
SOARES, S. A. Bíblia e catequese . Revista de Catequese 13 (1990), n. 49, p. 36-40.

Particular interesse tem o conceito de experiência religiosa, em relação com a


catequese, e a dimensão antropológica ou experiencial na catequese. Na vastíssima bibliografia
existente, apontamos:
ALBERICH, E. Fede ed esperienza nel movimento catechistico postconciliare . Catechesi 50 (1981),
n. 17, p. 3-37.
ALVES DE LIMA, L. Interação . Nov. Dic. de catequética. São Paulo, Paulus, 2003. ANJOS, M. F.
et al. Experiência religiosa, risco ou aventura? São Paulo, Paulinas, 1998. BISSOLI, C. L´uomo
uditore della parola . Religio, p. 111-36.
BOSH, F. van den. Situación, experiencia y vida . In: SOCIEDAD DE CATEQUETAS
LATINOAMERICANOS (Scala). Encrucijadas de la catequesis. San José de Costa Rica, Editorial
Conec, 1999, p. 56-100.
BRIEN, A. Quale antropologia nella pastorale? . Note di Pastorale Giovanile 8 (1974), n. 11, p.
2-14.
CALIMAN, C. Experiência de Deus ontem e hoje . Revista de Catequese 7 (1984), n. 27, p. 14-
23.
EXELER, A. La catéchèse, annonce d´un message et interprétation d´expériences . Lumen Vitae
25 (1970), n. 393-404.
FUCHS, G. Glaubenserfahrung - Teologie - Religionsunterricht. Ein Versuch ihrer Zuordnung .
Katechetische Blätter 103 (1978), p. 190-216.

150
GEVAERT, J. La dimensione experienziale della catechesi. Leumann (Turim), Elledici, 1984.
. Esperienza . Diz. Cat., p. 247-49.
GRUEN, W. Interação entre experiência e mensagem na catequese . Revista de Catequese 6 (1983),
n. 24, p. 27-37.
. Linguagem e libertação na catequese . Revista de Catequese 7 (1984), n. 25, p. 17-31.
GRUPPO DI CATECHESI. Fede ed esperienza nella catechesi. Leumann (Turim), Elledici, 1982.
HALBFAS, H. Linguaggio ed esperienza nell´insegnamento della religione. Roma-Brescia,
Herder-Morcelliana, 1970, p. 71-96.
LANGER, W. Aprire la vita alla fede. Significato e ruolo della catechesi in una società
pluralista . Catechesi 58 (1989), n. 5, p. 4-13.
MARTÍN VELASCO, J. Experiencia religiosa . Nuevo Dic. Cat., p. 882-99.
MOLARI, C. L´esperienza ´luogo´ della catechesi? . Via Verità e Vita 28 (1979), p. 8-17.
PRENNA, L. L´uomo religioso . Religio, p. 83-110.
SCHILLEBEECKX, E. História humana, revelação de Deus. São Paulo, Paulus, 1994.
SCHOONENBERG, P. Expérience et révélation . Lumen Vitae 25 (1970), p. 383-92. TRENTI, Z.
L´esperienza dell´uomo . Religio, p. 51-82.
TRENTI, Z. - SASTRE GARCÍA, J. Experiencias humanas fundamentales . Nuevo Dic. Cat., p.
899-912.

151
152
Capítulo 5
A catequese:
Iniciação à fé e educação da fé
No capítulo anterior falamos da catequese enquanto serviço
da palavra de Deus que se manifesta na história e tem seu
vértice na revelação de Cristo. Agora vamos considerar o p lo
subjetivo do dinamismo da revelação, isto é, a fé como
resposta humana à interpelação da palavra. Diante da ação da
palavra de Deus o ser humano deve responder com a atitude
de fé: e a catequese se define também como mediação eclesial
para colocar a pessoa em sintonia com a palavra de Deus,
favorecendo, assim, o crescimento na fé.

1. INICIAR E EDUCAR PARA A FÉ HOJE: IDEAL E REALIDADE

Há já algum tempo, especialmente a partir do período querigmático do movimento


catequético, reivindicou-se para a catequese a natureza de serviço da fé , 1 e pouco a pouco
foi se tornando habitual, na literatura catequética e eclesial, a denominação da catequese
como educação da fé (ou educação para a fé, ou ainda educação na fé), ou outras
expressões semelhantes que contêm uma referência explícita à fé: transmissão da fé,
pedagogia da fé, ensinamento da fé, itinerário de fé etc. Nos documentos oficiais, na esteira
do decreto conciliar Christus Dominus, encontra-se claramente consagrada a qualificação da
catequese como educação da fé: [A catequese] consiste na educação sistemática e
progressiva da fé, aliada a um processo contínuo de amadurecimento da própria fé .2
O Diretório Geral para a Catequese coloca em primeiro plano o primado e a urgência
da catequese de iniciação e da catequese posterior como educação permanente da fé
(DGC n. 67-70).
A qualificação da catequese como iniciação à fé e como educação da fé constitui, por
isso, uma via privilegiada de acesso à compreensão da sua identidade e de seu significado na
práxis eclesial. Ao mesmo tempo, porém, essa denominação e a atividade prática que dela
deriva envolvem muitos aspectos problemáticos e dificuldades que exigem um esforço de
esclarecimento e constituem um desafio à responsabilidade dos agentes pastorais.

1
Cabe lembrar a obra clássica de F. X. Arnold, Dienst am Glauben. Friburgo, Herder 1948 (trad. it.: Il ministero
della fede. Alba, Paoline, 1955).
2
CD n. 14. Cf. DGC n. 67 e 69; Mensagem do Sínodo de 1977, n. 1, retomado também em Puebla n. 977, Brasil
CR n. 71,72, 310 e França (Texte de référence) 1.3.2.
153
1.1 É possível iniciar e educar para a fé?

Por um lado, os conceitos teológicos de fé e de iniciação à fé parecem tornar vã


qualquer pretensão de intervir pedagogicamente, e portanto de influenciar, a partir de fora, o
dinamismo interior do crente. Na verdade, a fé é sempre fruto do encontro entre a inefável
graça de Deus e o mistério da liberdade humana. E a iniciação cristã, em seu significado mais
profundo, é sobretudo ação interior e transformadora operada por Deus por meio dos
sacramentos do batismo, da confirmação e da eucaristia. Cabe então perguntar se é possível
programar e guiar, a partir de fora, o caminho interior e secreto do trabalho da graça no
coração das criaturas humanas. Tem sentido querer gerir de fora um processo como esse? É
possível iniciar, transmitir, educar a fé? 3
Por outro lado, os conceitos de iniciação e de educação aplicados à catequese não
parecem corresponder à realidade efetiva da práxis catequética, que muitas vezes se limita a
simples ensinamento doutrinal, ou a um processo de socialização a serviço de grupos ou
instituições religiosas, ou a formas mais ou menos conscientes de doutrinação ideológica.
Muitas vezes o esforço para comunicar uma fé é percebido como um processo de
doutrinação e proselitismo da parte de grupos ideologicamente bem definidos. Nesse sentido,
a catequese cristã poderia constituir um obstáculo não apenas à verdadeira ação educativa e
promocional das pessoas, mas também à causa da união ecumênica e da convivência
democrática.

3
Cf. F. Coudreau, Si può insegnare la fede? Leumann (Turim), Elledici, 1978; J. Werbick, Glaubenlernen aus
Erfahrung, Munique, Kösel, 1989, p. 17-42.
154
1.2 Iniciação à fé na sociedade atual

De outro ponto de vista, a situação religiosa e cultural de hoje parece anular, desde o
início, qualquer esforço para revelar e potencializar a fé dos cristãos. Por um lado, como já
salientamos, atualmente os tradicionais processos de iniciação e de socialização religiosa
encontram-se emperrados, assim como o processo de passagem da fé de uma geração para a
outra. Onde encontramos hoje verdadeiros processos de iniciação para a fé? Além disso,
como falar de fé em uma sociedade dominada pelo pensamento racional, pelo gosto da
demonstração científica e pela perspectiva do futuro programado e planificado? Quem num
mundo altamente tecnicizado, consumista e pragmático vai querer ouvir um convite à
entrega confiante representada pela fé? A dificuldade da tarefa é causa de desânimo para
muitos catequistas e educadores.
Em contrapartida, assiste-se a um certo despertar do sagrado , do religioso , do
espiritual , e ao sucesso de movimentos religiosos diversos, alternativos. São fenômenos e
experiências muitas vezes bastante sugestivos e plenos de ambig idade. Nesse contexto, a
obra paciente da educação e amadurecimento da fé muitas vezes se vê ameaçada pela
fuga fácil para o irracional, pela procura de segurança afetiva, pela eterna tentação de
refugiar-se em formas de religiosidade compensatória ou em experiências imaturas de fé.

1.3 Catequese da conversão, das atitudes, rumo à maturidade

Atualmente, na tentativa de superar o unilateralismo da catequese do passado,


formulam-se os objetivos da ação catequética não mais em termos de conhecimentos, mas de
atitudes interiorizadas de fé, a começar pela atitude fundamental que é a conversão. Ora, o
conceito de atitude provoca a mesma perplexidade que se tem diante do conceito de
experiência (de que falamos no capítulo anterior): parece algo impreciso, incontrolável; algo
que exclui a verificação e a clareza conceitual. Uma catequese que se propõe a favorecer
atitudes de fé parece furtar-se às exigências de clareza e de completitude.
E algo semelhante acontece com o conceito de maturidade de fé, atualmente usado para
indicar o horizonte ideal do processo catequético. De que maturidade se trata? Até que ponto
o crescimento da fé se insere no amadurecimento afetivo e humano das pessoas? Para que
modelo de crente adulto deve orientar-se o esforço da catequese dos dias de hoje? Quais os
requisitos de uma catequese que queira promover esse novo modelo de ser maturante ,
evitando as tentações fáceis do espiritualismo e do infantilismo religioso?

155
A simples enumeração dessas dificuldades, às quais seria fácil acrescentar outras tantas, nos
leva a considerar com atenção a natureza da catequese como iniciação à fé e educação da
fé e a tentar uma certa elucidação de suas implicações e consequências mais importantes.

2. A FACE RENOVADA DA FÉ

Ponto de partida obrigatório da nossa reflexão é uma concepção adequada da fé como


base segura e estimulante na procura da identidade da catequese (cf. DGC n. 53-55). O que
está em jogo é importante, porque a cada concepção do dinamismo e crescimento da fé
corresponde um modo particular de entender a tarefa catequética.
Interessa-nos concretamente chamar a atenção para aqueles aspectos da teologia
renovada da fé que iluminam, de forma mais direta, a reflexão catequética. Cumpre lembrar
principalmente que, em comparação com um passado que muitas vezes reduziu a fé a alguns
de seus aspectos (ver, por exemplo, a fé como o ato de considerar como verdadeira uma
doutrina ou alguma verdade), a teologia contemporânea, seja católica ou protestante, encerra
uma concepção mais bíblica, e portanto mais global, mais personalísta e totalizante de atitude
de fé. O texto da Constituição Dei Verbum, que representa uma clara abertura de horizontes
em relação ao Vaticano I, continua sendo uma referência essencial: A Deus que revela
deve-se a obediência da fé (Rm 16,26; cf. Rm 1,5; 2Cor 10,5-6), com a qual a criatura
humana se entrega a Deus por inteiro, livremente, prestando-lhe o respeito do intelecto e da
vontade e consentindo voluntariamente na revelação feita por Ele (DV n. 5).
Lembremos agora, resumidamente, alguns aspectos característicos dessa concepção
renovada da fé.

2.1 A fé, resposta à palavra interpelante de Deus

A palavra de Deus não se limita a simples ensinamento, mas se apresenta como uma
provocação interpessoal, diante da qual o ser humano não pode ficar passivo nem quedar-se
em uma escuta descompromissada. Ouvindo esse apelo, cada um sente dever tomar posição e
comprometer assim o próprio destino, porque na vida das pessoas chamadas à fé, a palavra
de Deus irrompe como uma força envolvente, como um apelo que incomoda e as impede de
acomodar-se na indiferença. Nesse sentido deve-se falar da relevância existencial e dramática
da revelação de Deus na história.
Sob todos os aspectos a palavra de Deus é sempre uma palavra interpelante que exige
resposta: esta é revelação, isto é, luz que deve ser recebida; é promessa que exige entrega
confiante e perseverante; é convite pessoal, e portanto compromisso a assumir e deixar
penetrar a própria vida; é também plano divino de salvação, e por isso também julgamento
que salva ou condena, a depender de sua aceitação ou de sua recusa. Na verdade, o ser
humano é julgado por sua atitude em relação à palavra: se alguém se envergonhar de mim e
das minhas palavras, também o Filho do Homem se envergonhará dele, quando vier na glória
de seu Pai (Mc 8,38).

156
2.2 A fé, entrega confiante a Deus

Na Sagrada Escritura, a fé se apresenta como entrega religiosa de toda a pessoa e não


simplesmente adesão intelectual ou obediência moral, respondendo à natureza dinâmica, vital
e pessoal da palavra de Deus. A fé bíblica envolve a pessoa toda, com todas as suas
faculdades, convidando-a a responder a Deus que se revela e se doa, com um movimento
global de vontade, inteligência, afetividade, ação. O crente, no sentido bíblico, é aquele que
aceita submeter-se e entregar-se a Deus com a fé, que dá a Deus esse crédito total, que
admite ser ele Verdade, que nele se ap ia, e não apenas em si mesmo, e assim se torna
sólido e verdadeiro, com a solidez e verdade do próprio Deus.4 Essa adesão a Deus como
Verdade não é entendida em sentido intelectual:

Para um semita a verdade não é um objeto que se possa conhecer como uma coisa,
independentemente daquele que a professa; e quando se trata da Verdade, crer é apoiar-se na
Rocha misteriosa que é o Deus vivo e verdadeiro, é experimentar incessantemente a sua
estabilidade.5

A origem etimológica da palavra fé em hebraico, (da raiz ) indica que


crer significa sentir-se seguro , confiar em , apoiar (o próprio peso ou a própria
debilidade) em outro, apoiar-se em, e portanto, no plano espiritual, depositar a própria
confiança em .6 Crer em Deus significa, pois, reconhecer e deixar-se levar por sua emeth, por
sua inabalável fidelidade e solidez, e dizer amém (que significa: isto é sólido, firme, digno
de confiança) a Deus que é fiel às suas promessas e tem força para cumpri-las. No NT a fé
conserva sempre o seu caráter de adesão confiante e de entrega total, mas salienta também
aquilo em que se crê, isto é, o evento e a mensagem evangélica que há na vida, morte e
ressurreição de Cristo.7
A fé tem uma grande densidade existencial. Longe de limitar-se a um ato de aceitação
religiosa ou a um movimento de adesão voluntarista ou emotiva, ela constitui uma atitude de
fundo que dá sentido e orientação a toda a vida. Por isso a Bíblia considera a fé como síntese
e fonte de toda vida religiosa, enquanto resposta por excelência à totalidade do plano de
Deus. Abraão é pai dos crentes , os justos vivem de fé, daquela fé que Cristo leva à
perfeição (Hb 12,2) e os cristãos são chamados simplesmente aqueles que creram (At
2,44), aqueles que cr em (1Ts 1,7), os fiéis . Nesse sentido, a fé não pode dissociar-se da
esperança e do amor: ela encerra toda a riqueza da vida cristã entendida como resposta
acolhedora do homem ao plano de salvação revelado por Deus.

4
Y. Congar, La fede e la teologia. Roma, Desclée e C. 1967, p. 84-85.
5
X. Léon-Dufour, Credere in Dio , in: Grandi temi biblici. Alba, Paoline, 1960, p. 99.
6
Y. Congar, La fede e la teologia, 85.
7
M. Lubomirski, L´esistenza cristiana nella fede speranza e carità (Traccia delle lezioni). Roma, Ed. Pont. Univ.
Gregoriana, 1995, p. 49-50; F. Ardusso, Imparare a credere: la ragioni della fede cristiana. Cinisello Balsamo,
Milão, Paoline, 1992, p. 33-38.
157
2.3 A fé, dom e graça

A resposta da fé é dom de Deus (DGC n. 55), não apenas porque Deus sempre tem a
iniciativa de vir ao encontro das expectativas do homem, mas sobretudo porque o próprio ato
pelo qual o homem acolhe sua palavra se encontra na dependência dos movimentos do
Espírito e é, portanto, dom de graça:

Para que se possa ter essa fé, é necessária a graça de Deus que previne e socorre, e auxílio
interior do Espírito Santo, para que mova o coração e o encaminhe para Deus, abra os olhos
da mente e dê a todos a docilidade no consentir e crer na verdade (DV n. 5).

O primado da iniciativa divina no plano da salvação revela-se, pois, total, porque diz
respeito, também, à resposta humana à palavra. A fé seria impossível se Deus, no próprio
momento em que faz sua oferta, não estivesse presente no coração do homem,
transformando-o interiormente e predispondo-o a ouvir:

A Palavra tem como reflexo, no Antigo Testamento, um entender , que tem em sua origem
apenas Deus. Deus predispõe e atrai. O Senhor ou o Espírito Santo predispõe o coração,
abre-lhe os ouvidos. Em suma, à revelação objetiva corresponde, no sujeito chamado à fé, um
espírito de revelação .8

A fé cristã apresenta-se, assim, como um chamado, uma vocação.

8
Y. Congar, La fede e la teologia, p. 23-24.
158
2.4 Aspectos complementares do ato de fé

A reflexão teológica sobre a fé evidencia a existência de determinadas bipolaridades ou


complementaridades de aspectos que lhe caracterizam a estrutura:
Bipolaridade entre adesão global (conversão) e aprofundamento progressivo da vida
crente, entre fé de conversão e fé de conhecimento.9 Ela corresponde à tensão
existente no ministério da palavra entre o primeiro anúncio e o momento
posterior de explicação e aprofundamento.
Bipolaridade entre componente fiducial da fé (credere Deo, fides qua), e componente
conteudístico, objetivo (credere Deum, fides quae),10 entre fé existencial e fé
doutrinal:11

Se é verdade, pois, que ser cristão significa dizer sim a Jesus Cristo, cumpre lembrar que esse
sim tem dois níveis: ele consiste em entregar-se à palavra de Deus, apoiando-se nesta, mas
significa também, em segunda instância, esforçar-se para conhecer cada vez mais o sentido
profundo dessa Palavra (CT n. 20; cf. DGC n. 54).

São dois componentes essenciais, dos quais, porém, o aspecto mais importante e
absolutamente fundamental é a dimensão pessoal, fiduciária, o credere Deo. Só nessa
perspectiva tem significado a explicitação doutrinal e conteudística da atitude de fé, como o
diz São Tomás:

Como aquele que crê dá seu assentimento à fala de outro, parece que a coisa mais importante e
o objetivo de toda crença seja aquilo a que se dá o assentimento: em certo sentido, são
12
secundárias as coisas que uma pessoa aceita quando assente a outrem.

Bipolaridade entre a atitude radical da fé, como adesão ao projeto existencial


revelado em Cristo, e a expressão ou manifestação da fé em categorias culturalmente
condicionadas (formulações, crenças, ritos, tradições etc.).13 Daí deriva uma
espécie de tensão sempre aberta entre fé e linguagem, uma busca contínua de
autenticidade e de encarnação histórica, sempre no interior do próprio dinamismo de fé.

9
Cf. A. Liégé, Le ministère de la parole: du kérygme à la catéchèse . La parole de Dieu e Jésus-Christ. Tournai,
Casterman, 1964, p. 182-184.
10
Cf. Espanha CC n. 129; F. Ardusso, Fede . Diz.Cat., p. 276-77.
11
Cf. L. Malevez, Foi existentielle et foi doctrinale , Nouv. Rev. Théol. 100 (1968), p. 137-54.
12

13
Cf. C. Molari, Fede , in: J. B. Bauer - C. Molari (eds.), Dizionario Teologico. Assis, Cittadella, 1974, p. 262.

159
3. O DINAMISMO DA FÉ

No que se refere à catequese, que é iniciação à fé e educação da fé em crescimento


rumo à maturidade, interessa-nos não apenas precisar a identidade do ato de fé, mas também
entender-lhe o dinamismo de crescimento, compreender o que significa concretamente fazer
um caminho de fé, um itinerário de fé. Adotaremos uma tríplice abordagem: bíblico-
teológica, psicoantropológica e evolutiva.

3.1 Dinamismo da fé: indicações bíblico-teológicas

Segundo o NT o dinamismo da fé parte da conversão ao Evangelho e se prolonga em


um movimento de adesão e seguimento de Cristo, elevando-se a uma plenitude escatológica.
Em uma perspectiva teológico-pastoral podem-se distinguir as seguintes etapas: o interesse
pelo Evangelho (os simpatizantes ), a conversão como opção fundamental , a profissão de
fé (viva, explícita e operosa) e o caminho para a perfeição (DGC n. 56).
Ponto de partida de todo crescimento na fé é a conversão, momento crucial na vida
do crente, que supõe uma ruptura com o passado e a assunção de uma nova
mentalidade e estilo de vida. É uma situação radicalmente nova, um processo de
desestruturação que leva a uma reestruturação ou recomposição da vida em torno
de um novo centro vital, Cristo.14

14
Cf. J. P. Bagot, Conversione , Diz.Cat., p. 177-78. De sua parte, a psicologia da religião ressaltou o significado
da conversão para o desenvolvimento e estruturação da personalidade: cf. G. Milanesi - M. Aletti, Psicologia
della religione. Leumann (Turim), Elledici, 1973, p. 23-37.
160
A adesão a Jesus Cristo se desenvolve num processo de aprofundamento e de
aprendizado da vida cristã que leva à profissão de fé (DGC n. 56; 66) e,
através dos sacramentos de iniciação cristã, à incorporação a Cristo e à Igreja
como experiência do êxodo e da imersão no mistério pascal de Cristo (RM n. 5).
A vida de fé se desenvolve, então, em um dinamismo de crescimento e de
amadurecimento seja da pessoa, seja da comunidade:15
No que se refere ao indivíduo crente, o NT usa diversas expressões e imagens
para exprimir a realidade de uma fé que deve ser cultivada, intensificada,
amadurecida. A palavra de Deus é semente que deve crescer até produzir cem
por um (Mt 13,23); o dinamismo cristão é o desenvolvimento da vida
divina, crescimento até a estatura do Cristo, construção do templo espiritual; a
palavra deve dar fruto , deve ser conservada etc. Essas expressões abrangem
toda a densidade da vida cristã, mas vos colocam sempre no centro da fé. O
verdadeiro crescimento do Reino de Deus é algo interior que compreende também
a ordem do conhecimento: o cristão deve, na verdade, crescer na fé (2Cor 10,15;
Fl 1,25), no conhecimento de Deus (Cl 1,10) e de Jesus Cristo (2Pd 3,18).
No que se refere às comunidades cristãs, a Escritura exprime também com imagens
diversas o dinamismo das Igrejas locais, que crescem, se edificam, avançam etc.
Encontra-se também a advertência a algumas comunidades, porque se mostram ainda
imaturas na fé. Assim, Paulo escreve aos cristãos de Corinto que lhes deu leite a
beber, e não alimento sólido, porque ainda são carnais (1Cor 3,2-3). No
Apocalipse adverte-se a Igreja de Laodiceia porque perdeu o vigor de sua fé e não é
fria nem quente (cf. Ap 3,16). Por meio dessa linguagem testemunha-se a realidade
de um dinamismo pessoal e coletivo que deve levar a fé à sua maturidade.
O ponto de chegada desse crescimento é a plena maturidade e perfeição da fé, a meta
do homem perfeito que realiza a plenitude do Cristo (Ef 4,13). É uma meta
inatingível que remete à consumação escatológica e que impede de considerar
completado, no curso concreto da vida humana, o caminho da fé.

15
Cf. G. Groppo, Teologia dell´educazione: origine, identità, compiti. Roma, LAS, 1991, p. 406-11.
161
3.2 Dinamismo da fé: abordagem psicoantropológica

Do ponto de vista antropológico, é possível aprofundar a análise do dinamismo da fé


através de duas categorias significativas: o processo iniciático e conceito de atitude.

3.2.1 O dinamismo da fé como processo iniciático

O conceito de iniciação não tem origem no cristianismo. Ele foi utilizado algumas
vezes no período patrístico, mas só no século XX foi usado de forma sistemática no sentido
de iniciação cristã .16
Ainda que hoje seja freq ente falar-se de iniciação a propósito das diversas formas de
aprendizagem ou de socialização (por exemplo, iniciação à música, à informática etc.), em
seu sentido mais genuíno a iniciação (do latim in-ire: entrar em) indica um processo de
transição e de transformação; a etnologia e a antropologia cultural distinguem três formas
principais desse processo: as iniciações tribais (passagem da adolescência à condição adulta
no interior de um grupo étnico); as iniciações religiosas (entrada nas religiões com mistério,
ou em seitas ou sociedades secretas); e as iniciações mágicas (para entrar em posse de certos
poderes sobre-humanos).
Em seu conceito, a iniciação implica a ideia de uma passagem, de uma mudança de
estado que diz respeito à pessoa em seu modo de ser profundo, na sua identidade relacional e
na sua história. Tradicionalmente, os elementos constitutivos de toda iniciação são: uma
instrução ou ensinamento; uma apropriação pessoal e existencial da cultura do grupo, através
de experiências de interiorização de atitudes e de competências; e um conjunto de cerimônias
rituais. Todo processo iniciático, ainda que com diferenças notáveis segundo o contexto,
percorre normalmente estas três etapas: uma situação inicial de separação ou ruptura com o
passado; um momento intermediário de provas e de luta, em geral associados a relatos que
indicam seu significado e seu alcance; uma situação final de renovação, através da passagem
simbólica da morte à vida, e a aquisição de uma nova identidade e uma nova pertença.17

16
Cf. Luiz Alves de Lima, Catequese com adultos e iniciação cristã , in: CNBB-Grecat, Segunda emana
asileira de atequese. São Paulo, Paulus, 2002, p. 318-354 (Estudos da CNBB n. 84); J. Ruiz de Gopegui,
Iniciação cristã , Revista de Catequese 23 (2000), n. 91, p. 5-20; P. M. Gy, La notion chrétienne d´initiation:
jalons pour une enquête , La Maison- Dieu (1977), n. 132, p. 33-54.
17
Cf. G. Paleari, Os ritos de iniciação como parte de cultura humana , Revista de Catequese 23 (2000),
n. 91, p. 21-30; J. Claes, L´initiation , Lumen Vitae 49 (1994), n. 1, p. 11-20.
162
É fácil entender como o conceito de iniciação foi adotado no âmbito cristão ( iniciação
cristã ) para indicar o dinamismo da conversão e da incorporação à Igreja, vale dizer, para
designar todo o processo educativo e sacramental que leva os candidatos à plena
incorporação ao cristianismo e à Igreja. Na realidade, em seu sentido teológico mais
profundo, a iniciação cristã significa principalmente a ação interior e transformadora operada
por Deus através dos sacramentos do batismo, confirmação e eucaristia,18 e is o evidencia
a originalidade da iniciação cristã em comparação com os processos iniciáticos
tradicionais. Tornar-se cristão significa em primeiro lugar acolher um dom e deixar-se
transformar pela ação de Deus. Mas entendida em sentido lato, a iniciação cristã
compreende também todo o processo de apropriação pessoal da fé e do comportamento
cristão que leva à profissão de fé e à plena incorporação à Igreja.
Além disso, mesmo assumindo as características de todo processo iniciático, a
iniciação cristã conserva sempre sua irredutível originalidade, graças a alguns traços típicos
que a distinguem. Antes de tudo, ela recusa toda forma de transmissão automática ou mágica,
solicitando, em vez disso, da parte dos iniciados, a livre acolhida e apropriação das atitudes e
conhecimentos da fé. A iniciação cristã está nos antípodas da adesão a um grupo fechado ou
seita, porque, em vez disso, integra a pessoa a uma comunidade e a um povo de abertura
universal (catolicidade). Finalmente, o processo de iniciação cristã, longe de constituir uma
meta cumprida, faz entrar num caminho sempre aberto de crescimento e de amadurecimento,
pessoal ou comunitário.19
A iniciação cristã hoje, na nossa sociedade pluralista e secularizada, tornou-se um
problema pedagógico e pastoral de difícil solução. A situação religiosa atual não favorece
mais a opção de fé pela qual, muitas vezes, a iniciação se torna na realidade um processo
de conclusão que põe um ponto final numa série de ritos e tradições religiosas. Por outro
lado, de um ponto de vista educativo e pastoral, é muito importante conseguir estimular,
sobretudo para as novas gerações, autênticos processos de iniciação à fé e à vida cristã. Um
verdadeiro processo iniciático possui, na verdade, muitas virtudes educativas, principalmente
por sua articulação global, existencial, e por seu caráter de experiência vigorosa que lhe
garante o êxito em profundidade. E como forma de aprendizagem, mais que transmissão de
um saber, deve ser introdução a um mistério , lugar de amadurecimento pessoal através de
uma transformação e incorporação a uma comunidade.

18
Ver R. Falsini, Iniziazione ai sacramenti o sacramenti dell´iniziazione? , La Rivista Del Clero Italiano 73
(1992), n. 4, p. 266-82.
19
Cf. L. M. Chauvet, Les sacrements de l´initiation , Croissance de l´Église (1993), n. 108, p. 35-44.

163
Não é uma tarefa fácil, também pelo fato de que a sociedade contemporânea parece
refratária aos percursos de iniciação: recorre-se principalmente a processos de aprendizagem;
a formação é muito setorizada, fragmentada; a pertença aos grupos e instituições se tornou
parcial, funcional, pluralista; o homem moderno ama os pormenores, a provisoriedade, não
ama o compromisso a longo prazo; o sentido do tempo e da duração é mais pontual,
fragmentário; muitas vezes recorre-se à autoiniciação (do it yourself). Mas se constata, não
obstante, a persistência de alguns processos iniciáticos, principalmente sob formas não
institucionais (por exemplo, a direção espiritual, os retiros, o escotismo, a maçonaria). E tem-
se sobretudo a formidável máquina iniciática da sociedade midiática. Pode-se falar de uma
iniciática flutuante (initiatique flottant), sinal de uma necessidade oculta, sempre presente
no substrato cultural dos homens de hoje.20

3.2.2 O dinamismo da fé como interiorização de atitudes

O conceito de atitude (attitude, Haltung, actitud), bem conhecido no campo da


psicologia social,21 é utilizado também na psicologia da religião para nomear e descrever o
amadurecimento da religiosidade, em oposição ao nível de religiosidade espontânea22 e ao
estágio de simples crença, que se refere quase unicamente às fases cognitivas de uma
conduta. A atitude, ao contrário, envolve toda a pessoa:

A atitude é, pois, um sistema duradouro de valorização positiva ou negativa, de sentimentos e


emoções, e de tendências à ação, favorável ou contrária, em relação a uma determinada
situação de vida (Krech, Crutchfield e Ballachey). Estamos inclinados a aceitar esta última
definição como aquela que, aplicada ao conceito teológico de ato de fé , atende melhor, no
23
plano psicológico e sociológico, às exigências globais.

20
Cf. J. Claes, L´initiation.
21
Para uma visão de conjunto cf: G. D. Wilson, Atitude , in: W. Arnold (org.), Dicionário de Psicologia. São
Paulo, Loyola, 1983, vol. I, p. 135-39; Salvatore Priovatera, Atitude (Ética normativa II a IV) , in: Francisco
Compagnoni (org.) et al., Dicionário de Teologia Moral. São Paulo, Paulus, 1997, p. 481-84; Marciano Vidal,
Atitude , in: Dicionário de Teologia. São Paulo, Santuário, s/d, p. 41-43. C. Messana, Atteggiamento ,
Diz.Sc.Ed., p. 191-204; V. Volpe, Atteggiamento , in: F. Demarchi - A. Ellena (eds.), Dizionario de sociologia.
Roma, Paoline 1976, p. 138-143; L. Boncori, Atteggiamento , in: M. Laeng (ed.), Enciclopedia
pedagogica. Vol. I. Brescia, La Scuola, 1989, col. 1181-1185; E. Alberich, Atteggiamenti , Diz.Cat., p. 55-
56.
22
Cf. A. Vergote, Psicologia religiosa. Turim, Borla, 1967, p. 211.
23
G. Milanesi, Integrazione tra fede e cultura, problema centrale della pastorale catechetica , in: id.,
Ricerche di psico-sociologia religiosa. Zurique, PAS-Verlag, 1970, p. 62-63.
164
Assim, a atitude denota um modo de ser, uma conduta global que, ante uma realidade
ou situação de vida, mobiliza a esfera cognitivo-valorativa, a afetividade e as tendências
volitivo-operativas.24 Quando bem enraizadas gozam em geral de grande estabilidade e têm
uma posição-chave, central, no desenvolvimento da personalidade. Na verdade elas

têm uma função essencial em determinar nosso comportamento: condicionam os nossos


julgamentos e as nossas percepções, influenciam a nossa presteza e a eficiência de nossa
aprendizagem, ajudam-nos a escolher os grupos a que nos integrar, as profissões a abraçar e
nosso modo de viver.25

O conceito de atitude fornece, do ponto de vista pastoral-catequético, indicações


interpretativas e operativas úteis. A distinção dos três componentes essenciais cognitivo,
afetivo e comportamental tem muitas aplicações práticas. Mas também do ponto de vista
teológico podemos exprimir em termos de atitude a conversão26 e o dinamismo da vida cristã
como fé, esperança e caridade:

Chamando a fé, esperança e caridade atitudes fundamentais da existência cristã, usa-se uma
linguagem inteligível e plenamente significativa para o homem do nosso tempo. Dado o caráter
totalizante e a mútua imanência da fé, esperança e caridade, será possível falar de uma
atitude da existência cristã, que receberia o nome de fé, esperança ou amor, para que se dê a
essas palavras a plenitude de significado que têm na experiência cristã e na revelação bíblica.27

24
Cf. A. Vergote, Psicologia religiosa, p. 213.
25
V. Volpe, Atteggiamento , in: F. Demarchi - A. Ellena (orgs.), Dizionario di sociologia. Roma, Paoline, 1976,
p. 141.
26
Cf. J. Alfaro, Atteggiamenti fondamentali dell´esistenza cristiana , in: id., Cristologia e antropologia. Assis,
Cittadella, 1973, p. 550.
27
J. Alfaro, ibid., . 475.

165
À luz dessas considerações, é possível descrever o crescimento da fé como um
processo iniciático e permanente:
de , isto é, de transformação profunda (através de etapas de separação,
prova e renovação) e de assunção de uma atitude totalizante e central (que confere
uma nova identidade), feita de renúncia à lógica mundana e de opções
fundamentais por Cristo na Igreja;
de interiorização progressiva de , alimentadas pela esperança e pelo
amor, no desenvolvimento harmônico dos três componentes: cognitivo, afe

de caminho para a , em um dinamismo sempre aberto para o ideal


do adulto crente.

166
3.3 Dinamismo da fé: a perspectiva evolutiva

O amadurecimento do crente não acontece ordinariamente de modo uniforme e linear,


mas de formas diversas no curso da existência, segundo os diversos períodos ou etapas do
ciclo da vida. E, sem negar a influência dos fatores educacionais ou ambientais (por
exemplo, os sacramentos, as festas religiosas, as relações significativas), está provado que
existe uma certa relação entre fases da vida e desenvolvimento religioso.
Talvez seja útil lembrar, entre as diversas tentativas de descrição, a conhecida teoria de
James Fowler sobre o desenvolvimento da fé, como quadro descritivo do dinamismo
religioso das pessoas, elaborado com o objetivo de estimular as diferenciações no trabalho
educativo.28 Na realidade essa teoria não diz respeito à fé religiosa, em sentido estrito, mas a
um conceito amplo de fé, entendida como modo de provar e dar sentido à própria vida, de
experimentar-se e experimentar os outros e o mundo, através da representação de um Ser
Último. Mas é uma tentativa de modelo teórico para compreender o desenvolvimento das
capacidades com as quais elaboramos as relações com nós mesmos, com os outros e com
Deus, e assim oferece um quadro evolutivo ligado ao processo de crescimento religioso e
cristão.
Eis os períodos ou etapas do desenvolvimento religioso, segundo Fowler, apresentados
de forma muito esquemática e reelaborados de um ponto de vista mais explicitamente
educativo e catequético:29
Primeira etapa: fé intuitivo-projetiva (de 2 a 6/8 anos de idade, aproximadamente).
Na primeira infância se plasmam as disposições que marcarão, mais tarde, a relação
com Deus. Percebendo as coisas de forma intuitiva e emotiva, a criança projeta em
Deus o seu modo de apreender o mundo (antropomorfismo). Essa etapa é
particularmente adequada para formar as dimensões emotivas da atitude de fé.
Segunda etapa: fé mítico-literal (entre 6/8 e 11/13 anos de idade; mas também na idade
adulta). Entre os 6 e 8 anos de idade as crianças compreendem as coisas de modo
concreto, literal. Já são capazes de dar sentido às próprias experiências e compartilhá-
las com os outros, valendo-se de relatos, oriundos do próprio grupo ou comunidade.
Mas ainda são incapazes de sair do curso das próprias experiências e histórias para
refletir sobre elas e deduzir das mesmas um sentido mais global. Pensam em Deus
com a lógica do [eu dou para que tu dês], como Deus da punição e da
recompensa.

28
Cf. J. W. Fowler, Estágios da fé: a psicologia do desenvolvimento humano e a busca do sentido , Teologia
prática. São Leopoldo, Sinodal, 1981 (Série estudos pastorais n. 10). Limitamo-nos à apresentação de
Fowler, mas existem outras análises psicogenéticas dignas de consideração, como a de F. Oser - P. Gmünder, Der
Mensch, Stufen seiner religiösen Entwicklung. Ein strukturgenetischer Ansatz. 4ª ed. Gütersloh, Gütersloher
Verlagshaus, 1996. Cf. sobre isso: A. Bucher, Fasi dello sviluppo religioso secondo James W. Fowler e Fritz
Oser. Panorama comparativo e critico , Orientamenti Pedagogici 36 (1989), n. 6, 1.090-121; id.,
Entwicklung zur religiösen Mündigkeit , Lebendige Katechese 21 (1999), n. 1, p. 7-14.
29
Cf. E. Alberich - A. Binz, Catequese de adultos: elementos de metodologia. 2ª ed. São Paulo, Salesiana,
2001, p. 97-101; P.-A. Giguère, Une foi d´adulte. Ottawa, Novalis-Université Saint Paul, 1991, p. 71-93.
167
Terceira etapa: fé sintético-convencional ou fé de pertença comunitária (dos 11/13
até o início da idade adulta, ou mais além). Na pré-adolescência a criança adquire a
capacidade de pensamento abstrato e conceitual, e portanto a possibilidade de
distanciar-se e ir além das palavras e das coisas com uma nova consciência de si
mesma. Isto lhe permite reconstruir experiências anteriores e projetar-se para o futuro.
Tarefa importante nessa idade é definir a própria identidade fazendo a síntese dos
conteúdos de fé e das relações que mantém com os outros. A forte necessidade
manter a relação com os outros e de corresponder às suas expectativas pode,
por vezes, se tornar uma submissão aos outros (superconformismo). Para as
pessoas nesse estágio Deus é alguém que nos conhece melhor que nós mesmos, o
amigo, o companheiro.
Quarta etapa: fé individual-reflexiva ou em referência a si mesmo (até o início da idade
adulta). No limiar da idade adulta (ou mais além) o equilíbrio do estágio anterior pode
modificar-se graças a duas condições evolutivas: a) os conteúdos da fé, os valores e os
compromissos (que eram aceitos sem discussão) agora são submetidos a exame crítico;
b) cada um acha que deve procurar o próprio fundamento para além dos
relacionamentos. Sente-se a necessidade de comprometer-se responsavelmente com a
própria opção de vida, quando antes se dependia da opinião das pessoas de suas
relações. Reexaminam-se os conteúdos religiosos (crenças, símbolos, relatos) para
traduzi-los em fórmulas conceituais. A fé perde qualidade emotiva, mas ganha em
clareza (sistematização, precisão) e em coerência. Às vezes pode haver um conflito
com a própria comunidade a que se pertence. Corre-se o risco de acreditar poder
controlar totalmente o sentido da própria vida.
Quinta etapa: fé unificante ou da reapropriação (depois dos 40 anos; alguns não
chegam a atingi-la). A mudança acontece quando se toma consciência de que não se
tem domínio de tudo, de que a confiança em si mesmo pode estar fundada em ilusões,
e de que somos também condicionados por fatores desconhecidos, não conscientes.
Agora se quer unificar aquilo que parece oposto nos diversos campos da vida, enquanto
a procura das relações se amplia para além das pertenças de classe, nação, religião.
Reconhece-se que a verdade não pode limitar-se a um único ponto de vista e aceita-se
a dimensão dialética da experiência com os seus paradoxos: Deus é ao mesmo tempo
transcendente e imanente, onipotente e voluntariamente limitado. A fé se torna mais
humilde, porque se sabe que, quando falamos do divino, podemos apenas balbuciar.
Em vez de querer explicar os símbolos e as crenças religiosas, aprende-se a
acolher e a penetrar em seu universo de sentido.

168
Sexta etapa: a fé universalizante (poucos a alcançam). As pessoas que superam o
estágio anterior vivem um dinamismo no qual o eu vai além de si mesmo, concebendo
seu Deus de forma qualitativamente nova. Nessa etapa, a pessoa vive uma união
profunda com Deus, que renova os próprios fundamentos da identidade, do
conhecimento e dos valores. Daí resulta um desejo ativo de transformar as situações
humanas atuais em uma perspectiva de advento do Reino e de comunhão com Deus,
doando-se integralmente e opondo-se, de forma não violenta, ao mal. Essas pessoas
excepcionais (pense-se, por exemplo, na Madre Teresa ou em Martin Luther King)
parecem descentradas , imersas numa espécie de kenosis que as faz viver como se o
Reino já se tivesse realizado. São pessoas, como os santos, que fazem entrever o que
poderia ser o futuro em Deus, e que, apenas com sua vida, já constituem, para todos,
uma interpelação e um estímulo.
A pedagogia religiosa vê na descrição dessas etapas evolutivas um conjunto de
estímulos e sugestões para uma obra educativa eficaz a serviço do despertar e do crescimento
da fé.

3.4 A meta da maturidade religiosa

O dinamismo da fé aponta para a meta nunca plenamente alcançada da


maturidade e da (relativa) autonomia religiosa. Tentar uma descrição dessa meta, apontando-
lhe os traços mais significativos, é obra extremamente útil em termos catequéticos, porque
ilumina o horizonte operativo para o qual todo projeto concreto deve orientar-se. A tarefa se
revela absolutamente necessária pelo fato de que observamos, com tristeza, um certo medo
da maturidade no panorama eclesial atual: nos pastores, porque muitas vezes preferem a
situação infantilizante dos fiéis dóceis e obedientes;30 nos próprios crentes, porque acham
mais fácil acomodar-se a uma religiosidade infantil que poupa o esforço do crescimento.
Também nesse caso revela-se muito eficaz o diálogo entre teologia e ciências humanas.
Na verdade, para entender os conceitos de maturidade e de autonomia da fé, os dados
bíblicos e teológicos se enriquecem com os aportes da psicologia da personalidade, da
psicologia da religião e das ciências pedagógicas em geral.31
Tomando como referência o conceito de atitude e sua estrutura, podemos resumir deste
modo os traços característicos da maturidade da fé:

30
É percuciente a observação feita, por J. Colomb, Al servizio della fede: manuale di catechetica. Vol. 2,
Leumann (Turim), Elledici, 1970, p. 405. Cf. A. Bucher, Entwicklung zur religiöser Mündigkeit.
31
Cf. G. Groppo, Teologia dell´educazione, p. 406-25.
169
3.4.1 Maturidade da fé como atitude global

A fé madura constitui uma característica central da personalidade (em contraposição à


religiosidade ou fé marginal) e torna-se assim fonte de sabedoria e de sentido.
A atitude de fé madura goza de estabilidade e se integra na personalidade como um
todo, como ponto central de referência para as escolhas que se fazem na vida. É fruto de um
processo de integração em que a fé coordena e harmoniza todos os valores e motivações da
personalidade:

Há integração quando a atitude de fé [...] se torna a atitude fundamental, a mentalidade de vida,


o traço fundamental que organiza a personalidade de um indivíduo, na medida em que passa
a ser o esquema fundamental de interpretação das situações existenciais.32

A fé madura ocupa o centro operativo da pessoa (a cabine dos botões a sala de


controle ) ao contrário do que acontece com a religiosidade marginal, dissociada, limitada a
algum aspecto de conduta ou de emotividade, sem influência sobre o comportamento global
e sobre as opções éticas.33 Quando, porém, a atitude religiosa se coloca no centro, a fé se
torna sapiência , isto é, capacidade habitual de julgar, discernir e atuar segundo a lógica
evangélica.34

32
G. Milanesi, Integrazione tra fede e cultura, p. 70.
33
Cf. B. Grom, Religionspädagogische Psychologie des Kleinkind-, Schul- und Jugendalters. Düsseldorf-
Göttingen, Patmos-Vendenhoeck & Ruprecht, 1981, p. 17-20; F. Garelli, La religione dello scenario: la
persistenza della religione tra i lavoratori. Bolonha, Il Mulino, 1986.
34
Cf. R. Paganelli, Formare alla fede adulta. Bolonha, Dehoniane, 1996, p. 81.
170
A fé madura desenvolve harmonicamente as três dimensões da atitude: cognitiva,
afetiva e comportamental (em contraposição ao desenvolvimento unilateral ou parcial).
Não existe amadurecimento se as dimensões constitutivas da atitude não se
desenvolvem juntas. Assim, por exemplo, um saber religioso desligado dos momentos
afetivos e operativos se limita ao conhecimento teórico sem conexão com a vida. Da mesma
forma, os sentimentos e afetos religiosos (entusiasmo, generosidade, alegria etc.) só são
válidos quando sujeitos a uma consciência iluminada e orientada para formas coerentes de
conduta. E o mesmo vale para a esfera do comportamento: uma conduta exteriormente
exemplar, mas não sustentada pelas motivações adequadas, pode-se revelar conformista,
evasiva. Só no crescimento harmônico das três dimensões a atitude de fé se torna fonte de
sentido para a vida e fator de unidade interior.35

3.4.2 Maturidade da fé na dimensão cognitiva

A fé madura desenvolve a dimensão cognitiva, e portanto valorativa e motivacional, da


atitude (em oposição à religiosidade fideísta ou irracional). Em termos concretos, entenda-se:
Uma fé informada, aprofundada e portanto não apenas emotiva, infantil ou irracional.
Não demonstra maturidade quem se declara incapaz de prestar contas da fé que
professa, ou lhe ignora os fundamentos, as implicações, as tradições etc., ou se baseia
apenas em lugares-comuns e preconceitos. Parece-nos que hoje não é mais possível
refugiar-se na fé do carvoeiro ou delegar a outros a tarefa de prestar contas daquilo
que se vive e daquilo em que se crê.
Uma fé diferenciada, capaz de discernimento, não monolítica nem integrista. É a
qualidade que permite distinguir o essencial do secundário, o imutável do
contingente, o certo do discutível. É o sentido interiorizado da hierarquia das
verdades (DGC 114-115), unida ao senso do discernimento, que permite uma
experiência articulada do universo religioso, com a possibilidade de revisões e
adaptações, sem o risco de crises ou dilacerações. Em posição oposta encontra-se a
rigidez do monolitismo religioso que, talvez sob a aparência de fidelidade, na verdade
esconde a imaturidade do imobilismo, da intolerância e do fundamentalismo.
Uma fé crítica e autocrítica, não ingênua, acrítica ou passiva. O espírito crítico,
entendido de forma correta, é próprio da maturidade da atitude de fé. Essa crítica deve
ser entendida como construtiva e equilibrada, baseada em documentos e argumentos
sérios. A fé é, sim, entrega confiante a Deus que se revela, mas isso não significa dever
aceitar com o mesmo abandono as manifestações concretas da experiência religiosa em
seu encarnar-se na história da humanidade. É por isso que também a catequese elege
como uma de suas metas o aguçamento equilibrado do senso crítico.36

35
Cf. P.-A. Giguère, Une foi d´adulte. Ottawa, Novalis-Université Saint-Paul, 1991, p. 110-11.
36
Cf. Alemanha KWK A 3.5. A propósito do correto exercício da crítica e de sua aceitação da parte da Igreja, cf. J.
I. Gonzalez Faus, La liberdad de palabra en la Iglesia y en la teologia. Santander, Sal Terrae, 1985, p. 117-29.
171
3.4.3 Maturidade da fé na dimensão afetiva
A fé madura desenvolve de forma integrada a dimensão afetivo-emotiva da atitude (em
oposição à religiosidade adolescente, infantil ou integrista). Eis alguns de seus traços típicos:
A fé madura goza de autonomia motivacional, e por isso não tem um papel penas
funcional ou compensatório. Ou seja, ela

A atitude de fé não pode ser considerada madura se não tiver em sua base uma certa
maturidade psicológica, afetiva, com tudo o que ela implica em termos de liberdade interior e
superação do egocentrismo.38 Só uma personalidade equilibrada, capaz da livre doação de si
e liberta de ansiedades e frustrações pode responder de modo pleno e maduro ao chamado
existencial da fé. Só com base nesse equilíbrio interior é possível uma fé verdadeiramente
pessoal e livre.39
A falta de autonomia motivacional muitas vezes se traduz numa religiosidade
funcional, compensatória, fácil refúgio de pessoas inseguras ou frustradas, que procuram na
vida religiosa uma resposta aos seus problemas não resolvidos.40 A propósito, não faltam
espiritualidades que satisfazem à ânsia de segurança psicológica, mas à custa de infantilizar
psicologicamente, de criar dependências infantilizantes, de distanciar-se da liberdade do
Evangelho, de bloquear o desenvolvimento humano e cristão .41

37
G. Milanesi - M. Aletti, Psicologia della religione. Leumann (Turim), Elledici, 1973, p. 304. Cf. B. Grom, op.
cit. p. 21-22; A. Godin, Psicologia delle esperienze religiose. Brescia, Queriniana, 1983, p. 13-59.
38
Cf. a apresentação da personalidade madura: G. W. Allport, Pedagogia della personalità. Zurique, PAS-Verlag
1969, p. 235-62, e M. Oraison, Moral para os nossos tempos. Lisboa, Duas Cidades, 1965. Traduzido em
português com o título: Instrução dos catecúmenos: teoria e prática da catequese , in: Fontes da Catequese 7.
a
3 ed. Petrópolis, Vozes, 1984.
39
Cf. A. Giguère, Une foi adulte, p. 104-10.
40
Cf. A. Vergote, Psicologia religiosa, p. 211-58.
41
F. Urbina, in T. Ruiz - J. Lopez, VIII Jornadas Nacionales de Catequesis de Adultos , Actualidad
Catequética (1984) n. 116, p. 81.
172
A fé madura é criativa, aberta à novidade. Não é imóvel ou conformista. Longe de
permanecer bloqueada ou temerosa diante dos novos desafios, ela é fonte contínua de
motivações, novas interpretações, iniciativas. Não teme a mudança, mas a considera lei
normal de crescimento vital e condição de autenticidade. Quem aceita aderir
profundamente ao Deus vivo que se revelou em Cristo se põe sob a égide do Espírito,
que é fonte perene de vida e de novidade.
A fé madura é constante, capaz de compromisso a longo prazo; ela não é nem
caprichosa nem instintiva. Essa característica, complementar à da criatividade, deriva
da própria natureza da fé, que é também um projeto de vida comprometido, isto é,
voltado para bens de longo alcance, e não para a fruição imediata .42 O cansaço fácil, a
provisoriedade, a tendência a ceder às exigências das modas ou aos impulsos imediatos
estão em contradição com a solidez de uma atitude de fé-esperança interiorizada e
madura.
A fé madura é comunicativa, contagiante, aberta ao diálogo e à confrontação,
não autossuficiente ou intolerante. As pessoas maduras do ponto de vista religioso
gostam de testemunhar a própria fé, mas sem constrangimentos, e são abertas à
confrontação com posições culturais e ideológicas diversas das suas; aliás elas
sentem necessidade dessa confrontação como fonte contínua de purificação e
enriquecimento. Longe de se sentir ameaçada em sua própria identidade, a fé
madura é expansiva e capaz de diálogo, seja com os não crentes, seja no
interior das confissões cristãs (diálogo ecumênico), seja ainda no próprio seio da
comunidade religiosa (respeito ao pluralismo). Quando, ao contrário, a aceitação
do diferente, dentro ou fora das instituições, é restrita ou rejeitada, tende-se
facilmente a cair na intolerância e no preconceito, e a fé degenera em ideologia.

42
A. Ronco, Psicologia della religione: una disciplina in costruzione , in: Ecclesia. Roma, LAS, 1977, p. 464.

173
3.4.4 Maturidade da fé na dimensão comportamental

A fé madura desenvolve de forma coerente a dimensão comportamental-operativa da


atitude (em oposição à religiosidade inoperante ou incoerente):
A fé madura é dinâmica e ativa, não passiva ou estéril. Ela se torna uma fonte
inesgotável de motivações que impelem à ação ou reforçam a ação já empreendida. Em
contrapartida, é sinal de imaturidade a esterilidade operativa de muitos crentes, cuja
religiosidade se alimenta de devoções e de práticas religiosas, mas à margem da vida
ativa, profissional, social e política. A atitude religiosa que não se traduz em uma
convincente práxis de fé e que não é vivida como uma tarefa aberta fica muito longe
da meta da maturidade.
A fé madura é consequente, coerente, em sua vertente operativa, não incoerente ou
inconsequente. O caráter conseq ente, que marca todo sentimento maduro,43 supõe
uma relação de profunda coerência entre fé professada e fé vivida, entre o projeto
evangélico e a própria conduta. A isso opõem-se diversas formas de esquizofrenia
ou dissociação entre pensamento e ação, a incoerência de condutas massificadas ou
institucionalizadas, a falta de unidade e de alegria interior.

3.5 Ser adulto na fé hoje: em busca de um novo modelo de crente

As considerações anteriores não bastam para distinguir com clareza a meta da


maturidade religiosa para a qual deve orientar-se a atividade catequética. Em nossa sociedade
atual, procura-se um novo modelo de crente, uma nova espiritualidade cristã,44 porque está
em forte crise e é pouco convincente a imagem tradicional do bom cristão ou fiel
praticante , isto é, a imagem do cristão que observa as práticas e as normas religiosas
plasmada pela idade moderna. Atualmente, as condições cambiantes da sociedade e a
derrocada da homogeneidade religiosa obrigam a rever esse modelo tradicional, sem lhe
negar os valores, e a formular de modo diferente a meta da ação pastoral da Igreja.

43
Cf. G. Milanesi - M. Aletti, op. cit., p. 235.
44
Cf. J. Martin Velasco, El malestar religioso de nuestra cultura. Madri, Paulinas, 1993, p. 273-74.
174
Não obstante os riscos dessa ação, oferecemos um esboço de identikit do cristão do
futuro, do modelo de crente que imaginamos no horizonte ideal da tarefa da catequese. É um
quadro que salienta intencionalmente os aspectos de novidade, em relação ao passado, desse
novo modelo de crente adulto que a sociedade atual e a Igreja exigem.
3.5.1 Uma identidade religiosa personalizada e livre

Esse crente hipotético não poderá sê-lo por tradição ou por pertença sociológica, mas
por opção pessoal, redescobrindo assim sua própria identidade e a alegria de ser cristão. Essa
personalização da fé implica a experiência de uma conversão renovada e a interiorização de
atitudes livres de fé, rumo à maturidade. Em um mundo marcado pelo pluralismo e pelo
desejo de autodeterminação, só uma comunidade de crentes livres e convictos oferece
garantias de solidez e de credibilidade.

3.5.2 Fé encarnada na cultura

Muitos crentes sentem a necessidade de uma religiosidade difícil de ser vivida no


mundo atual, e têm a sensação de pertencer a dois mundos quase inconciliáveis entre si: o da
fé cristã, da forma como foi herdada e transmitida, e o da cultura atual, constituído pelo
conjunto das aspirações, valores e modos de pensar próprios de nossa época. Daí resulta
um dilaceramento interior, cuja razão nem sempre se percebe, também entre aqueles que
aceitam o Evangelho como critério de discernimento. É o drama da separação entre valores
culturais e exigências evangélicas, entre fé e cultura, o drama da nossa época (EN n. 20).
Trata-se, portanto, de inculturar a fé, ativando o diálogo entre fé e cultura e abrindo-se
aos valores da modernidade e da pós-modernidade, aplicando com discernimento a dupla lei
da continuidade com as autênticas aspirações e valores da cultura moderna, e da ruptura ou
denúncia de tudo o que ameaça a dignidade do ser humano ou os valores do Reino. Esse
diálogo não exclui o uso equilibrado da racionalidade crítica e deve levar a uma revisão
corajosa das representações religiosas tradicionais. 45

45
Cf. A. Fossion, Dieu toujours recomencé: essai sur la catéchèse contemporaine. Bruxelas, Lumen
Vitae/Novalis/Cerf/Labor et Fides, 1997, cap. 8 ( Le travail des représentations ).
175
3.5.3 mas de forma adulta

O novo modelo de crente deve ter certamente o sensus ecclesiae: sentido de pertença e
de identificação com a comunidade eclesial, mistério e instituição, mas de forma madura,
adulta , isto é, sem os traços infantilizantes e acríticos que tantas vezes caracterizaram a
atitude dos cristãos para com a instituição. A dimensão adulta do sentido da Igreja implica a
vontade de pertença e de participação responsável, consciente, com sentido de relativa
autonomia e espírito crítico construtivo.
3.5.4 Espírito comunitário

Temos em mente um crente não individualista, mas solidário e com espírito


comunitário. Diante de tantas formas de individualismo, existem cristãos mais solidários,
com mais espírito comunitário, mais capazes e necessitados de viver a própria fé com os
outros , em um movimento enriquecedor de compartilhamento e de solidariedade. É o
modelo de um cristão menos isolado e autossuficiente, mais tendente à corresponsabilidade e
ao espírito de grupo. O crente, assim considerado, se sentirá de certa forma mais dependente
dos outros, mais ligado à comunidade de fé a que pertence. Mas esse laço, longe de constituir
um sinal de debilidade, será vivido antes como um sinal de enriquecimento e de maturidade.

3.5.5 Compromisso com o mundo e forte consciência ética

Temos em mente um crente que não seja falsamente espiritualista , mas encarnado e
comprometido, com grande vigor moral. É aquele que demonstra ser cristão não tanto pelas
práticas religiosas, mas no coração do mundo: na família e no trabalho, na política e no
tempo livre, no compromisso pela transformação da sociedade. Sua fisionomia espiritual é
caracterizada pela abertura cultural e pelo espírito de colaboração, sensibilidade ética e
consciência dos valores, compromisso social e político, solidariedade para com os pobres e
com os marginalizados.

176
3.5.6 Abertura e diálogo intercultural e inter-religioso

Mergulhada num mundo pluralista, a fé deve ser vivida hoje em contato com diversas
religiões, culturas e visões do mundo. Essa situação não representa necessariamente uma
ameaça, e pode ser um fator positivo, se vivida com espírito de confrontação leal e sincero.
Nosso crente, assim considerado, deverá ser capaz de diálogo, aberto à aceitação do outro e à
pluralidade. E isso o levará a fortalecer a própria identidade religiosa, não em conflito com
os outros, mas num clima de colaboração e enriquecimento recíproco.

Aqui temos uma série de elementos que nos ajudam a compreender melhor o que significa
crescer na fé e em que consiste hoje a meta da fé adulta ou fé madura. São indicações úteis
para podermos iniciar a reflexão sobre a catequese como mediação eclesial a serviço desse
crescimento e desse amadurecimento.

4. CATEQUESE, INICIAÇÃO À FÉ E EDUCAÇÃO DA FÉ: IDENTIDADE E


TAREFAS

A catequese se define como mediação eclesial a serviço do dinamismo da fé que


acabamos de descrever. Devemos agora refletir sobre sua identidade e as suas tarefas
enquanto iniciação e educação.

4.1 Mas é possível educar a fé?

Quando se respeita a natureza teológica do ato de fé, só se pode falar de educação em


sentido secundário e instrumental, isto é, no âmbito das mediações humanas que podem
facilitar, ajudar, remover obstáculos etc., no processo de despertar e de crescimento da
atitude de fé. Porém, sempre deve evitar qualquer intervenção direta sobre a própria fé, que
depende sempre da ação gratuita de Deus e da livre resposta do ser humano. Portanto, a
catequese deve ser consciente dos próprios limites, enquanto mediação educativa puramente
instrumental e dispositiva, a serviço do encontro inefável dos seres humanos com a proposta
interpelante de Deus.46

46
Provavelmente por isso, em vez de se dizer educação da fé , prefere-se às vezes falar de educação para a fé
ou de educação na f : cf. Office de Catéchèse du Québec, Les nouveaux défis de l´éducation de la foi des adultes
au Québec. Montreal, Fides, 1988, p. 84.

177
4.1.1 A catequese, verdadeira educação

Isso não quer dizer, porém, que a ação de Deus e a obra catequética sigam caminhos
tão diversos que tornam vão todo esforço humano para o crescimento efetivo da fé. O
catequista pode ficar certo do seguinte: se sua ação educativa se desenvolve dentro das
devidas regras, também ela é graça para o desenvolvimento da fé. Em verdade sabemos que a
graça de Deus se encarna nas mediações eclesiais da salvação, sendo a própria Igreja a graça
salvadora de Deus na sua visibilidade histórica.
No sentido indicado, e dentro de seus limites, postula-se a natureza genuinamente
educativa da ação catequética, em sentido integral, uma vez que o crescimento da fé envolve
também o dinamismo do amadurecimento humano. O princípio válido para a obra
evangelizadora: Evangelizar educando e educar evangelizando (DGC n. 147) aplica-se
também à catequese, enquanto caminho educativo (ibid.). Assim, ela deve se tornar
estímulo, ajuda, intervenção intencional em vista de um crescimento pessoal, interiorizado e
livre, a serviço de um projeto existencial válido, aberto aos valores e capaz de discernimento
crítico. A pedagogia da fé nunca poderá ignorar a exigência da Palavra de Deus e da resposta
de fé, inspirando-se, por isso, na pedagogia de Deus (cf. DGC n. 139-147), mas isso não
fere de modo algum a natureza perfeitamente pedagógica da tarefa catequética.
Por isso, a catequese se configura como iniciação e educação da fé na sua totalidade
existencial e na riqueza de suas dimensões. E uma vez que a maturidade cristã pressupõe o
desenvolvimento de uma sadia maturidade humana, a catequese não deve ficar no nível
abstratamente religioso da personalidade nem limitar-se a algum aspecto particular do
desenvolvimento religioso, como o conhecimento da verdade revelada ou a aquisição de
comportamentos morais. A tarefa catequética envolve a riqueza de atitude de fé como
resposta pessoal e total ao projeto de vida cristã, que é adesão e seguimento de Cristo. O
DGC é bastante explícito em reafirmar a natureza da catequese como formação cristã
integral (n. 84) que atinge a pessoa como um todo:

Essa formação orgânica é mais que um ensino: é um aprofundamento de toda a vida cristã, uma
iniciação cristã integral [...] Trata-se, na verdade, de educar para a consciência e para a vida de fé,
de tal maneira que todo o homem, em suas experiências profundas, se sinta fecundado pela
Palavra de Deus (DGC n. 67).

