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índice

Apresentação Programa- 5 -
para um novo urbanismo - 17
- Arquitetura para a
vida - 31 -Introdução a uma crítica da
-Fragmentos
geografia urbana - 34

do d o rn u rn e nt o
fundacional - 48 - Teoria da
Outra cidade
deriva - 66 -

para outra vida - 80 -


Posições situacionistas sobre a circulação

Programa elementar
- 89 -

da oficina de
--------
urbanismo unitário -
95 Apêndice 105

-4-
Apresentação
Após quase cinqüenta anos da forma-
ção da Internacional Situacionista (1S) I
uma editora contraculturallança uma co-
letânea de artigos situacionistas. Mais do
que simples difusão de idéias, este livro
trata da formação de conhecimentos im-
portantes na construção de novas situa-
ções. E como toda comemoração (50 anos
da fundação da 1S), trazemos elogios,
lembranças e esperanças.
Para os que ainda não a conhecem, a
1S foi uma vanguarda artística e política
européia da segunda metade do século XX
que fez uma crítica unitária- da socieda-
* Apresentação desenvolvida por Erahsto Felício de
Sonsa. estudante de História da Universidade Esta-
dual de Santa Cruz (UESC) em Ilhéus-BA, pesqui-
sa na área de História Social Urbana, é participante
do coletivo Gunh Anopetil onde traduziu textos e
organizou um acervo situacionista.
1. O documento de sua fundação é de 1957.
2. Sobre Crítica Unitária ver o artigo coletivo da 1S
-5-
de capitalista, e teve como elemento
introdutório desta crítica uma nova con-
cepção para a cidade. Fora fruto de uma
Europa arrasada pela guerra, onde os pro-
cessos de reconstrução urbana (e políti-
ca) se constituíram como projetos de pu-
blicidade ideológica. Enquanto o capital
refez a Europa ainda mais igual a sua ima-
gem e semelhança, a 15 surgia da crítica
da cidade como prisão mental e física do
espetáculo.
Dadaístas e surrealistas tinham, na
primeira metade do século XX, dado as
cartas da crítica urbana. E os
situacionistas tinham a exata dimensão
do que essa crítica significara. A 15 her-
dou os procedimentos experimentais des-
ses grupos, mesmo que posteriormente
tenha voltado suas críticas a eles.
De fato era um outro tempo. E foi en-
tre a guerra política na cidade e a amplia-
ção da hegemonia cultural do capital que
Definições Mínimas das Organizações Revolucionárias no
sítio da Biblioteca Virtual Revolucionária.
3. Ver livro virtual Paris: Maio de 68. da coleção
·6·
nasceu, lutou e se desfez a Internacional
Situacionista. Possivelmente o ápice da
difusão dos conteúdos situacionistas, foi
também o momento da véspera da sua
dissolução: o Maio de 683 . Foi nessa revo-
lução, que se iniciou na França em 1968,
que veremos os revolucionários discutin-
do escritos situacionistas, e negando a
sociedade do capital espetacular. O impac-
to dessa "revolução dos estudantes" é for-
te o suficiente para que escritos
situacionistas tenham circulado no Bra-
sil, sem que os estudantes que lutaram
contra o Ato Institucional Número 5 nes-
tas terra, tivessem se quer a noção de
quem eram os Enragers no Soviet da
Sourbone, ou mesmo que existia o libelo
Da Miséria do Meio Estudantil" em circula-

Baderna da Editora Comad.


4. Escrito pelo situacionista Mustapha Kayati, in-
fluenciou o movimento estudantil francês de 1966
até o Maio de 68. Ver livro Situacionista: teoria e práti-
ca da revolução (Coleção Baderna. São Paulo: Editora
Conrad do Brasil, 2001), ou o acervo da IS no site
do Coletivo Gunh Anopetil.

-1-
. ----------
ção na França, e já em outros países eu-
ropeus.
Mas não foi o movimento estudantil
o precursor da IS. Sua fundação se deu
em 1957 na localidade de Cosio d' Arrosca,
na união dos grupos Internacional
Letrista, Associação Psicogeográfica de
Londres, MIEI (Movimento Internacional
por uma Bauhaus Imaginista) - movi-
mento posterior ao Cobra (Copenhague,
Bruxelas, Amsterdã). Todos esses movi-
mentos já pesquisavam e difundiam no-
vas idéias sobre cidade, arquitetura e ur-
banismo. Seus membros, já conhecidos
dos círculos marginais de pesquisa, ti-
nham um curto e intenso histórico de
negação da arquitetura moderna, princi-
palmente do funcionalismo e sua "perso-
nificação", Le Corbusier. Entre os primei-
ros membros de maior produção durante
as discussões urbanísticas destacam-se o
pintor dinamarquês Asger Jorn, o urba-
nista utópico holandês Constant, e o
"doutor em nada" francês Guy-Ernest
Debord (apresentamos artigos de ambos
-8-
nessa coletânea).
Durante sua união a IS publicou doze
números de sua revista homônima, além
de artigos em outras revistas. Dentre seus
artigos podemos perceber que se dedica-
ram até 1961 em discutir propriamente a
cidade. O desenvolvimento da
psicogeografía" como campo de pesqui-
sa, a crítica ao funcionalismo e a cons-
trução de um urbanismo unitário foram
suas principais abordagens até então. A
ligação ao grupo do então estudante bel-
ga Raoul Vaneigem, em 1961, parece ter
guinado a discussão para o campo da
práxis revolucionária. O grupo se desin-
tegrou em 1972 depois do bum causado
pelo Maio de 68.
Os situacionistas contribuíram muito
no pensar a cidade. Vejamos: a
marginalidade processual das pesquisas
deu atenção à rede de territórios e ao po-

5. "Estudo dos efeitos exatos do meio geográfico,


conscientemente planejado ou não, que agem díre-
tarnente sobre o comportamento afetivo dos indiví-
duos" em Definições lS n° O1, junho de 1958.
-9-
der das zonas psíquicas na cidade; a
rnilitância contra o funcionalismo sinali-
zou a desorganização dos territórios soci-
ais pelo urbanismo; a vida nos ;;guetos"
europeus percebeu a cidade como obser-
vatório dos grupos subalternos e insubor-
dinados, num terreno de luta de classes;
e a posição crítica situou o social como
condição para as proposições no urbanis-
mo. A intenção de difundir sentimentos
como amizade e o amor através da apli-
cação de procedimentos corretos, serviu
como matriz energética de urna signifi-
cativa contribuição no campo das idéias
políticas, da arquitetura e urbanismo, das
ciências sociais, da história e filosofia.
Se os situacionistas não são os cria-
dores da psicogeografia, pelo menos fo-
ram importantes dífusores. Esse conhe-
cimento aponta urna certeza: as represen-
tações simbólicas do espaço influenciam
os sujeitos que o habita. O objetivo era
criar novas ambiências, cujos códigos in-
fluíssem para domínios de liberdades
humanas. Não foram criadas cidades
-10-
situacionistas, porém a evolução do pen-
samento psicogeográfico continua contri-
buindo para a crítica dos domínios urba-
nos, e da construção desses pelo capital.

'A sociedade que modela tudo o


que a cerca construiu uma técnica
especial para agir sobre o que dá
sustentação a essas tarefas: o pró-
prio território. O urbanismo é a to-
mada de posse do ambiente natu-
ral e humano pelo capitalismo que,
ao desenvolver sua lógica de domi-
nação absoluta, pode e deve agora
refazer a totalidade do espaço
como seu próprio cenário."

Não limitavam a cidade ao concreto,


pensavam principalmente no poder.
Kotanyi e Vaneigem em Programa elemen-
tar da oficina de.urbanismo unitário dão ên-

6. Ver página 112 do livro A Sociedade do Espetáculo


de Guy Debord (Rio de Janeiro: Contraponto. 1997).
O livro está disponível em português na internet no
sítio da Biblioteca Virtual Revolucionária.
-11-
fase a esta discussão quando entendem
que "de fato não se mora em um bairro
de uma cidade, mas no poder. Se mora
em algum lugar da hierarquia':". Esse
deslocamento da noção de espaço físico
para espaço social- ou mesmo psíquico -
foi uma marca da posição política frente
à concepção de cidade estudada e
construída pelos modernos.
Devo dedicar aqui um espaço especial
a duas questões que muito me chamam
atenção: a motivação humanística e a
crença revolucionária. Esses dois aspec-
tos podem, para os mais cicntificistas. até
não trazer profundidade teórica, porém
trazem uma sensibilidade, com a qual,
muitos libertários continuam a compar-
tilhar.
A construção de uma revolução coti-
diana afastava-se dos dogmas
bolcheviques e do capitalismo burocráti-
co de estado. A 1S viu na sociedade um
grande tédio em meio ao consumismo e
7. Ver pago 98, Programa elementar da oficina de urba-
nismo unitário
-12-
a felicidade burguesa. Acreditavam que
para acabar com a exploração humana era
preciso apenas criar os procedimentos de
pesquisas corretas, e aplicar os resultados
dessas na sociedade, como afirma Debord
em Introdução a uma crítica da geografia ur-
bana, um artigo pré-situacionista:

"De fato, não há nada mais a es-


perar que a tomada de consciência
pelas massas ativas das condições
de vida que lhes são impostas em
todos os domínios e dos meios prá-
ticos para combatê-Ias."

A 1S viu na arquitetura essa possibili-


dade, e desejava construir cidades livres
e construídas por todos os que a
vivenciam. Em Programa para um novo ur-
banismo, Gilles Ivain fala de um sonho e
da necessidade de sua urgente constru-
ção. A poesia e a sensibilidade artística
foram componentes para argumentar

8. Ver pago 45, Introdução a uma crítica da geografia


urbana.
-13-
contra a derrota dos sonhos humanos
pela sociedade do ter e do parecer. Se para
alguns as cidades eram - ou ainda são
um amontoado de concreto e pessoas,
para Ivain se tratava, sobretudo, do lugar
da realização de sonhos humanos:

'là medida que desaparecem os


motivos para apaixonar-se, se faz
urgente uma ampliação racional
das antigas crenças religiosas, dos
velhos contos e, sobretudo da psi-
canálise da arquitetura."

Os sonhos não morreram. E hoje inú-


meros sítios virtuais difundem as idéias
situacionistas pela internet. e, cada vez
mais, surgem coletivos dispostos a por em
prática essas idéias'" , principalmente cri-
ando novas. No Brasil (mesmo que na
Internet) ainda não encontramos tradu-
zido todos os textos das doze revistas da
9. Ver pago 26. Proqrama para um novo urbanismo.
10. Ver apêndice do livro com sítios e livros com
publicações situacionistas.
-14-
Internacional Situacionista, porém alguns
coletivos têm se imbuído da tarefa de tra-
duzir estes, e alguns livros já foram pu-
blicados com esse material. A difusão des-
se conhecimento tem contribuído em ní-
vel de estudo urbano e de prática políti-
ca. O sonho de educar uma geração
situacionista continua vivo.
O caráter autêntico e os princípios re-
volucionários continuam a chamar aten-
ção nos textos dos situacionistas (mes-
mo que anteriores ao grupo). Nesta cole-
tânea apresentaremos artigos escritos
anterior a IS, porém que serviram de base
para o pensamento psicogeográfico do
grupo. Utilizamos textos disponíveis na
Internet e traduzidos por coletivos que
vêm contribuindo para difusão dessas
idéias.
Mesmo que tenham quase meio século
de existência, ainda não podemos - para
a infelicidade de muitos - condenar as
idéias situacionistas ao anacronismo. Per-
maneceram atuais porque não atacaram
as formas superficiais da sociedade capi-
·15·
~--------~---
talista. mas o princípio gerador dessas
formas. Enquanto o inimigo não morrer,
não pode desaparecer a necessidade de
sonhar com uma sociedade de liberdades.

'Ainda que o projeto que acabamos


de trazer em grandes linhas corre
o risco de ser considerado como um
sonho fantasioso, insistimos no
feito de que é realizável desde o
ponto de vista técnico, desejável
desde o ponto de vista humano, e
que será indispensável desde o
ponto de vista social." II

Erahsto Felício de Sousa,


Coletivo Gunh Anopetil,
em fevereiro de 2007

1 1.Ver pago 89, Outra cidade para outra vida.


