Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Resenha Wolfflin PDF
Resenha Wolfflin PDF
Segundo Jörn Rüsen, uma análise metodológica de uma específica obra historiográfica
pode ser feita com base em quatro etapas processuais inter-relacionáveis, a fim de dar sentido
às perspectivas orientadoras do passado humano, transformando-as em História. Os processos
são: carência, heurística, crítica e interpretação.
A carência de orientação ocorre quando certas respostas previamente dadas se
mostram insuficientes para a resolução de questões levantadas pelo sujeito. Esta crise servirá
de motivação para a escolha do objeto que será investigado. A próxima etapa é a metodização
heurística do conhecimento, ou seja, a formulação da pergunta fundamental que irá orientar a
pesquisa histórica. Para dar sentido a esse questionamento, a crítica das fontes torna-se
necessária. Ela regula o processo cognitivo a partir da coleta intersubjetivamente selecionada
de documentos, dados (ou fatos) e informações pertinentes. Por fim, a interpretação constrói
a inteligibilidade da narrativa, pois articula as informações obtidas através da crítica,
transformando-as em História e, ao mesmo tempo, busca suplantar a carência inicial,
respondendo à pergunta e desenvolvendo a hipótese lançada.
Tendo como base as etapas descritas acima, o objeto escolhido para a elaboração de tal
análise é o livro Conceitos Fundamentais da História da Arte, de Heinrich Wölfflin, lançado
pela primeira vez em 1915. Tal obra é considerada um clássico da historiografia relacionada à
arte, mais especificamente, à teoria estética moderna. Esta obra surgiu a partir da necessidade
de se estabelecer uma base mais sólida às características estilísticas referentes à História da
Arte. Para isso, Wölfflin faz uma análise pormenorizada de pinturas, desenhos, esculturas e
obras arquitetônicas de grandes artistas renascentistas e barrocos, com o objetivo de mostrar a
evolução interna dos estilos e definir categorias permanentes da arte.
Assim sendo, a carência de Wölfflin está relacionada a essa necessidade de
elaboração de um constructo teórico mais solidificado, relativo às características de estilo na
História da Arte. Para ele, existem estágios evolutivos da concepção visual que precisam ser
levados em conta pelo historiador, para que este determine com maior precisão as
*
Graduanda em História pela UNIRIO (Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro) – IC/CNPq
1
Marcelo de Mello Rangel; Mateus Henrique de Faria Pereira; Valdei Lopes de Araujo
(orgs). Caderno de resumos & Anais do 6º. Seminário Brasileiro de História da
Historiografia – O giro-linguístico e a historiografia: balanço e perspectivas. Ouro Preto:
EdUFOP, 2012. (ISBN: 978-85-288-0286-3)
1
Termo utilizado pelo autor.
2
Marcelo de Mello Rangel; Mateus Henrique de Faria Pereira; Valdei Lopes de Araujo
(orgs). Caderno de resumos & Anais do 6º. Seminário Brasileiro de História da
Historiografia – O giro-linguístico e a historiografia: balanço e perspectivas. Ouro Preto:
EdUFOP, 2012. (ISBN: 978-85-288-0286-3)
admitir que ele tenha sido a expressão de um caráter nacional ‘permanente’ na mesma
extensão em que foi a arte holandesa contemporânea” (WÖLFFLIN, 2006: 11).
Segundo Wölfflin, o espírito de uma nova época exige uma nova forma de estilo. A
transição do Renascimento para o Barroco é um exemplo bem elucidativo. O Renascimento
italiano é caracterizado pelo ideal da proporção perfeita, do completo, limitado e concebível.
Já o Barroco oferece o ideal do movimento, da emoção, aquilo que é mutável e ilimitado. O
estilo é tido, portanto, como expressão do espírito de uma época, de uma nação e de um
temperamento individual, a partir de suas considerações.
No entanto, quais são as condições que determinam o estilo dos indivíduos, das épocas
e dos povos? A expressão (temperamento, raça e época) e a qualidade de uma obra são
insuficientes para resolver tal questão. É necessário um terceiro elemento: o modo de
representação, isto é, as técnicas. Este é o ponto central da análise de Wölfflin.
Para simplificar o estudo, Wölfflin considera os séculos XVI e XVII como unidades
de estilo, mas, ao mesmo tempo, atenta ao fato de que estes períodos não apresentam uma
produção homogênea. Contudo, os estágios que antecederam o Renascimento não podem ser
ignorados, pois, embora representem um estilo arcaico de arte (os Primitivos), não possuem
uma forma plástica definida.
As diferenças individuais que levaram à mudança de estilo destes séculos podem ser
resumidas, segundo o autor, a partir de cinco pares de conceitos: a) evolução do linear ao
pictórico; b) evolução do plano à profundidade; c) evolução da forma fechada à forma aberta;
d) evolução da pluralidade para a unidade; e) clareza absoluta e relativa do objeto. As
transformações são também observadas sob o ponto de vista nacional e histórico. A evolução
3
Marcelo de Mello Rangel; Mateus Henrique de Faria Pereira; Valdei Lopes de Araujo
(orgs). Caderno de resumos & Anais do 6º. Seminário Brasileiro de História da
Historiografia – O giro-linguístico e a historiografia: balanço e perspectivas. Ouro Preto:
EdUFOP, 2012. (ISBN: 978-85-288-0286-3)
descrita por Wölfflin não possui um caráter qualitativo, mas sim, demonstra uma nova postura
diante do mundo.
