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MINISTÉRIO DA FAZENDA

PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL


COORDENAÇÃO-GERAL DE ASSUNTOS TRIBUTÁRIOS

PARECER PGFN/CAT/Nº 2195 /2013

Imposto sobre a Importação de Produtos


Estrangeiros. Materialidade da hipótese de incidência
do imposto sobre a importação. Decreto-lei nº 37, de
18 de novembro de 1966, art. 1º, § 1º, com a
redação dada pelo Decreto-lei nº 2.472, de 1º de
setembro de 1988. Incidência do imposto sobre a
importação de mercadoria nacional ou nacionalizada
exportada em caráter definitivo, que reingressa no
País, com exceção das situações previstas nas
alíneas do citado § 1º. Compatibilidade material da
norma incursa no § 1º do art. 1º do DL nº 37, de
1966, com o Texto Constitucional vigente.

Trata-se de expediente oriundo da Procuradoria-Geral da República para


pronunciamento desta Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional a propósito da
(in)constitucionalidade do § 1º do art. 1º do Decreto-lei nº 37, de 18 de novembro de 1966,
com a redação dada pelo Decreto-lei nº 2.472, de 1º de setembro de 1988, norma repisada
no art. 70, caput, e incisos, do Decreto nº 6.759, de 5 de fevereiro de 2009, nominado
Regulamento Aduaneiro. Suscita-se eventual ofensa aos arts. 146, III, a, e 153, I, da
Constituição Federal de 1988.

2. A questão sob apreço teve origem, naquele Órgão Ministerial, em


requerimento formulado por cidadão que questionava o então art. 70 do Decreto nº 4.543,
de 26 de dezembro de 2002, cujo texto substancialmente idêntico ao citado art. 70 do
Decreto nº 6.759, de 2009, foi revogado por esse último. A inconformidade do administrado
radicava-se em declaração de inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal, em
sede de controle incidental, da norma incursa no art. 93 do Decreto-lei nº 37, de 1966, cuja
execução restou suspensa pela Resolução nº 436, de 5 de dezembro de 1987, do Senado
Federal.

3. A presente documentação vem acompanhada pela Nota Cosit nº 252, de 28


de outubro de 2004, a qual conclui que, para fins de incidência do Imposto de Importação,
considera-se estrangeira a mercadoria nacional ou nacionalizada exportada, que retorne ao
País, exceto na hipótese de mercadoria para a qual tenha sido aplicado o regime de
exportação temporária e os demais casos citados no art. 70 do revogado Decreto nº 4.543,
de 2002, igualmente previstos no art. 70 do atual Regulamento Aduaneiro.
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4. É o que se tem de mais importante para relatar, passando-se à análise


jurídica da questão em estudo.

5. O § 5º do art. 34 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT)


dispõe que, vigente o novo sistema tributário nacional, fica assegurada a aplicação da
legislação anterior, no que não seja incompatível com ele e com as leis editadas pelos entes
federados logo após a promulgação da Constituição brasileira de 1988 e com entrada em
vigor a partir do primeiro dia do mês de março de 1989, necessárias à aplicação do referido
sistema tributário.

6. Desse modo, as reflexões supervenientes serão delineadas sob a ótica do


fenômeno da recepção. Isto é, tendo em vista que o Decreto-lei nº 2.472, de 1988 (DOU
2.9.1988), nasceu sob a égide de ordem constitucional pretérita, cabe analisar se a norma
incursa no § 1º do art. 1º do Decreto-lei nº 37, de 1966, na redação dada por aquele ato
normativo, foi recebida pela Constituição de 1988 e, quanto ao fenômeno da recepção, é
certo que revalida apenas as normas que não desafiam, materialmente, a nova
Constituição.1 Sob tal aspecto, passa-se ao exame da compatibilidade material da referida
norma em face dos arts. 146, III, a, e 153, I, do Texto Constitucional vigente.

7. É sabido que a Constituição vigente reserva à lei complementar a fixação de


normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre definição de tributos
e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados em seu texto, a dos
respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes (cf. art. 146, III, a). Mais
adiante, define competência tributária da União para instituir impostos sobre importação de
produtos estrangeiros (art. 153, I).