-16-
,__ o
programa para 11111
novo urbamsmo
Senhor, sou de outro país.

Nos entediamos na cidade, já não há


nenhum templo do sol. Entre as pernas
das mulheres passavam os dadaístas, que
queriam encontrar uma chave inglesa, e
os surrealistas, que queriam uma taça de
cristal. Isto acabou. Sabemos ler nos ros-
tos de todas as promessas o último esta-
do das coisas. As poesias dos cartazes du-
raram vinte anos. Nos entediamos na ci-

* Artigo adotado em outubro de 1953 pela Interna-


cional Letrista (I.L), construiu elementos decisivos
da nova orientação tomada a partir de então pela
vanguarda experimental. O presente texto foi esta-
belecido a partir de duas versões sucessivas do ma-
nuscrito, que comportam leves diferenças de for-
mulação. Publicado na revista 15 de n" O 1, em ju-
nho de 1958. Tradução do espanhol por membros
do coletivo Gunh Anopetil.
-11-
dade. temos que nos exaurir para desco-
brir os mistérios nos cartazes da rua, este
é o último estado do humor e da poesia.
Banhos dos patriarcas
Máquinas de açougue
Zôo de Nossa Senhora
Farmácia desportiva
Alimentação dos Mártires
Concreto translúcido
Serraria Mão de Ouro
Ambulância Santa Ana
Café da Quinta Avenida
Rua dos Voluntários
Prolongada
Pensão familiar no jardim
Hotel de Estrangeiros
Rua selvagem

E a piscina da Rua das Nenas. E a de-


legacia da Rua das Citas. A Clínica cirúr-
gica e o escritório de emprego gratuito do
cais dos Orfebres. As flores artificiais da
Rua do Sol. O Hotel dos Porões do Caste-
·18·
10, o bar do Oceano e o café de Ir e Vir. O
Hotel de Época.
E a estranha estátua do Médico
Phillippe Pinel, benfeitor dos loucos, nas
últimas tardes de verão. Explore Paris.
E você se esqueceu, tuas recordações
assoladas por todas as angustias do mapa-
múndi. encravado nas Grutas Vermelhas
de Pali-Kao, sem música e sem geogra-
fia, sem ir à fazenda onde as raizes pensam
no menino e o vinho se acaba em fábulas de
almanaque. Agora acabou. Nunca verás a
fazenda. Ela não existe.

Devemos construir a fazenda


Todas as cidades são geológicas, e não
podemos dar três passos sem encontrar
fantasmas armados com todo o prestígio
de suas lendas. Evolucionamos em um es-
paço fechado cujos pontos de referência
nos atraem constantemente para o pas-
sado. Alguns ângulos movediços, algumas
perspectivas defuqa nos permitem vislum-
·19·

,----
brar concepções originais do espaço, mas
esta visão continua sendo fragmentária.
Devemos buscar nos lugares mágicos dos
contos de folclore e nos escritos
surrealistas: castelos, muralhas, pequenos
bares esquecidos, grutas de mamutes, ge-
lados cassinos.
Estas velhas imagens conservam um
pequeno poder de catálise. mas é quase
impossível utilizá-Ias num urbanismo
simbólico, sem que desviemos
tdetournementv os seus sentidos, rejuve-
nescendo-as dando-lhes um novo senti-
do. Nosso imaginário, construído por ve-
lhos arquétipos, ficou quebrado muito
atrás das máquinas aperfeiçoadas. As di-
versas tentativas de integrar a ciência
moderna nos novos mitos continuam sen-
do insuficientes. Enquanto isso o abstra-
to tem invadido todas as artes, em parti-
cular a arquitetura atual. O feito plástico

1. "Abreviação da expressão: desvio de elementos


estéticos pré-fabrícados. Integração de produções
artísticas ("0) em uma construção superior do am-
biente", em Definições IS n" 01. junho de 1958 (NoO) o
-20-
em estado puro, sem anedota, é inanima-
do, descansa e refresca os olhos. Em ou-
tros lugares se encontram mais belezas
fragmentárias, mas a terra das sínteses
prometidas está cada vez mais longe.
Cada um fica em dúvida entre o passado
emocionalmente vivo e o futuro já mor-
to.
Não prolongaremos as civilizações me-
cânicas e a fria arquitetura cuja meta é o
ócio tedioso.
Nós propomos inventar novos palcos
dinâmicos. (... )
A escuridão retrocede ante a luz arti-
ficial e o ciclo das estações ante as salas
climatizadas: a noite e o verão perdem seu
encanto e a D'Alva está desaparecendo.
O homem das cidades pensa afastar-se da
realidade cósmica e por isso já não sonha.
A razão é evidente: o sonho se lança so-
bre a realidade e se realiza nela.
A última fase do aprendizado permite
o contato ininterrupto entre o homem e
a realidade cósmica ao mesmo tempo em
que elimina seus aspectos desagradáveis.
- 21-
o teto de vidro deixa ver as estrelas e a
chuva. A casa móvel gira com o sol. Seus
muros corrediços permitem a vegetação
invadir a vida. Deslizando-se sobre cami-
nhos pode ir a té o mar pela manhã e vol-
tar à noite pelo bosque.
A arquitetura é o meio mais simples
de articular o tempo e o espaço, de modu-
lar a realidade, de formar sonhos. Não se
trata somente da articulação e modula-
ção plástica, expressão de uma beleza
passageira, mas sim de uma modulação
influenciadora que se escreve nas curvas
eternas dos desejos humanos e do pro-
gresso em sua realização.
A arquitetura de amanhã será um
meio para modificar condições atuais do
tempo e do espaço. Um meio de conheci-
mento e um meio de ação.
O complexo arquitetônico será
modificável. Seu aspecto combinará par-
cial ou totalmente segundo a vontade de
seus habitantes. (... )
As comunidades do passado oferece-
ram às massas uma verdade absoluta e
·22·
exemplos míticos inquestionáveis. A apa-
rição da noção de relatividade na menta-
lidade moderna permite suspeitar do as-
pecto experimental da nova civilização,
ainda que esta não seja a melhor palavra.
Um aspecto mais flexível, mais "diverti-
do", digamos. Sobre a base desta civiliza-
ção móvel, a arquitetura será - ao menos
inicialmente - um meio para experimen-
tar mil formas de modificar a vida, com
vista a uma síntese que só pode ser len-
dária.
Uma doença mental invadiu o plane-
ta: a banalização. Todo o mundo está hip-
notizado pela produção e pelo conforto-
esgoto, elevador, banho, lava-roupa.
Este estado de coisas que nasce de
uma rebelião contra a miséria supera seu
remoto fim - a libertação do homem das
inquietudes materiais para converter-
se em uma imagem obsessiva do imedia-
to. Entre o amor e o lixeiro automático, a
juventude de todo o mundo já fez sua es-
colha, e prefere o lixeiro. É imprescindí-
vel uma transformação espiritual comple-
·23·
--------
ta, que traga à luz desejos esquecidos e
criem outros completamente novos. Além
de realizar uma propaganda intensiva a fa-
vor destes desejos.
Temos apontado a necessidade de
construir situações como um dos desejos
básicos em que se fundaria a próxima ci-
vilização. Esta necessidade de criação ab-
soluta sempre esteve estreitamente asso-
ciada à necessidade de jogar com a arqui-
tetura, o tempo e o espaço. (... )
Um dos mais destacados percussores
arquitetõnicos permanecerá sendo
Chirico. Ele abordou os problemas das
ausências e das presenças no tempo e es-
paço.
Sabemos que um objeto que não é
conscientemente percebido em uma pri-
meira visita provoca, em sua ausência,
uma sensação indefinível em visitas pos-
teriores: mediante a uma percepção dife-
rente a ausência do objeto sefaz presença sen-
sível. Sendo mais exato: ainda que a qua-
lidade da impressão geralmente segue
indefinida, varia com a natureza do obje-
·24-

I--~
to despercebido e a importância concedi-
da ao mesmo pelo visitante, podendo ir
do gozo sereno ao terror (pouco importa
que neste caso específico seja a memória
o veículo desses sentimentos; só escolhi
este exemplo por comodidade).
Na pintura de Chirico (na época de As
Arcadas) um espaço vazio cria um templo
pleno. É fácil imaginar o futuro que reser-
vamos aos tais arquitetos e suas influên-
cias sobre as massas. Hoje não podemos
fazer nada que não desapreciar um sécu-
lo que relegou estas maquetes a supostos
museus.
Esta nova visão de tempo e espaço, que
será a base teórica de futuras construções,
não está pronta e nem estará completa-
mente sem que se experimente o com-
portamento nas cidades, onde se reúnem
sistematicamente, além disto, estas ins-
talações necessárias para um mínimo de
conforto e segurança, são construções car-
regadas de um grande poder de evocação
e de influência, edifícios simbólicos que
representam os desejos, as forças, os
-25-
acontecimentos do passado, do presente
e do futuro. À medida que desaparecem
os motivos para apaixonar-se, se faz ur-
gente uma ampliação racional das anti-
gas crenças religiosas, dos velhos contos
e, sobretudo da psicanálise da arquitetu-
ra.
De algum modo cada um habitará em
sua" catedral" pessoal. Haverá habitações
que farão sonhar melhor que qualquer
droga e casa onde só se poderá amar.
Outras atrairão irresistivelmente os via-
jantes ...
Este projeto poderia comparar-se com
os murais de ilusão de ótica chineses e
japoneses - com a diferença que aqueles
jardins não estavam desenhados para se-
rem vividos - ou com o ridículo labirinto
do Jardim de Plantas, no qual na entrada
se pode ler o absurdo, Ariadna sem fun-
ção: Os jogos estão proibidos no labirinto.
Esta cidade poderia ser imaginada
como uma reunião arbitrária de castelos,
grutas, lagos e etc. .. Seria o estado barro-
co do urbanismo considerado como um
-26-
meio de conhecimento. Mas esta fase te-
órica já está superada. Sabemos que se
pode construir um imóvel moderno que
não se pareça com um castelo medieval,
mas que conserve ou multiplique o poder
poético do Castelo (mediante a conserva-
ção do mínimo específico de linhas, a
transposição de outras, a localização das
entradas, a situação topográfica, etc).
Os distritos da cidade poderiam
corresponder ao espectro completo dos di-
versos sentimentos que se encontram ao
acaso na vida cotidiana.
Bairro Feio - Bairro Feliz (reservado
particularmente à moradia) - Bairro No-
bre e Trágico (para bons garotos) - Bairro
Histórico (museus, escolas) - Bairro Útil
(hospital, armazéns de ferramentas) -
Bairro Sombrio, etc. E um Astrolábio que
agruparia as espécies vegetais de acordo
com as relações que manifestam com o
ritmo estelar, um jardim planetário com-
parável ao que o astrônomo Thomas que-
ria estabelecer em Laaer Berg, em Viena,
indispensável para dar aos habitantes
-21-
uma consciência cósmica. Talvez também
um Bairro da Morte, não para morrer, mas
para ter onde viver em paz, e penso aqui
no México em um princípio de crueldade
na inocência que cada dia me seduz mais.
O Bairro Sombrio, por exemplo, subs-
tituiria vantajosamente essas bocas do in-
ferno que muitos povos tinham antiga-
mente em sua capital e que simbolizavam
as potências maléficas da vida. O Bairro
Sombrio não tem por que apresentar pe-
rigos reais, como armadilhas, masmorras
ou minas. Seria de difícil acesso, horro-
rosamente decorado (apitos estridentes,
sons de alarme, sirenes in termináveis
com marcação irregular, esculturas mons-
truosas, móveis mecânicos motorizados
chamados de automóveis) e pouco ilumi-
nado pela noite, e escandalosamente du-
rante o dia, mediante o uso abusivo da
resplandecência. No centro, a 'A.Praça do
Espantoso Móvel". O excesso no merca-
do de um produto provoca a queda de seu
valor: o garoto e o adulto aprenderam me-
diante a exploração do Bairro Sombrio a
-28-
não temer as manifestações angustian-
tes da vida, sem que se divirta com elas.
A atividade principal dos habitantes
será a deriva contínua. A troca de paisa-
gens entre uma hora e a seguinte será res-
ponsável pela desorientação completa.
(... ) Mais tarde, com o inevitável desgas-
te dos gestos, esta deriva abandonará em
parte o campo do vivido, trocando pelo
da representação. (... )
A objeção econômica não resiste ao
primeiro olhar. Sabemos que quanto mais
reservado à liberdade do jogo está um lugar,
mais influi sobre o comportamento e
maior é sua força de atração. O que de-
monstra o imenso prestígio de Mônaco e
Las Vegas. Também de Reno, caricatura
do amor livre. Mas não se tratam mais
que de simples jogos de dinheiro. Esta
primeira cidade experimental viverá ge-
nerosamente do turismo tolerado e con-
trolado. As próximas atividades e produ-
ções da vanguarda se concentrarão nela.
Em uns poucos anos chegará a ser a capi-
tal intelectual do mundo e será univer-
·29·

,-------- ---~-- ._-- -~-_._---


salmente conhecida como tal.

