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DIREITO FISCAL – CASOS PRÁTICOS 1º TESTE

ASPETOS ESSENCIAIS À RESOLUÇÃO DE CASOS PRÁTICOS EM DIREITO FISCAL:

1. Perceber qual a situação de facto e a sua componente prática, de modo


2. a evitar uma recondução das respostas meramente ao contexto teórico.
3. Compreender, na questão, qual a matéria que está sob avaliação (exceto questões quid iuris),
que deve ser o principal assunto abordado na resposta.
4. Realizar um estreitamento da matéria em questão, desde as suas bases gerais e mais abstratas
até à matéria de facto tratada na questão, mediante análise prática (ex. em matéria de tributo,
começa-se por dar uma contextualização geral, partindo-se depois para o tratamento do tributo
em causa e sua aplicação prática).

CASO PRÁTICO 1

A 30 de março de 2018, foi publicado em Diário da República um decreto-lei que veio


introduzir as seguintes medidas legislativas: (Pronuncie-se sobre cada uma das medidas
constantes no aludido diploma, individualizando as respetivas respostas)
a) Agravamento da taxa normal do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) no continente,
de 23% para 28% (mantendo as taxas normais dos Açores e da Madeira em 18% e 22%,
respetivamente);
• Vícios orgânicos:
▪ A competência legislativa e administrativa do Governo em matéria tributária (artigos
165.º, n.º 1, alínea i), e 198.º, n.º 1, alínea b), da CRP)
▪ O princípio da legalidade tributária - reserva de Lei: (i) em sentido absoluto e em
sentido relativo e (ii) em sentido formal e em sentido material (artigo 103.º, n.º 2, da CRP, e
artigo 8.º da LGT)
• Vícios formais: a impossibilidade de adoção de Decreto Lei sem autorização legislativa para
disciplinar os elementos essenciais dos impostos – no caso, a taxa (artigos 103.º, n.º 2, 165.º, n.º 1,
alínea i), e 198.º, n.º 1, alínea b), da CRP)
• (Eventual) vício material: violação do princípio da proporcionalidade (artigo 62.º da
CRP)
b) Estabelecimento de (i) isenção de IVA relativamente aos serviços profissionais prestados
por solicitadores e de (ii) isenção de todos os serviços médicos quando prestados a
elementos de famílias numerosas;
• Vícios materiais:
▪ O princípio do livre exercício da profissão
▪ O princípio da igualdade tributária (artigo 13.º da CRP e artigos 5.º, n.º 2 e 7.º, n.º 3,
da LGT) – uma vez que a medida em causa só se aplica a um certo grupo de contribuintes
▪ O princípio da consideração fiscal da família (artigos 67.º, n.º 2, alínea f), 104.º, n.º
1, da CRP, e artigo 6.º, n.º 3, da LGT) – que não obrigada a discriminação positiva da família
▪ O princípio da tipicidade tributária – uma vez que fica por esclarecer quando é que
uma família é considerada numerosa

• Vícios orgânicos e formais: remissão para a resposta anterior, com a identificação do elemento
essencial em causa – benefícios fiscais
c) A aplicação das aludidas alterações legislativas a todas as operações concretizadas desde 1
de janeiro de 2018;
Vício material: o princípio da segurança jurídica (i) a não retroatividade das normas tributárias
(artigo 103.º, n.º 3, da CRP, e artigo 12.º, da LGT); (ii) recondução do caso a uma situação de
retroatividade de 1.º grau.
d) Criação do “imposto do sal”, que passará a incidir sobre quaisquer alimentos que tenham
mais de um grama de sal por cada 100 gramas de produto, tendo em vista diminuir os
casos de aterosclerose e hipertensão em Portugal.
• Identificar o tipo de tributo, delimitando o conceito de taxa e o de imposto
• Ausência de uma contraprestação específica (não se verifica a bilateralidade) e de uma utilidade
divisível
• O tributo em causa é mais consentâneo com a figura do imposto

CASO PRÁTICO 2

No mês passado, por Portaria do Governo, foi criada a Taxa de Consolidação Financeira,
que passa a ser devida por todos os cidadãos de nacionalidade portuguesa que aufiram
rendimentos anuais superiores a € 2.500.
Resulta da aludida Portaria que a Taxa de Consolidação Financeira vigorará durante os
próximos dois anos. No entanto, este período poderá ser prorrogado ou não, em função dos
montantes de receita que vierem a ser arrecadados.
Na sequência desta medida, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu ontem um ofício-
circulado, nos termos do qual determinou que a Taxa de Consolidação Financeira será apenas
devida por advogados, podendo a mesma ser-lhes exigida também em relação aos rendimentos
auferidos no ano de 2017, no caso de terem sido superiores a € 20.000.
Pronuncie-se sobre a medida referida à luz dos princípios jurídico-constitucionais de Direito
Fiscal.