8. Fundando-se na mencionada matriz constitucional, a norma incursa no art. 19


do Código Tributário Nacional (CTN) – Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 –, foi
recepcionada sob a roupagem de norma geral, a qual prevê que o imposto, de competência
da União, sobre a importação de produtos estrangeiros tem como fato gerador a entrada
destes no território nacional. De igual modo, as normas inscritas nos arts. 20 e 22 do CTN,

1
Cf. MENDES, Gilmar Ferreira, et al. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 193.

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recepcionadas, com status de lei complementar, definem, respectivamente, a base de


cálculo e o contribuinte do imposto de importação.

9. O art. 1º do Decreto-lei nº 37, de 1966, institui o Imposto sobre a Importação,


dispondo o quanto segue:
Art. 1º O Imposto sobre a Importação incide sobre mercadoria estrangeira e tem como
fato gerador sua entrada no Território Nacional. (Redação dada pelo Decreto-Lei nº
2.472, de 1º/9/1988)
§ 1º Para fins de incidência do imposto, considerar-se-á também estrangeira a
mercadoria nacional ou nacionalizada exportada, que retornar ao País, salvo se:
(Incluído pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 1º/9/1988)
a) enviada em consignação e não vendida no prazo autorizado; (Incluído pelo
Decreto-Lei nº 2.472, de 1º/9/1988)
b) devolvida por motivo de defeito técnico, para reparo ou substituição; (Incluído
pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 1º/9/1988)
c) por motivo de modificações na sistemática de importação por parte do país
importador; (Incluído pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 1º/9/1988)
d) por motivo de guerra ou calamidade pública; (Incluído pelo Decreto-Lei nº
2.472, de 1º/9/1988)
e) por outros fatores alheios à vontade do exportador. (Incluído pelo Decreto-Lei
nº 2.472, de 1º/9/1988)
(...)

10. Por sua vez, o Decreto nº 6.759, de 2009, reproduzindo o referido dispositivo
legal, prevê em seu art. 70:
Art. 70. Considera-se estrangeira, para fins de incidência do imposto, a mercadoria
nacional ou nacionalizada exportada, que retorne ao País, salvo se (Decreto-Lei nº
37, de 1966, art. 1º, § 1º, com a redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 1988,
art. 1º):
I - enviada em consignação e não vendida no prazo autorizado;
II - devolvida por motivo de defeito técnico, para reparo ou para substituição;
III - por motivo de modificações na sistemática de importação por parte do país
importador;
IV - por motivo de guerra ou de calamidade pública; ou
V - por outros fatores alheios à vontade do exportador.
(...)

11. Com efeito, o art. 153, I, da Constituição Federal de 1988, outorga


competência à União para instituir imposto sobre a importação de produtos estrangeiros,
exação de caráter eminentemente extrafiscal. Tem-se, portanto, como base econômica do
referido tributo, a importação de produtos estrangeiros. Estrangeiro deriva do latim
extraneus, que quer dizer de fora. Assim, quer como adjetivo, quer como substantivo,
significa coisa que procede ou pertence a outro país.2 É certo que a expressão produtos
estrangeiros funciona como verdadeiro limite ao legislador ordinário e também como
parâmetro para se verificar a harmonia de norma anterior com o Texto Constitucional que
2
Cf. DE PLÁCIDO e SILVA. Vocabulário jurídico. 15 ed, Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 327.

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lhe sucedeu. Não obstante, referida locução não se limita a produto cuja fabricação tenha
ocorrido no exterior, mas compreende, igualmente, produtos substancialmente
transformados em território alienígena, bem como produtos nacionais ou nacionalizados
exportados a título definitivo e que tenham retornado ao País.

12. Note-se que o inciso I do art. 153 da CR/88 refere-se a produtos estrangeiros,
ou seja, produtos vindos do exterior. A norma constitucional de competência tributária não
restringe a incidência do citado imposto ao critério de origem – onde o bem foi produzido ou
substancialmente transformado3 –, alcançando, de igual modo, bens nacionais e
nacionalizados exportados definitivamente, dado que, nesse último caso, a mercadoria
passa a receber o status jurídico de estrangeira.

13. A interpretação da norma incursa no art. 153, I, da CR/88, não pode ser
autista, fechada em concepção que ignora a realidade do comércio internacional subjacente
às formas jurídicas hoje existentes. No mundo globalizado, com “a intensificação de
relações sociais mundiais que unem localidades distantes de tal modo que os
acontecimentos locais são condicionados por eventos que acontecem a muitas milhas de
distância e vice-versa”4, a efetividade da referida norma encontra-se intimamente conectada
com a dinamicidade e complexidade dos fenômenos negociais na seara internacional.
Recusar a validade de aporte normativo idôneo a esclarecer o conteúdo da aludida norma
implicaria reduzir, de forma indevida, o seu campo de abrangência.