Gilles Ivain, 1958.

arquitetura

-30-
para a vida
A utilidade e função serão sempre, o
ponto de partida para qualquer crítica for-
mal; trata-se simplesmente de transfor-
mar o programa funcionalista.
Os funcíonalistas' ignoram a função
psicológica dos ambientes ... A aparência
dos edifícios e dos objetos que usamos, e
que formam nosso ambiente familiar, tem
uma função que está separada de seu uso
prático.

* Artigo pré-sítuacionísta. pu blícado na revista


Potlatch de n° 15, em dezembro de 1954. Compo-
nente elo livro de J orn "Imagem e Forma" sobre a
arquitetura e seu futuro. Tradução do espanhol por
membros elo coletivo Gunh Anopetil.
3. Ver nota 9 no artigo Outra cidade para outra vida
pag.84.
- 31·
À causa de seu conceito de padroni-
zação, os funcionalistas racionalistas
acreditaram ser possível conseguir formas
definitivas e ideais dos diferentes objetos
utilizados por nós. Desenvolvimentos re-
centes têm mostrado que esta concepção
estática está errada. Devemos alcançar
uma concepção dinâmica das formas, en-
frentar o feito de que todas as formas hu-
manas estão em um estado constante de
transformação; onde os racionalistas se
equivocam é em entender que o único
modo de evitar a anarquia das trocas é
chegar a ser consciente das leis que go-
vernam a transformação e utilizá-Ias.
É importante entender que este
conservadorismo das formas é comple-
mento ideológico, porque não é o resul-
tado do não saber o que é a forma defini-
tiva de um objeto, mas sim o fato de que
nos sentimos perturbados quando não en-
contramos algum elemento de deja vu
num fenômeno pouco familiar ... O radi-
calismo das formas é o resultado de que
a gente se entedia quando não encontra
·32·
algum elemento inesperado no conheci-
do. Uns podem achar este radicalismo iló-
gico, como fazem os defensores da padro-
nização, mas não devemos perder de vis-
ta que esta necessidade humana é a úni-
ca que faz possível os descobrimentos.
A arquitetura é sempre a realização úl-
tima da evolução intelectual e artística, a
materialização de uma fase da economia.
A arquitetura é o ponto final na realiza-
ção de qualquer esforço artístico, porque
a criação arquitetõnica implica na cons-
trução de um ambiente e o estabeleci-
mento de um modo de vida.

Asger Jorn, 1954

Introdução a
" .
uma cntíca
·33·
,---- --- -- ---------
da geografia
urbana
De todos os acontecimentos que par-
ticipamos, com ou sem interesse, a busca
fragmentária de uma nova forma de vida
é o único aspecto ainda apaixonante. É
necessário desfazer aquelas disciplinas
que, como a estética e outras, se revela-
ram rapidamente insuficientes para essa
busca. Deveriam se definir então alguns
campos de observação provisórios. E en-
tre eles a observação de certos processos
do acaso e do previsível que se dão nas
ruas.
O termo psicogeografia4, sugerido por
* Artigo pré-situacionista originalmente publicado
no jornal belga surrealista Les lévres nues em setem-
bro de 1955. Tradução disponível na Biblioteca Vir-
tual Revolucionária.
4. Uma ciência experimental e ainda marginal à

-34-
um iletrado Kabyle para designar o con-
junto de fenômenos que alguns de nós
investigávamos no verão de 1953, não pa-
rece demasiado impróprio. Não contradiz
a perspectiva materialista dos aconteci-
mentos da vida e do pensamento provo-
cados pela natureza objetiva. A geogra-
fia, por exemplo, trata da ação
de terminante das forças naturais gerais,
como a composição dos solos ou as con-
dições climáticas, sobre as estruturas eco-
nômicas de uma sociedade e, por conse-
qüência, da concepção que esta possa criar
do mundo. A psicogeografia se propunha
o estudo das leis precisas e dos efeitos exa-
academia. Tem sua origem junto à evolução das
vanguardas dadaístas e surrealistas. porém tomara
corpo como campo de pesquisa da cidade na segun-
do metade do século xx com os grupos que forma-
ram a Internacional Situacionista. A evolução des-
sa ciência experimental alcançou na década de 1990
uma minuciosa crítica do Projeto Luther Blissett
(lutherblissett.net) à psicogeografia sítuacionista.
e ao mesmo tempo ampliou as noções experimen-
tais neste campo (ver BLISSETT, Luther. Guerrilha
Psíquica. São Paulo: Editora Ccnrad do Brasil, 2001)
(N.O).
·35·
tos do meio geográfico, conscientemente
organizado ou não, em função de sua in-
fluência direta sobre o comportamento
afetivo dos indivíduos. O adjetivo
psicogeográfico, que conserva uma incer-
teza bastante agradável, pode então ser
aplicado as descobertas feitas por esse tipo
de investigação, aos resultados de sua
influência sobre os sentimentos huma-
nos, e inclusive de maneira geral a toda
situação ou conduta que pareça revelar o
mesmo espírito de descobrimento.
Se disse durante muito tempo que o
deserto é monoteísta. Se encontrará iló-
gica, ou desprovida de interesse, a
constatação de que o distrito de Paris, en-
tre a Praça de Contrescarpe e a rua l'Arbalête
conduz ao ateísmo, ao esquecimento e a
desorientação das influências habituais?
É conveniente ter uma concepção his-
toricamente relativa do utilitário. A ne-
cessidade de dispor de espaços livres que
permitem a rápida circulação de tropas e
o emprego da artilharia contra as insur-
reições esteve na origem do plano de
·36-
embelezamento urbano adotado pelo se-
gundo império. Mas desde qualquer pon-
to de vista, exceto o policial, a Paris de
Haussmann é uma cidade construída por
um idiota, plena de ruído e fúria, que nada
significa. Hoje o principal problema do ur-
banismo é resolver o problema da circu-
lação de uma quantidade rapidamente
crescente de automóveis. Podemos pen-
sar que o urbanismo vindouro se aplicará
a construções, igualmente utilitárias, que
concedam a maior consideração às pos-
sibilidades psicogeográficas.
Além do mais, a abundância atual de
veículos privados não é mais que o resul-
tado da propaganda constante pela qual
a produção capitalista induz as massas -
e este é um de seus êxitos mais
desconcertantes - de que a possessão de
um carro é precisamente um dos privilé-
gios que nossa sociedade reserva a seus
privilegiados. (Por outro lado, o progres-
so confuso nega-se a si mesmo: alguém
pode gozar do espetáculo de um oficial
de polícia convidando em um anúncio pu-
-31-
~
--- ~--~--~--~-~~ ~----------~
blicitário aos parisienses proprietários de
automóveis a utilizar transportes públi-
cos).
Posto que encontramos a idéia de pri-
vilégio inclusive em assuntos tão banais,
e que sabemos com que certa cólera tan-
ta gente - por pouco privilegiada que seja
- está disposta a defender suas medío-
cres conquistas, é necessário constatar
que todas estes detalhes participam de
uma idéia burguesa de felicidade, idéia
rnantida por um sistema de publicidade
que engloba tanto a estética de Malraux
como os imperativos da Coca-Cola, e cuja
crise deve ser provocada em qualquer oca-
sião, por todos os meios.
O primeiro destes meios é sem dúvida
a difusão, com um objetivo de provoca-
ção sistemática, de um conjunto de pro-
postas tendentes a converter a vida em
um jogo apaíxonante, e o contínuo me-
nosprezo de todas as diversões para com
o uso, na medida em que estas não po-
dem ser desviadas para servir à constru-
ção de ambientes. É certo que a maior
-38-
dificuldade em tal projeto é fazer passar
estas propostas aparentemente deliran-
tes para um grau suficiente de séria se-
dução. Para a obtenção deste resultado se
pode imaginar um uso hábil dos meios
de comunicação imperantes. Mas tam-
bém um tipo de abstencionismo
provo cativo ou de manifestações tenden-
tes à decepção radical dos aficionados
destes meios de comunicação, podem fo-
mentar inegavelmente, sem muito esfor-
ço, uma atmosfera de pertubação extre-
mamente favorável à introdução de no-
vas noções de prazer.
A idéia de que a realização de uma si-
tuação eleita depende unicamente do co-
nhecimento rigoroso e da aplicação deli-
berada de um certo número de técnicas
concretas, inspirou o jogo psicogeográfico
da semana publicado, não sem certo hu-
mor, no número 1 de POTLATCH5:

5. A revista Potlatch era a via de publicação da In-


ternacional Letrista (N.O).
-39-

------------ ----~- ------


"Em função do que você busca, es-
colha um país, uma cidade mais ou
menos populosa, uma rua mais ou
menos animada. Cons trua uma
casa. Tire o maior partido de sua
decoração e seus arredores. Eleja a
estação e a hora. Reúna as pessoas
mais adequadas, os discos e as be-
bidas mais convenientes. A ilumi-
nação e a conversação deverão ser
as oportunidades para a ocasião,
como o tempo atmosférico ou vos-
sas recordações. Se não houve ne-
nhum erro em vossos cálculos, o
resultado deve satisfazer- te."

Devemos trabalhar para inundar o


mercado, mesmo que pelo momento não
seja mais que o mercado intelectual, com
uma massa de desejos cuja realização não
rebaixará a capacidade dos meios de ação
atuais do homem no mundo material,
mas sim a velha organização social. Não
carece de interesse político contrapôr pu-
blicamente tais desejos aos desejos ele-
-40-
mentares que não nos assombra vermos
repetidos incessantemente na indústria
cinematográfica ou nas novelas psicoló-
gicas, como desse velho carniceiro de
Muriac. (Marx explicava ao pobre
Proudhon que, em uma sociedade fun-
dada sobre a "miséria", os produtos mais
"miseráveis" têm a fatal prerrogativa de
servir ao uso do maior número de pesso-
as ).
A transformação revolucionária do
mundo, de todos os aspectos do mundo,
confirmará todos os sonhos de abundân-
cia.
A mudança repentina de ambientes
em uma mesma rua no espaço de alguns
metros; a clara divisão de uma cidade em
zonas de distintas atmosferas psíquicas;
a linha de mais forte inclinação - sem re-
lação com o desnível do terreno - que de-
vem seguir os passeios sem propósito; o
caráter de atração ou repulsão de certos
espaços: tudo isso parece ser ignorado.
Em todo caso, não se concebe como de-
pendente de causas que possam ser des-
·41·
--- ---------
cobertas através de uma cuidadosa aná-
lise, e das quais não se possa tirar parti-
do. As pessoas são conscientes de que al-
guns bairros são tristes e outros agradá-
veis. Mas geralmente assumem simples-
mente que as ruas elegantes causam um
sentimento de satisfação e as ruas pobres
são deprimentes, e não vão mais além.
De fato, a variedade de possíveis combi-
nações de ambientes, análoga à dissolu-
ção dos corpos químicos puros num infi-
nito número de mesclas, gera sentimen-
tos tão diferenciados e tão complexos
como os que pode suscitar qualquer ou-
tra forma de espetáculo. E a menor in-
vestigação revela que as diferentes influ-
ências, qualitativas ou quantitativas, dos
diversos cenário de uma cidade não se
pode determinar somente a partir de uma
época ou de um estilo de arquitetura, e
ainda menos a partir das condições de
vida.
As investigações assim destinadas a se
levar a cabo sobre a disposição dos ele-
mentos do meio urbano, em relação ínti-
-112-
ma com as sensações que provocam, não
querem ser apresentadas senão como hi-
póteses audazes que convém corrigir
constantemente à luz da experiência,
através da crítica e da autocrítica.
Certas pinturas de Chirico, que são ela-
ramente provocadas por sensações cuja
origem se encontra na arquitetura, podem
exercer uma ação de retorno sobre sua
base objetiva até transformá-Ia: tendem
a converter-se elas mesmas em maquetes.
Inquietantes bairros de arcadas poderiam
um dia continuar e complementar o atra-
tivo desta obra.
Não conheço senão esses dois portos
ao entardecer pintado por Claude Lorrain.
que estão no Louvre e que apresentam
dois ambientes urbanos totalmente diver-
sos, para rivalizar em beleza com os car-
tazes dos planos de metrô de Paris. Se en-
tenderá que ao falar aqui de beleza não
me refiro a beleza plástica - a nova bele-
za não pode ser outra que a beleza da si-
tuação - senão somente a apresentação
particularmente comovedora, em ambos
-43-