• Qualificação do tributo em causa como um imposto (artigo 4.º da LGT) Em particular, a


distinção entre impostos e taxas: critério económico-financeiro (divisibilidade) e critério jurídico
(sinalagmaticidade)
• Regime jurídico aplicável aos impostos
Em particular, o princípio da legalidade tributária: o Princípio da reserva de lei:
(i) em sentido absoluto(intensidade máxima) e em sentido relativo(intensidade
mínima);
(ii) em sentido formal e em sentido material (artigo 103.º, n.º 2, da CRP, e artigo 8.º
da LGT)
o Princípio da prevalência de lei (artigo 266.º, n.º 2, da CRP)
o Princípio da precedência de lei (artigo 112.º, n.º 8, da CRP)
• Competência do Governo em matéria tributária o Competências legislativas (artigo 198.ºda
CRP)
o Competências administrativas (decretos regulamentares, portarias e despachos
normativos) – a impossibilidade de serem criados tributos por portaria
• Competência da Administração Tributária e Aduaneira em matéria tributária – as ordens internas
– a impossibilidade de serem disciplinadas matérias essenciais dos impostos (em concreto, regras de
incidência) por ofício circulado
• Princípio da segurança jurídica e da confiança
o A rejeição do arbítrio, exigência de transparência – uma vez que se desconhece, ao certo,
o período de tempo durante o qual será devido o tributo e em que circunstâncias futuras
poderá ser exigido o A não retroatividade dos impostos (artigo 103.º, n.º 3, da CRP) – face à
exigência do tributo em relação aos rendimentos auferidos em 2017
• Princípio da igualdade tributária (artigo 13.º da CRP e artigos 5.º, n.º 2 e 7.º, n.º 3, da LGT) –
uma vez que a medida em causa só se aplicaria a um certo grupo de contribuintes
• Princípio da proteção da escolha e do livre exercício da profissão (artigos 47.º e 80.º, alínea c),
da CRP)
CASO PRÁTICO 3

No corrente mês, a Assembleia da República criou a “Taxa Desportista”.


A “Taxa Desportista” passará a acrescer, a partir de setembro de 2018, ao preço dos
bilhetes para todos os jogos de todas as modalidades desportivas, devendo ser paga pelos
espectadores no momento da aquisição dos bilhetes.
A receita obtida pela cobrança da aludida imposição destinar-se-á à promoção da prática do
desporto em Portugal.
Tendo em conta os dados fornecidos, responda de uma forma juridicamente fundamentada
às seguintes questões:
1. Será a “Taxa Desportista” uma verdadeira taxa?
Identificar o tipo de tributo, delimitando o conceito de taxa e o de imposto
- Ausência de uma contraprestação específica (não se verifica a bilateralidade) e de uma utilidade
divisível
- A “Taxa Desportista” não se reconduz de forma óbvia a nenhum dos tipos de taxa previstos no
artigo 4.º, n.º 2, da LGT
- O tributo em causa é mais consentâneo com a figura do imposto
2. Poderá o Governo, por decreto-lei, determinar as condições de isenção, de liquidação e de
cobrança da “Taxa Desportista”?
A competência do Governo em matéria tributária – em especial, as competências legislativas (artigos
198.º e 165.º, n.º 1, alínea i), da CRP)
- O princípio da legalidade tributária: a reserva de lei e a prevalência de lei (artigo 266.º, n.º 2, da
CRP); a precedência de lei (artigo 112.º, n.º 8, da CRP)
- Os elementos essenciais dos impostos: incidência, taxa, benefícios fiscais e garantias dos
contribuintes (artigo 103.º, n.º 2, da CRP, e artigo 8.º da LGT)
– recondução da isenção à matéria dos benefícios fiscais
– a necessidade de autorização legislativa (fator de valorização: referência à consideração doutrinal
da liquidação e da cobrança como elementos essenciais dos impostos).
3. Suponha que é definida uma isenção relativamente aos “jogos de futsal”. Considera que
também os “jogos de futebol” poderão ficar abrangidos por essa isenção?
A interpretação das normas tributárias (artigo 11.º da LGT)
▪ A interpretação económica e a interpretação funcional
▪ A interpretação das normas tributárias de acordo com os critérios tradicionais
interpretativos (artigo 9.º do CC)
- Os princípios da segurança jurídica e da tipicidade fechada (traços fundamentais)
– a inadmissibilidade da interpretação extensiva em relação a matéria de benefícios fiscais
(a isenção prevista para os jogos de futsal não se poderá estender aos jogos de futebol).
4. Pronuncie-se sobre a possibilidade de a “Taxa Desportista” ser também devida na compra
de bilhetes em Espanha para os jogos aí realizados.
Pronuncie-se sobre a possibilidade de a “Taxa Desportista” ser também devida na compra de bilhetes
em Espanha para os jogos aí realizados.
- O princípio da territorialidade
- Critérios de aplicação das leis tributárias no espaço – elementos de conexão (artigo 13.º da
LGT): de natureza pessoal e de natureza real
- A necessidade de existência de uma conexão relevante entre a manifestação de capacidade
contributiva (a compra dos bilhetes), o tributo e o ordenamento em causa

