FICHAMENTO
Os autores iniciam o texto com o seguinte questionamento “por que, em plena ‘era da
globalização”, é preciso voltar à época colonial para estudar a formação econômica e social do Brasil
no período republicano?” (p.12). Em si essa indagação carrega outras igualmente plausíveis, haja
vista que não se pode entender o contexto ao qual o país encontra-se inserido sem regressamos na
história. Mas a necessidade desse estudo, segundo ele é visto nos “vestígios da época colonial” que
ainda sobrevive alguns de forma quase “natural” na sociedade de hoje.
A colonização experimentada pelo Brasil esteve alicerçada em três elementos chave, segundo
os autores citando Prado Jr. (1949), a saber a “grande propriedade, a monocultura e o trabalho
escravo” (p.13). Ao apontar a lógica argumentativa daquele, afirma que a colonização do país sempre
esteve envolta em um sentido, a saber, produzir volumes relevantes de produtos que apresentassem
um caráter comercial para o mercado europeu. Este sentido, determinou a forma como a economia
colonial se estruturou, os autores ressaltam que a grande propriedade era condição relevante para que
a demanda externa fosse atendida pela colônia. Somada a esta estrutura a especialização produtiva e
o trabalho escravo (indígena ou africano) completavam “esqueleto” colonial.
Fernando Novais, parte da análise de Prado Jr para realizar uma ampliação do sentido da
colonização do país, apontando que esta esteve condicionada também a uma transição da estrutura
feudal para a capitalista (p. 15). Como pode ser visto na passagem “examinada a colonização do Novo
Mundo na Época Moderna [...] a conotação do sentido profundo [desta é] comercial e capitalista, isto
é elemento constitutivo do processo de formação do capitalismo moderno” (p.15) (apud Novais,
1979, p 70). Nesse sentido a própria lógica da acumulação primitiva encontra-se no pano de fundo da
constituição dos sistema colonial que permitia lucros elevados por apresentar aquilo que os autores
citando Novais, (1979) definem como “exclusivo metropolitano do comércio colonial” (p. 16).
Ressalta-se que os autores tecem um esforço em diferenciar a visão de Prado Jr da visão de
Novais, mas observa-se uma complementariedade entre ambos na medida em que o primeiro aponta
o abastecimento do comércio europeu como o foco da colonização, mas o segundo tem a pretensão
de apresentar uma análise mais profunda que converge para a anterior. É interessante ressaltar que a
incorporação da mão de obra escrava (indígena ou/e africana) esteve sustentada na necessidade de
manter a geração de excedentes em bases concentradoras de renda. Observa-se que esse é um ponto
que ainda é visível no sociedade brasileira do século XXI, haja vista que a concentração de renda
mesmo em caráter distinto do período colonial, ainda se faz marcante. Os autores citando Novais
afirmam que a transição da mão de obra escrava indígena para a escrava africana consistia parte do
processo de acumulação primitiva.
Os autores citando Jacob Gorender propõem uma análise diferente dos autores anteriores na
medida em que segundo ele é o modo de produção escravista que irá determinar a forma de produção
colonial (p.18), afirmando que “são as próprias condições da produção que exigem a introdução do
escravo e não fatores externos à produção colonial”.
Para Caio Prado Jr, em consonância com sua visão do sentido da colonização, visto pelo frutos
continuamente gerados na colônia, não havia motivos para alterações na forma de organização
produtiva. No entanto ele aponta que existia, mesmo que inexpressivas, atividades que tinham como
objetivo atender ao mercado interno, mas que foram incapazes de promover alterações estruturais
relevantes.
Celso Furtado compartilha da mesma ideia com uma argumentação diferente, aponta que não
havia estímulos a inovação e portanto, era natural que não houvesse alterações estruturais. Assim, os
autores afirmam que “Furtado é levado à conclusão de que a estrutura da economia colonial era
extremamente resistente à mudança, fundamentalmente pela presença do trabalho escravo” (p.22).
Jacob Gorender, afirma que a limitada transformação vivida pela colônia brasileira que limitou o
progresso técnico, é explicado em parte “pela própria natureza da relação social escravista” (p.23).
Assim, observa-se que existe um consenso sobre as poucas mudanças vividas pela economia colonial,
todavia os argumentos são diferentes.
Uma importante mudança na relação produtiva da ex-colônia é que os interesses que devem
ser atendidos são aqueles das classes internas ainda “embrionárias” que conseguem influenciar a seu
favor o exercício do Poder Estatal – ressalta-se que este nasce endividado para com os banqueiros
ingleses. Mas, é importante mencionar que o país pode assumir internamente as decisões de investir
o excedente outro remetido ao exterior como apontado por João M. Cardoso de Mello (p.25).