178
4.1.2 Por uma genuína ação educativa

A catequese também é considerada obra de socialização religiosa. Mas esse seu


atributo implica o risco de uma deturpação de sua natureza educativa. Considerada em si
mesma, a socialização tem indiscutíveis virtudes educativas e aliás constitui um fundamento
necessário a toda obra de educação.47 Enquanto transmissão e aprendizagem de valores e
normas culturais, a socialização é premissa necessária para um crescimento na liberdade e
permite processos de identificação que são essenciais aos sujeitos em formação. Mas, por
outro lado, os processos de socialização podem também desenvolver funções e papéis que se
refletem negativamente na ação educativa.
Sabe-se que a socialização, enquanto processo de transmissão cultural funcional à
sociedade, desenvolve muitas vezes uma função de conservação e de adaptação visando à
reprodução do consenso e à consolidação do . Nesse sentido ela tende a criar
sujeitos dóceis, integrados, feitos à sua própria imagem e semelhança .48 E não apenas isso:
muitas vezes a socialização se torna um poderoso sistema de controle, de manipulação e de
doutrinação ideológica, através de diversos agentes de socialização como a escola, os meios
de comunicação de massa e as diversas formas de indústria cultural .49
É necessário, pois, fazer a distinção entre socialização e educação, e defender a obra
educativa de possíveis efeitos despersonalizantes. Já está mais que claro o caráter libertador e
a centralidade da pessoa em todo trabalho pedagógico autêntico. Na verdade, este não tem,
em princípio, objetivo de conservação social, mas está a serviço das pessoas, para seu
crescimento e promoção integral, no respeito da própria vocação e originalidade, tendo em
vista personalidades livres e responsáveis. A verdadeira educação tem em sua base a
proposta de valores e a participação convicta dos sujeitos. Orientada nesse sentido, ela tem
também, necessariamente, uma função social, não no sentido de simples integração passiva,
mas dentro de um espírito crítico e de transformação. Sob certo ponto de vista, educar quer
dizer oferecer estímulos e critérios para que se possa reagir criticamente aos processos de
socialização.

47
Para um esclarecimento do termo: cf. G. Milanesi - J. Bajzek, Sociologia della religione. Leumann (Turim),
Elledici, 1990, p. 41-42; G. Milanesi, Socializzazione religiosa , Diz.Cat., p. 588-92; C. Nanni,
Socializzacione, inculturazione e educazione , Orientamenti Pedagogici 25 (1978), p. 651-65.
48
Assim se expressou o Sínodo dos Bispos de 1971 a propósito do papel socializante da escola, que tende muitas
vezes a formar o homem como a própria ordem o deseja, feito à sua imagem, não um homem novo, mas sim a
reprodução do homem tal como é : Sínodo dos Bispos, La giustizia nel mondo. Typis Polyglottis Vaticanis, 1971,
p. 19.
49
Cf. C. Nanni, art. cit. p. 656-63.

179
Tudo isso tem consequências importantes para a catequese, enquanto fator importante
de socialização, no interior da comunidade religiosa e também da sociedade civil. Há sempre
o perigo de que a função socializante fira ou comprometa a autenticidade do crescimento na
fé. Na verdade, sabe-se que o fato religioso pode ser facilmente utilizado com o objetivo de
justificação ideológica e de controle social. No âmbito da sociologia da religião, conhece-se
a possível função integradora e conservadora da religião em relação ao sistema social. 50 O
uso ideológico da catequese se torna tanto mais compreensível quando se pensa no interesse
que todos os grupos e estruturas de poder têm em ganhar legitimação religiosa, uma vez que
esta oferece maiores garantias de estabilidade e transcendência.
Não faltam na história exemplos de uso ideológico da fé, tanto na Igreja como na
sociedade civil. Em si mesmo, o Evangelho, mensagem libertadora e salvífica, encerra uma
missão profética, de crítica e de denúncia, em franca oposição a toda forma de ideologia.
Mas também o cristianismo, em suas encarnações históricas, tornou-se sujeito e objeto (às
vezes de forma inconsciente) de operações ideológicas (por exemplo: a apologia a certos
regimes políticos, a defesa da ordem constituída, a legitimação da subordinação da mulher, a
sacralização de determinadas formas de autoridade e de obediência). E também a catequese,
como o mostra a sua história,51 por vezes foi utilizada com vistas à integração e legitimação
ideológica.
Assim, educar na fé significa promover personalidades crentes, livres e maduras,
integradas na comunidade, mas em atitude de corresponsabilidade e de participação crítica.
Só assim a catequese se torna um fator de consolidação e de integração na comunidade e na
Igreja.52

50
Cf. G. Milanesi - J. Bajzek, op. cit., cap. IV ( La religione come fattore di integrazione sociale ).
51
Basta lembrar, em muitos catecismos do passado, as páginas dedicadas aos deveres cristãos para com o príncipe
ou o imperador, ou, em época ainda recente, o tratamento dado às confissões e correntes culturais não católicas.
Cf. P. Braido, Lineamenti di storia della catechesi e dei catechismi. Dal tempo delle riforme all´età degli
imperialismi (1450-1850). Leumann (Turim), Elledici, 1991, p. 334-339 ( Il controllo politico dei
catechismi ; Il catechismo imperiale del 1806 ); O. Klineberg et al., Religione e pregiudizio. Roma,
Cappelli, 1968; H. Halbfas, Linguaggio ed esperienza nell´insegnamento della religione. Roma-Brescia, Herder-
Morcelliana, 1970, p. 217.
52
Existe o risco de pensar a obra catequética numa linha restauradora ou de integração passiva, causando
decepção aos interessados, especialmente adultos, e em prejuízo da renovação eclesial: Cf. D. Piveteau,
L´Église, les adultes et la formation permanente , Catéchèse 15 (1975), n. 59, p. 161-76; E. Alberich, Catechesi
adulta in una chiesa adulta: i nodi ecclesiologici della catechesi degli adulti , Orientamenti Pedagogici 38 (1991),
n. 6, p. 1.367-84.
180
4.2 Objetivos e tarefas da catequese

Seguindo a descrição que acabamos de fazer do dinamismo de crescimento na fé, agora


podemos precisar as finalidades e os objetivos da ação catequética enquanto mediação
eclesial para a educação da fé. Temos diante de nós o esquema exposto anteriormente, que
parte do momento da conversão e chega até a maturidade, passando pela interioziação de
atitudes. A tarefa da catequese pode ser assim explicitada:

4.2.1 É tarefa da catequese favorecer e despertar a conversão

Ao anunciar ao mundo a Boa Nova da Revelação, a evangelização convida homens e mulheres


à conversão e à fé (DGC n. 53).

A fé é um dom destinado a crescer no coração dos crentes. A adesão a Jesus Cristo, na verdade,
inicia um processo de conversão permanente, que dura toda a vida (DGC n. 56).

A conversão, momento fundamental e unificador do dinamismo da fé, exige em


primeiro lugar a evangelização, não a catequese. Esta, porém, não pode tê-la como
pressuposto, dada a situação cultural e pastoral de que já falamos. Por isso a catequese deve
esforçar-se

não apenas para alimentar e ensinar a fé, mas também para estimulá-la incessantemente, com o
auxílio da graça, a abrir os corações, a converter, a preparar uma adesão global a Jesus Cristo
por aqueles que ainda estão na soleira da fé (CT n. 19).

A conversão, como adesão totalizante a Cristo, pode se dar em momentos e de modos


diversos, mas é sempre elemento indispensável no dinamismo de uma fé em crescimento.
Um desenvolvimento religioso não unificado, desde o momento global da conversão, mais
cedo ou mais tarde exclui a possibilidade de um amadurecimento autêntico.

181
A conversão não constitui, aliás, um momento isolado e único da própria história
religiosa. É concebida antes como a estrutura, sempre emergente, que suporta todo o edifício
da fé pessoal.53 Pode-se dizer que, sobretudo nos momentos significativos da vida, a fé deve
reviver o momento crucial de conversão, reencontrando o impulso da adesão consciente ao
plano de Deus encarnado nessas situações. Pense-se, por exemplo, nas etapas humanas da
infância, adolescência, ingresso na vida adulta, escolha da profissão, matrimônio, doença,
morte; nos períodos de transição e em certos momentos cruciais da existência (escolhas
importantes, desgraças, sucessos, crises etc.). Nessas situações, normalmente está em jogo o
projeto global de vida que toda pessoa ou todo grupo se propôs e se inspirado na fé ,
deverá emergir com a riqueza de uma conversão renovada ao plano de Deus.
Pense-se, além disso, na atual sociedade pós-moderna, em contínuo processo de
transformação e com o seu culto do provisório e da fragmentação, e também na crise
generalizada da socialização religiosa. Pode-se imaginar, para o futuro, não apenas a
necessidade urgente de promover verdadeiros processos de iniciação à fé, em vista da
conversão, mas também prever, no longo curso da vida, mais momentos iniciáticos, para
sustentar o caminho do crescimento na fé.

4.2.2 É tarefa da catequese promover e fortalecer as atitudes de fé

A educação das atitudes cristãs constitui o traço unificador e mais decisivo da tarefa da
catequese, por levar à profissão de fé viva, explícita e operante (DGC n. 56) que constitui o
elemento determinante de seu crescimento. Só a interiorização de atitudes maduras de fé
pode libertar a catequese da redução simples instrução religiosa, preparação material
dos sacramentos ou observância não interiorizada de regras morais. Só através do
amadurecimento de verdadeiras e autênticas atitudes de fé a catequese se torna verdadeira
iniciação, isto é, acesso ao mistério da existência cristã, através de suas etapas, provas e
ritos transformadores.
Se nos perguntamos agora que atitudes constituem concretamente o objetivo central da
catequese, podemos evocar a concepção bíblica tradicional que coloca no centro da
existência cristã as atitudes fundamentais da fé, esperança e caridade. A fé fortalecida pela
esperança e informada pelo amor: eis o sistema estável de atitudes que a catequese deve
estimular e fazer amadurecer. Santo Agostinho resumiu is o numa expressão memorável:
Quidquid narras ita narra, ut ille cui loqueris, audiendo credat, credendo speret, sperando
amet.54 Em termos mais específicos:

53
Cf. CT n. 19; Espanha CC n. 49. Sobre essa visão dinâmica da conversão, cf. G. Groppo, Teologia
dell´educazione, p. 403-06; J. P. Bagot, Conversione , Diz.Cat., p. 177-78.
54
O que quer que contes, faze-o de modo a que o interlocutor ouvindo creia, crendo espere, esperando
ame: De catechizandis rudibus, IV, 8 (PL 40, 316).
182
Favorecer o crescimento da atitude de fé significa concretamente despertar sentimentos
de docilidade, escuta e abandono à palavra de Deus em Cristo; significa sobretudo
levar à adesão pessoal e incondicional a Jesus Cristo, no amor e na confiança,
como ponto de referência essencial para a própria vida. É nesse contexto que se fala de
sequela de Cristo (CT n. 20), de profissão de fé (DGC n. 66), de mentalidade de
fé como objetivo da catequese:

Educar no pensamento de Cristo, ensinar a ver a história como Ele, a considerar a vida como
Ele, a escolher e a amar como Ele, a esperar como Ele o ensina, a viver Nele a comunhão
com o Pai e o Espírito Santo. Em uma palavra, alimentar e orientar a mentalidade de fé: esta
é a missão fundamental de quem faz catequese em nome da Igreja (RdC n. 38).

Favorecer o amadurecimento da esperança, como dimensão essencial da atitude de fé


cristã, significa educar para a confiança inabalável nas promessas de Deus, para a
confiança e espera da salvação, para a paciência ante as adversidades, para o
abandono em Deus que incita à audácia e faz renunciar a toda forma de
autossuficiência.55 Viver na esperança significa também apegar-se a um otimismo de
base ante a história e o futuro (a Deus nada é impossível : Lc 1,37) e trabalhar com
afinco por um mundo mais humano e próximo do projeto do Reino, sem desesperar
nem fechar-se numa resignação inoperante.
Favorecer o crescimento da fé informada pela caridade significa levá-la à perfeição
do amor, que é o mandamento novo (Jo 13,34-35), o pleno cumprimento da
lei (Rm 13,8-10), o selo que torna operante e válida a própria fé (Gl 5,6; Ef 14,15). E
visto que a lei central da existência cristã é o amor de Deus realizado no amor dos
homens, 56 compreende-se a riqueza e a importância das atitudes implícitas nessa lei:
amor apaixonado a Cristo nos irmãos; renúncia a toda forma de egoísmo e prepotência;
disponibilidade para compartilhar; solidariedade no serviço de todos,
especialmente dos pobres etc. Nesse sentido, o crescimento na fé deve tornar
madura a opção moral fundamental, a consciência dos valores e portanto a formação
de uma vigorosa personalidade ética.57

55
Cf. J. Alfaro, Esistenza cristiana (texto mimeogr.). Roma, Pont. Univ. Gregoriana, 1975, p. 152.
56
J. Alfaro, Esistenza cristiana, p. 185-97.
57
Cf. G. Gatti, Opzione fondamentale , Diz.Cat., p. 470.
183
4.2.3 É tarefa da catequese levar à consciência plena da mensagem cristã
A catequese, em sua função de educação da fé, não pode esquecer o essencial
componente conteudístico . É tarefa sua, portanto, favorecer um conhecimento
cada vez mais profundo e completo, do mistério cristão:
Aquele que encontrou a Cristo deseja conhecê-lo tanto quanto possível, e também conhecer o
plano do Pai que ele revelou. O conhecimento dos conteúdos da fé (fides quae) é requisito da
adesão à fé (fides qua) DGC n. 85; cf. CT n. 20).

Nessa linha de pensamento, atribuem-se à catequese as tarefas de transmissão dos


documentos da fé ,58 a introdução à leitura da Sagrada Escritura (CT n. 27) e a interiorização
dos símbolos da fé (CT n. 28).
Já se denunciou inúmeras vezes a inadequação de uma catequese reduzida à
transmissão de conhecimentos religiosos. Muitas vezes a obra catequética caiu nesse
evidente unilateralismo, desfigurando a mensagem cristã e realizando uma doutrinação que
tem o efeito de deseducar. A reação, porém, não deve levar a um empobrecimento cultural
que subestime o papel insubstituível do conhecimento em todo o processo de
amadurecimento humano.59 É essencial saber integrar o desenvolvimento cognitivo no
dinamismo do crescimento da fé, para que as explicitações conceituais surjam no interior das
atitudes de fé, como resposta às interrogações reais que a vida cristã nos suscita. Nesse
sentido o saber da fé, mais que alimentar a cultura ou erudição religiosa, se torna um
conjunto de representações e motivações que sustentam e dão sentido ao projeto cristão de
vida.
Ora, em relação à tarefa da catequese como ensinamento, afloram tradicionalmente
dois problemas que merecem atenção: o da integridade do conteúdo e o da memorização
como método e objetivo da catequese.

58
Mensagem do Sínodo de 1977, n. 9.
59
Cf. Brasil CR n. 116, 139-141; CNBB, Linha 3, Textos e manuais de catequese: orientações para sua
celebração, análise e avaliação. São Paulo, Paulinas, 1987, n. 104-118 (Estudos da CNBB n. 53), Espanha CC 86.
Cf. a esse respeito as postulações legítimas de G. Moran, Catéchèse biblique. Paris, Ligel 1968, p. 119-32.
184
O problema da integridade do conteúdo

A esse respeito é bem conhecida a insistência dos documentos oficiais em que a


catequese transmita toda a doutrina, a mensagem cristã completa:

Na tarefa da inculturação da fé, a catequese deve transmitir a mensagem evangélica na sua


integridade e pureza [...] Por isso um critério fundamental de aferição da catequese é o de
salvaguardar a integridade da mensagem, evitando apresentações parciais ou deturpadas
(DGC n. 111; cf. CT n. 30).

Essa exigência teológica, legítima em si mesma, muitas vezes corre o risco de


comprometer a não menos legítima necessidade pedagógica do respeito às reais condições e
possibilidades das pessoas, e também as exigências de uma comunicação religiosa
significativa e eficaz. Na verdade, não se deve esquecer que o ensino catequético deve ser
funcional na educação da fé e, portanto, apontar para o amadurecimento das atitudes. O
conhecimento da fé não deve ser um fim em si mesmo, mas avançar na medida em que se
liga ao amadurecimento da própria fé.
Concretamente, o magistério e a reflexão catequética oferecem alguns critérios que
permitem conciliar exigências aparentemente contraditórias:
O critério do gradualismo e da adequação aos catequizandos. Uma relação educativa
não pode ignorar o gradualismo das exigências e possibilidades de todo crente
potencial. A integridade da fé continua sendo sempre uma meta a alcançar (cf. DGC
[1971] n. 38), mas será sempre necessário propor a mensagem cristã gradualmente,
seguindo o exemplo da pedagogia divina, com a qual Deus se foi revelando de modo
progressivo e gradual. A integridade deve se fazer acompanhar da adequação (DGC n.
112).

185
O critério da hierarquia das verdades . Este princípio, de grande significado no âmbito
ecumênico (cf. UR n. 11), pode e deve ser aplicado também à catequese. 60 Nem tudo
tem a mesma importância no interior da fé, como o prova a tradição dos símbolos e a
clássica distinção entre fé implícita e fé explícita,61 e entre hierarquia teológica
e hierarquia existencial das verdades de fé.62
O critério da integridade intensiva . O Sínodo de 1977 sobre a catequese afirma que a
integridade do conteúdo catequético é concebida em sentido intensivo, não extensivo,
ou de explicitação materialmente completa:

Esse método intensivo de transmitir o Evangelho (= as Sagradas Escrituras), que tem em seu
favor a tradição eclesiástica mais qualificada, distingue-se do outro modo de catequizar, que
transmite toda a mensagem da revelação cristã segundo um critério de completitude
extensiva, explícita ou analítica; para essa segunda corrente, seria necessário apresentar aos
catequizandos quase tudo aquilo que, desde o princípio da história da Igreja, os concílios
ecumênicos e as intervenções magisteriais dos pontífices romanos determinaram (em sentido
estrito) acerca da fé e dos costumes. Esse conjunto de doutrinas é examinado e estudado
pelos teólogos, mas não deve, necessariamente, ser estudado por todos os fiéis, a menos que
haja o risco de que alguma verdade seja negada ou esquecida.63

O problema da memorização
O costume de fazer memorizar fórmulas ou expressões catequéticas tem raízes muito
antigas e reaparece de vez em quando no curso do movimento catequético. O papel da
memória é lembrado nos documentos oficiais (cf. CT n. 55; DGC n. 154), embora se lhe
reconheçam os limites e os riscos. Na realidade, a memorização beneficia-se de uma longa
tradição e ainda hoje constitui, em diversos campos, um instrumento indispensável de
transmissão cultural. Por outro lado, porém, lamenta-se também a inutilidade e o contra-
senso educativo de uma aprendizagem baseada na memorização que não contribua para o
amadurecimento de autênticas atitudes de fé.

60
Cf. DGC ( Un messaggio organico e gerarchizzato ). A CT lembra também que a integridade não dispensa o
equilíbrio nem o caráter orgânico e hierarquizado, graças aos quais se dará a devida importância às
verdades que se devem ensinar, às normas que se devem transmitir, aos caminhos de vida cristã que se devem
apontar (CT n. 31). Cf. Brasil CR n. 100.
61
Cf. Espanha CC 200-201; P. A. Liégé Un abrégé de la foi? , Catéchèse (1972), n. 49, p. 414-15.
62
Cf. G. Bitter, Quale fede trasmettere? Possibilità di una elementarizzazione kerygmatica , Concilium 20 (1984),
n. 4, p. 77; F. Ardusso, Fede , Diz.Cat., p. 277.
63
Proposição n. 10 do Sínodo de 1977, citado em: U. Gianetto, Catechesi Tradendae e metodo catechistico: alla
radice dei problemi , Catechesi 49 (1980), n. 7, p. 62. Cf. a esse respeito, A. García Suárez, Entorno a la
integridad extensiva e intensiva del mensaje cristiano , Actualidad Catequética (1977), n. 81/82, p. 139-225. Cf.
também Espanha CC n. 200-201; Brasil CR n. 98.
186
Temos uma solução equilibrada para o problema na devida integração da memória no
processo global da educação da fé enquanto interiorização de atitudes. É, pois, no interior do
processo educativo global e em função disso que tem sentido o exercício da memória, lá
onde esse exercício tem um grande alcance educativo. Ora, se se fala de integração e de
finalidade educativa da memória, na verdade se exclui a memorização puramente nocional,
ou motivada exclusivamente pela exigência de completitude doutrinal, ou algo desse tipo.
Concretamente:
Lembremo-nos de que há uma diferença entre exercitar a memória e decorar. É
verdade que o desenvolvimento da fé cristã requer referências à tradição bíblica e
eclesial e, portanto, muitas lembranças e evocações do patrimônio da experiência
cristã. Mas essas referências não devem necessariamente se tornar fórmulas decoradas.
Pode ser útil, e às vezes necessário, guardar na memória as expressões do patrimônio
cristão ligadas à interiorização da fé e à prática de vida cristã, como o são
algumas expressões bíblicas, fórmulas litúrgicas, orações, e outras de mesmo tipo.64

4.2.4 É tarefa da catequese educar para o agir cristão

No dinamismo da educação da fé, como processo de amadurecimento de atitudes, não


pode faltar o componente comportamental, que envolve a catequese no que se refere ao
exercício das diversas formas de conduta e de vida cristã. Com relação a isso, os documentos
oficiais atribuem à catequese tarefas diversas: educação para a oração e para a meditação,
iniciação sacramental e litúrgica, formação moral, educação para a paz e para a justiça,
preparação para o compromisso social e político, incremento da causa ecumênica etc.65

64
Cf. DGC n. 154; Mensagem do Sínodo de 1977, n. 9; CT n. 55; Puebla n. 1009; França (Texte de référence)
3.3.2; Brasil CR n. 140-141.
65
Cf. por exemplo: Brasil CR n. 246-276; DGC 85-86; CT 19-24; Espanha CC 91-92; Alemanha KWK A 3.1.-
3.5.; França (Texte de référence) cap. III; EUA (NCD) passim. Neste sentido é interesante consultar: CNBB-
Linha 3, Textos e manuais de catequese: orientações para sua elaboração, análise e avaliação. São Paulo,
Paulinas, 1987 (Estudos da CNBB n. 53). Vários aspectos do documento CR são aí aprofundados e ampliados.

187
Esse conjunto de tarefas pode ser organizado tomando-se como referência o esquema
66
das quatro funções ou mediações eclesiais:
É tarefa da catequese educar para o exercício da caridade e do serviço (sinal da
diaconia). Inclui-se aí a iniciação às diversas formas de testemunho cristão no mundo,
às diversas formas do amor e do serviço desinteressado, a luta pela justiça e a paz, a
ação social e política para a promoção e a libertação etc.
Cabe à catequese educar para o sentido da comunhão e para a vida comunitária (sinal
da ). Integra-se nesse objetivo tudo o que diz respeito à vida da comunidade
cristã: o espírito de fraternidade e de compartilhamento, a capacidade de

É tarefa da catequese iniciar à escuta e ao anúncio da Palavra (sinal da ). A


catequese, ela própria momento da ou ministério da palavra, deve educar
para a participação consciente na função profética da Igreja. Isto inclui a iniciação
à leitura da Bíblia, a educação para a escuta da palavra de Deus na Igreja e no mundo
e, num sentido dinâmico, a preparação para o trabalho apostólico e missionário.
É também tarefa da catequese iniciar ao mistério da celebração cristã (sinal da liturgia).
Chegamos então à concepção clássica da catequese como preparação para os
sacramentos, especialmente para a Eucaristia, e para a participação consciente e ativa
na liturgia. Tem grande importância também, nesse contexto, a educação para a oração
e para a meditação, como momentos essenciais da existência na fé.
Finalmente, em referência ao nível dos condicionamentos institucionais, cabe
também à catequese educar para a escolha vocacional e ministerial. A catequese deve
ajudar as pessoas a descobrir o próprio papel na sociedade e na Igreja. Ela se torna
assim um instrumento de orientação vocacional, pela descoberta e amadurecimento dos
diversos carismas e ministérios a serviço da comunidade.

66
As tarefas da catequese, aqui enumeradas de forma sucinta, serão aprofundadas nos capítulos que lhes
concernem.

188
Desse quadro de objetivos se deduz uma indicação importante sobre a natureza da catequese.
Na verdade, ela se define simultaneamente como obra de primeiro anúncio, iniciação,
ensinamento e educação (cf. DGC n. 68). Sua missão é verdadeiramente rica e complexa. E é a
qualificação de educação da fé que melhor unifica e resume a totalidade da tarefa
catequética.

4.3 Algumas consequências e aplicações concretas

À guisa de conclusão, retomamos aqui algumas indicações:


A catequese, educação da fé, supõe e promove necessariamente o processo geral de
crescimento e amadurecimento humano. Sem a maturidade humana pelo menos
relativa não se pode conceber maturidade da fé. Ressalta-se, assim, a vocação
pedagógica, em sentido integral, dos agentes da catequese.
A meta da fé madura não é, por si só, passível de ser atingida ao longo da vida, mas é
sempre uma tarefa contínua, horizonte em direção ao qual se caminha. Daí o caráter
permanente, em sentido lato, da catequese. E o crescimento rumo à maturidade
continua sendo um critério válido para verificar se um determinado processo
catequético é educativo, favorece o amadurecimento, ou não.
É fácil perceber o elo que liga estreitamente o dinamismo da fé à categoria fundamental
da experiência religiosa . Se antes afirmamos que sem experiência religiosa não
existe comunicação da fé , podemos acrescentar agora que sem experiência religiosa
de fé a atitude de fé não amadurece.
A estrutura da atitude de fé permite entrever diferentes metodologias de intervenção
educativa: métodos predominantemente cognitivos (informação, ensinamento,
reflexão); métodos que destacam o afetivo ou emotivo (testemunho, vida em grupo,
convivialidade); métodos de caráter ativo (ação, compromisso, participação). Mas é
importante que em todas as situações se respeite o caráter global de toda atitude
verdadeira.

5. UM PROBLEMA PARTICULAR: EDUCAÇÃO DA FÉ E PLURALISMO


RELIGIOSO

Para um esclarecimento posterior da identidade da catequese como educação da fé,


merece atenção especial a situação de pluralismo religioso em que esta deve operar.
Consideram-se três questões especiais: a relação com a religiosidade popular; o problema dos
novos movimentos religiosos; e o encontro com as grandes religiões.

189
5.1 Catequese e religiosidade popular

Consideremos antes de mais nada a realidade rica e complexa da religiosidade popular.


Mesmo reconhecendo que o interesse por esse tema tem aumentado nos últimos anos,67
cumpre dizer que a reflexão teológica e pastoral ainda não lhe dá a devida importância:

O fenômeno do catolicismo popular está sempre presente, circundando a vida eclesial como um
horizonte envolvente. Não obstante, no campo da reflexão sociológica, pastoral e teológica,
deve-se dizer que permanece ausente. Foi ignorado com certo desprezo; com o mesmo
desprezo que a cultura da elite vota à cultura popular.68

No que diz respeito à religiosidade popular, a catequese deve também rever as próprias
orientações e estratégias, em consonância com o reconhecimento dos valores que essa
religiosidade encarna e exprime. Um interesse renovado por essa realidade e novos
instrumentos de análise permitem hoje uma percepção mais objetiva dos valores culturais e
teológicos presentes na religião do povo.69 Esta muitas vezes contém autênticos valores de
fé, esperança, caridade, e constitui mesmo um verdadeiro locus theologicus, um espaço de
experiência cristã, um comentário vital original ao Evangelho, diante do qual mesmo a fé
douta deveria se pôr humildemente à escuta.70

67
Cf. EN 48; CT n. 54; DGC n. 195-196; Puebla n. 444-469; México GP n. 96-99. Encontra-se uma
reflexão rica e esclarecedora sobre o tema em CAL, cap. 6: Religiosidad opular y atequesis .
68
L. Maldonado, Religiosidad popular , C. Floristan - J. J. Tamayo (eds.), Conceptos fundamentales del
cristianismo. Madri, Trotta, 1993, p. 1184. Cf. também México GP n. 96-97.
69
O tema da religiosidade popular é objeto de muitos estudos, especialmente na América Latina e nos países
latinos da Europa (Itália, Espanha, França). Cf, por exemplo: F. De Vos, Catequese e religiosidade popular ,
Revista de Catequese 4 (1981), n. 14, p. 5-12; M. Sousa, Catequese e religiosidade popular , Revista de
Catequese 9 (1986), n. 35, p. 19-30; Arquidiocese de Belo Horizonte, Encontro sobre religiosidade popular e
catequese , Revista de Catequese 4 (1981), n. 14, p. 86-93; V. Orlando, Religiosità popolare , Diz.Cat., p. 540-
41; R. Berzosa Martinez, Religiosidad popular en Europa , Nuevo Dic. Cat., p. 1938-47; D. Irarrázabal
Covarrubus, Religión del pueblo en América Latina , Nuevo Dic. Cat., p. 1.920-38; L. Maldonado, Introducción
a la religiosidad popular. Santander, Sal Terrae, 1985.
70
Cf. B. Secondin, Religiosità popolare , in: E. Ancilli (ed.), Dizionario di spiritualità dei laici. Vol. II. Milão,
Edizioni O.R. 1981, p. 219-20.
190
Mas nem tudo é positivo na religiosidade popular. Com certeza ela tem aspectos
mistificadores e alienantes:

Podemos dizer que a religiosidade popular tem, naturalmente, as suas limitações. Ela muitas vezes
está aberta à penetração de deformações e também de superstições. Em freq entes casos ela
se limita a manifestações culturais sem o compromisso de uma autêntica adesão de fé. Pode
também levar à formação de seitas e colocar em risco a verdadeira comunidade eclesial.71

É uma realidade rica e também vulnerável, onde a fé, que lhe serve de base, precisa de purificação
e de reforço [...] É necessária, pois, uma catequese que seja capaz de apreender, desse potencial
religioso, as dimensões interiores e os valores inegáveis, ajudando a superar o risco do
fanatismo, da superstição, do sincretismo e da ignorância religiosa (DGC n. 195).

Por isso, superando posições unilaterais de aceitação acrítica ou de negação global, impõe-
se a opção pastoral por uma evangelização da religiosidade popular (Puebla n. 457), por uma
pedagogia de evangelização (EN n. 48), na convicção de que a religiosidade popular é uma
expressão privilegiada da inculturação da fé (S. Domingo n. 36). Uma educação da fé bem
concebida, que respeite as exigências do amadurecimento da própria fé, encontrará o seu
caminho também no interior da religiosidade popular, evitando os perigos do sincretismo, do
fanatismo ou do sectarismo religioso que tantas vezes lhe compromete a autenticidade.
O esforço catequético de discernimento e de purificação no mundo fascinante mas também
ambíguo da devoção popular não deve esquecer que a religião do povo se encontra
indissoluvelmente ligada à sua cultura, aos seus valores profundos, às suas categorias
expressivas e simbólicas. Destruir a devoção popular, já se disse, seria como assassinar os
pobres .72 Por outro lado, o povo cristão se revela muitas vezes um verdadeiro catequista na
família, nos grupos e associações, em suas devoções, graças principalmente ao
73
trabalho educativo da mulher.

71
EN n. 48. Cf. Puebla n. 456. CNBB, Diretrizes gerais da ação evangelizadora da Igreja no Brasil 2003-2006. São
Paulo, Paulinas, 2003, n. 36 e 197 (Documentos da CNBB n. 71).
72
B. Cansi, Inculturação da catequese no catolicismo popular , Revista de Catequese 15 (1992), n. 58, p. 19-26.
73
Cf. D. Irarrazabal, Religión del pueblo, en la catequesis , Teología y Vida 38 (1997), n. 3, p. 198-215.

191
Existem muitos elementos e recursos na religião do povo passíveis de utilização
catequética: crenças, símbolos, arte, sabedoria popular, tradições e relatos, valores éticos, ritos
e celebrações. Com as devidas precauções, valoriza-se esse potencial catequético, essa
riqueza presente na cultura popular e muitas vezes escondida em seu patrimônio
devocional e religioso.

5.2 Os novos movimentos religiosos

Essa denominação reúne hoje um número considerável de movimentos, seitas e


experiências religiosas das mais diversas origens e identidades (cf. DGC n. 201);
Testemunhas de Jeová, Meninos de Deus, Hare Krishna, New Age [Nova era], Cientologia etc.
Alguns têm raiz cristã, enquanto outros se inspiram em religiões orientais ou em outras fontes e
tradições. São expressões religiosas que atraem não poucos cristãos, em parte porque respondem
à ânsia de segurança e também porque criam relações pessoais intensas e gratificantes, em um
clima de caloroso acolhimento e fraternidade. Nelas se mergulha num mundo simbólico e
esotérico que se abre para o sentido do mistério, do oculto, da transcendência. Mas são
experiências dominadas muitas vezes pelo subjetivismo exagerado, pela forte emotividade e pela
dependência psicológica da comunidade e de seus líderes. Tudo isso torna particularmente
complexo e difícil a tarefa do discernimento.74
Não falta a alguns desses movimentos um autêntico anseio religioso, pelo que podem
ser considerados como um areópago a evangelizar, no qual os problemas mais freq entes
possam encontrar resposta (DGC n. 201). Mas na maior parte dos casos constituem um
verdadeiro perigo para a fé dos crentes, que muitas vezes a eles aderem por causa da
ignorância religiosa e da insatisfação com a Igreja. Sua difusão é um indício eloquente do
culto da subjetividade de muitos de nossos contemporâneos e da crise de confiança em
relação às instituições religiosas tradicionais.
Diante desse panorama variegado e inquietante, a catequese como educação da fé está
engajada em diversas frentes:

74
Também é vasta a bibliografia sobre novos movimentos religiosos. Recomendamos: CNBB, Guia para o
diálogo inter-religioso: relações com as grandes religiões, movimentos religiosos contemporâneos e filosofia de vida.
São Paulo, Paulus, 1987 (Estudos da CNBB n. 52); Fr. Félix Neefjes, O fenômeno das seitas , Revista de
Catequese 12 (1989), n. 47, p. 55-56; Cesnur (Centro Studi Nuove Religioni), L´Europa delle nuove religioni.
Leumann (Turim), Elledici, 1993; E. Fizzotti - F. Squarcini (eds.), L´Oriente che non tramonta: movimenti di origine
orientale in Italia. Roma, LAS, 1999; G. Maggioni, Nuovi movimenti religiosi ento schede. Milão, Centro
Ambrosiano, 1998.
192
É importante antes de mais nada contribuir para reforçar a identidade cristã dos crentes
com o aprofundamento do núcleo central da fé e com um conhecimento adequado da
Sagrada Escritura. É , na verdade, que muitos cristãos se sentem
despreparados para responder aos desafios dos novos movimentos religiosos.
Impõe-se um esforço educativo para um crescimento na fé orientado para a maturidade e
autonomia de uma religiosidade adulta, superando os riscos aliciantes do infantilismo e da
dependência psicológica, autêntico refúgio de muitas pessoas em busca de segurança e de
satisfação emocional.
Será necessário também ajudar a redescobrir e reforçar o sentimento de pertencer à
comunidade cristã e à Igreja, através de experiências convincentes de vida fraterna
comunitária e de um modelo alternativo de Igreja.

5.3 O mundo das grandes religiões

Bem diversa, e muito mais absorvente, é a tarefa da educação da fé no diálogo com as


religiões tradicionais, como é o caso, em especial, do judaísmo, do islamismo e das grandes
religiões orientais (cf. DGC n. 200). Depois da mudança conciliar, com as novas perspectivas
abertas na relação entre a Igreja e as religiões, a reflexão teológica está empenhada
atualmente em aprofundar e proceder a uma revisão da natureza dessa relação, procurando
determinar como deve ser entendido o caráter absoluto do cristianismo e em que sentido as
religiões podem ser consideradas como formas históricas de revelação como via de
salvação.75
Nos documentos conciliares as religiões são vistas como lugares da procura de Deus
por parte do homem e valorizadas como preparação evangélica (LG n. 16), ricas da
presença de sementes do Verbo (AG n. 11). Na situação de pluralismo religioso, que deve ser
apreciado em si mesmo como uma realidade positiva e enriquecedora, surge a
necessidade de acolher todos os valores presentes nas diversas experiências religiosas e de
assumir uma atitude aberta diante do outro, visto não mais como ameaça à própria
identidade, mas como possível parceiro de um diálogo enriquecedor. É toda uma mudança de
mentalidade que se requer para passar da identidade excludente ao sentido da identidade
compartilhada e aberta ao diálogo, porém na mais autêntica fidelidade à própria pertença
religiosa.

75
Sobre essa questão remetemos à nota bibliográfica no fim do capítulo.
193
Supera-se, assim, na catequese, a questão inicial da estranheza e recusa a abrir-se com
realismo a novas perspectivas de diálogo sincero.76 Nesse campo surgem hoje recursos inéditos,
que podem refletir-se na obra da evangelização e no desenvolvimento das comunidades
eclesiais, especialmente nas igrejas jovens. Eis algumas indicações concretas:
O sentido missionário, que é um dos objetivos da catequese, deve ser repensado
atualmente na perspectiva de uma abertura ao diálogo inter-religioso:

Educando nesse sentido missionário, a catequese desenvolverá o diálogo inter-religioso, que


pode tornar os fiéis capazes de uma comunicação fecunda com homens e mulheres de outras
religiões. A catequese mostrará que o elo da Igreja com as religiões não cristãs é, em
primeiro lugar, o da origem comum e do objetivo comum do gênero humano, como também
o das múltiplas sementes da Palavra , que Deus colocou naquelas religiões (DGC n. 86).

O diálogo supõe e exige um enraizamento e um reforço da própria identidade religiosa,


não concebida, porém, em termos de autossuficiência e de exclusão das outras, mas
purificada e enriquecida nas relações interculturais e inter-religiosas. Esse processo se
baseia necessariamente no testemunho de comunidades cristãs sólidas e fervorosas e
requer o empenho de catequistas bem preparados, da própria comunidade (DGC n. 200).
No exercício de sua tarefa de educação da fé, a catequese deverá promover uma
verdadeira aprendizagem ecumênica entendida no sentido lato do termo. Almeja-se uma
atitude e um processo didático que integre em seu dinamismo a relação com o outro e o
reconhecimento do outro, em um movimento de abertura interior que vá além das
próprias fronteiras e aponte para a globalidade da verdade compartilhada. 77 Essa forma
de aprendizagem inclui, entre outras, as seguintes características e competências:

capacidade de proceder ao diálogo e de enfrentar os conflitos; tolerância e sensibilidade para


com os outros; capacidade de abrir-se e de comunicar-se com os outros; capacidade de
reconhecer a diversidade e a verdade nas posições do outro e de dialogar com elas;
capacidade de praticar a solidariedade. As vias didáticas para alcançar essas competências
são a informação, a participação, a ação, a comunicação na comunidade.78

Essas indicações e orientações mostram a dimensão da mudança de mentalidade e o


esforço de conversão que os agentes a catequese são chamados a realizar para responder
às exigências e desafios da nossa sociedade pluralista.

76
Cf. EN n. 53; Mensagem do Sínodo de 1977, n. 15. Grande sensibilidade a is o se vê no documento: Ásia
(Cingapura, 1995).
77
Para um esclarecimento do conceito de aprendizagem ecumênica , cf. Faustino Teixeira, O diálogo inter-
religioso como desafio para uma catequese com adultos , in: CNBB, Segunda semana brasileira de catequese. São
Paulo, Paulus, 2002, p. 136-57 (Estudos da CNBB n. 84); Therezinha M. Lima da Cruz, Diálogo na diversidade
religiosa, cultural e humana , in: ibid., p. 158-71 (cf., também, Revista de Catequese 24 [2001], n. 96, p. 29-36); id.
Bases para uma atitude de diálogo , Revista de Catequese 20 (1997), n. 80, p.
62-66; R. Schlüter, Apprendimento ecumenico: aspetti pedagogici e teologici di un nuovo concetto di pedagogia
religiosa , in: C. Nanni (ed.), Pace, giustizia, salvaguardia del creato: impegno delle Chiese, compito dell´educazione.
Roma, LAS, 1998, p. 48-71.
78
São expressões de um documento da Igreja Evangélica Alemã (Ökumenisches Lernen: Grundlagen und Impulse,
1995), cit. por R. Schlüter, loc. cit. p. 55. Neste sentido, cf. também os dois artigos em português, citados na
nota anterior.

194
SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS

Na base desse capítulo encontra-se a concepção teológica renovada da fé como atitude


cristã fundamental. Sugerimos para um aprofundamento do tema:
ARDUSSO, F. Fede . Diz.Cat., p. 275-78.
. Imparare a credere: le ragioni della fede cristiana. Cinisello Balsamo (Mi), Paoline,
1992.
EQUIPO DE CATEQUETAS DE EUSKAL-HERRIA, Fe y conversión . Nuevo Dic. Cat., p.
960-71.
LUBOMIRSKI, M. Vita nuova nella fede speranza e carità. Assis, Cittadella Editrice, 2000.
TORRES QUEIRUGA, A. Creer de otra manera. Madri, PPC, 1999.

Sobre o tema central do capítulo, a catequese como iniciação e educação da fé, remetemos
à bibliografia geral do final do volume. Apontamos alguns autores que desenvolvem o tema de
modo especial: J. Colomb (Al servizio della fede, livro I, parte II); F. Coudreau (Si può insegnare
la fede?). D. Emeis - K. H. Schmitt; E. Feifel ( Glaube und Bildung . In: Handbuch der
Religionspädagogik vol. 3, p. 25-41); J. J. Rodríguez Medina (1972); Z. Trenti (Educare alla
fede); M. Van Caster (Strutture della catechesi); J. Werbick (1989).

Para aprofundar o tema da iniciação pode-se ainda acrescentar:


ALVES DE LIMA, L. Catequese com adultos e iniciação cristã . In: CNBB-Grecat. Segunda
emana rasileira de atequese. São Paulo, Paulus, 2002 (Estudos da CNBB n. 84).
CNBB. Dimensão bíblico-catequética: o itinerário da fé na iniciação cristã do adulto . São
Paulo, Paulus, 2001 (Estudos da CNBB n. 82).

195
FELLER, V. G. Itinerário da fé na catequese com adultos, do ponto de vista da teologia . In:
CNBB. Dimensão bíblico-catequética: o itinerário da fé na iniciação cristã de adultos. São
Paulo, Paulus, 2001, p. 204-224.
FLORISTAN, C. Catecumenato: história e pastoral da iniciação. Petrópolis, Vozes, 1995.
LACHNITT, J. Catequese na iniciação cristã entre os Xavante . Revista de Catequese 18
(1995), n. 70, p. 27-33.
LELO, A. F. Dinamismo sacramental e aplicação do ´Ordo iniciationis christianae
adultorum´ no Brasil. Publicação parcial da tese doutoral. Barcelona, edição do autor, 2003.
LIBÂNIO, J. B. Itinerário da fé hoje a propósito da teologia da fé . In: CNBB Dimensão
bíblico-catequética: o itinerário da fé na iniciação cristã dos adultos. São Paulo, Paulus,
2001, p. 296-331.
MARKUS, M. J. K. Iniciação no judaísmo . Revista de Catequese 23 (2000), n. 91, p. 31-34.
MERLOS, F. O rito da iniciação cristã de adultos: uma leitura teológica . Revista de
Catequese 25 (2002), n. 99, p. 34-42.
ORMENDO, D. Vale a pena os catequistas conhecerem o catecumenato . CNBB-Grecat.
Segunda semana brasileira de catequese. São Paulo, Paulus, 2002, p. 244-53 (Estudos da
CNBB n. 84).
NERY, I. J. Catecumenato e catequese com adultos . Revista de catequese 23 (2000), n. 91, p.
35-52.
. Catequese com adultos e catecumenato: história e proposta. Petrópolis, Vozes,
2001.
PALEARI, G. Os ritos de iniciação como parte de cultura humana . Revista de Catequese 23
(2000), n. 91, p. 21-30.
RUIZ DE GOPEGUI, J. Iniciação cristã . Revista de Catequese 23 (2000), n. 91, p. 5-20.

Em uma perspectiva mais explicitamente dinâmica, como aprofundamento do caminho ou


itinerário de fé rumo ao amadurecimento e reflexão sobre a maturidade da fé e suas exigências, cf:
BUCHER, A. Fasi dello sviluppo religioso secondo James W. Fowler e Fritz Oser anorama
comparativo e critico . Orientamenti Pedagogici 36 (1989), n. 6, p. 1090-1121.
BURGALASSI, S. Gli ostacoli alla crescita nella fede oggi . Presenza Pastorale 65 (1995), n.
4, p. 301-22.
DA MATA, R. Os ritos de passagem. Petrópolis, Vozes, 1978.
DEVITT, P. M. Immortal diamond: facets of mature faith. Dublin, Veritas, 1997. FOWLER, J.
W. Faith development and pastoral care. Filadélfia, Fortress Press, 1987.
. Estágios da fé: a psicologia do desenvolvimento humano e a busca do sentido .
Teologia Prática. São Leopoldo, Sinodal, 1981 (Série estudos pastorais n. 10). GIGUÈRE, P.-
A. Une foi d´adulte. Ottawa, Novalis-Université Saint-Paul, 1991.
GROPPO, G. Teologia dell´edducazione rigine, identità, compiti. Roma, LAS, 1991, p. 369-
431.
HEMEL, U. Ziele religiöser Erziehung. Beitrage zu einer integrativen Theorie. Frankfurt, Peter
Lang, 1988.
VERGOTE, A. Pour une foi adulte . Lumen Vitae 23 (1968), p. 431-44.

196
Sobre o problema das religiões não cristãs e sua relação com a obra evangelizadora e
catequética, cumpre assinalar sobretudo os documentos do competente dicastério vaticano:
SEGRETARIATO PER I NON CRISTIANI. Guide per la conoscenza e il dialogo colle varie
religioni quali Buddhismo, Islam, Induismo, Religioni Africane. Roma, 1984.
. L´attegiamento della Chiesa di fronte ai seguaci di altre religioni. Roma, 1984.

Cumpre lembrar também a discutida declaração da Congregazione per la Dottrina della


Fede Dominus Jesus, de 30.6.2000. Sobre o tema encontram-se abordagens válidas nas
obras:
ISTITUTO DI CATECHESI MISSIONARIA DELLA PONT. UNIV. URBANIANA (ed.).
Andate e insegnate: commento all´Esortazione Apostolica Catechesi Tradendae di
Giovanni Paolo II. Bolonha, Ed. Missionaria Italiana, 1980, quinta parte.
PONTIFICIA UNIVERSITÀ URBANIANA (ed.). Evangelizzazione e culture: atti del Congresso
Internazionale Scientifico di Missiologia, Roma 5-12 ottobre 1975. Vols. I e II. Roma, Pont.
Univ. Urbaniana, 1976.

Para um aprofundamento posterior, cf.:


BACCARI, L. La rivelazione nelle religioni. Roma, Borla, 1996.
BÜHLMANN, W. Igreja no limiar do terceiro milênio. São Paulo, Paulus, 1994.
CODA, P. Per un´ermeneutica cristologica del pluralismo delle religioni . In: G. Coffele (ed.).
ilexit cclesiam tudi in onore del prof. Donato Valentini. Roma, LAS, 1999, p. 125-40.
COMBI, E. (ed.), Salvezza universale e salvezza in Cristo: confronto di tradizioni religiose.
Cinisello Balsamo (Milão), San Paolo, 1994.
D´COSTA, G. La teologia pluralista delle religioni: un mito? L´unicità cristiana riesaminata.
Assis, Cittadella, 1994.
DUFAUX, L. et al. L´annonce de Jésus Christ et la rencontre avec les religions . Spiritus 33
(1992), n. 126, p. 3-144 (número monográfico).
DUPUIS, J. Rumo a uma teologia cristã do pluralismo religioso . In: Pensamentos teológicos.
São Paulo, Paulinas, 2001.
GEFFRÉ, C. Salut en Jésus Christ et valeur salutaire des religions du monde . Catéchèse 32
(1992), n. 128, p. 53-64.
LAMBIASI, F. L´unico salvatore e le religioni non cristiane . Via Veritá e Vita 41 (1992), n.
136, p. 32-45.
LESEGRETAIN, C. et al. Dossiê: Christianisme et autres religions: pluralisme religieux
aujourd´hui . Catéchèse 32 (1992), n. 128, p. 9-42.
ROSSANO, P. Dialogo e annuncio cristiano: l´incontro con le grandi religioni. Cinisello
Balsamo (Mi), Paoline, 1993.
WALDENFELS, H. Il fenomeno cristiano: una religione mondiale nel mondo delle religioni.
Brescia, Queriniana, 1995.
ZAGO, M. Religioni non cristiane . Diz.Cat., p. 537-39.
ZIEBERTZ, H.-G. Pluralismo religioso e processi di apprendimento interreligioso
onsiderazioni sulla ricerca dell´identità religiosa nella società (post-)moderna .
Orientamenti Pedagogici 43 (1996), n. 4, p. 731-52.

197
198
Capítulo 6
A catequese: ação eclesial e educação
para o sentido da greja
Depois da palavra e da fé, consideramos agora o terceiro
polo essencial de referência o polo institucional para a
catequese: a Igreja. A catequese é sempre, na verdade, obra da
Igreja e experiência de Igreja: A catequese é um ato
essencialmente eclesial. O verdadeiro sujeito da catequese é a
Igreja que, continuadora da missão de Jesus Mestre e animada
pelo Espírito, é convidada a ser mestra da fé (DGC n. 78).
É a afirmação da dimensão eclesial da catequese, constitutiva
de sua identidade. Não é concebível um exercício da função
catequética que não se reporte à Igreja como seu sujeito e
referência necessária.

1. A DIMENSÃO ECLESIAL DA CATEQUESE: LUZES E SOMBRAS

A natureza eclesial da catequese comporta efeitos de certo modo contraditórios: por um


lado, ela não apenas abre possibilidades sempre novas de realização e de eficácia, mas constitui
um estímulo decisivo para a renovação da Igreja; por outro lado, porém, é a própria
eclesialidade, seu vínculo com a realidade eclesial, que muitas vezes se constitui em
obstáculo considerável. Eis alguns problemas e situações recorrentes na prática:
Enquanto obra de Igreja, a catequese muitas vezes se deixa contaminar pela opinião
negativa de que a própria Igreja é objeto, especialmente em alguns aspectos históricos e
institucionais. A crise de credibilidade da Igreja, real ou percebida como tal, se
reflete também na credibilidade da catequese: No contexto cultural europeu, a imagem
da Igreja na sociedade atual constitui um enorme entrave para a empresa catequética.
Isso pode ser constatado a cada dia pelos agentes da catequese.1
A exigência da comunhão eclesial, válida também para a catequese, apresenta muitos
problemas de realização e de avaliação. O respeito pela diversidade e pelo
legítimo pluralismo se v em ameaçados, em alguns casos, seja pelas várias formas de
autonomia mal compreendida, seja pelos chamamentos à comunhão, que parecem antes
uma tentativa de controlar e uniformizar os grupos eclesiais. Como conceber um
exercício da comunhão que liberte da dispersão caótica sem cair na uniformidade
mortificante?

1
A. Fossion, La catéchèse dans le champ de la communication: ses enjeux pour l´inculturation de la foi. Paris,

199
A catequese reivindica a participação de todos no ministério da palavra e a
valorização dos ministérios e carismas presentes na comunidade eclesial. Ora, também a
perpetuação do monopólio clerical da palavra na verdade reduz o povo de Deus ao papel
passivo de escutar, ou no máximo de colaborar em nível executivo e subordinado. Por
outro lado, como evitar o perigo de um exercício agressivo ou espontaneísta da
mediação catequética?
A catequese se pretende um fator primordial de renovação da Igreja, muitas vezes
portadora de um projeto alternativo de Igreja. Mas aqui surgem, muitas vezes, tensões e
polêmicas entre os defensores de uma catequese fiel à Igreja tal como ela é e os
que defendem uma catequese a serviço de uma Igreja renovada ou diversa. Como chegar
a uma posição equilibrada?
Por sua fidelidade à Igreja, da qual é expressão, a catequese foi acusada de contribuir
para o enrijecimento dos diversos guetos confessionais e assim favorecer a
intolerância e o preconceito outras confissões, religiões e ideologias.
Seria admissível dizer que a catequese, por seu próprio caráter eclesial, é um obstáculo
para o movimento ecumênico e para a paz religiosa e social em uma sociedade
pluralista e democrática.
Esse levantamento de problemas, fruto da experiência, justifica um esforço de
aprofundamento da dimensão eclesial da catequese.

2. PALAVRA DE DEUS, IGREJA E CATEQUESE

As relações entre palavra de Deus, resposta de fé e realidade eclesial são múltiplas,


essenciais e profundas. Quanto à identidade da catequese apontamos algumas dessas relações:

200
2.1 A Igreja depende totalmente da palavra de Deus

Saliente-se, antes de mais nada, o papel ativo e fundamental da palavra de Deus em todos
os momentos do dinamismo eclesial:
A palavra faz nascer a Igreja: a Igreja, ekklesia , é antes de tudo convocação,
assembleia dos que foram chamados, comunidade daqueles que ouvem e seguem a
Palavra. A Igreja nasce da ação evangelizadora de Jesus e dos Apóstolos (EN n.
15). É a palavra que convoca e faz nascer a Igreja como comunidade de crentes (cf. At
2,41,47), como multidão de crentes (At 4,32).
A palavra edifica e faz crescer a Igreja: o crescimento da Igreja é sempre um crescer e
multiplicar-se da palavra (cf. At 6,7: a palavra do Senhor crescia ; 12,24: a palavra de
Deus crescia e se multiplicava ). A Igreja vive e se constrói quando a palavra de Cristo
permanece entre vós em toda a sua riqueza (cf. Cl 3,16).
A palavra renova, purifica, julga a Igreja: é a função profética e de julgamento da
palavra de Deus que se exerce mesmo em relação à Igreja. As comunidades eclesiais
devem sempre escutar o que o Espírito diz à Igreja (Ap 2,7;2,11 etc.) em atitude de
contínua conversão.
Dessa dependência da Igreja em relação à palavra de Deus deriva a atitude de contínua
escuta da palavra que a deve caracterizar. A Igreja precisa sempre ser evangelizada (EN n.
15) e de modo nenhum, portanto, pode se sentir dona da palavra, como se a gerir um
patrimônio de que pudesse dispor a seu bel-prazer, com plena liberdade de interpretação. O
magistério eclesial não é superior à palavra de Deus, mas dela é servidor, ensinando apenas
aquilo que foi transmitido (DV n. 10): é uma exigência fundamental e de grande
importância no exercício da palavra eclesial.

2.2 A palavra de Deus se encarna e vive na Igreja

Por outro lado, porém, a Igreja tem um papel ativo e essencial para a atualização e a
transmissão da palavra de Deus no mundo (DGC n. 42-45). Assim como existe uma lei da
salvação em comunidade ,2 existe também uma lei da palavra em comunidade que consagra a
mediação eclesial na difusão da palavra de Deus entre os seres humanos. É interessante apontar
alguns momentos e aspectos mais significativos desse papel fundamental.

2
Deus quer santificar e salvar os seres humanos não individualmente e isoladamente, mas quer fazer deles um
povo, que o reconheça na verdade e fielmente o sirva : LG n. 9.
201
2.2.1 Toda a Igreja é palavra

Enquanto sacramento universal de salvação (cf. LG n. 48; AG n. 1; GS n. 45) a Igreja


empenha-se em um anúncio e em um testemunho que envolvem a totalidade de seu ser e de sua
atuação. Nesse sentido a revelação realizada em Cristo se torna, na Igreja, Tradição no sentido
aberto e dinâmico da Dei Verbum:

Aquilo que foi transmitido aos Apóstolos compreende tudo quanto contribui para a conduta santa
do Povo de Deus e para o aumento da fé, e assim a Igreja, em sua vida e em seu culto, perpetua e
transmite a todas as gerações tudo o que ela é, tudo aquilo em que ela crê (DV n. 8).

Essa Tradição apostólica se perpetua na Igreja e por meio da Igreja. E toda ela, pastores e fiéis,
vela por sua conservação e transmissão (DGC n. 43)

A encarnação da palavra na realidade eclesial constitui ao mesmo tempo uma


vantagem e um risco, um dom e uma tarefa sempre aberta, uma missão altíssima mas sempre
exposta ao perigo da ambig idade e da tergiversação. Para além das palavras que a Igreja
proclama, existe a palavra que ela é, palavra que muitas vezes está em dissonância com o que
quer transmitir de forma explícita.

2.2.2 No ministério da Igreja está presente e operante a palavra de Deus

Como dissemos, na Igreja existe o ministério da palavra (At 6,4) desejado por Cristo
(cf. Jo 20,21; Mt 20,10-20; Mc 16,15-20). A Igreja está consciente do fundamento desse
ministério, sabe que sua palavra vem de Cristo, sabe que através dela a palavra de Deus em
Cristo se faz presente e operante. Na pregação eclesial está presente e atuante a própria palavra
de Deus, com toda sua força salvífica e transformadora, com sua dinâmica e eficácia.
O testemunho do NT a esse respeito é bastante rico e explícito, em particular nos
ensinamentos de São Paulo.3 Nas cartas paulinas emerge com vigor a consciência de que na
palavra eclesial é o próprio Deus que se apresenta com sua palavra, com toda a sua eficácia (cf.
1Ts 2,13; 2Cor 5,19-20). Para Paulo, evangelizar não significa apenas comunicar uma
mensagem de salvação, mas antes procurar o cumprimento do Evangelho de Cristo , 4
realizar o acontecimento da palavra de Deus .5

3
Para um aprofundamento do tema cf. H. Schlier, La parola di Dio: teologia della predicazione secondo il Nuovo
Testamento. Roma, Paoline, 1963; J. Dupont, La parole de Dieu suivant saint Paul , in: La Parole de Dieu en
Jésus-Christ. Tournai, Casterman, 1964, p. 68-84; J. Murphy - O´Connor, La prédication selon Saint Paul. Paris,
Gabalda, 1966.
4
S. Lyonnet, La nouveauté de l´Évangile , Spiritus 10 (1969), p. 348.
5
P. Benoit, citado por S. Lyonnet, ibid. Nas Diretrizes da ação evangelizadora da Igreja no Brasil (2003-2006)
da CNBB se lê: O Concílio Vaticano II colocou conscientemente o ministério da Palavra de Deus em primeiro
lugar. Paulo louvava os cristãos de Tessalônica que a tinham recebido não como palavra humana, mas como ela é
de fato: palavra de Deus, que age em vós que acreditais (1Ts 2,13). A escuta e a acolhida da Palavra desde que
traduzidas coerentemente em atos (cf. Mt 7, 21-27) são fundamento da vida e da missão da Igreja (CNBB,
Diretrizes gerais 2003-2006, n. 20).
202
2.2.3 Somente na Igreja a palavra de Deus é devidamente ouvida e interpretada

Não se trata de uma tarefa confiada aos indivíduos ou ligada a aptidões individuais. A
palavra foi confiada à Igreja na sua totalidade e na articulação de seus ministérios, e só com esta
autoridade se garante a presença do Espírito que conduz à verdade plena (cf. Jo 16,13). Na
tarefa de reflexão e interpretação, desempenha um papel primordial o magistério dos
pastores (cf. DV n. 10), juntamente com a responsabilidade dos outros ministérios, como os dos
exegetas e teólogos (cf. DV n. 23) e em geral de todos os membros do povo de Deus (cf. LG
12,35; AA 6).

2.3 A catequese, ação eclesial

Enquanto serviço da palavra de Deus para a educação da fé, a catequese apresenta sempre
os traços de eclesialidade da palavra e da fé. Existe, portanto, uma ligação estreita entre Igreja e
catequese, de modo que a cada concepção eclesiológica corresponde uma visão da catequese, e
toda forma de catequese implica uma eclesiologia. Pode-se dizer, de forma análoga ao
conhecido princípio que liga eucaristia e Igreja,6 que se é verdade a Igreja faz a
catequese , é verdade também que a catequese faz a Igreja .

2.3.1 A Igreja faz a catequese (a Igreja como sujeito da catequese)

É a afirmação da dimensão eclesial da catequese, dimensão essencial, que constitui sua


identidade. Não se pode conceber um exercício da função catequética que não se reporte à Igreja
como seu sujeito indiscutível:

O reportar-se à Igreja é determinante para todos os problemas concretos relativos ao


exercício da catequese: formação dos responsáveis, escolha dos conteúdos e dos métodos,
estruturas de realização, critérios de avaliação etc. Na tarefa eclesial tomada em seu
conjunto, a catequese tem um papel absolutamente primordial (CT n. 15), tarefa muito
absorvente que envolve o testemunho positivo e negativo que a Igreja dá de si mesma
com sua vida e com sua presença (cf. RdC n.145).
Em âmbito de encarnação local, a eclesialidade da catequese se expressa sobretudo no
papel fundamental da Igreja particular e da comunidade cristã, que constituem o sujeito
principal e, portanto, natural da catequese (cf. DGC, quinta parte).