,---- -------~---- ----


os casos, de uma suma de possibilidades.
Entre diversos meios de intervenção
muito difíceis, parece apropriada uma car-
tografia renovada para sua utilização ime-
diata.
A elaboração de mapas psícogeográfí-
cos". inclusive de diversos truques como
a equação pouco fundada ou completa-
mente arbitrária, estabelecida entre duas
representações topográficas, pode contri-
buir para esclarecer certos deslocamen-
tos de caráter não precisamente gratui-
tos, mas sim absolutamente insubmísso
às influências habituais. As influências
deste tipo estão catalogadas em termos
de turismo, droga popular tão repugnan-
te como o lazer ou a compra a crédito.
Recentemente, um amigo me disse
que percorreu a região de Harz, na Ale-
manha, com a ajuda de um mapa da ci-
dade de Londres cujas indicações havia
seguido cegamente. Este tipo de jogo é

6. Ver imagem The Naked City exemplo de mapa


psicogeográfico produzido após estudos de Deriva,
no sítio da Editora Deriva (N.O).
-<14-
obviamente só um começo medíocre em
comparação com uma construção com-
pleta da arquitetura e do urbanismo,
construção que estará algum dia em po-
der de todos. Enquanto isso podemos dis-
tinguir distintas fases de realizações par-
ciais, meios menos complicados, come-
çando pelo simples deslocamento dos ele-
mentos do cenário dos lugares nos quais
estamos acostumados a encontrar.
Assim, no número precedente desta
revista, Mariên propôs reunir em desor-
dem, quando os recursos mundiais te-
nham cessado de ser desperdiçados nos
projetos irracionais que nos são impostos
hoje, as estátuas eqüestres de todas as
cidade do mundo em uma planície deser-
ta. Isto ofereceria aos transeuntes - o fu-
turo lhes pertence - o espetáculo de uma
carga de cavalaria oficial, que inclusive
poderia dedicar-se a memória dos maio-
res massacradores da história, desde
Tamerlan até Ridgway. Aqui vemos rea-
parecer uma das principais demandas
desta geração: o valor educativo.
·45-
De fato, não há nada mais a esperar
que a tomada de consciência pelas mas-
sas ativas das condições de vida que lhes
são impostas em todos os domínios e dos
meios práticos para combatê-Ias.
O imaginário é aquilo que tende a con-
verter-se em real, escreveu um autor cujo
nome, devido a sua notória degradação
intelectual, faz tempo é esquecido. Tal
afirmação, pelo que tem de
involuntariamente restritiva. pode servir
de pedra de toque e fazer justiça a certas
paródias de revolução literária: o que ten-
de a permanecer irreal é palavrório.
A vida, da qual somos responsáveis,
oferece ao mesmo tempo grandes moti-
vos de desânimo, uma infinidade de di-
versões e de compensações mais ou me-
nos vulgares. Não passa um ano em que
as pessoas que amamos não ceda, por fal-
ta de ter compreendido claramente as
possibilidades presentes, a alguma capi-
tulação manifesta. Mas isto não reforça o
campo inimigo, que conta com milhões
de imbecis e no qual se está objetivamente
-46-
condenado a ser imbecil.
A primeira deficiência moral que per-
manece é a indulgência, em todas as suas
formas.

Guy Debord, 1955

-41-

,----- "--"-----
Pragrnentos do domumento fundacional

Por uma
internacional
Situacionista
Nossa idéia central é a construção de
situações, ou seja, a construção concreta
de flashes de vida, elevando-a a um nível
superior de qualidade passional. Para con-
seguir isso, temos que direcionar uma in-
tervenção ordenada sobre os fatores com-
plexos de dois grandes componentes em
perpétua interação: o marco material da
vida; e os comportamentos que o entra-
nham e que o desordenam. Nossa pers-
* Texto extraído do documento fundacional da In-
ternacional Situacionista: Informe sobre a construção
de situações e sobre as condições da orqanização e a ação da
tendência situacionista internacional ( 1957). Traduzido
do espanhol por Railton Guedes / Coletivo Perife-
ria.
-48-

,--
pectiva de ação sobre esse marco tende,
em última análise, à concepção de um
urbanismo unitário. O urbanismo unitá-
rio se define principalmente pelo uso con-
junto das artes e das técnicas como meio
que concorre para uma composição inte-
gral do meio. Esse confronto resulta infi-
nitamente mais amplo do que o do anti-
go império da arquitetura sobre as artes
tradicionais, do que a atual aplicação oca-
sional de técnicas especializadas no ur-
banismo anárquico, de investigações ci-
entíficas como a ecologia. O urbanismo
unitário tenderia a dominar, por exern-
plo, tanto a mídia sonora como a distri-
buição de diferentes variedades de bebi-
das e alimentos. Tenderia a criar novas
formas e a inverter as formas conhecidas
de arquitetura e de urbanismo - também
subverteria a poesia ou o antigo cinema.
A arte integral, da qual tanto se fala, não
pode realizar-se a não ser em nivel de ur-
banismo. Porém não correspondería a ne-
nhuma das definições tradicionais da es-
tética. Em cada uma de suas cidades ex-
-49-
--~ ._----._--- ..
perimentais, o urbanismo unitário atua-
ria mediante um certo número de cam-
pos de força que momentaneamente de-
signaríamos com o termo clássico de bair-
ro. Cada bairro poderá tender para uma
harmonia exata e romper com as harmo-
nias vizinhas; ou agir no sentido de uma
máxima ruptura da harmonia interna
Em segundo lugar, o urbanismo uni-
tário é dinâmico, ou seja, tem estreita re-
lação com o estilo de comportamento. O
elemento mais reduzido do urbanismo
unitário não é a casa, mas o complexo
arquitetônico, que é a reunião de todos
os fatores que condicionam um ambien-
te ou uma série de ambientes diversos na
escala da situação construída. O desen-
volvimento espacial tem de levar em con-
sideração as realidades sensíveis determi-
nadas pela cidade experimental. Um de
nossos camaradas avançou em uma teo-
ria dos bairros estado-de-espírito, segun-
do a qual cada bairro de uma cidade ten-
taria despertar um sentimento simples,
ao qual a pessoa se submeterá voluntari-
-50-

1--
amente. Aparentemente, tal projeto de-
precia sentimentos primários acidentais,
e sua realização contribui para acelerar
essa tendência. Os camaradas que ansei-
am por uma nova arquitetura, uma ar-
quitetura livre, compreenderão que esta
nova arquitetura não funcionará com li-
nhas e formas livres, poéticas - no senti-
do da pin tura de "abstração linear" - fun-
cionará sobre todos os efeitos da atmos-
fera das peças, cores, ruas, atmosfera li-
gada aos gestos que a contém. A arquite-
tura avançará tomando como matéria
prima mais situações excitantes do que
fórmulas comovedoras. As experiências
feitas a partir desta matéria prima con-
duzirão a formas desconhecidas. A inves-
tigação psicogeográfica, "o estudo das leis
exatas e dos efeitos precisos do meio ge-
ográfico, conscientemente planejado ou
não, que atuam diretamente sobre o com-
portamento afetivo dos indivíduos", ad-
quire seu duplo sentido da observação
ativa dos conglomerados urbanos de hoje,
e do estabelecimento de hipóteses sobre
-51-

------- ------
a estrutura de uma cidade situacionista.
O progresso da psicogeografia depende
em grande medida da extensão estatísti-
ca de seus métodos de observação, porém
principalmente da experimentação medi-
ante intervenções concretas no urbanis-
mo. Até este ponto não se pode estar se-
guro da verdade objetiva dos primeiro
dados psicogeográficos. Quando estes
dados forem falsos, serão seguramente
falsas as soluções para um verdadeiro pro-
blema.
Nossa ação sobre o comportamento,
bem como com os demais aspectos dese-
jáveis de uma revolução nos hábitos, pode
definir-se resumidamente pela invenção
de jogos essencialmente novos. O objeti-
vo geral seria ampliar a parte não medío-
cre da vida, e abreviar, tanto quanto pos-
sível, os momentos nulos. Algo como uma
empreitada para a ampliação quantitati-
va da vida humana, mais séria do que os
procedimentos biológicos estudadosatu-
almente. O que implica num aumento
qualitativo de resultados imprevisíveis. O
·52-
jogo situacionista se distingue da concep-
ção clássica de jogo pela negação radical
do caráter lúdico da competição e de se-
paração da vida corrente. O jogo
situacíonísta não é alheio a uma escolha
moral, à tomada de partido visando asse-
gurar o reino futuro da liberdade e do
jogo. Ele se relaciona à certeza do contí-
nuo e rápido aumento do tempo livre, ao
nível de força produtiva, típico de nosso
tempo. Ele se relaciona ao reconhecimen-
to do fato que se descortina diante de
nossos olhos: uma batalha de tempo li-
vre, cuja importância na luta de classes
não tem sido suficientemente analisada.
Neste momento, a classe dominante ain-
da consegue servir-se do tempo livre con-
quistado pelo proletariado revolucionário,
desenvolvendo um vasto setor industrial
de ócio que é um incomparável instru-
mento que embrutece o proletariado por
intermédio dos subprodutos da ideologia
mistificadora e dos gostos da burguesia.
Provavelmente encontramos neste abun-
dante lixo televisivo uma das razões da
-53-
incapacidade da classe operária america-
na se politizar, Ao obter mediante pres-
são coletiva uma ligeira elevação do pre-
ço de seu trabalho, acima do mínimo ne-
cessário na produção deste, o proletário
amplia não apenas seu poder de luta, mas
também o terreno de luta. Surgem novas
formas de luta paralelas aos conflitos di-
retamente econômicos e políticos. Pode-
se dizer que até agora a propaganda re-
volucionária permanece dominada pelas
mesmas formas de luta em todos os.paí-
ses em que o desenvolvimento industrial
avançado foi introduzido. A necessária
mudança da ínfraestrutura pode ser re-
tardada pelos erros e pelas debilidades ao
nível das superestruturas, é o que lamen-
tavelmente tem demonstrado algumas
experiências do século vinte. Ternos que
lançar novos ataques na batalha do ócio
para conquistarmos nosso lugar.
Um ensaio primitivo de um novo tipo
de comportamento foi obtido com o que
7. "Modo de comportamento experimental ligado
às condições da sociedade urbana: técnicas da pas-
-54-

r+:
chamamos deriva". que é a prática de uma
confusão passional pela rápida mudança
de ambiente, e ao mesmo tempo um meio
de estudo da psicogeografia e da psicolo-
gia situacionista. A aplicação deste dese-
jo de criação lúdica ampliará as formas
conhecidas de relações humanas, e influ-
enciará a evolução histórica de sentimen-
tos como a amizade e o amor, por exem-
plo. Tudo leva a crer que é no entorno da
hipótese da construção de situações que
deve se localizar a essência de nossa in-
vestigação.
A vida de um homem é um amontoa-
do de situações fortuitas, se nenhuma de-
las é similar a outra, estas situações são
pelo menos, em sua imensa maioria, tão
indiferenciadas e sem brilho que dão per-
feitamente a impressão de semelhança.
O resultado deste estado de coisas é que
as escassas situações conhecidamente re-
levantes em uma vida, retêm e limitam
rigorosamente esta vida. Temos que ten-
sagem rápida por ambiências variadas", em Defini-
çõesISnoOl,junhode 1958 (N.O).
-55-