14. Como bem ressaltou a Nota Cosit nº 252/2004, “em face da grande
multiplicidade de operações de comércio internacional, hoje em dia, uma mercadoria pode
ser produzida em vários estágios e com a participação de vários países. A mercadoria pode
ir e vir, como objeto de comércio. Pode ser beneficiada, transformada, vendida, e essas
etapas podem se realizar em países distintos. Assim, o que prepondera, nas operações
de comércio exterior, atualmente, não é apenas a origem da mercadoria, mas também
sua procedência. Portanto, o Imposto de Importação incide sobre operação de importação
de mercadoria de origem ou procedência estrangeira. Assim, um produto de origem
nacional ou nacionalizado pode adquirir o status de estrangeiro em função da sua nova
procedência”.

3
Cf. MEIRA, Liziane Angelotti. Tributos sobre o comércio exterior. São Paulo, Saraiva, 2012, p. 331.
4
GIDDENS apud SANTOS, Boaventura de Sousa. Os processos da globalização. In: SANTOS, Boaventura de
Sousa (Org.). A globalização e as ciências sociais. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2002, p. 26.

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15. Nesse sentido, colhem-se as percepções de Liziane Angelotti Meira, Chefe da


Divisão de Tributos sobre o Comércio Exterior da Secretaria da Receita Federal do Brasil,
em importante obra sobre o tema:5
Os bens do Brasil podem ser alcançados pelo imposto sobre a
importação quando forem exportados e transformados no exterior – de modo
que percam a identidade, transformando-se em produtos estrangeiros,
segundo as regras de origem – e depois, reimportados.
O Supremo Tribunal Federal manifestou-se, no Recurso
Extraordinário nº 104.306-7, sobre a falta de competência da União para
cobrar imposto sobre a importação de bens de origem nacional. Foi
declarada a inconstitucionalidade do artigo 93 do Decreto-lei nº 37, de 1966,
que teve a aplicabilidade suspensa pela Resolução do Senado nº 436, de 5
de dezembro de 1987. (...)
Mister consignar que a situação considerada inconstitucional pelo
STF e afastada do sistema normativo brasileiro por resolução do Senado
Federal identifica-se com bens que saíram temporariamente do país, não
sofreram de despacho para exportação, nem obtiveram as desonerações
tributárias relativas à exportação.
Diversa é a hipótese veiculada pelo artigo 1º, § 1º, do Decreto-lei n.
37, de 1966. Neste caso, os bens foram exportados definitivamente, em
regra, com transferência de propriedade para estrangeiro, e receberam os
incentivos fiscais para a exportação. Trata-se, assim, de bens
desnacionalizados. Se estes bens retornarem ao país sem uma
transformação substancial, juridicamente continuariam sendo bens
desnacionalizados com origem brasileira.

16. Como se vê, a materialidade do tributo sob apreço remete à procedência do


produto, termo mais amplo que origem, esse último intimamente ligado à zona geográfica ou
territorial de produção da mercadoria. De tal modo, com a saída, em caráter definitivo, da
mercadoria nacional, esta perde a qualidade de nacional, assumindo status de produto
estrangeiro, submetendo-se à incidência do Imposto de Importação se ulteriormente
reintroduzida no Brasil, salvo se configurada alguma das situações previstas nos incisos do
§ 1º do art. 1º do Decreto-lei nº 37, de 1966.

17. Os incisos do § 1º do art. 1º do Decreto-lei nº 37, de 1966, encerram


cláusulas que excepcionam a norma inscrita no referido § 1º, elegendo produtos que, a
despeito de exportados, não perdem a qualidade de nacional ao retornarem ao País,
afastando-se, portanto, a incidência do Imposto de Importação. Cabe destacar, a propósito,
a situação descrita no inciso V que se reveste de alcance normativo bastante amplo, cujo
teor explicita que não se consideram estrangeiras as mercadorias que voltarem ao Brasil por
fatores alheios à vontade do exportador.

5
MEIRA, Liziane Angelotti. Tributos sobre o comércio exterior. São Paulo, Saraiva, 2012, p. 338.

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18. Sob tal perspectiva, o comando do § 1º do art. 1º do Decreto-lei nº 37, de


1966, apenas explicitou o conteúdo normativo da norma de competência tributária inscrita
no inciso I do art. 153 da Constituição, sem se divorciar do seu espectro de abrangência.