6
Cabe lembrar a expressão de H. De Lubac: C´est l´Église qui fait l´Eucharistie, mas c´est aussi l´Eucharistie qui
fait l´Église , in: Méditation sur l´Église. Paris, Aubier, 1953, p. 113.
7
A fé é vivida e transmitida dentro de uma comunidade: por isso a catequese é obra de toda a comunidade
(Brasil CR n. 214; cf. n. 118, 144).
203
2.3.2 A catequese faz a Igreja (a Igreja como objeto e meta da catequese)

A atividade catequética não aponta apenas para o crescimento dos indivíduos na fé: sua
tarefa tem também um horizonte eclesial. Na verdade, a catequese constrói a Igreja, de diversos
pontos de vista: porque é um lugar de educação e de experiência de Igreja; porque representa
um fator de renovação da Igreja; porque deve se colocar a serviço de um projeto convincente de
Igreja.
A catequese é educação para o sentido da Igreja. Um maduro e equilibrado sensus
Ecclesiae é próprio, como vimos, do modelo de cristão a ser promovido na catequese.
Educar para a pertença e para a identificação afetiva e efetiva com a Igreja é uma tarefa
muito árdua nos dias atuais, no contexto de crise das pertenças e das instituições.
A catequese é um lugar de experiência de Igreja.8 Ela não se faz apenas na Igreja e nem
fala apenas da Igreja, mas constitui, em si mesma, uma experiência de Igreja, positiva
ou negativa, dependendo de sua qualidade. É importante, pois, que a catequese permita
uma experiência positiva de Igreja, com o caráter imediato e de valor educativo próprios
de toda experiência verdadeira.
A catequese deve ser um fator de renovação da Igreja. Dado que participa, a seu modo,
da função profética e crítica da palavra de Deus, ela desenvolve, em relação à Igreja,
uma missão de renovação e constitui um estímulo para sua contínua purificação e
reforma. Atualmente tem-se uma viva percepção do papel da catequese na edificação
de toda a comunidade eclesial e de sua função crítica no interior da Igreja.9
A catequese deve promover um projeto convincente de Igreja. No horizonte ideal da
catequese deve-se poder entrever um projeto estimulante de Igreja renovada e
convincente. Is o é especialmente urgente, nos dias de hoje, no trabalho com jovens e
adultos, que devem nutrir atitudes de fidelidade, não apenas à Igreja do passado e do
presente, mas também à Igreja do futuro, isto é, ao projeto de Igreja que o
Espírito convida a promover.

8
Porque a pessoa se realiza no relacionamento e no amor, o seguimento [de Jesus] realiza-se na comunidade
fraterna. Seguir a Jesus é juntar-se, fraternalmente, aos outros discípulos. Assim a fé, nascida na comunidade da
Igreja, renova permanentemente a própria comunidade a partir da sua raiz profunda, a comunhão com Deus, e gera
novas comunidades eclesiais (Brasil CR n. 65). Cf. Espanha CC n. 253.
9
A vida na Igreja, à qual a catequese deve levar, não é entendida como adaptação, sem problemas, à situação atual
da própria Igreja. Não apenas o indivíduo cristão necessita de um espaço de liberdade para o seu desenvolvimento
pessoal; também para a Igreja é de importância vital que aqueles que a ela pertencem ou desejam pertencer
contribuam com sua própria capacidade e criatividade. A catequese deve ajudar os indivíduos crentes a
redescobrir, a dar relevo e a traduzir, na realidade de vida, tudo o que se refere à vida da Igreja : Alemanha KWK,
A.3.5. Cf. Puebla n. 995.

204
3. CATEQUESE E NOVAS PERSPECTIVAS ECLESIOLÓGICAS

Para um aprofundamento da dimensão eclesial da catequese é importante levar em


consideração a mudança eclesiológica realizada pelo Vaticano II e as novas tendências e
instâncias que se afirmaram nesse campo nas últimas décadas. Na verdade, tudo isso tem
notáveis consequências sobre a concepção e modalidade da ação catequética.

3.1. A mudança eclesiológica do Vaticano II

O Concílio Vaticano II representou um momento decisivo na renovação da


eclesiologia. Ainda que em seus documentos coexistam elementos de tendências teológicas
diversas,10 não há dúvida de que o Concílio continua sendo um avanço irreversível na
renovação da eclesiologia, assinalando a passagem de uma concepção institucional e jurídica da
Igreja a uma eclesiologia de comunhão e de serviço ao mundo. Apontamos, resumidamente, os
aspectos mais característicos dessa mudança.

10
Cf. A. Acerbi, Due ecclesiologie: ecclesiologia giuridica ed ecclesiologia di comunione nella Lumen
Gentium . Bolonha, Dehoniane 1975. É sabido que, do ponto de vista teológico, ainda existem muitos
pontos a esclarecer na doutrina conciliar, de modo que se pode falar de confusão eclesiológica e de atrofia
doutrinal : cf. A. Anton, Ecclesiologia postconciliar: speranze, risultati e prospettive , in: R. Latourelle (ed.),
Vaticano II: bilancio e prospettive venticinque anni dopo (1962-1987). 1 vol. Assis, Cittadella, 1987, p. 363-64.

205
3.1.1 O modelo eclesiológico predominantemente institucional e jurídico

É o modelo considerado pré-conciliar (embora ainda esteja vigente em muitos lugares),


chamado também piramidal , hierárquico ,11 sociojurídico .12 Nessa concepção, a Igreja se
apresenta como societas perfecta, com consciência fortemente eclesiocêntrica, em que
predominam os aspectos jurídicos e institucionais. No que se refere à estrutura de base do
ministério profético, o modelo pode ser assim esquematizado:

11
Cf. Y. Congar, Ministeri e comunione ecclesiale. Bolonha, Dehoniane, 1973, p. 12.
12
Cf. A. Anton, Ecclesiologia postconciliare, p. 368.

206
A Igreja é dividida em dois setores bem distintos e desiguais: a hierarquia e o povo, os
pastores e o rebanho, os eclesiásticos e os leigos, a Igreja docente e a discente. A
hierarquia é o elemento ativo e responsável; o povo é receptor passivo, como o diz com
clareza uma citação de São Pio X:

Portanto, esta sociedade [a Igreja] é, por sua força e natureza, desigual; com efeito, ela
compreende duas ordens de pessoas: os pastores e o rebanho, isto é, aqueles que se
encontram nos diversos graus da hierarquia, e a multidão dos fiéis; e essas ordens são tão
absolutamente distintas entre si, que só na hierarquia reside o direito e a autoridade para
mobilizar e orientar os membros para o objetivo da sociedade; quanto à multidão, não tem
outro direito senão o de deixar-se conduzir e, docilmente, seguir os seus pastores.13

No que diz respeito à transmissão da palavra, impera o esquema vertical: Cristo


Fundador [Depósito revelado] papa bispos sacerdotes povo cristão. Do
princípio fontal que é Cristo, a palavra é confiada por via hierárquica aos pastores da
Igreja, por meio dos quais segundo uma ordem decrescente de autoridade chega
finalmente à multidão dos fiéis.
O papel dos leigos é bastante subestimado. Eles são considerados em geral como objetos
da cura pastoral e do ensinamento dos pastores, ou relegados ao papel de meros
colaboradores executores.
Nesse modelo encontra-se muito relativizado o papel dos carismas e dos ministérios
leigos. No ministério da palavra impera o estilo de monopólio hierárquico: não
se reconhecem as formas de profetismo particular , e mesmo o papel dos teólogos
encontra-se em parte neutralizado, em parte marginalizado.

13
Encíclica Vehementer nos (11/2/1906), in: Acta Sanctae Sedis 39 (1906), p. 8-9. Cf. Y. Congar, La
situazione ecclesiologica al tempo dell´Ecclesiam Suam , Il Regno 26 (1981), n. 5, p. 172.

207
3.1.2 A mudança conciliar: eclesiologia de comunhão e de servi o

A novidade eclesiológica trazida pelo Concílio pode ser resumida reportando-se às


categorias de koinonia (comunhão) e de diaconia (serviço ao mundo), no sentido
missionário e ecumênico.14 Apresentamos aqui alguns de seus traços característicos:

A Igreja apresenta-se essencialmente como koinonia, comunhão , fraternidade :

Sem dúvida, o conceito-chave para interpretar a eclesiologia do Vaticano II e aquele que


resume melhor os resultados presentes na sua doutrina eclesiológica e na renovação da Igreja é
o conceito de comunhão . Concentrar a teologia do mistério da Igreja nesse conceito de
koinonia talvez tenha sido a inovação de maior transcendência do Vaticano II para a
eclesiologia pós-conciliar e para a vida da Igreja.15

Colocando no centro o tema do povo de Deus e antepondo-o ao do ministério


hierárquico (cf. LG cap.2), o Concílio salientou a substancial igualdade e fraternidade de
todos os membros da Igreja no que se refere à dignidade e à ação comum a todos os fiéis no
edificar do corpo de Cristo (LG n. 32).16

14
Cf. L. Sartori, Chiesa . In G. Barbaglio - S. Dianich (eds.), Nuovo izionario di eologia. Alba,
Paoline, 1977, p. 127.
15
A. Anton, Ecclesiologia postconciliare, p. 369.
16
M. Dujarier redescobriu o valor tradicional e originalmente cristão do conceito de fraternitas para
designar a Igreja: M. Dujarier, L´Église-Fraternité. I: les origines de l´expression adelphotès-
fraternitas aux trois premiers siècles du christianisme. Paris, Cerf, 1991.
208
Reafirma-se a participação comum de todo o povo de Deus, animado pelo Espírito, na
missão profética de Cristo (LG n. 35). O esquema piramidal é substituído por
uma imagem oval congregante que salienta a presença vivificante do Cristo, por meio
do Espírito, em toda a realidade comunitária da Igreja, segundo a linha Cristo-Espírito
comunidade eclesial ministérios e carismas.17
Igreja inteiramente ministerial na variedade dos ministérios e carismas. Na nova
visão, substituem-se os binômios hierarquia-fiéis clero-laicato , Igreja docente-
Igreja discente , por demais inadequados,18 pela articulação comunidade-ministérios e
carismas , mais fiel ao dinamismo global da realidade eclesial. Os ministérios
ordenados, sempre necessários, são vistos em sua ligação orgânica com toda a
riqueza dos ministérios no interior de uma comunidade de Igreja toda ministerial.
Redescobrem-se e revalorizam-se também os carismas (LG n. 12): mesmo que esses
termos às vezes adquiram significados diferentes,19 indicam essencialmente os diversos
dons do Espírito para o serviço e edificação da Igreja.
Abertura ecumênica: também quanto a isso o Vaticano II representa uma mudança
radical, expressa no decreto Unitatis Redintegratio e nos documentos oficiais
subseq entes do magistério pontifício e do Secretariado Romano para a unidade dos
cristãos,20 com indicações concretas sobre o novo clima de aproximação e de
colaboração a serviço da causa da unidade dos cristãos.21
Redescoberta da Igreja particular que, como proclamou o Vaticano II, não se limita a ser
parte ou província ( diocese ) da grande instituição, e tampouco o bispo deve ser
considerado como funcionário ou vigário do Papa (LG n. 27): é todo o mistério da Igreja
de Cristo que está verdadeiramente presente nas legítimas comunidades locais de
fiéis, as quais, ligadas aos seus pastores, também são chamadas Igreja no Novo
Testamento (LG n. 26). Toda a Igreja, una, santa, católica e apostólica, encarna-se e se
concentra em todas as comunidades locais (LG n. 25), tornando-se visível no tempo e
no espaço. Pode-se dizer que a Igreja particular é de certa forma a Igreja toda , ainda
que não seja toda a Igreja .22

17
Cf. Y. Congar, Introdução ao mistério da Igreja. São Paulo, Herder, 1966.
18
CNBB. Educação da fé e ministérios: conclusões do Encontro Nacional de Pastoral Vocacional . Revista de
Catequese 1 (1978), n. 3, p. 82-85; Diocese de Osasco, Os ministérios na Igreja . Revista de Catequese 17
(1994), n. 66, p 37-39; A. Antoniazzi, Vocações e ministérios na Igreja , Revista de Catequese 6 (1983), n.
23, p. 10-19; Marcelo Guimarães, A catequese numa Igreja que busca ser toda ministerial , Revista de
Catequese 11 (1988), n. 42, p. 70-71. Cf. H. Legrand, I ministeri nella Chiesa , Catechesi 45 (1876), p. 18-20; B.
Forte, Laicato e laicità. Gênova, Marietti, 1986, p. 82.
19 Sobre o tema dos carismas, cf. L. Sartori, Carismi , in: G. Barbaglio - S. Dianich (eds.), Nuovo izionario di
ologia. Alba, Paoline, 1977, p. 79-98; A. Vanhoye, Il problema biblico dei carismi dopo il Vaticano II , in: R.
Latourelle (ed.), Vaticano II: bilancio e prospettive. Vol. 1, p. 389-413. F. Catão, Carismáticos, um sopro de
renovação. São Paulo, Salesiana, 1995 [é mais um estudo teológico sobre os carismas na Igreja do que
propriamente sobre o movimento carismático].
20
Cf. João Paulo II, Carta encíclica Ut unum sint (25/5/1995), in: Enchiridion Oecumenicum:
documenti del dialogo teologico interconfessionale. 4 vols. Bolonha, Dehoniane, p. 1986-96.
21
Para uma visão orgânica da eclesiologia em perspectiva ecumênica, cf. G. Ceretti, Per un´ecclesiologia
ecumenica. Bolonha, Dehoniane, 1996. Cf. Georges Tavard - Euclides Luís Calloni, A Igreja, comunidade de
salvação: uma eclesiologia ecumênica. São Paulo, Paulus, 1998.
22
Cf. L. Boff, Eclesiogênese: as comunidades eclesiais de base reinventam a Igreja. Petrópolis, Vozes,
1977.
209
Igreja diaconal , a serviço do mundo. A comunidade eclesial não é um fim em si
mesma, nem vive voltada apenas para si mesma. Enquanto sacramento universal de
salvação ela existe e age voltada ao grande projeto do Reino, totalmente voltada para o
serviço de um mundo que o amor salvífico de Deus quer transformar em sua família.
Por isso, a Igreja repensa as suas funções e ministérios considerando a realidade
histórica do mundo e das pessoas em meio às quais deve testemunhar a salvação.
Também o serviço da palavra assume um relevo particular nessa perspectiva, pondo no
centro a tarefa da evangelização e do testemunho, para a salvação integral do ser
humano.

3.2 Desenvolvimentos eclesiológicos pós-conciliares

A reflexão eclesiológica é um campo cada vez mais aberto, dinâmico, em busca de novos
aprofundamentos e desenvolvimentos. Muitos pontos fundamentais para a vida da Igreja ainda
precisam ser esclarecidos (a colegialidade episcopal, o exercício do papado, o papel dos leigos,
o reconhecimento da mulher, a relação Igreja-mundo etc.). A nova concepção eclesiológica
inspirada no Vaticano II luta com dificuldades para afirmar-se em muitos de seus aspectos e
chega a sofrer retrocessos.23 Mas não faltam tendências promissoras e fecundas de consequências,
no que se refere ao exercício da catequese.
3.2.1 O anelo da

A redescoberta e centralidade da koinonia , como coração palpitante da realidade


eclesial, adquire os contornos de um vasto movimento comunional que permeia todos os níveis
da estrutura da Igreja. Se hoje a Igreja se mostra muito mais como sociedade do que como
comunidade , são muitos os esforços e as esperanças de poder realizar, em todos os níveis,
uma verdadeira Igreja-comunhão . O quadro que apresentamos a seguir resume-lhe as
tendências e aspirações.

23
Cf. G. Ceretti, Per un´ecclesiologia ecumenica; A. Anton, Ecclesiologia postconciliare.
210
DINAMISMO COMUNITÁRIO DA IGREJA

SITUAÇÃO ATUAL: PERSPECTIVAS DE RENOVAÇÃO:


Koinonia eclesial Koinonia eclesial de viés
de viés COMUNITÁRIO EVANGELIZADOR
INSTITUCIONAL E ( comunidade anúncio e testemunho)
FUNCIONAL
( sociedade )
Estruturas COMUNITÁRIAS Valores de COMUNHÃO

1. Nível UNIVERSAL Rumo à COMUNHÃO Ecumenismo: Ut unum sint


DE IGREJAS Superação do centralismo
Igreja e confissões (eclesiologia de comunhão)
Igreja Católica

2. Nível REGIONAL Rumo formas inculturadas Colegialidade


De IGREJAS LOCAIS Corresponsabilidade
Regiões e províncias (Patriarcados) Inculturação
eclesiásticas Catolicidade
Patriarcados
Conferências episcopais
Regiões pastorais

3. Nível PARTICULAR Rumo às IGREJAS Eclesiologia de comunhão e


PARTICULARES De serviço
Dioceses Ministérios e carismas
Decanatos, prefeituras Rumo às COMUNIDADES Unidade no pluralismo
vicariatos etc. LOCAIS
Paróquias ( comunhão de comunidade )

4. Nível da BASE
ECLESIAL
Rumo às COMUNIDADES Comunidade na medida umana
Participação, liberdade,
Grupos, associações, E GRUPOS DE BASE
espontaneidade, acolhimento,
Movimentos
evangelização e testemunho
Comunidade de base

211
Em âmbito ecumênico e universal
Em âmbito universal observa-se um duplo movimento convergente: das diversas
confissões cristãs rumo à unidade (movimento ecumênico) e de descentralização no interior da
Igreja católica (promoção das Igrejas locais).
No campo ecumênico, a busca da comunhão continuou a dar os seus frutos nas últimas
décadas, com alternância de avanços e recuos. Cumpre assinalar muitas iniciativas comuns,
reflexões e documentos das Comissões mistas entre as Igrejas, encontros interconfessionais,
celebrações comuns etc. Certamente desapareceram muitos preconceitos e atitudes de
desconfiança.24
Mesmo no campo eclesiológico o ecumenismo está enfrentando as questões mais
decisivas para a causa da unidade.25 E aqui se abrem atualmente perspectivas novas e
promissoras, graças à redescoberta da koinonia como eixo central de uma renovada eclesiologia
de comunhão:

A noção de koinonia (comunhão) se tornou fundamental para revigorar uma concepção comum
da natureza da Igreja e de sua unidade visível. [...] Tendo permanecido em uso nos últimos
séculos, atualmente o termo foi recuperado no movimento ecumênico como uma chave para a
26
compreensão da natureza e do escopo da Igreja.

A noção de koinonia permite aos cristãos separados reconhecer que eles compartilham um grau
profundo de comunhão, baseado na sua participação comum na vida e no amor de Deus, Pai,
Filho e Espírito Santo. O caminho da unidade é o de tornar essa comunhão cada vez mais
27
visível.

É importante também o conceito de diversidade reconciliada , especialmente caro à


sensibilidade dos protestantes. Esse modelo de comunhão supõe a aceitação, da parte de
todos, da identidade confessional das diversas Igrejas, mas com o desejo de superar o
isolamento atual e de abrir-se às outras comunidades para chegar à plena comunhão.28
No interior da Igreja católica, essa busca da comunhão tende à superação do
centralismo romano e à realização da Igreja como .29 Na dialética
entre Igreja universal e Igrejas particulares, deseja-se uma realização mais convincente da
eclesiologia de comunhão, para que a Igreja, na sua vastidão ecumênica e católica, se
apresente, de fato, como uma comunhão de Igrejas particulares na unidade da fé e do
amor .30

24
Cf. J. Bosch Navarro, Ecumenismo y catequesis , Nuevo Dic. Cat., p. 718.
25
Cf. G. Ceretti, Per un´ecclesiologia ecumenica, p. 13.
26
CEC-Fede e Costituzione, La natura e lo scopo della chiesa , Il Regno-Documenti 44 (1999), n. 9, p. 48.
27
Ibid., p. 322.
28
Cf. J. Bosch Navarro, Ecumenismo y catequesis, p. 720.
29
Cf. A. Anton, Ecclesiologia postconciliare, p. 288.
30
Y. M. Congar, Christianisme comme foi et comme culture , in: Evangelizzazione e culture. Roma, Pont. Univ.
Urbaniana, 1976, p. 83-103. Cf. as interessantes perspectivas ecumênicas de H. Fries - K. Rahner, Unione delle
Chiese: possibilità reale. Brescia, Morcelliana, 1986, e J.-M. R. Tillard, Église d´Églises: l´ecclésiologie de
communion. Paris, Cerf, 1987.

212
Em âmbito regional e nacional
Na configuração eclesiástica atual existem estruturas supradiocesanas (patriarcados,
regiões e províncias eclesiásticas etc.) que deverão tornar-se verdadeiras Igrejas locais,
superando o modelo atual centralizado. Essas Igrejas locais, que poderão também retomar a
tradição dos patriarcados ,31 tornando-se encarnações significativas da Igreja nos diversos
contextos étnico-culturais, por meio de uma efetiva inculturação da experiência cristã e eclesial,
em todos os seus aspectos (teologia, liturgia, disciplina e práxis eclesial, estrutura ministerial
etc.).

Em âmbito local (diocesano)


No que concerne às dioceses e às suas subdivisões supraparoquiais (setores,
circunscrições, decanatos, vicariatos etc.), a necessidade mais urgente é a de realizar de fato a
rica identidade eclesial da Igreja particular. Esta, como já lembramos, não se reduz a ser
parte ou província ( diocese ) da grande Igreja, mas é a Igreja toda encarnada em um lugar.
Nessa perspectiva, podemos esperar que as dioceses se tornem verdadeiras igrejas , de modo
efetivo e pastoralmente significativo, realizando, na realidade concreta, a eclesiologia de
comunhão postulada pelo Concílio.

Em âmbito paroquial
Também as comunidades locais, presididas pelos presbíteros, são encarnações
históricas da única Igreja de Deus (LG n. 28), e devem viver plenamente a experiência eclesial,
para que possam ser dignamente chamadas pelo nome com o qual foi distinguido apenas o
povo de Deus, isto é Igreja de Deus (LG n. 28). A paróquia é hoje objeto de profunda
reavaliação, em busca dos valores da comunhão: participação, corresponsabilidade, unidade no
respeito da diversidade etc. Eis o imperativo: que as paróquias se tornem verdadeiras
comunidades . Ou antes, uma vez que em seu interior multiplicam-se os grupos e as
comunidades menores, as paróquias são chamadas hoje a se tornar comunidade de
comunidades (cf. DGC n. 258; CAL n. 188).

31
Cf. M. Sotomayor, Iglesias en comunión presidida por el obispo de Roma: consideraciones históricas sobre los
antiguos patriarcas y las actuales conferencias episcopales , Proyección (Granada) 24 (1977), p. 115-124. Para
uma visão do ecumenismo no Brasil, cf. Elias Wolff, Caminhos do ecumenismo no Brasil: história, teologia,
pastoral. São Paulo, Paulus, 2002; Sandra F. Ribeiro, Ecumenismo: simples tolerância ou um estilo de vida? São
Paulo, Cidade Nova, 2002.
213
Na base eclesial: o surgimento das pequenas comunidades
Atualmente, a base do tecido eclesial é permeada de esforços variados de criação de
novas formas de comunidade, em geral pequenas, nascidas do desejo de viver a experiência
cristã em lugares de autêntica comunhão. Elas surgem praticamente em toda parte, com formas
e nomes diversos, e devem ser saudadas como um sinal dos tempos e um fruto do Espírito (cf.
EN n. 58; DGC n. 263). Muitas Igrejas locais fizeram-nas objeto de opções pastorais explícitas,
e também em nível universal se reconheceram os seus valores eclesiais. Elas são um terreno
especialmente fecundo para a renovação da catequese.32

3.2.2 A Igreja a serviço do mundo

A orientação eclesiológica do Concílio por uma Igreja a serviço do mundo,


amadurecida sobretudo na Gaudium et Spes, teve no período pós-conciliar um desenvolvimento
relevante e um aprofundamento posterior, principalmente nas Igrejas mais empenhadas na
promoção do ser humano e na luta contra a pobreza.33 Delineia-se, assim, o modelo da Igreja-
serviço , que salienta a orientação transeclesial da práxis eclesial e redescobre novos conteúdos
e urgências no seio da diaconia.34

3.3 Novas perspectivas para a catequese

Todas essas evoluções eclesiológicos se refletem de forma bastante evidente no modo de


entender e de realizar a catequese, que vê sua renovação ligada à assunção de um modelo de
Igreja atualizado e convincente.

32
Falaremos mais explicitamente sobre a catequese comunitária e de grupo no capítulo 8.
33
Para uma visão aprofundada dessa linha eclesiológica, cf. CNBB, Diretrizes gerais da ação evangelizadora da
Igreja no Brasil. São Paulo, Paulus, 2003, particularmente a introdução (n. 1-2) (Documentos da CNBB n. 71). Cf.
Luís Gallo, Uma Igreja a serviço dos homens: contribuições para uma compreensão atual da Igreja. São Paulo,
Salesiana, 1984.
Brasil CR n. 144, 214.
34
Remetemos ao capítulo 7 para uma consideração mais explícita dessa perspectiva.
214
3.3.1 A catequese no modelo eclesiológico tem um viés predominantemente institucional e
jurídico

Esse modelo se faz acompanhar de um estilo pastoral, fortemente intraeclesial e


clerical, que já não oferece nenhuma garantia de sucesso. (cf. cap. 2). É um modelo, por
outro lado, que veicula uma experiência e uma imagem de Igreja muito negativa, enganosa,
fonte de desamor e de distanciamento da parte de muitos, principalmente os jovens.35
Infelizmente se trata de uma visão ainda muito presente nos dias de hoje, e is o compromete
gravemente uma séria renovação da pastoral e da catequese.
Nesse modelo eclesiológico, a catequese assume em geral o clássico paradigma
tridentino : concebida sobretudo como ensino doutrinal, organizada de forma marcadamente
hierárquica em todos os seus elementos (programas, conteúdos, agentes, métodos etc.). O recurso
aos leigos é claramente subsidiário: em geral para suprir a falta de sacerdotes e com funções
subordinadas de colaboração. A práxis catequética muitas vezes é presa da uniformidade
e do imobilismo conteudístico e metodológico, de estilo paternalista, pouco sensível aos
valores do pluralismo e da criatividade. A catequese desempenha normalmente um papel
conservador, com vistas a perpetuar a ordem tradicional. E caracteriza o estilo e o
sistema catequético que, como lembramos no início (cap.1), encontra- se em séria crise.

3.3.2 Na nova perspectiva eclesiológica

Em um contexto eclesiológico renovado (modelo de comunhão e de serviço), a catequese


constitui, acima de tudo, um serviço articulado da palavra de Deus para o crescimento da fé,
assumido corresponsavelmente por toda a comunidade eclesial e diferenciado segundo a
diversidade d ministérios e carismas:

A catequese é tarefa de vital importância para toda a Igreja. Essa tarefa cabe verdadeiramente a
todos os fiéis, cada um de acordo com suas próprias condições de vida e segundo seus dons
particulares e carismas. Na verdade, todos os cristãos, em virtude dos sacramentos do
batismo e da crisma, são chamados a anunciar o Evangelho e a se sentirem responsáveis pela fé
dos irmãos em Cristo, principalmente das crianças e dos jovens.36

35
Cf. L. Gallo, Il senso di Chiesa , in: M. Midali - R. Tonelli (eds.), L´esperienza religiosa dei giovani
2/3 pprofundamenti. Leumann (Turim), Elledici, 1996, p. 120.
36
Mensagem do Sínodo de 1977, p. 12; cf. Puebla n. 993 e 27; Alemanha KWK A 4; DGC
n. 219.
215
Daí, deriva, pois, uma concepção orgânica e pluralista da catequese, que já não se
pode reduzir a um modelo uniforme. A catequese se torna um serviço único e
diferenciado (DGC n. 219), exercido de formas diversas e originais, segundo a multiplicidade
dos ministérios e dos carismas: catequese dos pastores, dos religiosos, dos pais, dos
catequistas leigos, dos grupos e associações etc. Toda forma tem sua peculiaridade e
seu fundamento carismático-sacramental e como tal merece ser reconhecida e estimulada,
na correta organização da vida eclesial. Descobrem-se e valorizam-se, assim, as
potencialidades catequéticas da comunidade, na variedade dos carismas da palavra de fé
na Igreja. Seguindo o exemplo das Igrejas apostólicas, que demonstram uma grande riqueza
de ofícios da palavra (anúncio, apologia, ensinamento, exortação, advertência, catequese,
doutrina) edeministrosdapalavra(missionários itinerantes, apóstolos, profetas, doutores,
diáconos etc.), redescobrem-se e valorizam-se os carismas e ministérios do povo de
Deus, a serviço da evangelização e da renovação eclesial. É necessário superar, nesse
sentido, a situação de empobrecimento e de
tração unilateral que se consolidou ao longo da história.37
Nessa perspectiva eclesiológica, a catequese não pode estar a serviço do , isto é,
da conservação da Igreja tal como se encontra e da práxis pastoral tradicional. Ela deve
desempenhar uma função claramente renovadora, para um projeto novo de Igreja e um estilo
pastoral voltado para a evangelização. Uma nova catequese em uma Igreja renovada: assim
se pode resumir o alcance catequético das novas tendências eclesiológicas. Mas vejamos
agora mais detalhadamente as características dessa concepção.

4. A CATEQUESE, AÇÃO DE IGREJA ( A IGREJA FAZ A CATEQUESE )

Na rica articulação da Igreja-comunhão, a catequese assume a conotação original própria


dos diversos lugares e sujeitos eclesiais.

4.1 Os lugares eclesiais da catequese

São muitos os lugares em que se realiza a experiência eclesial, e todos são, de algum
modo, lugares de catequese. Mas de um ponto de vista eclesiológico, o primado cabe, como
sujeito verdadeiro e próprio da atividade catequética, à Igreja particular (cf. DGC quinta parte),
vista não num sentido estático-litúrgico, mas antes dinâmico-eclesial, e aberta, como ponto de
referência, às variedades de expressões e realizações da comunhão eclesial em seus diversos
níveis.

37
Cf. B. Van Leeuwen, La partecipazione comune del Popolo di Dio all´ufficio profetico di Cristo , in: G.
Baraúna (ed.), A Igreja do Vaticano II. Petrópolis, Vozes, 1965; G. Barbaglio et al., La predicazione dei laici:
comunicazione della fede e nuovi misteri della parola. Brescia, Queriniana, 1978; Concilium 21 (1985), n. 4
( L´autorità dottrinale dei fedeli ).
216
4.1.1 A centralidade da Igreja particular

A Igreja particular ou diocese, como verdadeira encarnação da Igreja e de sua


catolicidade, tem tarefas e responsabilidades primárias no que se refere à catequese:

O anúncio, a transmissão e a experiência vivida do Evangelho se realizam na Igreja


particular ou Diocese. [...] Em toda Igreja particular se faz presente a Igreja universal com todos
os seus elementos essenciais (DGC n. 217; cf. RdC n. 145).

No conjunto dos ministérios e dos serviços, com os quais a Igreja particular realiza sua
missão evangelizadora, ocupa um lugar de destaque o ministério da catequese (DGC n. 219).

A Igreja particular garante a autenticidade do serviço da palavra de Deus, confiada


aos bispos, como sucessores dos apóstolos (RdC n. 145) e tem uma tarefa central de
organização, coordenação e estímulo à atividade catequética.38 Além disso, ela é chamada a
assegurar alguns serviços catequéticos dificilmente realizáveis em níveis inferiores, como a
formação de especialistas, a catequese especializada, a preparação de materiais e planos
pastorais, o atendimento a categorias especiais de pessoas etc.39

4.1.2 A paróquia, lugar de catequese

A comunidade paroquial deve continuar sendo a animadora da catequese e seu


lugar privilegiado. 40 A paróquia, que é o espaço onde se nasce e se cresce na fé (DGC
n. 257), tem a tarefa de promover a realização concreta da atividade catequética, assegurar-lhe
os elementos indispensáveis (catequistas, animadores, meios, estruturas) e coordenar
devidamente a atividade dos grupos e movimentos (CT n. 67). No que se refere à prática, o
DGC (n. 258) especifica alguns aspectos da programação catequética paroquial, salientando a
centralidade da catequese dos adultos, a importância do anúncio aos que se encontram afastados
e a organização da paróquia em pequenas comunidades.41 O projeto da paróquia como
comunidade de comunidades abre perspectivas promissoras de eficácia catequética (DGC n.
258; CAL n. 188).

38
Essas tarefas serão mais bem especificadas posteriormente, quando se tratar do papel do bispo (cf. DGC n. 222-
23).
39 a
Cf. CNBB-Linha 3, Formação de catequistas. 7 ed. São Paulo, Paulus, 1990, p. 60-62 (Estudos da CNBB n.
59). Cf. Espanha CC n. 292-295.
40
CT n. 67. Cf. também Espanha CC n. 268 e DGC n. 257.
41
Outras tarefas serão especificadas mais adiante a propósito da responsabilidade dos párocos (cf. DGC n.
224-225).
217
É preciso salientar as qualidades de autenticidade e globalidade que a comunidade local
pode oferecer, quando une ensinamento, experiência de vida, comunhão e testemunho; mas também
as limitações e as possíveis dificuldades, no caso de as paróquias não viverem um autêntico espírito
comunitário (DGC n. 257; RdC n. 149). Por isso a paróquia não deve julgar-se autossuficiente, mas
aberta à integração com outros sujeitos e instituições.

4.1.3 Os âmbitos regional, nacional, universal

Para além dos limites diocesanos e paroquiais, existem outros lugares e sujeitos
eclesiais que compartilham, de acordo com a sua identidade, a tarefa da catequese. As principais são
as seguintes:

Os movimentos, associações e institutos religiosos


Os religiosos, as associações e os movimentos podem também garantir serviços catequéticos
válidos, especialmente na forma de catequese especializada, segundo a própria espiritualidade ou
carisma. A Igreja local deve saber acolhê-los e respeitar-lhes a originalidade e a eclesialidade.
Por outro lado, porém, é justo esperar dos diversos institutos e movimentos um testemunho
coerente de sentido eclesial, evitando o perigo do paralelismo, da autossuficiência, e cuidando da
própria relação de pertença e de comunhão com os sujeitos primários da eclesialidade.42

Em âmbito regional e nacional


Em âmbito regional e nacional muitas são as possibilidades para a ação catequética, seja
pela promoção do diálogo cultural e a pesquisa de linguagem (inculturação), seja pelas atividades e
serviços qualificados dificilmente realizáveis em níveis inferiores: gente especializada, institutos
superiores, materiais e instrumentos especiais (catecismos, programas, mídia etc.: DGC n. 268-269).

Em âmbito da Igreja universal


Não se ignora a alta responsabilidade, seja da Igreja romana (DGC n. 270), seja das diversas
expressões da colegialidade episcopal, sobretudo no exercício do ministério da unidade e da
autenticidade da fé. Mas não é uma tarefa apenas de controle, nem se trata de impor a uniformidade:
deve estar a serviço da promoção qualitativa da catequese e estimular a originalidade e a
criatividade das Igrejas particulares. No exercício da atividade catequética, tanto a unidade
quanto a pluralidade são valores que se enriquecem mutuamente.

42
Cf. DGC n. 261-62. Falaremos mais detalhadamente do papel desses grupos e movimentos no capítulo 8.
218
4.2 A catequese eclesial: serviço único e diferenciado (DGC n. 219)

Na Diocese, a catequese é um serviço único, realizado conjuntamente pelos presbíteros, diáconos,


religiosos e leigos, em comunhão com o bispo. Toda a comunidade cristã deve sentir-se responsável
por esse serviço. Ainda que os sacerdotes, religiosos e leigos realizem em comum a catequese, fazem-
no de modo diferenciado, cada um segundo sua condição particular na Igreja [...] Se faltasse alguma
dessas formas de presença a catequese perderia boa parte da própria riqueza e do próprio significado
(DGC n. 219).

Vamos apontar agora os principais agentes e sujeitos desse serviço único e diferenciado .

4. O primeiro catequista: a comunidade eclesial

A comunidade cristã é o sujeito primeiro e principal da catequese, ponto de referência de suas


articulações diversas e particulares: A catequese é uma responsabilidade de toda a comunidade
cristã. [...] A catequese é, portanto, uma ação educativa realizada a partir da responsabilidade
peculiar de cada membro da comunidade (DGC n. 220).
Isso quer dizer que o primeiro catequista, o catequista por excelência, é a comunidade cristã,
que deve ser considerada agente solidariamente responsável pela catequese. 43 Está superada a
mentalidade que considera a catequese como tarefa de alguns encarregados dos trabalhos ou
especialistas ; em vez disso, cumpre promover a consciência do envolvimento comunitário de
todos na sua realização.

43Cf. Brasil CR n. 118; Celam-Decat, A comunidade catequizadora no presente e futuro da América Latina: conclusões da
emana atino-americana de atequese. Quito, 3-10 de outubro de 1982. São Paulo, Salesiana, 1983 (Coleção
catequética n. 9). Cf. Celam-Decat, La comunidad catequizadora en el presente y futuro de America Latina: ponencias y
concusiones. emana ati americana de atequesis. Bogotá, Celam, 1983. Cf. também Alemanha KWK A
4; Puebla n. 983; Espanha CC n. 266; CAL n. 19, p. 183-86.
219
4.2.2 A missão catequética dos pastores

Merecem menção especial, no interior da comunidade eclesial, os ministros ordenados (bispos,


presbíteros, diáconos), que desempenham um papel especial de presidência, orientação,
coordenação e discernimento. É uma missão investida de autoridade, mas que não os deve
isolar nem colocar acima da comunidade, porque só inseridos nela, de forma vital, poderão
cumpri-la com eficácia. Sua autoridade é sobretudo aquela que coordena, estimula e discerne o
conjunto da ação catequética da comunidade, assegurando-lhe ao mesmo tempo a comunhão
com toda a Igreja e garantindo-lhe a fidelidade na transmissão da fé.
Os bispos, em sua qualidade de mestres da fé (cf. EN n. 68) e de guardiães da
unidade eclesial, são os primeiríssimos responsáveis pela catequese, os catequistas por excelência
(DGC n. 222; cf. CT n. 63). Além de exercerem de forma direta o ministério da palavra
catequética,44 eles têm, antes de , a tarefa de coordenar e incrementar em suas Igrejas o
desenvolvimento organizado da atividade catequética, movidos por uma autêntica paixão pela
catequese (DGC n. 223). Não se trata tanto de vigiar e controlar, mas antes de estimular e garantir
espaços de liberdade e criatividade,45 cuidando, em especial, da formação dos catequistas e
elaborando um adequado projeto global de catequese (DGC n. 223).
Os presbíteros, enquanto educadores da fé (PO n. 6) e colaboradores de ordem episcopal,
também têm uma grande responsabilidade no âmbito catequético, seja diretamente, seja
principalmente promovendo a aptidão catequética de todos e fazendo crescer a comunidade no
ministério da fé.46 E como o ministério ordenado deve estar a serviço do comum (LG n. 10),
eles deverão ter uma disposição especial para estimular vocações catequéticas e cuidar da
formação dos catequistas, em sua qualidade de catequistas dos catequistas (DGC n. 225). A
eles cabe também integrar a ação catequética no projeto evangelizador da comunidade e garantir
a ligação da catequese de sua comunidade com os planos pastorais diocesanos (DGC n. 225),
evitando dois extremos: considerar a si mesmos os únicos catequistas da comunidade, ou
desinteressar-se de tudo, abandonando os catequistas a si mesmos.47

44
Cf. Mensagem do Sínodo de 1977, n. 14; CT n. 63; DGC n. 223.
45
Bernardo Cansi, Os padres e a catequese renovada . REB 51 (1991) n. 201, p. 353-68. Cf. Alemanha KWK A 4.
Cf. A. Fossion, La catéchèse dans le champ de la communication: ses enjeux pour l´inculturation de la foi. Paris, Cerf,
1990, p. 51-53.
46
Cf. PO n. 6; CT n. 64; RdC n. 193; USA (NCD) n. 217; DGC n. 224.

seguinte: Aos Seminários, Institutos, Faculdades de teologia e Escolas de Formação


Pastoral [solicitamos] que introduzam em seus currículos a catequética e deem dimensão catequética
aos estudos teológicos . CNBB-Linha 3, Primeira Semana Brasileira de Catequese. São Paulo, Paulinas, 1987, n. 17,
p. 264 (Estudos da CNBB n. 55).
220
4.2.3 O ministério dos catequistas

No quadro da ministerialidade comunitária, têm um papel fundamental os tradicionalmente


chamados catequistas , a quem se delegam determinadas tarefas de catequese: iniciação
sacramental, ciclos de formação, orientação de grupos ou comunidades etc. Seja como catequistas
paroquiais, seja como animadores e guias nas Igrejas jovens, é muito árduo o seu campo de
atividade e de responsabilidade.48 Em muitos países seu número aumentou de forma espetacular
depois do Concílio, e esse florescimento constitui um verdadeiro dom do Espírito à Igreja.49 O
problema de sua escolha e formação está hoje no centro das atenções pastorais.50
Segundo uma tradição persistente, a obra dos catequistas constitui certamente um
ministério eclesial (cf. EN n. 73; DGC n. 219), ou antes, um dos ministérios mais valorizados no
âmbito da ação pastoral.51 Uma outra questão é estabelecer se o mandato dos catequistas deve ser
reconhecido de forma canônica e através de um rito consagrador particular.52 De todo modo, é
importante que o catequista goze de um reconhecimento comunitário explícito e de um
reconhecimento oficial na Igreja.

49
DGC n. 29; cf. a carta dos bispos italianos (n. 13) na apresentação do documento de base RdC (1988).
50
Cf. DGC n. 233-52; EN n. 73; Mensagem do Sínodo de 1977, 14; RdC cap. 10. O tema do catequista e de sua
formação será objeto de particular atenção no capítulo 11.
51
Na realidade, existe sempre uma ligação estreita entre carismas e ministérios: um ministério é normalmente
expressão de um carisma, e um carisma permanente assume a forma de um ministério ou serviço : R.
Lautentin, Carismi: precisazioni circa il vocabolario , Concilium 13 (1977), n. 9, p. 1.456.
52
CT n. 71 afirma que a catequese é se não um ministério formalmente instituído, pelo menos uma função de
enorme importância na Igreja .
221
4.2.4 A tarefa catequética da família

Cabe aos pais um papel especial como primeiros mestres da fé no interior da Igreja
doméstica que é a família53 e que, como a Igreja, deve ser um espaço no qual o Evangelho é
transmitido e a partir do qual se difunde (EN n. 71). Os pais cristãos exercem um
verdadeiro ministério para com seus filhos, em virtude do sacramento do matrimônio (DGC n.
227). A catequese na família, que precede, acompanha e enriquece todas as outras formas de
catequese (CT n. 68), é redescoberta em sua originalidade e em seu valor único (DGC n. 226).
Concernente a isso, está superada a mentalidade da delegação que tira a responsabilidade dos
pais , em favor de uma revalorização plena de seu ministério catequético.
Por outro lado, sabe-se que a família de hoje (família nuclear ) tem muitas limitações, seja
porque perdeu muito de sua tradicional capacidade de socialização, seja pela situação de crise e de
dificuldade em que se encontra. Daí a necessidade de ajudar os pais a assumir sua tarefa educativa e
a inserir-se de modo vital na comunidade (DGC n. 227), para fazer que a catequese familiar não
perca suas características particulares. Na verdade, deve ser uma catequese mais de testemunho do
que de ensinamento, mais de oportunidade do que sistemática, mais permanente que organizada em
etapas .54 São diversos os níveis de intervenção catequética na família: testemunho de fé na vida
cotidiana, leitura cristã dos acontecimentos, iniciação sacramental, educação moral, iniciação na
oração etc.

53
Cf. LG n. 11; DGC n. 255. Na realidade, a qualificação da família como Igreja doméstica é discutível em sua
fundamentação bíblica e histórica: cf. G. Lohfink, Die christliche Familie: eine Hauskirche? . Theologische
Quartalschrift 163 (1983), n. 227-29; D. Emeis - K. H. Schmitt, Handbuch der Gemeindekatechese.
Friburgo/Basileia/Viena, Herder, 1986, p. 157-61; L. M. Pignatiello, Comunicare la fede. Saggi di teologia pastorale.
Cinisello Balsamo (Milão), San Paolo, 1996, p. 206-09.
54
Espanha CC n. 273. Cf. DGC n. 255; RdC n. 152. Para um aprofundamento cf. G. Gatti, Família e catequese .
Revista de Catequese 3 (1980), n. 12, p. 5-14. Dom João Resende Costa, Família e catequese , Revista de Catequese 5
(1982), n. 18, p. 27-29; J. Kestering, Família: ninho da catequese , Revista de Catequese 17 (1994), n. 65; p. 54-58; L.
Macario, Família ´Igreja doméstica´ , Revista de Catequese 3 (1980), n. 12, p. 15-19.
222
4.2.5 A contribuição dos religiosos

Também os religiosos têm um carisma próprio na Igreja e, portanto, também um papel


particular no exercício da ação catequética e evangelizadora (DGC n. 228-229). Sua obra não é
considerada essencialmente como ajuda na catequese indiferenciada, para suprir a falta de
sacerdotes ou de leigos comprometidos. É antes de tudo com o seu estar na Igreja e no
mundo (EN n. 69), enquanto discípulos e profetas,55 que devem cumprir a própria missão
evangelizadora e encarnar a Igreja enquanto desejosa de abandonar-se ao radicalismo da beatitude
(EN n. 69), testemunhando com a vida e a palavra o primado da transcendência e a dimensão
escatológica da fé cristã. Por isso, sua contribuição se torna original e preciosa, e não poderá ser
substituída nem pelos sacerdotes nem pelos leigos (DGC n. 228).
Valoriza-se de forma especial o caráter profético da vida consagrada, que se configura como
uma forma especial de participação na função profética de Cristo . 56 Por isso os religiosos são
chamados não apenas a dar uma grande contribuição à catequese (cf. CT n. 65, RdC n. 194),
especialmente com os adultos e na formação dos catequistas, mas a garantir o aporte específico de
sua vocação no concerto dos carismas eclesiais:
Os carismas fundantes não ficam de lado quando os religiosos assumem a tarefa catequética.
Mantendo intacto o caráter próprio da catequese, os carismas das diversas comunidades religiosas
dão características próprias a essa tarefa religiosa comum, muitas vezes de grande profundidade
religiosa, social e pedagógica. A história da catequese demonstra a vitalidade que esses carismas
trouxeram à ação educativa da Igreja (DGC n. 229).

55
Cf. F. Moloney, Discepoli e profeti: un modello biblico per la vita religiosa. Leumann (Turim), Elledici, 1981.
56
João Paulo II, Esortazione apostolica post-sinodale Vita consecrata (25/3/1996).
Cidade do Vaticano, Liberia Editrice Vaticana, 1996, p. 84.
223
4.2.6 O profetismo carismático particular

Sempre existiu na Igreja a função estimulante dos carismas particulares de palavra e de


testemunho (figuras carismáticas, profetas, teólogos, mestres, mestres espirituais etc.57) que têm
um papel importante de aprofundamento, de estímulo, de provocação. 58 Sua função crítica é
também um dom do Espírito: Na história da Igreja, ao lado de outros cristãos, não faltaram homens
e mulheres dedicados a Deus que, por um dom especial do Espírito, exerceram um autêntico
ministério profético, falando no nome de Deus a todos e também aos Pastores da Igreja .59
Sua presença provoca muitas vezes aquela tensão entre instituição e carisma60 ou entre
carismas e ministérios ordenados, que pode levar à marginalização de muitas vozes proféticas
consideradas incômodas. Não obstante, o seu papel, se desempenhado com autenticidade, é um sinal
eloquente da presença do Espírito na Igreja, de modo que sua repressão empobrece a comunidade e
indica falta de fé.
Na realidade, os dois elementos não se contrapõem, mesmo porque, por natureza, todos os
ministérios têm um fundamento carismático.61 E assim como o sacerdócio hierárquico está a serviço
do comum (LG n. 10), também o ministério profético dos pastores deve estar a serviço do
profetismo universal de todos os fiéis. Não tem sentido, portanto, um exercício do magistério
hierárquico de forma autônoma e separada do corpo da Igreja: os bispos não dispõem de novas
revelações (LG n. 25) mas, a serviço da palavra de Deus, saciam-se na doutrina da verdade da
tradição viva da Igreja, que permeia toda a comunidade eclesial: O ministério apostólico só pode
propor à crença o que está presente na fé de toda a Igreja. Ele realiza esse ato com autoridade e
portanto de modo autêntico, mas tira a sua fé da própria Igreja .62
Numa perspectiva de Igreja-comunhão, será necessário manter sempre uma saudável tensão
entre os diversos p los da dinâmica eclesial: entre vértice e base (pastores e povo cristão), entre
instituições e carisma (hierarquia e profetas ). Assim se poderá constatar que o conjunto dos
carismas particulares, juntamente com o papel dos pastores e o papel global da base eclesial,
representa um tríplice ponto de referência da palavra eclesial. Sua interação recíproca e diálogo
constante garantem fidelidade e autenticidade no exercício da missão evangelizadora e catequética
da Igreja.

57
Pense-se, por exemplo, em figuras de santos como Catarina de Siena e Teresa d´Ávila; de pastores como João XXIII,
Helder Câmara, Tonino Bello; de teólogos como K. Rahner ou Y.Congar; de testemunhas carismáticas como Teresa
de Calcutá, Arturo Paoli, Lorenzo Milani etc. No Brasil podemos citar o padre Álvaro Negromonte, a irmã Tereza
Lézier, dom José Costa Campos, a irmã Elizabeth Stümpfer, o padre Ivan Teófilo, o frei Bernardo Cansi e tantos outros.
58
CNBB-Linha 3, Catequista: profeta na comunidade, subsídio para o dia dos catequistas , Revista de
Catequese 11 (1988), n. 43, p. 46-49. Sobre a existência e importância desse profetismo particular , cf. H.
Schürmann, I doni spirituali della grazia , in: G. Baraúna (ed.), A Igreja do Vaticano II. Petrópolis, Vozes, 1965. B.
Van Leeuwen, La partecipazione comune del Popolo di Dio all´ufficio profetico di Cristo , ibid. p. 465-90.
59
João Paulo II, Exortação apostólica pós-sinodal Vita Consecrata, n. 84.
60
Leonardo Boff, Igreja: carisma e poder. Petrópolis, Vozes, 1982. Cf. Ch. Butler, L´istituzione e i carismi ,
in: R. Aubert et al., Teologia del rinnovamento. Assis, Cittadella, 1969, p. 542-53.
61
Cf. A. Vanhoye, Il problema biblico dei carismi, p. 411-12.
62
B. Van Leeuwen, La partecipazione comune, p. 484.
224
. A IGREJA, OBJETIVO DA CATEQUESE ( A CATEQUESE FAZ A IGREJA )

A catequese não é apenas obra da Igreja; tem também uma missão profética que diz respeito a
esta. Se é tarefa da catequese educar para o sentido da Igreja por meio de uma experiência de Igreja,
isso é entendido de forma criativa e dinâmica, em virtude de sua renovação. Desse compromisso
catequético veremos concretamente dois aspectos importantes: o serviço à causa ecumênica da
unidade e a promoção de um projeto renovado de Igreja.

.1 Rumo à comunhão completa: a catequese ecumênica

A contribuição da catequese ao ecumenismo muitas vezes resultou, principalmente no


passado, num saldo negativo, e a instrução catequética foi um dos principais fatores que
contribuíram para perpetuar a divisão entre os cristãos. Ela muitas vezes se tornou uma verdadeira
fonte de ignorância e de preconceito em relação às outras confissões.63 No período pós-
conciliar, no fervor do novo clima ecumênico, houve iniciativas de diálogo e de colaboração
catequética, nem sempre definidos claramente (cf. Puebla n. 991). Vamos lembrar agora os
princípios e requisitos fundamentais para uma catequese fiel à causa da unidade ecumênica.
A dimensão ecumênica da catequese é um dado já aceito na consciência eclesial. 64 A divisão
dos cristãos constitui um grave escândalo e um obstáculo à pregação do Evangelho (cf. EN n. 77):
daí a necessidade de um esforço ecumênico que facilite a tarefa da evangelização e a
urgência de uma catequese que contribua para o fortalecimento da obra ecumênica.

63
Cf. O. Klineberg et al., Religione e pregiudizio. Roma, Cappelli, 1968.
64
Cf. por exemplo: DGC n. 197-98; RdC n. 49; EN n. 77; Mensagem do Sínodo de 1977, n. 15; CT n. 32; Pontificio
Consiglio per la promozione dell´unità dei cristiani, Direttorio per l´applicazione dei principi e delle norme
sull´ecumenismo, 1993, p. 188-90.
225
.1.1 Finalidade e objetivos de uma catequese ecumênica

Uma catequese erdadeiramente ecumênica se caracteriza por alguns objetivos fundamentais:

Objetivo primeiro e condição básica de toda ação catequética é a conversão sincera das
pessoas e das comunidades às exigências do Evangelho. A catequese pode ajudar a
superar resistências arraigadas e o apego rígido à própria identidade cristalizada.65
O caminho ecumênico não poderá avançar se os cristãos e suas Igrejas não aprenderem a
distinguir bem o núcleo irrenunciável da fé de muitos sedimentos históricos que se
acrescentaram no curso da própria tradição.
Um objetivo muito importante é levar a um leal conhecimento das diversas Igrejas e
confissões cristãs (RdC n. 49, CT n. 32), de forma séria e objetiva, superando a ignorância e
os preconceitos tradicionais. Isso permitirá apreciar os valores e as riquezas de todas as
confissões, à luz dos novos critérios valorativos obtidos através do diálogo e da colaboração
ecumênica.
Em termos de atitudes, a catequese ecumênica aponta para a interiorização de sentimentos de
estima e de amor para com as outras Igrejas, abandonando resistências e lugares comuns.
Promovem-se as atitudes de humildade e de sinceridade, a capacidade de ouvir, a
disponibilidade para aprender e para deixar-se enriquecer pela experiência dos outros.
É necessária toda uma mudança profunda para abrir-se à alteridade e para considerar as
posições alheias não como uma ameaça, mas como possível enriquecimento.
Uma catequese em perspectiva ecumênica deve também favorecer as diversas formas de
diálogo e de colaboração no campo da atuação: oração, estudo, ação promocional e social,
luta pela justiça e a paz etc.

.1.2 Fontes, conteúdos e métodos de uma catequese ecumênica

Para que uma catequese seja ecumênica não basta que se dedique algum tempo ou lição ao
tema do ecumenismo. Se é importante procurar um conhecimento correto da história e das
vicissitudes do movimento ecumênico (catequese sobre ecumenismo), é todo o campo da
catequese que deve se impregnar de sensibilidade e de referência à grande causa da
unidade ecumênica (catequese ecumênica). Essa dimensão transversal corresponde à
importância do ecumenismo na vida da Igreja:

O ecumenismo, o movimento em favor da unidade dos cristãos, não é apenas um apêndice


qualquer que se acrescenta à atividade tradicional da Igreja. Ao contrário, ele pertence,
organicamente, à sua vida e à sua ação e deve, por conseguinte, permear esse conjunto e ser como o
fruto de uma árvore que, sadia e viçosa, cresce até atingir seu pleno desenvolvimento.66

65
Cf. Gruppo di Dombes, Per la conversione delle chiese: identità e cambiamento nella dinamica comune. Bolonha,
Dehoniane, 1991. A. F. Bohn, O cristão adulto em busca do diálogo ecumênico , Revista de Catequese 11 (1988), n.
43, p. 22-40, e 11 (1988), n. 44, p.
33-42.
66
João Paulo II, Carta encíclica Ut num sint (25/5/1995), n. 20.
226
A propósito das fontes da catequese, duas exigências parecem impor-se: o reconhecimento
efetivo do primado da Sagrada Escritura (DGC n. 197), fonte primordial de unidade entre as
Igrejas, e a utilização dos documentos ecumênicos particularmente significativos produzidos
pelo movimento ecumênico. Esse recurso às fontes ecumênicas deverá caracterizar,
doravante, as publicações catequéticas: catecismos, textos, materiais.
Particular importância tem também a utilização de uma linguagem adequada, seja para
tornar compreensível a própria doutrina e não induzir a erro os irmãos separados (LG n. 67,
UR n. 11), seja também para garantir uma apresentação correta e leal das diversas Igrejas
(CT n. 32).

67
J. F. Long, La catechesi in una prospettiva ecumenica , in: Istituto di Catechesi Missionaria della Pont. Univ.
Urbaniana (ed.), Andate e insegnate: commento all´Esortazione apostolica Catechesi Tradendae di
Giovanni Paolo II. Bolonha, EMI, 1980, p. 331-32.
227
Entre as diversas formas de colaboração ecumênica, merece atenção especial, em nosso
campo, a realização de catequeses comuns, dirigidas a pessoas e envolvendo agentes
catequéticos de confissões diversas. Os documentos oficiais admitiram ser possível e útil
esse exercício da catequese comum (CT n. 33; DGC n. 74. 198), em relação à catequese e
também ao ensino da religião na escola, mas lembrando-lhe os limites e estimulando os
necessários trabalhos de integração.
É evidente que a realização de uma catequese ecumênica eficaz e autêntica depende muito da
formação dos catequistas e da preparação ecumênica dos seminaristas e dos sacerdotes.

Como se vê, não se afigura fácil o exercício de uma autêntica catequese ecumênica. É toda
uma mentalidade que deve ser promovida, uma nova imagem de crente e de Igreja que é
necessário ter diante dos olhos. E por isso será necessário dispor de instrumentos novos:
catecismos, programas, métodos etc., se se quiser realizar de fato uma catequese renovada
em sua dimensão ecumênica.

5. Por um projeto renovado de Igreja

Na sua função profética e na situação atual da realidade eclesial, a catequese deve promover
não apenas um novo modelo de cristão, mas sobretudo um modelo renovado de Igreja.
Por sua própria natureza, a catequese é um fator de renovação da comunidade eclesial. Mas
hoje essa tarefa adquire uma urgência especial, dada a crise de distanciamento e de desamor em
relação à Igreja, da parte de tantos homens e mulheres de nosso tempo. Aos olhos de muitos de
nossos contemporâneos, a Igreja constitui um verdadeiro obstáculo à evangelização, e são muitas
as vozes em seu interior que falam da necessidade de uma reforma profunda da Igreja, na sua
vida, na sua estrutura, no exercício da autoridade etc.68 Algumas metas são especialmente
importantes para a catequese nos dias de hoje:

68
É impressionante ver o número de pessoas de Igreja (estudiosos, teólogos, bispos) que exigem uma séria reforma
nesse campo. Temos alguns exemplos na bibliografia final do capítulo.
228
5. .1 Catequese para construir a Igreja, não para conservar a Igreja

Mais que integrar na Igreja , hoje se deve falar antes de fazer a Igreja ,69 de fazer da
catequese um instrumento para renovar a Igreja. É importante que a catequese crie espaços novos
de vida cristã e novas formas de experiência de uma Igreja mais autêntica. No exercício da
catequese deve-se poder experimentar micro realizações de uma Igreja renovada.70
Trata-se, no fundo, de permitir na catequese uma autêntica e estimulante experiência de
Igreja , que possa ajudar a interiorizar o sentido da pertença e da comunhão. E aqui é decisiva a
imagem de Igreja que toda comunidade traz consigo e busca realizar. Sabemos que ainda está muito
presente, nas comunidades cristãs, a visão de Igreja de molde pré-conciliar, predominantemente
institucional e clerical , e isso provoca o desânimo e a desilusão entre os responsáveis e os
participantes da catequese.

5.2.2 Catequese para um projeto renovado e convincente de Igreja

Deseja-se a realização também através da ação da virada eclesiológica do Vaticano II, da


visão de Igreja comunhão e serviço que responde aos anseios de nosso tempo. A catequese pode
contribuir de forma eficaz para construir, na comunidade cristã, uma verdadeira fraternidade de
pessoas iguais em dignidade, todas co responsáveis e atuantes, todas participantes, embora de
modos diversos, do serviço sacerdotal, profético e real de Cristo. Portanto, uma Igreja disposta a
superar o clericalismo, o peso burocrático e institucional, a falta de diálogo e comunicação, e
principalmente as diversas formas dilacerantes e antievangélicas de discriminação intraeclesial,
especialmente em relação aos pobres, aos leigos e às mulheres.
Na linha da eclesiologia de serviço , a catequese deve trabalhar por uma Igreja serva da
humanidade ,71 toda voltada para a causa do Reino, menos voltada para si mesma e mais tomada
pela paixão em favor da humanidade; uma Igreja mais decididamente a serviço do mundo e da sua
salvação, sem nostalgia de poder ou de prestígio como na época da cristandade.72 Opõem-se a essa
imagem eclesial as variadas deformações do eclesiocentrismo, que impele a Igreja a viver
debruçada sobre si mesma e preocupada em defender os próprios interesses, e o horizontalismo, que
corre o risco de reduzi-la a uma instituição filantrópica de beneficência e promoção.
Parece urgente, no exercício da catequese, delinear bem o horizonte eclesiológico que se
pretende atingir, com a escolha consciente de um projeto de Igreja estimulante e convincente para os
homens e as mulheres de hoje. E se é verdade que o crescimento da fé inclui a fidelidade à Igreja,
cumpre dizer que esta fidelidade não diz respeito apenas à Igreja do passado e do presente (isto é, a
Igreja como efetivamente foi e é) mas também Igreja do futuro, isto é, como deve ser, como pode
ser sonhada por quantos a querem mais próxima do ideal evangélico.

69
Luiz Alves de Lima, Com adultos catequese adulta , Revista de Catequese 24 (2001), n. 94, p. 5-26; A.
Antoniazzi, Catequese de adultos: um desafio que não pode esperar , Revista de Catequese 8 (1985), n. 30, p.
18-25; Francisco Catão, Catequese adulta: fé e santidade , Revista de Catequese 24 (2001), n. 95, p. 5-15. E. Lepers,
Nécessité d´une catéchèse d´adultes dans l´Église? , in: Catéchèse 21 (1981), n. 82, p. 10.
70
D. Piveteau, L´Église, les adultes et la formation permanente , Catéchèse 15 (1975), n. 59, p. 161-76.
71
Paulo VI, discurso de encerramento do Concílio, 7/11/1965.
72
Cf. L. Gallo, Uma Igreja a serviço dos homens. São Paulo, Salesiana, 1984. S. Dianich, Chiesa estroversa: una
ricerca sulla svolta ecclesiologica contemporanea. Cinisello Balsamo (Milão), Paoline, 1987.
229
6. A CATEQUESE ECLESIAL: POR UMA PALAVRA AUTÊNTICA E DIGNA DE FÉ

No exercício da catequese surge com frequência o problema da autenticidade e da


credibilidade da palavra proclamada. Só um quadro bem estabelecido de critérios de discernimento
permite à catequese desenvolver-se organizada e eficazmente em sua tarefa eclesial fundamental, no
respeito do pluralismo legítimo e da criatividade.

6.1 A autenticidade da palavra: critérios de discernimento

Não raro, no campo catequético surgem tensões e polêmicas a propósito da ortodoxia e


autenticidade dos conteúdos apresentados, polêmicas que muitas vezes geram perplexidade e
perturbação. As discussões podem ter por objeto o conteúdo de um catecismo, os valores de uma
corrente teológica ou a ortodoxia de um modelo catequético. Nesses casos está em jogo a
autenticidade do discurso catequético, e é importante poder contar com critérios válidos de
discernimento e de valoração.
Pois bem, a busca de tais critérios está necessariamente ligada à concepção eclesiológica da
qual se parte.