CASO PRÁTICO 4

Face às operações de reabilitação concretizadas na zona ribeirinha de Lisboa e promovidas


pela respetiva Autarquia, os imóveis ali situados viram o seu valor patrimonial aumentar
exponencialmente. Nessa sequência, o Governo aprovou, a 2 de maio de 2018, e ao abrigo de
uma autorização legislativa que havia sido concedida em agosto de 2016, um Decreto-Lei,
contendo as seguintes disposições: (Pronuncie-se sobre cada uma das medidas constantes no
aludido diploma, individualizando as respetivas respostas.)
a) Criação de um novo tributo, a ser pago pelos proprietários de tais imóveis;
Qualifica-se o tipo de tributo. Começa-se por dizer em que consiste um tributo (prestação
patrimonial exigida por entidades públicas a quem tem capacidade contributiva ou a quem beneficia
de um serviço ou prestação público, sem caráter sancionatório), bem como que tributos foram
construídos pelo ordenamento português. Exclui-se a análise dos tributos que não estão em causa na
alínea: neste caso, será uma contribuição especial ou um imposto (concentrar a resposta na matéria
dos impostos e contribuições especiais de melhoria). Conclui-se pelas contribuições especiais de
melhoria, uma vez que há uma atuação do ente público que aumenta o valor patrimonial dos imóveis
na zona ribeirinha de Lisboa. Está em causa a existência de operações de reabilitação, que aumentou
o valor patrimonial dos imóveis ali situados.
As implicações desta classificação prendem-se, sobretudo, com a questão da criação deste tributo
(primeiramente, fazer uma contextualização teórica e, seguidamente, uma concretização prática), no
caso, a partir do art. 165º/5 CRP (autorização legislativa). Ora, o problema é que, neste caso em
concreto, a autorização foi concedida a meio do ano, mas, mesmo assim, o prazo mantém-se até ao
final do ano em que a autorização foi concedida; há uma autorização concedida em agosto de 2016,
mas que apenas foi utilizada em 2018, pelo que, pelo já anteriormente mencionado, já não era válida,
portanto, caducou. Assim, o Decreto-lei em questão não corresponde às exigências constitucionais,
pelo que incorre em inconstitucionalidade orgânica (o Governo não estava autorizado, logo, não é o
órgão competente) e material (o Governo não pode legislar sobre esta matéria).

b) Diminuição do limite máximo permitido de deduções à coleta por despesas de educação


das famílias numerosas que naqueles imóveis habitem
Matéria do domínio do IRS. Está em causa uma diminuição das deduções, que é menos vantajosa
para os contribuintes, face a famílias numerosas. Neste contexto, importa mencionar o princípio
constitucional da consideração da família, no sentido em que o legislador compreende que, em
termos fiscais, um sujeito passivo inserido num agregado familiar não se encontra nas mesmas
condições de um sujeito passivo sozinho.

Está a existir, neste caso, tratamento desigual com as famílias numerosas, o que permite equacionar o
princípio da igualdade – art. 13º CRP, com ligação aos art. 5º/2 e 7º/3 LGT.

