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OS MOVIMENTOS SOCIAIS

COMO POLÍTICA
E “COM, CONTRA E PARA ALÉM DE CHARLES
TILLY”

PROF. DR. RICHARD ROMANCINI


PPGCOM – ECA/USP
TILLY E OS MS

• Autor profícuo, seminal e influente no campos


de estudo dos MS.
• No texto em questão, propõe a definição de
Movimento social como uma “forma política
(particular) inventada”, que se pode localizar
no tempo e em determinado espaço.
• Movimentos na história: análise diacrônica
mostra a motivação de certos traços centrais
dos MS e identifica as mudanças pelas quais
Charles Tilly (EUA, 1929- eles passam. Por exemplo, o fato de que os
2008) protestos e manifestações dirigem-se cada vez
menos às pessoas próximas (mas com menos
poder de decisão) do que aos representantes
legislativos e ao governo. Ou ainda a correlação
entre os MS e democratização.
UMA DEFINIÇÃO MÍNIMA DE MS, PARA TILLY

• Um movimento social, para Tilly pode ser


visto como a síntese de três elementos:
1- Esforço público, organizado e
sustentado para encaminhar
reivindicações coletivas às autoridades
pertinentes (campanha);
2- Uso combinado de determinadas
formas de ação política: reuniões públicas,
vigílias, marchas, petições (repertório)
3- Demonstrações públicas de valor,
unidade, números e compromisso (WUNC
- worthiness, unity, numbers e
commitment)
WUNC

San Marcha das


Francisco Vadias
Pride, 2005 Brasília,
2011

• Valor: condutas; trajes; tipos de


participantes e formas de participação.
• Unidade: emblemas iguais; faixas;
vestuário; canções; hinos.
• Número: contagem de participantes;
assinaturas de petições; ocupações de
espaços públicos.
March for
• Compromisso: participação sob quaisquer Life, 2012
(EUA?)
circunstância (tempo ruim, possível
repressão), com eventual sacrifício
TESES PRINCIPAIS DO TRABALHO - I

• Desde seu surgimento no século


XVIII, os MS não progridem apenas
pelas ações individuais, mas também
graças às campanhas interativas.
• Os movimentos sociais combinam três
tipos de reivindicações:
programáticas (demandas),
identitárias (quem somos, WUNC) e de
posicionamento (quem é parte ou
aliado do MS e quem está fora ou é Adesivo, anti-imigrantes (Colorado, EUA)
combatido pelo movimento).
• A importância relativa das
reivindicações programáticas,
identárias e de posicionamento
variam entre um MS e outro, dentro
dele e nas diferentes fases do MS.
TESES PRINCIPAIS DO TRABALHO - II

• A democratização fomenta a
formação de movimentos sociais.
• Os MS afirmam a soberania
popular. (Mesmo que um MS seja
antidemocrático, o consentimento
popular que os caracteriza faz com
que MS confrontem formas
dominação que não levem em conta Fonte: Tilly (2010)
a vontade popular.)
• Comparados com outras formas de
política popular de ação mais local,
os MS (principalmente modernos)
dependem fundamentalmente de
empreendedores políticos
(indivíduos e organizações – Martin Luther
King Jr.
aspecto que a TMR enfatiza).
TESES PRINCIPAIS DO TRABALHO - III

• Apesar de relacionados a um
contexto político determinado, os MS
podem ser fomentados a outros
contextos, por processos imitativos,
relacionados à comunicação e à
colaboração.
• As formas, os participantes e as
Comemoração na Praça Tahrir (Egito) após renúncia de
reivindicações dos MS variam e Hosni Mubarak (2011)

estão sujeitas a um processo de


evolução histórica.
• Enquanto uma instituição inventada,
o MS poderá desaparecer ou se
transformar profundamente (podem
ser proibidos num mundo não
democrático ou podem dar forma a
uma “democracia 2.0” [Gerbaudo]) Protesto de estudantes secundaristas em São Paulo, em
2015
QUESTÃO PARA DEBATE
POSSÍVEIS VANTAGENS E DESVANTAGEM