230
6.1.1 No modelo pré-conciliar: conformidade com o magistério

Na lógica desse modelo, o critério único de autenticidade é a conformidade com o magistério


hierárquico, em ordem descendente de autoridade (papa, bispos, sacerdotes). A importância desse
critério não deve ser subestimada mas, tomado como único, revela-se absolutamente insuficiente.
O recurso isolado à autoridade do magistério reflete os limites da visão eclesiológica em
que se baseia, remete a uma linha interpretativa posterior do próprio magistério e deixa na sombra
a contribuição enriquecedora dos carismas e do sensus fidei do povo cristão. É um critério que, se
tomado como absoluto, deixa sem respostas muitos problemas ligados às possíveis interpretações do
próprio magistério (níveis diversos de compromisso magisterial, variedade de contextos históricos e
culturais, diferenças significativas no tempo e no espaço etc.). Em boa criteriologia teológica,
também a palavra do magistério deve ser acolhida e interpretada no Espírito .73

6.1.2 Na eclesiologia renovada: fidelidade a Cristo, ao Espírito, à comunhão eclesial

Na nova perspectiva, os critérios de autenticidade da palavra não podem ser reduzidos a


alguns elementos isolados da realidade eclesial, mas derivam do conjunto articulado e convergente
de diversas instâncias. Eles se reportam a Cristo, ao Espírito e à comunhão eclesial, e podem ser
assim descritos:
— Fidelidade a Cristo e ao Evangelho. Exprime-se sobretudo como fidelidade às Sagradas
Escrituras (especialmente ao NT) e à Tradição viva que se liga aos Apóstolos (critério da
apostolicidade).
— Fidelidade ao Espírito e ao seu dinamismo renovador: é fidelidade que se manifesta
especialmente nas diversas obras e frutos do Espírito:

Práxis evangélica libertadora a serviço do Reino: é o critério das obras segundo o Espírito,
obras que dão testemunho dos valores do Reino: amor, serviço, fraternidade, reconciliação,
promoção integral de todos. É sobretudo o grande sinal da opção preferencial pelos pobres, a
solidariedade vivida com o povo humilde e explorado (cf. Puebla n. 1145).

73
É o princípio expresso por P. Hünermann na introdução a: H. Denzinger, Enchiridion Symbolorum: definitionum
et declarationum de rebus fidei et morum. Bolonha, Dehoniane, 1995.
231
Edificação da Igreja: palavra autêntica é aquela que constrói, não a que destrói; a palavra que
revigora e encoraja, não a que divide e desanima. Também nos momentos de tensão ou de conflito
a palavra de fé deve manifestar sua capacidade de edificar e amadurecer a comunidade eclesial
(cf. Rm 15,2; 1Cor 10,23; 15,26).
Frutos do Espírito: trata-se do critério das atitudes próprias de quem é movido pelo
Espírito: bondade, paz, paciência, força, disponibilidade, brandura, desinteresse etc. (cf. Gl 5,22).
Em sentido oposto, testemunham negativamente os sentimentos carnais de quem manifesta
ambição ou vaidade, arrogância, amargura, ressentimento, autoexaltação etc.
— Fidelidade à comunhão eclesial: só a comunhão com a Igreja dá a garantia de
autenticidade. Não basta o acordo com algum elemento da equipe eclesial, mesmo que
investido de autoridade, mas deve-se buscar a convergência com as diversas expressões da
Igreja, com os vários níveis (particulares, locais, universais). De fato a comunhão eclesial se
verifica com diversas formas de consenso e de participação: na escuta do magistério dos
pastores; no exercício efetivo do sensus fidei dos crentes; na atuação da colegialidade e da
comunicação no interior da Igreja; na justa apreciação da receptio como forma concreta de
acolhimento da palavra. É, no fundo, o critério da catolicidade, na fidelidade a uma
comunhão que não se confunde com a uniformidade ou o nivelamento. Mas é um critério que
só terá sucesso se se realizar efetivamente a eclesiologia de comunhão e de serviço, no
respeito à participação e à originalidade de todos, segundo o princípio clássico: in necessariis
unitas, in dubiis libertas, in omnibus caritas.74
Esse quadro de critérios faz entrever a complexidade do problema e a necessidade de articular
harmonicamente os diversos elementos da dinâmica da palavra de fé na Igreja. E para a
catequese parece urgente encontrar a convergência nesses critérios de discernimento, em relação à
concretude da práxis.75

74
Cf. Y. Congar, Ministeri e comunione ecclesiale. Bolonha, Dehoniane, 1973, p. 197-219.
75
Cf. nessa linha de pensamento, os critérios apresentados pela EN n. 58 e Puebla n. 648, p. 370-384, 992-999. Cf.
Brasil CR n. 80 que insiste: na necessidade de considerar estes três temas [fidelidade a Deus, à Igreja e à pessoa
humana] não como separados e estanques, mas como mutuamente implicados um no outro. Cristo ilumina o mistério do
homem; a Igreja só se entende como caminho da realização do homem em Cristo; não há fidelidade a um, sem fidelidade
aos outros .
232
6.2 A busca da credibilidade

A grande e deplorável crise de credibilidade da Igreja e da palavra eclesial torna essa busca
atual e urgente. Não está em jogo apenas o exercício da palavra na Igreja (pregação, magistério,
catequese etc.) mas principalmente, e de forma determinante, a credibilidade da própria Igreja
enquanto palavra global, testemunha viva da mensagem que anuncia. A palavra eclesial
tornada digna de fé, mais por aquilo que a Igreja é ou faz do que pelo que ela diz (RdC n. 145). Mais
que na mensagem explícita que a Igreja propõe, a credibilidade está em jogo na meta-mensagem
realmente veiculada e na efetiva qualidade da Igreja como instituição-mensagem.76
Apresentamos a seguir alguns critérios para verificar o grau de credibilidade da palavra da
Igreja.

6.2.1 Os principais sinais de credibilidade da palavra eclesial

Enquanto palavra significada, isto é, acompanhada de sinais de aferição e de


testemunho (cf. Mc 16,20), a palavra eclesial exige, para ser digna de credibilidade, a
presença de dois sinais evangelizadores particularmente expressivos do Reino que anuncia: o amor-
serviço ( diaconia ) e a comunhão-fraternidade ( koinonia ):
O testemunho do amor e do serviço é determinante para a credibilidade da palavra da Igreja,
porque vai direto ao coração da mensagem anunciada, o Reino de Deus como reino do amor
incondicional e libertador.77
Por sua vez, o sinal da comunhão-fraternidade se apresenta como testemunho necessário ao
anúncio evangélico, porque também é sinal central do Reino anunciado, que é projeto de
comunhão e de unidade para toda a humanidade. O fenômeno das seitas mostra até que ponto
é determinante o testemunho efetivo da fraternidade e do acolhimento.

76
Cf. R. Dulong, Une Église cassée: essai sociologique sur la crise de l´Église catholique. Paris, Ed. Economie et
Humanisme/Les Edit. Ouvrières, 1971; J. Martin Velasco, Non credenza ed evangelizzazione: dalla testimonianza al
dialogo. Assis, Cittadella, 1990, p. 184-222.
77
No capítulo 7 aprofundaremos o estudo da relação absolutamente essencial entre catequese e sinal da diaconia.
233
6.2.2 Os critérios intrínsecos à palavra eclesial

A palavra da Igreja em si mesma, e não apenas os sinais de que se faz acompanhar, se revela
digna de fé se dotada de algumas características que pertencem à sua natureza e lhe asseguram a
eficácia: a fidelidade à mensagem revelada e a encarnação dessa mensagem na realidade dos
destinatários:
Fidelidade à mensagem revelada: é condição indispensável de autenticidade e de
credibilidade. Compreende aspectos variados e complementares como, por exemplo:
— respeito à pureza da mensagem evangélica, numa retomada constante das fontes,
no contexto da Tradição;
— fé na força interior da mensagem evangélica, sem conivências ou reforços de
significado ambíguo;
— desinteresse e retidão no anúncio, sem segundas intenções ou buscando a satisfação
de interesses particulares;
— liberdade e franqueza ( ) no anúncio e na denúncia, sem condescender
com acordos, compromissos e cálculos da prudência mundana.
Encarnação da mensagem: é condição igualmente importante de autenticidade e de
fidelidade, não apenas por uma questão de facilidade ou compreensão, mas como traço
essencial da palavra de Deus ressoando entre as pessoas. Essa fidelidade de encarnação
apresenta algumas peculiaridades:
— fidelidade às pessoas em si, às suas exigências reais, às suas necessidades de
evangelização e libertação;
— caráter significativo da mensagem para os destinatários;
— sintonia e simpatia cultural ( inculturação ) em relação aos valores, às expectativas e à
mentalidade das pessoas e povos aos quais se dirige a palavra eclesial.
Cabe lembrar aqui a conhecida lei da dupla fidelidade, a Deus e ao homem, como critério
fundamental de autenticidade e credibilidade,78 mas sem esquecer outros elementos que devem
caracterizar o discurso catequético, como a adequação da linguagem, o apoio da comunidade, o
caráter significativo da mensagem, a aculturação nos novos contextos culturais, e outros do
mesmo gênero. Além disso, a ação catequética e evangelizadora deve vir acompanhada do esforço
para purificar a Igreja de todo seu contratestemunho real ou potencial:

78
Cf. DGC n. 145; CT n. 55; RdC n. 160; CAL n. 168; Brasil CR n. 78-81.
234
Daí se vê o quanto é necessário que as comunidades eclesiais, segundo o ensinamento da Igreja e
guiadas por seus pastores, eliminem ou corrijam aquilo que desfigura a fisionomia da Igreja e
constitui, para os homens, um obstáculo à fé (cf. GS n. 19) (DGC [1971] n. 35).

Não constitui exagero falar da necessidade urgente de recuperar a credibilidade da palavra da


catequese eclesial. Na verdade, seria ilusório confiar a eficácia da catequese a recursos técnicos ou
metodológicos (o uso dos meios de comunicação de massa, a dinâmica de grupo, a expressão
corporal etc.) esquecendo as verdadeiras condições de base da credibilidade da palavra: o
testemunho convincente do amor e do serviço, a fraternidade buscada e vivida, a volta ao
Evangelho, a fidelidade apaixonada às pessoas de nosso tempo, a opção preferencial pelos pobres.

SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS

Tema fundamental para o aprofundamento do capítulo é a concepção renovada da


Igreja depois da mudança eclesiológica do Vaticano II. Destacamos, na vasta bibliografia a
respeito, os seguintes trabalhos:
ALBERIGO, G. (ed.), L ecclesiologia del Vaticano II: dinamismi e prospettive. Bolonha,
Dehoniane, 1981.
ANTON, A. Ecclesiologia postconciliare: speranze, risultati e prospettive . In: R.
(ed.), Vaticano II: bilancio e prospettive venticinque anni dopo (1962-1987).
Vol. 1. Assis, Cittadella, 1987, p. 361-88.
BARAÚNA, G. (ed.). A Igreja do Vaticano II. Petrópolis, Vozes, 1965.
CALIMAN, Cleto. Sacramento de Deus num mundo em mudança . Revista de Catequese 1
(1978), n. 1, p. 5-6.
CONGAR, Y. A Igreja em nossos dias. São Paulo, 1969.
DIANICH, S. Chiesa in missione: per una ecclesiologia dinamica. Milão, Paoline, 1985.
GALLO, L. Uma Igreja a serviço dos homens: contribuições para uma compreensão atual da
Igreja. São Paulo, Salesiana, 1984.
LOHFINK, G. Como Jesus queria as comunidades? A dimensão social da fé. São Paulo,
Paulinas, 1987.
RIGAL, J. L´ecclésiologie de communion: son évolution historique et ses fondements. Paris, Cerf,
1997.
SARTORI, L. Chiesa . In: D (eds.). Nuovo Dizionario di
Teologia. Alba, Paoline, 1977, p. 122-148.

Um tema de grande atualidade nas últimas décadas é o da reforma da Igreja de hoje.


Sobre o assunto, vejam-se os seguintes trabalhos:
BUCHER, A. Braucht Mutter Kirche brave Kinder? Religiöse Reifung contra Kirchliche
Infantilisierung. Munique, Kösel, 1997.
BÜHLMANN, W. Igreja no limiar do terceiro milênio. São Paulo, Paulus, 1984.
DUCOS, M. Je voulais seulement changer l´Église. Paris, L´Harmattan, 1994.
ELLACURIA, I. Conversione della chiesa al regno di Dio: per annunciarlo e realizzarlo nella
storia. Brescia, Queriniana, 1992.

235
GATTI, C. O serviço eclesial do catequista . Revista de Catequese 5 (1982), n. 17, p. 18-20.
GONZALEZ DORADO, A. Desafios da nova evangelização e catequese na América Latina .
Revista de Catequese 60 (1992), p. 25-32.
GONZALEZ FAUS, J. I. Nueva evangelización, Iglesia nueva. Santander, Sal Terrae, 1992.
HÄRING, B. Il coraggio di una svolta nella chiesa. Brescia, Queriniana, 1997.
HÜNERMANN, P. (ed.). Papato ed ecumenismo: il ministero petrino al servizio dell´unità.
Bolonha, Dehoniane, 1999.
KEHL, M. Wohin geht die Kirche? Eine Zeitdiagnose. 4ª ed. Friburgo/Basil ia/Viena, Herder,
1996.
KRÄTZL, H. Im Sprung gehemmt. Was mir nach dem Konzil noch alles fehlt. 2ª ed. Mödling, St.
Gabriel, 1998.
QUINN, J. R. Reforma do papado: indispensável para a unidade cristã. Aparecida, Santuário,
2002.
RAHNER, K. Trasformazione strutturale della Chiesa come compito e come chance. Brescia,
Queriniana, 1973.
SCALIA, F. - AGOSTINO, G. - CAMPANINI, G. Le relazioni nella chiesa: per una comunità
a più voci . Milão, Ancora, 1998.
SEPE, C. A catequese e a Igreja do futuro: rumo à catequese do terceiro milênio . Revista de
Catequese 16 (1993), n. 61, p. 3-14.

Sobre a relação entre a catequese e as diversas concepções eclesiológicas, além de


obras gerais, ver:
ALBERICH, E. Catechesi adulta in una chiesa adulta : i nodi ecclesiologici della catechesi
degli adulti . Orientamenti Pedagogici 38 (1991), n. 6, p. 1.367-84.
EXELER, A. Vorstellungen von Kirche und deren religionspädagogische Auswirkungen .
Katechetische Blätter 103 (1978), n. 8, p. 591-602.
FOSSION, A. Images du monde et images de d´église . Lumen Vitae 45 (1990), n. 1, p. 61-70.
LOSADA, J. Modelos eclesiológicos y sus derivaciones en la evangelización y catequesis .
Actualidad Catequética (1979), n. 92-93, p. 273-83.
MALDONADO, L. Visión de la Iglesia y de la eclesiología desde la perspectiva de la
evangelización . Teologia y Catequesis (1990), n. 33-34, p. 49-66.
MARTIN VELASCO, J. Propuestas para una Iglesia evangelizadora . Teologia y Catequesis 4
(1985), n. 1, p. 29-42.
WERBICK, J. La Chiesa: un progetto ecclesiologico per lo studio e per la prassi. Brescia,
Queriniana, 1998.

236
Sobre o tema específico da catequese ecumênica, ver:
BOHN, A. F. O cristão adulto em busca do diálogo ecumênico . Revista de Catequese 11
(1988), n. 43, p. 22-40 e 11 (1988), n. 44, p. 33- 42.
BOSCH NAVARRO, J. Ecumenismo y catequesis . Nuevo Dic. Cat., p. 709-33.
CASALE, U. Il Direttorio Ecumenico e la catechesi . Catechesi 63 (1994), n. 6, p. 24-28; n. 7, p.
17-22.
CERETI, G. L ecumenismo, dimensione della catechesi . Via, Verità e Vita 31 (1982), n. 86, p.
4-11.
CRUZ, T. M. L. Ecumenismo, esse ilustre desconhecido . Revista de Catequese 23 (2000), n.
89, p. 34-41.
FORTINO, E. Ecumenismo . Diz.Cat., p. 231-33.
LONG, J. F. La catechesi in una prospettiva ecumenica . In: ISTITUTO DI CATECHESI
MISSIONARIA DELLA PONT. UNIV. URBANIANA (ed.). Andate e insegnate: commento
all´Esortazione Apostolica Catechesi Tradendae di Giovanni Paolo II. Bolonha, EMI
1980, p. 328-342. Oecuménisme et formation religieuse . Lumen Vitae 19 (1964), n. 1 e 3.
SAUER, R. - MOKROSCH, R. (eds.). Ökumene im Religionsunterricht Glauben lernen im
evangelisch-katholischen Dialog. Münster, Comenius Institut, 1994.
SAMPAIO WILKEN, I. Catequese de adultos e diálogo ecumênico . Revista de Catequese 8
(1985), n. 30, p. 26-35.
SEGRETARIATO ATTIVITÀ ECUMENICHE (SAE). Ecumenismo e catechesi. Nápoles,
Dehoniane, 1987.
SEGRETARIATO PER L´ECUMENISMO E IL DIALOGO DELLA CEI. La formazione
ecumenica nella chiesa particolare: nota pastorale. Bolonha, Dehoniane, 1989.

237
Capítulo 7
Catequese e compromisso
sociocaritativo
A função eclesial da diaconia ou do serviço-caridade compreende
uma vasta gama de expressões do amor cristão ao próximo:
solidariedade, auxílio, assistência, educação, promoção humana,
voluntariado, compromisso social e político etc. Também a esse
respeito surge a questão da relação com à evangelização e à
catequese. Em que sentido e até que ponto se integram
evangelização, catequese e diaconia? Pode-se falar de uma dimensão
diaconal da catequese?

1. EVANGELIZAÇÃO, CATEQUESE E DIACONIA: ASPECTOS DO PROBLEMA

Muitas vezes lamenta-se, na práxis pastoral, a falta de coordenação entre setores


operativos que parecem caminhar de forma independente: pastoral litúrgica, catequese, ação
caritativa e social, militância política etc. Em especial, e no que se refere à catequese,
apontamos algumas maneiras de resolver o problema.

1.1 Separação entre catequese e compromisso sociocaritativo

Às vezes se acentua de tal forma a especificidade da função catequética como anúncio


da palavra e experiência de fé que se exclui uma ligação orgânica entre catequese e diaconia.
São várias as formas concretas dessa atitude na catequese: insensibilidade aos problemas
sociais e políticos; marginalização da doutrina social da Igreja; desinteresse pelos pobres e
excluídos; esquecimento da dimensão social da fé; fechamentos espiritualistas etc.1
Também são vários os motivos apresentados para justificar essas posições: o
primado da evangelização na Igreja; o caráter espiritual e religioso da catequese; o
perigo de confusão entre educação da fé e compromisso sociopolítico etc. Muitas vezes
resulta daí um sentimento de desconfiança generalizado em relação a toda forma de
compromisso que implique o risco de desviar a catequese de sua identidade e missão
específicas.

1
Cf. Ásia (Cingapura, 1995) II B4; México GP, n. 85; M. Toso, Dottrina sociale oggi: evangelizzazione, catechesi e
pastorale nel più recente Magistero sociale della Chiesa. Turim, SEI, 1996.
239
1.2 Identificação da catequese com o compromisso sociopolítico

Outros, ao contrário, destacam a dimensão horizontal da experiência cristã e a


urgência do testemunho das obras. Preocupados sobretudo em superar a ineficácia das
palavras e a crise de credibilidade da palavra eclesial, insistem na tarefa promocional e
solidária como chave da evangelização e da catequese. Entre as razões que se costumam
apontar encontramos: a dimensão libertadora da fé; o conceito de salvação como
transformação da sociedade; o Evangelho como mensagem promocional e como
compromisso histórico etc. Nessa perspectiva, reduz-se a catequese à ação, e a fé às suas
consequências temporais, caindo-se no horizontalismo e na perda de identidade.

1.3 Relação estreita entre catequese e diaconia eclesial, manifesta em sua distinção

Mais convincente é a rica gama de posições que reconhece o laço existente entre
diaconia e função evangelizadora na Igreja, mas sem reducionismos ou polarizações
unilaterais. Como se verá a seguir, são posições que apreendem a urgência de um tema que
envolve a credibilidade da Igreja e a eficácia do anúncio evangélico. A dialética se concentra
na tensão entre horizontalistas e verticalistas , entre defensores do compromisso e
defensores da espiritualidade . E a discussão envolve também os agentes e responsáveis
pela catequese.
Para uma elucidação do problema, parece-nos necessário responder a duas questões
fundamentais:
a existência e o alcance da função diaconal na Igreja. Se existe tal missão de serviço
ou diaconia, a catequese tem todo o interesse nela, dada a sua tarefa de iniciação e
de educação para as diversas formas de vida e de ações eclesiais;
a relação entre educação da fé e testemunho da caridade: o grau dessa
relação determina necessariamente a identidade e a tarefa da catequese, enquanto
mediação eclesial para o amadurecimento da fé.

240
2. NOVAS PERSPECTIVAS DO SERVIÇO E DA CARIDADE NA IGREJA
(o aspecto renovado do sinal da diaconia)

Um primeiro ponto a precisar é o significado e os conteúdos que hoje assume a


diaconia como função eclesial, no contexto da práxis pastoral da Igreja. Lembraremos alguns de
seus aspectos significativos, evocando o passado e a situação atual da consciência eclesial.

2.1 Um olhar para o passado: o exercício da caridade na tradição da Igreja

Se o exercício da caridade é constante na experiência cristã, dada a centralidade evangélica do


preceito do amor, são bem diversas as formas concretas que ele assumiu ao longo da história, de
acordo com os condicionamentos culturais e históricos de cada época. Nesse sentido, encontramos
expressões e ênfases diferentes no exercício da diaconia na história da Igreja:2
na Igreja apostólica: partilha dos bens, caridade organizada para com os pobres, ajuda
fraterna, solidariedade entre as Igrejas;
na época patrística: exercício da caridade individual e da esmola; trinômio ascético: jejum,
oração, esmola;
na Idade Média e época moderna: exercício da beneficência, da assistência, obras de
misericórdia , instituições de ajuda aos pobres, aos doentes, aos presidiários etc.;
na época moderna e contemporânea: instituições e obras de educação, de promoção, de
alfabetização, de cooperação etc.
Essas breves indicações encerram o testemunho complexo e riquíssimo da caridade eclesial no
curso da história. Cumpre, porém, assinalar como determinados traços característicos dessa
atividade são hoje repensados e submetidos a uma revisão.3

2
Cf. S. Burgalassi, La carità nei secoli , in: Pont. Opera di Assistenza (ed.), Teologia e storia della carità. Roma,
Caritas, 1965, p. 293-328; M. Farina, Chiesa di poveri e Chiesa dei poveri. Roma, LAS, 1988.
3
Cf. a respeito G. Pasini, Carità , in: V. Bo et al. (eds.), Dizionario di pastorale della comunità cristiana. Assis,
Cittadella, 1980, p. 109-20.
241
Por exemplo:
o caráter predominantemente individualista, assistencial e estático do exercício da caridade
eclesial. Responde-se às necessidades reais das pessoas, sem pensar nas causas estruturais e
sociais das situações de indigência. As obras caritativas e assistenciais nem sempre atuam no
sentido da transformação da sociedade e nem sempre têm um efeito libertador sobre as
pessoas.
a funcionalização (e quase instrumentalização) de algumas formas de serviço e de
promoção tendo em vista o anúncio e a vida sacramental-litúrgica.
o exercício talvez legítimo em sua época de suplência em relação à sociedade civil.
a política por vezes necessária de oposição e de fechamento diante das instituições
civis.

2.2 A nova consciência eclesial do significado da diaconia

Alguns fatores decisivos das últimas décadas levam a uma nova concepção da tarefa da
caridade eclesial:
As profundas transformações da sociedade e novos condicionamentos culturais
(globalização, consciência social e política, autonomia do temporal, afirmação dos direitos
humanos, movimentos vários de libertação etc.) obrigam a uma profunda reavaliação
da tarefa do serviço ao mundo e do testemunho da caridade.
Novos instrumentos de análise e de interpretação permitem hoje uma visão mais objetiva e
aprofundada das situações e dos problemas ligados à pobreza e à justiça.
O desenvolvimento da doutrina social da Igreja ampliou enormemente o horizonte da
atuação cristã e criou uma nova sensibilidade para as novas dimensões da tarefa da
diaconia.
A reflexão teológica aprofundou alguns temas de grande importância para a compreensão
da diaconia eclesial:
a unidade entre ordem da criação e ordem da redenção, entre história humana e história
da salvação;
a nova concepção da salvação, em sentido integral, superando as resistências
espiritualistas e meta-históricas da visão tradicional;4
a superação dos tradicionais dualismos entre ordem espiritual e ordem temporal ,
entre sagrado e profano, entre Igreja e mundo;5

4
Luís Gallo, Uma igreja a serviço dos homens: contribuições para uma compreensão atual da Igreja. São Paulo,
Salesiana, 1984.
5
Uma concepção inadequada da natureza espiritual ou religiosa (GS n. 42) da missão da Igreja muitas vezes
levou a formas de evasão alienante, a concessões duvidosas ao temporal e à dissociação prática entre fé e vida.
Se tem sentido afirmar como faz o Concílio que a missão da Igreja não é de ordem política, econômica e social ,
mas de ordem religiosa (GS n. 42), também é verdade que a Igreja não aceita circunscrever a própria missão
exclusivamente ao campo religioso, desinteressando-se dos problemas temporais do homem (EN n. 34).
242
a superação do dualismo discriminador entre hierarquia e laicato, com a identificação, na
prática, da Igreja com a primeira, relegando para o segundo as tarefas terrenas ou temporais,
consideradas de importância secundária.

Todos esses fatores contribuíram para re-situar o sinal da caridade e do


empenho no próprio coração da missão da Igreja, não mais à margem ou como
realidade derivada da atitude de fé. E ampliaram consideravelmente o âmbito de
atuação, superando seus limites individuais e assistenciais e abrindo-se ao horizonte
da promoção integral do ser humano e da transformação da sociedade, nos diversos
níveis familiar, social, cultural, político, internacional etc.

Podemos resumir o resultado dessa reavaliação em alguns pontos e características mais


significativas, em geral, partilhadas nos dias de hoje:
A promoção integral da pessoa e a transformação da sociedade fazem parte, de forma
essencial, da missão da Igreja, que é toda diaconal . A necessidade diz respeito não
apenas ao sinal da diaconia, mas também ao compromisso fundamental e ao objetivo final
do agir eclesial, isto é, o serviço do Reino, que tem entre suas metas a promoção integral
do ser humano e da sociedade: A Igreja, tanto no ato de dar ajuda ao mundo como no
receber muito deste, visa apenas a isto: a vinda do Reino de Deus e a salvação de toda a
humanidade (GS n. 45).
O preceito do amor inclui também a atuação no mundo: O cristão que negligência suas
tarefas temporais, negligencia seus deveres para com o próximo, e também para com o
próprio Deus, e põe em risco sua própria salvação eterna (GS n. 45).
A promoção integral da pessoa humana e a transformação da sociedade são parte
constitutiva da evangelização. Talvez a formulação mais decisiva desse tema se encontre,
em termos de Igreja universal, nas famosas palavras do II Sínodo dos bispos, de 1971:

243
O agir pela justiça e o participar na transformação do mundo se nos afiguram claramente como
dimensão constitutiva da pregação do Evangelho, isto é, da missão da Igreja para a redenção do
gênero humano e a libertação de todas as situações de opressão.6

Em termos muito semelhantes se exprimiam o Sínodo de 1974, em que a luta pela libertação
e pelo progresso é considerada parte integrante da ação evangelizadora, 7 bem como a
exortação Evangelii Nuntiandi (EN n. 31). E são bastante conhecidas, a esse respeito, as claras e
corajosas resoluções da Assembleia episcopal de Puebla:
[A libertação de Cristo fica mutilada] se esquecemos o eixo básico da evangelização
libertadora, o é como tal porque transforma o ser humano em sujeito de seu
desenvolvimento, individual e comunitário (Puebla n. 485);

(...) o melhor serviço ao irmão é a evangelização que o prepara para realizar-se como filho de
Deus, liberta-o da injustiça e o promove integralmente.8

O mundo atual, dominado pelas divisões e pela injustiça, é um mundo dominado por
estruturas de pecado 9 e por mecanismos que só podemos qualificar como
perversos .10 Essa situação de injustiça, brado de um povo que sofre e pede justiça,
é um desafio à evangelização (Puebla nn. 87; 90).
No centro da missão salvífica da Igreja encontra-se a libertação integral das pessoas, que é
a libertação de toda a escravidão para o crescimento e a comunhão (Puebla n. 141;
482). Daí a necessidade da opção pela evangelização libertadora (Puebla n. 485-487).
A missão evangelizadora exige hoje, como sinal de fidelidade a Cristo, a opção
preferencial pelos pobres,11 que são os primeiros destinatários da missão e possuem um
grande potencial evangelizador (Puebla n. 1.142; 1.147).

6
A justiça no mundo , Introdução: Enchiridion Vaticanum, vol. 4. Bolonha, Dehoniane, 1978, p. 803.
7
Cf. G. Caprile, Il Sinodo dei Vescovi: terza assemblea generale (27 de set.-26 de out. 1974). Roma, La Civiltà
Cattolica, 1975, p. 331.
8
Puebla n. 1145. Cf. outras expressões semelhantes nos n. 90, 476.
9
João Paulo II, Encíclica Sollicitudo Rei Socialis (30/12/1987), n. 36 e 37.
10
Ibid, n. 17.
11
Essa opção, formulada claramente em Puebla (n. 1134-1165), foi estendida explicitamente a toda a Igreja
no Sínodo extraordinário de 1985 e na encíclica Sollicitudo Rei Socialis, n. 42. Em todas as Diretrizes gerais da ação
evangelizadora da Igreja no Brasil, que se renovam de 4 em 4 anos, o episcopado brasileiro tem mantido desde 1979
esta expressão nos planos pastorais: Evangelizar [...] à luz da evangélica opção pelos pobres. Cf. CNBB, Diretrizes
gerais 2003-2006. São Paulo, Paulinas, 2003, Objetivo geral , p. 5.

244
2.3 A nova face da diaconia eclesial

De todas essas instâncias emergem de algum modo, o aspecto renovado da ação caritativa
da Igreja, os novos traços característicos do sinal da diaconia:12

2.3.1 Horizonte universal

A diaconia não se fecha no âmbito intraeclesial (isto é, reduzida aos membros da


Igreja), mas é serviço para o mundo, para todas as pessoas, sem discriminações raciais, sociais
ou religiosas (AG n. 12), especialmente aos mais pobres e necessitados (ibid.). Ela deve envolver
todos os níveis de atuação e de participação: pessoal, familiar, social, econômico, ecológico,
político, internacional. Cada um desses níveis tem seu alcance específico e compromete os
indivíduos e a comunidade de modo diverso, a ser determinado à luz do Evangelho e com as
devidas mediações culturais.

2.3.2 Estilo evangélico e inspiração cristã

A diaconia eclesial deve mostrar os traços do amor evangélico, e traduzir-se, assim, em


compartilhamento, serviço, libertação, participação e amor universal (cf. AG n. 12). Como tal,
é um amor que privilegia os mais pobres e se identifica com os mais pobres, não em sentido
paternalista (ajuda aos pobres), mas reconhecendo sua dignidade e seu protagonismo eclesial.
Importância especial adquire a atenção às pessoas com necessidades especiais e marginalizadas da
comunidade.
Nessa tarefa deve haver uma preocupação com o caráter específico da inspiração cristã.
Exclui-se, portanto, toda atividade incompatível com o espírito evangélico, que se
caracteriza, em termos concretos, mais que pela própria natureza das ações empreendidas
(que também podem ser comuns aos não cristãos), pelo horizonte de motivações e ideais em que
se inspira e pela função crítico-profética da fé no interior da práxis histórica.

12
Cf. P. Jurio, Diaconía , in: C. Floristan - J. J. Tamayo (eds.), Conceptos fundamentales de pastoral. Madri,
Cristiandad, 1983, p. 230-237.
245
E é importante respeitar também a autonomia do temporal e a multiplicidade das
competências, num espírito de diálogo e de sincera colaboração.

2.3.3 Corresponsabilidade comunitária

O testemunho da caridade eclesial não pode ser deixado exclusivamente à iniciativa


individual ou à boa vontade de alguns cristãos. Ele é tarefa de toda a comunidade eclesial, à qual
cabe a responsabilidade global, e não apenas apanágio de alguns membros especializados ou
dedicados ao trabalho . E se alguns serviços requerem pessoas particularmente generosas ou
capazes, estas devem ter todo o apoio da comunidade.

2.3.4 Qualificação pastoral plena e evangelização do sinal da diaconia

A diaconia eclesial não se limita a simples instrumento auxiliar na busca de objetivos


pastorais considerados mais importantes (como a catequese ou a frequência dos
sacramentos). O exercício da caridade eclesial pertence por direito próprio à missão pastoral da
Igreja, e é ela própria ação pastoral, enquanto sinal e testemunho dos valores do Reino.13

2.3.5 Critério de autenticidade evangelizadora

A centralidade evangélica do mandamento do amor confere à diaconia eclesial


um certo primado entre as funções pastorais e constitui, em relação a estas, um critério
de autenticidade: O serviço ao irmão e a diaconia caritativa são as premissas para que as
outras expressões da vida da comunidade funcionem; são o critério de sua autenticidade .14
Diante da grave crise de credibilidade da Igreja atual, apenas o testemunho efetivo do
amor se faz convincente: A diaconia se torna critério decisivo para se poder
distinguir, na práxis eclesial, entre autoafirmação (institucional) e solidariedade, entre fé e
ideologia, entre amor e poder, entre libertação e posse, entre Baal e Javé .15

13
O Documento Catequese Renovada da CNBB em sua quarta parte mostra como, na caminhada da comunidade, vão
crescendo juntos e se desenvolvendo a caridade e a diaconia num fluxo mútuo e salutar. Esse processo é descrito em
quatro passos (cf. n. 288-310). Particularmente no n. 301, comentando o último passo, diz: Em nome do Evangelho, a
comunidade eclesial deve iluminar pela fé os projetos históricos, políticos, econômicos, culturais do mundo,
promovendo a inviolável dignidade do homem, sua responsabilidade em face do bem comum . E faz esta ressalva: Mas
a comunidade, enquanto Igreja, não se liga diretamente a um projeto histórico, especialmente na política. Pelo
anúncio do Evangelho, ela se evidencia como portadora de critérios que a colocam acima de qualquer projeto (Brasil,
CR n. 301). Cf. também a bela apresentação da virtude evangelizadora da caridade em AG n. 12.
14
R. Völkl, Diaconia e carità. Bolonha, Dehoniane, 1978, p. 64. O autor afirma mais adiante: Serviço ao irmão e
diaconia caritativa são, além disso, critério determinante para a verdadeira pertença do indivíduo à comunidade , ibid., p.
65.
15
O. Fuchs, Chiesa per gli altri , Concilium 24 (1988), n. 4, p. 548. Sobre esse tema, cf. as luminosas reflexões de J.
Martin Velasco, Presencia evangelizadora y compromiso de los cristianos , Teologia y Catequesis (1987), n. 23-24, p.
525-44.

246
Essa descrição do sinal da diaconia, em seu significado atual, reflete a necessidade urgente
da passagem de uma pastoral predominantemente cultural e religiosa a uma opção
evangelizadora na promoção humana e a partir dos pobres.16 É uma opção que envolve
também o exercício da catequese. E tudo leva a crer que é nessa direção que se deve
caminhar rumo ao futuro.

3. CATEQUESE E DIACONIA ECLESIAL: DIMENSÃO DE COMPROMISSO E


PROMOCIONAL DA CATEQUESE

A nova consciência eclesial do significado da diaconia reflete-se no modo de conceber a


identidade e as tarefas da ação catequética. A postulação foi recebida, de forma mais ou menos
consistente, na reflexão catequética e nos principais documentos da catequese pós-conciliar,
como se vê na mensagem final do Sínodo de 1977,17 em Catechesi Tradendae (CT n. 29) e no
novo Diretório (DGC n. 103-104). Também nos documentos de âmbito nacional se ressalta a
dimensão de compromisso da catequese: entre esses destaca-se o Diretório Nacional dos Estados
Unidos, que dedica todo um capítulo ao compromisso social da catequese,18 e diversos
documentos latino-americanos.19
Se quisermos explicitar sinteticamente a relação entre catequese e diaconia eclesial, eis
alguns dos aspectos mais significativos:

1
17
Mensagem do Sínodo de 1977, n. 10. Pode-se dizer que este é o espírito que perpassa também todo o documento
Catequese Renovada, como outros documentos complementares, publicados na Coleção Estudos da CNBB, como:
Textos e manuais de catequese: orientações para sua elaboração, análise e avaliação (n. 53, 1987); Primeira
Semana Brasileira de Catequese (n. 55, 1987); Formação de catequistas: critérios pastorais (n. 59, 1990);
Orientações para a catequese de crisma (n. 61, 1991); Catequese para um mundo em mudança (n. 73, 1994); O hoje de
Deus em nosso chão (n. 78, 1998); Com adultos catequese adulta (n. 80, 2001); Segunda Semana Brasileira de
Catequese (n. 84, 2002).
18
USA (NCD) cap. VII: Catechesi per il ministerio sociale.
19
Cf. CAL n. 24; Brasil CR desenvolve o tema da responsabilidade social e política do cristão (n. 252-80) e a
importância do compromisso no caminho de crescimento da comunidade catequizante (n. 288-316). México GP n. 83-
86. Cf. também RdC n. 96; Alemanha KWK A3.3.-34; Espanha CC n. 92.
247
3.1 Catequese voltada para a promoção

A catequese hoje deve assumir a opção pastoral pela evangelização na promoção


humana e a partir dos pobres, no interior de uma Igreja em estado de serviço à humanidade. Esse
é o horizonte de uma catequese em sintonia com a natureza diaconal de toda a Igreja.

A catequese atual deve assumir totalmente as angústias e as esperanças do homem de hoje, para lhe
dar a possibilidade de uma libertação plena: as riquezas de uma salvação integral no Senhor Jesus
Cristo. Por isso deve ser fiel à transmissão não apenas da mensagem bíblica em seu conteúdo
20
intelectual, mas também à realidade vital encarnada nos fatos da vida do homem de hoje.

A catequese, conquistando discípulos para o Senhor Jesus, realiza obras de conscientização e de


libertação orientadas para a luta por um mundo conforme ao projeto de Deus. É o aspecto de
compromisso e promocional da catequese (CAL n. 24).

Em meio a tantas forças desumanizantes e tantas mortes em muitos países asiáticos, nossa catequese
deve promover a vida. Ela deve chamar a atenção de todos os setores da Igreja para o grito
agonizante de Deus em meio ao seu povo, que espera de todos uma resposta de vida.21

A assunção plena da opção preferencial pelos pobres representa hoje, para a catequese, um
desafio e um critério de autenticidade.22 Surge nesse clima uma nova catequese, profundamente
renovada em seus conteúdos e métodos, aberta também à participação de novos sujeitos e plena
de tensão evangelizadora.23 Ela constitui um verdadeiro fator de promoção integral do ser
humano, uma defesa de sua dignidade e realização, um instrumento de libertação.24

20
Medellín (Catechesi), n. 6. Este clássico texto de Medellín é citado três vezes em Brasil CR: n. Cinapura 73-74,
101; cf. n. 69-70, 93, 116.
21
Ásia (1995), III.
22
Cf. DGC n. 104. A. Fossion, La catéchèse dans le champ de la communication.: ses enjeux pour l´inculturation de la
foi. Paris, Cerf, 1990, p. 338; A. Mejía Pereda, Pobres, opción preferencial por los , Nuevo Dic. Cat., p. 1849-63.
23
Cf. Puebla n. 100, 1147.
24
Medellín (Catechesi), n. 7. Cf. CAL 20. Brasil CR n. 20, 30, 73-74, 93, 104, 114, 138, 190, 222, 257 etc.
248
3.2 Catequese e educação para o serviço sociocaritativo

A catequese tem a tarefa de educar para o exercício da caridade eclesial em todas as suas
implicações e níveis de atuação. Trata-se de um objetivo que admite várias formulações, mas que é
absolutamente consensual:

A catequese eclesial tem implicações em todo o âmbito de ação dos cristãos e da Igreja. Ela deve abrir
25
perspectivas e motivações que possam estimular a paz, a justiça e a humanização.

Uma das tarefas fundamentais da catequese moderna consiste em suscitar e estimular novas formas de
compromisso, sobretudo no campo da justiça.26

Trata-se, portanto, para a catequese, de uma tarefa de verdadeira educação para a diaconia:
educação, isto é: informar e envolver, dar motivações, desenvolver o senso crítico, sugerir
chaves de interpretação, orientar a ação, promover vocações específicas no âmbito do empenho
e do serviço;
para diaconia eclesial, que implica diversas atitudes a promover: compartilhamento,
solidariedade, compromisso, participação, denúncia, responsabilidade etc., para a promoção
dos valores do Reino: o amor, a fraternidade, a justiça, a paz, a liberdade.27
Na práxis catequética concreta, seria possível citar muitas realizações e experiências que
dão um espaço relevante à dimensão diaconal da catequese.28

25
Alemanha KWK A 3.4. Cf. Brasil CR n. 239, 240, 243, 248, 274, 275 etc.
26
Mensagem do Sínodo de 1977, n. 10.
27
Cf. USA (NDC), n. 170.
28
Por exemplo: as Comunidades Eclesiais de Base, na América Latina; a Campanha da Fraternidade, no Brasil; o
projeto Chantier , no Canadá (cf. L. V. Perrelli, Il progetto Chantier , Catechesi 48 [1979], n. 13, p. 35-42); o
projeto vienense de textos de religião para as escolas austríacas (cf. E. J. Korherr, Katechese und aritas ,
Christlich Pädagogisch Blätter 94 [1981], n. 5, p. 326-38); o modelo escolástico de Lumen Vitae: Comment parler du
tiers monde? Bruxelas, Lumen Vitae, 1981. Cf. também E. García Ahumada, Lo social en la catequesis de niños,
adolescentes e adultos , Sinite (1987), n. 86, p. 431-58.
249
3.3 A diaconia no âmago do ato catequético

Mas é também no âmago do próprio caminho do crescimento na fé que o momento do


empenho e do amor ativo desempenha um papel indispensável:
A diaconia é de fato momento constitutivo do anúncio e do testemunho do Evangelho por
parte das comunidades eclesiais. Enquanto tal, faz parte do processo da catequese, não
apenas como condição ou pré-requisito do anúncio cristão, mas como parte do próprio
anúncio:

A catequese assume especial valor educativo quando é ligada ao exercício da caridade, que oferece
um fundamento válido para que se acolha e se traduza em prática a visão cristã das realidades sociais,
29
econômicas, políticas, culturais.

Sabemos que a dimensão operativa é componente essencial da atitude da fé e que a


meta da maturidade inclui também os traços do dinamismo operativo e da coerência.30
Portanto, a interiorização da fé implica também o exercício do empenho e da caridade.
O exercício da diaconia constitui para a catequese um critério de autenticidade,
especialmente quando se vive a opção preferencial pelos mais fracos e mais pobres:

Portanto, pode-se concluir que o momento caritativo é parte essencial do processo


catequético: a fé não cresce e não amadurece se não se tornar diaconia.

3.4 Diaconia e atenção aos últimos

A dimensão promocional da catequese e a opção preferencial pelos pobres devem-se


traduzir, no exercício concreto da catequese, em uma atenção especial a todos os desfavorecidos e
sofredores no âmbito da comunidade cristã. E entre esses merecem uma atenção particular as
pessoas com necessidades especiais e marginalizados.
Em sua relação com o mundo das pessoas com necessidades especiais, em suas diversas
formas, a comunidade cristã deve demonstrar uma solicitude especial e respeitosa, com
uma atitude de acolhimento e de particular atenção:

Toda comunidade cristã considera como pessoas prediletas do Senhor aquelas que, especialmente
entre os menores, sofrem de deficiência física, mental, e de outros tipos. Uma maior consciência
social e eclesial e os inegáveis progressos da pedagogia especial fazem que a família e outros
lugares de formação possam hoje dar a essas pessoas uma catequese adequada, a que têm direito
como batizados (DGC n. 189).

29
Proposta 4 do Sínodo de 1977: cf. M. Matos, Sinopsis para un estudio comparativo de la ´Catechesi Tradendae´ con
sus fuentes , Actualidad Catequética (1980), n. 96, p. 97-144.
30
Ver capítulo 5 deste livro, itens 3.2.2 e 3.4.4. O documento brasileiro CR fala de atividades
transformadoras (n. 135) ou atividades educativas da fé (n. 156) e atividades transformadoras e educativas (n. 157).
No documento Textos e manuais de catequese que aprofunda alguns aspectos de CR, particularmente na dimensão
metodológica, retoma este tema usando a expressão mais exata de ações evangélico-transformadoras : cf. CNBB,
Textos e manuais de catequese. São Paulo, Paulus, 1987, n. 125-136; 189-195 (Estudos da CNBB n. 53). Para um
aprofundamento deste tema cf. L. Alves de Lima, A face brasileira da catequese, op. cit., p. 433-35.

250
A catequese das pessoas com necessidades especiais fez enormes progressos nas
últimas décadas e doravante pode contar com reflexões e experiências de grande valor
pedagógico e pastoral. Mas ainda existe muito a fazer para criar uma mentalidade adequada, para
evitar que a cura pastoral dessas pessoas fique à margem da pastoral comunitária (DGC n. 189),
para valorizar realmente todos os recursos que este segmento possui. O trabalho catequético com
as pessoas com necessidades especiais é rico de possibilidades e de recursos, e tem muitas
lições a dar, mesmo em comparação com a catequese dos chamados normais .31

A pastoral e a catequese devem dar uma atenção especial ao vasto mundo dos
marginalizados, dos novos pobres, e também programar uma atividade tão importante
quanto difícil para atender a esse grupo:

Na mesma perspectiva considera-se a catequese de pessoas em situações de marginalidade, ou


próximas disso, ou já mergulhadas totalmente na marginalidade, como imigrantes, refugiados,
nômades, pessoas sem moradia fixa, doentes crônicos, dependentes de drogas, prisioneiros... A
palavra solene de Jesus, que considera como dirigido diretamente a ele qualquer gesto feito aos
irmãos mais pequeninos (Mt 25,40; 45), assegura a graça de bem agir em situações difíceis (DGC
n. 190).
E aqui nós temos uma verdadeira pedra de toque da autenticidade da nossa catequese.
Aqui se abrem muitos campos para iniciativas muito absorventes, que exigem agentes
catequéticos corajosos e especializados. Nem todos serão capazes de inserir-se de forma efetiva
nesses segmentos específicos, mas é importante que toda a comunidade se sinta solidária e
corresponsável nessa obra altamente evangelizadora (DGC n. 190).

31
Para um aprofundamento do tema, ver a bibliografia no fim do capítulo.
251
3.5 Diaconia e revisão dos conteúdos catequéticos

A dimensão de compromisso e libertadora da catequese implica uma revisão adequada


dos próprios conteúdos. Entre esses, a doutrina social da Igreja32 e sobretudo os aspectos e as
exigências da libertação integral do homem:

A teologia, a pregação, a catequese, para serem fiéis e completas, devem ter em mira toda a
pessoa e todas as pessoas, e comunicar, oportunamente, uma mensagem especialmente vigorosa
para nossos dias, sobre a libertação (EN n. 29) (Puebla n. 479).

Daí também o cuidado que a catequese deverá ter em não omitir, mas antes esclarecer, como
convém em seu esforço de educação para a fé , algumas realidades, como a ação da
pessoa para a sua libertação integral, a busca de uma sociedade mais solidária e fraterna, as lutas
pela justiça e pela construção da paz (CT n. 29).

Essa exigência geral se traduz numa multiplicidade de temas que fazem parte do
conteúdo da catequese como, por exemplo: o serviço pela paz e pela compreensão entre os
povos, a humanização do mundo do trabalho, a responsabilidade política, o respeito à vida e à
criação, os problemas sociais e econômicos, as diversas formas de marginalização e de
discriminação etc.33
Além disso, não se deve esquecer uma outra exigência importante do conteúdo da
catequese, isto é, explicitar a dimensão de compromisso e social dos diversos conteúdos da
fé, de modo a estimular uma experiência de vida cristã aberta à responsabilidade operativa
em todos os níveis.34

32
Cf. CT n. 29; DGC n. 175; CAL n. 20; USA (NCD), n. 150-164; E. García Ahumada, A dimensão social na
catequese de crianças, adolescentes e adultos , Revista de Catequese 10 (1987), n. 40, p. 46-52; 11 (1988), n. 41, p.
34-37; 11 (1988), n. 42, p. 35-40; 11 (1988), n.43, p. 41-44; R. Mendes de Oliveira, Catequese e política , Revista de
Catequese 10 (1987), n. 38, p. 3-4. M. Toso, Catechesi e dottrina sociale della Chiesa , Orientamenti Pedagogici 37
(1990), n. 5, p. 959-91.
33
Cf. USA (NCD) 167-170; CAL 90; Alemanha KWK A 3.4; RdC 97.
34
ense , por exemplo, nas novas perspectivas que se abrem, a essa luz, a temas como a eucaristia, a consciência
moral, os milagres de Jesus, a oração de súplica etc. Cf. L. Alves de Lima, Dimensão política da catequese:
considerações pastorais , Revista de Catequese 14 (1991), n. 55, p. 3-23 (publicado também como Dimensión política
de la catequesis: consideraciones pastorales , Medellín 16 (1990), n. 64, 492-515); J. I. Pimenta Teófilo, Linhas
metodológicas de uma catequese libertadora , Revista de Catequese 6 (1983, n. 23, p. 23-26.
252
3.6 Diaconia e método catequético

No exercício da diaconia eclesial, não basta confiar na improvisação ou na boa vontade:


é necessário o esforço do estudo e do planejamento. Também a catequese deve seguir as fases
de um correto processo metodológico, que nesse campo normalmente compreende:
conhecimento e análise da realidade (situações e problemas, interpretação e busca das
causas);
interpretação evangélica da situação, à luz da fé;
crítica e denúncia dos aspectos desumanizantes na sociedade e na Igreja;
orientação para a ação promocional e transformadora, no respeito da autonomia e
das realidades temporais e da especificidade do agir cristão.35
A extensão, os conteúdos e o tipo de envolvimento da dimensão diaconal dependem das
circunstâncias de cada projeto de catequese. Na verdade, são muitos e diversos os fatores
determinantes: estado e condição dos participantes, contexto cultural e sociopolítico, circunstâncias
históricas etc. São muito diferentes as condições em que se encontram, por exemplo, um grupo de
crianças ou uma comunidade de base, no campo ou na cidade, num bairro operário ou de classe
média etc. A catequese deve levar isso em conta no momento de planejar objetivos, conteúdos e
métodos no que se refere à sua tarefa de iniciação à diaconia da Igreja para o crescimento e o
amadurecimento da fé.

4. UM PROBLEMA PARTICULAR: CATEQUESE E POLÍTICA

Merece especial atenção um setor muito importante da atuação dos cristãos: o da


ação política. As relações entre catequese e política foram muitas vezes objeto de discussões e
motivo de divergências. Já se disse de certas experiências de catequese que pecavam por
uma politização excessiva, por horizontalismo, ou até por serem francamente
instrumentalizadas em proveito de interesses ideológicos ou partidários; em outras situações, a
catequese é acusada de

35
Dois exemplos concretos: a encíclica Sollicitudo Rei Socialis segue esse roteiro metodológico, em âmbito universal; o
documento Brasil CR (n. 288-310) apresenta de forma bastante concreta o caminho de uma comunidade que cresce na
fé, integrando-a harmonicamente em um processo de conscientização e de compromisso operativo. Cf. J. L. Pérez
Álvarez, Compromiso: orientaciones pedagógicas , Nuevo Dic. Cat., p. 436-37.
36
Recorde-se, por exemplo, na época dos catecismos, a parte relativa à obediência e à reverência devida ao imperador e
aos príncipes, no contexto dos deveres do quarto mandamento: Cf. E. Germain, Catechismo imperiale , Diz.Cat., p.
122-23.
253
Não faltaram catequistas que, por causa de seu compromisso social, foram presos, torturados,
assassinados.37 Trata-se, sem dúvida, de um tema difícil e delicado, que merece todo esforço que
se faça visando ao seu esclarecimento.38

4.1 Ação política e mentalidade contemporânea

Esclareçamos primeiramente o significado que se deve dar ao termo ação política . É


bastante frequente, principalmente no âmbito da reflexão eclesial, distinguir duas acepções
principais do termo política :39
Em sentido estrito, a política diz respeito à gestão do bem comum pelo do exercício do
poder, em suas diversas formas (legislativo, judiciário, executivo) e por meio das pessoas e
instituições que representam esse poder (governo, partidos, parlamento, órgãos
administrativos etc.).
Em sentido lato, entende-se por ação política toda forma direta ou indireta de participação
na promoção e gestão do bem comum e no exercício do poder, por meio de variadas formas
de presença e de atividade (educação, animação cultural, opinião pública, atividade
pastoral, serviço social etc.). Nessa perspectiva, todas essas formas de atividade podem ter
uma inegável dimensão política, e muitas vezes são chamadas de pré-políticas .
Na nossa época é muito viva a consciência da importância da ação política para a vida
social e para o futuro da convivência humana. Na origem desse fato, de um ponto de vista
histórico e cultural, encontra-se sobretudo a secularização, que modificou a visão do homem e da
história. De uma atitude de passiva contemplação e de resignação ineficaz, passa-se à convicção
de que o mundo é uma realidade a construir e o futuro um amplo programa a gerir.

37
Cf. R. Viola, Visages de la catéchèse en Amérique Latine. Paris, Desclée, 1993, p. 12.
38
Cf. as indicações bibliográficas no fim do capítulo. Para uma visão sumária cf: E. Alberich, Catechesi e
coscienza politica , Catechesi 42 (1973), n. 175, A, p. 1-20. Como uma experiência neste campo pode-se consultar o
texto do bispo Antônio Soares Costa, Educação política , Revista de Catequese 5 (1982), n. 17, p. 39-48.
39
Cf. por exemplo: Puebla n. 521-523; Brasil CR 268, 301; B. Sorge, Politica , M. Midali - R. Tonelli (eds.),
Dizionario di Pastorale Giovanile. Leumann (Turim), Elledici 1989, p. 763-73.

254
O desenvolvimento científico e técnico oferece aos seres humanos amplas possibilidades de
intervenção e instrumentos válidos de análise para conhecer, interpretar e mudar a realidade
social. Nasce, assim, a convicção de que o destino da convivência humana e as condições de vida
não dependem tanto do destino cego da natureza ou de alguma estrutura social imutável, mas
principalmente do livre jogo das decisões humanas e da gestão responsável do bem comum.
Surge a consciência de que é possível tomar nas mãos o destino e as rédeas do próprio futuro. E,
se é possível, isso significa que se trata de um imperativo: desse modo a sensibilidade política
se torna também consciência política, isto é, conhecimento de um imperativo ético que
interpela o senso de responsabilidade e exige a assunção de determinados compromissos.40
O âmbito da ação política apresenta, pois, algumas características de grande relevância
moral e operativa. Vamos destacar três delas: a universalidade, a laicidade e o conflito.
A universalidade: a ação política, longe de constituir apenas um campo especial de
atividade (ao lado da ação social, econômica, educacional etc.), tem um aspecto
globalizante, enquanto dimensão inerente a toda atividade de alcance social.41 Revela-se,
pois, ilusória a pretensão de assumir uma posição neutra ou apolítica , quando se trat
de uma atividade de ordem cultural ou social, que sempre se interliga, de um modo ou de
outro, com a densa trama do jogo político. E isso vale principalmente para as ações
que envolvem diversas instituições, civis ou religiosas, cujo peso político efetivo deve ser
conhecido, avaliado e, se for o caso, modificado.
A laicidade: a política constitui um setor profano de atividade que tem sua autonomia e
suas próprias regras. Nesse sentido, não é possível deduzir as linhas concretas de
um projeto político inspirando-se diretamente na fé cristã:

40
Cf. Ph. Roqueplo, Esperienza del mondo: esperienza di Dio? Leumann (Turim), Elledici, 1972, p. 39.
41
Cf. Puebla n. 513. Como afirma R. Coste, não se trata de uma forma secundária da atividade humana, mas de uma
das suas dimensões essenciais, uma vez que o político é uma superestrutura que abarca o econômico, o social, o
cultural, o familiar e finalmente o pessoal uma vez que cada um é membro de uma comunidade , e a política
concreta influencia, positiva ou negativamente, toda a estrutura que lhe é subjacente : R. Coste, Vangelo e
politica. Bolonha, Dehoniane, 1970, p. 18. Cf. também B. Sorge, loc. cit., p. 764.
255
Esse conceito sadio de laicidade impede que a coerência com a fé, exigida dos cristãos
que atuam na política, degenere em confessionalismo ou em clericalismo; isto é, impede que a
política venha a servir a fins diferentes daqueles que lhe são próprios: o bem temporal da
comunidade civil. Não é lícito pôr a política a serviço dos interesses da Igreja ou considerá-la
como um instrumento para a evangelização e salvação das almas!42

O caráter conflituoso: historicamente, a atividade política com frequência se caracteriza


pelo conflito social, pela injustiça e discriminação, pela violação de direitos humanos, por
formas variadas de autoritarismo e de abuso de poder. Diversos documentos eclesiais
descrevem a situação, em termos dramáticos, como injustiça estrutural, institucionalizada,
que divide os indivíduos e os grupos em dominadores e dominados, opressores e
oprimidos, participantes e excluídos na obra de promoção integral e de
comunitário.43 Essa situação torna conflituosa e muitas vezes dramática a participação na
ação política.
Essas considerações mostram a complexidade e relativa ambiguidade do jogo político, que
por um lado obriga a mergulhar fundo e a sujar as mãos , e por outro implica sempre o risco da
instrumentalização e da conivência.

4.2 Fé cristã e opções políticas

A complexidade do fato político e a justa autonomia da ordem temporal tornam problemática


a relação entre a fé cristã e a opção pela atuação no campo político. Por outro lado, é necessário
superar toda forma de estranheza ou dualismo entre as duas esferas vitais. No âmbito do nosso
tema específico, eis algumas exigências que se devem ter presentes:44
O cristão vê a fé envolta em suas opções políticas, dado que a salvação em que ele crê se
encarna também ainda que de formas sempre inadequadas em toda realização
histórica de autêntico progresso e promoção humana.

42
B. Sorge, loc. cit., p. 766. B. Cansi, O leigo catequista e o momento político , Revista de Catequese 10 (1987, n.
39, p. 16-26.
43
Cf. as severas observações dos documentos de Medellín e Puebla (cf. Medellín [Paz}, introdução; Medellín
[Catequese] 7; Puebla n. 27-50) e da encíclica Sollicitudo Rei Socialis (n. 11-26). Cf. também Brasil CR n. 171.
44
Sobre esse tema, cf: B. Sorge, loc. cit., p. 767-70; E. Alberich, Fede cristiana e scelte politiche , Orientamenti
Pedagogici 22 (1975), n. 5, p. 847-64. L. Alves de Lima, Dimensão política da catequese: considerações
pastorais , Revista de Catequese 14 (1991), n. 55, p. 3-23 (publicado também como Dimensión política de
la catequesis: consideraciones pastorales , Medellín 16 (1990), n. 64, p. 492-515.
256
Da fé cristã não é possível extrair projetos políticos precisos. Ela constitui, porém, no
interior da ação política, um importante princípio de orientação, estímulo e avaliação,
principalmente oferecendo motivações, valores e um horizonte transcendente, que lhe
consagra o significado. É assim, por exemplo, que a consciência cristã canaliza para o
âmbito político algumas exigências de base como, por exemplo: O respeito pelos
pobres, a defesa dos fracos, a proteção aos estrangeiros, a desconfiança em relação à
riqueza e a condenação do domínio exercido pelo dinheiro, a derrubada dos poderes
totalitários .45
A fé cristã tem uma função crítica de denúncia e de purificação frente às realizações
históricas concretas da práxis política. Os cristãos, mesmo aceitando o legítimo
pluralismo das opções políticas, encontram na fé motivos de incompatibilidade com
determinados projetos e ideologias políticas. E também no que se refere às próprias opções,
devem assumir uma atitude de contínua conversão e rever constantemente as próprias
posições, à luz do Evangelho.
A atuação dos cristãos na vida política exige a mediação da análise científica da realidade e
a concretude das opções de atuação, que não se podem fazer provir diretamente da fé. Daí
a dificuldade e, por vezes, a dramaticidade das opções dos crentes que, ainda que fazendo
derivar da fé muitos motivos inspiradores, se encontram imersos, como todos, na busca
sofrida de opções de ação adequadas, para se manterem fiéis ao ideal de sociedade que
entrev em à luz do Evangelho.
Dada a importância da ação política, o envolvimento responsável dos cristãos nesse campo
constitui um critério de autenticidade e de credibilidade do anúncio evangélico.
Assim se evita o perigo de refugiar-se em formas ambíguas de espiritualidade ou de
religiosidade que representam apenas evasão e descompromisso.46
Estamos diante de uma série de exigências que obrigam os indivíduos cristãos e as
comunidades eclesiais a uma contínua reflexão e a um dinamismo de conversão para traduzir em
opções políticas coerentes os imperativos fundamentais da mensagem evangélica.