Violação do princípio da legalidade, na sua vertente de tipicidade, uma vez que o legislador não foi
devidamente exaustivo ao expor a medida fiscal, ao não especificar o número de filhos que permite
falar em família numerosa, não permitindo ao contribuinte saber ao certo aquilo a que está sujeito –
conexão com o princípio da segurança jurídica. Cabe então mencionar os vícios e
inconstitucionalidades em que o legislador incorre.

c) Aumento em 30% da taxa de IMT a aplicar a esses imóveis, incidente sobre todas as
respetivas transmissões ocorridas após 2010;
Os dois aspetos principais são o aumento da taxa e a incidência da taxa – equacionar princípio da
proporcionalidade, princípio da proteção da propriedade privada, princípio da segurança jurídica na
vertente da proibição da retroatividade da lei fiscal. É precisamente no contexto da segurança
jurídica que se encontra a proibição da retroatividade (art. 2º CRP), o que não é, de facto, o caso.
Estamos perante um caso de retroatividade em 1º grau – efeitos ex tunc; importa mencionar que
apesar de o legislador, na Constituição, apenas fazer referência aos impostos, a proibição vale para
qualquer tipo de tributo, que a proibição da retroatividade não existe se a lei nova for mais vantajosa
para o contribuinte.

Brevemente dar conta dos vários tipos de retroatividade, bem como os seus efeitos, a sua proibição
ou não – sabemos que a retroatividade da lei fiscal é proibida, exceto em situações de limite, de
acordo com a doutrina de Sérgio Vasques. A doutrina considera que a proibição da retroatividade
constitucionalmente consagrada se aplica aos dois tipos de retroatividade, enquanto outra parte da
doutrina considera apenas que a retroatividade em 1º grau esteva vedada. Quanto à retrospetividade,
em regra, é permitida, mediante o preenchimento de quatro pressupostos do Tribunal Constitucional.

Por outro lado, a par dos outros dois princípios supramencionados, importa analisar se o requisito da
proporcionalidade está a ser respeitado ou não, mediante os pressupostos já conhecidos (idoneidade,
necessidade, proporcionalidade) – esta medida será à partida desproporcional (mas mais importante
será colocar o problema, não manifestar uma posição), uma vez que um aumento em 30% pode
facilmente ser considerado um atentado, difícil de suportar constitucionalmente, à propriedade
privada. Partindo da doutrina de Sérgio Vasques, diz-se que o direito fiscal se intromete na
propriedade privada dos cidadãos (rendimento), podendo o Estado intrometer-se ao cobrar impostos.
Não pode ele, contudo, extravasar aquilo que é constitucionalmente permitido – art. 62º CRP.

d) Possibilidade de serem interpretadas extensivamente as normas constantes naquele


diploma, sempre que por essa via se favoreçam os interesses da Administração Tributária.
É uma matéria de interpretação – art. 11º LGT (remissão do art. 11º/1 LGT para o 9º CC). Se está em
causa uma norma de incidência, o legislador tem de ser o maus detalhado e exaustivo possível, nos
termos do princípio da tipicidade, segurança jurídica e reserva de lei absoluta (art. 11º/3 LGT), sob
pena de padecer de inconstitucionalidade. Por outro lado, tratando-se de norma que não cai no
conceito de incidência, existindo dúvidas, simplesmente não há tributação, suscitando-se a questão
da sua inconstitucionalidade.

Art. 11º/4 LGT – as lacunas não podem ser resolvidas por analogia. Há uma diferencia entre
interpretação extensiva (a letra da lei ficou aquém do seu espírito) e lacuna (há um silencio da
normação). No segundo caso, procede-se de acordo com o Código Civil (analogia ou norma ad hoc).
No entanto, diz o legislador fiscal que a lacuna não pode ser ultrapassada por interpretação analógica
no caso de matéria fiscal de competência da Assembleia da República. Note-se que no caso dos
benefícios fiscais, a interpretação extensiva admite-se, para dar cobertura a situações em que não há
cobertura na lei, mas o espírito da lei tem em conta essas situações (art. 2º/2 Estatuto dos Benefícios
Fiscais). O mesmo não acontece especificamente no caso das isenções.

No nosso caso, a interpretação não é nem a favor da autoridade tributária nem a favor do contribuinte
(critérios não relevantes – in dubio pro fiscum, in dubio contra fiscum – porque são para efeitos de
prova e não de interpretação).

Caso prático 5

Com o objetivo de custear campanhas de combate à sinistralidade rodoviária, na semana


passada, o ministro da Administração interna criou, através de uma portaria, uma taxa a que
chamou «taxa de segurança rodoviária». A nova taxa será exigida, anualmente, aos condutores
de idades compreendidas entre os 18 e 30 anos, assim como aos que tenham mais de 65 anos,
por serem, supostamente, os que têm mais acidentes.

a) Diga, justificadamente, se a “taxa de segurança rodoviária” representa uma verdadeira taxa.