VANTAGENS
•Do ponto de vista dos próprios atores, ser entendido como
membro de um “movimento social” é bem melhor do que ser visto
como participante de um episódio nomeado como “distúrbio”,
“confusão”, “baderna” ou “bagunça”. A expressão MS adquiriu
legitimidade e atratividade ao longo do tempo.
•Da perspectiva teórica, identificar um fenômeno no que ele tem de
distintivo, aproximando-se mais ou menos de um MS, é relevante,
pois permite pensar sobre a utilização (ou não) das teorias do campo
que explicam esse tipo de ação coletiva.
•É muito importante evitar a tendência de ver toda mobilização
social que possui elementos de WUNC como MS, pois algumas não
se situam exatamente nesse âmbito – por exemplo, os partidos
políticos, as mobilizações feitas por empresas, igrejas e as próprias
“organizações de movimento social” (como o Greenpeace).
POSSÍVEIS VANTAGENS E DESVANTAGEM
DESVANTAGEM
•Tanto em termos práticos,
quanto teóricos, o rótulo
“movimento social”, aplicado
a alguma ação coletiva, pode
fazer com que se esqueça de
que a “unidade” recobre
disputas (internas) e
diferenças, que dão variação
ao MS, inclusive ao longo do Grupo black bloc em marcha perto do Banco Mundial, em Washington, D.C.,
2009
tempo.
“COM, CONTRA E PARA ALÉM DE CHARLES TILLY:
MUDANÇAS TEÓRICAS NO ESTUDO DAS AÇÕES
COLETIVAS E DOS MOVIMENTO SOCIAIS”

No artigo em questão, o autor, Breno Bringel, procura


apontar contribuições e limites da perspectiva de
Charles Tilly sobre os MS

Em termos de avanços produzidos por Tilly destaca:


•Imbricar a história (com abordagem de longa duração e perspectiva
comparada) com a sociologia (de processos sociais amplos:
proletarização, urbanização, etc.)
•Metodologia macrossociológica
•Forma inovadora de analisar os conflitos sociais
•Estudo das ações coletivas e dos movimentos sociais per se,
destacando o “caráter contingente, interativo, complexo e relacional da
história e dos processos sociais” (p. 46).
“COM, CONTRA E PARA ALÉM DE CHARLES TILLY:
MUDANÇAS TEÓRICAS NO ESTUDO DAS AÇÕES
COLETIVAS E DOS MOVIMENTO SOCIAIS”

Ainda em termos positivos, Tilly desenvolveu ou projetou


conceitos como:
•“repertório de contestação”: produção de demandas se concentra
em uma quantidade limitada de formas, que se repetem com variações
mínimas e constituem a coleção (ou repertório) dentro das quais os
potenciais atores selecionam de maneira mais ou menos deliberada.
Exemplo de repertório: greve, sequestro, destruição de máquinas, etc.
•“ciclos de protesto” (que Tarrow desenvolve mais amplamente):
uma fase de intensificação dos conflitos e da confrontação no sistema
social, que inclui uma rápida difusão da ação coletiva dos setores mais
mobilizados aos menos mobilizados, um ritmo de inovação acelerado
nas formas de confronto
“COM, CONTRA E PARA ALÉM DE CHARLES TILLY:
MUDANÇAS TEÓRICAS NO ESTUDO DAS AÇÕES
COLETIVAS E DOS MOVIMENTO SOCIAIS”

Tilly e as correntes teóricas aos quais esteve mais relacionado


também foi criticado (e fez autocríticas) quanto:
•“Estruturalismo” (da teoria da mobilização de recursos e do
processo político) é visto como excessivamente estático e com pouco
espaço para a ação/subjetividade dos atores (MS como “ação sem
atores” [Melucci])
•Daí também o excessivo peso analítico dado às relações dos MS com
o Estado e o sistema político
•Amplitude da comparação (ligada fundamentalmente à TPP):
impossibilita “gerar uma causalidade sistemática a partir de
comparações tão amplas” (p. 51)
“COM, CONTRA E PARA ALÉM DE CHARLES TILLY:
MUDANÇAS TEÓRICAS NO ESTUDO DAS AÇÕES
COLETIVAS E DOS MOVIMENTO SOCIAIS”

Por fim, Bringel aponta alguns desafios para os estudos dos MS


que se colocam no horizonte “pós-tillyano”
•Espacialização das ações coletivas e MS. “Assim como para Tilly a
história e o tempo não são meros contextos, o lugar e o espaço devem
ser entendidos como esferas de luta e elementos definidores do
movimento social” (p. 54).
•Abertura disciplinar do campo: é impossível, por exemplo, pensar o
espaço sem apoio dos geógrafos, a comunicação sem os
comunicólogos, etc.
•Atualização do debate epistemológico sobre a “interação do
mundo militante com o mundo acadêmico na produção de
conhecimento” (p. 54), o que, para o autor, pode significar a
atualização do pensamento de cientistas sociais como Falls Borda e
outros (“pesquisa-ação-participativa”)
“COM, CONTRA E PARA ALÉM DE CHARLES TILLY:
MUDANÇAS TEÓRICAS NO ESTUDO DAS AÇÕES
COLETIVAS E DOS MOVIMENTO SOCIAIS”

“é possível e necessário conciliar o


compromisso militante e a análise da
vida social, sempre que a opção seja
uma proximidade, empatia e trabalho
com os movimentos sociais que não
suponha uma cegueira analítica que se
limite a reproduzir a voz dos atores
sociais em vez de produzir
conhecimento crítico” (p. 57).

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