,------ ~~--~-----
tar construir situações, ou seja, ambien-
tes coletivos, um conjunto de impressões
que determinam a qualidade de um mo-
mento. Se tomarmos o exemplo simples
de uma reunião de um grupo de indiví-
duos durante um determinado tempo,
teremos que estudar a organização do lu-
gar, a escolha dos participantes e provo-
car uma dinâmica de acontecimentos
convenientes ao ambiente desejado. É
certo que a potência de uma situação se
ampliará consideravelmente no tempo e
no espaço com as realizações do urbanis-
mo unitário ou com a educação de uma
geração situacionista. A construção de
situações começa pela destruição da mo-
derna noção de espetáculo. É fácil ver até
que ponto o próprio princípio do espetá-
culo (a não intervenção) liga-se à aliena-
ção do velho mundo. Por outro lado ve-
mos como as investigações revolucioná-
rias mais válidas na cultura vêrn rompen-
do com a identificação psicológica do es-
pectador com o herói, visando arrastá-lo
à ação, e despertar suas capacidades de
-56-
subverter sua própria vida. A situação é
feita para ser vivida por seus construto-
res. O papel do "Público", se não passivo
pelo menos de mero figurante, deve ir di-
minuindo, na medida em que aumenta-
rá a quantidade daqueles que em vez de
serem chamados de atores, serão chama-
dos de vivenciadores, um sentido novo
deste termo.
Se multiplicarão, digamos, os objetos
e os sujeitos poéticos, desgraçadamente
tão raros atualmente que os poucos que
existem assumem uma importância
afetiva exagerada; e se organizarão jogos
destes sujeitos poéticos com aqueles ob-
jetos poéticos. Este é nosso programa, es-
sencialmente transitório. Nossas situa-
ções não buscarão acomodação, serão lu-
gares de passagem. O caráter imutável da
arte ou seja lá do que for não entra em
nossas considerações, que são firmes. A
idéia de eternidade é a idéia mais tosca
que um homem pode conceber no que diz
respeito a seus atos.
As técnicas situacionistas ainda estão
-51·
por ser inventadas. Porém sabemos que
uma tarefa não se realiza sem as condi-
ções materiais necessárias, elas devem es-
tar pelo menos em vias de formação. Te-
mos que começar por uma pequena fase
experimental. Sem dúvida temos de pla-
nejar situações, como se planejam palcos,
mesmo que no princípio isso se revele in-
suficiente. Temos que desenvolver um sis-
tema de observação, cuja precisão aumen-
tará com nosso aprendizado nas experi-
ências de construção. Temos que encon-
trar ou verificar leis, a emoção
situacionista pode depender de uma ex-
trema concentração ou de uma extrema
dispersão nos gestos (a tragédia clássica
daria uma imagem aproximada do pri-
meiro caso, e a deriva do segundo). Além
dos meios diretos que serão usados para
fins definidos, a construção de situações
requer, em sua fase de afirmação, uma
nova aplicação das técnicas de reprodu-
ção. Pode-se conceber, por exemplo, a te-
levisão projetando ao vivo alguns aspec-
tos de uma situação dentro de outra inci-
·58·
tando modificações e interferências. O
cinema documental mereceria tal nome
se formasse uma nova escola de
documentário responsável pelo registro,
para os arquivos situacionistas, dos ins-
tantes mais significativos de uma situa-
ção, antes que a evolução de seus elemen-
tos haja motivado uma situação diferen-
te. A construção sistemática de situações
deve produzir sentimentos até então
inexistentes; o cinema encontrará sua
grande função pedagógica na difusão des-
tas novas paixões.
A teoria situacionista sustenta firme-
mente uma concepção descontínua da
vida. A noção de unidade deve ser des-
prezada pela perspectiva da totalidade da
vida, - que é uma mistificação reacioná-
ria baseada na crença de uma alma imor-
tal e, em última instância, na divisão do
trabalho - ponteada por instantes isola-
dos, e pela construção de cada instante
mediante um uso unitário dos meios
situacionistas. Em uma sociedade sem
classes não haverá mais pintores, mas
·59·
,---
situacionistas que, entre outras ativida-
des' pintarão.
O principal drama afetivo da vida, fora
o eterno conflito entre desejo e realidade
hostil ao desejo, parece ser a sensação do
passar do tempo. A atitude situacionista
consiste em sobrepujar o fluxo do tempo,
em oposição aos procedimentos estéticos
que tendem a fixar a emoção. O desafio
situacionista diante das emoções e do
tempo seria apostar todas suas fichas na
mudança, indo sempre mais longe no jogo
e na multiplicação dos períodos excitan-
tes. Neste momento não é fácil fazer uma
aposta assim. No entanto, sem correr o
risco de perdê-Ia mil vezes, não levare-
mos a efeito nenhuma atitude progres-
sista.
A minoria situacionista se constituiu
como tendência dentro da esquerda
letrista e depois na Internacional Letrista,
que acabou controlando. A própria obje-
tividade do movimento fez com que mui-
tos grupos vanguardistas do recente pe-
ríodo chegassem a essa conclusão. Temos
·60-
que eliminar todos os sobreviventes do
passado. Hoje estimamos que um acordo
para uma ação única da vanguarda revo-
lucionária na cultura operará em um pro-
grama assim. Não temos receitas nem re-
sultados definitivos. Propomos unica-
mente uma investigação experimental
conduzida coletivamente em algumas di-
reções que agora definimos e em outras
que serão determinadas. A mesma difi-
culdade de chegar às primeiras realiza-
ções situacionistas é uma prova da novi-
dade do domínio em que estamos pene-
trando. Mudar nossa maneira de ver as
ruas é mais importante que mudar nossa
maneira de ver uma pintura. Nossas pos-
sibilidades de ação serão reexaminadas
em cada desordem futura, venha de onde
vier.
Principalmente os intelectuais e os ar-
tistas revolucionários dirão que preferem
continuar ancorados no sentimento de
impotência, que este "situacíonísmo" é
muito desagradável, que não fizemos
nada belo, que é melhor falar de Gide, que
·61·
não vêem razões para interessar-se por
nós. Fugirão de nós reprovando-nos por
fazer coisas que só resultaram em escân-
dalo, e que fizemos isso pelo simples de-
sejo de aparecer. Se indignarão com os
procedimentos que defendemos em algu-
mas ocasiões para manter ou aumentar
nossas distâncias. Nós respondemos: não
se trata de saber se se interessam por isso,
mas se continuarão interessados nas no-
vas condições da criação cultural. A fun-
ção de vocês, intelectuais e artistas revo-
lucionários, não é qualificar de insulto à
liberdade a nossa recusa em marchar com
os inimigos da liberdade. Parem de imi-
tar os estetas burgueses, que fazem e pe-
dem para vocês fazerem o que já foi feito,
e que não se incomodam com isso. Vocês
sabem que uma criação nunca é pura. A
função de vocês é examinar o que faz a
vanguarda internacional, participar na
crítica construtiva de seu programa e pro-
clamar sua sustentação.

·62·
nossas tarefas ím dO
e latas
Devemos sustentar, junto aos partidos
operários ou tendências extremistas pre-
sentes nos partidos, a necessidade de con-
trapor uma ação ideológica conseqüente
para combater, no plano passional, a in-
fluência dos métodos de propaganda do
capitalismo desenvolvido. Confrontar
concreta e constantemente os reflexos do
modo de vida capitalista com outros mo-
dos de vida desejáveis; destruir por todos
os meios hiper-políticos a idéia burguesa
da felicidade. Ao mesmo tempo, devemos
considerar a existência no interior da clas-
se dominante de grupos de elementos que
sempre se fundem, por tédio ou necessi-
dade de novidade, a àquilo que entranha
finalmente a desaparíção desta socieda-
de. Devemos incitar pessoas que possu-
em algum dos vastos recursos que neces-
sitamos para que nos proporcionem os
meios para realizar nossas experiências,
um crédito análogo ao da investigação
·63·
------~.~~-_ ..
científica, ou de qualquer coisa rentável.
Devemos apresentar em todas partes
uma alternativa revolucionária à cultura
dominante; coordenar todas as investiga-
ções que, mesmo sem perspectiva de con-
junto, se fazem neste momento; conduzir,
mediante a crítica e a propaganda, os ar-
tistas e intelectuais mais avançados de to-
dos os países a entrar em contato conosco
tendo em vista uma ação conjunta.
Devemos declarar-nos dispostos a re-
tomar as discussões sobre a base deste
programa, com todos aqueles que haven-
do tomado parte em uma fase anterior de
nossa ação se encontrem, todavia, capa-
zes de reincorporar-se.
Devemos levar adiante os pilares do ur-
banismo unitário, do comportamento ex-
perimental da propaganda hiper-política,
da construção do ambiente. As paixões já
foram suficientemente interpretadas: che-
gou a hora de encontrar outras novas.

GuyDebord, 1957.

-64-

ona
Entre os diversos procedimentos
situacionistas, a deriva se apresenta como
uma técnica ininterrupta através de di-
versos ambientes. O conceito de deriva
está ligado indissoluvelmente ao reconhe-
cimento de efeitos da natureza
psicogeográfica, e à afirmação de um
comportamento lúdico-construtivo, o que
se opôe em todos os aspectos às noções
clássicas de viagem e passeio.
Uma ou várias pessoas que se lançam
à deriva renunciam, durante um tempo
mais ou menos longo, os motivos para