19. Ressalte-se, ademais, que o mandamento legal do § 1º do art. 1º do Decreto-


lei nº 37, de 1966, possui campo de abrangência diverso do art. 93, na redação originária,
do Decreto-lei nº 37, de 1966, declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, em
sede de controle difuso, nos autos do RE 104.306, de relatoria do Ministro Octavio Gallotti, e
posteriormente com execução suspensa pela Resolução nº 436, de 1987, do Senado
Federal.

20. O citado art. 93, em sua redação original, estava inserido em Título dedicado
aos Regimes Aduaneiros Especiais, em Capítulo que disciplina a Exportação Temporária, e
determinava a cobrança de Imposto de Importação na hipótese de descumprimento das
condições do regime de mercadoria exportada temporariamente, considerada estrangeira
pelo teor do referido dispositivo legal, da forma que segue:

Art. 93. Considerar-se-á estrangeira, para efeito de incidência do imposto, a


mercadoria nacional ou nacionalizada reimportada, quando houver sido exportada
sem observância das condições deste artigo.

21. Trecho do voto do Ministro Relator Octavio Gallotti, proferido no citado


julgamento, evidencia a projeção do então art. 93, ao concluir que “não se poderia, pois sem
ferir o artigo 21, I, da Constituição [Constituição de 1967, com a redação dada pela Emenda
Constitucional nº 1, de 17/10/1969], entender a expressão ‘produto estrangeiro’, como
igualmente abrangendo as mercadorias nacionais retiradas temporariamente do Brasil,
para exposição em feiras no Exterior, numa prática habitual de incentivo à exportação”.6

22. Assim, a par da referida resolução suspensiva do Senado, o art. 9º do


Decreto-lei nº 2.471, de 1º de setembro de 1988, impôs o cancelamento dos débitos para
com a Fazenda Nacional, inscritos ou não em Dívida Ativa da União, ajuizados ou não, que
tivessem origem na cobrança do imposto de importação, no caso de reimportação de
mercadoria nacional ou nacionalizada, de que trata o mencionado art. 93.

6
RE 104.306, grifos que não constam do original.

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23. Note-se que, no regime aduaneiro especial de exportação temporária, a saída


da mercadoria não ocorre a título definitivo, circunstância que a impede de receber a
qualificação de estrangeira. Aliás, nos termos da legislação de regência hoje em vigor, a
inobservância das regras do regime de exportação temporária atrai a incidência de multa,
forte no art. 72 da Lei nº 10.833, de 29 de dezembro de 2003. Diversa é a situação do § 1º
do art. 1º do Decreto-lei nº 37, de 1966, que regula situação na qual a mercadoria nacional
foi remetida para fora a título definitivo, passando por processo de desnacionalização.

24. Em que pese o inciso I do art. 153 do Texto Constitucional vigente não ter
feito referência a mercadorias de procedência estrangeira, tal como constava do texto da
Constituição brasileira de 1946, a redação mais sintética não afasta, per se, a possibilidade
de equiparação nos moldes do § 1º do art. 1º do Decreto-lei nº 37, de 1966. Ainda que
concisa e abreviada, a norma de competência tributária do imposto sobre a importação de
produtos estrangeiros alcança, igualmente, a mercadoria desnacionalizada que volte a
ingressar no País, na medida em que, por ocasião de sua saída definitiva do território
nacional, passou a se revestir da qualificação de estrangeira.

25. Como se vê, a introdução de um produto estrangeiro no território nacional é o


fato material, núcleo da hipótese de incidência do imposto de importação, bastando, por si
só, a entrada em território nacional de mercadoria procedente ou originária do exterior com
ânimo de ser internada no País, para fins de incidência do referido tributo. E não há
qualquer extravasamento no fato de se reconhecer a validade material do § 1º do art. 1º do
DL nº 37, de 1996, com a Constituição vigente. In casu, a equiparação feita pelo legislador
fundamenta-se na própria normatividade emanada do Texto Constitucional, não se tratando
de ficção jurídica, razão pela qual o citado dispositivo legal foi recepcionado pela ordem
jurídica constitucional de 1988.

26. Em reforço ao entendimento aqui concebido, colhem-se excertos do voto


condutor, proferido em âmbito de 3ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais, nos
autos do Processo nº 11075.000049/00-05, de relatoria da Conselheira Judith Amaral
Marcondes Armando, julgado em 14 de maio de 2007, com ênfases minhas:7

7
Acórdão CSRF nº 03-05.347. Disponível em
http://carf.fazenda.gov.br/sincon/public/pages/ConsultarJurisprudencia/listaJurisprudenciaCarf.jsf. Acesso em 11
novembro de 2013.