Identificar o tipo de tributo, delimitando, em especial, o conceito de taxa e o de imposto;
- Ausência de uma contraprestação específica (não se verifica a bilateralidade) e de uma utilidade
divisível;
- A “taxa de segurança rodoviária” não se reconduz de forma óbvia a nenhum dos tipos de taxa
previstos no artigo 4.º, n.º2 da LGT;
- O tributo em causa é mais consentâneo com a figura do imposto.

b) Avalie se na criação da “taxa de segurança rodoviária” e na definição dos condutores a quem


será exigida foram respeitados os princípios jurídicoconstitucionais relevantes.

O princípio da legalidade tributária (artigo 103.º, n.ºs 2 e 3): a reserva de lei (em sentido absoluto e
em sentido relativo e em sentido formal e em sentido material); a prevalência de lei (artigo 266.º, n.º
2, da CRP); a precedência de lei (artigo 112.º, n.º 8, da CRP); - a inconstitucionalidade da portaria,
por não ser o meio adequado para a criação de um imposto (vício formal); - A competência
legislativa e administrativa do Governo em matéria tributária (artigos 165.º, n.º 1, alínea i), e 198.º,
n.º 1, alínea b), da CRP) - a incompetência do Governo, e em concreto, do ministro da Administração
interna para a criação de um imposto, sem a prévia autorização da Assembleia da República (vício
orgânico); - O princípio da capacidade contributiva e o princípio da igualdade tributária (artigo 13.º
da CRP e artigos 16.º, 5.º, n.º 2 e 7.º, n.º 3, da LGT) – uma vez que a “taxa de segurança rodoviária”
só seria exigida a um grupo em particular de condutores, de acordo com a faixa etária (o que por si
só é um fator discriminatório) (vício material).

Caso prático 6
No passado dia 19 de março de 2019, por decreto-lei simples, foi criada a “taxa sobre o digital”,
que veio sujeitar a tributação todos os serviços digitalmente prestados em Portugal. No
seguimento da publicação do aludido diploma, foi emitido um ofício circulado, que veio definir
os casos em que a “taxa sobre o digital” não será devida.
a) Diga se a “taxa sobre o digital” representa uma verdadeira taxa e avalie se na criação da mesma e
na definição dos casos em que não será devida foram respeitados os princípios jurídico-
constitucionais relevantes. (5 valores)
- Qualificação jurídico-tributária da “taxa sobre o digital”
- Identificação das espécies tributárias - impostos, taxas, contribuições especiais e contribuições
financeiras - 4.º da LGT
-Recondução da “taxa sobre o digital” a alguma das espécies tributárias - em especial, a
problematização da sua possível qualificação como imposto ou como taxa - análise dos principais
critérios de distinção: ausência de uma contração específica (não se verifica a bilateralidade) e de
uma utilidade divisível
- A não recondução, de uma forma óbvia, da “taxa sobre o digital” a nenhum dos tipos de taxa
previstos no artigo 4.º, n.º 2, da LG
- O tributo em causa será mais consentâneo com a figura do imposto
- Princípios jurídico-constitucionais relevantes:
> princípio da legalidade tributária: i. princípio da reserva de lei (em sentido absoluto e em sentido
relativo e em sentido formal e em sentido material); ii. princípio da prevalência de lei (artigo 266.º,
n.º 2, da CRP); iii. princípio da precedência de lei (artigo 112.º, n.º 8, da CRP)
- Os elementos essenciais dos impostos: incidência, taxa, benefícios fiscais e garantias dos
contribuintes (artigo 103.º, n.º 2, da CRP, e artigo 8.º da LGT) – recondução da isenção aos
benefícios fiscais – a necessidade de autorização legislativa
- A competência do Governo em matéria tributária – em especial, as competências legislativas
(artigos 198.º e 165.º, n.º 1, alínea i), da CRP) - A impossibilidade de adoção de Decreto Lei sem
autorização legislativa para a criação de impostos (artigos 165.º, n.º 1, alínea i), e 198.º, n.º 1, alínea
b), da CRP)
- A competência da Administração Tributária e Aduaneira em matéria tributária – as ordens internas
- A impossibilidade de serem disciplinadas matérias essenciais dos impostos (em concreto,
benefícios fiscais) por ofício-circulado

Suponha agora que, de acordo com o aludido decreto-lei, a “taxa sobre o digital” incidirá
sobre todos os serviços digitalmente prestados desde 19 de março de 2018.
b) A “Publicidade Digital, Lda.” é uma sociedade comercial que presta digitalmente serviços de
publicidade em Portugal desde janeiro de 2018. O que diria ao gerente desta sociedade se este lhe
perguntasse se deveria pagar esta “taxa sobre o digital” relativamente aos serviços prestados no
passado?