* Publicado na revista IS de n° 02, em dezembro de


1958. Tradução do espanhol por membros do cole-
tivo Gunh Anopetil.
-65-

r- - ----~------
da deriva
deslocar-se ou atuar normalmente em
suas relações, trabalhos e entretenimen-
tos próprios de si, para deixar-se levar
pelas solicitações do terreno e os encon-
tros que a ele corresponde. A parte alea-
tória é menos de terminante do que se crê:
do ponto de vista da deriva, existe um
relevo psicogeográfico nas cidades, com
correntes constantes, pontos fixos e mul-
tidões que fazem de difícil acesso à saída
de certas zonas.
Mas a deriva, em seu caráter unitário,
compreende o deixar levar-se e sua con-
tradição necessária: o domínio das variá-
veis psicogeográficas pelo conhecimento
e o cálculo de suas possibilidades. Con-
-66-
cluído este último aspecto, os dados pos-
tos em evidência pela ecologia, ainda sen-
do a priori muito limitado o espaço social
que esta ciência propõe estudar, não dei-
xam de ser úteis para apoiar o pensamen-
to psicogeográfico.
A análise ecológica do caráter absolu-
to e relativo de cortes do conjunto urba-
no, o papel dos micro-climas (zonas psí-
quicas), das unidades elementares com-
pletamente distintas dos bairros adminis-
trativos, e, sobretudo da ação dominante
dos centros de atração, deve utilizar-se e
completar-se com o método
psicogeográfico. O terreno ap a ixo-
nantemente objetivo em que se move a
deriva deve definir-se ao mesmo tempo
de acordo com seus próprios
determinismos e com suas relações com
a morfologia social.
Chombart de Lauwe, em seu estudo
sobre Paris et l'agglomération parisienne (Bi-
blioteca de Sociologia Contemporânea,
PUF 1952) assinala que "um bairro urba-
no não está determinado somente pelos
-61-
-- -._- -._-- --- ~---.
fatores geográficos e econômicos, mas sim
pela representação que seus habitantes e
os de outros bairros têm dele"; e apresenta
na mesma obra - pra mostrar "a estreite-
za da Paris real em que se vive cada indi-
víduo ... é um quadro geográfico é suma-
mente pequeno" =, o traçado de todos os
percursos efetuados em um ano por uma
estudante do distrito XVI, desenha um tri-
ângulo reduzido, sem fugir dele, cujos ân-
gulos estão a Escola de Ciências Políticas,
a casa da jovem e a de seu professor de
piano.
Não há dúvida de que tais esquemas,
exemplos de uma poesia moderna, con-
seguem produzir reações vivas e afetivas.
- neste caso a indignação de poder viver
desta forma - inclui a teoria, avançada
por Burgess no caso de Chicago, da re-
partição das atividades sociais em zonas
concêntricas definidas, e isto tem de ser-
vir ao progresso da deriva.
O acaso joga na deriva um papel tan-
to mais importante quanto menos esta-
belecido esteja à observação
·68-
psicogeográfica. Mas a ação do acaso é
naturalmente conservadora e tende, em
um novo marco, reduzir tudo à alternati-
va de um número limitado de variáveis, e
ao cotidiano. A não ser o progresso, a su-
peração de algum dos marcos em que o
acaso atua mediante a criação de novas
condições mais favoráveis a nosso desti-
no, se pode dizer que os acasos da deriva
são essencialmente diferentes dos do pas-
seio, correndo o risco de que os primeiros
atrativos psicogeográficos que descu-
bram, determinem ao sujeito ou ao gru-
po que deriva ao redor de novos eixos
habituais, os quais lhe fazem voltar cons-
tantemente.
Uma desconfiança insuficiente com
respeito ao acaso e o seu emprego ideoló-
gico, sempre reacionário, condenou a um
triste fracasso o famoso perambular sem
destino tentado em 1923 por quatro
surre alistas partindo de uma cidade es-
colhida ao acaso: vagar em campo ao re-
lento é deprimente, evidentemente, e as
interrupções do acaso são mais pobres que
·69·
--- ._- .. __ ._---
nunca. Mas certo Pierre Vendryes leva a
imprudência muito mais longe em
Medium (maio 1954) crendo poder adi-
cionar a esta anedota - já que tudo isso
participaria de urna mesma libertação
antideterminista - algumas experiências
probabilísticas sobre a distribuição alea-
tória de girinos em um cristalizador cir-
cular, por exemplo, cuja conclusão preci-
sa: "semelhante multidão não deve so-
frer nenhuma influência direta do exte-
rior", Nestas condições lavam os girinos
na palma da mão, pois que estes têm a
vantagem de estar "tão desprovidos corno
é possível de inteligência, de sociabilida-
de e de sexualidade", e conseqüentemen-
te "são verdadeiramente independentes
um dos outros".
Em oposição a estas aberrações, o ca-
ráter principalmente urbano da deriva,
em contato com os centros de possibili-
dade e de significação que são as grandes
cidades transformadas pela indústria, res-
pondem melhor a frase de Marx: "Os ho-
mens não podem ver ao seu redor mais
·10·

1-
que seu rosto; tudo lhes fala de si mes-
mo. Até suas paisagens estão animadas".
Pode-se derivar só, mas tudo indica
que a divisão numérica mais produtiva
consiste em vários grupos pequenos de
duas ou três pessoas que chegaram a um
mesmo estado de consciência; a análise
conjunta das impressões destes grupos
distintos permitirá chegar a conclusões
objetivas. É preferível que a composição
dos grupos troque de deriva uma com a
outra. Com mais quatro ou cinco partici-
pantes o caráter próprio da deriva decres-
ce rapidamente, e em todo caso é impos-
sível superar a dezena sem que a deriva
se fragmente em várias derivas simultâ-
nea. Diga-se de passagem, que a prática
desta última modalidade é de grande in-
teresse, mas as dificuldades que implicam
não têm permitido organizá-Ia com a
amplitude desejável até o momento.
A duração média de uma deriva é a
jornada considerada como o intervalo de
tempo compreendido entre dois períodos
de sono. São indiferentes os pontos de
-]1-

,---- -- ---------------------
partida e chegada no tempo com respeito
à jornada do sol, mas deve assinalar-se,
contudo que as últimas horas da noite são
geralmente inadequadas para a deriva.
Esta duração média da deriva só tem
um valor estatístico, sobretudo porque ra-
ramente se apresenta real, já que não se
podem evitar os interessados, ao princí-
pio ou ao final da jornada, distrair uma
ou duas horas para dedicá-Ias a ocupa-
ções banais; ao final do dia o cansaço con-
tribui muito com este abandono. Além do
mais a deriva se desenvolve a miúdo em
certas horas fixadas casualmente, ou in-
clusas deliberadamente durante breves
instantes ou pelo contrário durante vári-
os dias sem interrupção. Apesar das pa-
radas impostas pelas necessidades de dor-
mir, algumas derivas bastante intensas
tem se prolongado três ou quatro dias, e
até mais. É certo que, no caso de uma
sucessão de derivas durante um período
suficientemente longo, é quase impossí-
vel determinar com precisão o momento
em que o estado mental próprio de uma
-12-
deriva determinada deixa lugar à outra.
Tem-se prosseguido uma sucessão de de-
rivas sem grandes interrupções durante
cerca de dois meses, o que supõe trazer
novas condições objetivas de comporta-
mento que implicam a desaparição de
muitas das antigas.
A influência de variações climáticas
sobre a deriva, ainda que real, não é
determinante mais que em casos de chu-
vas prolongadas que a impedem absolu-
tamente. Mas as tempestades e outras
precipitações são até propícias.
O campo espacial da deriva será mais
ou menos vago ou preciso segundo a bus-
ca do estudo do terreno ou resultados
emocionalmente desconcertantes. Não há
o que se descuidar, já que estes dois as-
pectos da deriva apresentam múltiplas in-
terferências' e que é impossível isolar um
deles em estado puro. Finalmente o uso
de táxis, por exemplo, pode apontar uma
pedra de toque bastante precisa; se no
curso de uma deriva pegar um táxi, seja
com um destino preciso ou para deslocar
·13-

1-
vinte minutos para o oeste, é que opta-
mos, sobretudo pela desorientação pes-
soal. Se nos dedicarmos à exploração di-
reta do terreno é que preferimos a busca
de um urbanismo psicogeográfico.
Em todo caso o campo espacial está
implícito, em primeiro lugar, nas bases da
partida construídas para os indivíduos
isolados por suas casas e por lugares de
reunião escolhidos para os grupos. A ex-
tensão máxima do campo espacial não su-
pera o conjunto de uma grande cidade e
suas adjacências. Sua extensão mínima
pode reduzir-se a uma pequena unidade
de ambiente: só um bairro, ou inclusive
um quarteirão se valer a pena (no limite
extremo está a deriva estática em urna jor-
nada sem sair da estação Saint Lazare ).
A exploração dum campo espacial fi-
xado supõe por tanto o estabelecimento
das bases e o cálculo das direções de pe-
netração. Aqui intervem o estudo de ma-
pas, tanto de correntes como ecológicas
ou psicogeográficas, e a retificação ou me-
lhora dos mesmos. É necessário dizer que
-14-
a escolha de um bairro desconhecido em
si, jamais percorrido, não intervém em
nada no resultado? Diferente de sua
significância, este aspecto do problema é
completamente subjetivo, e não subsisti
por muito tempo.
Na "ocasião possível", a parte da ex-
ploração é pelo contrário mínima compa-
rada com a do comportamento
desorientador. O sujeito é convidado a
dirigir-se só, em uma hora marcada a um
lugar que lhe fixe. Acha-se livre das pesa-
das obrigações do cotidiano, já que não
tem nada a esperar. Sem, no entanto, ter
levado esta "ocasião possível" inespera-
damente a um lugar que pode não conhe-
cer, observa os arredores. Podem dar-se
ao mesmo tempo outra "ocasião possível"
no mesmo lugar com alguém cuja identi-
dade não é previsível. Pode inclusive não
tê-lo visto nunca, o que o incita a conver-
sar com alguns transeuntes. Pode não
encontrar nada, ou encontrar por acaso
algo que o tenha fixado à "ocasião possí-
vel". De todas as formas, sobretudo se o
·15·
- --._---
lugar e a hora foram bem escolhidos, o
emprego do tempo e do sujeito terá uma
mudança imprevisível. Pode inclusive pe-
dir por telefone outra "ocasião possível"
a alguém que ignora onde lhe foi condu-
zido a primeira vez. Há recursos quase in-
finitos para este passatempo.
Assim, o modo de vida pouco coeren-
te, e inclusive com certas brincadeiras
consideradas de mau gosto, que tem sido
sempre censurada em nosso ambiente,
como, por exemplo, introduzir-se de noi-
te no chão das casas em demolição, per-
correr Paris sem parar em pontos de ôni-
bus durante uma greve de transportes,
para agravar a confusão fazendo-se con-
duzir aonde for, ou perder-se nos subter-
râneos das catacumbas proibidas ao pú-
blico, revelaria um sentimento que seria
a deriva ou não seria nada. O que se pode
escrever só serve como produto deste
grande jogo.
O ensino da deriva permite estabele-
cer os primeiros quadros das articulações
psicogeográficas de uma cidade moder-
·15·
na. Além do reconhecimento de unida-
des de ambiente, de seus componentes
principais e de sua localização espacial,
se percebe seus eixos principais de cami-
nhos, suas saídas e suas defesas. Chega-
se assim à hipótese central da existência
de placas giratórias psicogeográficas.
Medem-se as distâncias que separam efe-
tivamente os lugares de uma cidade que
não têm relação com o que uma visão
aproximativa de um plano urbano pode-
ria perceber. Pode-se compor, com ajuda
de mapas velhos, de fotografias aéreas e
de derivas experimentais, uma cartogra-
fia influencial que faltava até o momen-
to, e cuja incerteza atual, inevitável antes
que se tenha cumprido um imenso tra-
balho, não é maior que a das primeiras
descrições, com a diferença de que não se
trata de delimitar precisamente áreas
dum continente, mas sim de transformar
a arquitetura e o urbanismo.
As diferentes unidades da atmosfera
e de moradia não estão, hoje em dia, exa-
tamente demarcadas, sem aproximar-se
-tt-
dos limites mais ou menos extensos. O
maior ganho que propõe a deriva é a di-
minuição constante desses limites, até
sua supressão completa.
Na arquitetura, a inclinação à deriva
leva a anunciar todo tipo de novos labi-
rintos que as possibilidades modernas de
construção favorecem. A imprensa disse
em março de 1955 sobre a construção em
Nova York de um edifício onde se pode
perceber os primeiros sinais de possibili-
dade de deriva no interior de um aparta-
mento:

"As pequenas habitações da casa


helicoidal terão a forma de uma
fatia de bolo. Poderão aumentar-
se ou reduzir-se à vontade desli-
zando paredes móveis. A disposi-
ção dos pisos em níveis evitará a
limitação do número de cômodos,
podendo o inquilino pedir que lhe
deixem utilizar o nível superior ou
o inferior. Este sistema permitirá
transformar em seis horas três
-18-
apartamentos de quatro cômodos
em um de doze ou mais".

(Continuará)

Guy Debord, 1958.