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“Entendo que a utilização dos termos desnacionalizada e reimportada


merecem ser apreciados no contexto das normas aduaneiras, antes de mais nada.
(...)
É certo que as palavras utilizadas na norma maior positivada, a
Constituição Federal, devem ser entendidas segundo o senso comum. Elas se
dirigem ao todo do corpo social. A despeito do brilho e especialização de seus
cidadãos individualizados, a Constituição Federal fala ao cidadão comum,
incluindo-o, pela compreensão das palavras de seu texto, no conjunto dos
cidadãos que ali expressam os seus valores.
Entretanto, ao construir normativas especializadas, tal como a
aduaneira, inclusive porque utilizam parte da normativa internacional como
modelo, as palavras deixam de lado o senso comum e ‘falam’ aos que se
utilizam desses setores ou campos específicos.
Assim, as leis aduaneiras constroem a positivação dos seus valores usando
palavras do senso comum, mas tendo o cuidado de conceituá-las claramente no seu
escopo, permitindo que não haja ambiguidade ou mal entendido quando
interpretadas pelos cidadãos que de boa fé as utilizam.
Vejamos nesse sentido o Decreto-lei 37, de 1966, que dispõe sobre o imposto
de importação e os serviços aduaneiros:
(...)
Está bem claro que, para os efeitos de aplicação do Imposto de
Importação sobre mercadorias estrangeiras que ingressam no território
aduaneiro, a mercadoria nacional ou nacionalizada, que tenha sido exportada, é
considerada estrangeira.
(...)
Entretanto, foi trazida a argumentação do conteúdo da Resolução nº 436, de
1987 do Senado Federal que tratando do art. 93 do Decreto-lei 37, texto original,
(considerar-se-á estrangeira, para efeito de incidência do imposto, a mercadoria
nacional ou nacionalizada reimportada, quando houver sido exportada sem
observância das condições deste artigo) suspendeu, por inconstitucionalidade, a
execução do art. 93, do Decreto-Lei nº 37, de 18 de novembro de 1966:
(...)
Há de se considerar duas observações sobre a indevida aplicação da tese
contida na Resolução do Senado Federal 436 a este caso:
1- referia-se a exportação temporária. Como se sabe, exportação temporária
é um regime aduaneiro especial onde a mercadoria, sem trocar o seu proprietário, sai
do país com alguma finalidade permitida para depois ser reintroduzida no território
aduaneiro. Como tal, o regime possui normas próprias, diferentes da exportação
definitiva, e das demais exportações condicionadas;
2- foi editada no contexto da apreciação sobre a prevalência do conteúdo ou
da forma da norma aduaneira em comento (exportação temporária), definindo-se pelo
conteúdo em detrimento da forma. Entendeu o Legislador que não havia de se cobrar
tributos do exportador temporário brasileiro, uma vez que não havia ânimo de
exportação definitiva, ainda que a norma falasse em exportação quando, a rigor,
deveria mencionar ‘saída temporária’.
Feito este introito, permito-me um paralelo entre a aquisição ou a perda da
nacionalidade de pessoas e de mercadorias, segundo o conceito sociológico, que
entende que A NACIONALIDADE INDICA A PERTINÊNCIA DA PESSOA A UMA
NAÇÃO.
(...)
Assim como se dá com as pessoas, duas formas permitem individualizar a
mercadoria como pertencente a um Estado: sua produção naquele país, -
correspondendo ao nascimento geográfico – ou a propriedade, correspondendo
ao nascimento sociológico (entendo o jurídico como o jurídico como subconjunto
do sociológico).

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Seguindo o raciocínio, percebemos a nacionalidade da mercadoria como algo


que a caracteriza de forma que possamos localizá-la primeiro geograficamente e
mais importante, na inclusão do contexto sócio-jurídico.
Ora, a exportação definitiva desloca física e juridicamente a mercadoria
passando a localizá-la no espaço geográfico de outra nação e transferindo a
propriedade para uma outra coletividade.
Percebe-se que houve com a exportação definitiva a perda do vínculo
que caracteriza a nacionalidade.
Ao conceder tratamento de estrangeira à mercadoria desnacionalizada, o
legislador aduaneiro, tal como o legislador constitucional, pretendeu dar ao produto
nacional que tenha sido transferido geográfica e juridicamente para outra nação o
tratamento que dá ao produto estrangeiro.
(...)