Para melhor exemplificar os conceitos evolutivos destacados, em cada capítulo,
Wölfflin analisa e contrapõe diferentes obras de grandes artistas – Dürer, Rembrandt, Rubens,
Holbein, Velásquez, Rafael, Bernini e outros – referentes aos séculos XVI e XVII, ao
Renascimento e Barroco respectivamente. A fim de que o leitor observe melhor as diferenças
de estilos, as obras utilizadas como exemplo possuem sempre um mesmo motivo e tema. A
comparação perpassa pelo âmbito da pintura, do desenho, da escultura e da arquitetura. A
caracterização da crítica é baseada, portanto, em uma análise comparativa entre duas ou mais
obras de arte.
Como vimos anteriormente, o autor procura analisar a evolução dos estilos artísticos a
partir de cinco pares de conceitos, caracterizados capítulo a capítulo. Neste momento, procuro
estabelecer a relação entre estilo e interpretação através da análise desses capítulos.
4
Marcelo de Mello Rangel; Mateus Henrique de Faria Pereira; Valdei Lopes de Araujo
(orgs). Caderno de resumos & Anais do 6º. Seminário Brasileiro de História da
Historiografia – O giro-linguístico e a historiografia: balanço e perspectivas. Ouro Preto:
EdUFOP, 2012. (ISBN: 978-85-288-0286-3)
5
Marcelo de Mello Rangel; Mateus Henrique de Faria Pereira; Valdei Lopes de Araujo
(orgs). Caderno de resumos & Anais do 6º. Seminário Brasileiro de História da
Historiografia – O giro-linguístico e a historiografia: balanço e perspectivas. Ouro Preto:
EdUFOP, 2012. (ISBN: 978-85-288-0286-3)
Figura 3: Massys, Quentin (c. 1466-1530), Pietá (peça Figura 4: Rubens, Peter Paul (1577-1642) Pietá, ass. "P. P.
central de um tríptico). Pintura em madeira, 260x273. RUBENS", pintura em madeira, 40,5x52,5. Viena.
Antuérpia.
do plano. No que diz respeito à Pietá de
Rubens (Fig. 4), nota-se que o estilo de representação barroco é empregado, visto que a
sensação de profundidade é bastante enfatizada vide, principalmente, ao corpo de Cristo.
Toda obra de arte deve ser vista em sua totalidade, fechada, porém a arte clássica e
arte barroca interpretam essa exigência de formas distintas. A forma fechada, com base
tectônica e típica do Renascimento, apresenta a imagem em uma realidade limitada. Os
objetos retratados são ordenados em torno de um eixo central, no qual os ângulos e as linhas
verticais e horizontais se tornam elementos importantes. A arte clássica, portanto, busca uma
simetria estável, um equilíbrio perfeito entre as partes do quadro.
A forma aberta e atectônica, pelo contrário, busca o ilimitado e assegura o caráter
fechado no sentido estético. A arte barroca recusa a fixação do eixo central e vê a estruturação
rígida do estilo clássico como sendo contrário à idéia de realidade. O emprego da diagonal
prevê isto ao negar o uso de ângulos retos nas obras e o equilíbrio estável se transforma em
instável, ao passo que a simetria é somente sentida como algo natural. “É perfeitamente
possível a ocorrência de ordenações simétricas, mas o quadro, em si, não é estruturado
simetricamente.” (WÖLFFLIN, 2006: 172)
Figura 5: Scorel, Jan van (1495-1562), Madalena. Pintura em
madeira, 67x76,5. Amsterdam.
6
Marcelo de Mello Rangel; Mateus Henrique de Faria Pereira; Valdei Lopes de Araujo
(orgs). Caderno de resumos & Anais do 6º. Seminário Brasileiro de História da
Historiografia – O giro-linguístico e a historiografia: balanço e perspectivas. Ouro Preto:
EdUFOP, 2012. (ISBN: 978-85-288-0286-3)
d) A evolução da
pluralidade para a unidade
7
Marcelo de Mello Rangel; Mateus Henrique de Faria Pereira; Valdei Lopes de Araujo
(orgs). Caderno de resumos & Anais do 6º. Seminário Brasileiro de História da
Historiografia – O giro-linguístico e a historiografia: balanço e perspectivas. Ouro Preto:
EdUFOP, 2012. (ISBN: 978-85-288-0286-3)
Figura 9: Cleve, Joos van (Mestre da Morte de Maria, c. 1485- Figura 10: Tintoretto (Jacopo Robusti, 1518-1594), Pietá.
1540), Pietá. Pintura em madeira, 145x206. Paris Pintura em tela, 226x292. Veneza, Academia.
8
Marcelo de Mello Rangel; Mateus Henrique de Faria Pereira; Valdei Lopes de Araujo
(orgs). Caderno de resumos & Anais do 6º. Seminário Brasileiro de História da
Historiografia – O giro-linguístico e a historiografia: balanço e perspectivas. Ouro Preto:
EdUFOP, 2012. (ISBN: 978-85-288-0286-3)
“[...] o valor expressivo em nossos conceitos esquemáticos (grifo meu) deve ser
determinado de um modo muito (grifo do autor) geral. É bem verdade que eles
possuem um aspecto espiritual e, se por um lado podem ser considerados
relativamente inexpressivos para caracterizar um artista em particular, por outro são
altamente reveladores, quando se trata de determinar a fisionomia geral de cada época
[...].” (WÖLFFLIN, 2006: 336)
- Referências
9
Marcelo de Mello Rangel; Mateus Henrique de Faria Pereira; Valdei Lopes de Araujo
(orgs). Caderno de resumos & Anais do 6º. Seminário Brasileiro de História da
Historiografia – O giro-linguístico e a historiografia: balanço e perspectivas. Ouro Preto:
EdUFOP, 2012. (ISBN: 978-85-288-0286-3)
10