- O princípio da segurança jurídica e a proteção da confiança: (i) a não retroatividade das normas
tributárias (artigo 103.º, n.º 3, da CRP, e artigo 12.º, da LGT); (ii) recondução do caso a uma situação
de retroatividade de 1.º grau

c) Sabendo que a “Publicidade Digital, Lda.” presta ainda serviços de publicidade através de
cartazes em papel colocados na via pública, poderá a Autoridade Tributária entender que também
deverá ser cobrada a “taxa sobre o digital” relativamente a estes serviços?
- A interpretação das normas tributárias (artigo 11.º da LGT)
- Os princípios da segurança jurídica e da tipicidade fechada (traços fundamentais) – a
inadmissibilidade da interpretação extensiva em relação a matéria de incidência (a “taxa sobre o
digital” sujeitava a tributação todos os serviços prestados digitalmente - e não serviços de colocação
de cartazes em papel na via pública)
- A inadmissibilidade da interpretação das normas tributárias à luz dos brocardos in dubio pro
fiscum e in dubio contra fiscum

Aula TP: 16/3/2020

CASO PRÁTICO I

Para evitar que as previsões mais pessimistas acerca do défice orçamental se verifiquem, a
Assembleia da República aprovou uma lei através da qual introduziu as seguintes medidas:
a) Aumento da taxa de IRC para 50% quando a matéria coletável é superior a € 12 500;
b) Eliminação da possibilidade de fazer deduções relativas à saúde e educação para
indivíduos cujos rendimentos obtidos se possam reconduzir, na sua maioria, à categoria
dos rendimentos de capitais;
c) Fim das deduções relativas à aquisição de equipamentos novos para a utilização de
energias renováveis;
d) Abaixamento do limite máximo permitido de deduções à coleta por despesas de educação
de famílias numerosas, compensando assim os maiores encargos que geram para o Estado;
e) Possibilidade de interpretar as normas fiscais extensivamente, sempre que por essa via se
favoreçam os interesses da Administração Fiscal;
f) Estabelecimento de uma taxa única de 40%, no domínio do IRS;
Logo após a entrada em vigor do diploma, um grupo de deputados solicitou ao Tribunal
Constitucional a declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória e geral das suas normas.
Diga que decisão tomaria se estivesse na posição de juiz do Tribunal Constitucional.

Resposta:

Medida a)

A primeira questão que surge é saber o que está aqui em causa, sobretudo se é ou não matéria
essencial do imposto. De facto, a taxa do imposto é um elemento essencial do imposto, pelo que
sabemos que tal exige, em termos de princípio da legalidade, deve ser uma lei da Assembleia da
República ou Decreto-lei autorizado. Deste modo, não há inconstitucionalidade do ponto de vista da
reserva de lei formal (art. 103º/2 e 165º CRP e art. 8º/1 LGT). Em princípio, também não existirão
vícios materiais de inconstitucionalidade. É possível invocar também o princípio da proibição do
excesso e até mesmo a proteção da propriedade privada e das legitimas espectativas dos cidadãos.

Medida b)

O que está em causa é, de novo, matéria essencial dos impostos, cujo enquadramento da medida é
semelhante àquele que se trata na alínea a). Aquilo que há de novo é uma clara discriminação dos
rendimentos suscetíveis de serem enquadrados nos rendimentos de capitais, que pode ser justificada
ou não e, consequentemente, suportada ou afastada. Estará em causa uma discriminação não
justificada, contrariamente àquilo considerado por Teixeira Ribeiro (que, em determinadas situações,
será justificada uma discriminação do rendimento, de caráter qualitativo - os rendimentos do trabalho
podiam ser discriminados positivamente. A fonte do trabalho é limitada, não é uma fonte perpétua
como é o caso do rendimento de capital, não envolvendo o esforço do sujeito passivo, por exemplo).
Esta discriminação não é sustentável, uma vez que apenas considera os rendimentos da categoria E,
deixando de fora rendimentos semelhantes, como por exemplo os de categoria F. Seria
excecionalmente concebível esta discriminação negativa em situações de limite, mas essa não
poderia recair apenas sobre os de categoria E, mas também sobre outros de equivalente natureza (ex.
rendimentos de imóveis), devendo ser equilibrada. Importa aqui o art. 13º CRP, articulado com o art.
15º/2 e o art. 7º/3 LGT.