45
Por uma prática cristã da política (documento dos bispos franceses de outubro de 1972). Il Regno documenti
17(1972) n. 21, p. 549.
46
Se a mensagem cristã relativa ao amor e à justiça não demonstra sua eficácia na ação a favor da justiça no mundo,
será muito mais difícil conseguir que ela conquiste credibilidade junto aos homens de nosso tempo : Sínodo dos Bispos,
La giustizia nel mondo (cf. Enchiridion Vaticanum. Vol. 4. Bolonha, Dehoniane, 1980, p. 817).
257
4.3 Comunidade cristã e ação política

Se, porém, das declarações de princípio se passar à determinação das tarefas concretas que,
na esfera política cabem aos cristãos enquanto indivíduos e enquanto comunidade, o problema se
torna mais delicado e mais complexo. Falando em termos gerais, podemos distinguir as etapas
características do processo metodológico, aplicadas ao momento político:
conhecer bem a situação social e política concreta na qual se está inserido, usando
instrumentos adequados de análise e procurando chegar às causas estruturais que estão
em sua base;
interpretar e avaliar a situação à luz da fé e da tradição eclesial, aprofundando os motivos
inspiradores do Evangelho, assumindo as atitudes e critérios próprios da fé,
e fazendo as opções adequadas;
fazer com coragem a denúncia profética dos aspectos desumanizantes da ordem
social e política, desmascarando o mal em todas as suas formas e todo atentado à
dignidade da pessoa humana;
exercer também a autocrítica, à luz dos critérios evangélicos, nas relações com suas
próprias instituições e atividades;
estar presente e participar ativamente nos diversos níveis de ação política,
respeitando-lhe a justa autonomia e levando-lhe o espírito próprio dos discípulos de Cristo.
No exercício da atuação política surgem problemas concretos relativos a envolvimento
efetivo dos diversos níveis e funções eclesiais.
versa é a tarefa das comunidades enquanto tais, dos diversos grupos e associações e
dos indivíduos cristãos enquanto cidadãos que se movem à luz da fé.47 Em princípio, a
ação política no sentido estrito é própria dos indivíduos crentes, em sua qualidade de
cidadãos, enquanto que as comunidades como tais são chamadas antes a difundir os
valores evangélicos e a dedicar-se a obras de promoção em nível social e pré-político (cf.
GS n. 42).
stinto é o grau de envolvimento dos diversos membros da comunidade eclesial, no
respeito à variedade dos ministérios e dos carismas. A atividade política em sentido estrito
é sobretudo tarefa dos leigos,48 enquanto os pastores e os religiosos têm, por norma, um
papel de animação comunitária e de serviço à comunhão dificilmente compatível com a
militância política em sentido estrito.49

47
Cf. GS p. 76; Puebla n. 521-24.
48
Cf. Puebla n. 524; Brasil CR n. 268.
49
Cf. Puebla n. 526-530. Brasil CR n. 303.
258
4.4 Catequese e ação política

À luz dessas premissas, podemos agora tentar indicar as principais exigências no que se
refere à tarefa da catequese para a ação política.

4.4.1 Dimensão política da catequese

A ação catequética tem sempre uma dimensão política que é analisada e gerida de
forma responsável. Com efeito, a catequese, por sua pertença à ação eclesial e por seu
alcance cultural e educativo, assume sempre um certo significado político, que pode ser
objeto de manipulações interesseiras (cf. Puebla n. 558). Por isso cumpre analisar adequadamente
seu significado e sua influência, para conhecer-lhe os aspectos positivos e negativos, e realizar as
mudanças necessárias.
Da mesma forma, faz parte também da tarefa promocional da catequese apresentar os
diversos conteúdos da mensagem cristã em sua relevância política, isto é, na sua dimensão social
e de compromisso, com toda a força inovadora e transformadora da práxis libertadora de Cristo e
da genuína experiência cristã.

4.4.2 A educação para a política, tarefa da catequese

A catequese, na sua qualidade de educação para a diaconia eclesial, deve ser também
educação para a atuação política das comunidades e dos cristãos. Com efeito, a ação política é
um momento integrante dessa diaconia. Isso quer dizer que também se aplicam à política as
exigências feitas à catequese no sentido de suscitar e estimular novas formas de atuação,
sobretudo no campo da justiça ,50 e de abrir perspectivas e criar motivações que possam levar
à paz, à justiça e à humanização .51
Uma justa compreensão do significado da ação política e de seus diversos níveis
permitirá superar, na catequese, a recomendação habitual de não ocupar da política suja
e aquela forma inadequada de entrar no terreno político que consiste em inculcar, de forma
passiva e acrítica, o respeito à autoridade e à ordem constituída.53 Existe pois, com relação a isso,
uma tarefa precisa de educação e de iniciação por parte da catequese. Destacamos a seguir alguns
de seus pontos mais importantes:

50
Mensagem do Sínodo de 1977, n. 10.
51
Alemanha KWK A. 3.4.
52
Cf. T. Filthaut, Per un impegno politico: educhiamo a vivere nell´oggi , Note di Pastorale Giovianile 5
(1971), n. 1, p. 17.
53
Uma catequese desse tipo educa estudantes dóceis e obedientes, mas não indivíduos políticos; prejudica a fé e não
leva em conta a realidade política moderna. A fé exige que a pessoa aja livremente, como adulto e de forma responsável.
Assim deve comportar-se o crente, tanto no âmbito da Igreja como na sociedade humana: em ambas as comunidades ele
não deve ser reduzido ao papel de súdito : T. Filthaut, art. cit. p.18.
259
Educar para uma consciência política inspirada no cristianismo
Trata-se sobretudo de ilustrar adequadamente o significado da ação política, as suas formas
e características, sua relação com a promoção integral do ser humano, e seus constantes perigos
de degeneração desumanizante. Significa aprofundar a relação entre fé cristã e opções políticas,
de modo a superar as posições dualistas ou integristas, e ajudar a interiorizar as atitudes cristãs
política (respeito à autonomia do temporal, senso do pluralismo, aceitação dos valores
cristãos, espírito de colaboração etc.).
Educar para a consciência política significa também despertar vocações
diferenciadas para a atuação política.54 Visto que a Igreja, a serviço da libertação integral da
pessoa, procura cada vez mais motivar muitos cristãos a se dedicarem à libertação dos outros
(EN 38), a catequese tem um campo concreto de aplicação, para fazer que cada um encontre o
próprio lugar na sociedade, no respeito à diversidade dos carismas e dos ministérios eclesiais.

Educar para a ação política à luz da fé


Já mostramos a articulação do caminho metodológico tendo em vista a ação: conhecimento
e análise da situação, discernimento evangélico, denúncia profética do mal, planejamento e
intervenção. A práxis catequética é também chamada a fornecer motivações, critérios e
instrumentos para que essas diversas funções possam ser cumpridas com competência e
honestidade, em interação dinâmica com as atitudes cristãs da fé, esperança e amor, tornados
solicitude e paixão para a salvação integral dos irmãos.

4.4.3 A catequese, reflexão política à luz da fé

A catequese deve respeitar sempre sua identidade cristã e eclesial, evitando o risco de
instrumentalização política.
Não se devem ignorar os riscos, inerentes à ação política, de perder sua finalidade
humanizante e o risco, a que está exposta a comunidade eclesial, de invadir o terreno das
legítimas autonomias temporais. No terreno concreto da práxis catequética, pode existir o risco de
ideologização da fé ou de instrumentalização da educação religiosa a serviço de interesses
políticos particulares. Na catequese não se devem identificar as exigências evangélicas com
determinadas fórmulas ou programas políticos, e muito menos impor opções políticas em
sentido estrito. O respeito ao seu caráter de educação da fé para nós se afigura hoje essencial para
o desenvolvimento de uma catequese que, sem invalidar a originalidade e a pureza do anúncio
cristão, possa levar ao amadurecimento autêntico da atuação política dos cristãos.

54
A catequese procurará também promover o surgimento de militantes nas organizações apostólicas leigas :
Espanha CC n. 92 Cf. Brasil CR n. 300.
260
SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS

O significado e o exercício da diaconia eclesial, sobretudo em relação ao problema da


promoção humana, foi e continua sendo objeto de inúmeros estudos e publicações. Quanto aos
documentos oficiais da Igreja, a produção é vastíssima. Para uma visão de conjunto, cf:
Le encicliche sociali: dalla Rerum Novarum alla Centessimus Annus. 3a ed. Roma, Paoline, 1992.
TOSO, M. Dottrina sociale oggi: evangelizzazione, catechesi e pastorale nel più recente
Magistero sociale della Chiesa. Turim, SEI, 1966.

Sobre a dimensão de compromisso e diaconal da catequese, cf. Catechesi e giustizia


sociale . Via Verità e Vita 36 (1987), n. 112.

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(1988), n. 43, p. 41-44.
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dedicado a este tema).

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UFFICIO CATECHISTICO NAZIONALE - SETTORE CATECHESI E HANDICAP. Non
voglio risorgere senza di te: linee di educazione alla vita cristiana dei disabili. Bolonha,
Dehoniane, 1996.
Sobre a relação entre catequese e política, ver:
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. Dimensão política da catequese: considerações pastorais . Revista de Catequese
14 (1991), n. 55, p. 3-23; publicado também como Dimensión política de la catequesis:
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BELLERATE, B. (ed.). Educazione e política . Vol. 1. Educazione, fede e politica. Turim, SEI,
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CANSI, B. O leigo e o momento político . Revista de Catequese 10 (1987), n. 39, p. 16-26.
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GONZALEZ-CARVAJAL, L. La catequesis politica en los momentos actuales . Teologia y
Catequesis (1983), n. 1-2, p. 107-17.
PIMENTA TEÓFILO, J. I. Linhas metodológicas de uma catequese libertadora . Revista de
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Politische Bildung . Kathekätische Blätter 102 (1977), n. 7.
SOARES COSTA, A. Educação Política . Revista de Catequese 5 (1982), n. 17, p. 39-48.
SORGE, B. Politica . In: MIDALI, M. - TONELLI, R. (eds.). Dizionario di astorale
iovanile. Leumann (Turim), Elledici, 1989, p. 763-73.

263
264
Capítulo 8
Catequese e comunidade
A catequese em todas as formas em que é concebida ou sonhada,
está ligada por laços muito estreitos à comunidade cristã. A
referência à comunidade é fundamental: diz-se que não existe
catequese sem comunidade, que a comunidade é fonte, lugar e meta
da catequese (DGC n.158), que as novas formas de comunidade
oferecem possibilidades inéditas ao desenvolvimento da catequese.
É uma instância pastoral rica de promessas, mas não isenta de
dificuldades e problemas.

1. A DIMENSÃO COMUNITÁRIA DA CATEQUESE: ESPERANÇAS E PROBLEMAS

A exigência de que a toda catequese corresponda uma comunidade cristã autêntica muitas
vezes nos leva a uma constatação amarga: onde está essa comunidade? Onde estão hoje as
comunidades cristãs da fé adulta e do testemunho convincente?
Hoje existe na Igreja um vasto movimento comunitário que assiste ao surgimento de
novas formas de comunidades desejosas de viver mais autenticamente a comunhão de fé
e de vida cristã. Nessas novas comunidades se desenvolve também um modo novo de
fazer catequese. Esse novo modo, porém, ao mesmo tempo em que goza de inúmeras
vantagens, padece de muitas problemas e tensões: problemas de comunhão entre as
novas comunidades e as paróquias e dioceses; problemas relacionados ao estatuto
eclesiológico, nem sempre claro, das novas experiências comunitárias: autenticidade
eclesial, critérios de discernimento, superação dos conflitos etc. É toda uma problemática
que também se reflete no terreno da catequese.
Em especial, oferecem vantagens indiscutíveis, mas também dificuldades, as experiências
de alguns grupos e movimentos com uma tradição catequética própria, que, no entanto,
também suscitam dúvidas sobre sua autenticidade. Muitas vezes se cai num
espontaneísmo cheio de emotividade ou no subjetivismo; acontece também de surgir a
figura de um líder carismático que é seguido mais ou menos cegamente; ou então se
valoriza de forma unilateral o carisma do movimento. São situações que tornam
problemática a presença de uma catequese fiel à sua identidade eclesial e ao seu papel de
educação da fé.

265
E ainda: a instância comunitária às vezes põe em questão o valor de alguns lugares
tradicionais da catequese, como a paróquia, e sobretudo a escola. A propósito desta, cabe
perguntar: é a escola um autêntico lugar de catequese? Em que medida? Pode ser
considerado catequese o ensino da religião dado na escola (ERE) ( aula de religião )?
Esses e outros problemas semelhantes convidam à reflexão que vamos iniciar. Trata-se de
apreender o significado da realidade comunitária (expressão do sinal da koinonia) na Igreja
de hoje e aprofundar-lhe as implicações para a compreensão da função catequética.

2. O MOVIMENTO COMUNITÁRIO NA IGREJA DE HOJE (Novas perspectivas do


sinal da koinonia)

O impulso renovador do Vaticano II e a redescoberta da eclesiologia de comunhão


estão na origem de um vasto movimento comunional e comunitário,1 caracterizado por
múltiplas iniciativas e exigências no âmbito eclesial: órgãos colegiais, sínodos e assembleias
eclesiais, novos grupos e movimentos, comunidades de base, novos ministérios etc. São
expressões variadas de um profundo desejo de comunhão, de participação e corresponsabilidade
no tecido da vida eclesial. É todo um mundo de ideias, perspectivas e tensões que,
entretanto, no seu conjunto, se anuncia como um sinal evidente da passagem do Espírito na
Igreja. Antes de mais nada, vamos procurar apontar alguns de seus pontos nodais e as
exigências mais significativas.

2.1 Raízes socioculturais do movimento comunitário

O movimento comunitário da Igreja, embora tenha motivações predominantemente


teológicas e pastorais, não é estranho a uma série de fenômenos típicos de nossa época, que
levam as pessoas de hoje à procura de novas formas de participação e de comunidade.
Na nossa sociedade é muito forte a socialização dos indivíduos e dos grupos. As pertenças
sociais se multiplicam, mas as pessoas do nosso tempo se sentem muitas vezes sem pontos de
referência, sós e perdidas na massa,2 sem uma comunidade que lhes permita sentir-se pessoas
acolhidas e valorizadas. Em muitos aspectos, a vida moderna é despersonalizante, massificante,
com exigências de eficácia e de produção que impedem os indivíduos de realizar-se como
pessoas. Assim se explica o grande desejo de experiências autênticas de comunhão e de
comunidade.

1
Cf. Max Delespesse, Revolução evangélica? São Paulo, Loyola, 1973.
2
Recorde-se a conhecida obra de D. Riesman - N. Glazer - R. Denney, The lonely crowd. Garden City, Doubleday,
1953 (La folla solitaria. Bolonha, Il Mulino, 1956).
266
No campo da sociologia conhece-se a distinção entre comunidade (Gemeinschaft) e
associação ou sociedade (Gesellschaft).3 Na associação ou sociedade as pessoas se unem tendo
em vista um objetivo a atingir, e cada um vale de acordo com o que tem e de acordo com sua
atuação, deixando na sombra a pessoa em si, em seu ser. A comunidade, ao contrário,
toma a pessoa em seu valor original e único, criando relações fraternas de acolhimento e de amor
e propiciando a livre troca interpessoal. Na vida moderna, tão rica de organizações e de
instituições, sente-se a necessidade imperiosa de experiências de comunidade, em meio às quais
seja possível o encontro, a comunicação, o amor, a aceitação recíproca.4
Essa busca de uma comunidade exprime e canaliza diversas exigências do homem
contemporâneo: a necessidade de integração afetiva; o desejo de participação em todos os níveis;
a reafirmação da própria identidade cultural e histórica, contra todas as formas de alienação ou
colonização; o reconhecimento efetivo da própria dignidade pessoal e social.

2.2 Raízes teológico-pastorais do movimento comunitário

Como já foi dito, a consciência eclesial redescobriu a centralidade da comunhão ou koinonia


no ministério da Igreja e no planejamento da atividade pastoral. 5 A comunhão eclesial, que é
antes de tudo dom do Espírito e reflexo da vida trinitária, exige ser vivida e traduzida na
experiência de comunidade, em todos os níveis da estrutura da Igreja: A comunidade cristã é a
realização histórica do dom da comunhão (koinonia), que é um fruto do Espírito (DGC n.
253).

3
A distinção remonta ao sociólogo alemão F. Tönnies: cf. F. Tönnies, Comunità e società. Milão, Ediz. Di
Comunità, 1963.
4
Cf. André Tange, Análise psicológica da Igreja. São Paulo, Loyola, 1975.
5
Ver capítulo 6, item 3.1.2.
267
Assim se explica a busca de novas formas de comunhão e de comunidade na Igreja de hoje;
ela se dá com tal força que se pode falar de revolução evangélica , de novo nascimento da
Igreja,6 através do tecido renovado das novas comunidades. Em sua base há a convicção,
apoiada no testemunho bíblico, de que a Igreja deve configurar-se sobretudo como
comunidade, como fraternidade,7 no sentido pleno da palavra. Não se ignora a sua dimensão
institucional, mas deve prevalecer o fato da Igreja como convocação por meio da fé,8 para que a
instituição não impeça o exercício autêntico da comunhão e da missão.
Pois bem, atualmente se constata na Igreja uma distância muito grande entre a
realidade e o que ela deveria ser. A Igreja se apresenta, de muitos pontos de vista, mais como
instituição que como comunhão, mais rica de estruturas institucionais que de
experiências autênticas de comunidade. Assim se explicam muitos becos sem saída da pastoral
sacramentária e catequética, muitas crises de pertença eclesial, não poucos casos de contestação
e de abandono da vida cristã, sacerdotal e religiosa. O relativo sucesso de tantas seitas e
movimentos esotéricos tem também em sua base a procura de uma fraternidade não
experimentada na comunidade eclesial.9 A excessiva institucionalização, o predomínio das
estruturas jurídicas, a prevalência de critérios de eficiência e visando à conservação obscurecem
com frequência o aspecto humano e libertador da comunhão de fé, sufocam o exercício da
vida comunitária e diminuem a credibilidade da Igreja.10
Compreende-se assim esse fenômeno típico da presente situação eclesial: a criação de novas
formas de viver a comunhão e de realizar a comunidade. Já apresentamos os traços principais
desse dinamismo, que entremostra a nova fisionomia da koinonia eclesial.11 Cabe agora
salientar o surgimento de um fenômeno de grande importância para o futuro da pastoral e
para a renovação da catequese: a decisão pela criação das pequenas comunidades.

6
Cf. Max Delespesse, Revolução evangélica? São Paulo, Loyola, 1973 e a conhecida obra de Leonardo Boff.
Eclesiogênese: as comunidades eclesiais de base reinventam a Igreja. Petrópolis, Vozes, 1977.
7
Cf. P. F. Schmid, Im Anfang ist Gemeinschaft. Personzentrierte Gruppenarbeit in Seelsorge und Praktischer
Theologie. Beitrag zu einer Theologie der Gruppe. Stuttgart/Berlim/Colônia, W.Kohlhammer, 1998, cap. 4 ( La
comunità è la forma sociale della Chiesa. L´ekklesia come luogo di convocazione dei credenti ).
8
Cf. Klostermann, Kirche, Ereignis und Institution. Viena, Herder 1976; P. A. Liégé, Lo stare insieme dei cristiani tra
comunità e istituzioni. Brescia, Queriniana, 1979.
9
A Igreja faz a opção pelos pobres e os pobres optam pelas seitas , in: Coincat, Catequese para viver
num mundo pluralista e secularizado . Revista de Catequese 15 (1992), n. 59, p. 59-64.
10
Cf. A. Tange, op. cit., p. 23-37.
11
Cf. cap. 6, item 3.2.
268
2.3 Refazer o tecido comunitário: as pequenas comunidades

As pequenas comunidades nascem da necessidade de viver a experiência cristã em lugares


de comunhão autêntica. Elas surgem praticamente em toda parte, com formas e nomes
diversos (comunidades eclesiais de base, small christian communities, communautés éclésiales
vivantes etc.), e também com aspectos às vezes problemáticos (cf. EN n. 58). Constituem
certamente um sinal dos tempos. Muitas Igrejas locais e particulares fizeram delas objeto de
opções pastorais explícitas,12 e também em nível universal se reconheceu seu valor eclesial:

Essas novas comunidades oferecem novas possibilidades à Igreja: com efeito, podem ser um
fermento na massa e no mundo em transformação; contribuem para manifestar mais claramente a
13
verdade e a unidade da Igreja; devem ser sinal de caridade recíproca e de comunhão.

Menção especial merece o fenômeno das comunidades eclesiais de base (CEBs) na América
Latina, elemento propulsor de uma renovação geral do tecido eclesial. Já nessa perspectiva
saudava o evento a conferência de Medellín:

A vida de comunhão a que foi chamado, o cristão deve encontrá-la na comunidade de base : ou
seja, em uma comunidade local ou setorial que corresponda à realidade de um grupo homogêneo
com uma dimensão que permita a convivência pastoral fraterna entre seus membros [...]. A
comunidade cristã de base é, assim, o primeiro e fundamental núcleo eclesial, que, em seu
âmbito, deve responsabilizar-se pela riqueza e expansão da fé e pelo culto de que é expressão.
Portanto, ela é uma célula inicial da estrutura eclesial, centro de evangelização e atualmente um fator
14
primordial da promoção humana e do desenvolvimento.

12
Além da América Latina (cf. bibliografia no fim do capítulo), fizeram essa opção diversas Igrejas: cf. por
exemplo: Ásia (Cingapura 1995) III D; J. M. Calle, Catechesis for the 80´s in the asian context , East Asian Pastoral
Review 17 (1980), n. 2, p. 187-94; J. Guiney, Les communautés ecclésiales de base: échos d´Afrique de l´Est ,
Lumen Vitae 43 (1988), n. 4, p. 407; L. Boka di Mpasi, Verso una cattolicità-Arcobaleno [...] Saggio documentario. I.
Problematica africana dell´inculturazione. Roma, 1998; Id., Verso una cattolicità-Arcobaleno [...] Saggio
documentario. II. All´appuntamento del dare e del ricevere: dinamica della missionarietà. Roma, 1999; Espanha CC
n. 277-80.
13
Mensagem do Sínodo de 1977, n. 13.
14
Medellín (Pastoral de conjunto), n. 10.

269
As CEBs, nascidas principalmente em ambientes populares, se tornaram uma esperança de
renovação eclesial e um lugar de redescoberta da comunhão evangelizadora. Elas foram
saudadas como Igreja que nasce do povo ,15 sinal dos tempos,16 lugares de conscientização,
primavera promissora para a Igreja.17 Elas receberam um reconhecimento oficial na
Evangelii Nuntiandi, que as chama de lugar de evangelização e esperança para a Igreja
universal (EN n. 58), e principalmente no documento de Puebla:

As Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), uma experiência que mal começava em 1968,
amadureceram e se multiplicaram, principalmente em alguns países, e agora constituem um dos
motivos de alegria e de esperança para a Igreja. Em comunhão com o bispo, como se postulou em
Medellín, elas se transformaram em p los de evangelização e em agentes de libertação e de
desenvolvimento (Puebla n. 96).

Puebla afirma também que as comunidades de base, quando atendem a critérios de


autenticidade eclesial, são expressões do amor preferencial da Igreja pelo povo simples
(n.643), instrumento para a criação de um homem novo na Igreja e na sociedade (n. 1308-
1309), um modo novo de ser Igreja (n. 273), um lugar privilegiado de evangelização e de
catequese (n. 640. 100. 1147).

15
Cf. Una Chiesa che nasce dal popolo e comunità di base. Roma, Quaderni Asal 1975, n. 21-22.
16
Cf. Comunidades cristianas de base: signo de los tiempos, opción pastoral. Chapinero-Bogotá, Indo-American
Press Service, 1970.
17
J. F. Marins, Comunidades eclesiais de base . Nuevo Dic. Cat., p. 505.
270
2.4 Critérios de autenticidade e sintomas patológicos dos grupos e comunidades eclesiais

A presença de grupos, movimentos e novas comunidades na Igreja levanta o problema de


sua autenticidade e sentido eclesial. Em que condições se pode reconhecer como autêntico um
grupo de cristãos que reivindica para si a qualificação de comunidade eclesial? Quem merece de
fato o nome de comunidade cristã? Quando se pode dizer que um grupo eclesial é sadio e
maduro?
O problema requer a atenção de diversas autoridades eclesiais, como Evangelii Nuntiandi
(n. 58), Puebla (n. 638-647) e diversos episcopados.18 Está presente também na reflexão
teológica e pastoral contemporânea.19 E aqui cabe não apenas mencionar os principais
critérios de autenticidade eclesial, mas também apontar as limitações ou doenças mais
frequentes dos grupos e comunidades, dado que elas prejudicam o bom andamento da
vida pastoral. Com efeito, são bastante conhecidas as acusações de que são objeto alguns
grupos e movimentos: isolamento pastoral, autoexaltação, espírito sectário, fanatismo e
emocionalismo, dificuldade de integração etc.
Existe um consenso básico sobre alguns elementos considerados essenciais, que podemos
resumir assim:

2.4.1 O Evangelho como fato fundador

No coração de toda comunidade cristã, como realidade-fonte, existe sempre a escuta do


Evangelho e a confissão de fé no Senhor Jesus. Nesse sentido, a fé é sempre a raiz última de
toda convocação eclesial, e é a referência a essa fé professada e vivida que torna genuína a
organização comunitária.20 Quaisquer outras motivações (amizade, fraternidade vivida, a
convergência de certos objetivos etc.) só têm sentido se ancorados e subordinados à
referência essencial à fé.

2.4.2 O critério da comunhão eclesial

Toda comunidade cristã autêntica deve ser reconhecida pela Igreja e viver em
comunhão com a Igreja, aberta, portanto, à universalidade eclesial. Não se pode conceber
uma comunidade cristã nascida por iniciativa própria e atuando de forma autônoma,
autossuficiente. Vão contra esse critério fundamental as diversas formas de isolacionismo e
fechamento nas relações com a comunidade mais vasta: grupos incoerentes, espírito de seita ou
gueto, isolamento de atuação, situação de conflito ou de contestação exasperada etc.

18
Assim se expressou a CNBB: A tarefa de construir comunhão e participação deve ser encarada com
continuidade e perseverança. Exige uma mudança de mentalidade, que muitas vezes ainda não aconteceu. Em alguns
casos, existem queixas de retrocesso na prática da comunhão e participação para um clericalismo incompatível com
os ideais evangélicos e a eclesiologia de comunhão (Diretrizes gerais 20032-2006, n. 108). Cf. também: Espanha CC
n. 257-265; Servicio pastoral a las pequeñas comunidades cristianas: documento de la Comisión Episcopal de
Pastoral. Madri, Edice, 1982; o documento da CEI: criteri di ecclesialità dei gruppi, movimenti, associazioni, Nota
Pastorale (1981).
19
Ver bibliografia no fim do capítulo.
20
Cf. P. A.Liégé, Lo stare insieme dei cristiani, p. 18-22.
271
2.4.3 O critério da globalidade das funções eclesiais

Toda comunidade autêntica deve dar o devido espaço às funções próprias da mediação
eclesial: a caridade-serviço (diaconia) a fraternidade (koinonia) o ministério da palavra
( ) e a celebração da fé (liturgia). Se falta alguma dessas funções, ou se realiza
de forma inadequada, não se pode qualificar um grupo ou associação como comunidade
cristã. Isso acontece, por exemplo, no caso do desenvolvimento inadequado do anúncio da
palavra ou das celebrações, ou pelo modo de conceber a atuação social e política etc. Por vezes
não se respeita a globalidade das funções eclesiais, concentrando-se a atenção em alguma delas e
negligenciando as outras.

2.4.4 O critério da ministerialidade

Uma comunidade é autêntica quando respeita a diversidade orgânica dos carismas e


ministérios, em particular do ministério ordenado, fator essencial de coordenação e
orientação. Por isso toda comunidade de Igreja reporta-se ao ministério episcopal, seja
diretamente (Igrejas particulares) ou através da função subordinada do presbítero (comunidades
locais), e promove a diversidade harmônica dos carismas e ministérios. Ora, essas interações
muitas vezes mostram-se comprometidas por insuficiências ou formas desequilibradas de
funcionamento: espontaneísmo exagerado, exercício inadequado da autoridade (autoritarismo,
paternalismo, culto da personalidade etc.), problemas de comunicação e participação etc.

2.4.5 O critério da fecundidade

É próprio também da maturidade comunitária a fecundidade catecumenal e batismal


(geração de novos membros), expressão essencial da maternidade da Igreja. 21 Também lhe é
própria a fecundidade vocacional (que assegura à comunidade o desenvolvimento e a
continuidade) e o ardor missionário (que faz da comunidade lugar de irradiação para outras
comunidades).

21
Cf. M. Dujarier, Le catéchuménat, fonction de l´Église , Spiritus 35 (1994), n. 134, p. 46-54. Luiz Alves de
Lima, Catequese com adultos e iniciação cristã , in: CNBB-Grecat, Segunda Semana Brasileira de Catequese. São
Paulo, Paulus, 2002, p. 318-54 (Estudos da CNBB n. 84).
272
2.4.6 A conciliação dos conflitos

Além disso, a estrutura eclesial, em seus diversos níveis, demonstra sua maturidade (ou a
sua imaturidade) no modo de gerir e conciliar sem os suprimir os conflitos e as tensões
presentes em seu interior. Tradicionalmente, três princípios ou valores são considerados critérios
para a resolução de conflitos eclesiais: a fé (pístis), o amor (ágape) e a edificação (oikodomé).22
A aplicação desses critérios nem sempre é fácil, mas é através deles que se podem enfrentar e
resolver as questões conflituosas.

Eis, pois, um quadro dos critérios de discernimento comunitário que permite esboçar os
traços característicos e os diversos níveis de maturidade da comunidade eclesial, assim como
já vimos as exigências da maturidade da fé das pessoas.23 São dois aspectos de grande
urgência pastoral, especialmente no que se refere à catequese.

3. DIMENSÃO COMUNITÁRIA DA CATEQUESE

A redescoberta da comunidade (em especial da pequena comunidade) e do grupo como


recurso pastoral tem aplicações muito relevantes no campo catequético.

3.1. Opção comunitária na pastoral catequética

A relação estreita entre catequese e comunidade é hoje um fato universalmente reafirmado e


colocado no centro da atenção pastoral:

A experiência catequética moderna confirma, mais uma vez, que em primeiro lugar vêm os
catequistas e depois os catecismos; ou melhor, as comunidades eclesiais vêm ainda antes. Com
efeito, não se concebe uma comunidade cristã sem uma boa catequese, assim como não se pode
conceber uma boa catequese sem a participação de toda a comunidade (RdC n. 200).

Pode-se falar, nesse sentido, de opção comunitária na catequética moderna, opção que
proclama a comunidade cristã como condição, lugar, sujeito, objeto e meta da catequese (cf.
DGC n. 158, 254). Examinemos mais de perto seus aspectos significativos.

22
Cf. G. Chiaretti, Comunità , in: V. Bo et al. (eds.). Dizionario di Pastorale della comunità cristiana.
Assis, Cittadella, 1980, p. 173.
23
Cf. cap. 5, item 3.4.
273
3.1.1 A comunidade, condição necessária para a catequese

O testemunho da comunidade eclesial é condição essencial de uma catequese


significativa:

A pedagogia catequética se faz eficaz na medida em que a comunidade cristã se torna referência
concreta e exemplar para o caminho da fé dos indivíduos. Isso acontece se a comunidade se
apresentar como fonte, lugar e meta da catequese (DGC n. 158).

A exigência é amplamente partilhada. Pode-se dizer que a comunidade cristã é em si


mesma catequese viva (DGC n. 140), e que esta corre o risco de se tornar estéril se não se
apoiar no acolhimento e no testemunho da comunidade (CT n. 24). Daí também a ideia de
que o catequista, ou o animador da catequese, deve, no fundo, desempenhar a função do
intérprete,24 isto é, daquele que ilumina e explica o que a comunidade vive e professa. E
pode-se concluir que, em sentido pleno, só pode ser objeto de catequese aquilo que se realiza
verdadeiramente na comunidade.25
A experiência mostra claramente a falência de uma catequese que apresenta apenas a
mensagem cristã como deveria ser, isto é, abstratamente, sem correspondência visível na
realidade vivida da comunidade.26 Podemos formular uma espécie de lei estrutural: sem
comunidade de fé não existe comunicação da fé ; sem compartilhamento da fé não existe
amadurecimento da fé .

24
DCG (1971), n. 35. O catequista é enviado. Sua missão possui duplo sentido: é enviado por Deus, constituído
ministro da Palavra pelo poder do Espírito Santo, e é enviado pela comunidade, pois é em seu nome que ele fala
(CNBB. Formação de catequistas. 7ª ed. São Paulo, Paulus, 1990, n. 46 (Documentos da CNBB n. 59).
25
R. Mendes de Oliveira, A comunidade: fonte, lugar e meta da catequese . Revista de Catequese 6 (1983), n. 21,
p. 7-16. Cf. B. Dreher, La catechesi in seno all´organismo complessivo della pastorale generale , in: B. Dreher et
al., La sterilità della catechesi infantile. Modena, Paoline, 1969, n. 71. Em certo sentido, ela [a catequese] nada
mais faz senão explicitar, com todos os recursos da Tradição, aquilo que a comunidade vive, aquilo por que ela
o vive, para que possa servir de referência. A. Fossion, La catéchèse dans le champ de la communication:
ses enjeux pour l´inculturation de la foi. Paris, Cerf, 1990, p. 354.
26
Cf. J. Colomb, De quelques conditions doctrinales et spirituelles pour l´annonce de Jésus Christ à
l´homme d´aujourd´hui . Vérité et Vie 20 (1967-68), série 78, n. 577.
274
3.1.2 Comunidade, lugar natural da catequese

É uma convicção que se tornou comum: [a comunidade] por aquilo que é, anuncia, celebra,
opera, permanece sempre lugar vital, indispensável e primário da catequese (DGC n. 141).
A complexidade do fato comunitário levará a distinguir, no interior da comunidade eclesial,
diversos lugares para a catequese ou a falar de novos lugares da catequese, em referência a
novas formas de comunidade.27 Na França prefere-se falar de lugar catequético 28 para
designar o contexto comunitário da catequese. Mas resta sempre a convicção de que a ação
catequética encontra seu ambiente de referência natural e fundamental na comunidade eclesial.29
A exigência comunitária obriga, assim, a repensar e verificar os ambientes da
catequese, quer os tradicionais (paróquia, escola, associações etc.), quer os novos (grupos,
comunidades, movimentos etc.) Critério decisivo é a qualidade comunitária ou a
possibilidade de referência comunitária nos diversos ambientes de catequese.

3.1.3 A comunidade, o próprio sujeito da catequese

Também essa é uma convicção bastante comum: toda a comunidade eclesial deve
considerar-se agente solidariamente responsável pela obra catequética.30 O verdadeiro sujeito da
catequese é a comunidade, ainda que concretamente se utilize de pessoas ou de estruturas
particulares.
Portanto, está superada a concepção verticalista da catequese, concebida como relação entre
alguém que ensina e que se encontra em posição elevada e o grupo de discípulos que recebe a
instrução. Em um contexto comunitário não existem propriamente destinatários, mas
participantes da catequese, todos sujeitos de palavra e de experiência, ainda que com papéis
diferenciados: Na comunidade todos somos ao mesmo tempo catequistas e catequizandos,
mestres e discípulos, agentes e destinatários da ação catequética, dado que somos todos servos
da única palavra que nos edifica através da boca e do testemunho de todos (México GP n. 71).

27
Mensagem do Sínodo de 1977, n. 13.
28
Um lugar de acolhimento que significa a Igreja [...] Esse lugar pode ser assim definido: é um lugar de
acolhimento no qual se levam em conta as realidades vividas por uns e por outros; é um lugar no qual os desejos
profundos e os projetos dos participantes são considerados em si mesmos; é um lugar no qual a Boa Nova de Jesus
Cristo é expressa em vista da vida de cada um; é um lugar no qual o testemunho daqueles que nele se reúnem [...]
permite que a fé seja realmente vivida em conjunto : França (Texte de référence) 3.1.1.1. Cf. G. Vogeleisen,
Lieu catéchétique , Diz.Cat., p. 382-83; J. Audinet - S. Duguet - J. Joncheray, Dans quels lieux catéchiser? ,
Lumen Vitae 43 (1988), n. 4, p. 377-86.
29
Ásia (Cingapura 1995) III D, insiste na necessidade de uma catequese comunitária, exatamente pela falta
desta dimensão na práxis catequética concreta.
30
Cf. DGC n. 220; Brasil CR n. 118, Celam-Decat, A comunidade catequizadora no presente e futuro da América
Latina: conclusões da I Semana Latino-Americana de catequese. Quito, 3-10 de outubro de 1982. São Paulo,
Salesiana, 1983 (Coleção Pastoral Catequética n. 9); Alemanha KWK A 4; Puebla n. 983; Espanha CC n. 266;
CAL n. 184.

275
3.1.4 A comunidade, destinatário último da catequese

A catequese não se destina exclusivamente a indivíduos, mas tem ante si a comunidade e o seu
crescimento na fé como verdadeiro destinatário de sua atuação: A catequese conduz à maturidade
da fé não apenas os catequizandos, mas também a própria comunidade enquanto tal (DGC n.
221).
Com efeito, a catequese é a ação eclesial que conduz as comunidades e os indivíduos cristãos à
maturidade da fé (DGC [1971] n. 21); ela se dirige à comunidade, sem descuidar dos fiéis, tomados
individualmente .31 Dada a lei de salvação em comunidade (LG n. 9), a ação catequética tem em
mira a comunidade e seu amadurecimento na fé, e no interior dessa ação comunitária também faz
crescer a vida religiosa dos indivíduos. A catequese apresenta-se assim como o processo de
crescimento de uma comunidade eclesial que acolhe a palavra de Deus e a aprofunda, caminhando
rumo à maturidade da fé.
Portanto, também está superada a concepção individualista de uma catequese concebida
como relação entre um catequista e catequizandos tomados individualmente. A relação pessoal se
insere num contexto de comunidade, verdadeiro sujeito e ambiente da obra catequética.
Sob essa luz revê-se também a tradicional setorialização da catequese segundo o estado ou
condição (catequese para crianças, jovens, adultos, operários, intelectuais etc.). Sem negar a
conveniência de algumas separações parciais e temporárias, para responder melhor às exigências dos
participantes, são preferíveis formas globais de catequese na comunidade cristã, que se enriquece
com as trocas entre participantes de condições e sensibilidade diversas (cf. CT n. 45). A
experiência comprova a ineficácia de uma catequese que priva as crianças ou os jovens do diálogo
entre gerações e do contexto vital e enriquecedor da comunidade.

31
Ibid. n. 31.
276
3.1.5 A comunidade, objetivo e meta da catequese

A comunidade é a origem, o lugar e a meta da catequese (DGC n. 254). A comunidade é,


sim, um pressuposto importante para o sucesso da obra catequética, mas é verdade também que a
própria catequese constrói comunidade (cf. Puebla n. 992, 995) e acompanha seu crescimento,32
fazendo com que, na catequese, a Igreja edifique a Igreja (Puebla n. 993). Essa exigência, que
nasce da natureza da Igreja como convocação em torno do anúncio da palavra, é amplamente
confirmada pela experiência pastoral. Com efeito, não poucas vezes a catequese deu origem a
formas diversas de grupos e comunidades eclesiais.
Uma observação importante: a opção comunitária que ilustramos, não deve ser tomada em
sentido unívoco e excludente, como se apenas em comunidade fosse possível a catequese. Também
são legítimas as formas de catequese individual, ocasional, de massa, ou através da mídia.33 Mas
continua sempre, mesmo nesses casos, a referência vital à comunidade, se se quiser ter garantia
de solidez e de eficácia.

Esses aspectos da opção comunitária convidam a uma revisão em profundidade da identidade


da catequese e de sua posição no quadro da ação pastoral da Igreja. Mais uma vez se impõe a
necessidade de harmonizar e coordenar os diversos ambientes e modalidades da ação
catequética no interior da comunidade, sem isolacionismos ou parcialidade. Por outro lado, a
atividade catequética está sempre estreitamente ligada a outras funções pastorais da Igreja
(liturgia, comunhão, compromisso etc.), sem solução de continuidade.

3.2 Catequese comunitária: características e perspectivas

Cumpre agora apontar alguns aspectos fundamentais da catequese comunitária: em que lugares
se dá, com que identidade, com quais catequistas?

32
Cf. Brasil CR, IV Parte: A comunidade catequizadora.
33
Parece-nos ser esta a exigência de uma diversificação dos lugares de catequese defendida, com razão, por A.
Fossion, op. cit., p. 333-71.

277
3.2.1 O papel do grupo e das pequenas comunidades

Na realização da catequese comunitária, tem uma importância toda especial a estrutura


do grupo e da pequena comunidade.

O grupo como lugar de catequese


Atualmente já não há mais dúvidas sobre a importância do grupo na pastoral e na
catequese:

O grupo tem uma função importante no processo de desenvolvimento das pessoas. Isso vale
também para a catequese, quer das crianças, às quais propicia uma boa socialização, quer dos
jovens, para os quais o grupo constitui quase uma necessidade vital na formação da
personalidade, quer dos adultos, entre os quais promove uma atitude de diálogo, de
compartilhamento e de corresponsabilidade cristã (DGC n. 159).

No interior do grupo desenvolve-se uma dinâmica que predispõe à aprendizagem.


Com efeito, o grupo é muito mais que a soma dos indivíduos, porque cada membro pode se
tornar uma referência importante para os outros. Das relações em seu interior surgem
ideias novas e novas possibilidades que antes não estavam presentes, de forma explícita,
em nenhum membro do grupo. É no próprio grupo e graças a ele que se estimula a
integração dos conhecimentos e do aprendizado.34
São notórias as virtudes do grupo, do ponto de vista pedagógico. No grupo se geram
processos de identificação e de conformidade que levam à aceitação de normas de
comportamento e de convicções comuns. Esses processos dão origem a uma dinâmica
educativa que motiva e dá ânimo ao indivíduo, ajudando-o a interiorizar os valores
comuns.35
Mas o grupo tem também uma dimensão eclesiológica e pastoral de grande
importância. Se, como disse Tertuliano, ubi tres, ecclesia est,36 o grupo representa a
mediação normal para fazer experiência de Igreja e para interiorizar o sentido da Igreja. 37
É no grupo que palavras como comunhão, co responsabilidade e presença se tornam
experiência vivida .38

34
Cf. P. Scilligo, Gruppo , in: J. Vecchi - J. M. Prellezo (eds.), Progetto educativo pastorale lementi
modulari. Roma, LAS, 1984, p. 389-90.
35
L. Berrical de la Cal, Grupo en la catequesis, el . Nuevo Dic. Cat., p. 1059.
36
Onde há três, aí está a Igreja : De exhortatione castitatis 7,3.
37
Cf. P. F. Schmid, Im Anfang ist Gemeinschaft, p. 110.
38
L. Berrocal de la Cal, Grupo en la catequesis, el , p 1.061.

278
É fácil entender a importância catequética do grupo como lugar de aprendizagem da
fé e de crescimento na fé. No grupo vivenciam-se atitudes e experiências de grande valor
educativo: a comunicação, a liberdade, a criatividade, o diálogo. Ele pode se tornar um
grupo de referência eficaz, essencial para a socialização e a educação. O grupo permite o
amadurecimento de verdadeiras experiências religiosas e em seu interior podem
amadurecer processos de identificação. Essas são características ideais para a
aprendizagem da fé e para a interiorização das atitudes de fé, objetivo principal da
catequese. Desse ponto de vista, pode-se dizer que aprender a crer é antes de mais nada
começar a crer juntos.

A pequena comunidade, lugar de catequese


Aquilo que se diz dos grupos aplica-se também às pequenas comunidades cristãs,
especialmente às comunidades eclesiais de base , que são, também elas,
legiados para o desenvolvimento de processos
tes .39 E isso por algumas características que são
grupos de dimensão humana, que permitem relações pessoais intensas; são
lugares de compartilhamento da fé; nelas é possível o exercício do amor fraterno;
nelas se estimula a criatividade e a busca comum; elas permitem uma experiência
global de vida cristã, como celebração, compromisso e comunhão fraterna. Como
ressaltou o documento de Puebla, as pequenas comunidades, principalmente as
Comunidades Eclesiais de Base, criam maiores inter-relações pessoais, aceitação da
Palavra de Deus, revisão de vida e reflexão sobre a realidade à luz do Evangelho;
acentua-se o compromisso na família, no trabalho e na comunidade local (Puebla n.
629).

Numa sociedade complexa e pluralista parece necessária a experiência da pequena


comunidade para reencontrar a identidade cristã e para amadurecer a própria fé:

Para defender-nos das famosas intempéries , na sociedade secularizada, não é necessário criar
uma espécie de submundo católico na sociedade, com seus próprios meios de comunicação,
seus partidos políticos e serviços de todo tipo, como se poderia pensar. Basta poder ter pequenas
comunidades cristãs nas quais exista fé compartilhada e calor humano.40

A propósito de grupos e pequenas comunidades, cumpre insistir numa condição


essencial de autenticidade: isto é, a exigência de que permaneçam abertos, prontos para o
diálogo e para o confronto, em atitude de comunhão com a equipe eclesial maior. Só desse
modo o grupo se torna lugar de amadurecimento pessoal e de construção de Igreja (Cf.
CAL n. 193).

39
CAL n. 189. Cf. DGC n. 263; Mensagem do Sínodo de 1977, n. 13; Brasil CR n. 118; Espanha CC n. 277-
280.
40
L.Gonzalez-Carvajal, Evangelizar en un mundo postcristiano. Santander, Sal Terrae, 1993, 100. Ítalo
Gastaldi, Educar e evangelizar na pós-modernidade. 4ª ed. São Paulo, Salesiana, 2003.
279
3.2.2 Catequese comunitária: uma mudança qualitativa

A catequese comunitária ou de grupo não o é apenas porque muda de lugar: seria


ilusória, nas novas estruturas comunitárias, uma catequese não renovada em seu estilo e em
seus conteúdos. A catequese deve mudar de aspecto. Não basta que seja feita em
comunidade, deve ser feita de comunidade.41 Que significa tudo isso?
Antes de , a catequese comunitária assume logicamente a visão renovada do
exercício da palavra de Deus na Igreja. Em termos concretos, no grupo ou na comunidade,
a catequese assume a fisionomia de uma busca comum, na fé,42 de um caminho que se
percorre juntos, onde os membros da comunidade anunciam uns aos outros o mistério de
Cristo , 43 onde é possível descobrir o potencial evangelizador dos mais humildes e
mais simples (Puebla n. 1147). Em comunidade, a catequese se torna em certo sentido
autocatequese, aprofundamento da fé através da mediação do grupo.
Não podemos ignorar a novidade qualitativa representada pelo caráter comunitário na
concepção da catequese. Em lugar da relação catequista-catequizandos (mestre-discípulos)
e da tradicional centralidade do conteúdo a transmitir, torna-se determinante a relação
interpessoal, o processo de interação pessoal, a relação catequética como lugar e
condição de anúncio e amadurecimento da fé.44 Isso quer dizer que adquire grande
importância o funcionamento correto das relações interpessoais no grupo ou na
comunidade, e que a sanidade e autenticidade do grupo se tornam questões de
fundamental importância.45 Daí também a utilidade das diversas ciências e técnicas para a
condução dos grupos: dinâmica de grupo, técnicas de animação, psicologia social, teoria e
prática da comunicação etc.

41
Cf. a análise de N. Mette, De la catéchèse dans la communauté à la catéchèse de la communauté . Lumen
Vitae 43 (1988), n. 4, p. 387-96.
42
Cf. DGC n. 159; Espanha CC n. 283-285;
43
Mensagem do Sínodo de 1977, n. 13.
44
Cf. Session Nationale de Notre-Dame de Laus (Juillet 1969) , Catéchèse 10 (1970), n.40, p. 350.
45
Cf. A. Aparisi, Invitación a la fe. Madri, ICCE, 1972, p. 42-52; R. Tonelli, La vita dei gruppi ecclesiali.
Leumann (Turim), Elledici, 1972.
280
3.2.3 Catequese comunitária: uma nova abordagem da mensagem cristã

Uma catequese autenticamente comunitária deve também repensar em


profundidade o próprio conteúdo da fé, motivada pela exigência da reflexão comum e
pelos novos ângulos de visão emergentes. Em especial:
O primado não diz respeito a um programa ou conteúdo fixado a priori, mas às
pessoas em situação, que se tornam, de qualquer modo, critério seletivo e
interpretativo do conteúdo da catequese. A comunidade se torna assim instância
hermenêutica, e nesse sentido se confronta com uma mensagem que não é
simplesmente assimilada, mas também reinterpretada, recriada.
A instância antropológica, enquanto esforço de integração entre mensagem cristã
e experiência vivida, reveste-se, aqui, de especial urgência e possibilidades.
Assim, a catequese comunitária se configura como reflexão de grupo sobre
experiências do grupo:

Com esses grupos, a Igreja se mostra em pleno processo de renovação da vida paroquial e
diocesana, por meio de uma nova catequese, não apenas na sua metodologia e no uso dos
meios modernos, mas também na apresentação dos conteúdos que se orientam no sentido
de introduzir na vida motivações evangélicas para um crescimento em Cristo (Puebla n.
100; cf. DCG n. 76).

Também o diálogo entre fé e cultura, e portanto o processo de inculturação da


experiência cristã, encontra na comunidade um campo de aplicação efetiva e
providencial.

281
3.2.4 Uma metodologia de caráter comunitário

Trata-se de uma conclusão evidente, se encaramos com seriedade as características da


dinâmica comunitária ou de grupo. O método da catequese assume necessariamente alguns
aspectos que caracterizam o caminho de fé em comunidade:
É um caminho de participação e de responsabilização. Em comunidade os
indivíduos não devem sentir-se simples destinatários do anúncio da fé, mas
sujeitos ativos, responsáveis. Especialmente com os jovens e os adultos, é
importante criar a convicção de que sem empenho pessoal e responsabilidade
também no que diz respeito à fé dos outros não se consegue amadurecer a
própria identidade de fé.
É um caminho no interior de uma experiência integral cristã. Em sentido pleno, a
comunidade não faz apenas catequese, mas vive também as diversas dimensões da
experiência eclesial: compromisso, compartilhamento, celebração, missão.
Nenhum exercício da catequese é enriquecedor sem união vital com essa
totalidadede experiência.
É um exercício da criatividade, que permite uma relação nova entre linguagem
constituída e novas expressões da experiência cristã (cf. Puebla n. 99).

3.2.5 O novo perfil do catequista-animador

A catequese comunitária implica também uma revisão em profundidade do perfil do


catequista ou animador da catequese. Dado o primado da relação catequética sobre o
conteúdo, é fundamental, para quem assume um papel de animação, ter uma personalidade
comunicativa , isto é, ser capaz de criar e fortalecer a participação e a maturidade do grupo.
A exigência da personalidade comunicativa é hoje muito viva na sociedade e na Igreja.
Em lugar das personalidades fortes e arrebatadoras, cheias de concepções geniais, grande
força de vontade e fascínio carismático, sente-se a necessidade de um novo tipo de
personalidade acolhedora e aberta, capaz de relações profundas, disposta a ser influenciada
pela comunidade, mas também capaz de guiá-la, valorizá-la, estimular ao máximo a
contribuição de todos.46 Não convencem as personalidades fortes, mas centralizadoras, pelo
fato de imporem as próprias convicções e decisões. Existe sempre o risco do culto da
personalidade. O mundo de hoje, e em especial as comunidades eclesiais, em todos os níveis,
sentem acima de tudo a necessidade de personalidades comunicativas :

46
Cf. P. Scilligo, Gruppo , loc. cit., p. 397-98; P. Babin, Opzioni per una educazione della fede dei giovanni.
Leumann (Turim), Elledici, 1967, p. 99.
282
A época moderna, felizmente, está forjando um novo tipo de personalidade mais de acordo
esperamos com a natureza fundamentalmente social do ser humano, uma personalidade que lhe
permitirá finalmente encontrar-se em plena harmonia com seu ser-em-comunicação. Se
quiséssemos tentar descrever essa nova personalidade, diríamos que ela não busca
desenvolver e ostentar qualidades individuais que revelem a própria perfeição, mas se traduz
numa atitude fundamental de acolhimento e de abertura para a experiência pessoal e para a dos
outros. Essa nova personalidade não atrai para si os olhares admirados e extasiados das massas
que desejam venerar o herói, mas antes, promove as capacidades dos outros, permitindo que esses
também desabrochem. O homem de amanhã se sentirá mais dependente dos outros. Mas longe de
o empobrecer, essa dependência o enriquecerá.47

Também no âmbito da catequese sente-se hoje a necessidade urgente de personalidades


comunicativas, de animadores e guias que, longe de querer se impor aos outros, saibam
sentir-se membros da comunidade para caminhar junto com todos e valorizar a contribuição
de todos.48

4. CATEQUESE E ESCOLA

A centralidade da dimensão comunitária da catequese leva logicamente a uma avaliação


de seus ambientes tradicionais. Entre estes a escola que, ela própria, objeto de reflexão e de
reforma, repensa hoje sua relação com a catequese; será a escola, e especialmente a escola
pública, um lugar adequado para o desenvolvimento da catequese?

4.1 Religião na escola: uma realidade em movimento

Sabe-se que, por muito tempo e em muitas nações, a escola foi um ambiente normal de
catequese, geralmente na forma de ensino da religião (ou instrução religiosa, ou catequese
escolar). Em muitos casos, foi o lugar privilegiado e praticamente exclusivo para o
desenvolvimento da obra catequética na idade escolar.49 Em alguns países, motivos de ordem
política ou cultural levaram à exclusão, de forma mais ou menos violenta, do ensino religioso
na escola pública.50 Em algumas Igrejas jovens, a escola dos missionários constituiu o
instrumento principal que, em conjunto com a obra educacional, desenvolveu também a
atividade evangelizadora e catequética, não sem aspectos problemáticos e ambíguos.51

47
André Tange, Análise psicológica da Igreja. São Paulo, Loyola, 1975.
48
Sobre a figura do catequista falaremos de forma mais aprofundada no capítulo 11.
49
É o caso, por exemplo, da Alemanha, Áustria, Holanda, Inglaterra. Cf. F. Pajer (ed.), L´insegnamento
scolastico della religione nella nuova Europa. Leumann (Turim), Elledici, 1991; Istituto di Catechetica
dell Università Salesiana (ed.), Scuola e religione, I. Una ricerca internazionale: situazioni, problemi,
prospettive. Leumann (Turim), Elledici, 1971. Ver também os verbetes relativos às diversas nações in Diz.Cat.
50
É o caso clássico da França, dos países comunistas e de diversas repúblicas latino- americanas.
51
Para uma visão da situação brasileira quanto ao ensino religioso cf. Anisia de Paulo Figueiredo, O ensino
religioso no Brasil: tendências, conquistas, perspectivas. Petrópolis, Vozes, 1996; para conhecimento da discussão
atual cf. bibliografia em português no final do capítulo. Cf. W. Bühlmann, O terceiro mundo e a terceira Igreja:
uma análise do presente e do futuro da Igreja. São Paulo, Paulinas, 1976, cap. XVI; M. Fievet, École,
mission et l´Église de demain. Paris, Cerf, 1969.

283
Essa práxis tradicional sofreu um forte questionamento, principalmente no período
pós-conciliar, que em alguns casos se tornou contestação polêmica. Isso estimulou não
apenas o estudo do problema e a experimentação de novas fórmulas, mas também
importantes posicionamentos autorizados.52 É verdade que as situações locais são muito
diversas no que se refere aos sistemas escolares, mas podemos tentar apontar as tendências
mais gerais do problema e apresentar um quadro que sirva de orientação sobre as relações
entre catequese e escola nos dias de hoje.

4.1.1. Um olhar para o passado: o ensino da religião (ER) como catequese escolar

O problema do ensino religioso na escola (ERE) sempre está condicionado ao peso da


história. No passado, a época moderna viu na Europa a presença pacífica da catequese no
interior da instituição escolar. Na origem há o fato de que a escola na Europa nasceu e se
desenvolveu por iniciativa e sob o controle das Igrejas. Além da herança cristã, oriunda da
Idade Média, teve também um peso determinante o forte processo de confessionalização
das nações europ ias ocorrido nos séculos XVI e XVII, quando as denominações cristãs,
católica ou protestantes praticamente se identificaram com a instituição estatal e plasmaram
um conjunto indissolúvel de leis, tradições, normas éticas e patrimônio cultural fortemente
marcado pela pertença confessional.53

52
Cf. bibliografia no fim do capítulo.
53
Cf. Rémond, Religion et société en Europe: essai sur la sécularisation des sociétés européennes aux XIX e XXe
siècles (1789-1998). Paris, Éditions du Seuil, 1998.
284
Nesse contexto, o ensino religioso p de manter, sem questionamentos, seu caráter
confessional e catequético: seja pelos conteúdos (geralmente contidos nos catecismos ),
seja pela modalidade de condução (gestão eclesiástica). O catecismo na escola, forma
pacífica de igreja na escola , se tornou instrumento válido de socialização religiosa, e
muitas vezes também de alfabetização e de promoção cultural, constituindo um fato
educacional de reconhecida importância cultural e social. Nesse percurso histórico existem
algumas constantes que lhe explicam a consistência e a duração:
A concepção do ERE como verdadeira catequese e como instrumento privilegiado de
socialização religiosa no interior das diversas confissões;
A relação indissolúvel entre religião e instituições confessionais, pela qual se entende
que tudo o que diz respeito à religião é matéria própria e exclusiva das Igrejas;
A convicção de que a pertença religiosa de toda pessoa, componente essencial da
própria identidade cultural, é um bem a ser promovido, evitando cuidadosamente
qualquer confronto com outras posições, consideradas perigosas para o próprio
crescimento humano e religioso.
Com a afirmação do iluminismo e da secularização, principalmente no século XIX, a
situação tornou-se problemática, uma vez que se passou a reivindicar a autonomia das
instituições civis, especialmente a escola, muitas vezes em conflito com a instituição
eclesiástica. E isso explica, pelo menos em parte, a atitude de defesa que não poucas vezes
caracterizou a reação do mundo católico, resolvido a defender as próprias instituições
(especialmente as escolas católicas) e a própria presença nas escolas públicas (especialmente
por meio do ERE).
Essas tensões se deram de forma muito diversa, de acordo com os fatores históricos e
culturais.54 Em algumas partes se instaurou uma colaboração pacífica entre Estado e Igreja,
ao passo que em outras chegou-se a uma ruptura, ou a formas diversas de acordo, como no
caso das concordatas. Do lado católico, para legitimar a presença do ERE confessional na
escola, recorreu-se geralmente à afirmação do direito da Igreja de desenvolver a própria
missão nas instituições civis e, numa linha mais pedagógica, por dois argumentos
tradicionais: o direito dos pais de assegurar aos filhos o tipo de educação desejado e a
importância da dimensão religiosa (identificada sempre confessionalmente) como parte
essencial de uma educação integral.

54
Cf. Istituto di Catechetica dell Università Salesiana (ed.), Scuola e religione, 1; F. Pajer (ed.), L´insegnamento
scolastico della religione nella nuova Europa.
285
4.1.2 Um sistema em crise

O Vaticano II significou uma mudança importante para o nosso tema, quer pela nova
visão da Igreja e de sua missão, quer pela sensibilidade que se criou em relação aos valores
da modernidade (a laicidade, a liberdade religiosa, o senso democrático, a intolerância a toda
forma de privilégio). Nasceu, assim, um vasto movimento de intolerância e de crítica à
presença da religião na escola em sua forma tradicional.55 O ER foi acusado de doutrinação,
violência contra as consciências, privilégio discriminatório em favor de uma confissão
religiosa etc. Não se justifica a religião na escola como concessão feita à Igreja, 56 como
Igreja na escola , quase um parêntese sacro no interior de uma instituição leiga.57
Cresceu a convicção de que, numa sociedade pluralista e democrática, não se pode
invocar a missão evangelizadora das Igrejas para manter, na escola de todos, de forma
institucionalizada, um ERE catequético. Na Itália falou-se até da ambig idade de um
ensinamento que, por um lado, é escolar, mas não totalmente, sendo também atividade gerida
pela Igreja. E essa ambig idade envolve também a figura do professor, que por um lado
pertence à escola, mas que também é representante da instituição eclesiástica.
Por outro lado, conceber o ERE como catequese prejudica tanto a instituição
eclesiástica como a catequese: a primeira, porque se apresenta como um corpo estranho à
escola e, portanto, objeto de marginalização progressiva; a catequese porque, já estando
presente na escola, tem o seu desenvolvimento obstruído na comunidade eclesial. Daí o
desejo, bastante difundido, de colocar sobre outras bases a legitimação do ER na escola.
Essa revisão, um pouco por toda parte, levou à busca de uma fundamentação pedagógico-
escolar do ER, na convicção de que, o direito de cidadania do ER na escola deve derivar das
necessidades da própria escola, no contexto de suas finalidades educativas. A lógica escolar e
o discurso pedagógico é que deverão justificar, se for o caso, a presença de um ensino
religioso ou um momento de formação religiosa na escola.58

55
Cf G. Milanesi, Religione e liberazione. Turim, SEI, 1971, p. 9-17; Dibattito sull´insegnamento della religione.
Zurique, PAS-Verlag, 1972.
56
Assim rezava o art. 36 do Acordo de 1929 entre a Itália e a Santa Sé: A Itália [...] consente que o ensino
religioso ora ministrado nas escolas públicas elementares tenha um desenvolvimento posterior nas escolas médias .
57
Cf. E. Alberich, L´insegnamento della religione tra catechesi e approccio culturale . Orientamenti
Pedagogici 33 (1986), n. 6, p. 1026-37.
58
Cf. F. Pajer, Per uno statuto laico dell´insegnamento religioso scolastico . Religione e Scuola 7 (1978-79), n.
8-9, p. 350-59.
286
4.1.3 O fundamento pedagógico-escolar do ER

Em termos pedagógico-escolares, o que se pergunta é se o tema religião pertence ou não


ao projeto educacional e didático de uma escola moderna, sem invocar posições de privilégio ou
juízos de fé próprios dos crentes: deve ser um raciocínio aceitável por qualquer pessoa que seja
sensível ao problema educacional e compartilhe uma concepção aberta da missão da escola. A
reflexão catequética e pedagógica atual59 se orienta decisivamente para essa via. E isso leva antes
de tudo a uma revisão de alguns argumentos tradicionais:
No mundo católico sempre se insistiu no direito que têm os pais de ver respeitado o seu
desejo de educação religiosa para os próprios filhos. O argumento conserva sempre o seu
valor, e é justo estimular a corresponsabilidade dos pais na vida da escola, mas também
tem os seus limites, na medida em que precisa respeitar outros direitos e exigências: isto
é, os dos próprios alunos, da sociedade em geral e do trabalho educacional.
Costuma-se invocar também a exigência de uma educação integral do ser humano, não
se ignorando a sua dimensão religiosa. Ora, se para os crentes o valor humanizador e
educacional da religião é um argumento convincente, não o é assim igualmente para
todos, porque pressupõe um juízo de valor sobre o fato religioso não partilhado por todos.
O argumento mais válido, mesmo para os não crentes, que pode justificar o ERE na escola de
todos, parece ser o da importância educacional e sociocultural do fato religioso na nossa
sociedade.

59
Cf. F. Pajer, Insegnamento della religione . Diz.Cat., p. 349-52 e os documentos episcopais citados no fim do
capítulo.