Furtado afirma que o desequilíbrio interno é recorrente no mercado cafeeiro brasileiro, e como
solução era utilizada a desvalorização das moeda, impondo custos aos importadores nacionais,
apelidado pelos autores de “socialização das perdas”, mas observa-se que parte importante dessa
renda era apropriada pelos grandes produtores e exportadores de café. Furtado afirma que as
condições externas e internas estava criando as bases para a possibilidade da industrialização.
Existem duas visões para a compreensão de uma possível relação entre abolição do escravismo
e o surgimento da república. De um lado, como defendido por Furtado, temos a necessidade de
atender os interesses individuais dos produtores de café e ressalta que a abolição foi um fato de
interesse político, visto que não houve alteração da forma de produção. No tocante a proclamação
Furtado observa-a como uma busca por “autonomia regional” (principalmente pelos sulistas) é
incompatível com a forma política centralizador vigente.
Do outro lado, tem-se Jacob Gorender que propõe como fatores explicativos para o fim da
abolição, a própria autodeterminação dos escravos visto pelas fugas, revoltas que apontavam para um
movimento de “luta de classes” entre outros movimentos que corroboraram com necessidade de
mudanças. Décio Saes segue na mesma perspectiva de Gorender atribuindo papel relevante para as
classes “marginalizadas” (escravos e classe média) ambas agindo em função de interesses próprios.
Os autores iniciam apontando que a conceituação de política de café com leite característica
do período da Primeira República escamoteia uma diversidade de outras atividades produtivas que
tinham espaço no mercado doméstico bem como no cenário exportador. Ressalta-se que um fato
relevante para este contexto é o surto de industrialização que configurou a urbanização das cidades
onde surgiram o que evidencia um nível de complexidade relevante da economia nacional. O objetivo
desse capítulo será investigar a relação entre o café e a indústria, ou seja, “como a indústria nasce
com base nas condições criadas pela expansão da economia cafeeira, e nos limites a que o crescimento
da indústria está sujeito nesse período” (p.40).
A república contou com a participação de dois grupos sociais, o primeiro deles composto por
produtores de café que visavam maior autonomia para comercialização e produção deste. Do outro
estava os integrantes das classes médias urbanas que visam maior participação nas questões políticas
com o fim do regime imperial. Não se deve no entanto, esquecer que o militares tiveram relevante
papel no processo em questão.
Foi, portanto, com Campos Sales e sua “Política dos Governadores” que se
consolidou o caráter oligárquico da Primeira República: às fraudes dos sistema
eleitoral se somava agora a articulação do governo da União com as oligarquias
estaduais num esquema que dificilmente poderia ser rompido pelas oposições.
(SAES, et all, ano, p.43).
A Economia cafeeira (1889-1930) é dividida, pelos autores em três partes para facilitar a
compreensão desta, nesse sentido, inicia-se pelo desenvolvimento e crise em que é apontado que o
café se desenvolveu a partir de 1820, no Rio de Janeiro e depois se estende ao estado de São Paulo,
ganhando importância econômica na pauta de exportações representando importante percentual entre
1840 e 1970, em torno de 40% do total das exportações do país. Todavia, a medida que a
produtividade das terras do RJ declinam São Paulo ganha relevante papel, mas este fato por si só não
explica a ascensão de São Paulo pois este já empregava mão de obra imigrante nas lavouras antes
mesmo da abolição da escravidão, ao contrário do Rio de Janeiro.
O grande número de imigrantes em direção a São Paulo teve apoio do governo Federal através
do fornecimento de navios, a expansão do crédito durante o começo da República favorecido pela
Reforma Bancária permitindo a abertura de novos canaviais, a expansão das linhas férreas que reduziu
os custos de transporte, aliado a esses fatores internos observou-se uma elevação no mercado
internacional do café de 1885 a 1890. A partir dos anos 90 os preços do produto tendem a reduzi
refletindo uma crise da economia dos EUA.
Assim, verificou-se uma combinação perversa de redução dos preços do produto no mercado
internacional, com elevação dos preços internos e moeda nacional desvalorizada. A frente ao
aprofundamento da crise da economia cafeeira, os estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas
Gerais reuniam-se em Taubaté (Convênio de Taubaté) em 1906 (ano de safra recorde) para exigir a
intervenção estatal para evitar o agravamento eminente, causado pelo superprodução. A política de
valorização do café estendeu-se até 1929. Essa política tinha o inconveniente de estimular o aumento
da produção de café, haja vista que tinha-se a segurança da compra do excedente pelo governo federal,
no entanto, frente a quebra da bolsa de Nova Iorque o mercado de crédito cessou e a demanda dos
EUA também, ponto efetivamente um fim a política de valorização do produto.