NOTAS FINAIS: No plano teórico, é possível sugerir vários argumentos. Ex.: O capital gera
rendimentos por si, logo a discriminação é justificada. Sérgio Vasques diria que a discriminação
poderia ser no máximo ser qualitativa, pois a natureza dos rendimentos o permite – no entanto, esta
limitação não poderia cingir-se aos rendimentos de categoria E, mas também a rendimentos de
natureza análoga – mais valias, rendimentos de imóveis etc. No entanto, o professor não acha a
posição sustentável, visto que estamos a falar dos rendimentos de categoria E.

Medida c)

Novamente, aplica-se a questão da reserva de lei formal, estando em causa elementos essenciais
dos impostos, pelo que não há violação do princípio da legalidade e se analisa nos termos das alíneas
anteriores. Contudo, há uma violação do princípio da proteção do ambiente (art. 66º/1/h) CRP).

Medida d)

Na vertente formal, não há qualquer violação nos termos da CRP e do princípio da legalidade.
Ora, na vertente material (a componente que tem a ver com a liberdade ou a margem de decisão que
deve ter o aplicador), existem alguns vícios, nomeadamente, o conceito de famílias numerosas
chocar com o grau da determinação da conduta, uma vez que é um conceito indeterminado. Deste
modo, viola-se o princípio da legalidade na sua vertente da reserva de lei absoluta, bem como o
próprio princípio da tipicidade que é o próprio desenvolvimento material desta reserva. Avançando
para a questão da igualdade, retira-se que este princípio é posto em causa desde logo pelo tratamento
diferenciado das várias famílias e pela discriminação dos sujeitos passivos com famílias mais
numerosas. A consideração fiscal da família também não é devidamente observada. Art. 67º/2/f) e
art. 104º/1 CRP, bem como o 6º/3 LGT.
As questões da determinação, da vedação, da margem para fazer juízos autónomos, podem ser
convocadas.

CONFERIR ARTIGOS: art.º 6º/3 LGT; art.º 103º e 165º/1/i); art.º 13º, art.º 67º/2/f); art.º 104º/1)
CRP; art.º 6º/3 LGT.
Medida e)

Esta questão faz apelo às teorias da interpretação e às tendências (in dubio contra fiscum ou in dubio
pro fiscum) que poderão surgir no seu âmbito. Consta do art. 11º LGT que não se deve proteger mais
o fisco ou o contribuinte, devendo haver uma harmonização das duas tendências, o que não obsta que
por vezes, pontualmente, não resultante da interpretação, a lei resulte em benefícios para o fisco ou
contribuinte, sendo legítimo pois trata-se do domínio da legislação.
A teoria mais adequada neste caso, a teoria mais adequada será a teoria que diz que as normas
fiscais devem ser interpretadas como qualquer outra norma, que resulta da própria LGT.

Medida f)

Esta medida será também matéria essencial dos impostos (taxa), pelo que, de modo geral, se
consideram preenchidos os requisitos ínsitos ao princípio da legalidade e da reserva de lei formal e
absoluta. Este princípio não é violado nas suas vertentes formal e material. Viola-se, contudo, a
igualdade em sentido material, uma vez que toda a gente é tratada do mesmo modo, sem atender às
diferenças materiais entre as pessoas. Por outro lado, equaciona-se a própria CRP nos art. 103º/1 e
104º/4 apela à progressividade (mais do que proporcionalidade) no contexto do rendimento, que não
se verifica neste caso. Há assim uma inconstitucionalidade material por violação do princípio da
igualdade.

CASO PRÁTICO II

A Direção Geral dos Impostos emanou uma norma de natureza regulamentar mediante a
qual impõe aos sujeitos passivos de IRS casados, com rendimentos entre € 20 000 e € 30 0000, o
dever de pagar, em dezembro de cada ano, uma taxa de € 500 destinada a custear despesas
inerentes à cobrança coerciva dos impostos aos contribuintes faltosos.
Joana e Pedro, um jovem casal de estudantes de engenharia, contactam-na(o) e colocam-lhe
as seguintes questões:
1. O pagamento de € 500 será uma verdadeira taxa?
2. Poderá o tributo em causa ser exigido por um ato de natureza regulamentar emanado pela
Direção Geral dos Impostos?
3. Será justificada a tributação diferenciada de um determinado grupo de sujeitos nas
condições acima explanadas?

