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RESENHA

HUNT, E. K. Utilitarismo puro versus utilitarismo eclético: os escritos de Bastiat e Mill.


In: HUNT, E. K. História do pensamento econômico: uma perspectiva crítica.
2. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005. p.166-191.

1. Sobre o autor

Eli K. Hunt é professor de Economia da Universidade de Utah. Sua pesquisa


concentra-se nas áreas da história do pensamento econômico, na Teoria Econômica de
Marx e na Economia do Bem-Estar. No livro história do pensamento econômico o autor
evidencia os acontecimentos que influenciaram o debate acerca da economia; analisa
teorias e as condições para que tenham surgido, e, como marxista que é, aponta o caráter
falacionista de uma economia livre de questões de valores (morais).

Fréderic Bastiat

Nascido em 1801 e falecido em 1850, Bastiat viveu o período das


movimentações sociais e dos debates socialistas. Foi economista e jornalista, e sua obra
de destaque se intitula “Economic Harmonies”. Sua obra fez grande contraponto a John
Mill.

John Stuart Mill

Nascido em 1807 e falecido em 1873. Grande defensor da teoria utilitarista,


pensamento este herdado de seu tutor Jeremy Bentham. Foi um dos economistas mais
influentes de sua época. Economista e filósofo.

2. Resumo da obra

Nas teorias dos pensadores clássicos, quer dizer, de Smith e Ricardo, as


perspectivas da utilidade e do trabalho permeavam simultaneamente os trabalhos, e, nos
dois casos, levavam a perspectivas e conclusões conflituosas. Elas poderiam chegar ao
conflito de classes ou a harmonia social.

No período de 1820 à 1850 os movimentos sociais e o debate socialista se


difundiu, dada a infelicidade dos trabalhadores nos postos de trabalho, as diferenças de
riqueza e poder e os efeitos de morais de um individualismo. O reflexo que se deu nas
teorias econômicas e na mente de sujeitos conservadores foi à busca do desenvolvimento
de uma economia que excluísse o âmbito moral da teoria e que justificasse essa realidade.
Logo a teoria econômica caminhou para o viés utilitarista.

Nessa gama de discussões dois autores se destacaram, e travaram grandes


debates. A obra de John Stuart Mill tentava conciliar conceitos de utilidade e trabalho –
talvez o último grande esforço de reunir as duas vertentes em uma mesma obra -, já a
obra de Fréderic Bastiat representava o amadurecimento das conseqüências lógicas das
teorias utilitaristas1.

Bastiat procurou excluir os ataques à propriedade privada; estabeleceu status de


“santidade” tanto a esta como ao capital, o lucro e a distribuição da riqueza, ou seja, os
componentes básicos do capitalismo concorrência; negou o conflito de classes e apelou
para a “autoridade da ciência”. Para ele todas as intenções e relações humanas se davam
simplesmente pelo interesse de troca, pois

“o próprio fato de ser feita uma troca é a prova de que tem haver lucro
para ambas as partes contratantes; caso contrário, a troca não seria feita.
Por isso toda troca representa ganhos para a humanidade” (BASTIAT,
1964 apud HUNT, 2005, p. 169).
E, considerando o esforço humano produtivo como um serviço, afirmou que capitalistas e
proprietários de terra – possuidores da benção divina da posse - também
prestavam serviços e, portanto, também sentiam dor. Sendo assim mostrou que
todos se “beneficiavam” com o cumprimento rígido das leis da propriedade e da
livre troca; havia senão uma “harmonia social”.

Mill afirmava que as leis da propriedade da distribuição da riqueza que foram


mudadas no passado e mudariam no futuro; para ele, portanto, a distribuição da riqueza
dependia daquilo que a sociedade criou. E, talvez, tenha ido de encontro não só a Bastiat
mas, possivelmente, a toda teoria utilitarista, quando coloca o conceito de prazeres
superiores ou mais nobres - “era melhor ser um Sócrates insatisfeito do que um tolo
satisfeito” (MILL, 1951 apud HUNT, 2005, p.179). Assim subentendeu-se que, quiçá, as
categorias harmônicas não ocorressem tal como dito por Bastiat. Para a melhor
distribuição da riqueza, relevou o papel da organização dos trabalhadores para “disputar”
1
Conceito de utilidade: “A natureza colocou a humanidade sob o domínio de dois mestres soberanos, a dor
e o prazer.... Só eles podem mostrar o que devemos fazer, bem como determinar o que faremos...Eles nos
governam em tudo o que fazemos, em tudo o que dizemos, em tudo o que pensamos” (BENTHAM, 1789
apud HUNT, 2005, p. 124)
maior parcela no fundo das remunerações; creditou ainda grande papel à educação como
meio que promovesse entendimento da necessidade de politização e reivindicação.
Portanto, os “salários eram determinados mais por fatores sociais e políticos do que por
fatores econômicos estritamente definidos” (HUNT, 2005 p. 183).

Para Mill os indivíduos poderiam, através da educação, elevar seu espírito. O


socialismo ao seu ver não seria possível naquele momento, mas tão somente quando
houvesse um amadurecimento geral do caráter das pessoas.

Mill condenava a injustiça de que, enquanto a imensa classe da população


estaria condenada ao trabalho ininterrupto para uma precária subsistência, uma minoria
gozaria da vida sem ter mérito de tê-las adquirido por esforço próprio. Defendia assim o
imposto sobre a herança, a fim de restringir a acumulação de riqueza nas mãos daqueles
que não as obtiveram por esforço próprio. Para ele “quando os ricos se contentassem em
ser ricos e não reivindicarem, por isso, privilégios políticos, seu interesse e o dos pobres
serão em geral os mesmos” (MILL, 1984 apud HUNT, 2005, p. 191). Ele acreditava
cegamente no desenvolvimento do espírito do homem e, de fato, isso não ocorreu.

3 – Conclusão do resenhista

Neste capítulo que trata sobre o utilitarismo puro e o utilitarismo eclético


evidenciado através do debate de Bastiat e Mill, vemos diferentes pontos e conclusões a
partir do mesmo ponto de vista: o utilitarismo.

Bastiat evidencia muito bem os benefícios da troca e a necessidade de uma


conjunção social para a produção. Os indivíduos em uma dada situação obteriam
proveitos com a troca - aliás, segundo Bastiat, a troca só é realizada porque há benefícios
para ambas as partes. Porém, como Mill evidencia, muitas das decisões do salário são
muito mais políticas do que necessariamente técnicas, como Bastiat imaginava, e,
portanto, um avanço no caráter dos homens era necessária assim como a organização
sindical.

Mill coloca um conceito que talvez o afaste da teoria utilitarista, mas que é
fundamental em seu pensamento, tanto para a distinção de desigualdade – que para
Bastiat era dada como harmonia - como para a sua preocupação com a felicidade geral:
os prazeres superiores. Seria necessário então que os indivíduos amadurecerem seu
pensamento, e, ao conhecerem os dois lados, e entenderem qual é o melhor. Isso refletia
no seu pensamento econômico, contrariando a afirmação de Bentham de que “apertar
parafusos seria tão bom quanto fazer poesias”. Assim o trabalho seria altamente penoso e
a o gozo do esforço de outrem sem ter contribuído para tal seria - e é – uma causa de
injustiça social.

O conceito de prazeres superiores será de contribuição ao projeto de estudo, pois


colocará em discussão a efetiva capacidade de maximização de felicidade dos indivíduos
a partir de si; levanta ainda a discussão de tal como, na realidade, as influências políticas
para as causas da desigualdade.

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