O último ponto diz respeito as relações de trabalho na economia cafeeira em que é apontado
que com a transição da mão de obra escrava africana para o sistema de colonato (este se processava
através do pagamento de uma remuneração, o direito de utilizar parte da terra para plantio de
subsistência) com a vinda dos imigrantes europeus trouxe importantes transformações seja no
mercado de trabalho, seja a formação de um mercado consumidor.
No entanto Fernando Henrique Cardoso observa esse processo como fruto de relações
capitalistas existentes na economia brasileira de modo que a industrialização necessitava “a existência
de certo grau de desenvolvimento capitalista” (p.63) para torna-se viável. Auxiliando essa transição,
segundo FCH observou-se que senhores de outrora tornaram-se empresários capitalistas através da
“importação” de imigrantes em substituição da mão de obra escrava africana que havia encarecido.
Sérgio Silva aponta em direção semelhante, porém com alguma diferença, em relação aos
anteriores ao afirmar que “o crescimento do comércio mundial e exportação de capitais” estabelecem
condições que viabilizaram a industrialização, no entanto ressalta que esta não pode ser vista apenas
como a introdução de indústrias no país, pois a mesma envolve marcantes transformações sociais,
evidenciadas nas relações capitalistas (trabalhadores destituídos dos meios de produção e empresários
ávidos por acumulação).
Ressalta-se que segundo Warren Dean, os proprietários das indústrias eram em geral
fazendeiros ou imigrantes que vieram para o país, estes seguramente antes de ingressarem nas
atividades produtivas já tinham experiência com importação ou com o comércio. Nas fases iniciais
da industrialização percebeu-se uma participação pouco expressiva de capital estrangeiro, pois em
essência predominava o capital nacional, e como já mencionado concentrada localmente em São
Paulo e no Rio de Janeiro.
Os autores dedicam parte do texto para mostrar que com a industrialização vieram também as
mobilizações dos operariados que em geral exigiam melhores salários e/ou condições de trabalhos
melhores. Citando movimentos de associação como o trabalhismo, o sindicalismo moderado, o
anarquismo, outros ligados ao Partido Comunista do Brasil e por fim o populismo.
As relações entre café e indústria são demasiadas complexas para serem explicadas pelas
teorias apresentadas anteriormente. Assim, os autores admitem existir uma subordinação da indústria
à economia cafeeira, enfatizando que essa disputa ficou no campo “ideológico”, na medida em que
não produziu resultados contundentes.
A Lei bancária de 1890, imposta pelo primeiro ministro da fazendo Rui Barbosa, foi uma
medida que facilitou a expansão monetária lastreadas em títulos públicos, medida essa considerada
heterodoxa, mas a mesma permitiu atender a demanda impostas principalmente pelo crescimento do
trabalho assalariado em relação ao trabalho escravo, haja vista que esse processo causou escassez de
liquidez interna, assim a medida consegue suprir parte dessa demanda. Não obstante, aquela Lei
permitiu a concentração de grandes cafezais que evoluíram para sociedades anônimas, todavia, os
autores ressaltam que isso gerou o conhecido “encilhamento”, ou seja, uma bolha especulativa na
medida em que as pessoas abriam empresas apenas para especular na bolsa de ações.
A economia brasileira sofreu com crises no balanço de pagamentos causadas pelo fuga de
capitais do pais, pelas desvalorizações cambiais (este melhorava a vidas dos exportadores, mas
indubitavelmente piorava a vida dos demandantes de produtos importantes de forma que as perdas
era socializadas como afirmou o próprio Furtado), de modo que as políticas econômicas adotas
sempre estiveram em consonância com a situação na qual o país via-se emergido, bem como aos
interesses daqueles que exerciam certo poder sobre o governo.
Quando avalia o Estado Oligárquico da Primeira República, os autores apontam que este era
caracterizado por um “modelo liberal-democrático: uma república federativa, em que os estados
tinham razoável autonomia e com um sistema de representação fundado no voto universal não
obrigatório”. É interessante ressaltar que neste período observa-se um traço histórico (“coronelismo”)
que ainda é muito presente na realidade do país, a saber a corrupção seja ela eleitoral seja nos outros
aspectos. O poder dos coronéis em decidir as eleições lhes conferia o poder de pressionar os governos
para que seus interesses fossem atendidos, isso segundo os autores enfraquecia o poder público em
função do poder privado.
Referencia