Resposta:

1. Parece-nos que não será uma taxa, uma vez que não existe uma contraprestação especifica,
que é um requisito essencial da bilateralidade das taxas (argumento principal). Está em causa
um verdadeiro imposto. Esta pertença taxa não quadra, na verdade, com nenhum dos tipos de
taxa consagrados no art. 4º LGT (argumento auxiliar). Outros argumentos serão: a utilidade
que resulta do pagamento desta taxa é de natureza pública do ponto de vista técnico e não é
divisível, sobre o ponto de vista técnico (Teixeira Ribeiro); sob o ponto de vista financeiro, é
uma utilidade gratuita – não é paga diretamente.
2. Volta-se ao princípio da legalidade, uma vez que está em causa matéria essencial, que é a
criação do imposto (art. 103º/2 e art. 165º/1/i) CRP). O princípio da legalidade é violado nas
suas vertentes formal e material, uma vez que não se utilizou o ato normativo por ele exigido e
que não se respeita a reserva de lei absoluta. Além disso, apenas se podem admitir
regulamentos de execução das bases gerais, e nunca regulamentos inovadores (art. 199º/c)
CRP). É violada ainda a precedência de lei, art. 112º CRP.
3. Estará aqui em causa o princípio da igualdade, devido à diferenciação feita entre os sujeitos
passivos. Há uma violação clara deste princípio fundada na sua arbitrariedade. Além disso, o
critério de diferenciação, que deve ser uniforme e genérico, não é suficientemente claro e é
arbitrário, infundado, pelo que choca frontalmente com a igualdade. Art. 67º/2/f) CRP? –
viola-se o princípio da consideração fiscal da família.
Utilidade económica dos sacrifícios não é respeitada. 104/1crp

CASO PRÁTICO III

Na sequência da reabilitação da zona ribeirinha de Lisboa, e tendo em consideração que o


valor dos imóveis na área aumentou consideravelmente, o Governo, aprovou, por regulamento,
as seguintes medidas:
a) Um tributo com uma taxa de 60%, a pagar pelos proprietários, sobre o valor patrimonial
dos imóveis;
b) Majoração em 10% das taxas de IMI e IMT a aplicar a esses imóveis, especificando-se, no
caso do IMT, que esta se aplica a todas as transmissões de imóveis situados na zona
ribeirinha, ocorridas após 2000;
c) Alteração com efeitos imediatos (incluindo os procedimentos que já estejam em curso) das
normas relativas ao procedimento de inspeção quando estejam em causa matérias que
digam respeito ao IMI.

Resposta:

Medida a)

Está em causa uma contribuição especial de melhoria, dada a bilateralidade difusa, que afasta o
tributo da taxa. A própria bilateralidade afasta a hipótese de se tratar de um imposto. O seu regime
jurídico é o mesmo dos impostos.

Inconstitucionalidade formal porque o Governo não tem poder para criar o tributo, sobretudo dado
que não estava dotado de lei de autorização legislativa. Consequentemente, viola-se o princípio da
legalidade na sua totalidade - em termos materiais, formais e orgânicos. Há ainda uma manifesta
violação do princípio da proporcionalidade e respetivo corolário da proibição do excesso, não só
dada a percentagem taxa, mas também tendo em conta que a aplicação dessa taxa sobre a
propriedade seria um verdadeiro confisco (direito à propriedade - art. 62º CRP).

Medida b)

Trata a aplicação da lei no tempo sobre uma questão essencial. Há uma aplicação retroativa dos
impostos (art. 103º/3 CRP e art. 12º/1 LGT). Diferentemente da alínea c), a questão em causa é
uma questão essencial, a questão da retroatividade torna-se mais exigente. As razões
normalmente invocadas para esta proteção têm inspiração na doutrina alemã e relacionam-se com
a segurança jurídica e princípio da proteção da confiança. Para além disso, impostos retroativos
põem em causa a própria capacidade contributiva – porque têm expectativas feridas os
contribuintes, usando os seus rendimentos de outra forma.

Medida c)
Trata a questão da aplicação da lei no tempo. Está em causa uma questão puramente
procedimental, que não terá a ver diretamente com as garantias dos sujeitos passivos. Se assim for, a
lei nova pode ser aplicada imediatamente (art. 10º/1 e 12º/3 LGT), desde que não se afetem essas
garantias e interesses dos sujeitos passivos.

Aplicação da lei do tempo. Alteração com efeitos imediatos (incluindo os procedimentos que já
estejam em curso) das normas relativas ao procedimento de inspecção quando estejam em causa
matérias que digam respeito ao IMI.
Está em causa uma questão puramente procedimental, tendo um enquadramento mais flexível.
Vamos partir do principio que não se violam garantias dos direitos passivos. Se assim for, a lei nova
pode ser aplicada imediatamente, até em situações do passado ou já em curso – art 12/ 3 LGT.

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