-19-

,---- -- ----~---
outra cidade
A crise do urbanismo se agrava. A
construção dos bairros, antigos e novos,
está em evidente desenvolvimento com
os modelos de comportamento estabele-
cidos, e ainda mais com os novos modos
de vida que buscamos. Um ambiente
amortecido e estéril é o resultado em nos-
sa volta.
Nos bairros velhos, as ruas têm sido

*. Publicado na revista 15 de n° 03, em dezembro de


1959. Esse autor foi posteriormente expulso da 15,
sob a alegação da insistência em criar uma cidade,
A Nova Babilônia. Tradução do espanhol por mem-
bros do coletivo Gunh Anopetil.
-80-
convertidas em pistas. O ócio está
desnaturalizado e comercializado pelo tu-
rismo. As relações sociais se fazem im-
possíveis nestes. Unicamente duas ques-
tões dominam os bairros construídos re-
centemente: a circulação de carros e o
conforto das habitações. São as miserá-
veis expressões de felicidade burguesa, e

para outra vida


toda preocupação lúdica está ausente.
Diante da necessidade de construir ra-
pidamente cidades inteiras, nos dispomos
a construir cemitérios de concreto arma-
do, em que grande parte da população
está condenada a morrer de tédio. Bem,
para que servem os inventos técnicos mais
assombrosos que o mundo tem a sua dis-
posição, se faltam condições para tirar
proveito deles, se nada acrescentam ao
ócio, se falta imaginação?
Nós reivindicamos a aventura. Ao não
encontrá-Ia na terra, alguns foram buscá-
Ia na lua. Apostamos sempre e, sobretu-
- 81-
,--- ----
do, em uma mudança na terra. Propomo-
nos a criar situações, e situações novas.
Contamos com o romper das leis que im-
pedem o desenvolvimento de atividades
eficazes na vida e na cultura. Nos encon-
tramos na aurora de uma nova era, e já
tentamos esboçar a imagem de uma vida
mais feliz e de um urbanismo unitário"; o
urbanismo feito para o prazer.
Nosso campo é por tanto a rede urba-
na, expressão natural de uma criatívidade
coletiva, capaz de compreender as forças
criadoras que se liberam no acaso de uma
cultura baseada no individualismo. A nos-
so entender, a arte tradicional não pode-
rá ter lugar na criação do novo ambiente
em que queremos viver.
Estamos inventando novas técnicas;
analisamos as possibilidades que ofere-
cem as cidades existentes; fazemos

8. "Teoria do emprego conjunto de artes e técnicas


que concorrem para a construção integral de um
ambiente em ligação dinâmica com experiências de
comportamento" em IS n" 01, junho de
1958 (N.O).
·82·
maquetes e planos para cidades futuras.
Somos conscientes da necessidade de uti-
lizarmos todos os inventos técnicos, e sa-
bemos que as construções futuras que
empreenderemos terão que ser suficien-
temente flexíveis para responder a uma
concepção dinâmica da vida, criando nos-
so redor em relação direta com tipos de
comportamento em constante mudança.
Nossa concepção de urbanismo é so-
cial. Nos opomos à concepção de uma ci-
dade verde, na qual arranha-céus espa-
çosos e isolados reduzirão necessariamen-
te as relações diretas e a ação comum dos
homens. Para que tenha lugar uma rela-
ção estreita entre o ambiente e o compor-
tamento, é indispensável à aglomeração.
Quem pensa que a rapidez de nosso des-
locamento, e a possibilidade de telecomu-
nicação vão dissolver a vida comum das
aglomerações conhecem mal as verdadei-
ras necessidades do homem. A idéia de
uma cidade verde, que tem adotado a
maior parte dos arquitetos modernos,
opõem a imagem de uma cidade coberta
-83-
na que ao separar os planos dos edifícios
e das estradas, dão lugar a uma constru-
ção espacial contínua separada do solo,
que compreenderá tanto conjuntos de
alojamentos como espaços públicos (per-
mitindo modificações de caminho segun-
do as necessidades do momento). Como
toda a circulação, no sentido funcional,
passará por debaixo ou pelos terraços su-
periores, serão suprimidas as ruas. A gran-
de quantidade de espaços atravessáveis
diferentes dos que se compõe à cidade
formam um espaço social complicado e
vasto. Longe de um retorno a natureza -
que vem da noção de viver em um par-
que como outrora os aristocratas solitári-
os - em tais construções, há imensa pos-
sibilidade de vencer a natureza e, subme-
ter a nossa vontade o clima, a ilumina-
ção' os barulhos nos diferentes espaços.
Entendemos por isso um novo funci-
onalismo? que ponha ainda mais em evi-
9. Concepção urbanística que no pós-guerra mar-
cou a defesa do capital na reconstrução européia,
teve como teórico Le Corbusier que em seu livro Por
·84·
dência a vida utilitária realizada? Não se
deve esquecer que, uma vez estabelecidas
as funções, sucede-se o jogo. Desde mui-
to tempo a arquitetura tem se convertido
em um jogo com o espaço e o ambiente.
A cidade verde carece de ambientes. Nós
queremos, pelo contrário, utilizar mais
conscientemente deles, e que
correspondam a todas nossas necessida-
des.
As cidades futuras que estamos con-
siderando oferecerão uma variabilidade
inédita de sensações neste campo e ha-
verá possíveis jogos imprevistos median-
te o uso inventivo das condições materi-
ais, como o ar-condicionado, a
sonorização e a iluminação. Já existem
urbanistas que estudam a possibilidade
de harmonizar a cacofonia que reina nas
cidades atuais. Não se tardará em encon-
trar nelas um novo campo de criação, as-
sim como muitos outros problemas que
uma Arquitetura afirma que a arquitetura pode evi-
tar a revolução (ver CORBUSIER, Le. Por uma arqui-
tetura. São Paulc.Perspecttva, 2004) (N.O).
-85-

-- -- -- ------
se apresentarão. As anunciadas viagens
ao espaço poderiam influir sobre este de-
senvolvimento, já que as bases que se es-
tabelecem em outros planetas iniciarão
de forma imediata o problema das cida-
des cobertas, que serão talvez o modelo
de nosso estudo do urbanismo futuro.
Antes de qualquer coisa, a diminuição
do trabalho obrigatório, para a produção
através da extensão da automatizaçâo.
criará uma necessidade de entretenimen-
to, uma diversidade de comportamentos
e uma mudança de natureza dos mesmos
que chegaram forçosamente duma nova
concepção de habitat coletivo que dispõe
do máximo espaço social, ao contrário da
concepção de cidade verde onde o espaço
social se reduz ao mínimo. A cidade fu-
tura tem de conceber-se como uma cons-
trução contínua sobre pilares ou como um
sistema ampliado de construções diferen-
tes nas quais estariam suspensos locais
de alojamento, de diversão, etc, e outros
destinados à produção e distribuição, li-
berando o solo para a circulação e as reu-
-86-
niões públicas. A aplicação de materiais
ultraleves e isolantes como os que são ex-
perimentados atualmente permitirá uma
construção leve e que suporte muitos es-
paços. De forma que poderá construir
uma cidade de várias camadas: porão,
planta baixa, pisos, terraços, de uma ex-
tensão que pode variar a até um bairro
atual de uma metrópole. Deve-se desta-
car que em tal cidade a superfície
construída será de 100% e a livre de 200%
(canteiros e terraços), enquanto que nas
cidades tradicionais as porcentagens são
de 80% e de 20%, e na cidade verde esta
relação de poder, no máximo, inverter-se.
Os terraços formam um território ao ar
livre que se estende por toda a superfície
da cidade, e que pode dedicar-se ao es-
porte, à aterrissagem de aviões e de heli-
cópteros, e ao mantimento de vegetação.
Serão acessíveis por todas as partes me-
diante escadas e elevadores. Os diferen-
tes pisos entrarão divididos em espaços
vizinhos e comunicantes, condicionados
artificialmente, que oferecerão a possibi-
-81-
~~ ---~~~
lidade de criar uma diversidade infinita
de ambientes, facilitando a deriva dos am-
bientes e seus freqüentes encontros ca-
suais. Os ambientes serão mudados re-
gular e conscientemente com ajuda de
todos os meios técnicos, mediante equi-
pamentos de especializados criadores que
serão, por tanto, situacionistas de profis-
são.
Uma das tarefas que estamos empre-
endendo é um estudo profundo dos mei-
os de criação de ambientes e da influên-
cia psicológica dos mesmos. A tarefa es-
pecífica dos artistas plásticos e dos enge-
nheiros é levar a cabo estudos
concernentes à realização técnica das es-
truturas equipadas e sua estética. O apon-
tamento dos últimos sobretudo é de uma
necessidade urgente de fazer progresso no
trabalho preparatório que nos propomos.
Ainda que o projeto que acabamos de
trazer em grandes linhas corre o risco de
ser considerado como um sonho
fantasioso, insistimos no feito de que é
realizável desde o ponto de vista técnico,
-88-

r
desejável desde o ponto de vista huma-
no, e que será indispensável desde o pon-
to de vista social. A crescente insatisfa-
ção que domina a humanidade alcançará
um ponto em que nos veremos empurra-
dos a executar projetos para que possua-
mos os meios que poderão contribuir à
realização de uma vida mais rica e com-
pleta.

Constant, 1959.

Ulll
O defeito de todos os urbanis-
tas consiste em considerarem
o automóvel individual (e os
seus subprodutos, do tipo
scooter) essencialmente como
um meio de transporte. Nisto
reside a principal
*Artigo publicado da revista IS de n°
03, em dezembro ele 1959. Tradução
para o português na Biblioteca Virtu-
al Revolucionária
-89-
materialização duma concepção da feli-
cidade que o capitalismo desenvolvido
tende a disseminar em toda a sociedade.
O automóvel como bem soberano duma
vida alienada, e inseparavelmente como
produto essencial do mercado capitalis-
ta, está no centro da mesma propaganda
global: diz-se este ano, correntemente,
que a prosperidade econômica norte-ame-
ricana dependerá em breve do êxito do
lema: "dois carros por família".

O ggj.§ transporte, como muito bem


viu Le Corbusier!", é um sobretrabalho
que reduz na mesma proporção a jorna-
da de vida pretensamente livre.

10. Teórico do urbanismo funcionalista, escritor da


Carta de Atenas (documento a favor da Arquitetura
Moderna), militante do CIAM (Congresso Interna-
cional de Arquitetura Moderna), do qual só foi se
afastar próximo ao CIAM X (onde os críticos da Ar-
quitetura Moderna Funcional defenderam as bases
da um urbanismo social, esses críticos foram co-
nhecidos como TEAM X), ver também nota 9 no
artigo "Outra cidade para outra vida" (N.O).
-se-
,--
/\

tres
Temos de passar da circulação como su-
plemento do trabalho à circulação como
prazer.

quatro
Querer refazer a arquitetura em função
da existência atual, maciça e parasitária,
dos carros individuais, é deslocar os pro-
blemas com um grave irrealismo. É pre-
ciso refazer a arquitetura em função de
todo o movimento da sociedade, critican-
do todos os valores passageiros, ligados a
formas de relações sociais condenadas (a
família, em primeiro lugar) .


CInCO
Mesmo que possa admitir-se provisoria-
mente, num período de transição a divi-
são absoluta entre zonas de trabalho e
zonas de habitação, é pelo menos preciso
prever uma terceira esfera: a da própria
vida (a esfera da liberdade, dos ócios - a
·91·
verdade da vida). Sabemos que o urba-
nismo unitário não tem fronteiras; que
pretende constituir uma unidade total do
meio ambiente humano onde as separa-
ções, do tipo trabalho/ócio, coletivos/Vida
privada, serão finalmente dissolvidas.
Mas antes disso, a ação mínima do urba-
nismo unitário há de ser o terreno de jo-
gos alargado a todas as construções de-
sejáveis. Este terreno terá o grau de com-
plexidade duma cidade antiga .


SeIS
Não se trata de combater o automóvel
como um mal. É a sua extrema concen-
tração nas cidades que acaba por negar o
seu papel. O urbanismo não deverá cer-
tamente ignorar o automóvel, mas deve-
rá ainda menos aceitá -10 como tema cen-
tral. impondo-se-lhe que aposte no seu
deperecimento. Seja como for, pode pre-
ver-se a sua proibição no interior de cer-
tos conjuntos novos, tal como em certas
cidades antigas.
-92-
sete
Os que julgam que o automóvel é eterno,
não pensam, nem sequer dum ponto de
vista estritamente técnico, nas outras for-
mas de transporte futuras. Por exemplo,
certos modelos de helicópteros individu-
ais, atualmente experimentados pelo
exército dos Estados Unidos, estarão pro-
vavelmente difundidos entre o público
daqui a menos de vinte anos.

oito
A ruptura da dialética do meio ambiente
humano em favor dos automóveis (pro-
jeta-se a abertura de auto-estradas em Pa-
ris, levando isso à destruição de milhares
de moradias, ao mesmo tempo que a cri-
se da habitação se agrava sem parar) es-
conde a sua irracionalidade por trás das
explicações pseudopráticas. Mas a sua
verdadeira necessidade prática
corresponde a um estado social preciso.
Os que julgam que os dados do problema
-93-

~- ----------
são permanentes, na realidade querem
acreditar na permanência da sociedade
atual.

nove
Os urbanistas revolucionários não hão-de
preocupar-se apenas com a circulação das
coisas e dos homens coagulados num
mundo de coisas. Tentarão desfazer estas
cadeias topológicas, experimentando ter-
renos para a circulação dos homens com
base na vida autêntica.