287
Antes de tudo a importância educacional da questão religiosa: porque a religião,
como quer que seja avaliada, se propõe como resposta a indagações profundamente
arraigadas na pessoa humana: sobre o sentido da vida e da história, sobre a origem e o
fim da existência etc. O fato religioso quer dar resposta à busca de sentido, coloca em
questão as próprias certezas e se constitui em critério valorativo da vida pessoal e
social. Por isso, conhecer essa realidade, confrontar-se com ela e assumir em
relação a ela uma atitude responsável é parte integrante de um verdadeiro
e, portanto, de um projeto escolar entendido corretamente.60
A importância educacional do fato religioso resulta também de suas influências preocupantes
e ambíguas no mundo de hoje, no qual existem tantas formas imaturas e desumanizantes de
experiências religiosas: fundamentalismos, fanatismos, intolerância, procura patológica de
segurança, subjetivismo exagerado, adesão acrítica a seitas ou a líderes carismáticos etc. São
situações que não podem deixar de preocupar a todos os que têm responsabilidades
educacionais. Além disso, as religiões se envolvem na questão, de enorme urgência e atualidade,
da educação para a paz, para a convivência e para a aceitação do pluralismo.
Mas o fato religioso tem também uma grande importância sociocultural. Em muitas
nações a religião pertence, de forma determinante, ao próprio patrimônio cultural e
histórico, e é para muitas pessoas uma referência verdadeiramente significativa para a
própria concepção da vida, da sociedade e da história. Trata-se, portanto, de um fato
sempre presente e de um fato importante, independentemente do valor que cada um lhe
possa atribuir. Não é razoável, pois, ignorá-la sem privar-se de elemento essencial para a
compreensão do próprio passado e da própria identidade. Conhecer esse fato
culturalmente relevante, entender-lhe o alcance, amadurecer opções ponderadas em
relação a ele e estar em condições de conviver com pessoas de convicções diversas:
eis uma série de objetivos que não podem ser descurados por uma escola que
queira ser verdadeiramente mediação crítica da cultura . 61 Ora, nos nossos dias a
ignorância religiosa de muitos cidadãos atinge proporções realmente incríveis, como o
mostra a experiência de todos os dias. E sabe-se que a ignorância é sempre fonte de
preconceitos, de intolerância, de ameaças para a convivência e a paz.

60
Cf. Alemanha ER n. 2.3.
61
Cf. Itália ER n. 15; Alemanha ER n. 2.3; Espanha ER n. 10-16.
288
Essas reflexões permitem concluir que uma abordagem séria do fato religioso na escola não
é apenas compatível com os objetivos da instituição escolar, mas constitui um elemento
integrante desta, que atende às finalidades de uma escola educativa, pluralista e democrática.

Uma consequência importante: o ER, enquanto parte integrante do projeto da escola, deve
assumir plenamente as exigências e as características próprias da abordagem escolar: seriedade de
programação, proposição científica, abertura à pesquisa, inserção no projeto educacional da escola,
qualificação adequada dos professores etc. O caráter específico do ER entre as disciplinas escolares
não deve fazer que se deixem de atender aos requisitos didáticos e pedagógicos, próprios de
todas as atividades da escola.

4.1.4 Distinção e complementaridade entre ER e catequese eclesial

A concepção escolar do ER levou a um consenso, ainda que diferenciado em suas


modalidades concretas, sobre a conveniência de distinguir claramente entre ER na escola e catequese
da comunidade cristã.62 Não se trata de contraposição, mas de complementaridade na distinção. É
uma distinção que diz respeito aos ambientes (a escola pública e a comunidade cristã, respectivamente),
aos destinatários ou participantes (os alunos, por um lado, e os crentes, de outro), às tarefas
(embate responsável com o fato religioso e amadurecimento da fé), às metodologias etc. E se trata,
no fundo, de um esclarecimento destinado a favorecer, não apenas o exercício do ER, mas também
o desenvolvimento do ministério catequético nos diversos campos da ação pastoral da Igreja.

62
Cf. DGC n. 73; Brasil CR n. 125; Alemanha ER 1,4; Espanha ER n. 58-65; Itália ER n.13; A. P. Purnel, Our
faith story. Londres, Collins, 1985, p. 72-75. Para melhor conhecimento da legislação do ERE no Brasil, cf. Anisia
de Paulo Figueiredo, Legislação do ensino religioso no Brasil no contexto histórico de diferentes épocas. Brasília,
janeiro de 2000, pró-manuscrito; L. Caron, Ensino religioso em documentos da Igreja católica apostólica romana .
Brasília, junho de 2000, pró-manuscrito; I. J. Nery, A escola católica no mundo plural: uma identidade contestada e em
busca. Brasília, junho de 2000, pró- manuscrito.
289
4.2 Novas perspectivas para o ensino da religião na escola

Quando nos propomos precisar a natureza e as tarefas de um ERE plenamente escolar,


encontramos, na realidade, um panorama muito diverso de realidades específicas concretas,
mas também algumas características daquilo que se pode chamar de a nova face do ER na escola.

4.2.1 Objetivos e tarefas do ER

Os objetivos do ER refletem as motivações pedagógicas que justificam a sua presença na


escola. Em suma, podem ser apreendidos tomando-se como base uma tríplice tarefa: informação,
formação, educação para a paz:
proporcionar aos jovens um conhecimento sério e articulado do fenômeno
religioso, na sua natureza e nas suas manifestações. Este objetivo se reveste hoje de
uma urgência toda especial, dadas as proporções alarmantes da ignorância religiosa na
nossa sociedade.
proporcionar aos jovens um confronto sério com questões fundamentais relativas
ao sentido da vida e às últimas realidades humanas, para ajudá-los a fazer opções livres e
maduras no campo religioso e a integrar os conhecimentos religiosos ao seu próprio
patrimônio cultural.63
numa sociedade complexa e multirreligiosa, é urgente educar para a
convivência pacífica e o diálogo, especialmente entre aqueles que pertencem a
culturas e confissões religiosas diferentes. A escola poderá oferecer, nesse particular, um
ambiente privilegiado de ação educativa.64

63
Cf. Espanha ER n. 15; Itália ER n. 7; A. Fossion, La catéchèse dans le champ de la communication, p. 365.
64
Cf. Itália ER n. 7. No Brasil, oficialmente pela Lei de Diretrizes e Bases , de 20 de dezembro de 1996, Lei 9.394/96,
artigo 33, substituída pela Lei 9.475/97 de julho de 1997 no âmbito da escola pública o ensino religioso escolar criou
uma epistemologia própria: já não está mais ligado às igrejas, não parte da fé nem visa a fé, embora ajude todos os
alunos a encaminhar uma opção consciente e responsável no que diz respeito à fé religiosa. Por sua vez, nas Diretrizes
gerais 2003-2006 assim se expressa a CNBB: As dioceses, colaborando entre si e com o Estado, apoiem o ensino
religioso nas escolas públicas e particulares e cuidem da formação de professores competentes. Embora este não se situe
mais na perspectiva da catequese, é um importante instrumento para responder à dimensão religiosa da pessoa
humana. Nas escolas católicas, e onde for possível, apresentem-se os conteúdos fundamentais do cristianismo e da
doutrina da Igreja (n. 24, cf. 85c).
290
4.2.2 Conteúdos do ER escolar

Sobre o tema dos conteúdos do ER, as posições são muito variadas. Alguns critérios devem
ser observados no esforço de esclarecimento:
Parece-nos insuficiente a proposta de reduzir o ER a uma simples informação, dita
científica e neutra, sobre o fato religioso, quer confiada às diversas matérias escolares,
quer como objeto de uma disciplina específica. Além da impossibilidade de um tratamento
verdadeiramente neutro nesse campo,65 essa estratégia não responderia devidamente à
importância educativa da questão religiosa e aos objetivos de um ER escolar entendido
corretamente.
Igualmente inadequada é a proposta de um ER como escola de religiosidade, que teria
como objeto não as religiões ou confissões religiosas existentes historicamente, mas o
problema ou a dimensão religiosa em seus aspectos universais e comuns, ainda que com o
objetivo de evitar na escola o conflito entre pertenças religiosas diversas. Embora
admitindo a importância de uma abertura à dimensão religiosa da vida, observa-se que a
religiosidade só existe encarnada nas formas históricas das religiões, e que de qualquer
modo sua importância educacional e cultural se liga não ao problema religioso considerado
abstratamente, mas à realidade concreta do fenômeno religioso tal como de fato existe.
Um ER fiel à sua função pode ser caracterizado como abordagem educativa e cultural do
fato religioso, tomado na concretude de suas realizações históricas e de suas dimensões, em
sintonia com o projeto educacional e cultural da escola.66 Trata-se, portanto, de um ensino
ou área temática que não exclui nenhum aspecto relevante da problemática religiosa, no respeito
às exigências didáticas e às reais condições dos alunos.

4.3 As questões em aberto: o problema da confessionalidade

Não obstante os passos dados e as declarações de princípio, a situação efetiva do ER, em


muitos países, não é tranquila. Lamenta-se uma certa precariedade da disciplina e do professor,
reconhecimento jurídico e profissional insuficiente, além da marginalização, em termos práticos,
da matéria na programação escolar. Muitas vezes se fala de disciplina incipiente , de disciplina
na encruzilhada , de aulas sem interesse .67

65
Cf. USA (NCD) n. 234; G. Baudler, in Scuola e religione, 1, p. 234-36.
66
A. Fossion, citando P.Garrigue, fala de três atitudes que se devem ter na condução do ERE: o respeito à especificidade
do fenômeno religioso, a adoção de uma abordagem científica, a apresentação do fato religioso na sua variedade: A.
Fossion, La catéchèse dans le champ de la communication, p. 368.
67
Cf. G. Malizza - Z. Trenti (eds.), Una disciplina in cammino: rapporto sull´insegnamento della Religione Cattolica
nell´Italia degli anni ´90. Turim, SEI, 1991; id., Una disciplina al bivio: ricerca sull´insegnamento della Religione
cattolica in Italia a dieci anni dal Concordato. Turim, SEI, 1996; C. C. Canta, L´ora debole ndagine
sull´insegnamento della religione cattolica nella Sicilia orientale. Salvatore Sciascia, 1999.
291
O aspecto mais problemático parece ser o da confessionalidade68 e, portanto, o fato de o ER
reportar-se a uma confissão religiosa específica e à instituição que a representa. Com efeito, a
gestão eclesiástica de uma disciplina escolar se afigura como uma presença indevida no interior de
uma instituição civil, especialmente nos países em que tradicionalmente existe uma tensão entre
Igreja e Estado, entre confissões religiosas e sociedade civil.69 Parece-nos que aqui se encontra a
própria raiz do problema.

4.3.1 As duas almas do ER escolar

Na realidade, não obstante as declarações de princípio, ainda está muito presente a concepção
catequética do ER, que encontra um claro apoio na confessionalidade da disciplina e da sua
gestão por parte das Igrejas. Permanece ainda a ideia de que todo o campo da educação religiosa
deve ser confiado exclusivamente à responsabilidade das instituições confessionais. Continua-se
a pensar que, para o crescimento humano e religioso, é importante proteger a própria
identidade e pertença de todo contato ou diálogo com outras posições religiosas, vistas sempre
como uma ameaça. Portanto, continuam vivos os pressupostos que estão na base de uma
concepção catequética do ER.
Por isso existe uma certa ambig idade fundamental, dada a presença de duas almas , no
modo de conceber e realizar o ER na escola. E talvez essa coexistência das duas almas constitua o
ponto nodal e o esquema interpretativo que está na base de tantas situações e de tantos
problemas. Por exemplo: em alguns países o ER continua a ser concebido como
catequese escolar (Áustria, Irlanda, Polônia, diversos países do continente americano etc.),
enquanto em outros ele foi excluído da escola pública em nome da laicidade (França, Holanda,
Eslovênia).70

68
Muito se tem escrito e discutido na Itália sobre esse tema. Cf. L. Alves Lima, O ensino religioso e a
confessionalidade . Revista de Catequese 7 (1984), n. 28, p. 14-21. Dibattito sull´insegnamento della religione. Atti del
"Colloquio sull´insegnamento della religione nella scuola secondaria superiore (Roma, 5-6 novembre 1971). Zurique,
PAS-Verlag, 1972; Istituto di Catechetica dell Università Salesiana (ed.), Scuola e religione. 2 vols. Leumann (Turim),
Elledici, 1973; F. Pajer, Per uno statuto laico dell´insegnamento religioso scolastico . Religione e scuola 7 (1978-79),
n. 8-9, p. 350-59; Società civile scuola laica e insegnamento della religione. Atti del Convegno Nazionale di Religione e
Scuola, Roma, 17-19 novembre 1982. Brescia, Queriniana, 1983; N. Galli, L´insegnamento della religione nella
scuola di Stato . Humanitas 38 (1983), n. 6, p. 847-91.
69
Por isso o problema é muito sentido na Itália, onde o ER se configura como ERC (ensino da religião católica) e,
legitimado por um acordo, traz consigo não poucas ambiguidades ligadas também ao seu caráter confessional.
70
Cf. F. Pajer, L´insegnamento scolastico della religione nella nuova Europa; Th. H. Groome, Catechesis and
religious education , The Living Light 29 (1992/93), n. 1, p. 40-46.

292
Sempre concebido como catequese escolar, o ER foi excluído também da escola pública nos EUA
e transformado em um ER não confessional na Inglaterra, não tanto por disposição contra a
religião, mas para evitar, na escola, os conflitos e a multiplicidade das confissões presentes
na sociedade. É também coerente com essa perspectiva, por respeito às pertenças religiosas,
a multiplicação dos ensinos confessionais no interior da escola pública, como, por exemplo,
na Croácia ou na Bélgica, onde coexistem diversas formas de ER na mesma escola (católico,
protestante, ortodoxo, hebraico, muçulmano, humanístico etc.).
Entrevê-se também essa dupla alma na fórmula, concordatária ou constitucional, de um ER
confessional presente na escola, mas tornado facultativo, opcional, ou com possibilidade de
dispensa (como na Itália, Espanha, Áustria etc.). Pode-se apontar nesses casos uma certa
contradição entre duas concepções de ER em contínua tensão,71 ou de qualquer modo a
dificuldade ligada à concepção do ER como instrumento de socialização religiosa confessional.
Essa sua conotação, ainda que atenuada por preocupações culturais e pedagógicas, faz que o ER
seja quase inevitavelmente excluído, garantido ou se torne facultativo, mas sempre em tensão ante
a laicidade e limitado na sua declarada intencionalidade educativa, enquanto ligado a uma
determinada confissão e pertença religiosa. Tudo isso torna muito difícil levar às suas
últimas consequências as novas e urgentes necessidades educacionais da escola e respeitar
devidamente a importância cultural e pedagógica de uma aproximação de todos ao fato religioso.

71
Na Itália observa-se uma certa contradição, no novo texto do acordo, entre, por um lado, a afirmação do valor da
cultura religiosa e de que os princípios do catolicismo fazem parte do patrimônio histórico do povo italiano , e,
por outro, o fato de tornar o ensino religioso facultativo, abrindo, portanto, a possibilidade de ignorar um patrimônio
cultural e histórico tão importante. Na Espanha tem-se um verdadeiro paradoxo, quando se afirma oficialmente que a
religião, enquanto oferta do sentido último, ainda que seja a disciplina escolar mais importante, é também aquela que
não pode ser imposta : Espanha ER n. 19.
293
4.3.2 Por um ER pluralista e interdisciplinar

Essas dificuldades podem explicar, no panorama internacional, uma situação de transição e a


necessidade de repensar a identidade e a função do ER na escola. A tendência atual pode ser assim
resumida: Em linhas gerais, o deslocamento se dá do querigmático para o cultural, do
confessional para o transconfessional e para o ético, do religioso cristão para o inter-religioso e a
abordagem fenomenológica e/ou histórica do fato religioso .72
Em algumas nações propuseram-se ou introduziram-se formas não confessionais, abertas, de
ER na escola. Além da Inglaterra, que já tem uma longa tradição nesse tipo de ensino, é de
lembrar também a Suécia (ER não confessional, obrigatório para todos) e diversas
experiências nos EUA, na Espanha, na Suíça, na Holanda.73 Na Alemanha, onde ainda se discute
o futuro do ER, existem propostas de revisão da estrutura jurídica e organizacional do ER, como
também de introdução de um ER geral, não ligado à gestão das Igrejas.74 Causou alvoroço, em
especial, a proposta feita em Brandenburgo de uma disciplina chamada Projeto de vida, ética,
religião aberta a todos, com caráter não confessional,75 ou, antes, de um ER para todos na escola
de todos .76
Tudo isso traduz a necessidade de fundamentar em novas bases a presença da religião nos
sistemas escolares, na convicção de que existe aqui um problema educacional e cultural que não se
esgota, como no passado, nos processos tradicionais de socialização religiosa das diversas
confissões. Anuncia-se, assim, o surgimento de uma nova abordagem educacional da religião,
que requer atenção da parte da sociedade e do universo da escola e da educação.
Talvez pudéssemos idealizar um modelo de ER transconfessional e multidisciplinar,
obrigatório para todos, concebido como abordagem didática e educacional do fato religioso, em
toda o seu valor cultural e na consistência de seu significado educacional. Um ER
transconfessional deveria superar os limites confessionais atuais, no que se refere aos conteúdos,
aos professores e à gestão, respeitando a pluralidade de experiências religiosas presentes na
sociedade. E deveria ser também multidisciplinar (ou, melhor ainda, interdisciplinar)
uma vez que o fato religioso hoje não pode ser apenas objeto da abordagem teológica e bíblica,
mas deve também receber a contribuição das ciências positivas da religião.

72
F. Pajer, L´enseignement scolaire de la religion en Europe: vue panoramique d´une mutation , in: J. Bulckens - H.
Lombaerts (eds.), L´enseignement de la religion catholique à l´école secondaire njeux pour la nouvelle Europe.
Leuven, University Press/Uitgeverij Peeters, 1993, p. 37.
73
Cf. Pajer (ed.), L´insegnamento scolastico della religione nella nuova Europa.
74
Cf. E. Feifel, Die konfessionalität des Religionsunterrichts . Religionsunterricht an höheren Schulen 37 (1994),
n. 6, p. 355-66; Konfessioneller Religionsunterricht wohin? Katechetische Blätter 118 (1993), n. 12, p. 810-32; G.
Miller, Vision eines dreistufigen Religionsunterrichts, p. 831-32.
75
Cf. W. Simon, Lebensgestaltung Ethik-Religion. Ein Modellversuch und einige offene Fragen , Katechetische
Blätter 120 (1995), n. 1, p. 29-40; A. Biesinger - J. Hänle (eds.), Gott mehr als Ethik. Der Streit um LER und
Religionsunterricht. Friburgo/Basileia/Viena, Herder, 1997.
76
N.Scholl, Der Überbau stürzt zusammen, wenn das Fundament nicht trägt , in: B. Jendorff (ed.), Katholischer
Religionsunterricht: Wohin? Visionen aus Erfahrungen mit einem bewegten Fach. Donauwörth, Auer, 1996, p. 81-83.

294
Esse ER não deve ser, porém, um ensino descompromissado ou supostamente neutro .
Não é possível, nem justificável do ponto de vista pedagógico, ignorar algumas exigências da
confessionalidade, isto é, da efetiva conotação histórico-cultural que as várias denominações
religiosas têm na realidade social. E isso vale principalmente para os jovens, que devem ser
respeitados em sua identidade e pertença religiosa, como base para um crescimento responsável e
livre; vale também para os professores, que não devem ocultar ou colocar entre parênteses sua
atitude pessoal em relação à religião. Vale, ainda, para os próprios conteúdos do ER, pelo
menos no sentido de que as posições religiosas sejam tratadas com honestidade e
autenticidade, sem ignorar a consciência que delas têm os discípulos e que o professor, de forma
autorizada, representa.
Um ER assim entendido deveria ser obrigatório para todos, dada a importância do problema
religioso em suas vertentes cultural e pedagógica. Não nos parece aceitável que uma certa
porcentagem de jovens (hoje limitada, mas fadada a aumentar) fique totalmente à margem do
questionamento que hoje a religião desperta nas pessoas e na sociedade.
Descortina-se, pois, um alargamento de horizontes na visão do conteúdo e das finalidades do
ER. A terminologia utilizada para identificar as novas linhas de orientação é significativa.
Categorias como pluralismo, multiculturalismo, ensino ecumênico, educação para o diálogo,
aprendizagem intercultural e inter-religiosa, ER aberto etc., estão na ordem do dia no atual
panorama internacional.77

77
A bibliografia sobre o assunto é abundante. Para o Brasil, cf. bibliografia em português no final do capítulo. Cf.
também E. Feifel, Religiöse Erziehung im Umbruch. Munique, Kösel, 1995; R. Schlüter (ed.), Ökumenisches un
interkulturelles Lernen eine theologische und pädagogische Herausforderung. Paderborn/Frankfurt, 1994; R. Englert,
Zukunftperspektiven des Religionsunterrichts , Katechetische Blätter 116 (1991), n. 11, 773-81; L. Prenna,
Insegnamento della religione e catechesi: distinzione e complementarità , Rassegna di Teologia 30 (1989), n. 2, p.
177-88; M. Phillips-Bell, Justification and multifaith religious education , British Journal of Religious Education 5
(1982-83), n. 2, 87-95; H. G. Ziebertz, Pluralismo religioso e processi di apprendimento interreligioso: considerazioni
sulla ricerca dell´identità religiosa nella società (post-) moderna , Orientamenti Pedagogici 43 (1996), n. 4, p. 731-52.
295
4.3.3 O professor de religião: profissionalismo e autenticidade

Naturalmente, continua sendo decisivo o modo de ser e a competência do professor, do qual


se exige hoje um sério profissionalismo. É preciso que tenha, por um lado, competência científica
na abordagem multidisciplinar do fato religioso (ciências teológico-bíblicas e ciências positivas
da religião); por outro, requer-se profissionalismo e honestidade pedagógica em vista dos
objetivos culturais e educacionais do ER. Pensa-se num professor capaz de falar de religião de
forma séria, documentada, respeitosa perante as consciências e o pluralismo, verdadeiro educador
da liberdade dos outros, que estimule as respostas livres e o respeito pela diversidade.
Por outro lado, não se deve subestimar a sua confessionalidade , pelo menos no
sentido da importância de sua experiência pessoal e opção religiosa. Em um contexto educacional
não é possível colocar entre parênteses a própria atitude pessoal em relação à religião. Não é
possível nem é pedagógico: ele deverá revelar os próprios caminhos, as suas opções pessoais,
naturalmente sem impor as próprias escolhas nem forçar os jovens com doutrinações. Para uma
abordagem eficaz do ponto de vista educacional, é preciso partir do testemunho de uma
identidade clara,78 em nome da própria seriedade pedagógica.79
Parece-nos, porém, que o mais importante é sua autenticidade e sua capacidade de educar. No
limite, mesmo um não crente com verdadeiras aptidões pedagógicas poderá ter mais sucesso como
professor de religião que uma pessoa muito religiosa, mas não qualificada profissionalmente.80

78
Cf. E. Feifel, Religiöse Erziehung im Umbruch, p. 127-32; R.Schlüter, Aufbau einer konfessionellen Identität?; P.
Tobie, Le cours de religion à l´école, un débat de société , Lumen Vitae 48 (1993), n. 2, p. 223-29.
79
Cf. R. Schlüter, Oekumenische Perspektiven eines bekenntnisgebundenen Religionsunterricht ,
80
É a posição defendida por Pietro Braido: cf. P. Braido, L´insegnamento della religione nella scuola: aspetto
pedagogico , in: Istituto di Catechetica dell Università Salesiana (ed.), Scuola e religione, n. 2, p. 185.
296
4.4 Catequese e ER na escola católica

Merece menção especial a situação das próprias escolas católicas, que em parte apresentam
características próprias em relação ao problema da catequese, em parte compartilham as
dificuldades e perspectivas da escola em geral.
Antes de mais nada devemos lembrar que uma escola não é católica apenas porque inclui
em seus programas um ensino religioso e alguns momentos de culto e de oração. A tarefa de
formação da escola católica diz respeito a toda a comunidade educacional da escola e a todo o
conjunto do projeto educacional e didático promovido e executado (CAL n. 192). É por meio de
e formação cristã.81
Por isso pode-se dizer que é a catolicidade da escola que torna possível a catequese, e não o
contrário,82 e que, de todo modo, se dá ênfase mais à globalidade

Em princípio, dada a clara identidade cristã da escola católica, reafirma-se não só a


possibilidade, mas também o dever de garantir nela uma autêntica catequese eclesial, capaz de
favorecer o amadurecimento da fé e a síntese entre fé e cultura.83 De fato, porém, a situação
real dos alunos, professores e pais em relação à fé muitas vezes não corresponde às exigências de
uma verdadeira catequese. Donde a conveniência, por realismo pastoral e coerência educacional,
de distinguir também na escola católica catequese de ER,84 delegando a esta as finalidades
educacionais e didáticas próprias do ER na escola de todos.
Em muitos países, sobretudo na Europa, a distinção entre catequese e ER é um fato em geral
estabelecido. Na América Latina existem posições diferenciadas: Em alguns países oferece-se
uma catequese explícita, em outros se tem uma assim chamada educação religiosa escolar. São
atividades diversas e complementares .85 Em todo caso, a escola católica deve oferecer, em seu
projeto educacional, ocasiões várias de experiência de fé e de crescimento na fé, enquanto que
o ER poderá cumprir a sua tarefa específica de informação e de formação, a serviço da
educação dos jovens e da convivência pacífica na sociedade de hoje.

81
Cf. Congregazione per l ducazione attolica, Dimensione religiosa dell´educazione nella scuola cattolica.
Bolonha, Dehoniane, 1988, Segunda Parte ( Dimensione religiosa dell´ambiente ).
82
Cf. o documento dos bispos holandeses de 11/1/1977: La scuola cattolica: lettera pastorale dei vescovi olandesi.
Leumann (Turim), Elledici 1977, p. 29.
83
Cf CT n. 69; DGC n. 74; CAL n. 192; S. Congregazione per l Educazione Cattolica, La Scuola cattolica
(19/3/1977), n. 49-52.
84
É isso o que faz o documento Dimensione religiosa dell´educazione nella scuola cattolica: Existe um laço
indissolúvel e, ao mesmo tempo, uma clara distinção entre o ensino da religião e a catequese (n. 68).
85
CAL n. 192. Na Argentina se fez uma opção clara por um ER catequético na escola católica: cf. Conferencia
Episcopal Argentina, Lineamentos curriculares para la catequesis en la escuela. Buenos Aires, Conferencia Episcopal
Argentina, 1997.
297
Conclusão: uma nova visão pastoral

O caráter pedagógico-didático do ER na escola e a distinção entre ER e catequese eclesial


poderia levar a pensar que assim se perde uma possibilidade tradicional de ação pastoral na escola
pública, questionando-se também a conveniência de se fazer presente na escola através dos
professores de religião. Em outras palavras: o ER na escola, concebido como abordagem não
propriamente catequética do fato religioso, interessa verdadeiramente à missão da Igreja?
A pergunta exige uma resposta claramente afirmativa,86 se se pensar no horizonte
eclesiológico da diaconia para o Reino:

Uma Igreja que fala em nome de Jesus Cristo tem como missão original a de ser para os outros .
Independentemente do fato de as pessoas pertencerem ou não a ela, a comunidade eclesial deve estar
pronta para servir com tudo o que ela é, e com tudo aquilo que corresponde ao mandato
recebido da Igreja. O ensino da religião na escola é uma das formas pelas quais a Igreja pode realizar
87
esse serviço em contato com os jovens. Por isso este deve ser visto como uma tarefa de diaconia .

O ER na escola conserva sempre a sua importância pastoral enquanto ensino e testemunho


dos cristãos no interior da escola. É um serviço que deve sua originalidade ao ambiente da escola
e a suas finalidades, e, segundo as circunstâncias, poderá adquirir características que o aproximem
da evangelização, da catequese ou da reflexão teológica.
Em resumo: na nova perspectiva indicada, o ER desenvolvido por crentes na escola não
perde relevância pastoral, mas de qualquer modo muda a sua posição pastoral. Se antes se
apresentava como catequese, ligada, portanto, ao campo da ou ministério da
palavra, agora se aproxima mais da tarefa da diaconia e do dinamismo da evangelização. Seu
papel continua sendo providencial, porque permite alcançar uma grande quantidade
de jovens dificilmente presentes em outras estruturas da Igreja, e porque, no interior da
escola, pode constituir uma ocasião privilegiada de diálogo e de confronto entre a religião e a
cultura contemporânea. Além do mais, o ER favorece a tomada de consciência, por parte da
comunidade cristã, das exigências e das expectativas do mundo juvenil.88 De resto, a
distinção entre ER e catequese não deve significar de modo algum contraposição ou
concorrência: trata-se de duas formas complementares de serviço eclesial que se devem integrar
reciprocamente e se colocar, cada uma em seu campo, a serviço da promoção integral da pessoa
humana.

86
Cf. Alemanha ER 2.6.; Espanha ER n. 58-70; Itália ER n. 27.
87
Alemanha ER 2.6; Espanha ER parte 4 ( O ensino da religião serviço eclesial ); Itália ER n. 4: O ensino da
religião católica é um serviço educativo em favor das novas gerações .
88
Cf. Itália ER n. 27.
298
SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS

Para um aprofundamento do tema da koinonia eclesial e do movimento comunitário da


Igreja, sugerimos:
CHIAVACCI, E. et al. Esperienza di comunità esperienza di Chiesa. Leumann (Turim), Elledici,
1980.
CNBB. Igreja: comunhão e missão. São Paulo, Paulinas, 1988 (Documentos da CNBB n. 40).
. Missão e ministérios dos leigos e leigas. São Paulo, Paulinas, 1999 (Documentos da

DELESPESSE, M. Revolução evangélica? São Paulo, Loyola, 1973.


GODIN, A. La vita di gruppo
HORTELANO, A. Comunidades cristianas, fracaso o base y futuro de la iglesia. Salamanca,
Sígueme, 1987.
LIÉGÉ, P. A. Lo stare insieme dei cristiani tra comunità e istituzioni. Brescia, Queriniana, 1979.
MENDES DE OLIVEIRA, R. Traços característicos da comunidade cristã . Revista de
Catequese 9 (1986), n. 35, p. 11-18.
RATZINGER, J. Compreender a Igreja hoje: vocação para a comunhão. Petrópolis, Vozes,
1992.
RAVAGLIOLI, A. M. La comunità: evento ecclesiale e dinamica di gruppo. Casale Monferrato
(AL), Piemme, 1990.
SCHMID, P. F. Im Anfang ist Gemeinschaft. Personzentrierte Gruppenarbeit in Seelsorge und
Praktischer Theologie. Beitrag zu einer Theologie der Gruppe. Stutgart/Berlim/Colônia, W.
Kohlhammer, 1998.
TILLARD, J. M. R. Iglesia de Iglesias: eclesiologia de comunion. Salamanca, Sigueme, 1991.

Na vasta produção relativa às comunidades de base, escolhemos alguns trabalhos mais


significativos ou ricos de indicações bibliográficas:
AZEVEDO, M. de C. Comunidades eclesiais de base e inculturação da Fé. São Paulo, Loyola,
1986.
BARBÉ, D. A graça e o poder: as comunidades eclesiais de base no Brasil. São Paulo, Paulinas,
1983.
BARREIRO, Á. Comunidades eclesiais de base e evangelização dos pobres. São Paulo, Loyola,
1977.
BOFF, L. Eclesiogênese: as comunidades eclesiais de base reiventem a Igreja. Petrópolis, Vozes,
1977.
CNBB. As comunidades eclesiais de base na Igreja do Brasil: 7ª Reunião Ordinária do Conselho
Permanente. São Paulo, Paulinas, 1983.

299
. Comunidades clesiais de ase na Igreja do Brasil. 3a ed., São Paulo, Paulinas, 1984.
FALLICO, A. Le comunità ecclesiali di base. Roma, Paoline, 1982.
GALLO, L. Comunidades de base (América Latina) . Diz.Cat. p. 207-208.
GREGORY, Affonso. Comunidades clesiais de base: utopia ou realidade. Petrópolis, Vozes,
1973.
LIBÂNIO, C A (Frei Betto). Aspectos pedagógicos das comunidades eclesiais. São
Paulinas, 1983.
. O que é comunidade eclesial de base? São Paulo, Brasiliense,

MAR INS, J. F. Comunidades eclesiais de base p. 491-506.


MAR INS, J. F. e outros. Modelos de Igreja: comunidade eclesial de base na América Latina
(para um modelo libertador). São Paulo, Paulinas, 1977.
O´HALLORAN, J. Small christian communities: a pastoral companion. Dublin, Columba Press,
1996.
TAMAYO ACOSTA, J. J. Comunidades de base . In: FLORISTAN, C. - TAMAYO, J. J.
(eds.). Conceptos fundamentales de pastoral. Madri, Cristiandad, 1983, p. 141-161.
TEIXEIRA, F. L. C. Comunidades eclesiais de base: bases teológicas. Petrópolis, Vozes, 1988.
Sobre a relação entre catequese e comunidade:
ALVES de LIMA, L. A comunidade catequizadora no Brasil . Revista de Catequese 10 (1987), n.
40, p. 7-20, publicado também como La comunidad catequizadora em Brasil . Medellín 15
(1989), n. 57, p. 125-40.
BARREIRO, Á. As comunidades eclesiais de base como modelo inspirador da nova
evangelização . Perspectiva Teológica 24 (1992), n. 331-56.
Brasil CR, IV Parte: A comunidade catequizadora.
CANSI, B. A catequese e as CEBs . Revista Eclesiástica Brasileira 52 (1992), n. 208, p. 894-
902. Communautés lieux de catéchèse . Lumen Vitae 43 (1988), n. 4.
. Catequese comunitária, formação da comunidade catequética. Petrópolis, Vozes,
1984.
CELAM-DECAT, A comunidade catequizadora no presente e no futuro da América Latina:
conclusões da I Semana Latino-americana de Catequese . Quito 3-10 de outubro de 1982. São
Paulo, Salesiana, 1983 (Coleção Pastoral Catequética n. 9).
CNBB-REGIONAL NORDESTE 2. A Igreja como tema de catequese . Revista de Catequese 7
(1984), n. 26, 63-69.
CNBB-REGIONAL SUL 1. Catequese e comunidade . Revista de Catequese 5 (1982), n. 18,
p.77-81.
ESPANHA CC VI: Catequesis de la comunidad cristiana.
GARCÍA AHUMADA, E. A atequese na omunidade clesial de base . Revista de Catequese 8
(1985), n. 30, p. 51-58.
. O catequista na comunidade eclesial de base, agente de inculturação da fé . Revista
de Catequese 9 (1986), n. 33, p. 53-56.
GEEURICKX, J. Fé e vida em comunidade: renovação da Igreja e transformação da sociedade.
Algumas considerações sobre o tema central da 1ª Semana Brasileira de Catequese . Revista de
Catequese 9 (1986), n. 35, p. 5-10.

300
MENDES DE OLIVEIRA, R. A comunidade: fonte, lugar e meta da catequese . Revista de
Catequese 6 (1983), n. 21, p. 7-16.
PEDROSA ARES, V. M. Las pequeñas comunidades cristianas (PCC): una experiencia eclesial
que favorece la inculturación de la fe y de su catequesis . Teologia y Catequesis (1993), n.71,
p. 67-86.
TRENTI, Z. La comunità, luogo di maturazione credente . Catechesi 53 (1984), n. 17, p. 9-19.

Sobre o grupo e sua relação com a catequese:


BERROCAL DE LA CAL, L. Grupo en la catequesis, el . Nuevo Dic. Cat., p. 1057-68.
CONTRERAS, J. M. Como trabalhar em grupo: introdução à dinâmica de grupos. São Paulo,
Paulus, 1999.
GASQUES, J. Grupo: pessoa e amizade, uma nova pastoral de juventude. São Paulo, Paulus,
1999.
GATTI, C. O grupo de catequese também com as crianças? . Revista de Catequese 3 (1980),
n.11, p. 34-41.
. O grupo de catequistas: o que é, como formá-lo, como funciona. São Paulo,
Salesiana, 1985.
MAWRIE, B. L. The efficacy of group communication in catechesis: a study on interpersonal
relationship as the method of catechesis. Roma, 1996.
MENDES DE OLIVEIRA, R. O grupo de jovens como lugar de catequese . Revista de
Catequese 8 (1985), n. 32, p. 3-6.
NERY, I. J. A dimensão comunitária da catequese renovada . Revista de Catequese 7 (1984),
n.27, p. 16-24.
SCHMID, P. F. Im Anfang ist Gemeinschaft. Personzentrierte Gruppenarbeit in Seelsorge und
Praktischer Theologie. Beitrag zu einer Theologie der Gruppe. Stutgart/Berlim/Colônia, W.
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SUÁREZ, O. Oficinas para crescimento em grupo. São Paulo, Paulinas, 2001.
TONELLI, R. Gruppi giovanili ed esperienza di chiesa. Leumann (Turim), Elledici, 1992.

Sobre a relação entre catequese e escola e sobre o ensino da religião na escola existe uma
vastíssima bibliografia. Recomendamos principalmente alguns documentos oficiais:
COMISION EPISCOPAL DE ENSEÑANZA Y CATEQUESIS. Orientaciones pastorales sobre la
enseñanza religiosa escolar. Madri, PPC, 1979.
CONFERENZA EPISCOPALE ITALIANA. Insegnare religione cattolica oggi: nota pastorale
della CEI sul´insegnamento della religione cattolica nelle scuole pubbliche (24
maggio1991). Milão, Paoline, 1991.
. L´insegnamento della religione cattolica a dieci anni dagli accordi concordatari: Atti
del Simposio Nazionale sull´IRC nel decennale degli Accordi concordatari (1984-1994) Roma, 4-
5 novembre 1994. Brescia, La Scuola, 1995.
DEC (DEPARTAMENTO DE EDUCACIÓN). Orientaciones generales para la educación
religiosa escolar en América Latina y el Caribe. Santafé de Bogotá, Celam, 1999.

301
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L´enseignement moral et religieux catholique au primaire: pour un enseignement mieux
adapté aux jeunes et aux contextes actuels. Sainte-Foy (Québec), Direction des communications
du Conseil supérieur de l´éducation, 1994.
Identität und Verständigung. Standort und Perspecktiven des Religionsunterrichts in der Pluralität.
Eine Denkschrift der Evangelischen Kirche in Deutschland. 4ª ed. Gütersloh, Gütersloher
Verlagshaus, 1997.
SEKRETARIAT DER DEUTSCHEN BISCHOFSKONFERENZ (ed.). Religionsunterricht 20
Jahren nach dem Synodenbeschlu. Dokumentation des Symposions vom 23. Bis 25. März
1993 in Bergisch Gladbach/Bensberg. Bonn, Sekretariat der Deutschen Bischofskonferenz,
1993.
SINODO NAZIONALE DELLE DIOCESI DELLA GERMANIA FEDERALE. Scuola e
insegnamento della religione. Leumann (Turim), Elledici, 1977.

Estudos e reflexões sobre o ensino religioso na escola:


ALBERICH, E. L´insegnamento della religione tra laicità e confessionalità. Nuove istanze e
prospettive . Pedagogia e Vita (1997), n. 2, p. 25-42.
ALVES DE LIMA, L. O ensino religioso e a confessionalidade . Revista de Catequese 7
(1984), n. 28, p. 14-21.
. Ensino religioso escolar na escola católica: uma disciplina a caminho . Presença
Marista 23 (1998), n. 65, Suplemento [Ecos do Centenário da presença marista do Brasil], p.
19-33.
BIESINGER, A. - HÄNLE, J. (eds.). Gott: mehr als Ethik. Der Streit um LER und
Religionsunterricht. Friburgo/Basil ia/Viena, Herder, 1997.
BISSOLI, C. - TRENTI, Z. (eds.). Insegnamento della religione e professionalità
docente.Leumann (Turim), Elledici, 1988.
CATÃO, F. A linguagem do ensino religioso . Revista de Catequese 14 (1991), n. 56, p. 3-
18.
. O estatuto pastoral do ensino religioso escolar . Revista de Catequese 13 (1990), n. 52,
p. 5-14.
. Política e espírito: a polêmica a respeito do ensino religioso escolar . Revista de
Catequese 20 (1997), n. 77, p. 12-20.
CNBB. Educação, Igreja e sociedade. São Paulo, Paulinas, 1992 (Documentos da CNBB n.
47).
. O ensino religioso nas escolas públicas, comunicação feita no plenário da 26ª
Assembleia Geral . Revista de Catequese 11 (1988), n. 44, p. 57-60.
DAMIANO, E. - MORANDI, R. (eds.). Cultura, religione, scuola: l´insegnamento della
religione nella trasformazione culturale e nell´innovazione scolastica, in prospettiva
europea. Milão, Franco Angeli, 2000.
Dibattito sull´insegnamento della religione. Atti del Colloquio sull´insegnamento della religione
nella scuola secundaria superiore (Roma, 5-6 novembre 1971). Zurique, PAS Verlag, 1972.
ESTEBAN GARCES, C. Panorama reciente a propósito de la ERE . Sínite 37 (1996), n. 111, p.9-
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p. 24-28.
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GALÁN, M. J. B. - GÓMEZ, E. M. Enseñanza religiosa escolar . Nuevo Dic. Cat., p. 779-793.
GALLI, N. L´insegnamento della religione nella scuola di Stato . Humanitas 38 (1983), n. 6,
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GRUEN, W. A natureza do ensino religioso, à luz de uma aula . Revista de Catequese 11
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304
Capítulo 9
Catequese e Liturgia
A relação entre catequese e liturgia tem uma longa e sólida tradição,
uma vez que a liturgia, e em particular a eucaristia e os outros
sacramentos, sempre constituíram um ponto de referência e um ambiente
privilegiado para o exercício da catequese. Pode-se dizer mesmo que por
longos períodos da história cristã a principal tarefa da catequese foi a
preparação para os sacramentos e a vida litúrgica. A primeira metade do
século XX assistiu ao forte crescimento da influência da liturgia sobre a
catequese, graças aos progressos do movimento litúrgico que, precedendo
de muito o desenvolvimento da renovação catequética, pôde
próprias conquistas a serviço desta última.1
No período pós-conciliar a relação entre catequese e liturgia foi
repensada à luz do impulso renovador da Constituição Sacrosanctum
Concilium e a consequente reforma da liturgia. Mas aconteceram tantas
mudanças, que se impõe um esclarecimento sobre as relações entre as
duas funções eclesiais.

1. LITURGIA E CATEQUESE: DIÁLOGO E TENSÃO

Na situação atual não faltam aspectos problemáticos e pontos de atrito, seja no âmbito
da reflexão catequética e litúrgica, seja no terreno da prática pastoral.2

1.1 Insatisfações no campo litúrgico

Do ponto de vista litúrgico, fazem-se à catequese, entre outras, as seguintes objeções:


A práxis catequética subestimou as exigências da catequese litúrgica. Is o explica,
pelo menos em parte, as limitações e o relativo fracasso da reforma pós-conciliar:

Muitas vezes [...] a prática catequética apresenta uma ligação débil e fragmentária com a
liturgia: limitada atenção aos sinais e ritos litúrgicos, pouca valorização das fontes
litúrgica roteiros catequéticos com pouca ou nenhuma relação com o ano litúrgico,
presença secundária de celebrações nos itinerários da catequese (DGC 30).

1
Bastaria recordar a obra catequética, fortemente impregnada de elementos litúrgicos, de figuras como Françoise
Derkenne e Lubienska de Lenval e no Brasil a figura da irmã Tereza Lézier. Cf. os respectivos verbetes in Diz.Cat.
2
Cf. por exemplo, na bibliografia no fim do capítulo, os estudos de J. Aldazábal, A. Rouet, R. Sauer, D. Sartore, e o
número monográfico citado na Rivista Liturgica.
305
A catequese parece mais atenta hoje à dimensão antropológica e experiencial
(problemas do homem, experiências de vida, de caridade e de serviço) do que ao
momento de celebração e de culto da vida cristã, esquecendo a centralidade da
experiência litúrgica no crescimento da fé.
Muitas vezes a liturgia é instrumentalizada em virtude de objetivos catequéticos que
não lhe respeitam a natureza celebrativa e simbólica.3 Pense-se em algumas
interpretações da confirmação ou na vivência da Eucaristia com fins didáticos ou de
animação juvenil.

1.2 Insatisfações no âmbito catequético

Do ponto de vista catequético, apresentam-se os seguintes contra-argumentos aos


defensores da liturgia:
Muitas vezes se atribui à liturgia um valor absoluto, e ela é considerada como um
lugar não apenas privilegiado, mas exclusivo, da presença salvífica do mistério de
Cristo. Muitas vezes nos deparamos com expressões como na liturgia se realiza o
que a catequese anuncia , que subestimam a tarefa da catequese e o caráter eficaz e
quase sacramental do anúncio da palavra de Deus na Igreja.
Exagera-se o papel da liturgia quando se afirma, por exemplo, que ela é o objetivo e
a fonte da catequese ,4 ou que toda catequese deve ter a liturgia como norma
estruturante e essencial ,5 ou que a verdadeira catequese é só a oficial [...] reservada
ao Bispo e aos seus colaboradores e explicada no contexto litúrgico, comentando os
livros sagrados .6
A exaltação da liturgia como fonte primeira do espírito cristão (cf. SC n. 14) ignora
muitas vezes as condições de um verdadeiro valor catequético da liturgia: o contexto
sociocultural, as exigências pedagógicas dos sujeitos, as leis da comunicação
significativa etc.7

3
Cf. L. Maldonado, Celebrar: reflexiones para un diálogo entre catequistas y liturgistas , Teologia y
Catequesis (1988), n. 26-27, p. 463-75.
4
Cf. A. Veerheul, citado por E. Moeller, Liturgie et catéchèse au Congrès Liturgique de Houthalen (29-31
octobre 1978) , Questions Liturgiques 60 (1979), n. 3, p. 318.
5
Era essa a tese defendida por J. Dreissen, La linea liturgica della nuova catequese. Leumann
(Turim), Elledici, 1969.
6
P. Dacquino, Teologia della Catechesi , Catechesi 37 (1968), n. 404, p. 22.
7
Ver, por exemplo, como se insiste na ordem tradicional dos sacramentos da iniciação. Sobre esse problema, cf.
E. Alberich, Pastorale giovanile e sacramenti: a proposito dell´età più conveniente per conferire i sacramenti
dell´iniziazione cristiana , Orientamenti Pedagogici 14 (1967), p. 1.324-63; D. Borobio, Confirmación e
iniciación cristiana , Teologia y Catequesis (1987), n.21, p. 25-46.
306
1.3 A questão em aberto da pastoral sacramental

Nesse âmbito observa-se a perplexidade derivada de situações problemáticas para a


autenticidade e eficácia dos sacramentos: motivações duvidosas na busca de sacramentos
(batismo, matrimônio, crisma, primeira comunhão); preparação insuficiente; pouco
envolvimento dos pais; mentalidade quase mágica em relação a alguns sacramentos etc. Na
prática pastoral muitas vezes se observa uma grande distância entre a demanda das pessoas
(sacramentos como ritos de passagem ou conveniência social) e a oferta da Igreja
(sacramentos como sinais de fé). Daí resulta uma situação que, se por um lado oferece
possibilidades para um caminho de fé, por outro implica o risco da desvalorização dos
sacramentos e da catequese. São situações e problemas que requerem ou põem à prova a
paciência e o esforço daqueles que cr em na seriedade do caminho de fé tendo em vista os
sacramentos, bem como a dignidade e o significado dos sacramentos em si.

1.4 A crise do processo de iniciação cristã

Em particular, continua em aberto o problema da iniciação cristã, que constitui uma


mescla de caminho de fé, expressão sacramental e experiência de vida. Como já dissemos,
está em grave crise esse processo de iniciação, que para muitos jovens se tornou,
paradoxalmente, processo de conclusão da vida cristã. E muitos pontos problemáticos
continuam em aberto: o batismo generalizado de crianças; a ordem e a idade para os
sacramentos de iniciação; a primeira confissão; a pastoral da crisma; a urgência do
catecumenato e a existência de catecumenatos para cristãos batizados etc. São situações e
problemas que envolvem a relação entre catequese e liturgia.

307
2. NOVAS PERSPECTIVAS DA LITURGIA ECLESIAL
(A face renovada do sinal da liturgia)

O sistema das celebrações litúrgicas não constitui uma realidade estática e imóvel, mas
é permeado por uma grande vivacidade e dinamismo renovador. O longo e fecundo
movimento litúrgico , verdadeira passagem do Espírito Santo em sua Igreja (SC n. 43), a
reforma litúrgica conciliar e outros desenvolvimentos sucessivos, levaram a uma revisão
profunda da identidade da liturgia e a um alargamento de seus horizontes. Vale lembrar, de
forma sucinta, alguns aspectos significativos dessa renovação, como ponto de partida para o
aprofundamento das relações entre liturgia e catequese.

2.1 O impacto conciliar

É notória a obra de aprofundamento e de renovação que o movimento litúrgico,


primeiro, e a reflexão conciliar, em seguida, desenvolveram no que se refere à liturgia. Basta
lembrar os aspectos negativos que prevaleceram durante séculos: formalismo, liturgismo,
moralismo, clericalismo etc. Umas poucas vezes se recuperaram e revalorizaram aspectos
essenciais da liturgia: a dimensão histórico-salvífica, a centralidade cristológica (enquanto
celebração e presença do mistério pascal de Cristo), a perspectiva eclesial e escatológica.
Continua fecunda e eloquente a definição de liturgia presente no Concílio:
Justamente por isso a liturgia é entendida como o exercício do sacerdócio de Jesus Cristo;
nela, por meio de sinais sensíveis, se exprime e, de modo adequado, se realiza a santificação do
homem, e se exercita, pelo Corpo Místico de Jesus Cristo, isto é, pela Cabeça e por seus
membros, o culto público integral (SC n. 7).
O Concílio lembra que a liturgia é ação sacra por excelência (SC n. 7) e que, ainda
que não exaurindo a totalidade do agir eclesial (SC n. 9), representa o ápice para o qual
tende a ação da Igreja e, ao mesmo tempo, a fonte da qual deriva toda a sua virtude (culmen
et fons: SC n. 10). Não se poderia ressaltar melhor a centralidade da liturgia na experiência
cristã e eclesial.
Ora, para que esse papel central da liturgia não fique isolado e adquira um valor quase
absoluto na realidade eclesial, se requerem alguns aprofundamentos e desenvolvimentos que
interessam de forma especial à tarefa da catequese.

308
2.2 A liturgia, lugar da palavra e sinal da fé

Um primeiro aprofundamento diz respeito à relação entre liturgia e palavra. A teologia


litúrgica lançou luz sobre o papel essencial da palavra no sinal litúrgico, não como elemento
anterior ou acrescentado ao rito, mas como realidade constitutiva do próprio rito. Na liturgia,
que reflete a lei estrutural da revelação como acontecimento e como palavra (cf. DV n. 2),
requer-se sempre a palavra profética interpretativa para revelar no sinal a realidade salvífica
manifestada e realizada. Os sinais litúrgicos são ao mesmo tempo anúncio, lembrança,
promessa e pedido,8 mas só por meio da palavra esses seus significados múltiplos emergem.
A relação estreita entre liturgia e palavra se revela sobretudo nos sacramentos, cuja
forma é constituída pela palavra de fé (verbum fidei) que, encarnando-se nos ritos,
transforma-os em sacramentos ou verba incarnata em analogia com a encarnação de Cristo,
verbo ou Palavra de Deus.9 Assim, o ministério da palavra entra no próprio coração dos
sacramentos, fazendo que um ato ritual se torne manifestação misteriosa da ação de Cristo
que realiza a salvação.10
Mas igualmente importante é a relação entre liturgia e fé. A liturgia, que é sempre uma
palavra de fé da Igreja, só se torna eficaz e significativa se celebrada e vivida na fé. Com
efeito, é por meio da fé que o homem é justificado:

Como os antigos Padres foram salvos pela fé do Cristo vindouro, nós somos salvos pela fé no
Cristo nascido e crucificado. Ora, os sacramentos são determinados sinais que exprimem a
fé, pela qual o homem é justificado.11

8
Cf. C.Vagaggini, El sentido teologico de la liturgia: ensayo de liturgia general. Madri, BAC, 1969.
9
Accedit verbum ad elementum et fit sacramentum [A palavra se une ao elemento e este se torna
sacramento]: Santo Agostinho, in: Ev. Joh. Trac. 80, 3 (PL 35, 1840). Mais claramente ainda Santo Tomás:
[Os sacramentos] podem ser considerados do ponto de vista da causa santificante, que é a palavra encarnada: o
sacramento se lhe assemelha num certo sentido, uma vez que a palavra se une ao elemento sensível, da mesma
forma que no mistério da encarnação, o Verbo de Deus, se uniu à carne sensível : Summa Theol. III, q. 60, in c.
10
Cf. E. Schillebeeckx, Cristo, sacramento do encontro com Deus: estudo teológico sobre a salvação
mediante os sacramentos. Petrópolis, Vozes, 1967.
11
Santo Tomás, Summa Theol. III, q. 61, a. 4.
309
Isso quer dizer que a atitude de fé pertence, intrinsecamente, à realidade litúrgica e
sacramental. Como já observamos,

sacramento da fé .12

A fé não é algo externo ao sacramento, ela é parte constitutiva deste. Assim como não existe
verdadeira fé sem sacramento, porque não seria a fé proclamada pelos apóstolos, tampouco
13
existe sacramento sem fé, que não seria o sacramento desejado por Cristo.

Toda a atividade litúrgico-sacramental da Igreja se apresenta, pois, como uma oferta


gratuita de graça, como uma palavra interpelante que solicita a resposta de fé. Os
sacramentos tornam-se sinais eficazes da graça que salva enquanto exprimem a fé (signa
protestantia fidem).14 Está superada, portanto, toda visão automática e quase mágica da
liturgia (presente em tantos momentos da história); em vez disso, requer-se uma
participação plena, consciente e ativa (SC n. 14) e um processo de comunicação adequado.
São observações de grande importância para a práxis pastoral e para a compreensão da
relação estreita entre a liturgia e a catequese.
2.3 A revolução cristã do culto como liturgia da vida

Se a liturgia cristã se define como exercício do sacerdócio de Jesus Cristo (SC n. 7),
é bastante esclarecedor ressaltar-lhe o caráter original e único e recuperar, à sua luz, o
significado verdadeiramente revolucionário do culto cristão.
O sacerdócio de Cristo, como o prova a arta aos ebreus, representa uma
novidade radical em comparação às concepções do Antigo Testamento e pagãs do
sacerdócio. Na verdade, Jesus, que não pertence à classe sacerdotal hebraica, não exerce
um sacerdócio cultual e litúrgico mas, consagrado sacerdote desde a encarnação, oferece
toda a sua vida, e especialmente a sua morte e ressurreição, como sacrifício perfeito de
uma nova e eterna aliança. Esse sacerdócio não se realiza por meio de ritos ou oferendas
sacrificiais: o novo e definitivo sacrifício é o da vida entregue ao cumprimento da vontade
de Deus (cf. Hb 10,5- 7). No ministério pascal de Cristo, que é sacerdote, altar e vítima, se
consuma a plenitude do novo sacerdócio.15

12
J. M. R. Tillard, Le nuove prospettive della teologia sacramentaria , Sacra Doctrina (1967), n.45, p. 44.
13
D. Borobio, Da celebração à teologia: que é um sacramento? , in: D.Borobio (ed.), A celebração na
Igreja. São Paulo, Loyola, 1993.
14
Nesse contexto a expressão ex opere operato significa por virtude do Cristo Redentor (E.
Schillebeeckx, op. cit., p. 100-05), inequívoca, estável promessa da graça para o ser humano, feita por
Deus, de forma irrevogável, e que assim deve ser considerada (K. Rahner, Chiesa e sacramenti. Brescia,
Morcelliana, 1966, p. 33).
15
Cf C. J. Mateos, Cristiani in festa. Bolonha, Dehoniane, 1981, p. 94-113. Cristo, ao oferecer a si mesmo, pôs
fim ao culto do Antigo Testamento e ao seu regime de ritualismo exterior (Hb 10,9). Com efeito, seu sacrifício
não é uma realidade paralela a sua existência, mas assume a própria existência de seu ingresso no mundo
(10,5) até a morte na cruz (2,14; 12,2) : A. Vanhoye, Cristo è il nostro sacerdote, la dottrina del´epistola agli
ebrei. Turim, Marietti, 1970, p. 54.
310
Tornada povo sacerdotal por meio do Espírito, a Igreja participa da dignidade e da
novidade do sacerdócio de Cristo. Como o de Cristo, o seu é

o sacerdócio da vida, confiada aos homens por fidelidade a Deus; o seu lugar sagrado é o
mundo, o seu tempo sagrado é a história, iluminada pela esperança; a sua oferenda e o seu
sacerdócio é o homem, consagrado a Deus e ao próximo. A consagração se recebe no
batismo que une a Cristo, à sua morte e à sua vida; seu exercício é a vida inteira: alegria e
16
dor, festa ou trabalho.

É muito importante insistir na originalidade do culto cristão como culto espiritual e


oferta da vida (cf. Rm 12, 1-2), como o prova claramente a terminologia do Antigo
Testamento e a práxis dos primeiros cristãos. Estes preferiram ser chamados de ateus, e sem
culto , a falsear a novidade de seu sacerdócio. Tinham uma liturgia, mas expressa em
linguagem não cultual. Sua liturgia, seu culto era a própria vida oferecida em sacrifício.17
Ora, existe sempre o perigo de perder de vista esses traços originais e de se prender a uma
concepção cultual da liturgia:

Consideremos aqui o verdadeiro conceito de culto cristão: não pode ser separado da vida,
mas consiste na vida cristã. Esse conceito já o dissemos não é inato no homem, que
espontaneamente faz uma diferenciação entre culto e vida. Também os cristãos o fazem
espontaneamente. É necessária uma reeducação contínua para fazer entender que Cristo
mudou essa situação e que agora não existe culto autêntico exceto na oferta pessoal existencial.
O culto cristão não consiste em cerimônias, não consiste tampouco em sacramentos, consiste na
oferta da própria pessoa na vida concreta. Parece-me que devemos repetir isso muitas vezes,
para que entre nas mentes e nos corações de todos.18

Assim, se faz uma revisão do significado que continua central da vida litúrgica,
superando-se qualquer ênfase unilateral na dimensão cultual da experiência cristã. Se é
verdade que a liturgia é a fonte de toda iniciativa autêntica de caridade , 19 é a caridade que
garante a verdade da liturgia. Ela, como a Igreja, não constitui um fim em si mesma, mas
está ligada ao projeto do Reino na totalidade de suas realizações e valores. Desligada dessa
tensão essencial, separada da liturgia da vida, ela degenera facilmente em ritualismo e perde
sua função.

16
J. Mateos, Cristiani in festa, p. 110-11. Cf. A. Vanhoye, Cristo è il nostro sacerdote, p.55; id., Sacerdoti
antichi e nuovo sacerdote secondo il Nuovo Testamento. Leumann (Turim), Elledici, 1985.
17
Cf. S. Lyonnet, La nature du culte dans le Nouveau Testament , in: Vatican II: la liturgie après le
Vatican II. Paris, Cerf, 1967, p. 57-384; Y. Basurko - J. A. Goenaga, Originalidade no culto cristão , in: D.
Borobio (ed.), A celebração na Igreja. São Paulo, Loyola, 1993; L. Gallo, Uma Igreja a serviço dos homens:
contribuições para uma compreensão atual da Igreja. São Paulo, Salesiana, 1984.
18
A. Vanhoye, I due aspetti del sacerdozio cristiano , Presenza Pastorale 57 (1987), n.9/10, p. 968.
19
A. Fallico, Pedagogia pastorale, questa sconosciuta: itinerario di formazione per operatori pastorali
presbiteri, religiosi e laici. Catania, Chiesa-Mondo, 2000, p. 361.
311
2.4 A tarefa aberta da pastoral litúrgica

Hoje, a pastoral litúrgica conta com inegáveis conquistas, mas enfrenta


dificuldades e problemas. A obra conciliar contribuiu certamente para superar alguns
reducionismos ou degenerações herdadas do passado: a liturgia como cerimonial a ser
seguido, ou como culto ao qual se assiste passivamente, ou como fonte automática de
eficácia espiritual etc. Mas ainda estamos longe de ter eliminado esses e outros desvios. Em
parte se lamenta ainda um certo isolamento pastoral da liturgia, a persistência da mentalidade
clerical e liturgista mesmo em relação aos ritos reformados, a incapacidade de
comunicação e ling ística de muitas celebrações. Ao entusiasmo das novidades pós-
conciliares se seguiu um sentimento de desilusão, a sensação de que apenas em parte a
realidade correspondeu às esperanças que se acalentaram. Entre as causas que podem
explicar o fenômeno cumpre destacar pelo menos três:
A falta de uma catequese adequada. A todos os esforços de renovação dos ritos não
correspondeu uma catequese apropriada que lhes interiorizasse o significado e as
exigências. Assim, muitas mudanças se deram apenas na superfície, sem envolver o
nível das atitudes de fé.
Os limites da reforma litúrgica pós-conciliar. Em linhas gerais, pode-se dizer que
essa reforma representou antes uma obra de restauração (redescoberta e fruição da
liturgia do passado) que uma renovação criativa, no sentido de elaboração de uma
linguagem simbólica e celebrativa em sintonia com a cultura de hoje.20
Deficiências no modo de celebrar. Mesmo com suas limitações, a reforma da liturgia
deixa um amplo espaço de criatividade e de adaptação que em poucos casos foi usado
com inteligência e sentido pastoral. Além do parco conhecimento do espírito e da
estrutura da celebração, muitas vezes falta o diálogo com as ciências humanas da
comunicação e da linguagem, instrumentos essenciais para o desenvolvimento
adequado do dinamismo expressivo e simbólico da liturgia cristã.
Essas observações explicam a urgência e o alcance das tarefas sempre abertas da
pastoral litúrgica.21

20
A reforma afigura-se a muitos uma restauração hierárquica e clerical , para a qual contribuíram, em escala
indevida, as culturas extraeurop ias, o laicato e as ciências humanas : in: R. Lombardi, Catechesi e liturgia
nella reflessione pastorale italiana del periodo post-conciliare. Brescia, Morcelliana, 1982, p. 48.
21
Cf. Floristan, Pastoral litúrgica , in: D. Borobio (ed), A celebração na Igreja. São Paulo, Loyola,
1993.
312
3. EVANGELIZAÇÃO, CATEQUESE E LITURGIA

Essas observações nos ajudam a recolocar a liturgia no contexto da vida cristã de modo
a evitar que fique isolada ou que se lhe atribua um valor absoluto. Como se viu na análise do
panorama geral da ação pastoral da Igreja, a polarização litúrgico-sacramental da pastoral
tradicional está superada. Agora a ação pastoral se abre para o horizonte das opções
evangelizadoras. Vamos considerar agora a relação entre liturgia, evangelização e catequese.