27. Nessa mesma linha de raciocínio, invoca-se a fundamentação do voto


condutor, proferido em âmbito da 2ª Câmara do Terceiro Conselho de Contribuintes, no bojo
do Processo nº 11075.002500/99-04, de relatoria do Conselheiro Luis Antonio Flora, julgado
em 20 de outubro de 2004:8
Segundo entendimento dos julgadores a quo, a mercadoria nacional ou
nacionalizada que, após ser submetida à exportação definitiva, retorna ao País, é tida
como mercadoria estrangeira.
Tal posicionamento decorre da inteligência do artigo 1º, § 1º do Decreto-lei nº
37/66, com sua redação modificada pelo artigo 1º do Decreto-lei nº 2.472/88, que
declara expressamente a incidência do Imposto de Importação sobre mercadorias
nacionais, exportadas em caráter definitivo, quando do seu retorno ao País.
(...)
Assim, fica patente que a declaração de inconstitucionalidade de que se trata
[declaração de inconstitucionalidade do art. 93 do Decreto-lei 37/66, promovida pelo
Recurso Extraordinário 104.306-7] só atinge as exportações temporárias, não
podendo ser extensiva a mercadorias exportadas a título definitivo, como no caso
em tela. Aliás, a admissão de tal tese conduziria à instauração do caos no comércio
exterior, já que transformaria em letra morta o Regime Aduaneiro Especial de
Exportação Temporária, que permite o controle sobre a mercadoria que se pretende
retornar ao País. Destarte, qualquer produto exportado definitivamente poderia
retornar ao País a qualquer momento, sem o pagamento de imposto, o que
dificultaria todos os controles, inclusive acerca da agregação de etapas de
industrialização eventualmente promovida no exterior.

28. Por fim, há de se afastar eventual alegação de vício formal, pois a norma
anterior compatível materialmente com o novo Texto Constitucional é recebida com a
natureza normativa prevista na Constituição. Isto é, a filtragem constitucional centra-se
apenas no conteúdo da norma, ganhando a lei anterior o status de lei ordinária ou de lei
complementar, a depender da exigência feita pela nova ordem jurídica constitucional,
inexistindo qualquer antinomia entre o § 1º do art. 1º do DL nº 37, de 1966, e o art. 19 do
CTN, e consequentemente com o art. 146, III, a, da Constituição.

8
Disponível em
http://carf.fazenda.gov.br/sincon/public/pages/ConsultarJurisprudencia/listaJurisprudenciaCarf.jsf. Acesso em 11
novembro de 2013.

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29. Do exposto, a par da conformação normativa do § 1º do art. 1º do Decreto-lei


nº 37, de 1966, com a base econômica do imposto sobre importação, prevista no inciso I do
art. 153 do Texto Constitucional vigente, e com os comandos do art. 146, III, a, da CR/88,
conclui-se pela compatibilidade material do § 1º do art. 1º do Decreto-lei nº 37, de 1966, na
redação dada pelo Decreto-lei nº 2.472, de 1988, e, consequentemente, pela legalidade do
art. 70, caput, e incisos, do Decreto nº 6.759, de 2009.

À apreciação superior.

COORDENAÇÃO-GERAL DE ASSUNTOS TRIBUTÁRIOS, em 13 de


novembro de 2013.

FLAVIANE RIBEIRO DE ARAÚJO


Procuradora da Fazenda Nacional

De acordo. À consideração do Senhor Procurador-Geral Adjunto de


Consultoria e Contencioso Tributário.

COORDENAÇÃO-GERAL DE ASSUNTOS TRIBUTÁRIOS, em 14 de


novembro de 2013.

CLÁUDIA REGINA GUSMÃO CORDEIRO


Coordenadora-Geral de Assuntos Tributários, Substituta

De acordo. À consideração da Senhora Procurador-Geral da Fazenda


Nacional.

PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL, em 20 de novembro


de 2013.

FABRÍCIO DA SOLLER
Procurador-Geral Adjunto de Consultoria e Contencioso Tributário

Aprovo. Remeta-se à Procuradoria-Geral da República, em referência ao


Ofício 18155-OBF-PGR, de 24 de outubro de 2013.

PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL, em 28 de novembro


de 2013.

ADRIANA QUEIROZ DE CARVALHO


Procuradora-Geral da Fazenda Nacional

Parecer_II_DL 37-1966 10

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