Debord, 1959
I I

·94-
Programa elementar
da oficina de urbanismo
. . '"
umtano
Inexistência do urbanismo e a
inexistência do espetáculo
o urbanismo não existe: nada mais é
que uma "ideologia", no sentido marxis-
ta da palavra. A arquitetura realmente

* Publicado na revista 15 de nO 06, em agosto de


1961. Este artigo marca a fase de transição entre a
discussão propriamente urbanística (ou contra-ur-
banística) para as discussões de caráter político re-
volucionário (linguagens, movimento estudantil,
espetáculo, etc.). Tradução disponível na Biblioteca
Virtual Revolucionária.
-95-
~--
existe, do mesmo modo que a coca-cola:
é uma produção envolta em ideologia,
mas real, satisfazendo falsamente uma
falsa necessidade; enquanto o urbanismo
é comparável a exibição publicitária que
rodeia a coca-cola. pura ideologia espeta-
cular. O capitalismo moderno, que orga-
niza a redução de toda vida social ao es-
petáculo, é incapaz de dar outro espetá-
culo que o de nossa alienação. Seu sonho
urbanístico é sua obra-prima.

A pla.n~ficação urbana como


_ cgpdlÇ]onameplO
e falsa participação
O desenvolvimento do meio urbano é
a modelação capitalista do espaço. Repre-
senta a escolha de uma certa
materialização do possível, com exclusão
de outras. Assim como a estética, cujo
movimento de decomposição permanece-
rá, pode ser considerada como um ramo
bastante negligenciado da criminologia.
Entretanto, o que o caracteriza no nível
de "urbanismo", com relação a seu nível
·96-
simplesmente arquitetõnico, é exigir um
consentimento da população, uma
integração individual na colocação em
andamento desta condição burocrática do
condicionamento.
Tudo isso é imposto por meio da chan-
tagem da utilidade. Se esconde que a im--
portância completa desta utilidade é posta
a serviço da reedificação. O capitalismo
moderno faz renunciar a toda crítica pelo
simples argumento de "faz falta um teto",
o mesmo que acontece com a televisão
com o pretexto de que" a informação é
necessária" e a diversão. O que leva a es-
quecer a evidência de que esta informa-
ção, esta diversão, este modo de habita-
ção, não são feitos pelas pessoas, mas sem
elas e contra elas.
Toda planificação urbana só pode ser
compreendida unicamente como o cam-
po da publicidade-propaganda de uma so-
ciedade, ou seja: a organização da parti-
cipação em algo no qual é impossível par-
ticipar.

-91-
3 Circulação: estágio SUprelTIO
da planificação urbana
A circulação é a organização do isola-
mento de todos. É nisso que ela consitui
o problema dominante das sociedades
modernas. É o contrário do reencontro, a
absorção das energias disponíveis para re-
encontros ou para qualquer tipo de parti-
cipação. A participação, que se fez impos-
sível, é compensada sob a forma de espe-
táculo!'. O espetáculo se manifesta no
habitat e no deslocamento (status da mo-
radia e dos veículos pessoais). Porque de
fato não se mora em um bairro de uma
cidade, mas se mora em algum lugar da
hierarquia. No cume dessa hierarquia, os
graus podem ser medidos pelo grau da cir-
culação. O poder se materializa median-

11. Debord publicou em 1967 suas teses sobre a te-


oria do espetáculo (ver DERBORD, Guy. A Sociedade
de Espetáculo. Rio ele Janeiro: Contraponto, 1997)
(N.O).
-98-
te a obrigação de se estar presente cotidi-
anamente em lugares cada vez mais nu-
merosos (almoços de negócios) e cada vez
mais afastados uns dos outros. Se pode-
ria caracterizar o alto executivo moderno
como um homem que se encontra em três
capitais diferentes em um só dia.

A distância diante do

A totalidade do espetáculo que tende


a integrar a população se manifesta tam-
bém como a organização das cidades e
como rede permanente de organizações.
É uma estrutura sólida para proteger as
condições existentes da vida. Nossa pri-
meira tarefa é permitir às pessoas que
cesse de se submeter ao meio e aos pa-
drões de comportamento. O que é
inseparável de uma possibilidade de se
reconhecer livremente em algumas zonas
elementares delimitadas para a ativida-
de humana. As pessoas estarão obriga-
das ainda durante muito tempo a aceitar
·99·
,----
I
o período reificado das cidades. Mas a
atitude com que o aceitarão pode ser
mudada imediatamente. Deve-se susten-
tar a difusão da desconfiança para os jar-
dins de infância ventilados e coloridos que
constituem, tanto o Leste como o Oeste,
as novas cidades dormitório. Só a desilu-
são estabelecerá a questão de uma cons-
trução consciente do meio urbano.

Uma liberdade infra mentável


O principal êxito da planificação
atual das cidades faz esquecer a pos-
sibilidade do que nós chamamos urbanis-
mo unitário, ou seja, a crítica viva, alimen-
tada pelas tensões de toda vida quotidia-
na, dessa manipulação das cidades e de
seus habitantes. Crítica viva quer dizer es-
tabelecimento das bases de uma vida ex-
perimental: reunião de criadores de sua
própria vida em terrenos dispostos para I I

seus fins. Essas bases não poderão ser


reservadas a "diversões" separadas da
sociedade. Nenhuma zona espaço-tempo-
-100-
ral é totalmente separável. De fato, sem-
pre existe pressão da sociedade global
sobre as atuais "reservas" de férias. A
pressão será exercida no sentido inverso
nas bases situacionistas, que cumprirão
a função de ponte para uma invasão de
toda vida quotidiana. O urbanismo uni-
tário é o contrário de uma atividade es-
pecializada; e reconhecer um campo ur-
banístico separado é reconhecerjá toda a
mentira urbanística e a mentira de toda
a vida.
É a felicidade aquilo que se promete
no urbanismo. Portanto, o urbanismo será
julgado segundo esta promessa. A coor-
denação dos meios de denúncia artística
e dos meios de denúncia científica, deve
levar a uma denúncia completa do con-
dicionamento existente.

O desembar~ue 6
Todo espaço já está ocupado pelo ini-
migo, que domesticou para sua utilização
até as regras elementares desse espaço
·101-
----- - --------
11

12. Ver nota 1, Programa para um novo Urbanismo,


pago 20. Ver também texto pré-situacionista Um Guia
Prático para o Desvio no sítio do Coletivo Gunh
Anopetil.
·102·

,----._- -- ---
8 Condições do diálogo
o funcional é o que é prático. Unica-
mente é prático a resolução de nosso pro-
blema fundamental: a realização de nós
mesmos (nosso desvencilhamento do sis-
tema do isolamento). Isso é o útil e o uti-
litário. Nada mais. Todo o resto não re-
presenta mais que derivações mínimas do
prático; sua mistificação.

'I Ma téria rima


e transformação
A destruição situacionista do condici-
onamento atual é já, ao mesmo tempo, a
construção das situações. É a libertação
para as energias inesgotáveis contidas na
vida quotidiana petrificada. A atual pla-
nificação das cidades, que se apresenta
como uma geologia da mentira, cederá
lugar, com o urbanismo unitário, a uma
técnica de defesa das condições da liber-
dade, sempre amenizadas, no momento

-1113-

- -- -----------------
em que os indivíduos, que enquanto tais
não existem ainda, construam sua pró-

1O
pria história.

Fim da pré- história


dO qmdiçjopamrptg
Não sustentamos que se retorne a
qualquer estágio anterior ao condiciona-
mento; mas apenas ir além. Inventamos
a arquitetura e o urbanismo que não po-
dem ser realizados sem a revolução da
vida quotidiana; ou seja, a apropriação do
condicionamento por todos os homens,
seu crescimento indefinido, seu fim.

Attila Kotanyi &


Raoul Vaneigem, 1961

-1011-
Apêndice
Coletivos e sítios
Arquivo Situacionista Brasileiro
Projeto Periferia
Arquivo dos textos situacionistas no
Brasil. Possui o índice de todos os artigos
publicados na revista IS. Porém ainda não
tem traduzido todos esses artigos. Textos
em português e espanhol.
www.gcocitics.com/projctopcrifcria5/asb.htm
(pt)

Archivo Situacionista Hispano


Este arquivo é referência em textos
situacionistas no idioma espanhol. Mai-
or do que o arquivo brasileiro, faz parte
da rede de arquivos situacionistas.
www.sindominio.nct/ashllash.htm (esp.)

-105-
Biblioteca Virtual Revolucionária
Além dum rico acervo de artigos da
1S, pode-se encontrar nessa biblioteca o
livro A Sociedade do Espetáculo de Guy
Debord. além de conteúdos sobre o gru-
po. Traz material de conteúdo revolucio-
nário sobre Revolução e Contra-revolução
Russa, Revolução Espanhola, Conselho de
Trabalhadores e etc.
www.geocities.com/autonomiabvr (pt)

Coletivo Baderna
Se por um lado saiu da net. este coleti-
vo é o responsável pelas publicações de li-
vros com conteúdo contracultural, através
da editora Conrad incluindo Situacionistas:
teoria e prática da revolução.

Coletivo Gunh Anopetil


Contém um acervo da 1S com textos
traduzidos por membros do coletivo, que
variam desde o momento anterior a fun-
dação do grupo, até o seu fim. Além do
-106-
acervo IS encontram-se textos do próprio
grupo.
br.gcocítíes.corn/anopetíl (pt)

Coletivo Sabotagem
Coletivo contra o direito autoral e mi-
litante na difusão de conhecimentos.
Contém artigos situacionistas enviados
por colaboradores. Possui um rico conteú-
do Iibertário, Além de livros, podem ser
baixados vídeos (há um rico acervo de
documentários), tutoriais, etc.
www.sabotagem.revolt.org (pt)

Rizoma.net
Neste sítio é possível encontrar mate-
rial sobre o grupo e membros, artigos de
grupos que militam na psicogeografia (in-
clusive que criticam a IS), artigos publi-
cados nas revistas da IS, etc. Contém um
acervo considerável sobre a temática
psicogeográfica e outras artes da subver-
são.
-107-
www.rizoma.net (pt)

Editora Deriva
Site da editora onde consta textos
situacíonistas, mapas psicogeográficos e
quadrinhos inspirados no conceito do
détournement.
wwwderiva.com.br (pt)

Livros
AQUINO, João Emiliano. Reificação
e Linguagem em Guy Debord. Forta-
leza: EDUECE, 2006.
DEBORD, Guy. A Sociedade do es-
petáculo. Rio de Janeiro: Contraponto,
1997.
---
, Guy. Panegírico. São Pau-
10: Conrad Editora do Brasil, 2002.
HOME, Stewart. Assalto à cultura:
Utopia, subversão, guerrilha na
(anti) arte do século XX. São Paulo:
-108-

1---
Editora Conrad do Brasil, 1999.
INTERNACIONAL SITUACIONISTA.
Situacionista: teoria e prática da re-
volução. Coleção Baderna. São Paulo:
Conrad Editora do Brasil, 2002.
JACQUES, Paola (org). Apologia da
Deriva: escritos situacionistas sobre a
cidade. Rio de Janeiro: Casa da Palavra,
2003.
JAPPE, Anselm. Debord. Petrópolis-
RJ: Vozes, 1999
VANEIGEM, Raoul. A Arte de Viver
para as Novas Gerações. Coleção
Baderna São Paulo: Conrad Editora do
Brasil,2002.
-----'
, Raoul. Nada é sagra-
do, tudo pode ser dito. São Paulo, Pa-
rábola, 2004

-109-

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