3.1 Unidade profunda entre liturgia, caminho de fé e vida cristã

Um primeiro imperativo diz respeito à necessidade de recompor a unidade entre


dimensões complementares da vida cristã, que na história se separaram e quase se exauriram.
As experiências fortemente unitárias das comunidades apostólicas (cf. At 2,42-47) e do
antigo catecumenato, modelo de toda catequese,22 e a tradição dos Padres demonstram a
fecundidade de uma síntese vital entre celebração, escuta, profissão de fé e testemunho
cristão. Estes, longe de constituírem momentos isolados e quase independentes, são antes
uma experiência única e um fator de amadurecimento. Daí algumas observações importantes:

22
Cf. Mensagem do Sínodo de 1977, 8; CT n. 23. Cf. CNBB, Com adultos catequese adulta , n. 110 (Estudos
da CNBB n. 80).

313
Necessidade de reconstituir a unidade e a globalidade da experiência cristã, como
vida de comunidade e também como dinamismo de crescimento e de testemunho. A
vida de fé não pode privilegiar nenhuma de suas expressões em prejuízo das outras
(concentrando-se, por exemplo, no momento litúrgico-sacramental, no esforço
promocional, ou na dinâmica intracomunitária), mas deve garantir a presença dos
momentos essenciais da existência cristã: anúncio, serviço, celebração e comunhão.23
Necessidade de recolocar no centro a vida de fé-esperança-caridade. É nesse sentido
que se deve orientar a pastoral, principalmente em relação à prática sacramental. O
crescimento na fé, na esperança e no amor torna-se critério decisivo para resolver
muitos problemas ligados à pastoral sacramental: frequência dos sacramentos, idade
da iniciação, admissão aos sacramentos etc. Só uma celebração que deriva da fé e leva
à fé, ainda que de forma imperfeita, merece ser promovida pastoralmente. A pastoral
hoje exige que se busque, mais que o aumento do número dos praticantes , a
promoção dos verdadeiros crentes . Eis um verdadeiro desafio à arte e à criatividade
pastorais: transformar a frequente demanda de ritos (celebrações, devoções,
sacramentos) em demanda de fé, de que o rito deve ser expressão e estímulo.

23
Duchesnau insiste na necessidade de que os fiéis, além dos momentos propriamente litúrgicos, possam
também fazer experiência de vida comunitária, de compartilhamento, de ensino e de escuta etc. C. Duchesnau,
La celebrazione nella vita cristiana. Bolonha, Dehoniane, 1977, p. 130-131.
314
3.2 Dimensões evangelizadora e catequética da liturgia

A renovação teológica da liturgia revalorizou seu valor profético e magisterial.


Chamada por Pio XI o órgão mais importante do magistério ordinário da Igreja ,24 ela é
considerada, com razão, como verdadeira didascália da Igreja, veículo e expressão da fé,
órgão da Tradição,25 verdadeiro e próprio locus theologicus.26
A liturgia tem, portanto, uma importante função catequética (cf. SC n. 33). Enquanto
fonte primeira e indispensável do espírito cristão (cf. SC n. 14), ela pode ser chamada
catequese permanente da Igreja ,27 manancial inesgotável de catequese (RdC n. 113),
preciosa catequese em ação (RdC n. 114). Em virtude do famoso princípio lex credenti, lex
orandi, a liturgia contém, em forma expressiva e unitária, a globalidade da mensagem cristã
e é considerada como fonte da catequese.28 A reflexão catequética nela vê um grande
catecismo vivido, de grande riqueza e eficácia, com sua variedade de ritos, celebrações,
textos e acontecimentos: Toda a catequese está no missal. Trata-se apenas de saber
encontrá-la e principalmente transmiti-la às crianças, da mesma forma como a Igreja a
transmite a nós.29 A forma mais eficaz de pregação de uma verdade de fé é a de uma festa.30
Já lembramos que a palavra e a resposta de fé são elementos constitutivos do rito
litúrgico. Mas na realidade todo o conjunto da liturgia como ação celebrativa e simbólica
constitui uma linguagem global que manifesta a palavra de Deus e o acolhimento da fé:

O núcleo catequético da liturgia eucarística reside na confissão de fé, que se desdobra pela
leitura bíblica (proclamação), credo (profissão) e oração eucarística (doxologia), sem
31
esquecer que toda celebração é e deve ser expressão da fé .

24
Em uma audiência a D. Bernard Capelle, em 12 de dezembro de 1935. Cf. A. Bugnini, Documenta
pontificia ad instaurationem liturgiae spectantia (1903-1935). Roma, 1953, p.70-71.
25
Cf. C. Vagaggini, Il senso teologico della liturgia, cap. XVI.
26
Cf E.Schillebeeckx, La liturgie lieu théologique , in: id., Approches théologiques., 1: Révélation et
Théologie. Bruxelas-Paris, Ed. du Cerf, 1965, p. 187-90; I. H. Dalmais, La liturgie comme lieu théologique ,
La Maison-Dieu (1964), n. 78, p. 97-105.
27
I. H. Dalmais, A liturgia e o depósito da fé , in: Martimort, Aimé-Georges e outros, A Igreja em oração:
introdução à liturgia. Petrópolis, Vozes, 1992.
28
Cf. RdC n. 113; E. Alberich, Liturgia e catechesi. La sintesi del mistero cristiano offerta dalla liturgia ,
Orientamenti Pedagogici 13 (1966), n. 4, p. 691-713; J. López Martín, Liturgia y catequesis , Nuevo Dic. Cat.,
p. 1378-83.
29
F. Derkenne, Catéchisme et vie liturgique , La vie spirituelle 11 (1938), n. 230, p. 204. Cf. Brasil CR n. 89.
J. Colomb, Al servicio della fede. Vol. I. Leumann (Turim), Elledici, 1969, p. 119-125.
30
J. A. Jungmann, Catequética: finalidade e método do ensono religioso. São Paulo, Herder, 1967.
31
C. Floristan, Teologia práctica. Teoria y praxis de la acción pastoral. Salamanca, Sígueme, 1991, p. 491.
315
Em particular, a virtude catequética da liturgia se manifesta sobretudo:
na liturgia da palavra, momento privilegiado do diálogo entre Deus e seu povo, de
expressão de atitudes de fé: louvor, escuta, agradecimento, profissão. E aqui se reveste
de importância especial a leitura que a liturgia faz da Escritura através do lecionário;32
nos momentos de pregação ou homilia, realização da palavra de Deus;
nas orações principais dos ritos sacramentais que, sob a forma de memorial e de
invocação (anamnese e epíclese), oferecem sínteses densas e admiráveis de grande
valor catequético;
no quadro sacramental da iniciação, conjunto articulado de etapas e ritos para o
itinerário de fé dos cristãos;
nos itinerários e ritmos de conversão e de aprofundamento (ano litúrgico, tempos fortes,
festas e comemorações etc.) que constelam o caminho dos indivíduos e das
comunidades.
Pode-se dizer, portanto, que a liturgia tem um enorme potencial evangelizador e
catequético, ou antes, que ela própria é, sem perder a sua especificidade,33 uma forma
excelente de evangelização e de catequese.34 Mas não de forma automática e quase mágica:
para se tornar catequese em ação, a liturgia tem que percorrer um longo caminho de
renovação, de avaliação de suas linguagens simbólicas, de inculturação, seguindo as leis de
toda comunicação da fé válida e correta.35
A tarefa continua aberta e está bem longe de ter atingido os efeitos que seriam
desejáveis, e são muitos os fatores negativos que comprometem a transparência da palavra
litúrgica: símbolos obsoletos, ritos incompreensíveis, linguagem distante, falta de gosto,
improvisação etc. Do ponto de vista pastoral e catequético, a liturgia está bem longe de saber
aproveitar as suas potencialidades.

32
Cf. J. López Martín, Liturgia y catequesis, p. 1382.
33
Não tendo uma finalidade propriamente didática, a liturgia não visa a iluminar a inteligência nem expor
ideias ou raciocínios. Ela se vale dos recursos da intuição, da poesia, do sentimento : in: J. López Martín,
Liturgia y catequesis, p. 1383.
34
Isto, porém, não deve levar à instrumentalização da liturgia: A celebração não é simples ocasião de
evangelização, mas o próprio ato evangelizador celebrado sacramentalmente : in: C. Floristan, Teología
práctica, p. 490.
35
Cf. as observações de F. Lever a propósito da falta de comunicação na celebração da missa dominical:
in: F. Lever, La messa come comunicazione , Catechesi 49 (1980), n. 15, p. 3-22, e as advertências de C.
Floristan, La liturgia, luogo dell´educazione della fede , Concilium 20 (1984), n. 4, p. 648-61.
316
3.3 A catequese litúrgica
(a liturgia tem necessidade da catequese)

Nada do que se disse até aqui exclui o fato de que a liturgia necessita da obra prévia e
auxiliar da catequese, em função de sua estrutura ritual-simbólica, da riqueza expressiva de
seus sinais. O rito litúrgico não é portador apenas de seu significado natural ou espontâneo,
mas remete a uma história de salvação que é evocada, ilustrada e vivida.
A catequese, enquanto iniciação à vida eclesial, tem também a tarefa mistagógica de
educar para a liturgia,36 para que a celebração dos ritos cristãos seja expressão daquele
caminho de fé que lhe garante a verdade e autenticidade:

catequese, além de favorecer o conhecimento do significado da liturgia e dos


sacramentos, deve educar os discípulos de Jesus Cristo para a oração, o agradecimento, a
penitência, a súplica confiante, o sentido comunitário, a linguagem simbólica... , porque
tudo isso é necessário para que haja uma verdadeira vida litúrgica (DGC n. 85).

A catequese, a serviço da plena, consciente e ativa participação nas celebrações


litúrgicas" dos fiéis (SC n. 14; DGC n. 85), tem uma tarefa de ilustração e de iniciação que
lev aos diversos planos da realidade litúrgica:37

36
O princípio figura claramente nos documentos oficiais da catequese. Cf. por exemplo: DGC n. 85, 108; RdC
n. 113-17; EN n. 43; Puebla n. 926-931, 941, 989, 1005; CT n. 23. Cf. CNBB, Com adultos catequese adulta ,
n. 170 (Estudos da CNBB n. 80).
37
Seguimos aqui a distinção proposta por L. Della Torre, Evoluzione dell´esperienza liturgica , in: A. Abelli et
al., Chiesa in Italia: 1975-1978. Brescia, Morcelliana, 1978, p. 70.

317
No plano da celebração: uma vez que a liturgia é ação simbólica, a catequese deve
ser iniciação aos seus diversos ritos e formas de expressão.
No plano do mistério: sendo a liturgia ação significativa e rememorativa de
acontecimentos salvíficos, a catequese deve favorecer e ilustrar as experiências
bíblicas e eclesiais significadas pelos ritos.
No plano da existência: enquanto a liturgia é celebração de vida no espírito e de
existência salva no mundo, a catequese deve educar para as convicções e atitudes que
servem de base a essa vida: acolhimento, agradecimento, escuta, compromisso,
comunhão, responsabilidade etc.
Para cumprir essa sua função, a catequese recorre ao rico patrimônio que a própria
liturgia oferece, de modo que, compreendendo-o bem por meio dos ritos e das orações (per
ritus et preces) (SC n. 48), se torne possível o acesso ao mistério de fé professado pela
Igreja.38

3.4 A liturgia, referência essencial para a catequese


(a catequese tem necessidade da liturgia)

Se agora consideramos as exigências, os objetivos, a própria natureza da catequese, não


é difícil entender a importância de sua referência à liturgia, por sua própria tarefa essencial
de educação e amadurecimento da fé.

38
Cf. L. Della Torre, Catechesi e Liturgia: il punto di vista de um liturgista , Rivista di Pastorale
Liturgica 26 (1988), n. 149, p. 28-36.
318
3.4.1 O contexto litúrgico da catequese

A centralidade da liturgia na experiência de fé faz que a catequese, mesmo na


diversidade de suas realizações, encontre nela uma fonte de inspiração e de apoio, como
contexto celebrativo no qual se insere. A catequese normalmente se desenvolve no quadro do
ano litúrgico e associada ao conjunto dos sacramentos, ápice expressivo do próprio itinerário
de fé:

A catequese sempre se reporta aos sacramentos. [...] a vida sacramental se empobrece e logo se
torna um ritualismo vazio, se não se baseia em um sério conhecimento do significado dos
sacramentos. E a catequese se torna intelectualista se não adquirir vida na prática
sacramental (CT n. 23).

O processo de crescimento na fé é sempre estruturado sacramentalmente , ligado a


momentos celebrativos que lhe exprimem o significado profundo:
Professar a própria fé é dar-se conta de que o Pai chama, nomeia e torna a criatura humana
partícipe da própria vida por meio de seu Filho, no Espírito Santo: é a obra do batismo.

Professar a própria fé é permitir que o Senhor transforme um coração de pedra em um


coração de carne (cf Ez 36,26) em seu Espírito, para encontrar o amor do Pai: é aquilo
que se celebra no sacramento da reconciliação. Professar a própria fé é agradecer ao
Pai pelo Filho morto e ressuscitado no Espírito, na comunhão com os irmãos: é o que é
expresso na Eucaristia. Enfim, professar a própria fé é viver como Igreja do Espírito
que o Senhor nos

39
França (Texte de référence) 3.1.3. Sob essa luz se compreende o problema de uma sacramentalização muitas
vezes separada da confissão de fé (sacramentos de iniciação) e de uma iniciação ou reiniciação desligada dos
sacramentos (por exemplo: em algumas comunidades catecumenais ou neocatecumenais). Cf. A. Caprioli, Il
problema dell´iniziazione cristiana in Italia , in: G. Angelini et al., Iniciazione cristiana e immagine di Chiesa.
Leumann (Turim), Elledici, 1982, p. 220-44; D. Borobio, Proyecto de iniciación cristiana. Bilbao, Desclée de
Br., 1980, p. 208-20.
319
3.4.2 O símbolo e a celebração, formas privilegiadas de linguagem religiosa

Por outro lado, a catequese não pode prescindir da linguagem total da celebração e
do símbolo, uma vez que a dimensão celebrativo-simbólica pertence, intrinsecamente, ao
dinamismo do processo catequético. Algumas considerações podem reforçar a validade dessa
exigência:
A centralidade do símbolo
A liturgia utiliza abundantemente a linguagem simbólica. Ora, o símbolo é um recurso
expressivo fundamental na vida humana, especialmente no que se refere às experiências mais
profundas e significativas. Com efeito, ele pode ser definido como:
um sinal que, para além de seu significado imediato, condensa e exprime significados ricos,
complexos, efetivamente inexprimíveis por outras vias.40
Só por meio de símbolos ou gestos simbólicos se consegue exprimir e comunicar a
profundidade e a riqueza das experiências que envolvem toda a pessoa, alma e corpo,
consciência e subconsciência.41 O símbolo é, na verdade, a linguagem do mistério ,42
devido à sua carga evocadora e reveladora. É o veículo ideal, indispensável, para a expressão
e a comunicação da experiência religiosa. E nesse sentido a liturgia se torna um instrumento
privilegiado de comunicação catequética:
A liturgia pode se tornar, para a catequese, um manancial inesgotável de elementos
simbólicos ou de motivos concretos para iniciar os indivíduos nos aspectos do mistério de
Cristo e da Igreja e para promover a fé e a vida cristã.
A celebração e a festa
O outro elemento característico da liturgia, juntamente com o símbolo, é a linguagem
da celebração e da festa. Ora, a festa, com a celebração que constitui seu âmago, tem um
alcance antropológico fundamental que lhe consagra a importância no que diz respeito à
comunicação da fé. Celebração e festa têm um significado verdadeiramente essencial para a
vida das pessoas, dos grupos, dos povos. E estão fortemente ligadas ao desenvolvimento das
experiências religiosas.44

40
A. Fossion, Dieu toujours recommencé ssai sur la catéchèse contemporaine. Bruxelas, Lumen
Vitae/Novalis/Cerf/Labor et Fides, 1997, p. 100.
41
Cf. J. M. Castillo, La alternativa cristiana. Salamanca, Sígueme, 1978, p. 267.
42
A. Aubry, È finito il tempo della liturgia?, p. 108.
43
D. Sartore, Catechesi e liturgia , in: D. Sartore - A. M. Triacca (eds.), Nuovo Dizionario di Liturgia.
Cinisello Balsamo. Paoline, 1988, p. 228.
44
Cf. K. H. Schmitt, Erfolgreiche Katechese. Ermutigungen für die Praxis. Munique, Kösel, 2000, p.
92-98.
320
A celebração é, antes de tudo, afirmação dos valores. O ser humano tem necessidade da
celebração, da festa, desse tempo de destaque , para exprimir o significado e o valor
da vida, para afirmar as coisas que contam verdadeiramente (o amor, a amizade, a
família, a pátria, a salvação etc.).45 Toda vez que acontece algo importante ou que
se comemora um fato significativo, sente-se a necessidade de celebrá-lo. Daí o valor
pedagógico e catequético de todas as celebrações: elas são momentos privilegiados
para a afirmação e interiorização dos valores.
Além disso, a celebração e a festa respondem à exigência de viver a comunhão e a
pertença ao próprio grupo, à própria família, ao próprio povo. A festa é tempo de
encontro, de comunicação, de redescoberta das próprias raízes e da própria identidade
coletiva. Ela tem o objetivo de codificar no rito o fluido de comunhão que une os
membros de um grupo e de colocar as pessoas no âmago de uma tradição e de uma
história plenas de significado para elas próprias. Assim, a celebração e a festa têm
uma grande eficácia para a educação no sentido de pertença e para a dimensão
comunitária da vida.46
A celebração tem também um valor escatológico , enquanto anúncio e antecipação de
um futuro sonhado. Os gestos típicos da festa (roupas especiais, presentes, banquetes,
algum excesso, transgressão de algumas normas sociais etc.) são uma expressão
antecipada do mundo diverso, alternativo, que as pessoas desejam e sonham. Impõe-se
uma lógica diversa da ordinária: de todo modo se deseja proclamar o advento de um
mundo ideal desejado. E nesse sentido a celebração orienta e impele as pessoas rumo a
um futuro positivo e novo.
A celebração é também solicitação para um renovado compromisso operativo, que
guarda estreita relação com os valores e ideais vividos na festa. A evocação de
acontecimentos, pessoas e valores importantes traz consigo um forte estímulo para uma
ação pessoal e coletiva coerente. Nesse sentido, toda celebração autêntica encerra
um grande poder motivador, uma capacidade de fortalecimento moral para a realização
dos ideais comuns proclamados e vividos.

45
Cf. C. Duchesneau, La celebrazione nella vita cristiana, p. 50-53; J. Mateos, Cristianos en fiesta, p. 264-75.
46
Cf C. Duchesneau, La celebrazione nella vita cristiana, p. 53-58.
321
Em síntese, pode-se dizer que a celebração e a festa constituem um modo privilegiado de
proclamar os valores fundamentais da vida e seu sentido profundo, e por isso contêm um
forte componente promocional e educativo. E não apenas isso: por seu significado e
conteúdo, encerram sempre algo de religioso e podem constituir um excepcional veículo de
expressão religiosa.

3.4.3 Celebração e educação da fé

A linguagem ritual e simbólica da celebração encontra-se no coração da liturgia e da


piedade cristã. Nesse sentido as celebrações cristãs, especialmente as litúrgicas, encerram em
alto grau as potencialidades pedagógicas e pastorais que apontamos. Com efeito, elas são
expressão privilegiada de valores e acontecimentos decisivos para a vida (a história da
salvação, o mistério pascal de Cristo); constituem uma afirmação da identidade cristã e da
pertença eclesial; têm uma clara dimensão escatológica, enquanto anúncio e antecipação do
futuro prometido por Deus; e compreendem também uma dimensão de compromisso e um
vigoroso apelo ético.
É fácil constatar a afinidade que existe entre a tarefa da catequese e as virtudes
pedagógicas das celebrações cristãs. A ligação estreita que existe entre experiência, valores e
celebrações nos permite formular uma espécie de lei estrutural da comunicação religiosa:
aquilo que não é celebrado não pode ser apreendido em sua profundidade e em seu
significado para a vida. Também a fé, para que se torne experiência significativa e
interpretativa da existência, precisa ser celebrada (DGC n. 84). Portanto, a catequese não
pode negligenciar os momentos celebrativos e rituais: sem celebração da fé não existe
comunicação nem amadurecimento da fé.
As virtudes pedagógicas da celebração contribuem para que se atinjam os mais
importantes objetivos catequéticos: interiorização das atitudes de fé, esperança e amor,
amadurecimento do sensus ecclesiae, educação para o compromisso cristão na Igreja e na
sociedade. Assim, a catequese é convidada a introduzir organicamente a dimensão
celebrativa em suas manifestações. E isso pode ocorrer e ocorre de várias formas: ritos
litúrgicos, celebrações ad hoc, paraliturgia, ritualizações, momentos de prece etc. Muitos
itinerários catequéticos incluem no próprio processo o momento celebrativo como
componente essencial, no interior das diversas seq ências operativas, como, por exemplo, na
conhecida versão ampliada do método da revisão de vida: ver, julgar, agir e celebrar.47
Uma última observação: a catequese tem, sim, uma dimensão litúrgica, mas isso não
significa que todo processo catequético deva ter necessariamente um estilo ou um andamento
de tipo litúrgico. Não existe apenas a catequese litúrgica: existem muitas possibilidades de
comunicação autêntica da fé no desenvolvimento da ação catequética: o diálogo, o ensino, a
reflexão em grupo, a discussão, a leitura de documentos etc. Ressaltar a importância da
relação entre liturgia e catequese não significa dar uma importância absoluta à linguagem
litúrgica nem restringir indevidamente as modalidades expressivas da comunicação religiosa.

47
É o itinerário metodológico utilizado com muita frequência na América Latina, especialmente no Brasil. Cf.
Grecat-Grupo Nacional de Reflexão de Catequese, Textos e manuais de catequese: elaboração, análise, avaliação.
São Paulo, Paulinas, 1987, p. 124.
322
SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS

Sobre o tema das relações entre catequese e liturgia, destacamos, na vasta bibliografia
existente, as seguintes obras:
ALDAZABAL, L. Preguntas a la catequesis desde la liturgia . Actualidad Catequética (1981),
n. 102-103, p. 71-82.
ALVAREZ GONZALEZ, L. F. Celebración cristiana y catequesis. Madri, CCS, 1987.
Catéchèse et Liturgie . La Maison-Dieu 140 (1979).
ALVES DE LIMA, L. Evangelização, catequese e liturgia . Revista Rogate 19 (2000), n. 181, p.
12-18.
. A celebração do ministério cristão no Catecismo da Igreja Católica . Revista de
Catequese 16 (1993), n. 62, 3-22, publicado também como Celebracion del misterio
cristiano en el Catecismo de la Iglesia Catolica . Medellín 19 (1993), n. 76, p. 533- 56.

CANSI, B. A dimensão sociopolítica da liturgia . Revista de Catequese 14 (1991), n. 55, p. 28-


37.
. Inculturação, liturgia e catequese . Revista de Catequese 13 (1990), n. 49, p. 6-17.

CNBB. Animação da vida litúrgica no Brasil. São Paulo, Paulinas, 1989 (Documentos da CNBB
n. 43).
DELLA TORRE, L. Catechesi e Liturgia: punto di vista di un liturgista . Rivista di Pastorale
Liturgica 26 (1988), n. 149, p. 21-39.
FLORISTÁN, C. A liturgia lugar de educação da fé . Concilium 194 (1984/4), p. 73-83 [501-
511].
LEVER, F. Comunicação e liturgia . Revista de Catequese 12 (1989), n. 45, p. 35-52.
LIMA JÚNIOR, J. A liturgia como lugar de Catequese . Revista de Catequese 6 (1983), n. 22,
p. 7-16.

323
Liturgia catechesi spiritualità . Rivista di Pastorale Liturgica 26 (1988), n. 149, p. 3-73.
Liturgia e catechesi . Rivista Liturgica 72 (1985), n. 1.
Liturgia y catequesis . Phase 20(1980), n. 118.
Liturgie: den Glauben feiern . Katechetische Blätter 109 (1984), n. 10.
LOMBARDI, R. Catechesi e liturgia nella riflessione pastorale italiana del periodo post-
conciliare. Brescia, Morcelliana, 1982.
LÓPEZ MARTÍN, J. Liturgia y catequesis . Nuevo Dic. Cat., p. 1369-88.
LUTZ, G. A liturgia no documento Catequese renovada . Revista de Catequese 7 (1984), n.
25, p. 32-42.
MALDONADO, L. Celebrar. Reflexiones para un diálogo entre catequistas y liturgistas .
Teología y catequesis (1988), n. 26-27, p. 463-75.
PASQUATO, O. Rapporto tra catechesi e liturgia nella tradizione biblica e patristica . Rivista
Liturgica 72 (1985), n. 1, p. 39-73.
REGIONAL SUL 3I-SETOR DE LITURGIA. Relatório do seminário de liturgia e catequese .
Revista de Catequese 25 (2002), n. 98, p. 59-63.
ROUET, A. Catéchèse et liturgie: radiographie d´un débat insuffisant . La Maison-Dieu n. 140
(1979), p. 7-23.
SARTORE, D. Catechesi e liturgia . In: SARTORE, D. - TRIACCA, A. M. (eds.). Nuovo
Dizionario di Liturgia. Cinisello Balsamo, Paoline, 1988, p. 219-31.
SAUER, R. Die Kunst, Gott zu feiern. Liturgie wiederentdecken und einüben. Munique, Kösel,
1996.
VENTURI, G. F. Liturgia e catechesi: prassi e riflessione di un decennio . Rivista Liturgica 72
(1985), n. 1, p. 7-38.

324
Capítulo 10
Rumo a uma Catequese em ato:
a Perspectiva metodológica
Depois de ter examinado a identidade da catequese e seu

sos propriamente metodológicos.

1. O PROBLEMA DO MÉTODO CATEQUÉTICO

Não cabe apenas perguntar qual ou quais métodos se devem usar, mas muitas vezes
surgem perplexidades no que se refere ao próprio significado do método e sua função precisa
no conjunto do processo catequético, principalmente em relação ao conteúdo. Sobre esse
ponto existem algumas questões abertas e questões a esclarecer.

1.1 A banalização do problema do método

É bastante comum subestimar o método em relação ao conteúdo. Pensa-se que, no


fundo, o que interessa à catequese é a mensagem a transmitir, ao passo que as questões
metodológicas (programação do roteiro catequético, escolha e articulação dos conteúdos,
linguagem a ser usada, técnicas e subsídios práticos etc.) são coisas secundárias, de
importância relativa, problemas meramente práticos .
Essa mentalidade logicamente se reflete na formação dos catequistas e dos pastores. O
que importa é o que se pensa é uma boa formação teológica, que garanta o pleno
domínio dos conteúdos. Os problemas metodológicos, de importância secundária, ficam por
conta de um complemento de programa qualquer ou simplesmente da experiência prática. E
o mesmo vale para o planejamento da catequese ou para a preparação de catecismos e
documentos catequéticos, geralmente confiados a teólogos ou biblicistas. De acordo como
esse modo de pensar estão o empirismo e a improvisação com que muitas vezes se enfrentam
os problemas de método na catequese. Em muitas paróquias e comunidades desenvolve-se a
catequese de modo consuetudinário e improvisado, sem um sério esforço de reflexão e de
planejamento.

325
1.2. A contraposição entre conteúdo e método

É fácil cair no dualismo conteúdo-método , com reducionismos num ou noutro


sentido (DGC n. 30).
O problema da relação entre conteúdo e método sempre aflora ao longo da história da
catequese. Muitas vezes o campo se divide entre os que defendem o conteúdo e os que
insistem na importância do método, uma polarização que não raro reflete a divisão entre
teólogos e catequistas, entre dogmáticos e pedagogos, entre vértice e base eclesial. Os
primeiros, sobretudo teólogos e pastores, insistem no primado do conteúdo e na exigência de
integridade e sistematicidade da mensagem a ser transmitida, e reprovam os segundos,
catequistas e pedagogos, pela ênfase excessiva que dão às exigências metodológicas da
catequese, comprometendo a sua identidade e a fidelidade à mensagem.
O conhecido princípio da fidelidade a Deus e fidelidade ao homem 1 por vezes é
invocado em referência ao método, como se este, expressão da fidelidade ao homem ,
comprometesse a devida fidelidade a Deus . Ou então se divisa, na preocupação
metodológica (ou pedagógico-antropológica ) um perigo a ameaçar a integridade e a
ortodoxia da mensagem. Recorde-se, por exemplo, a severa acusação de J. Ratzinger,
formulada em 1983, a propósito do movimento catequético pós-conciliar:

O primeiro e grave erro foi suprimir o catecismo e declarar ultrapassado o próprio modelo do
catecismo. [...] O que estava por trás dessa decisão errada, apressada e generalizada? As razões
são diversas e, até hoje, não foram suficientemente analisadas. Mas em primeiro lugar devemos
relacionar essa decisão com a evolução geral do ensino e da pedagogia, caracterizada
por uma hipertrofia do método em contraposição aos conteúdos das diversas disciplinas. Os
métodos se tornam critério do conteúdo, mais que o veículo.2

1
Cf. DGC n. 145; RdC n. 160; CT n. 55. Brasil CR n. 78-81; 174 (título e subtítulos); CNBB, Formação
de catequistas, n. 111; p. 112-147 (Estudos da CNBB n. 59).
326
1.3 A radicalização da originalidade do método catequético

Por vezes se destaca de tal forma a originalidade do método catequético


formas de ensino e de comunicação que se tem a impressão de ser ele inacessível a
qualquer tentativa de aproximação racional ou científica. Insiste-se de tal modo no caráter
sobrenatural do crescimento na fé que se exclui, na prática, todo recurso às mediações
metodológicas humanas. Ou então se invoca a pedagogia de Deus , a pedagogia divina , de
modo a tornar sem eficácia todo recurso a instâncias pedagógicas profanas.
Em outros casos se exalta o caráter de arte , contraposto à ciência , da competência
catequética, subestimando-se o esforço de preparação metodológica dos agentes da
catequese. A história da catequese no século XX já teve ocasião de assistir, e mesmo de
forma clamorosa, à explosão de tensões e polêmicas ligadas a esse problema.3

2. A DIMENSÃO METODOLÓGICA NO CENTRO DA CATEQUESE

As observações feitas exigem um esclarecimento sobre a dimensão metodológica do


trabalho catequético. Antes de se perguntar que métodos devem ser usados na catequese,
cumpre precisar o próprio significado e a função do método no planejamento catequético.
Assim se verá a posição da dimensão metodológica na competência catequética, em geral, e
na formação dos catequistas e dos pastores, em particular.

2
J. Ratzinger, Trasmissione della fede e fonti della fede. Casale Monferrato, Piemme, 1985, p. 7-8. Ver também
DGC n. 30.
3
Recorde-se, por exemplo, a discussão em torno do método de Munique , no início do século XX, acusado de
infidelidade aos princípios da fé e do dogma, e a crise do movimento catequético francês à época do
catéchisme progressif de J. Colomb, na década de 1950. Cf. E. Alberich, La catequética entre pedagogía y
teología: ambivalencia de una disciplina en búsqueda de reconocimiento , in: J. M. Prellezo (ed.),
L´impegno dell´educare: studi in onore di Pietro Braido. Roma, LAS, 1991, p. 222-24.
327
2.1 Para um esclarecimento do conceito de método catequético

Convém deixar claro, antes de tudo, o que se entende por método, na catequese. Na
verdade, o termo normalmente é usado com significados bem diversos, o que gera não
poucas confusões. Podem-se distinguir pelo menos quatro desses significados, habitualmente
presentes no âmbito teórico e prático da atividade catequética:4
a) Método como roteiro global de planejamento e realização da catequese, segundo a
proverbial divisão dos momentos: cognitivo (conhecimento da situação), interpretativo
(análise e avaliação), momento de planejamento, realização e avaliação. Assim concebido, o
método reúne todos os elementos constitutivos do processo catequético, inclusive os
conteúdos a serem transmitidos.
b) Método como modelo catequético particular, concebido como sistema estruturado
por fatores pessoais, conteudísticos, operativos e estruturais, dinamicamente organizados
com vistas a alcançar determinados fins catequéticos. Alguns exemplos: o método do
catecumenato , o método dos centros de escuta , o método da catequese familiar latino-
americana etc. Também nessa acepção, o método compreende as escolhas referentes ao
conteúdo.
c) Método como seq ência de intervenções operativas no interior de um projeto de
catequese, tendo em vista determinados objetivos e a transmissão dos conteúdos escolhidos.
Por exemplo: o método de Munique ou dos graus formais; o método da révision de vie
(ver, julgar, agir) etc.
d) Método como emprego de determinadas técnicas ou instrumentos na comunicação
catequética. É assim que, de forma algo imprópria, são chamados de método , por exemplo,
a dinâmica de grupo, a mímica, a fotolinguagem, o estudo de textos, o uso de montagem
audiovisual, e outros semelhantes.
Excetuando-se a última acepção (d), parcial e inadequada, parece legítimo chamar de
método às outras três. Na terceira (c), o método se distingue dos conteúdos e objetivos da
ação catequética, ainda que entre esses elementos exista uma relação de interdependência.
Em contrapartida, se falamos de método no sentido primeiro (a) e segundo (b), salta aos
olhos a impossibilidade de distinguir ou contrapor método a conteúdo, uma vez que o
método compreende necessariamente o conteúdo.5

4
Note-se os dois sentidos de método de que fala o estudo: Textos e manuais de catequese (n. 119), e a
observação do n. 120: Sem desprezarmos os aspectos da metodologia catequética, é tempo de incorporarmos
decididamente, na teoria e também na prática, suas exigências sociopolíticas. Trata-se de ajudar os cristãos a
realizarem progressivamente sua opção por Jesus Cristo, vivendo seu compromisso pastoral e seu engajamento
político, dentro do processo de conversão do homem e da sociedade (CNBB-Linha 3, Textos e manuais de
catequese . São Paulo, Paulinas, 1987, n. 120 [Estudos da CNBB n. 53]).
5
O documento brasileiro Textos e manuais de Catequese aprofunda melhor o que havia sido dito em CR sobre
as atividades educativas da fé (cf. Brasil CR, p. 156-58). Começa afirmando que elemento metodológico
importante da catequese são as atividades: vivências educativas planejadas em vista de determinadas
transformações (n. 126). A seguir fala das atividades educativas (pedagógicas), tanto as tradicionais como as
renovadas (n. 127). Dentre estas últimas sobressaem as ações transformadoras (n. 128). Elas se constituem na
grande novidade de CR e são assim descritas: As ações transformadoras são inspiradas pela experiência de
Deus na caminhada da comunidade. Educam evangelicamente para as mudanças no ambiente que a nossa fé
exige e inspira. Para deixar isto bem claro, convém chamá-las Ações evangélico-transformadoras (n. 129).
O texto a seguir aprofunda este conceito metodológico (n. 130-36). Cf. também os n. 187-95 onde se
fala do roteiro de ações evangélico-transformadoras .
328
2.2 Caráter metodológico da abordagem catequética

Ao se refletir sobre a natureza da catequese, forçoso é afirmar que a abordagem


catequética é essencialmente praxiológica e, portanto, também metodológica, à medida que a
perspectiva do método se encontra no centro do próprio problema da mediação catequética.
Com efeito, a catequese se configura essencialmente como ação, e precisamente que
diz respeito a: educação, comunicação, ensino, iniciação. Assim, sua realização se configura
como processo pedagógico, didático, mistagógico. Torna-se fundamental a perspectiva
metodológica, isto é, as considerações de como os diversos fatores e condicionamentos se
organizam e se mobilizam para que a ação catequética se desenvolva e atinja seus objetivos:

Na catequética, não se deve separar o estudo do objeto da fé (fides quae creditur) da


consideração de suas condições de enunciação, transmissão e apropriação (fides qua
creditur) no campo da comunicação humana e, portanto, da procura do melhor savoir faire
comunicativo para garantir a comunicação da fé no interior de uma determinada cultura. Assim,
diz Jacques Audinet a propósito disso, é a articulação do saber e do saber-fazer que nos parece
6
constituir a originalidade da reflexão catequética .

Entre os fatores determinantes da catequese encontra-se certamente a transmissão fiel


dos conteúdos da fé, mas essa exigência não anda separada do processo catequético global,
que é bem mais complexo e envolvente. É por isso que a disciplina catequética , reflexão
sistemática e científica sobre a ação catequética, assume um caráter de abordagem
verdadeiramente metodológica.7

6
A. Fossion, La catéchèse dans le champ de la communication: ses enjeux pour l´inculturation de la foi. Paris,
Cerf, 1990, p. 492.
7
Cf. J. Gevaert, Studiare catechetica. 4ª ed. Roma UPS-FSE-Istituto di Catechetica 1999, p.20-21; G. Stachel,
Catechetica , Diz.Cat., p. 110-11.
329
2.3 Pela superação da tensão conteúdo-método

O princípio da fidelidade a Deus e fidelidade ao homem faz que se evite toda


contraposição, separação artificial ou pretensa neutralidade entre método e conteúdo,
afirmando antes sua necessária correlação e interação (DGC n. 149).
Já a distinção dos diversos significados do método na catequese nos permitiu ver a
necessária inter-relação existente entre conteúdo e método na ação catequética. E não só isso:
vimos que muitas vezes o método encerra também o conteúdo.
Uma reflexão adequada sobre a identidade e as tarefas da catequese leva à superação
de toda contraposição artificial entre método e conteúdo. Como vimos, a catequese é
essencialmente comunicação experiencial significativa,8 e enquanto tal tem como conte do
a própria riqueza e complexidade da experiência cristã ao fazer-se presente em pessoas
concretas no aqui e agora das situações.
E mais: a palavra de Deus, objeto da comunicação catequética, não existe em estado
puro, mas sempre e necessariamente encarnada em uma história e em uma cultura. Nesse
sentido, a linguagem e as outras mediações da comunicação não são o revestimento externo
de um conteúdo preexistente, mas elementos constitutivos da própria comunicação. Cumpre
dizer que, na catequese, o método também faz parte do conteúdo, e que o conteúdo também
faz parte do método. Assim, não é possível desvincular o problema metodológico da
preocupação com o conteúdo.
Um bom método catequético é garantia de fidelidade ao conteúdo (DGC n. 149). Se,
por vezes, o conteúdo da catequese se vê falseado ou comprometido, isso não se deve à
importância dada ao método, mas a uma formulação incorreta do problema metodológico.

8
Ver cap. 4, n. 4.5. neste sentido Textos e manuais de catequese afirma: O traço metodológico fundamental de
CR, a interação na comunidade entre vivência e formulação da fé , deve estar presente também nos textos.
Não basta que eles informem. Eles deverão favorecer a confrontação entre formulações da fé e
experiência de vida, bem como encaminhar a vida comunitária, a ação, a celebração dos ministérios
salvíficos e o processo de continuidade em tudo is o (CNBB-Linha 3, Textos e manuais de catequese, n. 121).

330
2.4 Pedagogia divina e catequese

Na catequese invoca-se o primado da pedagogia da fé (CT n. 58), ou da pedagogia de


Deus (DGC n. 143). E se ressalta também sua originalidade e transcendência:

Quando se fala da pedagogia da fé, não se trata de transmitir um saber humano, ainda que
seja o mais elevado; trata-se de comunicar, em sua integridade, a Revelação de Deus. Ora, o
próprio Deus, no curso da história sagrada e sobretudo no Evangelho, usou uma pedagogia, que
deve servir como modelo para a pedagogia da fé. Na catequese, uma técnica só tem valor à
medida que se põe a serviço da transmissão da fé e da educação para a fé; caso contrário, não
tem nenhum valor (CT n. 58).

Essa pedagogia divina tem alguns traços característicos: a encarnação, o caráter


progressivo, a adequação às pessoas, a centralidade de Cristo, o primado da relação
interpessoal, a pedagogia dos sinais etc.9 Observe-se, porém, que apenas analogicamente é
possível falar de métodos catequéticos revelados. 10 Se existe uma pedagogia original da fé
(DGC n. 144), isso não diminui o significado da mediação humana nem permite ignorar as
indicações metodológicas das ciências da educação.11 A mediação pedagógica é sempre
fundamental, ainda que seja necessariamente repensada nas coordenadas específicas do ato
catequético:

A metodologia catequética tem por objetivo único a educação para a fé; vale-se das ciências
pedagógicas e da comunicação aplicadas à catequese; leva em conta os numerosos e notáveis
12
avanços da catequética contemporânea.

3. QUE MÉTODO USAR NA CATEQUESE?

Na raiz do problema do método catequético existe uma premissa fundamental, aliás


comum a todo o campo da teologia pastoral ou prática: a superação do dedutivismo
metodológico, isto é, da concepção que pretende deduzir diretamente da teoria orientações
referentes à prática. Em vez disso, a metodologia pastoral é concebida como reflexão sobre
a práxis , como esforço para interpretar e avaliar o efeito da ação, tendo em vista o seu
aperfeiçoamento. Nessa perspectiva, consideremos agora os diversos significados do método
a que nos referimos já anteriormente.

9
Cf. DGC n. 143. Em México GP n. 119-121 encontra-se uma sugestiva apresentação da pedagogia divina. Cf.
também R. Mendes de Oliveira, A pedagogia da fé no Diretório Geral para a Catequese , Revista de Catequese
22 (1999), n. 88, p. 23-29.
10
Cf. C. Bissoli, Pedagogia di Dio , Diz.Cat., p. 494.
11
C. Bissoli, ibidem. Cf. do mesmo autor: Bibbia ed educazione. Roma, LAS, 1981. Cf. também I. J. Nery,
Pedagogia catequética segundo a Bíblia , Revista de Catequese 5 (1982), n. 17, p. 48-52.
12
DGC n. 148. Com efeito, pode-se reconhecer uma originalidade da pedagogia da fé, não porque ela seja
substancialmente diversa da pedagogia profana, mas no sentido de que o uso que ela faz do conjunto dos
recursos pedagógicos é iluminado pela fé e determinado pelas finalidades da catequese : A. Fossion, La
catéchèse dans le champ de la communication, p.417.
331
3.1 O itinerário global do PLANEJAMENTO CATEQUÉTICO

O problema metodológico da catequese refere-se, principalmente, à necessidade de um


planejamento cuidadoso, superando frequentes atitudes de improvisação ou de empirismo
pastoral. É preciso partir daí para chegar a um equacionamento sério do problema do método.

3.1.1 A passagem do empirismo à racionalidade

Trata-se da primeira exigência ligada ao tema do planejamento. A competência


catequética, assim como a pedagógica, é ao mesmo tempo arte e ciência, fruto não apenas da
racionalidade, mas também da intuição, do talento pessoal, da experiência. Mas, sem
diminuir a importância desses fatores, é necessário também insistir na necessidade de superar
muitas formas de improvisação e de empirismo na realização da obra catequética,
introduzindo, tanto quanto possível, a racionalidade e o espírito crítico.
Evidentemente, nem tudo é possível nessa área, mas muitos momentos e aspectos do
percurso da atuação catequética comportam o uso de instrumentos científicos: técnicas e
levantamentos sociológicos; conhecimentos teológicos, históricos, antropológicos; perspectivas
culturais de interpretação; procedimentos didáticos e educativos; instrumentos de controle
e de avaliação etc.13 E num contexto de planejamento todos esses elementos encontram
seu próprio lugar e realização.

3.1.2 A passagem do programa (ou do texto) à programação

Aquilo que se diz no campo didático14 vale também, feitas as adaptações devidas, para
a catequese: a necessidade de passar do programa à programação. Quando se fala de
programação entende-se um certo uso da racionalidade e possibilidade de verificação na
prática. Se outrora a tarefa do catequista se ligava ao programa a desenvolver ou ao texto a
explicar, hoje, numa visão mais articulada, impõe-se o hábito da programação como método
de base para o equacionamento da ação catequética. E falar em programação significa evocar
um processo articulado que aponta, em todas as situações, para uma revisão e organização da
ação em benefício de pessoas concretas e em contextos bem determinados.

13
Cf. G. Stachel, loc. cit.; A. Fossion, op. cit., p. 476.
14
Cf. M. Pellerey, Programmazione educativa/scolastica , Diz. Cat. Ed., p. 866.
332
ITINERÁRIO METODOLÓGICO CATEQUÉTICO

1. MOMENTO COGNITIVO
(observação-conhecimento da situação inicial):
A ação inicial (práxis catequética já existente).
O contexto ou ambiente histórico, cultural, político, social, psicológico, econômico,
religioso.
As pessoas que participam, das mais diversas formas.
As relações: papéis, grupos, comunicação, tensões.
As instituições: sociais, políticas, educacionais, culturais, religiosas.

2. MOMENTO INTERPRETATIVO
(análise-interpretação-problematização da situação):
Análise-interpretação-problematização do contexto pessoal e ambiental.
Análise-interpretação-problematização da ação inicial.

3. MOMENTO DE PLANEJAMENTO e de PROGRAMAÇÃO


(planejamento-programação da ação catequética):
Busca e formulação dos OBJETIVOS (gerais, parciais, intermediários).
Escolha do MODELO ou MÉTODO CATEQUÉTICO GLOBAL.
Seleção e organização dos CONTEÚDOS (bíblicos, eclesiais, experienciais).
Escolha do método ou sequência de INTERVENÇÕES OPERATIVAS (ou
experiências de aprendizagem).
Escolha e determinação de ESTRUTURAS (individuais, grupais, comunitárias),
TÉCNICAS, INSTRUMENTOS E MATERIAIS (livros, documentos, audiovisuais etc.).
Programação da EXECUÇÃO ou REALIZAÇÃO do projeto:
Determinação, escolha e preparação (formação) dos agentes e colaboradores.
Determinação dos prazos e modalidades de atuação.
Sensibilização do ambiente.
Aspectos organizacionais e financeiros.
Programação da verificação ou avaliação.

4. MOMENTO OPERATIVO
(experimentação e) realização do projeto

5. MOMENTO DE AVALIAÇÃO
verificação e avaliação da realização do projeto

6. MOMENTO DE REPLANEJAMENTO
retomada do roteiro metodológico para a modificação ou aperfeiçoamento
daquilo que se pôs em prática.

333
3.1.3 O itinerário do planejamento e programação da catequese

Na perspectiva metodológica da reflexão sobre a práxis, o planejamento e a


programação da ação catequética deveriam prever, de um ou de outro modo, o
desenvolvimento destes momentos ou etapas:15
1. Momento cognitivo: observação atenta da situação inicial, constituída pela ação
catequética existente (quando é o caso) e pelo contexto no qual a nova atividade deve
ser desenvolvida: ambiente, contexto social, cultural, político, religioso; situação
concreta das pessoas envolvidas: exigências, problemas, expectativas. Dessa análise
deve resultar um quadro inicial da situação de aprendizagem e uma primeira
formulação da demanda operativa.
2. Momento interpretativo: avaliação e discernimento, pesquisa das causas e dos
significados, problematização e interpretação da demanda operativa. É um momento
fundamentalmente hermenêutico e crítico, que leva à transformação da demanda e ao
diagnóstico das necessidades e urgências relativas à ação.
A importância desse momento não deve ser subestimada. Não é possível deduzir
diretamente do conhecimento da situação indicações operativas sem um esforço prévio de
interpretação e avaliação problematizadora. Isso quer dizer que os elementos da situação: a
práxis existente, o ambiente, as pessoas, as relações, as instituições são analisados e
avaliados em um esforço de busca de significados, de determinação de relações e causas, de
valores, positivos e negativos. Assim se poderá chegar a uma determinada escolha de
campo e a uma tomada de consciência mais iluminada ( conscientização ) que implicará
um esclarecimento e uma eventual modificação da demanda operativa .
3. Momento de planejamento e programação: elaboração de um projeto realista
coerente, que inclui: finalidades e objetivos a serem atingidos (gerais e particulares);
escolha do modelo catequético global; determinação dos conteúdos; processos
operativos ou seq ência de aprendizagem; escolha das técnicas, dos meios e materiais
necessários etc. Programa-se também a realização concreta do projeto (dividindo-o em
etapas) e a sua avaliação.

15
O itinerário apresentado apoia-se largamente no que é utilizado no campo pedagógico-didático e no campo da
teologia prática: cf. M. Pellerey, Progettazione educativa/didattica , Diz. Sc. Ed., p. 863-65; M. Midali,
Teologia pastorale o pratica.. 2ª ed. Roma, LAS, 1991, p.576-95; J. G. Nadeau (ed.), La praxéoligie
pastorale: orientations et parcours. 2 vols. Montreal, Fides, 1987. Embora os termos planejamento e
programação muitas vezes sejam usados como sinônimos, aqui consideramos o segundo como momento de
organização e realização dentro do planejamento. Cf. M. Pellerey, loc. cit., p. 864.

334
4. Momento operativo: finalmente, põe-se em prática a ação programada, segundo os
elementos, etapas e recursos previstos.
5. Momento de avaliação: utilização dos instrumentos ou técnicas apropriados para
avaliar o caminho percorrido e dar novo impulso ou rever o projeto, tendo em vista
uma execução mais satisfatória.
6. Momento de replanejamento: reabre-se o círculo reflexão-ação e se revê o projeto,
em vista de um novo projeto de ação mais aperfeiçoado.
Não estamos dizendo que sempre e em todos os casos seja necessário seguir ponto por
ponto as etapas desse roteiro. Trata-se de um esquema básico que comporta, naturalmente,
vários tipos de adaptação, de andamentos, com muitas variantes e especificações particulares.
Parece-nos que o importante é apreender-lhe a lógica subjacente, a necessidade expressa de
um planejamento ponderado e conjuntural da ação catequética, respeitando-lhe todos os
componentes, de forma encarnada e ligada à realidade. É importante também, ao longo do
planejamento, saber adotar as abordagens, as técnicas, os instrumentos científicos que
permitam levar adiante de forma não empírica esse itinerário metodológico catequético.

3.2 A escolha do MODELO OU MÉTODO CATEQUÉTICO GLOBAL

No roteiro metodológico proposto prevê-se, dentro do momento de planejamento e


depois da formulação das finalidades e objetivos, a escolha do modelo ou
projeto catequético global . Temos assim um segundo nível de resposta ao problema
metodológico da catequese. Como já dissemos, entende-se por modelo catequético
global : um sistema estruturado por fatores pessoais, relacionais, conteudísticos,
operativos e estruturais, dinamicamente organizados com vistas a alcançar determinadas
finalidades catequéticas.
A escolha do modelo permitirá identificar e caracterizar melhor a ação catequética
planejada. Falando em termos gerais, parece-nos possível distinguir três tipos de catequese,
no que se refere à tarefa catequética privilegiada:16 catequese de tipo ensino (ou
formação ), catequese de tipo iniciação (ou de estilo catecumenal ), e catequese de tipo
educação (ou promoção ). Mas é importante ressaltar a exigência de que todo modelo de
catequese, como quer que seja entendido, traga em si os três aspectos há pouco descritos:
ensino, iniciação e educação, ainda que com ênfases e matizes diversos.

16
Cf. cap. 5, item 4.2.
335
3.3 A escolha e a organização das intervenções operativas

Dentro do planejamento catequético, prevê-se como escolha de método a


programação das experiências ou intervenções operativas por meio das quais se desenvolve a
catequese. Configura-se, assim, uma seq ência operativa (por exemplo: apresentação de um
tema, reflexão em grupos, expressão não verbal, celebração etc.) que constitui o momento
mais propriamente metodológico do projeto.
Falando em termos gerais, a seq ência operativa resulta da combinação de quatro
gêneros de fatores: palavra (elementos didático-cognitivos), relação (fatores interativo-
relacionais), ação (momentos operativos) e celebração (elementos simbólico-celebrativos):
Palavra (elementos didático-cognitivos). Por exemplo: anúncio, relato, exposição,
discussão, pesquisa, dramatização etc.
Relação (fatores interativos, afetivos e relacionais): interação, expressão, dinâmica de
grupo, convivialidade, amizade, sentimento de pertença etc.
Ação (momentos operativos): compromisso, testemunho, ação social, trabalho etc.
Celebração (elementos simbólico-celebrativos): rito, festa, gestos simbólicos, oração,
diversão, dança, canto, expressão corporal etc.
É nessa perspectiva metodológica que se fala, por exemplo, na América Latina, do
método ver-julgar-agir-celebrar .17 E em princípio pode-se dizer que todo projeto
catequético concreto encerra em si seu próprio método , com este significado (caso, por
exemplo, dos diversos catecumenatos para adultos, do modelo catequético da Ação
Católica, dos Centros de escuta etc.).
Em princípio, pode haver muitas e diversas combinações dos elementos constitutivos
do método e, portanto, uma grande variedade de métodos catequéticos (DGC n. 148). Pode-
se dizer em geral que um método bem concebido para a catequese deve sempre conter os
quatro tipos de elementos (palavra, relação, ação, celebração), ainda que em proporções
diversas, a depender do que o modelo catequético prioriza: a educação, a iniciação ou o
ensino.

17
CNBB, Textos e manuais de catequese, n. 124; cf. M. Sousa - M. Veras, O método ver-julgar-agir-celebrar
na catequese: reflexão para catequistas , Revista de Catequese 9 (1986), n. 33, p. 30-34.
336
3.4 TÉCNICAS, INSTRUMENTOS E SUBSÍDIOS NA CATEQUESE
Ainda que pareça inadequado falar de método no que diz respeito a isso, na
verdade, abre-se aqui o vasto campo das diversas técnicas ou metodologias de intervenção,
juntamente com uma grande variedade de instrumentos, documentos, materiais e
subsídios, aptos a serem usados na catequese. É um campo vastíssimo e de grande
interesse. Existe, principalmente, uma grande variedade de técnicas de comunicação e de
animação como, por exemplo: lição, fórum, entrevista, painel, dramatização, grupo de
interação, técnica de cochicho, brainstorming [tempestade de ideias], debate, diário de
bordo, perguntas e respostas, esquete, simulação, visita etc.18
O elenco dos instrumentos e materiais utilizáveis na catequese não é menos rico e
estimulante: livros, documentos, fotografias, eslaides, cartazes, questionários, teste, discos,
gravações, montagens, filmes, vídeos, diaporama, programas de rádio, TV etc.
Diante desse amplo leque, impõe-se o problema propriamente metodológico da escolha
apropriada das técnicas e dos instrumentos mais adequados a cada processo concreto de ação
catequética. São muitos os fatores que se devem ter em mente no momento da escolha: o tipo
de catequese, as pessoas envolvidas, os objetivos a atingir, os meios concretos disponíveis, o
tempo que se tem etc. É importante não se deixar levar por motivos contingentes ou
arbitrários, para escolher as técnicas e instrumentos que melhor respondam, a cada
situação dada, às exigências catequéticas do planejamento.

3.5 O CATECISMO como subsídio catequético: significado e limites

Entre os instrumentos tradicionais da catequese, o catecismo merece consideração


especial, pela importância que teve na história e na práxis educacional da Igreja.

18
Para uma descrição e explicação das diversas técnicas, remetemos às obras específicas relacionadas no fim
do capítulo, em especial a de B. Grom, A. Beauchamp - R. Graveline - C. Quiviger, Office de Catéchèse du
Québec e D. Emeis - K. H. Schmitt.
337
3.5.1 Mas ainda é tempo de catecismos ?

O catecismo ou compêndio da fé cristã indiscutivelmente teve papel privilegiado na


prática da catequese, especialmente na época moderna. A mudança conciliar trouxe uma
revisão profunda do catecismo, mas em direções e com estilos diversos. Se em alguns países,
como na Itália e na Espanha, a elaboração de novos catecismos representou um instrumento
eficaz para a renovação pós-conciliar da catequese, em outros, como na França e na
Alemanha, essa renovação levou a uma certa relativização do catecismo, em favor de outros
instrumentos considerados mais de acordo com as novas circunstâncias e as exigências da
comunicação da fé nos dias de hoje: documentos de base, orientações programáticas,
coletânea de documentos, textos didáticos etc.
Mas não faltam discussões e polêmicas a propósito dos diversos catecismos novos,
ainda que elaborados e preparados pelos episcopados ou pelos organismos oficiais da
catequese.19 A publicação do (1992) recolocou na ordem
do dia a questão do significado e do papel de um catecismo nas situações concretas de hoje.20
A propósito, já lembramos a severa tomada de posição do ardeal Ratzinger (1983):
O primeiro e grave erro foi suprimir o catecismo e declarar ultrapassado o próprio modelo
do catecismo .21 E assim o problema continua em aberto. Ou antes, pode-se dizer que sempre
que surge um novo catecismo, oficial ou não, reabre-se a polêmica.

19
Pense-se nas polêmicas surgidas quando da publicação do Catecismo Holandês dos Adultos (1966), dos novos
catecismos franceses no primeiro pós-concílio, dos catecismos italianos, ou ainda do Katholischer
Erwachsenenkatechismus dos bispos alemães etc.
20
Cf. E. Alberich - U. Gianetto (eds.), Il catechismo ieri e oggi: studi sul significato dei catechismi nel passato
e nel presente della catechesi della Chiesa. Leumann (Turim), Elledici, 1987.
21
J. Ratzinger, Trasmissione della fede e fonti della fede, p. 7.
338
3.5.2 Algumas lições da história e do movimento catequético

Um exame atento da pesquisa histórica22 e do movimento catequético do nosso


século23 pode ter resultados muito sugestivos. Ao longo do tempo, a catequese foi organizada
e vivida de modos bem diversos e com instrumentos variados. Daí provêm pelo menos duas
conclusões: o catecismo não pode ser considerado como meio indispensável de catequese,
uma vez que houve lugares e tempos em que ele não existia. E portanto e aqui temos a
segunda conclusão o papel dos catecismos deve ser sempre relativizado, na medida em que
podem responder a exigências e condições muito diversas.
Em especial, vários catecismos tradicionais foram objeto de não poucas observações
críticas: 1) são compêndios doutrinais abstratos e distantes da vida: podem ter tido sentido
em uma época e em um ambiente que garantia, por outras vias, a comunicação da fé; 2) eles,
em geral, refletem uma concepção pedagógica e didática obsoleta; alguns deles se revelaram
instrumentos inadequados e ineficazes na tarefa da transmissão e educação da fé, como o
provam as muitas críticas de contemporâneos e de historiadores.

3.5.3 Significado do catecismo hoje

A questão do catecismo é repensado hoje não apenas nas coordenadas pastorais e


culturais modificadas, mas também em relação à nova fisionomia da catequese. Em certo
sentido pode-se dizer que passou a época do catecismo, na medida em que a catequese se
apresenta hoje como uma ação bem diversificada e ampliada em sua concepção. Desse ponto
de vista, o catecismo é considerado como um instrumento possível, entre outros, a serviço da
catequese, ao qual não se deve atribuir um valor absoluto.
Um catecismo, hoje, pode responder a exigências variadas e, portanto, assumir formas
e funções diversas (compêndio da fé, núcleo essencial ou fórmula breve , manifesto da fé
cristã, itinerário de fé para determinadas pessoas etc.). Assim, materiais diversos são também
chamados de catecismos : é necessário que se explicite com clareza a finalidade e a
possível utilização de cada um deles.
Eis algumas exigências legítimas que podem encontrar resposta no uso do catecismo: a
redescoberta do núcleo essencial da fé, a necessidade de uma visão estruturada e sistemática
da mensagem cristã, a salvaguarda da própria identidade religiosa, o desejo de responder a
possíveis objeções ou dificuldades etc. Essas e outras exigências semelhantes podem
legitimar hoje a demanda de catecismos bem-feitos. Eles poderão ser verdadeiramente úteis e
eficazes se, além de apresentarem conteúdos teologicamente atualizados, se mostrarem
atentos às exigências pedagógicas e catequéticas próprias da comunicação da fé.
Parece legítimo concluir também que, para atender às exigências metodológicas da
catequese atual, um catecismo deve ser fruto de um trabalho em equipe e de ampla
colaboração entre pastores e fiéis, entre teólogos, pedagogos e especialistas nas diversas
disciplinas envolvidas no planejamento da ação catequética.

22
Encontra-se grande abundância de elementos e de documentos em: P. Braido, Lineamenti di storia della
catechesi e dei catechismi: dal tempo delle riforme all´età degli imperialismi (1450-1870). Leumann
(Turim), Elledici, 1991, e in: E. Alberich - U. Gianetto (eds.), Il catechismo ieri e oggi.
23
Cf. por exemplo, L. Alves de Lima, Catecismos doutrinais e o Concílio Plenário Latino- americano , Revista
de Catequese 22 (1999), n. 87, p. 5-19. G. Adler - G. Vogeleisen, Un siècle de catéchèse en France 1893-1980.
Histoire-déplacements-enjeux. Paris, Beauchesne 1981, p. 117-140; W. Langer, Catechismo (criteri) ,
Diz.Cat., p. 116-18.
339
3.5.4 O Catecismo da Igreja Católica

Papel especial tem o (CaIC) publicado pela Santa


Sé,

Este catecismo tem o objetivo de apresentar uma exposição orgânica e sintética dos
conteúdos essenciais e fundamentais da doutrina católica, sobre a fé e sobre a moral, à luz do
Concílio Vaticano II e do conjunto da Tradição da Igreja (CaIC n. 11).

Ele pretende ser antes de tudo um ponto de referência para os catecismos locais:
Ponto de referência para os catecismos ou compêndios preparados nas diversas regiões .
Com efeito, o Catecismo da Igreja Católica não se destina a substituir os catecismos locais:

Ponto de referência para os catecismos ou compêndios preparados nas diversar regi es


Com efeito, o Catecismo da Igreja Católica não se destina a substituir os catecismos locais ,
mas a encorajar e ajudar a redação de novos catecismos locais, que levem em conta as
diversas situações e culturas, mas que preservem a unidade da fé e a fidelidade à doutrina
católica (DGC n. 121).

Portanto, o CaIC não é um catecismo universal , como infelizmente é considerado em


muitos lugares. Utilizar esse catecismo ou um de seus múltiplos resumos que surgem por
toda parte é ignorar e invalidar seu verdadeiro significado.

340
3.6 Em termos concretos: que métodos usar na catequese moderna?

É possível dar uma resposta exclusiva a essa questão? Na realidade, as considerações


feitas até agora insistem no princípio da necessária multiplicidade dos métodos, como foi
proclamado pelas instâncias competentes:

Na transmissão da fé, a Igreja não tem um método próprio nem um método único; ao contrário,
à luz da pedagogia de Deus, discerne os métodos do tempo [...] Desse modo a variedade dos
métodos é um sinal de vida e uma riqueza , e também demonstração de respeito para
com os destinatários (DGC n. 148).

da qual se
24
parte; métodos predominantemente cognitivos, afetivos ou operativos, de acordo com a
dimensão privilegiada da atitude de fé.25
Outras classificações inspiram-se nos principais modelos pedagógicos ou de
transmissão cultural. Assim, por exemplo, podemos conceber os métodos do ensino, da
animação e da aprendizagem;26 ou distinguir as três modalidades socializantes: o ensino, a
iniciação e o aprendizado.27
De qualquer modo é possível, na situação atual, distinguir algumas exigências
metodológicas comuns que, ligadas a uma visão renovada da catequese, encontram-se muitas
vezes nas mais variadas experiências catequéticas de hoje, especialmente nas mais válidas.
Podemos apontar algumas, como opções:
Opção experiência (DGC n.152-153): a experiência de fé, além de ser o verdadeiro
conteúdo da catequese, é também o lugar por excelência do anúncio e da escuta da
palavra. Como vimos, existe no coração da catequese a arte de suscitar experiências,
de comunicar experiências, de permitir a expressão de experiências de fé autênticas.
Opção comunidade (DGC n. 158): a comunidade, como dissemos, é condição, lugar,
sujeito, objeto e meta da catequese. A comunidade em termos gerais é o
verdadeiro sujeito da catequese, o catequista por excelência, a condição básica
para que a catequese tenha êxito: só pode ser objeto de catequese aquilo que se
realiza na comunidade .28 Nos dias de hoje, esta é uma das indicações metodológicas
mais importantes e decisivas, verdadeira pedra de toque da eficácia da catequese.

24
DGC n. 151. Cf. capítulo 4, item 5.3.
25
Cf. capítulo 5, item 4.3.
26
Cf. A. Fossion, La catéchèse dans le champ de la communication, p. 423-40. Uma outra modalidade prefere
distinguir entre educação, ensino e iniciação: cf. E. Alberich - A. Binz, Adulti e catechesi. Leumann (Turim),
Elledici, 1993, p. 114.
27
Cf. J. Audinet et al., Essais de théologie pratique: l´institution et le transmettre. Paris, Beauchesne, 1988.
28
B. Dreher, La catechesi in seno all´organismo complessivo della pastorale generale , in: B. Dreher et al., La
sterilità della catechesi infantile. Modena, Paoline, 1969, p. 71.
341
Opção grupo (DGC n. 159): dentro da comunidade, o grupo é considerado hoje,
universalmente, uma modalidade indispensável no processo de interiorização da fé
e, portanto, lugar privilegiado de catequese.
Opção pluralidade de linguagens: enquanto fato comunicativo, a catequese se abre hoje
ao rico leque de variadas linguagens verbais, icônicas, gestuais, audiovisuais, midiáticas
etc., para a comunicação da fé. Em geral, prefere-se, na catequese, a linguagem simbólica,
evocativa, própria da comunicação religiosa. Procura-se também dar um espaço adequado
à comunicação verbal e às ricas possibilidades das mídias.
Opção participação (DGC n. 157): a participação é uma exigência da eclesiologia de
comunhão e tanto mais viva entre as pessoas do nosso tempo, pelo fato de não desejarem
sentir-se membros passivos. A catequese deve fazer que todos se sintam sujeitos
corresponsáveis e ativos, não limitados ao papel de destinatários .
Opção criatividade (DGC n. 157): é uma exigência há muito aceita no movimento
catequético contemporâneo, isto é, a passagem de uma pedagogia da assimilação a uma
pedagogia da criatividade.
Opção primado do sujeito (DGC n. 157): se a lei fundamental do método catequético deve
ser a dupla fidelidade, a Deus e ao ser humano, reafirma-se também o primado
operativo do sujeito e de suas exigências, uma vez que a palavra de Deus deve
constituir, para todos, uma abertura para os próprios problemas, uma resposta às próprias
perguntas, uma ampliação dos próprios valores e também a satisfação de suas
aspirações mais profundas (RdC n. 52).
Opção globalidade: o amadurecimento da fé requer hoje o contexto envolvente de uma
experiência de vida cristã que deve ser ao mesmo tempo escuta, aprendizagem,
compartilhamento, empenho, celebração, testemunho. Nesse sentido pode-se dizer que
hoje a catequese é destinada a não ser apenas catequese, mas momento integrante de uma
experiência de fé e de vida cristã mais vasta e totalizante.

342
SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS

O problema geral do método catequético normalmente é tratado nos documentos


oficiais da catequese (cf. DGC, parte III, La pedagogia della fede ) e nas obras gerais de
catequética. Sobre esse assunto, ver a bibliografia geral no fim do volume.
Para uma consideração mais específica do problema do método na catequese, ver:

ALBERICH, E. Méthodes et enjeux catéchètiques . Lumen Vitae 44 (1989), n. 2, p. 127-35.


ALBERICH E. - A. BINZ. Catequese com adultos: elementos de metodologia. 2a ed. São Paulo,
Salesiana, 2001.
ALVES DE LIMA, L. O princípio [metodológico] de interação fé e vida . In: Id. A face
brasileira da catequese, p. 425-35.
BEAUCHAMP, A.- GRAVELINE, R.- QUIVIGER, C. Come animare un gruppo. Leumann
(Turim), Elledici, 1977.
BERTOLDI, M. Metodologia catequética. Florianópolis, Arquidiocese de Florianópolis, s/d.
BOFF, C. Como trabalhar com o povo: metodologia do trabalho popular. Petrópolis, Vozes,
1994.
CASIELLO, B. Metodologia catequística. 4a ed. Rosario (Argentina), Ed. Didascalia, 1999.
CAVALLON, G. L´arte di fare catechismo: metodologia. Roma, Paoline, 1988.
CNBB-GRECAT. Textos e Manuais de Catequese: elaboração, análise, avaliação. São Paulo,
Paulinas, 1987 (Estudos da CNBB n. 53).
CRUZ, T. M. L. Ensinar e aprender no novo milênio: novas tendências pedagógicas e
metodológicas . Revista de Catequese 21 (1998), n. 81, p. 44-46.
DÍAZ, T. J. Algumas notas sobre a metodologia catequética . Revista de Catequese 22 (1999),
n. 88, p. 9-22.
DIMENSÃO BÍBLICO-CATEQUÉTICA. Metodologia para oficinas de catequese . Revista de
Catequese 20 (1977), n. 80, p. 54-56.
DONZELLINI, M. Metodologia: fé e vida caminham juntas em comunidade . Cadernos
Catequéticos 9. São Paulo, Paulus, 1996.
FRINHANI, M. A metodologia da interação na catequese . Revista de Catequese 11 (1988), n.
42, p. 35-40.
GARCÍA AHUMADA, E. Catequese familiar de iniciação eucarística: um modelo chileno de
catequese com adultos . Revista de Catequese 25 (2002), n. 99, p. 49-58.
GIANETTO, U. Catechesi Tradendae e metodo catechistico: alla radice dei problemi .
Catechesi 49 (1980), n. 7, 51-64.
GIL LARRAÑAGA, P. Opción de método y opción de contenidos . Sínite 20 (1979), n. 61, p.
185-98.
GIUSTI, G. Il metodo nella catechesi degli adulti: esigenza, identità, orientamenti, con
particolare riferimento al metodo della correlazione . Catechesi 57 (1988), n. 8, p. 48-56.
. Catechesi: progettare e agire: linee metodologiche. Roma, Paoline, 1988.
GROM, B. Metodi per l´insegnamento della religione, la pastorale giovanile e la formazione
degli adulti. 2 ed. Leumann (Turim), Elledici, 1989.

343
GRUEN, W. Interação entre experiência e mensagem na catequese . Revista de Catequese 6
(1983), n. 24, p. 27-37.
KESTERING, J. Elementos de metodologia catequética . Revista de catequese 21 (1998), n. 82,
p. 47-52.
LELIS DE OLIVEIRA, M. Pedagogia e fé . Revista de Catequese 22 (1999), n. 88, p. 46-52.
MENDES DE OLIVEIRA, R. A pedagogia da fé no . Revista
de Catequese 22 (1999), n. 88, p. 23-29.
MORERO, V. Anunciar Cristo hoje. Orientações metodológicas fundamentais . Revista de
Catequese 12 (1989), n. 46, p. 32-40.
NADEAU, J.G. (ed.). La praxéologie pastorale: orientations et parcours. Montreal, Fides, 1987
(2 vols.).
NERY, I. J. Pedagogia catequética segundo a Bíblia . Revista de Catequese 5 (1982), n. 17, p.
48-52.
OFFICE DE CATÉCHÈSE DU QUÉBEC, Dossiers d´andragogie religieuse. 6. Comment bâtir
une activité éducative. Ottawa, Novalis, 1983 (2 vols.).
PIMENTA TEÓFILO, J. I. Linhas metodológicas de uma catequese libertadora . Revista de
Catequese 6 (1983), n. 23, p. 23-26.
RUTA, G. Programmare la catechesi. Leumann (Turim), Elledici, 1996.
SANDRINI, M. A educação à Fé num mundo em conflito . Revista de Catequese 21
(1998), n. 82, p. 5-10.
SOUSA, M; VERAS, M. O método ver-julgar-agir-celebrar na catequese: reflexão para
catequistas . Revista de Catequese 9 (1986), n. 33, p. 30-34.
TAVARES, M. Metodologia participativa: lidando com adultos . Revista de Catequese 25
(2002), n. 99 , p. 5-23.
TONELLI, M. - Peresson, L. Aprender a educar com Jesus. São Paulo, Salesiana, 2001.

344
Capítulo 11

O Catequista:
Identidade e formação
A nossa reflexão se encerra com uma observação sobre a figura
do catequista ou animador de catequese. As questões relativas a sua
identidade e a sua formação são temas muito vivos e atuais na presente
situação eclesial.

1. PERFIL DO CATEQUISTA OU ANIMADOR

Já vimos que, na realidade, a responsabilidade da catequese cabe à comunidade cristã


enquanto tal e, de alguma forma, a todos os seus componentes: pastores, religiosos, leigos,
pais, educadores etc.1 Aqui, porém, ocupamo-nos apenas do ministério pastoral dos agentes
da catequese reconhecidos oficialmente como tais. Não se pode ignorar sua importância: A
experiência catequética moderna confirma mais uma vez que em primeiro lugar vêm os
catequistas, depois os catecismos (RdC n. 200).

1.1 Os diversos níveis de responsabilidade catequética

Ainda que em primeiro lugar voltemos a atenção para os catequistas de base, convém
não perder de vista os três níveis mais conhecidos de responsabilidade eclesial: o de base, o
nível dos agentes intermediários e o mais alto, que é o dos especialistas e responsáveis
superiores.

1
Cf. capítulo 6, item 4.2.
345
1.1.1 Os catequistas de base

São aqueles que chamamos tradicionalmente de catequistas , responsáveis por setores


concretos de prática catequética na comunidade: iniciação sacramental, preparação para o
batismo ou para o matrimônio, animadores de grupos de reflexão, de centros de escuta, de
catequese bíblica etc. Para alguns desses setores, e em alguns lugares, torna-se problemático
o uso do termo catequistas , considerado inadequado e infantilizante, por isso se prefere
falar de animadores , ou acompanhantes de catequese.2 Lá onde o ensino escolar da
religião é considerado verdadeira catequese, a figura do professor de religião assume as
características e as problemáticas próprias do catequista enquanto tal.
Falando em termos gerais, cumpre assinalar no período pós-conciliar o enorme
aumento do número de catequistas leigos, um autêntico boom que deve ser saudado como um
verdadeiro dom do Espírito Santo à Igreja.3 Reconhece-se como fato altamente positivo e
promissor o grande número de sacerdotes, religiosos e leigos que se dedicam com
entusiasmo e perseverança à catequese (DGC n. 29).

1.1.2 Os agentes intermediários

Em um nível mais alto de responsabilidade encontram-se os operatori intermedi


[agentes intermediários], que recebem nomes diversos nos diferentes contextos culturais (por
exemplo: animateurs relais na França, Gemeindereferenten na Alemanha etc.). São os
coordenadores e animadores da catequese nas paróquias, nos setores pastorais, responsáveis
pela formação dos catequistas em nível local, colaboradores nos departamentos catequéticos,
participantes das equipes de animação pastoral e catequética etc.
No que se refere a eles, existe hoje uma crescente demanda de utilização e de formação
nas dioceses, com o emprego cada vez maior dos leigos, também pela grave deficiência de
vocações sacerdotais. Essa tendência envolve não apenas o âmbito da catequese, mas toda uma
gama, sempre crescente, de serviços pastorais: capelães nos hospitais, animadores na pastoral
juvenil, na pastoral universitária, na pastoral familiar, na organização paroquial etc.4

2
Cf. França (Texte de référence) 3.1.1.2.
3
No Brasil, o estudo da CNBB Formação de Catequistas de 1990 afirmava: Não se dispõe de estatísticas
exatas, mas seguramente mais de 500 mil catequistas estão diretamente envolvidos na educação da fé de nosso
povo. A quase totalidade são leigos (95%), os demais sendo religiosas/os, seminaristas, sacerdotes. Deste grande
contingente, 80% são mulheres, revelando-se, assim, fortemente a presença feminina neste ministério eclesial.
Também se nota grande presença de jovens (67%) (n. 2). Ver a carta dos Bispos italianos na apresentação
do documento base , in: Conferenza episcopale italiana, Il rinnovamento della catechesi. Roma, CEI, 1988,
p. 14-15.
4
Quando se tratou de convocar a Segunda Semana Brasileira de Catequese, cujo tema foi a catequese com
adultos, ficou evidente a variedade de pessoas que trabalham na educação da fé, mas não são chamados
propriamente de catequistas. São pessoas que trabalham com a pastoral da juventude, comunidades eclesiais,
movimento de casais, círculos bíblicos, missão popular, grupos de rua, escolas da fé, diversos cursos de
preparação para os sacramentos (batismo, matrimônio curso de noivos), encontros com pais e mães de
adolescentes e crianças da catequese, encontros da campanha da fraternidade, estudantes universitários, etc. (cf.
CNBB-Dimensão bíblico-catequética, Segunda Semana Brasileira de Catequese. São Paulo, Paulus, 2002, n.
3.6 (Estudos da CNBB n. 84). Cf. Id., Com adultos catequese adulta . Paulus 2001, n. 169-70 (Estudos
da CNBB n. 80). Cf. também a rica documentação in A. Binz - R. Moldo - A. L. Roy (eds.), Former des
adultes en Église: état des lieux, aspects théoriques et pratiques. Saint- Maurice, Editions Saint-Augustin,
2000.
346
1.1.3 Especialistas e responsáveis superiores

É o nível das mais altas responsabilidades catequéticas nas Igrejas particulares ou


regionais e compreende: as autoridades eclesiais (pastores, bispos, sacerdotes); os
responsáveis nacionais ou diocesanos (diretores de departamentos ou secretariados
catequéticos); o âmbito do estudo e da pesquisa (docentes de catequética, especialistas e
estudiosos etc.). É todo um âmbito de grande relevo e de vital importância para a catequese
(DGC n. 251), ainda que, infelizmente, muitas vezes negligenciado no que diz respeito à
preparação e profissionalização.

1.2 Os agentes da catequese: competência unitária e diferenciada

O perfil do catequista ou animador de catequese é entendido no contexto geral do agir


pastoral da comunidade cristã. E nesse sentido salienta-se em primeiro lugar a dimensão
pastoral da tarefa catequética, que faz o catequista sentir-se agente pastoral co responsável e
envolvido no projeto operativo global da sua comunidade. Is o tem consequências, como
veremos, no campo da formação.
No que concerne à figura e à competência propriamente catequética dos agentes da
catequese, cabe lembrar a articulação orgânica da catequese como serviço único e
diferenciado (DGC n. 219). Essa diferenciação se reflete logicamente em uma variedade de
perfis profissionais dos agentes responsáveis pela catequese, pelo menos de dois pontos de
vista.
Um primeiro ângulo de visão distingue na Igreja particular ministérios diversificados
segundo a diferenciação harmônica dos papéis eclesiais. Já destacamos o papel particular de
seus principais agentes, no contexto de uma visão renovada de eclesiologia de comunhão. Eis
uma rápida enumeração: a comunidade como primeiro e principal catequista (DGC n. 220-
221); os bispos, primeiríssimos responsáveis pela catequese, os catequistas por excelência
(DGC nn. 222), aos quais cabe a alta direção da catequese na Igreja particular (DGC n.
223); os presbíteros, pastores e educadores da comunidade cristã, catequistas dos
catequistas (DGC n. 226-227); os pais, primeiros educadores da fé dos filhos (DGC n. 226-
227); os religiosos, chamados a dar uma contribuição original e específica na obra
catequética (DGC n. 228-229); e os catequistas leigos, convidados a prestar um serviço
imprescindível e qualificado, em tempo integral ou parcial, diversificado na variedade das
tarefas catequéticas da comunidade (DGC n. 230-232; CAL n. 203-208).
Um outro ponto de vista introduz o critério da diferenciação por idade, condição,
situação dos participantes na catequese. Distinguem-se assim catequistas das crianças, dos
adolescentes, dos jovens, das pessoas com necessidades especiais, animadores da catequese
dos adultos; animadores de catequese familiar, de catequese bíblica, de catequese para
profissionais liberais, agricultores, artistas etc.

347
1.3 As competências do animador ou catequista: ser, saber, saber fazer

Muitas vezes tivemos ocasião de apontar as consequências da nova visão catequética


sobre a figura e a formação do catequista ou animador da catequese. De forma resumida e
mais intensa, podemos agora retomar os elementos mais significativos do perfil interior e
profissional do catequista, em torno da clássica dimensão tríplice: o ser, o saber e o saber
fazer.
1.3.1 O ser do catequista: sua fisionomia humana e cristã

Dadas as exigências da catequese hoje, sente-se a necessidade urgente de


personalidades convincentes e significativas, em nível humano e crente. Mais do que por sua
competência operativa ou pela riqueza de seus conhecimentos, o catequista se define hoje,
antes de mais nada, pelo seu ser , por sua espiritualidade , por seu perfil pessoal e interior,
que apresenta os seguintes traços gerais e específicos:

348
Uma maturidade humana de base, ainda que relativa, pressuposto para o crescimento
da fé, que se requer do catequista para o cumprimento de sua missão. Não é
razoável imaginar um catequista que, tendo a missão de acompanhar outros no
caminho para a maturidade humana e cristã, não possua ele próprio um certo grau
dessa maturidade. Essas qualidades humanas incluem não poucas exigências de
grande influência na ação catequética: O exercício da catequese, constantemente
reconsiderado e avaliado, permitirá ao catequista crescer no equilíbrio afetivo,
no senso crítico, na unidade interior, na capacidade de diálogo e de estabelecer
relações, no espírito construtivo e no trabalho de grupo (DGC n. 239; cf. CAL n.
201).
Uma clara espiritualidade e identidade cristã e eclesial (DGC n. 237, 239; CAL n.
202). Enquanto educador da fé de seus irmãos, deverá ter uma séria e convincente
vida de fé, uma certa maturidade de fé, de modo a poder apresentar-se não apenas
como mestre, mas principalmente como testemunha digna de fé. O catequista deve
encarnar e tornar visível aquele novo modelo de crente requerido nos dias de hoje,
como já o dissemos, pelas circunstâncias religiosas e culturais modificadas.5 Sua
espiritualidade deve possuir, em forma adulta, o sensus ecclesiae, o sentido e a
experiência de Igreja, com atitude interiorizada de pertença, sensibilidade comunitária
e consciência apostólica (DGC n. 239).6
Mas não basta: são necessários homens e mulheres do próprio tempo, plenamente
identificados com sua gente, abertos aos problemas reais e com sensibilidade cultural,
social, política. Não prestam um bom serviço os catequistas, talvez até muito
generosos, devotos e apegados à Igreja, que se mantenham, porém, à margem da
vida social e cultural da sociedade. Somente com homens e mulheres inseridos na
realidade do mundo é possível imaginar hoje uma educação da fé em sintonia com as
exigências atuais da vida cristã. Nesse contexto cumpre salientar a importância dos
catequistas do próprio meio e a contribuição indispensável dos catequistas leigos, que
por isso devem ser encorajados e estimulados.

5
Cf. capítulo 5, item 3.5.
6
J. Kestering, Mística e espiritualidade da catequese Cf. P. Damu, Quale spiritualità per il catechista , in: C.
Bissoli - J. Gevaert (eds.), La formazione dei catechisti: problemi di oggi per la catechesi di domani. Leumann
(Turim), Elledici, 1998, p. 83-93; A. Fossion, Dieu toujours recommencé: essai sur la catéchèse contemporaine.
Bruxelas, Lumen Vitae/Novalis/Cerf/Labor et Fides, 1997, p. 211-12.
349
1.3.2 O saber do catequista: sua bagagem intelectual

Naquilo que se refere ao conhecimento, o saber do catequista, nas atuais circunstâncias,


não mais poderá limitar-se ao âmbito teológico, ainda que continue a ser importante uma boa
base teológica como ingrediente essencial da competência catequética. O catequista deverá
também conhecer a problemática pastoral de hoje e o projeto pastoral da Igreja a que
pertence, a natureza e dimensões do ato catequético, as pessoas ou sujeitos com os quais irá
trabalhar e, de modo especial, o contexto sociocultural em que se situa a sua ação (DGC n.
238). Tudo isso se traduz, portanto, em exigências concretas no plano da formação.
No que se refere à mensagem ou ao conteúdo da comunicação catequética, a dimensão
experiencial da catequese exige hoje do catequista uma grande familiaridade com as
experiências e linguagens próprias do fato cristão: na área da experiência bíblica, no âmbito
múltiplo da tradição eclesial, das linguagens e experiências da vida de hoje.

1.3.3 O saber fazer do catequista: sua competência operativa

Hoje não é mais possível confiar a realização da catequese ao jogo da improvisação e do


empirismo pastoral. O animador ou responsável pela catequese deve demonstrar um certo
profissionalismo , pelo menos no sentido de possuir as competências operativas necessárias
à sua tarefa. Em termos concretos, o nosso tempo parece exigir do catequista uma preparação
adequada nos seguintes âmbitos ou atividades: educação, comunicação, animação e
planejamento.
Educação: o catequista é sempre um mestre , um educador , e como tal deve ter as
qualidades próprias de todo verdadeiro educador, além, naturalmente, de sua bagagem
de conhecimentos: tato e sensibilidade para com as pessoas, capacidade de
compreensão e de acolhimento, habilidade para incentivar processos de aprendizagem,
arte para orientar para a maturidade humana e cristã, com tudo o que isso supõe
(DGC n. 244).
Comunicação: o catequista deverá ter familiaridade com as técnicas e linguagens da
comunicação, com particular atenção para a comunicação da fé e das
experiências de fé (DGC n. 235; CAL n. 131). Convém insistir mais uma vez: a
melhor bagagem intelectual, teológica e bíblica resulta absolutamente ineficaz se o
catequista não domina a difícil arte da comunicação experiencial e significativa.

350
Animação: o catequista é essencialmente um animador, no contexto da comunidade
ou do grupo, que é o ambiente normal da catequese. Nesse sentido, deverá conhecer
as regras da vida e animação dos grupos e, o que é mais importante, ter uma
verdadeira personalidade comunicativa 7: ser capaz de promover relações profundas,
de estimular o protagonismo do grupo, fazendo-o sentir-se à vontade, de permitir que
cada um se sinta valorizado, de garantir um clima positivo e estimulante no interior do
grupo. Seu trabalho de animação deverá permitir-lhe evitar os extremos de uma
postura autoritária, por um lado (a mais frequente), e, por outro, o excesso de
permissividade e espontaneísmo , que é uma tendência mais atual.
é tarefa do catequista, ou melhor, da comunidade ou grupo de
catequistas, conhecer as regras de um correto planejamento catequético e ser capaz de
pô-lo em prática (DGC n. 245). Isso supõe, como já vimos,8 conhecer e interpretar
as situações iniciais dos participantes, elaborar um projeto concreto de ação, pô-lo em
prática e avaliá-lo, para aperfeiçoá-lo e reaplicá-lo posteriormente.

2. A FORMAÇÃO

Essa breve caracterização do perfil do catequista permite-nos entender a urgência de


uma seleção e formação adequadas, superando as tradicionais improvisações e
superficialidade, no contexto global da promoção e qualificação.

2.1 Um olhar sobre a situação: luzes e sombras

Hoje trabalha muito no campo da formação.9 E certamente não faltam posições


oficiais e orientações válidas por parte da hierarquia, com documentos e subsídios de vários
tipos.10 Abundantes são as declarações sobre a importância e a urgência da formação, em
todos os níveis, e se expressa satisfação pelo aumento da participação dos leigos e pelo
dos catequistas nos anos pós-conciliares, verdadeiro dom do Espírito à Igreja.11 É necessário
reconhecer, porém, que a realidade muitas vezes não corresponde aos desejos expressos. A
prática da formação, não obstante os louváveis esforços, ainda continua longe de atender às
exigências reais da situação. Assim, a formação se apresenta como verdadeira urgência
pastoral .12 Vejamos alguns de seus aspectos.

7
Dessa qualidade fundamental se falou no capítulo 8, item 3.2.5. Cf. A. Fossion, Dieu toujours recommencé,
p. 210. Para esta e outras qualidades do catequista cf. o cap. V Dimensões e conteúdos da formação do
catequista do estudo Formação de catequistas, da CNBB, n. 148-207.
8
Cf. capítulo 10, item 3.1.3; G. Ruta, Programmare la catechesi: teoria e pratica per animatori e catechisti.
Leumann (Turim), Elledici, 1996.
9
Cf. C. Bissoli - J. Gevaert (eds.), La formazione dei catechisti. Encontra-se uma rica documentação sobre a
situação na França, Quebec, Itália, Espanha e Alemanha em: A. Binz - R. Moldo - A. L. Roy (eds.), Former des
adultes en Église, p. 15-90. Com relação ao Brasil, no que se refere à catequese com adultos pode-se consultar:
I. J. Nery - Vilson Dias de Oliveira, Pesquisa sobre catequese com adultos , in: Segunda Semana Brasileira de
Catequese, p. 49-59 (Estudos da CNBB n. 84).
10
Ver bibliografia no fim do capítulo.
11
Ver a carta dos bispos na apresentação do texto Il rinnovamento della catechesi , in: Conferenza
Episcopale Italiana, Il rinnovamento della catechesi. Roma, CEI, 1988.
12
Cf. R. Paganelli, La formazione emergenza pastorale . Settimana n. 9 (7/3/1999), p. 1 e 16.

351
2.1.1 O nível de base: catequistas e professores de religião

O esforço para a formação se concentra principalmente na preparação de catequistas e


mestres de crianças e pré-adolescentes, dado que são estes os destinatários tradicionais da
atividade educativa e catequética das comunidades cristãs.

Em termos gerais, o quadro apresentado por esses campos de formação certamente tem
muitos aspectos positivos e promissores, mas revela também, de forma bastante clara, não
poucas limitações e questões não resolvidas, principalmente no que diz respeito à formação
dos catequistas. Na Itália, por exemplo, levantaram-se muitos pontos problemáticos;15 em
outros lugares, como na Ásia16 ou na América Latina, a situação deixa muito a desejar:

Depois de vinte e nove anos de contato com milhares de catequistas de toda a América
Latina, sempre chego à seguinte conclusão: eles, os verdadeiros inculturadores da fé, os
homens e mulheres que suportam o rigor do dia e do calor , são os últimos comensais à mesa.
E uma vez sentados, muitas vezes recebem apenas as migalhas.17

13
G. Morante, I catechisti parrocchiali in Italia nei primi anni ´90: ricerca socio-religiosa. Leumann (Turim),
Elledici, 1996; F. Merlos, Catequesis latinoamericana: las tentaciones de un ministerio . Medellín 20 (1994), n.
80, p. 607-16.
14
Cf. G. Malizia - Z. Trenti (eds.), Una disciplina al bivio: ricerca sull´insegnamento dele Religione cattolica
in Italia a dieci anni dal Concordato. Turim, SEI, 1966.
15
Por exemplo: 32% dos catequistas não participam de nenhuma atividade de formação; faltam os formadores
principalmente para o setor dos adultos: cf. L. Soravito, La formation des catéchistes en Italie aujourd´hui .
Lumen Vitae 52 (1997), n. 1, p. 53-64; U. Gianetto, La situazione attuale della formazione dei catechisti ,
in: C. Bissoli - J. Gevaert (eds.), La formazione dei catechisti, p. 21-31; C. Bissoli, Punti deboli del
catechista oggi , ibid. p. 32-40. Ver também a lúcida descrição de E. Biemmi, in: L. Soravito, La catechesi
degli adulti: orientamenti e proposte. Leumann (Turim), Elledici, 1998, p. 281-85.
16
Cf. Ásia (Cingapura 1995), II. C.
17
F. Merlos, Catequesis lationoamericana, p. 615. Ver também México GP n. 146.
352
2.1.2 Os agentes intermediários: animadores, coordenadores, formadores

A situação da formação em nível intermediário é muito variada. Pode-se dizer, falando


em termos gerais, que a demanda por formação está aumentando, no quadro geral da
necessidade de agentes pastorais leigos na práxis pastoral das comunidades cristãs. Em
alguns países assiste-se à multiplicação de institutos e centros de formação, em outros à de
seminários, faculdades, institutos de ciências religiosas, em geral, dedicados à formação de
agentes pastorais.18
Numa visão de conjunto, eis algumas características e tendências mais significativas
nesse campo de atividade:
Existe a tendência a dignificar e atribuir status universitário aos diversos processos
de formação.
Aumenta a gama dos ministérios ou serviços pastorais que são objeto de formação:
animadores litúrgicos, catequistas, pastoral da saúde, setor caridade, marginalização,
pastoral familiar, pastoral bíblica, professores de religião etc.
Em especial, cresce também a sensibilidade em relação aos ministérios chamados
seculares , que atuam como cristãos no coração do mundo: na realidade social, no
mundo do trabalho, na educação, na política.
Em muitos lugares vê-se o desejo de superar um estilo de formação predominantemente
intelectual, voltando-se a atenção para a pessoa enquanto ser integral, especialmente
no que diz respeito à espiritualidade e à competência na atuação, observando- se uma
estreita relação entre teoria e prática.

18
Cf. U. Gianetto, La situazione attuale della formazione dei catechisti, p. 25; A. Binz - R. Moldo - A. L. Roy
(eds.), Former des adultes en Église. Cf. também L. Alves de Lima, Capacitação para agentes de catequese:
curso ligado a instituições universitárias . Revista de Catequese 25 (2002), n. 100, p. 17-23.
353
2.1.3 O nível superior: bispos, sacerdotes, responsáveis, especialistas, docentes

Também nesse nível a situação é muito variada, mas não muito encorajadora. É de
lamentar, em geral, a pouca consciência que se tem da importância da competência
catequética dos pastores e responsáveis. Em especial, a formação dos seminaristas e dos
sacerdotes nesse campo é altamente deficitária. A maioria continua a pensar que, para a
formação dos pastores na comunidade cristã, o essencial é uma boa formação teológica e
bíblica, unida, de forma absolutamente secundária, a alguma iniciação ao trabalho pastoral
ou à aprendizagem decorrente da experiência.19 Não obstante as insistentes recomendações
dos documentos oficiais (cf. DGC n. 234), a formação catequética ou não existe ou muitas
vezes é marginalizada e confiada a pessoas sem preparação específica. Encontramo-nos
numa situação crítica, naquilo que se refere à formação, que tem fortes conseq ências na
renovação efetiva da prática catequética.

2.2 As exigências da formação (cf. DGC, V Parte, cap. II; CAL cap. 10)

Diante dessa comunidade de formação, que orientação seguir? Quais os imperativos


mais consensuais?

2.2.1 Planejar e investir na formação

O tema da formação não apenas na realidade eclesial, mas na sociedade em geral


assume nos dias de hoje uma importância nova e uma grande atualidade. Pode-se dizer que
em todos os setores da vida, da profissão e da práxis sente-se hoje a imperiosa necessidade
de formação e de formação permanente.20 Nesse sentido deve aumentar a convicção da
necessidade de uma política da formação mais decisiva e eficaz, superando todo
superficialismo e improvisação,21 e de que investir na formação constitui hoje um

No âmbito da pastoral e da prática catequética, a necessidade não é certamente menor.


Como adverte o Diretório catequético, na base de tudo deve estar a convicção de que
qualquer atividade pastoral que não contribua, para a sua realização, com pessoas formadas e
preparadas, corre o risco de ter sua qualidade comprometida.

Os instrumentos de trabalho não podem ser verdadeiramente eficazes se não forem utilizados
por catequistas bem formados. Para tanto, a preocupação com a atualização dos textos e com
uma melhor organização da catequese não deve fazer esquecer a necessidade de uma adequada
formação dos catequistas (DGC n. 234).

19
O problema é bastante geral, pelo menos no que diz respeito à Europa: cf. E. Alberich, La formazione dei
responsabili e degli agenti della catechesi: indicazioni da un convegno di catecheti europei . Orientamenti
Pedagogici 43 (1966), n. 6, p. 1335-40. No que se refere ao Brasil pode-se encontrar alguns dados em Grupo de
Reflexão sobre Escolas Catequéticas (Grescat), Metodologias nas escolas de formação de catequistas . Revista
de Catequese 21 (1998), n. 83, p. 40-47.
20
Bastaria lembrar os conhecidos relatórios da Unesco sobre a educação: E. Faure (org.), Aprender a ser: la
educación del futuro. Madri, Alianza, 1978; Jacques Delors, Um tesouro a descobrir: relatório para a Unesco
da Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI. São Paulo, Cortez, 1998. Cf. J. Joncheray,
Formation et stratégies d´Église , in: A. Binz - R. Moldo - A. L. Roy (eds.), Former des adultes en Église, p.
156-60.
21
Cf. A. Fossion, Dieu toujours recommencé, p. 214.
354
Ora, a formação dos catequistas faz parte de um projeto pastoral mais amplo, que
abrange a formação de agentes pastorais em geral. É por isso que nos parece conveniente
inserir essa formação em um quadro conjuntural de formação pastoral, organizando, por
exemplo, ciclos de formação em institutos ou centros que prevejam uma primeira formação
pastoral para todos, passando-se depois a formações mais específicas (catequistas, animadores
litúrgicos, agentes sociais etc.) (DGC n. 250).

2.2.2 A pastoral dos catequistas (DGC n. 233)

Cad Igrej particular (diocese) e, respeitadas as devidas proporções, cada setor


pastoral ou paróquia, tem diante de si a tarefa de organizar e programar adequadamente a
pastoral dos catequistas (DGC n. 233). Essa tarefa requer um projeto unitário de
discernimento vocacional,de ormação e acompanhamento que se aplique à pluralidade
dos serviços catequéticos da comunidade cristã e que leve em conta a diversidade de
tipos de

Podemos pensar em diversos lugares ou instituições de formação (DGC n. 246-251)


quer em âmbito diocesano, quer em âmbito paroquial ou interparoquial: a comunidade local,
as escolas para catequistas, institutos de ciências religiosas, centros de formação de agentes
pastorais etc.

22
Cf. C. Bissoli - J. Gevaert (eds.), La formazione dei catechisti. Parte Terza ( Proposte per la formazione di
diversi tipi di catechisti , p. 115-86).
355
No planejamento das iniciativas de formação é preciso ter presentes as coordenadas
fundamentais de todo projeto de formação: finalidade e objetivos, conteúdos formativos,
pedagogia da formação, técnicas e meios. Mas um aspecto que deve ser ressaltado é a
exigência de que se respeite a condição de adultos das pessoas em formação e, portanto,
sua necessidade de autonomia, corresponsabilidade e liberdade. Portanto, o estilo
paternalista e clerical de muitas ações pastorais está superado. Há uma consciência muito
clara, nos dias de hoje, de algumas exigências em relação a esse tema:
Deseja-se uma formação na corresponsabilidade e na participação. Sente-se uma
grande necessidade de superar o estilo tradicional infantilizante, que reduz o adulto
ao papel quase totalmente passivo de destinatário da formação.
Aspira-se a uma formação que leve em conta a experiência e os problemas de vida
do adulto. E não apenas no sentido de não ignorá-los ou deixá-los de lado, mas,
mais profundamente, no sentido de integrar os conteúdos da formação,
reapresentando-os no contexto da experiência e dos problemas vividos por pessoas
concretas.
Deseja-se uma formação que aponte para o novo modelo de crente, de que
já falamos, que possa atender às novas exigências da sociedade atual.

2.2.3 A pedagogia da formação

Um fator decisivo no campo da formação é o da pedagogia e da metodologia


adotadas no processo formativo. Falando em termos gerais, podemos distinguir,
como o faz E. Biemmi, três modelos mais freq entes de formação:23
Um modelo de formação bastante difundido é o do tipo divulgação teológica ,
que procura fazer assimilar toda uma série de conteúdos e informações teológicas,
seguindo um modelo de tipo professoral e o estilo tradicional do ensino teológico.
A formação recebida, nesse modelo, é de reprodução, de imitação. É uma formação
concebida essencialmente como informação , que muitas vezes se configura como
verdadeira doutrinação .
Um segundo modelo é do tipo operativo ou tecnicista , que procura transmitir
um saber fazer relacionado à animação: técnicas de animação, dinâmica de
grupo, competências relacionais etc. É uma formação na inha do adestramento .
Comunica habilidades de gerenciamento e de relações, mas deixa de lado
os conteúdos e os objetivos da ação empreendida.
Talvez o modelo mais seguido atualmente seja aquele que une as duas concepções
descritas: uma boa dose de informação teológica, acrescida de algumas indicações
de ordem técnica e metodológica.

23
Cf. E. Biemmi, I catechisti degli adulti in Italia , in: C. Bissoli - J. Gevaert (eds.), La formazione dei
catechisti, p. 148-50.

356
específicas da aprendizagem do adulto.24

Muitas são as modalidades e características que podem assumir uma experiência


formativa bem concebida e realizada. Mas algumas exigências têm hoje um
destaque especial:
A personalização , entendida como exigência de situar a pessoa no centro da
formação, em uma dinâmica que faça da formação uma verdadeira trans-
formação . Nessa concepção, a aprendizagem tem o primado sobre o ensino e
nela se valoriza bastante o uso dos relatos ou histórias de vida (récits de vie).25
A integração entre a teoria e prática (DGC n. 245), seja na forma de tirocínio
prático que acompanha a aprendizagem teórica, seja melhor ainda como
26
reflexão continuada e sistemática sobre a prática pastoral.
A articulação entre teologia e ciências humanas (DGC n. 243) (antropologia,
psicologia, sociologia) e uma atenção toda especial à formação pedagógica (DGC
n. 244). Nessa perspectiva, a própria formação teológica deve ter uma conotação
claramente antropológica e catequética:

Deve ser uma formação teológica muito próxima da experiência humana, capaz de
correlacionar os diferentes aspectos da mensagem cristã com a vida concreta dos homens
e das mulheres seja para inspirá-la, seja para examiná-la à luz do Evangelho . Mesmo
permanecendo ensino teológico, deve adotar, de qualquer modo, um estilo catequético
(DGC n. 241).

A orientação didática da formação permanente : mais que fornecer conhecimentos


e habilidades, a formação deve tornar as pessoas capazes de autoformação e
de autoaprendizagem, capazes portanto de aprender a aprender , com relativa
autonomia e criatividade:

O objetivo ou ideal é aquel segundo qual os catequistas deverão ser os


protagonistas de sua aprendizagem, submetendo a sua formação ao signo da
criatividade e não apenas mera assimilação de regras externas (DGC n. 245).

24
Quanto ao Brasil pode-se consultar: CNBB-Dimensão Bíblico-catequética, Formação de catequistas:
critérios pastorais; L. Alves Lima, Capacitação para agentes de catequese: cursos ligados a instituições
universitárias; A. F. Merlos, Características atuais da catequese na América Latina . Revista de Catequese
21 (1998), n. 83, p. 6-13. Entre as tentativas significativas de renovação pedagógica no campo da formação
eclesial podemos apontar, a título de exemplo: a rica experiência do Institut Romand de Formation aux
Ministères (IRFM) de Friburgo (Suíça) e do Institut de Pédagogie Religieuse, de Estrasburgo; os
laboratórios de formação de Enzo Biemmi e o Serviço Diocesano de Formação do Laicato de Bilbao, no País
Basco espanhol. Cf. A. Binz - R. Moldo - A. L. Roy (eds.), Former des adultes en Église. A. Binz - S.
Salzmann, Documents d´andragogie: outils pour la formation e la catéchèse des adultes.
Friburgo/Estrasburgo, IPR-IFM, 1996; E. Biemmi, I catechisti degli adulti in Italia , p. 156-60; Servicio
Diocesano de Formación del Laicado, Marco de formación de laicos en fase diocesana. Bilbao, 1998. 25.
Cf. A. Fossion, Dieu toujours recommencé, p. 213; R. Comte, Identité narrative et formation , in: A. Binz -
R. Moldo - A. L. Roy (eds.), Former des adultes en Église, p. 201-21. S. Salzmann, La dimension
catéchétique de la formation des adultes , ibid., p. 245-63.
26
Cf. A. Fossion, Dieu toujours recommencé, p. 212.
357
SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS

Sobre o tema da formação dos catequistas destacamos principalmente o capítulo 2 da


Quinta Parte do (ver também: CAL cap. 10; Brasil CR
n. 144-151 e México GP cap. 6). Entre os documentos oficiais dedicados especificamente
ao assunto, cf:

COMISION EPISCOPAL DE ENSEÑANZA Y CATEQUESIS. El catequista y su formación:

CONFERENZA EPISCOPALE ITALIANA-COMISSIONE PER LA DOTTRINA DELLA


FEDE E LA CATECHESI. La formazione dei catechisti nella comunità cristiana. Roma,
CEI, 1982.

CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL. Formação de catequistas: critérios


pastorais. 7a ed. São Paulo, Paulinas, 1990.
UFFICIO CATECHISTICO NAZIONALE. Orientamenti e itinerari di formazione dei
catechisti.
Leumann (Turim), Elledici, 1991.

358
A bibliografia sobre o tema é vastíssima. Eis uma seleção indicativa:

ALCEDO, A. et al. Las exigencias de formación de catequistas en relación con las nuevas
necesidades y con la situación real de nuestros catequistas . Actualidad Catequética (1995),
n.166/167, p. 281-93.
ALVES DE LIMA, L. A formação de catequistas . Revista de Catequese 14 (1911), n. 53, p.
3-17.
. A formação dos seminaristas para a catequese . Revista de Catequese 8 (1985), n.
32, p. 37-42.
. Capacitação para agentes de catequese: curso ligado a instituições universitárias .
Revista de Catequese 25 (2002), n. 100, p. 17-23.
. Pressupostos teológicos para a formação de catequistas . Revista de Catequese 21
(1998), n. 81, p. 37-39.
ANTONIAZZI, A. Renovação da Igreja e ministério do catequista . Revista de Catequese 8
(1985), n. 29, p. 12-17.
BARBON, G. Cammino per la formazione dei catechisti. Bolonha, Ed. Dehoniane, 1992.
BIEMMI, E. Accompagnare gli adulti nella fede. Leumann (Turim), Elledici, 1994.
BINZ, A. - MOLDO, R. - ROY, A. L. (eds.). Former des adultes en Église: état des lieux,
aspects théoriques et pratiques. Saint-Maurice, Editions Saint-Augustin, 2000.
BINZ, A.- SALZMANNS. Documents d´andragogie: outils pour la formation et la
catéchèse des adultes. Friburgo/Estrasburgo, IPR-IFM, 1996.
BISSOLI, C. - GEVAERT, J. (eds.). La formazione dei catechisti: problemi di oggi per la
catechesi di domani. Leumann (Turim), Elledici, 1998.
BRODOLONI, P. Il ministero e la spiritualità del catechista. Milão, Paoline, 1990.
BROSHUIS, I. Algumas reflexões sobre a formação dos catequistas . Revista de catequese 21
(1998), n. 81, p. 34-36.
CANSI, B. A pessoa e a formação do catequista a partir de uma análise histórico-crítica da 1ª
Semana Brasileira de Catequese . Revista de Catequese 19 (1996), n. 76, p. 16-21.
CANSI, B. O catequista da cidade . Revista de Catequese 16 (1993), n. 63/64, p. 76-83.
. O novo tipo de catequista . Revista de Catequese 8 (1985), n. 29, p. 32-43.
. Os catequistas no Brasil hoje . Revista de Catequese 5 (1982), n.17, p. 31-38.
Catechisti di qualità. Atti del primo Convegno Nazionale dei Catechisti (Roma, 23-25 aprile
1988). Roma, Fondazione di religione Santi Francesco di Assisi e Caterina da Siena, 1988.
CNBB-DIMENSÃO BÍBLICO-CATEQUÉTICA. Espiritualidade do catequista . Revista
de Catequese 20 (1997), n.79, p. 41-44.
CNBB-REGIONAL LESTE 2. Afetividade e catequese: subsídio para a formação de
catequistas . Revista de Catequese 21 (1998), n. 83, p. 23-39, e 21 (1998), n. 84, p. 25-39.
. Pedra em lapidação: catequista em formação . Revista de Catequese 19 (1996), n.
74, p. 19-27.
CNBB-REGIONAL OESTE 2, A formação de catequista . Revista de Catequese 11 (1988), n.
42, p. 53-56.
CNBB-REGIONAL SUL 3. Orientações para a formação de catequistas . Revista de
Catequese 20 (1997), n. 77, p. 24-30.

359
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DONZELINI, M. - RODRIGUES, M. P. Espiritualidade do catequista: caminho, formação,
vida na missão catequética. 2ª ed. São Paulo, Paulus 1998 (Cadernos Catequéticos n. 10).
DOTOLO, C. - MEDDI, L. Adulti nella fede: itinerari per la formazione del catechista degli
adulti . Bolonha, Dehoniane, 1991 (2 vols.).
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FERRARO, B. Jesus formador de adultos . Revista de Catequese 24 (2001), n. 96, p. 51-62.
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Lumen Vitae/Novalis/Cerf/Labor et Fides, 1997 (cap. 14: La formation des catéchistes ).
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GRESCAT. 5º Encontro Nacional de coordenadores das escolas de formação de
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Metodologias nas escolas de formação de catequistas . Revista de Catequese 21 (1998), n.
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GRUPPO ITALIANO CATECHETI. La formazione dei catechisti. Bolonha, Dehoniane,
1980.
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coordenação da pastoral catequética . Revista de Catequese 21 (1998), n. 81, p. 72-74.
ISTITUTO DI CATECHETICA-UPS (ed.). Formare i catechisti in Italia negli anni ´80,
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. Mística e espiritualidade da catequese e do catequista . Revista de Catequese 17
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Revista de Catequese 21 (1998), n. 81, p. 42-44.
MORANTE, G. I catechisti parrocchiali in Italia nei primi anni ´90: ricerca socio-religiosa.
Leumann (Turim), Elledici, 1996.
NAVARRO GONZÁLEZ, M. Formación de catequistas . Nuevo Dic. Cat., p. 1004-12.

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(1985), n. 29, p. 5-11.
PEREIRA, E. N. A formação cristã de adultos. Petrópolis, Vozes, 1994, 302 p. (cf. recensão de
E. Alberich, Revista de Catequese 18 [1995], n.72, p. 78).
RUTA, G. Programmare la catechesi: teoria e pratica per animatori e catechisti. Leumann
(Turim), Elledici, 1996.
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SORAVITO, L - BISSOLI, C. I catechisti in Italia: identità e formazione: indagine su
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60-69.

361
362
Conclusão:
A fisionomia da catequese renovada

No final de nossa reflexão, parece-nos útil tentar retomar, de forma


sistemática e resumida, os traços mais significativos da fisionomia
renovada da catequese que, ao longo de todo o livro, procuramos
aprofundar e que as circunstâncias atuais e o amadurecimento da
consciência eclesial convidam a acolher.
Vimos que, se por muito tempo a catequese foi concebida
predominantemente como ensino da doutrina cristã por meio do
catecismo , hoje, à luz das novas diretrizes e exigências, ela é entendida
como um serviço da palavra de Deus encarnada em experiências de fé,
tendo diante de si um caminho de crescimento e de amadurecimento,
profundamente inserido num vasto projeto de renovação eclesial. Os
contornos típicos dessa nova fisionomia da catequese podem ser assim
sintetizados:1

UMA NOVA ORIENTAÇÃO DE BASE: CATEQUESE


EVANGELIZADORA

Evoca-se a passagem de uma pastoral de conservação para uma pastoral evangelizadora,


missionária (fim do período de cristandade ).
A catequese, momento essencial do processo da evangelização (DGC n. 63-64), não
pode mais se limitar à promoção do modelo tradicional do bom cristão ou do fiel
praticante , mas deve inspirar sobretudo verdadeiros crentes, a fé personalizada,
despertando a conversão, a opção pelo Evangelho, o gosto e a alegria de ser cristão.
A catequese deve estar a serviço da iniciação cristã (DGC n. 65-68). O primado do ensino
deve dar lugar à preocupação com a iniciação: se antes o interesse se concentrava no
ensino da doutrina, hoje se redescobre a importância única do processo iniciático e,
portanto, também do catecumenato como instrumento de iniciação ou de reiniciação na fé
cristã.

1
A descrição salienta os aspectos de novidade na nova fisionomia da catequese, mas apenas para visar à
clareza, sem nenhum propósito de desqualificar indiscriminadamente a catequese tradicional.
363
UMA NOVA IDENTIFICAÇÃO DOS SUJEITOS
E DOS OBJETIVOS DA CATEQUESE

Do predomínio da catequese infantil e infantilizante, passa-se à catequese dos adultos e


adulta (DGC n. 172-176). A atenção para com o mundo das crianças dá lugar ao
primado da catequese dos adultos e da catequese adulta, sem descuidar da educação
religiosa das crianças e dos jovens. Especial atenção se dá também à educação religiosa
das pessoas com necessidades especiais, muitas vezes esquecidas por parte do trabalho
pastoral.
Amplia-se notavelmente o horizonte da tarefa catequética. De uma catequese
monocórdica , reduzida praticamente à transmissão de conhecimentos religiosos, passa-
se a uma visão mais global da tarefa catequética, que busca uma formação cristã integral
(DGC n.
A catequese predominantemente individual dá lugar à catequese de tipo comunitário.
Ressalta-se o papel necessário da comunidade e do grupo em todo o processo de
crescimento na fé: a comunidade é proclamada condição, lugar, sujeito, destinatário e
meta da catequese (opção comunitária: DGC n. 141, 158, 219-221, 253-257).
Da centralidade da prática religiosa passa-se ao primado do compromisso na fé. Mais que
inclinar-se, como ideal pastoral, para a promoção de fiéis praticantes , sente-se a
necessidade de promover crentes comprometidos , radicados na fé e abertos à atuação no
mundo.
Da catequese preparação para os sacramentos, passa-se à catequese educação da fé
(DGC n. 84). À tradicional orientação devocional da catequese sucede a preocupação
com a educação de atitudes de fé e de amor como liturgia da vida .

364
UMA NOVA VISÃO DO CONTEÚDO DA CATEQUESE

A experiência, antes da doutrina (DGC n. 116-117, 152-153). Em vez de apontar para


a transmissão da doutrina cristã, a catequese deve ser antes de
comunicação de experiências de fé . A experiência cristã de fé constitui o conteúdo
propriamente dito da catequese. Isso não exclui o aspecto doutrinal, mas o integra em
um contexto mais amplo e mais vital.
Da catequese da verdade dada à catequese da verdade dada e prometida . Com
essa expressão se salienta a passagem da transmissão de verdades já possuídas
(catequese apenas de certezas ) a uma catequese que, sem comprometer os
elementos certos e definitivos da fé cristã, privilegia também a dimensão escatológica
da revelação, a verdade que ainda está por vir, permanecendo em certo sentido
incompleta, aberta à pesquisa, à obscuridade do incerto, à paciência da espera.
Do conteúdo depósito cristalizado à mensagem encarnada e inculturada na história.
Em lugar de um conteúdo imutável , não histórico, impermeável às vicissitudes do
tempo, salienta-se a dimensão histórica da revelação e os esforços de encarnação ou
inculturação da fé nos diversos contextos culturais.
Da catequese da verdade à preocupação com o caráter significativo . À obsessão
de uma doutrina teologicamente correta, sucede a exigência de garantir o caráter
significativo , vital, existencial, da mensagem transmitida. Não se ignora a
exigência veritativa , [de verdade], mas se pretende antes de mais nada uma
comunicação catequética que faça sentir o caráter de Evangelho , de boa nova, da
mensagem cristã.
A preocupação com a ortodoxia é substituída pela fidelidade às fontes (primado
absoluto da Sagrada Escritura e centralidade dos Evangelhos: DGC n. 41). A
catequese cuida da guarda dos documentos da fé (DGC n. 85 e 88) e procura
recuperar a credibilidade do testemunho.

365
UMA NOVA PERSPECTIVA PEDAGÓGICA

Da centralidade dos conhecimentos ao primado das atitudes (cf DGC n. 85-86). A


catequese não se esgota no transmitir um patrimônio de conhecimentos religiosos: deve
voltar-se principalmente para a educação de verdadeiras atitudes interiorizadas de fé.
Evangelizar educando e educar evangelizando (DGC n.147). Cresce em importância a
dimensão educativa e promocional da catequese, e leva-se em conta o risco de uma
doutrinação despersonalizante e da busca de refúgio em experiências gratificantes, que
dão segurança e ao mesmo tempo infantilizam. Busca-se uma catequese educativa e
promocional, que respeite o gradualismo e seja capaz de conduzir à maturidade da fé.
De uma comunicação predominantemente verbal à pluralidade de linguagens (DGC n.
208-209). Há um esforço para superar a estreiteza da catequese do catecismo e da
transmissão apenas verbal, abrindo-se a uma multiplicidade de linguagens (relato,
símbolo, celebração, testemunho, arte etc.) e ao vasto mundo dos meios de comunicação
de massa e da comunicação social.
Da pedagogia da assimilação à pedagogia da criatividade. Aspira-se à passagem de uma
catequese de simples assimilação , de pura recepção de um conteúdo professado, a
uma catequese da criatividade e da corresponsabilidade (DGC n.157).

O SURGIMENTO DE NOVOS LUGARES


E NOVOS CAMPOS PARA A CATEQUESE

Catequese comunitária e de grupo: salienta-se o papel da comunidade, do grupo


(DGC n. 159), como lugares por excelência e condição indispensável para o
amadurecimento da fé, o primado da relação sobre o conteúdo e a necessidade da
personalidade comunicativa do catequista.
Envolvimento catequético da família (DGC n. 226-227): atitude muitas
vezes passiva dos pais, que delegam aos outros a educação religiosa dos filhos,
revalorizam-se e promovem-se as possibilidades educativas e catequéticas da família
enquanto célula eclesial e lugar privilegiado de educação da fé (catequese
sobretudo experiencial e ocasional).
Importância da pequena comunidade ou comunidade de base (DGC n. 263-264).
Redescobre-se o potencial evangelizador e catequizador das pequenas comunidades em
nível humano.
Distinção entre catequese e ensino escolar da religião (cf. DGC n. 73-75). Nos dias de
hoje, a escola pública, enquanto lugar de presença da catequese eclesial, revela-se
problemática. Normalmente tende-se a considerar o ensino escolar da religião como
abordagem educativa e cultural do fato religioso.

366
UMA NOVA FISIONOMIA DO CATEQUISTA
E DE SUA FORMAÇÃO

O quase monopólio clerical da catequese tradicional é substituído pela valorização dos


catequistas leigos, do meio do povo, testemunhas de fé no mundo.
Redescobre-se a tarefa do catequista como autêntico ministério eclesial, digno de ser
reconhecido e ratificado no contexto das estruturas e dos projetos pastorais.
Sente-se a necessidade de repensar a formação e de investir na formação. Está superado o
trabalho muitas vezes superficial e improvisado; em vez disso, promove-se uma
espiritualidade mais acurada do catequista e sua profissionalização nas três dimensões
fundamentais: em seu ser (fisionomia interior), em seu saber (bagagem intelectual), e
em seu savoir faire ou competência operativa.

UM NOVO SIGNIFICADO DA CATEQUESE


NA IGREJA E NA SOCIEDADE

De uma catequese visando à sacramentalização, numa perspectiva intraeclesial,


passa-se para uma catequese de iniciação, de linha evangelizadora.
A catequese de conservação , que procura perpetuar a situação existente, deve se tornar
catequese de transformação , a serviço de um novo modelo de crente, de
comunidade, de Igreja.
A um estilo antes predominantemente devocional sucede a preocupação com uma
catequese libertadora e comprometida, atenta à dimensão social e histórica da fé.
Finalmente, a abertura ao encontro e ao diálogo. A uma catequese preocupada com a
defesa exacerbada da própria identidade, sucede um espírito aberto e pronto para o
diálogo, sensível à dimensão ecumênica e capaz de promover o entendimento e a
convivência pacífica entre pessoas de convicções e opiniões diversas.

367
368
Bibliografia geral

Ao longo de todo o manual, e no fim de cada capítulo, apresentamos a


bibliografia mais pertinente às questões tratadas. Aqui limitamo-nos a
oferecer uma seleção de documentos e obras que tratam da problemática
geral do volume.

OBRAS DE REFERÊNCIA

BITTER, G. - MILLER, G. (eds.). Handbuch religionspädagogischer Grundbegriffe. 2 vols.


Munique, Kösel, 1986.
BÖCKER, W. - HEIMBROCK, H. G. - KERKHOFF, E. (eds.). Handbuch Religiöser Erziehung. 2
vols. Düsseldorf, Schwann, 1987.
GEVAERT, J. Studiare catechetica. 4a ed. Roma UPS, FSE, Istituto di Catechetica 1999 (pro
manuscripto).
ISTITUTO DI CATECHETICA (FACOLTÀ DI SCIENZE DELL´EDUCAZIONE)
DELL´UNIVERSITÀ PONTIFICIA SALESIANA DI ROMA. Dizionario di catechetica, sob a
responsabilidade de J. Gevaert. Leumann (Turim), Elledici, 1987 [Diccionario de Catequética.
Madri, Editorial CCS 1987; Diccionari de Catequètica (ed. catalã). Ibid., 1987].
MIDALI, M. - TONELLI, R. (eds.). Dizionario di pastorale giovanile, Leumann (Turim),
Elledici, 1989.
PEDROSA ARES, V. M. et al. (eds.). Nuevo iccionario de atequética. 2 vols. Madri, San
Pablo, 1999. Esta obra será editada no Brasil pela editora Paulus.
SEVESO, B. - PACOMIO L. (eds.). Enciclopedia di pastorale, vol. 2. Annuncio, Predicazione,
Catechesi, Guida personale. Casale Monferrato, Piemme, 1992.
VECCHI, J. - PRELLEZO, J. M. (eds.). Progetto educativo pastorale lementi modulari. Roma,
LAS, 1984.

COLEÇÃO DE DOCUMENTOS OFICIAIS DA CATEQUESE

Os principais documentos do magistério catequético já foram incluídos na lista inicial de


siglas e abreviaturas. Uma relação mais detalhada, com indicação dos respectivos estudos,
comentários e traduções, encontra-se no volume supracitado de J. Gevaert, Studiare catechetica.
Aqui assinalamos algumas coleções de documentos de especial utilidade.

KEVANE, E. (ed.). Teaching the catholic faith today:


. Boston, St. Paul Editions, 1982.
MEDICA, G. M. (ed.). Documenti su catechesi ed evangelizzazione. Leumann (Turim), Elledici,
1988.
MERLOS, F. (ed.). Evangelización y atequesis. Documentos Eclesiales con ndice nalítico.
Tijuana (B. C. México) 1992.
VALLADOLID, J. La educación de la fe según el Concilio Vaticano II. Textos catequéticos
conciliares. Salamanca, Sígueme, 1967.

369
DOCUMENTOS DA CNBB SOBRE CATEQUESE

CNBB. Catequese renovada: orientações e conteúdo. ed. ( edição 1983).


Paulus, 2003. (Documentos da CNBB n. 26).
A DIMENSÃO BÍBLICO-CATEQUÉTICA (anteriormente denominada Linha 3) publicou, na série
verde Estudos da CNBB os seguintes títulos, sempre pela Editora Paulus, elencados a seguir em
ordem cronológica:
Textos e manuais de catequese: orientações para sua elaboração, análise e avaliação
(n.53), 1987.

Primeira Semana Brasileira de Catequese (n. 55), 1987.


Formação de catequistas: critérios pastorais (n. 59), 1990.
Orientações para a catequese de crisma (n. 61), 1991.
Catequese para um mundo em mudança (n. 73), 1994.
O hoje de Deus em nosso chão (n. 78), 1998.
Com adultos catequese adulta (n. 80), 2001.
O itinerário da fé na iniciação cristã de adultos (n. 82), 2001.
Segunda Semana Brasileira de Catequese (n. 84), 2002.
Crescer na leitura da Bíblia (n. 86), 2003.

MOVIMENTO CATEQUÉTICO E SITUAÇÃO DA CATEQUESE

Para uma visão de conjunto da situação da catequese, em termos gerais e em alguns


países, especialmente no período pós-conciliar e na atualidade, sugerimos:
ALBERICH, E. La catechesi nei documenti della Chiesa lationoamericana: da Medellín a Puebla .
In: ISTITUTO DI CATECHESI MISSIONARIA della PONT. UNIV. URBANIANA (ed.).
Andate e insegnate: commento all´Esortazione Apostolica Catechesi Tradendae di Giovanni
Paolo II. Bolonha, Ed. Missionaria Italiana, 1980, p. 616-32.
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. La catechesi alla fine di un secolo: crisi e esperanze . Orientamenti Pedagogici 46
(1999), n. 6, p. 1097-108.
ALVES DE LIMA, L. A catequese na América Latina a partir do Vaticano II . Medellín 23
(1997), n. 89, p. 5-66.
. Análise da realidade catequética . Revista de Catequese 20 (1997), n. 80, p. 24-30.
. O recente movimento catequético brasileiro . Revista de Catequese 19 (1996), n. 73,
p. 5-24.
. Panorámica de la renovación catequética brasileña de los últimos años . Medellín 18
(1992), n. 72, p. 795-817 (também em: Teología y Catequesis [1993],n. 45-48, p. 369-95).
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acogida del Vaticano II . Teologia y Catequesis (1982), n. 1, p. 45-64. La catechesi a 10 anni
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MANUAIS E OBRAS GERAIS DE CATEQUÉTICA

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. O novo Diretório Geral para a catequese e o Catecismo da Igreja Católica no
contexto do movimento catequético . Revista de Catequese 21 (1998), n. 82, p. 12-25.
. O querigma e sua relação com a catequese . Medellín 24 (2000), n. 104, p. 547-64.
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